Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02520/19.4BEBRG
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:10/28/2022
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Antero Pires Salvador
Descritores:COMISSÃO PROTECÇÃO VÍTIMAS CRIMES VIOLENTOS; INDEMNIZAÇÃO DANOS PATRIMONIAIS;
PROCESSO CRIME; TEMPESTIVIDADE/CADUCIDADE PEDIDO COMISSÃO;
DECISÃO PÕE TERMO PROCESSO
Sumário:
1. Segundo o art.º 4.º do Dec. Lei 423/91, de 30/10 [na redacção conferida pela Lei n.º 31/2006, de 21/“1 - Sob pena de caducidade, o pedido de concessão da indemnização por parte do Estado deve ser apresentado no prazo de um ano a contar da data do facto".
2. De acordo com o n.º 3, "Se tiver sido instaurado processo criminal, os prazos referidos nos números anteriores podem ser prorrogados e expiram após decorrido um ano sobre a decisão que lhe põe termo.
3. A expressão “põe termo ao processo” refere à noção de trânsito em julgado.
4. O prazo suplementar de três dias a que se refere o art.º 145º, n.º 5, do Cód. Proc. Civil, não se soma ao prazo de interposição de recurso ou de reclamação para efeito de determinação da data do trânsito em julgado da decisão judicial, apenas destruindo os efeitos do caso julgado já produzido se no decurso desses três dias for praticado algum acto processual nos termos referidos em tal dispositivo.
Recorrente:AA
Recorrido 1:MINISTÉRIO da JUSTIÇA
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Negar provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não foi emitido parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, no Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo
I. RELATÓRIO
1. AA, residente na Rua do ..., inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do TAF de Braga, datada de 23 de Março de 2021, que julgou totalmente improcedente a Acção Administrativa que havia instaurado contra o MINISTÉRIO da JUSTIÇA, na qual impugnava o despacho da Senhora Secretária de Estado Adjunta e da Justiça, de 23 de Setembro de 2019, que decidiu pela não atribuição de indemnização ao A./Recorrente, na qualidade de vítima de crime violento, bem como peticionava a condenação do R./Recorrido na prática de acto administrativo sanado dos vícios imputados e o reconhecimento do direito do A./Recorrente a receber a indemnização devida, acrescida de juros, ou em alternativa condenar o Réu/Recorrido no pagamento de uma pensão anual vitalícia, acrescendo as prestações vencidas de juros.
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2. Nas suas Alegações, o Recorrente formulou as seguintes conclusões:
"1ª) Tendo em conta que os agressores não repararam, nem era razoável prever que procedessem à reparação do dano patrimonial infligido ao aqui Autor, por não disporem de capacidade financeira para o custear, este requereu à CPVC, no dia 14/10/2009, que lhe fosse concedida uma indemnização por danos patrimoniais.
2ª) A condição de suspensão da execução das penas aplicadas foi sucessivamente prorrogada até ao dia 13/10/2013.
3ª) Por requerimento datado de 10/02/2015, o aqui Autor informou os autos de que, por despacho de 15/01/2015, proferido no âmbito do Proc. n.º 21/05...., havia sido revogada a suspensão da execução da pena de prisão aplicada aos condenados BB e CC e determinado o cumprimento da pena quatro anos de prisão efetiva, mais concluindo que, se até àquela data o aqui Autor não obtivera por parte dos agressores a efetiva reparação dos danos patrimoniais sofridos, e tendo em conta a privação de liberdade dos mesmos, aquele não seria ressarcido dos danos patrimoniais havidos, verificando-se, assim, o preenchimento desse requisito para a atribuição de uma indemnização pelo Estado.
4ª) O art. 4.º, nos 1 e 3, do Decreto-Lei n.º 423/91, refere que (nº 1), sob pena de caducidade, o pedido de concessão da indemnização por parte do Estado deve ser apresentado no prazo de um ano a contar da data do facto e que (nº 3) Se tiver sido instaurado processo criminal, os prazos referidos nos números anteriores podem ser prorrogados e expiram após decorrido um ano sobre a decisão que lhe põe termo.
5ª) A decisão que pôs termo ao processo foi o supramencionado despacho de 15/01/2015 que revogou a suspensão da execução da pena de prisão aplicada aos condenados BB e CC e determinou o cumprimento da pena quatro anos de prisão efetiva.
6ª) Com efeito, tendo a pena sido aplicada sob condição, apenas quando tal condição se tornasse de cumprimento impossível (designadamente por morte dos arguidos), ou se constatasse da sua não verificação, seria proferido o despacho que põe termo ao processo, ou declarando o cumprimento da condição ou declarando o seu incumprimento culposo e determinando a revogação da suspensão da execução da pena, nos termos dos arts. 56.º e 57.º do Código Penal, conforme sucedeu.
7ª) Até tal termo temporal não podia ser proferido qualquer despacho no sentido de “pôr termo ao processo”, isto porque existiam incidentes pós-decisórios com influência necessária na pena a aplicar aos arguidos e dilatando o prazo de cumprimento da condição de suspensão de execução da pena que se consubstanciava no pagamento da indemnização.
8ª) A lei não diz que caduca o direito a pedir a indemnização no prazo de um ano após o trânsito em julgado da decisão que aplica a pena, mas sim um ano após a decisão que lhe põe termo.
9ª) O decurso do prazo da suspensão de execução da pena não era inócuo para a conclusão do processo porque, apesar de o aqui Autor ter executado a sentença, a previsão seria a de que os arguidos, apenas sob a ameaça do cumprimento efetivo de prisão, pagariam a indemnização.
10ª) Quanto à noção do que seja “despacho que põe termo ao processo” veja-se, a propósito o que dispõe o art. 449.º, n.º 2 do CPP, segundo o qual “à sentença é equiparado despacho que tiver posto fim ao processo” para o efeito da admissibilidade do recurso de revisão de sentença transitada em julgado.
11ª) O acto administrativo sob sindicância e a sentença recorrida, salvo o devido respeito, confunde duas situações totalmente diversas, quais sejam o trânsito em julgado da sentença ou acórdão e o despacho que põe termo ao processo, uma vez que, em bom rigor, o despacho que põe termo ao processo penal é o despacho que declara extinta a pena, sendo, no entanto que, ainda que assim não fosse de entender, nunca a sentença que aplica uma pena suspensa na sua execução sob condição se trata da decisão que põe termo ao processo.
12ª) Quanto à referida norma do artº 449º nº 2 do Código de Processo Penal, o que refere o Supremo Tribunal de Justiça em diversos acórdãos citados supra é que:
- O despacho que revoga a suspensão da execução da pena, na medida em que põe termo à pena de substituição da pena de prisão, dando efectividade à execução desta, não se limita a dar sequência à condenação antes proferida e, por outro lado, integra-se na decião final;
- Tal despacho não se limita a dar sequência à “execução” da pena anteriormente cominada, mas aprecia factos novos entretanto surgidos e que põem em causa a suspensão (condicional) da pena de prisão, pois toda a suspensão da pena se estriba numa condição;
- Há aqui um juízo autónomo efectuado pelo tribunal, baseado em facto ou omissão entretanto surgidos e imputáveis ao condenado e apreciados segundo o critério da culpa; e
- O despacho que revoga a suspensão da execução da pena é também, nesse sentido, um despacho que põe fim ao processo e é equiparado à sentença, para o efeito do disposto no n.º 2 do art.º 449.º do CPP (negrito e sublinhado nossos).
13ª) O entendimento de que a decisão que põe termo ao processo criminal, nos termos do n.º 2 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 423/91, corresponde, neste caso, ao despacho de revogação da suspensão da pena é o que melhor se coaduna com a ratio do instituto da concessão de indemnização a vítimas de crimes violentos e ao espírito da lei, cuja letra exige que não tenha sido obtida efetiva reparação do dano em execução de sentença condenatória relativa a pedido deduzido nos termos dos artigos 71.º a 84.º do Código de Processo Penal ou se for razoavelmente de prever que o delinquente e responsáveis civis não repararão o dano, sem que seja possível obter de outra fonte uma reparação efetiva e suficiente (artigo 1.º, n.º 1, al. c) do Decreto-Lei n.º 423/91).
14ª) No entanto, ainda que se entenda que a decisão que põe termo ao processo é aquela que aplica a pena aos arguidos, ainda que sob condição, dever-se-á concluir que o requerimento foi apresentado atempadamente, uma vez que o requerimento que deu origem ao acto administrativo impugnado foi apresentado pelo aqui Autor no dia 14/10/2009, sendo que as partes foram notificadas do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães em 16­09-2008, podendo interpor recurso ordinário, no prazo de 20 dias, nos termos do artigo 411.º, n.º 1, do Código de Processo Penal (doravante CPP) à altura em vigor, prazo que terminaria no dia 09/10/2008.
15ª) Mas, segundo dispunha o artigo 145.º, n.º 5, do CPC, aplicável ex vi do artigo 107-A.º do CPP, “pode o acto ser praticado dentro dos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo, ficando a sua validade dependente do pagamento imediato de multa”, pelo que àquele prazo de 20 dias acrescem 3 dias úteis, o que significa que poderia ser interposto recurso ordinário do acórdão até à data de 14/10/2008 – último dos 3 dias úteis.
16ª) O mesmo resulta da certidão judicial junta aos autos no dia 30/07/2019, que certifica que o acórdão da Relação era passível de recurso até ao dia 14/10/2008, mediante o pagamento imediato de multa nos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo.
17ª) Ensina, aliás, Abílio Neto que “Para que se opere o trânsito em julgado de uma decisão, há que fazer acrescer aos prazos normais de interposição de recurso e/ou de arguição de nulidades e similares, o prazo máximo de condescendência fixado no art. 145º para prática do acto com multa” (in Código de Processo Civil anotado, 22.ª edição atualizada, 2009, pág. 1002), partilhando do mesmo entendimento o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28-09-2006, Proc. n.º 06P2256, disponível em www.dgsi.pt.
18ª) Assim, o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães pôs termo ao processo em 14/10/2008, porquanto foi nessa data que transitou em julgado, devendo, por isso, ser essa a data a ter como ponto de partida para a contagem do prazo de um ano aludido no n.º 3 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 423/91, pelo que como o pedido foi apresentado em 14/10/2009, jamais poderia a Comissão e a Ré considerar que o requerimento sofre do efeito de caducidade, porquanto não havia decorrido um ano sobre a decisão que pôs termo ao processo (artigo 279º alínea c) do Código Civil).
19ª) O art. 4.º nº 4 do Decreto-Lei n.º 423/91 refere que em qualquer caso, o Ministro da Justiça pode relevar o requerente do efeito da caducidade quando justificadas circunstâncias morais ou materiais tiverem impedido a apresentação do pedido em tempo útil, pelo que é dito pela Comissão, nos seus Pareceres de 19/07/2013 e de 22/02/2019, que “o requerente tem de pedir a suspensão ou o relevar do efeito de caducidade, tendo simultaneamente de apresentar as razões que justifiquem a não apresentação dentro dos prazos fixados para o efeito”, mas não resulta da lei que o requerente tenha de pedir a suspensão ou o relevar da caducidade no requerimento inicial.
20ª) A Comissão está a invocar a norma do atual Regime de Concessão de Indemnização às Vítimas de Crimes Violentos e de Violência Doméstica (Lei n.º 104/2009, de 14 de Setembro), designadamente o art. 11.º, n.º 4, que revogou o Decreto-Lei n.º 423/91, de 30 de Outubro, mas esse regime não é aplicável ao caso em apreço (art. 26.º da referida Lei n.º 104/2009).
21ª) Com este novo diploma o legislador quis colmatar as lacunas de que padecia o Decreto-Lei n.º 423/91, que dificultavam a interpretação das suas normas e o consequente andamento do processo, o que vai ao encontro do que se disse supra, não resultando da lei, à altura em vigor, que o requerente tivesse de pedir a suspensão ou o relevar da caducidade no requerimento inicial, alegando expressamente tais causas impeditivas no seu pedido.
22ª) Resultava, ainda, do art. 4.º do Decreto Regulamentar n.º 4/93 que “Quando o requerimento de indemnização for apresentado fora dos prazos previstos no artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 423/91, de 30 de Outubro, antes de a comissão proceder à instrução do pedido, o Ministro da Justiça decide da relevância ou não do efeito da caducidade, mediante prévio parecer da comissão”, pelo que, mais uma vez, em parte nenhuma se diz que o requerente tem de pedir o relevar da caducidade do pedido apresentado, cabendo antes ao Ministério da Justiça aferir e decidir da relevância ou não do efeito da caducidade, mediante prévio parecer da comissão.
23ª) Não só não houve parecer prévio da comissão, como o Ministério da Justiça não decidiu da relevância ou não do efeito da caducidade antes daquela entidade proceder à instrução do pedido.
24ª) De qualquer forma não resultava do diploma legal que o aqui Autor tivesse que apresentar as suas causas impeditivas aquando do seu pedido, e que não o pudesse fazer a posteriori, designadamente no seguimento de notificação emitida pela Comissão ao requerente para esse efeito
25ª) A decisão recorrida viola, por isso, claramente, as normas dos artigos 1º nº 1 alínea c), 4º nos 2, 3 e 4 do Decreto-Lei n.º 423/91 de 30 de Outubro, 449º nº 2 do Código de Processo Penal e 145º nº 5 do Código de Processo Civil".
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3. O Recorrido, Ministério da Justiça, apresentou Contra-alegações, que concluiu do seguinte modo:
A. A decisão que põe termo ao processo-criminal é aquela que se debruça sobre a punição, ou não, dos arguidos, no sentido de apurar o cometimento dos factos;
B. O despacho que revoga a suspensão da pena de prisão não põe termo ao processo-criminal, consiste, isso sim, numa decisão que versa somente sobre a verificação do cumprimento, pelos arguidos, da condição de suspensão da pena e nada mais;
C. No caso dos autos a decisão que pôs termo ao processo-crime foi o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães, sendo que, a expressão “põe termo ao processo”, a que se reporta o n.º 3 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 423/91, de 30 de outubro, só pode estar a referir-se à noção de trânsito em julgado;
D. Esse mesmo acórdão transitou em julgado em 9 de outubro de 2008, podendo, no entanto, ser interposto recurso nos três dias úteis subsequentes, ou seja, 10, 13 e 14 de outubro de 2008;
E. O Recorrente remeteu o seu requerimento à CPVC em 14 de outubro de 2009;
F. Está hoje estabilizada na jurisprudência a ideia de que a decisão penal condenatória transita em julgado logo que decorrido o prazo de recurso, não sendo de considerar para este efeito os três dias úteis após o termo do prazo, dentro dos quais a lei admite ainda a prática do ato;
G. Isto é, a tese maioritária da jurisprudência será a contrária à pretendida pelo Recorrente, pelo que o trânsito em julgado do acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães ocorreu quando terminou o prazo de recurso, sem considerar os três dias de multa, ou seja, em 9 de outubro de 2008;
H. Assim, terá de considerar-se que o requerimento do Recorrente foi apresentado intempestivamente, com a consequente caducidade do direito à indemnização, já que apenas foi apresentado na CPVC em 14 de outubro de 2009;
I. Por outro lado, o Recorrente não só deixou caducar o direito a requerer uma indemnização, como também não solicitou a relevação dessa falta, faculdade que estava ao seu alcance;
J. Tentando argumentar e defender a sua atuação, o Recorrente imputa ao aqui Recorrido o ónus de, por iniciativa própria, promover a relevação da caducidade, circunstância que, como é bom de ver, não tem qualquer apoio na lei;
K. Na verdade, é por demais evidente que cabe ao interessado, na formulação da sua pretensão, instruir o requerimento de forma cabal, sendo certo que sobre ele impende o ónus de demonstrar a existência de motivos atendíveis que justifiquem a não apresentação dentro dos prazos fixados para o efeito, conforme decorre do n.º 4 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 423/91, de 30 de outubro;
L. A citada norma tem carácter absolutamente excecional e funciona como válvula de escape a aplicar somente em situações muito particulares, em que é possível afirmar a ocorrência de circunstâncias de ordem moral ou material, que impediram a apresentação do requerimento em tempo útil, sendo que o Recorrente não invocou qualquer circunstância que apontasse no sentido de aplicação dessa norma;
M. De notar, que não poderá impor-se à CPVC a adivinhação da ocorrência de circunstâncias morais ou materiais que tenham impedido a apresentação atempada do requerimento;
N. Se o Recorrente o não fez, a conclusão que se impõe é a de que não existem motivos para aplicar a norma excecionalíssima do n.º 4 do art.º 4.º do citado Decreto-Lei n.º 423/91;
O. Pelo contrário, e como bem se referiu na sentença recorrida, “(...) a situação em causa parece corresponder ao caso típico de quem arriscou deixar para o que entendia ser o último dia a prática de um ato que poderia ter garantido muito antes. Impõe-se, assim, concluir que o requerimento foi apresentado intempestivamente”;
P. Diremos, por fim, que a sentença recorrida fez uma correta interpretação do quadro legal aplicável, não padecendo, por isso, de nenhuma das ilegalidades imputadas pelo Recorrente, pelo que não deverá ser revogada".
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4. O Digno Magistrado do M.º P.º neste TCA, notificado nos termos do art.º 146.º n.º 1 do CPTA, não se pronunciou.
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5. Sem vistos, mas com envio prévio do projecto aos Exmos. Srs. Juízes Desembargadores Adjuntos, foram os autos remetidos à Conferência para julgamento.
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6. Efectivando a delimitação do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, sendo certo que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, acima elencadas, nos termos dos arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, ns. 3 e 4 e 685.º A, todos do Código de Processo Civil, “ex vi” dos arts. 1.º e 140.º, ambos do CPTA.
II. FUNDAMENTAÇÃO
1. MATÉRIA de FACTO
São os seguintes os factos fixados na sentença recorrida - cuja fidelidade e completude não se mostram questionadas em sede recursiva:
1. O ora autor foi vítima de ofensas à integridade física no dia 20.01.2005 – facto não controvertido;
2. Em razão do que apresentou a respetiva queixa-crime, constitui-se assistente e deduziu pedido de indemnização civil, no âmbito do processo criminal comum n.º 21/05...., que correu termos no então ... Juízo do Tribunal Judicial ... – facto não controvertido;
3. As lesões sofridas pelo aqui Autor, na sequência das agressões de que foi vítima, determinaram-lhe 637 dias de doença com incapacidade para o trabalho, tendo a data da consolidação médico-legal da mesma sido fixada em 18.10.2006 – facto não controvertido;
4. O período de incapacidade temporária geral total, bem como o período de incapacidade temporária parcial, fixou-se em 103 dias – facto não controvertido;
5. As lesões e sequelas decorrentes da agressão determinaram-lhe uma incapacidade permanente geral para o trabalho de 70% - facto não controvertido;
6. Na verdade, o autor perdeu toda a sua independência, deambula com dificuldade e com ajuda de uma canadiana, tem o membro superior direito pendente, pelo que leva um suporte para imobiliza-lo, deixou de se poder deitar e levantar sozinho, de ir até ao café conviver com os amigos, ficando dependente de terceiras pessoas para fazer todas as coisas que fazia quotidianamente, designadamente para fazer a sua higiene, para se vestir e para levar os alimentos à boca – facto não controvertido;
7. Em consequência direta e necessária das lesões que sofreu, o aqui autor sofreu um profundo abalo psicológico do qual ainda não se recuperou totalmente e, ao nível da cognição, encontra-se deprimido, choroso, com irritabilidade mais fácil, com vontade de morrer e medicado com antidepressivos e ansiolíticos – facto não controvertido;
8. Por sentença proferida em 08.01.2008, no sobredito processo n.º 21/05...., os ali arguidos foram condenados nos seguintes termos:
a. O CC pela prática de um crime de ofensas à integridade física simples na pessoa do ofendido DD, na pena de 200 dias de multa à taxa diária de € 10,00, e relativamente ao aqui autor pela prática de um crime de ofensas à integridade física grave na pena de 4 anos de prisão suspensa na sua execução por quatro anos, sob condição de pagar € 5.000,00 por ano ao assistente;
b. O BB pela prática de um crime de ofensas à integridade física grave na pena de 4 anos de prisão suspensa por igual período, na condição de pagar ao assistente € 5.000,00 por ano; e
c. O EE pela prática de um crime de ofensa à integridade física grave na pena de 4 anos de prisão suspensa por igual período na condição de pagar ao assistente € 2.500,00 por ano; - facto não controvertido;
9. No que respeita ao pedido de indemnização civil, a sentença em causa condenou os agressores BB, CC e EE, no pagamento das seguintes quantias:
a. € 40.000,00, a título de danos não patrimoniais;
b. € 80.952,97, a título de danos patrimoniais; - facto não controvertido;
10. Esta sentença foi confirmada por acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, proferido em 15.09.2008 – facto não controvertido;
11. O prazo para interpor recurso deste acórdão findou em 09.10.2008, correspondendo os dias 10, 13 e 14 de Outubro de 2008 aos três dias úteis subsequentes àquela data – cf. certidão emitida pelo Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Juízo Local Criminal ..., junto a fls. 3 do documento n.º 18 junto com a petição inicial;
12. O aqui autor apresentou, em 17.04.2009, requerimento executivo destinado a promover a execução da sentença, e que corre termos no Tribunal Judicial ..., por apenso ao processo n.º 21/05.... – facto não controvertido;
13. À data da apresentação do requerimento executivo, os agressores apenas tinham pagado a quantia de € 5.000,00, nada mais tendo sido paga pelos mesmos, encontrando-se a restante quantia ainda pendente, não a tendo o autor recebido por qualquer outra forma – facto não controvertido;
14. Em 08.05.2009, foi comunicado ao aqui autor, na pessoa do seu mandatário, o resultado das pesquisas para encontrar bens suscetíveis de penhora, tendo em consequência indicado para esse efeito os veículos – cf. documento n.º 19 junto com a petição inicial;
15. Tendo em conta que os agressores não pagaram, nem sendo razoável prever que pagassem, o dano patrimonial causado ao autor, por não disporem de capacidade financeira para o custear, este remeteu em 14.10.2009 requerimento junto da Comissão de Proteção às Vítimas de Crimes Violentos (doravante, apenas CPVCV), solicitando que lhe fosse concedida uma indemnização por danos patrimoniais – facto não controvertido;
16. Logo em 23.10.2009, e na sequência do procedimento desencadeado pela apresentação deste requerimento, o presidente da CPVCV proferiu despacho no sentido de: (i) solicitar à GNR ... informação sobre a situação económica de FF e do ora autor; (ii) solicitar à PSP informação sobre a situação económica de BB e CC; e (iii) solicitar a designação de data para prestação de declarações por parte do requerente, com recurso a videoconferência – cf. documento de fls. 112 do processo administrativo integrado nos autos;
17. Sendo que, por ofício de 26.11.2009, o aqui autor foi notificado pela CPVCV para comparecer no Tribunal Judicial da Comarca de Guimarães em 14.12.2009, a fim de prestar declarações por videoconferência – cf. documento de fls. 120 do processo administrativo integrado nos autos;
18. Por ofício de 22.07.2013, foi o autor notificado do parecer da CPVCV de 19.07.2013, cujo entendimento andou no sentido do arquivamento dos autos, sem atribuição de qualquer indemnização – facto não controvertido;
19. Nesse parecer, por ler-se nomeadamente o seguinte:
“(...)
3. Caducidade
- Os factos denunciados ocorreram em 20.01.2005.
- Deram origem ao Processo-crime com o NUIPC 21/05.....
- Sentença condenatória datada de 08.01.2008.
- Trânsito em julgado em 09.10.2008.
- O requerimento foi apresentado à Comissão datado de 16.10.2009.
- Constata-se que todos os prazos previstos no art.º 4 do Decreto-Lei 423/91, de 30 de outubro, se encontram totalmente ultrapassados, pelo que sofre o presente requerimento do efeito da caducidade.
Mas analisemos de forma mais profunda o que estatui o referido art.º 4, relativamente a prazos;
(...)
1 - O n.º 1 deste art.º 4, estabelece a regra geral. Assim, o pedido para a concessão da indemnização deve ser apresentado à Comissão, no prazo de um (1) ano a contar da data do crime. No caso em apreço, o crime ocorreu em 20 de janeiro de 2005, ou seja, há mais de 8 anos, sendo que o pedido entrou na Comissão no dia 16 de outubro de 2009, ou seja, mais de 4 depois da data do crime. De acordo com este n.º 1, não existe nenhuma dúvida que o requerimento foi apresentado fora do prazo.
2 - Este n.º 2, abre a primeira exceção e dirige-se aos menores. No caso em apreço, nenhuma das vítimas era menor, pelo que não este n.º 2, não pode ser aplicado a este caso em concreto.
3 - Este n.º 3, funciona como uma autêntica válvula de escape. Assim, e apenas nos casos em que tiver sido instaurado processo criminal - e no caso em apreço foi, mais concretamente constata-se que o crime deu origem ao NUIPC 21/05.... - os prazos referidos nos números anteriores podem ser prorrogados pelo presidente da Comissão e expiram após decorrido um ano sobre a decisão que lhe põe termo, ou seja, o despacho de arquivamento do Ministério Público nos casos em que não foi possível proceder ao apuramento de responsabilidades - por exemplo quando os agressores não são identificados - o despacho de não pronúncia do juiz de instrução, ou por fim o trânsito em julgado.
Para que este n.º 3 funcionasse corretamente, o pedido devia ter sido feito no prazo de um ano, para depois poder ser prorrogado pelo presidente.
No entanto a Comissão prescinde desse preciosismo jurídico em benefício dos requerentes e desde que o pedido seja apresentado dentro do prazo estipulado, ou seja, até um ano depois da data da última decisão no processo penal, conforme estipula o preceito legal, a Comissão não levanta nenhum tipo de dúvidas e aceita o requerimento.
No caso em apreço, a última decisão em processo penal - o trânsito em julgado - ocorreu no dia 09 de outubro de 2008, pelo que o prazo de caducidade ocorreu no dia 10 de outubro de 2009. O requerimento a peticionar a indemnização, foi apresentado no dia 16 de outubro de 2009, ou seja, mais já depois do prazo máximo legalmente estipulado para a sua apresentação ter sido ultrapassado, pelo que sofre o mesmo do efeito da caducidade. Bem sabe a Comissão, que o prazo foi ultrapassado por uma questão de dias, mas objetivamente nada pode fazer a esse respeito.
4 - O n.º 4 prevê ainda, uma última regra, mas esta muito excecional. Assim, “em qualquer caso, a Ministra da Justiça pode relevar o requerente do efeito da caducidade quando justificadas circunstâncias morais ou materiais tiverem impedido a apresentação do pedido em tempo útil”. Para que aconteça esta situação em concreto, o requerente tem de pedir a suspensão ou o relevar do efeito da caducidade, tendo simultaneamente de apresentar as razões que justifiquem a não apresentação dentro dos prazos fixados para o efeito.
No requerimento apresentado a esta Comissão, em momento algum, é ou é pedido, o relevar da caducidade, nem são apresentadas qualquer tipo de justificações que justifiquem essa situação.
Assim sendo, não pode a Comissão tomar outra decisão, que não seja, a de considerar que requerimento apresentado em nome de AA, sofre do efeito da caducidade, por ter sido apresentado depois de todos os prazos previstos no art.º 4.º do Decreto-Lei 423/91, de 30 de outubro, estarem totalmente ultrapassados.
4. Direito
(...)
Por fim, prevê-se na alínea c), que, “ Não tenha sido obtida efetiva reparação do dano em execução de sentença condenatória relativa a pedido deduzido nos termos dos artigos 71.º a 84.º do Código de Processo Penal ou, se for razoavelmente de prever que o delinquente e responsáveis civis não venham a reparar o dano, sem que seja possível obter de outra fonte uma reparação efetiva e suficiente”.
Relativamente ao previsto nesta alínea, a situação é um pouco diferente; assim, os agressores já pagaram uma parte, ainda que pequena da indemnização em que foram condenados.
Por outro lado, o requerente conseguiu também em sede de execução de sentença, que alguns bens que eram propriedade dos agressores, passassem para a sua esfera patrimonial. Assim, até este momento, e em relação a esta matéria, constata-se o seguinte;
a) Resultante da execução de sentença, encontra-se depositado na conta do requerente a importância de 3.000,00€; Mas no dia 15 de março, os agressores serão novamente ouvidos, a fim de explicarem os motivos do seu incumprimento no que se refere ao pagamento das indemnizações em que foram condenados.
b) BB, pagou até este momento a quantia de - 2.000,00€;
c) CC, pagou até este momento a quantia de - 2.000,00€;
d) EE, pagou até este momento a quantia de -1.000,00€.
e) No entanto, frise-se que a viatura com a matrícula ..-DX-.., um ligeiro da marca ... de passageiros a gasóleo, do ano de 1990, e que era propriedade do agressor BB, encontra-se já em nome do requerente;
f) A viatura com a matrícula ..-..-LT, um veículo pesado, da marca ... a gasóleo, do ano de 1990, e que era propriedade do agressor BB, encontra-se já em nome do requerente;
g) A viatura com a matrícula ..-..-HC, um veículo ligeiro de passageiros, da marca ... a gasolina, do ano de 1996, e que era propriedade do agressor BB, encontra-se já em nome do requerente;
h) A viatura com a matrícula ..-..-QC, um veículo pesado, da marca ... a gasóleo, do ano de 2000, e que era propriedade do agressor BB, encontra-se já em nome do requerente.
i) Existiam ainda outras 4 viaturas que estavam em nome do agressor e que não se sabe se elas passaram para o nome do requerente
Se é verdade, que até este momento os agressores ainda não liquidaram toda a indemnização cível em que foram condenados em juízo, a pagar ao requerente, também não deixa de ser verdade, que uma pequena parte dessa indemnização foi já paga, podendo inclusive neste momento e devido à diligência efetuada a 15 de março, que o valor pago tenha já sido reforçado.
De qualquer forma, a indemnização atribuída por esta Comissão, não é para substituir aquela em que os agressores foram condenados, mas é sim, para nos casos em que os requerentes não foram ressarcidos de nenhuma outra verba e que devido ao crime, ficaram numa situação económica de grande gravidade, possam encontrar algum respaldo no Estado e beneficiar de uma indemnização social.
Não é de todo este o caso.
Estão pois preenchidos os requisitos exigidos pelas al. as a) e b) do n.º 1 do art.º 1, o mesmo não acontecendo com o disposto no al. c) do mesmo n.º 1, pois até este momento foi já liquidada uma parte da indemnização, sendo que simultaneamente, o requerente tomou já posse de duas viaturas ligeiras e duas viaturas pesadas, que eram propriedade de um dos agressores, não estando ainda este processo encerrado.
(...)
5. Conclusão
Não existe nenhum tipo de dúvida que o requerente foi vítima de um crime grave e violento, crime esse, que lhe causou lesões de tal forma graves, que ficou com sequelas permanentes para toda a sua vida.
Os requisitos previstos nas al. as a) e b) do nº 1 do art.º 1 do Decreto-lei 423/91, de 30 de outubro, encontram-se integralmente preenchidos.
O mesmo não acontece com o requisito previsto na al. c) do mesmo artigo, conforme acima foi referido.
De qualquer forma, os presentes autos, sofrem de um problema de caducidade, uma vez que o requerimento foi apresentado a esta Comissão já depois de todos os prazos previstos no art.º 4 do Decreto-lei 423/91, de 30 de outubro, estarem completamente ultrapassados. Assim, entende a Comissão, que por esse motivo, devem os presentes autos ser arquivados, sem a atribuição de nenhuma indemnização ao requerente.
(...)”; - Cf. documento n.º 5 junto com a petição inicial, correspondente ao documento de fls. 146 a 161 do processo administrativo integrado nos autos;
20. Tendo o autor apresentado requerimento escrito, destinado a pronunciar-se sobre este parecer e respetiva proposta de indeferimento do seu pedido; neste requerimento pode ler-se nomeadamente o seguinte:
“(...)
32.º
Assim, e na hipótese, que se equaciona meramente por cautela de patrocínio, de o pedido de indemnização ter efectivamente sido formulado pelo requerente após terem sido ultrapassados os prazos previstos nos nºs 1 e 3 do artigo 4.º (o que, insiste-se, não se aceita), ora se passam a expor as razões que justificam a apresentação do pedido somente naquela data.
33.º
Um dos requisitos da aplicação do Decreto-Lei n.º 423/91 é a não obtenção de efectiva reparação do dano em execução de sentença condenatória relativa a pedido de indemnização civil ou ser razoável prever que o responsável civil não reparará o dano, sem que seja possível obter de outra fonte uma reparação efectiva e suficiente.
34.º
Ora, encontra-se na presente data a correr termos no Tribunal Judicial ... e por apenso ao processo criminal, execução intentada pelo aqui requerente da sentença condenatória relativa à indemnização civil na qual foram os seus agressores, ali executados, foram condenados.
35.º
Assim, sempre se deverá reconhecer que, em bom rigor, o requerente apenas estará em condições de saber se preenche o requisito previsto na primeira parte da alínea c) do n.º 1 do artigo 1.º do referido decreto-lei, após o termo do respectivo processo executivo. (...)
40.º
Quer isto dizer que, tendo em conta que a pena de prisão foi suspensa pelo período de 4 anos, na condição de os arguidos pagarem 5.000,00 € por ano (dois deles) e 2.500 € por ano (o outro), era razoável esperar até ao fim de um ano após o trânsito em julgado para saber se estes iriam ou não pagar tais quantias.
41.º
E certo é que, durante esse ano, decorreram negociações entre as partes que não chegaram a bom termo, relativamente a esse pagamento,
42.º
Sendo certo que, os arguidos apenas pagaram, até agora, voluntariamente ao Requerente 5000 € e muito depois do ano passado sobre o trânsito em julgado.
43.º
Era, pois, razoável que se esperasse um ano, antes de se fazer o pedido de indemnização a esta Comissão, tendo em conta que durante esse ano os arguidos poderiam/deveriam pagar, pelo menos uma parte da indemnização e que a indemnização que esta Comissão poderá eventualmente suportar não se destina a substituir os obrigados principais. (...)
45º
Conforme resulta já assente, em consequência do crime, o requerente sofre ainda hoje de lesões corporais graves, que se manifestam numa incapacidade permanente de 70%, tendo, aliás, perdido toda a sua independência, razões pelas quais carece de recorrer a ajuda terceira para execução das mais simples tarefas diárias, designadamente para se deslocar dentro e para fora da sua residência,
46.º
O que condicionou a frequência e a celeridade no agendamento de reuniões com o seu advogado, a fim de ser tratado o assunto da reparação do dano.
47.º
Assim, apenas em 17-04-2009 foi o processo executivo instaurado contra os agressores, sendo certo que o requerente somente decidiu recorrer ao auxílio do Estado quando percebeu que o mais provável era não lograr obter a reparação do dano por via do processo executivo, o que mais tarde se veio a comprovar.
48.º
Ora, apenas em 08/05/2019 teve o requerente conhecimento dos bens dos agressores susceptíveis de penhora (cfr. doc. n.º 2), pelo que de imediato nomeou à penhora os veículos do agressor BB.
49.º
Apercebendo-se que tais bens não seriam susceptíveis de garantir o pagamento da indemnização, o requerente nomeou ainda à penhora os bens móveis que fossem encontrados na residência dos executados.
50.º
Sendo que, tendo em conta que, por um lado, a residência de dois dos executados é em Valongo, a realização de tal diligência ficou dependente da emissão de cartas precatórias pelo Tribunal Judicial ... ao Tribunal Judicial de Valongo, e, por outro, a suspensão dos prazos processuais durante as férias judiciais, não foi possível a realização das penhoras durante o período de tempo que precedeu a apresentação do pedido de indemnização ao requerente pelo Estado.
39.º
Isto porque, beneficiando o Requerente de apoio judiciário, não é indicado solicitador de execução, sendo os funcionários judiciais que fazem as diligências de tais execuções. 40.º
Pelo que, como se disse, à data de apresentação do pedido de indemnização pelo Estado, e o que se afigurava ser razoavelmente de prever era os agressores não virem reparar o dano causado, situação que se mantém nesta data.
41.º
Deste modo, existem razões para que a Ex.ma Ser. Ministra da Justiça releve a prática do acto fora do prazo.
(...)”; - Cf. documento n.º 6 junto com a petição inicial, correspondente ao documento de fls. 164 a 215 do processo administrativo integrado nos autos;
21. Por ofício de 26.02.2019, foi o ora autor notificado de novo parecer da CPVCV, reiterando o entendimento plasmado no anterior parecer datado de 19.07.2013 – facto não controvertido;
22. No seguimento do que o aqui autor reiterou, igualmente, o seu entendimento no sentido de considerar estarem preenchidos os pressupostos de que depende a concessão da indemnização pretendida, mediante requerimento de 19.03.2019 – facto não controvertido;
23. Após o que pela Direção de Serviços Jurídicos e de Contencioso do Ministério da Justiça foi elaborada informação, em 27.08.2019, de referência ...52, em que se pode ler o seguinte:
“(...)
II- Enquadramento Fáctico-Jurídico
2. Conforme se refere no Parecer da Comissão de Proteção às Vítimas de Crimes (CPVC), AA, na qualidade de vítima de crime violento - ofensa à integridade física grave - veio requerer a atribuição de uma indemnização, nos termos do Decreto-Lei n.º 423/91, de 30 de outubro, à data em vigor e aplicável ao caso sub juditio.
3. Não se encontram reunidos os pressupostos exigidos pelo Decreto-Lei para a atribuição da indemnização solicitada, como ressalta do apontado Parecer da Comissão de fls. 514 e 530, designadamente fls 517.
4. Também, face ao consignado no art.º 4.º do Decreto-Lei nº 423/91, de 30 de outubro, concretamente do seu n.º 3, é de indeferir o requerido.
5. Recorda-se aqui o teor do normativo atrás citado:
(...)
6. Notificado para se pronunciar a fls. 531 e 532, o Requerente veio combater a argumentação sustentada no Parecer da CPCV, negando que tenha havido lugar à caducidade do prazo para a apresentação do requerimento porque:
(...)
7. Em momento posterior o Requerente veio juntar certidão na qual se atesta que até 14 de outubro de 2008 o P.º 21 /05.7GAWD era passível de recurso, tendo o seu trânsito em julgado ocorrido em 9 de outubro de 2008.
8. Assim, na perspetiva da impetrante só em 14 de outubro é que se “considera pôr termo ao processo criminal”.
9. Em 8 de agosto de 2019, a CPVC elaborou uma Nota Informativa reiterando o teor do seu Parecer de 22 de fevereiro de 2019 e, por consequência, indeferindo o peticionado por AA.
III – Apreciação
10. Seguramente que o n.º 3 do art.º 4.º do Decreto-Lei n.º 423/91, de 30 de outubro, não justifica uma pesquisa da semântica a recair sobre a expressão “decisão que lhe põe termo”.
11. É por demais evidente que sinónimo de “decisão que lhe põe termo” é “decisão que transita em julgado”.
12. E, recorrendo às vetustas aprendizagens de Direito, fica a questão: “Quando é que uma decisão/sentença/acórdão transita em julgado?”. A resposta é linear e não obriga a maturada indagação. Quando aquela já não seja suscetível de recurso, atendendo-se ao prazo legalmente estipulado.
13. Não faz sentido procurar encontrar respostas sem qualquer suporte para um conceito singelo como o de “pôr termo”.
14. A circunstância do n.º 5 do art.º 139.º do CPC permitir a prática do ato dentro dos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo, ficando a sua validade dependente do pagamento imediata de uma multa, não significa que se deva se deva inferir que, para além do prazo legalmente determinado se possa acrescentar um período de três dias, ainda por cima úteis.
15. Aliás, se os “três dias da multa”, como vulgarmente é designada a hipótese prevista no n.º 3 do art.º 4.º do Decreto-Lei n.º 423/91, de 30 de outubro, se identificassem com o conceito de “prazo”, então porque é que teríamos um prazo (mais longo) sem quaisquer cominações e um prazo (mais curto) com cominações de índole progressiva?
16. Não colhe, pois, a argumentação trazida pelo Requerente. A realidade é só uma: operou-se a caducidade do direito de requerer indemnização à CPVC.
17. Releva-se uma logomaquia a questão de pretender agora fazer acionar o consignado no n.º 4 do art.º 4.º do Decreto-Lei n.º 423/91, de 30 de outubro.
18. Como se disse, o prazo para suscitar qualquer questão encontra-se largamente
ultrapassado e a situação do Requerente definida para a CPVC.
VI – Conclusão e Proposta
19. Assim sendo, face ao que antecede, é de proferir decisão final nos precisos termos em que se encontra formulada a proposta pela Comissão de Proteção às Vítimas de Crimes, pelo que, ao abrigo do n.º 1 do art.º 6.º do Decreto-Lei n.º 423/91, de 30 de outubro, é de indeferir o pedido de uma indemnização na qualidade de vítima de crime violento - ofensa à integridade física grave - formulado por AA.
(...)”; - Cf. documento n.º 12 junto com a petição inicial;
24. Sobre esta informação recaiu, em 23.09.2019, o seguinte despacho, proferido pela Sr.ª Secretária de Estado Adjunta e da Justiça:
“(...)
Despacho proferido ao abrigo da delegação de competências conferida pela Senhora Ministra da Justiça (Despacho n.º ...16, publicado na 2.ª Série do Diário da República n.º 13, de 20 de janeiro de 2016) – Pedido de indemnização ao abrigo do Decreto-Lei n.º 423/91, de 30 de outubro – Requerente AA.
Despacho
Nos termos e com os fundamentos constantes da Informação n.º I-SGMJ/2019/752, de 27/8/2019, da Secretaria-Geral do Ministério da Justiça em obediência ao consignado no art.º 6º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 423/91, de 30 de outubro, indefiro o pedido de indemnização apresentado por AA.
(...)”; - Cf. documento n.º 12 (fl. 1) junto com a petição inicial;
Mais se considera provado que:
25. Em 14.01.2016, pela Sr.ª Ministra da Justiça foi proferido despacho, publicado sob o número 977/2016 na 2.ª Série do Diário da República- n.º 13, de 20.01.2016, do seguinte teor:
“(...)
Ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 44.º a 50.º do Código do Procedimento Administrativo e do artigo 8.º da Decreto-Lei n.º 251-A/2015, de 17 de Dezembro, que aprova a Lei Orgânica do XXI Governo Constitucional, determino o seguinte quadro de delegação de competências:
1 – Delego na Senhora Secretária de Estado Adjunta e da Justiça, Dra. GG:
1.1 – As competências que por lei me são conferidas, com a faculdade de subdelegação, relativas a todas as matérias e à prática de todos os atos respeitantes às entidades adiante indicadas, designadamente, as decorrentes das redações atuais do Decreto-Lei n.º 192/95, de 28 de julho, do Decreto-Lei n.º 106/98, de 24 de abril, de acordo com as orientações fixadas na Resolução do Conselho de Ministros n.º 51/2006, de 5 de maio, do Decreto-Lei n.º 197/99, de 8 de junho, do Código dos Contratos Públicos, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 18/2008, de 29 de janeiro, do n.º 6 da Resolução do Conselho de Ministros n.º 112/2002, de 24 de agosto, da Lei n.º 8/2012, de 21 de fevereiro, do Decreto-Lei n.º 127/2012, de 21 de junho, e nos termos da alínea b) do n.º 3 do artigo 120.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas:
(...)
e) Comissão de Proteção às Vítimas de Crime;
(...)”; - Cf. documento n.º 13 junto com a petição inicial;
26. No dia 15.01.2015 foi proferido despacho no identificado processo-crime número 21/05...., no sentido de determinar a revogação da suspensão da pena de prisão que havia sido determinada quanto aos arguidos BB e CC - cf. documento n.º 8, fls. 3 a 6, junto com a petição inicial.
2. MATÉRIA de DIREITO
Tendo em consideração, por um lado, o acto impugnado, alegações do recorrente - sintetizadas nas proposições conclusivas supra transcritas - e, por outro, a sentença recorrida e, em concordância com a mesma, as contra alegações apresentadas pelo Ministério da Justiça - também supra transcritas nas suas conclusões sintetizadoras -, depois da sentença ter apreciado diversas invalidades suscitas nos autos e concluído pela sua inverificação - não sindicadas neste recurso jurisdicional - a única questão que subsiste desde o início da acção e que continua a dividir o entendimento das partes é aquela que tem a ver com a caducidade atinente à apresentação à Comissão da Protecção das Vítimas de Crimes Violentos --- adiante, por razões de simplificação, apenas também designada por Comissão --- do requerimento do A./Recorrente, em 14/10/2009, solicitando o pagamento, indemnização, por danos patrimoniais e que, além do mais, foi mandado arquivar pela Comissão por caducidade na sua apresentação.
Vários têm sido os argumentos aduzidos pelo A./Recorrente para dar consistência à sua tese referente à tempestividade na apresentação do seu requerimento à Comissão, reiterados e repetitivos, desde a petição inicial Sem se olvidar a similar argumentação já apresentada em sede de audiência prévia junto da Comissão e do requerimento apresentado à Sr.ª Ministra da Justiça, na sequência da decisão final da Comissão, que culminou com o acto impugnado - Despacho de 23/9/2019 da Sr.ª Secretária de Estado Adjunta e da Justiça, por delegação de competências - como se infere dos documentos juntos aos autos e transcritos, na sua essencialidade, na matéria de facto dada como provada na sentença recorrida e não questionada pelas partes. até às alegações, estas na sequência da sentença do TAF de Braga.
Porém - adiantamos, desde já - sem sucesso, pese embora a douta argumentação do recorrente, que, à míngua de razões adicionais, continua a "lutar" pela tempestividade da apresentação do requerimento à Comissão, com todos os argumentos possíveis que insiste em reiterar, mas que já obtiveram resposta negativa em todas as anteriores apreciações, sejam elas de índole administrativa, seja judicial e cuja solução aqui se reitera pela sua evidência.
Efectiva e essencialmente, a sentença do TAF de Braga, a par das demais invalidades, assertiva e justificadamente reiterou, com base em diversa jurisprudência, a caducidade daquele requerimento.
Porque a argumentação do recorrente, nesta sede recursiva - como se disse - não deixa de ser repetitiva, mas ainda assim, insubsistente, importa rever – evitando repetições despiciendas - a argumentação propendida na sentença do TAF de Braga, sublinhando nós aspectos que temos por essenciais para concluir pela sua manutenção, como segue:
"... Tempestividade do pedido formulado pelo autor junto da CPVCV
Não obstante as ilegalidades da decisão administrativa de conteúdo negativo invocadas pelo autor, e como começou por se dizer, nesta sede importa sobretudo aferir do preenchimento dos pressupostos legais para deferir o pedido apresentado junta da entidade demandada.
E, nesse aspeto, a questão central que nestes autos se coloca tem que ver com a tempestividade da apresentação do requerimento para atribuição de indemnização por parte do autor perante a CPVCV. O carácter essencial dessa questão advém da circunstância de o requerimento em causa ter sido indeferido, com fundamento (desde logo) na sua intempestividade. E daí que essa constitua uma questão também largamente abordada nos articulados das partes.
Quanto ao autor, afirma que discorda do entendimento da decisão administrativa, considerando que apresentou o requerimento de forma tempestiva, designadamente por:
- Ter sido prorrogada, até ao limite máximo, a suspensão da pena de prisão, a qual só veio a ser revogada por despacho de 15.01.2015, sendo certo que é este despacho que deve ser considerado como o que pôs termo ao processo-crime, determinando o cumprimento da pena de prisão;
- O trânsito em julgado só ocorreu em 14.10.2008, na medida em que esse era o último dia em que poderia ser interposto recurso, mediante o pagamento da respetiva multa;
- Sempre seria de aplicar o disposto no n.º 4 do art.º 4.º do DL n.º 423/91, de 31.10.
Por seu lado, a entidade demandada afirma que nem compreende a dificuldade da questão, referindo que a decisão final é o acórdão condenatório, e que é evidente que a utilização da expressão “põe termo ao processo” só pode corresponder à noção de trânsito em julgado, para o qual não se consideram os três dias para além do prazo, em que o legislador admite a prática do ato mediante o pagamento de uma multa processual.
Vejamos.
Em matéria de tempestividade de apresentação do requerimento junto da CPVCV, importa atender ao estabelecido no art.º 4.º do DL n.º 423/91, de 30.10 [na redação conferida pela Lei n.º 31/2006, de 21.07] Sendo certo que, conforme esclarecido - e bem - logo no intróito da apreciação de Direito, na sentença recorrida, se tenha escrito que "... cumpre esclarecer que o DL 423/91, de 31.10, foi expressamente revogado pelo art.º 25.º da Lei n.º 104/2009, de 14.09, que entrou em vigor a 01.01.2010. Porém, como decorre da norma que versa sobre a aplicação da lei no tempo constante do art.º 26.º deste último diploma, a presente lei não se aplica aos processos pendentes à data da sua entrada em vigor. E daí que, tendo o autor apresentado o requerimento em 14.10.2009, ainda se lhe aplique o regime anterior, ou seja, o do DL n.º 423/91, de 31.10".
, podendo ler-se aí o seguinte:
“1 - Sob pena de caducidade, o pedido de concessão da indemnização por parte do Estado deve ser apresentado no prazo de um ano a contar da data do facto.
2 - O menor à data do acto intencional de violência pode apresentar o pedido de concessão da indemnização por parte do Estado até um ano depois de atingida a maioridade ou ser emancipado.
3 - Se tiver sido instaurado processo criminal, os prazos referidos nos números anteriores podem ser prorrogados e expiram após decorrido um ano sobre a decisão que lhe põe termo.
4 - Em qualquer caso, o Ministro da Justiça pode relevar o requerente do efeito da caducidade quando justificadas circunstâncias morais ou materiais tiverem impedido a apresentação do pedido em tempo útil.
5 - Em caso de urgência, pode ser requerida a concessão de uma provisão por conta da indemnização a fixar posteriormente, de montante não superior a um quarto do limite máximo.”
No caso concreto, e como diz o autor, terá de atender-se ao n.º 3 acima transcrito, porquanto resulta do probatório que foi instaurado e correu termos o respetivo processo-crime pelos factos geradores das lesões.
E nessa sequência, pretende ainda o autor que se estabeleça como decisão que pôs termo ao processo o despacho que determinou a revogação da suspensão da pena de prisão, determinando o cumprimento da pena de prisão efetiva por parte dos condenados BB e CC.
Mas por esta via, julgamos que não lhe assiste razão.
Antes de mais, e como questão prévia a este respeito, importa aqui salientar que o n.º 3 da norma transcrita parece pressupor uma decisão de prorrogação, depois de o requerimento ter sido apresentado até um ano após os factos.
Todavia, como se lê no parecer da CPVCV, esta considerou que se trata de um preciosismo jurídico, e que aceitou o requerimento nestas circunstâncias, ou seja, contando o prazo de um ano após a decisão que põe termo ao processo criminal. Ora, não sendo esta questão levantada, não cumpre dela conhecer, considerando-se assim pacífico entre as partes que o requerimento pode ser apresentado no prazo de um ano desde a decisão que põe termo ao processo, sem necessidade de qualquer decisão prévia de prorrogação.
Na verdade, diga-se que além de a decisão administrativa assim o ter considerado, também o STA o determinou pouco tempo após a vigência da lei; com efeito, no seu de 09.05.1996, proferido no processo n.º 038615, aquele colendo tribunal considerou o seguinte:
II - Apesar da expressão “pode ser prorrogado”, o prazo referido no n. 2 do citado art. 4 resulta da mera verificação dos requisitos da lei - ter sido instaurado o processo crime - e não do exercício de um poder que não é atribuído a qualquer autoridade.
III - A caducidade não ocorre se, tendo sido instaurado processo criminal, o pedido de indemnização for apresentado no prazo referido no n. 2 do art. 4, não sendo necessário nenhum pedido de prorrogação do prazo ou qualquer acto de autoridade administrativa a conceder essa prorrogação.
Portanto, e em síntese, a este respeito é de considerar o prazo contado desde a decisão que põe termo ao processo-crime, mesmo que o aqui autor não tenha formulado qualquer pedido de prorrogação do mesmo, na medida em que essa questão é pacífica entre as partes, não podendo o tribunal ocupar-se da mesma, porque não submetida ao seu conhecimento.
Avançando.
A primeira questão que se coloca consiste em determinar qual deve ser considerada a decisão que põe termo ao processo criminal. O autor pretende que se considere para este efeito o despacho que revogou a suspensão da pena de prisão.
Não obstante o labor dispensado na petição inicial a este respeito, pensamos que não lhe assiste razão.
De facto, a decisão que põe termo ao processo-criminal é aquela que se debruça sobre a punição, ou não, dos arguidos, no sentido de apurar o cometimento dos factos [isto tendo por base o caso concreto, dado que podem existir situações em que o processo nem chega tão longe, como nos casos em que finda na fase de instrução, mediante despacho de não pronúncia].
A este respeito, consideramos o que se escreveu no acórdão do STJ de 10.12.2008, proferido no processo n.º 08P3638: “Nessa perspectiva nos parece de assumir o entendimento já expresso por este Supremo Tribunal no sentido de que a decisão que põe termo á causa é aquela que tem como consequência o arquivamento, ou encerramento do objecto do processo, mesmo que não se tenha conhecido do mérito. Em última análise trata-se da decisão que põe termo àquela relação jurídica processual penal, ou seja, que determina o “terminus” da relação entre o Estado e o Cidadão imputado, configurando os precisos termos da sua situação jurídico-criminal.”
Na verdade, o despacho que revoga a suspensão da pena de prisão não põe termo ao processo-criminal; consiste numa decisão que versa somente sobre a verificação do cumprimento, pelos arguidos, da condição de suspensão da pena, e nada mais. Ora, como decorre do aresto acima referido, a que aderimos, a decisão que põe termo ao processo é aquela que versa sobre a relação entre o Estado e o cidadão, apurando a existência do crime ou não, e a respetiva punição.
O mesmo é dizer que, no caso concreto, a decisão que pôs termo ao objeto processual (v.g., a que decidiu sobre a imputação feita aos arguidos) foi o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães.
E note-se que a jurisprudência citada pelo autor, elaborada pelo STJ, tem por base a norma do recurso de revisão prevista no CPP [art.º 449.º, n.º 2, deste código], equiparando para esse efeito o despacho de revogação à decisão condenatória, por nela se integrar, mesmo não versando sobre o objeto do processo – precisamente porque a condenação lhe é anterior.
Por isso mesmo, soçobra a tese avançada pelo autor a este respeito.
Seguidamente, o autor coloca uma outra questão, esta relacionada com o momento em que se deve considerar a decisão transitada em julgado.
Basicamente, aquilo que está em causa é saber se a decisão se considera transitada em julgado quando decorrido o prazo normal de recurso, ou se para esse efeito se devem considerar os chamados “três dias de multa”, ou seja, os três dias úteis imediatamente subsequentes ao termo daquele prazo.
Esta questão assume relevo capital no caso concreto, porque pode determinar a tempestividade da apresentação do requerimento, no caso do prazo contado desde o trânsito em julgado da decisão proferida no processo criminal.
Retenham-se, para esta análise, as seguintes datas:
- Tal como está provado, o acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães (que, como visto acima, é em nosso entender a decisão que põe termo ao processo), transitou em julgado em 09.10.2008 [considerando-se aqui apenas o prazo de recurso];
- Poderia ainda ser interposto recurso nos três dias úteis subsequentes, ou seja, 10, 13 e 14 de Outubro de 2008;
- O requerimento foi remetido à CPVCV no dia 14.10.2009, data em que se considera apresentado.
Desta conjugação de datas decorre a relevância da questão a que acima fizemos referência: caso se considere que a decisão transitou em 09.10.2008, então quando o requerimento foi enviado a 14.10.2009 já o prazo estava esgotado, com a consequente caducidade do direito; mas se considerarmos que o trânsito em julgado apenas ocorreu no momento do último dia admissível para a prática do ato, mediante o pagamento de multa, i. e., em 14.10.2008, então teremos que o requerimento foi apresentado tempestivamente, porque 14.10.2009 era o último dia do prazo.
Ora, esta questão da definição do momento do trânsito em julgado da decisão penal (e se para esse efeito os três dias úteis subsequentes ao termo do prazo previsto na lei se consideram ou não) foi já por diversas vezes abordada pela jurisprudência dos tribunais superiores competentes nessa matéria, e máxime pelo colendo STJ, nem sempre no mesmo sentido. Porém, parece estar hoje estabilizada a ideia de que a decisão penal condenatória transita em julgado logo que decorrido o prazo de recurso, não sendo de considerar para este efeito os três dias úteis após o termo do prazo, dentro dos quais a lei admite ainda a prática do ato.
Assim, no seu acórdão de 10.02.2004, proferido no processo n.º 03A4156, o STJ afirmou que “o prazo suplementar de três dias a que se refere o art.º 145º, n.º 5, do Cód. Proc. Civil, não se soma ao prazo de interposição de recurso ou de reclamação para efeito de determinação da data do trânsito em julgado da decisão judicial, apenas destruindo os efeitos do caso julgado já produzido se no decurso desses três dias for praticado algum acto processual nos termos referidos em tal dispositivo” – sendo que este entendimento, mesmo perfilhado à luz do anterior CPC, permanece perfeitamente válido à luz do atual código.
Do sumário do mais recente acórdão do mesmo STJ de 30.10.2019, proferido no processo n.º 324/14.0TELSB-N.L1-D.S1, retira-se, no mesmo sentido, o seguinte:
“VIII – Não relevam, para o efeito da data do trânsito em julgado, os 3 dias úteis durante os quais o acto ainda pode ser praticado com o pagamento de uma multa (art. 145.º do CPC), pois, como refere esta norma, trata-se dos “três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo.
IX – No mesmo sentido, apreciando pedido de aclaração, pronunciou-se o acórdão de 13­04-2016, proferido no processo n.º 651/11.8GASLH-B.S1-3.ª Secção, de que se extrai:
“As decisões judiciais consideram-se transitadas em julgado logo que não sejam susceptíveis de recurso ordinário, sendo que no caso de decisões inimpugnáveis o trânsito se verifica findo o prazo para arguição de nulidades ou apresentação de pedido de reforma (correcção) ou de aclaração, ou seja, o prazo-regra fixado no n.º 1 do art. 105.º do CPP, qual seja o de 10 dias.
Ao prazo de 10 dias previsto no n.º 1 do art. 105.º do CPP, não pode adicionar-se o prazo de 3 dias úteis constante dos arts. 139.º, do CPC e 107.º-A, do CPP, prazo este de natureza distinta que, como a própria lei adjectiva estatui no art. 139.º, n.º 5, do CPC, se situa para além do termo do prazo da prática do acto (“pode o acto ser praticado dentro dos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo”), sendo de inferir o pedido de aclaração formulado com tal fundamento”.”
Teremos assim de concluir que a tese maioritária será a contrária à pretendida pelo autor, pelo que o trânsito em julgado ocorreu quando terminou o prazo de recurso, sem considerar os dias de multa. Ou seja, em 09.10.2008. E esta será a tese a acompanhar, dado que é certo que o caso julgado se forma logo no termo do prazo de recurso; aliás, assim o diz o STJ, esclarecendo que se for utilizada a possibilidade prevista na lei, o que há é a destruição do caso julgado até então provisoriamente formado; e se nenhum recurso for apresentado, consolida-se a situação no momento do termo do prazo de recurso.
O autor, enquanto assistente, bem o devia saber (já que, se fosse interposto recurso, dele seria notificado; ou, então, seria ele o recorrente), sendo certo que alguma displicência lhe pode ser apontada, por ter aguardado tanto tempo para o envio do requerimento [e pelo menos desde 08.05.2009 sabia que os bens a penhorar não seriam minimamente suficientes para satisfazer a indemnização, como se colhe do ponto 14 dos factos provados].
E assim terá de afirmar-se que o requerimento foi apresentado intempestivamente, com a consequente caducidade do direito à indemnização, já que apenas foi remetido em 14.10.2009.
De facto, temos também aqui de acompanhar a entidade demandada quando esta diz que o legislador, ao utilizar a expressão “põe termo ao processo”, só pode estar a referir-se à noção de trânsito em julgado.
Pressupondo um legislador racional, conhecedor do ordenamento jurídico em que se move, de acordo com os cânones estabelecidos no art.º 9.º do Código Civil, seguramente que não ignorava que, nos termos da lei processual, um processo judicial se considera findo quando a decisão transita em julgado, e que o trânsito em julgado acontece quando a decisão deixar de ser suscetível de reclamação ou recurso ordinário, como atualmente se prescreve no art.º 628.º do CPC.
Com efeito, no acórdão do TCA Norte de 13.11.2020, proferido no processo n.º 00511/13.8BEAVR, assumiu-se, pelo menos de forma indireta, que à luz desta definição legal o termo inicial do prazo é quando ocorre o trânsito em julgado da decisão que põe termo ao processo. Neste sentido, pode ler-se no aresto em causa o seguinte:
“(...)
3.2.5. Na situação em juízo, o crime de que o apelante foi vítima ocorreu em 12.02.2009, resultando dos factos assentes que a sentença proferida no âmbito do processo crime que correu termos com processo n.º 19/09...., transitou em julgado no dia 30/09/2010. Mais se apurou que o apelante apenas requereu à CPVC a atribuição de indemnização, em 05/02/2013.
Aplicando ao caso a regra quanto a prazos prevista no n.º 1 do art.º 11.º da Lei 104/2009, o prazo de caducidade de um ano aí previsto, iniciou-se em 12.02.2009 e o seu termo eclodiu em 12.02.2010.
A partir da referida data- 12.02.2010- o direito à indemnização de que o apelante pudesse beneficiar enquanto vítima de um crime violento por parte da CPVC, extinguiu-se, uma vez que o apelante não requereu nenhum pedido de prorrogação.
E ainda que tivesse apresentado pedido de prorrogação o mesmo tinha como data limite o dia 30.09.2011, ou seja, um ano a contar da data da decisão que pôs termo ao processo crime, que como provado, é de 30.09.2010 (cfr. art.º 11.º, n.º 3).
(...)” – o sublinhado é nosso.
Não ignoramos que esta jurisprudência teve por base o novo regime da Lei n.º 104/2009, de 14.09; todavia, a mesma é perfeitamente transponível para o caso concreto, dado que a disposição legal é materialmente idêntica à que se aplica in casu.
Assim sendo, tudo indica que a melhor leitura a fazer da norma é a de que o prazo de um ano se conta do trânsito em julgado da decisão que versa sobre o objeto do processo penal (v.g., no caso concreto, sobre a acusação), e não sobre o concreto estatuto do arguido/condenado. E esse trânsito em julgado aconteceu, no caso concreto, em 09.10.2008. Logo, quando em 14.10.2009 o aqui autor remeteu o requerimento, já o prazo estava esgotado, com a consequente caducidade do direito que se pretendia exercer.
Versando ainda sobre esta questão da tempestividade, refere-se o autor à aplicação do disposto no n.º 4 do art.º 4.º acima transcrito, que por isso se volta a transcrever:
4 - Em qualquer caso, o Ministro da Justiça pode relevar o requerente do efeito da caducidade quando justificadas circunstâncias morais ou materiais tiverem impedido a apresentação do pedido em tempo útil.
Trata-se de uma norma de carácter absolutamente excecional, que funciona aqui como válvula de escape, mas somente para situações muito particulares, em que é possível afirmar a ocorrência de circunstâncias, de ordem moral ou material, que impediram a apresentação do requerimento em tempo útil.
Acontece que o autor não vem invocar qualquer circunstância que aponte no sentido de aplicação dessa norma. Na verdade, numa primeira fase, limita-se a discordar do entendimento da CPVCV, no sentido de considerar que a aplicação desta norma depende de requerimento do interessado nesse sentido.
A este respeito, importa começar por referir que não se poderá impor à CPVCV a adivinhação da ocorrência de circunstâncias morais ou materiais que tenham impedido a apresentação atempada do requerimento. Só existem aqui duas hipóteses: ou bem que essas circunstâncias já emergem do contexto da apresentação do requerimento, e aí funcionará o princípio do inquisitório, associado ao princípio da colaboração e ao princípio da boa-fé, enquanto princípios fundamentais da entidade administrativa; ou bem que é efetivamente o interessado quem tem de alegar e demonstrar essas circunstâncias, requerendo que seja relevado o atraso. O que não se nos afigura legítimo é exigir uma decisão oficiosa sem que à entidade decisora tenham sido apresentados elementos que a constituíssem no dever de decidir.
Certo é que no caso concreto nada se diz sequer sobre a ocorrência de quaisquer circunstâncias que tenham impedido (e note-se que a norma é de tal forma especial que não se limita a referir a dificuldade em apresentar o requerimento) a apresentação tempestiva do requerimento. E isto acontece num duplo sentido: primeiro, nada se alega sobre ter sido transmitida qualquer circunstância à entidade demandada, aquando da apresentação do requerimento; segundo, nada se alega nesta sede judicial que permita aferir sobre o preenchimento da previsão normativa.
A verdade é que no caso em análise não se afigura (ou pelo menos nada se alega) a existência de quaisquer circunstâncias morais ou materiais que tenham impedido a apresentação do requerimento. O que se regista é um caso típico de quem arriscou deixar a apresentação do requerimento para o final do prazo, e com isso deu-se mal.
De resto, a própria CPVCV, no seu parecer, não se limita a afirmar a necessidade de requerimento por parte do interessado, tendo também salientado que não foram apresentadas quaisquer justificações para a incumprimento do prazo. Neste sentido, na conclusão do parecer pode ler-se: “no requerimento apresentado a esta Comissão, em momento algum, é ou é pedido, o relevar da caducidade, nem são apresentadas qualquer tipo de justificações que justifiquem essa situação.”
E nisto a CPVCV tem integral razão: é sempre ao interessado que compete invocar os factos que possam justificar o incumprimento do prazo, com ou sem requerimento expresso nesse sentido. Se o autor não o fez, e se também não o faz nesta sede judicial, a conclusão que se impõe é a de que não existem motivos para aplicar a norma excecionalíssima do n.º 4 do art.º 4.º em análise.
Além disso, também não faz sentido alegar que está aqui em causa a aplicação da redação do n.º 4 do art.º 11.º da Lei n.º 114/2019, de 14.09; na verdade, esta regra do ónus de alegação e prova em sede de procedimento era a que já resultava do art.º 88.º do CPA então em vigor, no sentido de caber ao interessado a alegação e prova dos factos subjacentes à sua pretensão.
Da mesma forma, é irrelevante sob este ponto de vista a invocação do disposto no art.º 4.º do Decreto Regulamentar n.º 4/93. O que se regista no caso em apreço é que a questão da caducidade foi decidida simultaneamente com os restantes pressupostos (aliás, antes deles, embora no mesmo documento), tendo sido objeto de decisão expressa. Neste ponto, o autor só se pode considerar beneficiado, dado que, a aplicar a regra que o mesmo invoca, nem sequer teria visto o seu pedido instruído.
Além disso, este art.º 4.º do Decreto Regulamentar 4/93 parece apontar em sentido diverso do que é pretendido pelo autor, na medida em que parece pressupor a existência de um requerimento a ser decidido pelo Ministro da Justiça sobre a admissibilidade do pedido apresentado intempestivamente. Ou seja, o interessado teria, antes de mais, de invocar as circunstâncias que impediram a apresentação do requerimento no devido tempo (pelo menos isso teria de fazer), cabendo decisão liminar sobre o assunto, mediante parecer da comissão. Outra coisa não parece fazer sentido, dado que, como referido, não se pode exigir à entidade demandada que adivinhe as circunstâncias que levaram à apresentação do requerimento naquele momento.
De todo o modo, como referido, o certo é que existe decisão expressa sobre a tempestividade do requerimento, e a circunstância de ter sido proferida em conjunto com os demais pressupostos não afeta de modo algum a decisão, já que, em rigor, nem sequer se deveria ter chegado a esse ponto, do que resulta que o autor ficou até melhor tutelado em comparação com o indeferimento liminar do requerimento com base em intempestividade.
Em todo o caso, e sem prejuízo do referido, regista-se ainda assim que o autor aproveitou a audiência prévia para alegar razões que pudessem fazer funcionar a norma excecional que permite a apresentação do requerimento fora dos prazos previstos na lei [facto provado do ponto 20]. E essas razões são basicamente as seguintes:
- Incompatibilidade entre o prazo de um ano e o requisito previsto na al. c) do n.º 1 do art.º 1.º do DL n.º 423/91, de 30.10, por ter de aguardar o termo do respetivo processo executivo;
- Durante o ano ulterior ao trânsito em julgado da decisão condenatória, decorreram negociações com os condenados, relativas ao pagamento dos valores devidos, que não chegaram a bom termo;
- O grau de incapacidade dificultou a realização de encontros com o seu advogado para definir o modo como proceder, sendo que apenas em 08.05.2009 teve conhecimento dos bens penhoráveis dos agressores.
Se são estas as razões que o autor pretende que justifiquem a apresentação intempestiva do requerimento, então deve dizer-se que nenhuma delas seria suscetível de permitir a aplicação da norma em causa.
Desde logo, a primeira das razões apontadas não colhe. De facto, se existisse alguma incompatibilidade entre o prazo e o requisito em questão, e houvesse necessidade de aguardar o termo do processo executivo, como o autor sugere, então não se compreende qual a razão que o levou a apresentar o requerimento quando aquele processo ainda se encontrava pendente. Além do mais, veja-se que o facto de o processo executivo estar pendente nunca impede a apresentação do requerimento; na melhor das hipóteses, apresentado o requerimento, poderá a decisão aguardar o respetivo desenvolvimento – aliás, isso mesmo foi o que aconteceu no caso concreto, de acordo com o que se pode ler nos pareceres e na informação que subjaz ao despacho. E, sem prescindir, atente-se que no art.º 1.º, n.º 1, al. c), do DL 423/91, de 30.10, se diz que o reconhecimento da indemnização depende os lesados “não terem obtido efectiva reparação do dano em execução de sentença condenatória relativa a pedido deduzido nos termos dos artigos 71.º a 84.º do Código de Processo Penal ou, se for razoavelmente de prever que o delinquente e responsáveis civis não repararão o dano, sem que seja possível obter de outra fonte uma reparação efectiva e suficiente – sublinhado nosso. Já por aqui se vê que a pendência do processo executivo não gera qualquer impossibilidade de apresentação do requerimento. De resto, esta necessidade de esgotar a execução como condição de apresentação do requerimento foi rejeitada pelo acórdão do TCA Norte proferido em 13.11.2020, no processo n.º 00511/13.8BEAVR [já antes citado], cuja tese é plenamente transponível para o regime que ainda se aplica in casu.
Acrescente-se ainda que, segundo o que está provado nestes autos, nem o próprio autor aguardou o termo do processo executivo para apresentar o requerimento, e desde pelo menos 08.05.2019 teve conhecimento dos bens penhoráveis, e que os mesmos dificilmente poderiam garantir a indemnização. Por isso mesmo, nunca foi a pendência do processo executivo que impediu o autor de apresentar tempestivamente o requerimento.
As restantes razões apontadas também estão bem longe de demonstrar a apresentação tempestiva do requerimento. Com efeito, é o próprio autor quem alega, e ficou provado, que logo em 17.04.2009 instaurou a execução de sentença, pelo que nessa data já saberia que os condenados não teriam intenção de cumprir o acórdão voluntariamente. Nesse momento, faltavam cerca de seis meses para o prazo se esgotar.
Depois, e mais uma vez assim é assumido pelo próprio autor, logo em 08.05.2009 teve conhecimento dos bens penhoráveis dos condenados, pelo que nessa altura já teria uma ideia mais ou menos concreta sobre as reais possibilidades de ver satisfeita a indemnização por essa via. Nesse momento, faltavam cerca de 5 meses para acabar o prazo para apresentar o requerimento.
Ou seja, o que se pode concluir da análise destas razões é que não existiu qualquer motivo de ordem moral ou material que tenha impedido o autor de apresentar o requerimento no prazo previsto na lei. Pelo contrário, e como também já se frisou, a situação em causa parece corresponder ao caso típico de quem arriscou deixar para o que entendia ser o último dia a prática de um ato que poderia ter garantido muito antes.
Impõe-se, assim, concluir que o requerimento foi apresentado intempestivamente.
*
Em face da referida intempestividade do requerimento, impõe-se concluir que o mesmo terá forçosamente de ser indeferido com esse fundamento.
Assim sendo, daqui também resulta a improcedência dos pedidos formulados nas alíneas b), c) e d), atendendo à falta de preenchimento do referido pressuposto legal.
Por outro lado, resulta da conclusão obtida acerca da intempestividade do requerimento que fica prejudicado o conhecimento da questão relativa ao preenchimento da al. c) do n.º 1 do art.º 1.º do DL n.º 423/91, de 30.10. Isto porque, como referido, está em causa um ato de conteúdo negativo, pelo que o objeto do processo corresponde à pretensão material do interessado. E, uma vez que se concluiu pela intempestividade do requerimento, forçoso será dizer que é inútil saber se o requisito em causa está ou não preenchido, já que sempre se concluirá pelo indeferimento com aqueloutro fundamento. Aliás, como se explicou, a questão da tempestividade é mesmo prévia à que diz respeito aos restantes requisitos de ordem material, pelo que, quando verificada, impede o conhecimento destes (embora, como explicado, a entidade demandada o tenha feito de qualquer forma).
Neste sentido, cumpre concluir pela improcedência total da presente ação".
**
Ora, concordando inteiramente com a argumentação veiculada na sentença recorrida - corroborada, conforme também referido na sentença do TAF de Braga, pelo aresto deste TCA, de 13/11/2020, in Proc. 511/13.8BEAVR - mal grado, a insistência do A./Recorrente, outra solução não nos resta que, sem necessidade de acrescidas argumentações, por despiciendas, em negação de provimento ao recurso, manter a decisão judicial do TAF.
III. DECISÃO
Nestes termos, acordam, em conferência, os juízes deste Tribunal em negar provimento ao recurso e assim manter a sentença recorrida.
*
Custas pelo recorrente, sem prejuízo do apoio judiciário concedido.
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Notifique-se.
DN.
Porto, 28 de Outubro de 2022
Antero Salvador
Hélder Bonito