Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00425/10.3BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:10/26/2018
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Rogério Paulo da Costa Martins
Descritores:NULIDADE DA DECISÃO; OMISSÃO DE PRONÚNCIA; EXCESSO DE PRONÚNCIA; CONDENAÇÃO EM OBJECTO DIVERSO; ALÍNEAS D) E E), N.º1, DO ARTIGO 615º DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL; JUROS DE MORA; CITAÇÃO; PROLAÇÃO DA DECISÃO;
ARTIGO 805º, N.º 1, N.º 2, ALÍNEA B), E N.º 3, E ARTIGO 806º, N.º1, AMBOS DO CÓDIGO CIVIL.
Sumário:
1. Padece de nulidade, por omissão de pronúncia, nos termos do disposto na alínea d) do artigo 615º do Código de Processo Civil, a decisão que julgando o pedido de indemnização principal procedente não se pronunciou, por lapso, sobre o pedido de pagamento de juros.
2. Os juros de mora calculados sobre o valor da indemnização por danos patrimoniais são devidos desde a data da citação - artigo 805º, n.1, n.º2, alínea b), e n.º 3, e artigo 806º, n.º1, ambos do Código Civil.
3. Os juros de mora quanto à indemnização por danos morais e devida desde a prolação da decisão que os fixa se se tratar de uma importância actualizada.
4. Não padece de nulidade por excesso de pronúncia ou por condenação em objecto diverso - alíneas d) e e) do artigo 615º do Código de Processo Civil -, mas eventual erro de julgamento, a decisão que condena a seguradora do município, a par do município, a pagar uma indemnização pelos danos decorrentes de um acidente ocorridos numa via municipal. *
*Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:JPM
Recorrido 1:Município VNG
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum - Forma Sumária (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:
Deferir a correcção da nulidade arguida pelo recorrente; indeferir, no mais, as arguidas nulidades
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer
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Decisão Texto Integral:EM NOME DO POVO
Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
O Recorrente JPM veio arguir a nulidade do acórdão deste Tribunal de 16.03.2018 por não se ter pronunciado quanto a juros de mora.
Sobre este requerimento não foi emitida qualquer pronúncia.
Por seu turno, a fls. 674 e seguintes, veio a AGP, actual designação da AP, arguir a nulidade e pedir a aclaração do acórdão.

Notificadas as partes e o Ministério Público deste requerimento também nada vieram dizer.
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Cumpre decidir.
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1. O requerimento do Recorrente JPM:
Determina a alínea d) do n.º1, do artigo 615º, do Código de Processo Civil (de 2013), aplicável por força do disposto no artigo 1º, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, que a sentença é nula quando “O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”.
Este preceito deve ser compaginado com a primeira parte do n.º2, do artigo 608º, do mesmo diploma (anterior artigo 660º, com sublinhado nosso): “O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras”.
Conforme é entendimento pacífico na nossa jurisprudência e na doutrina, só se verifica nulidade da sentença por omissão de pronúncia, a que aludem os citados preceitos, quando o juiz se absteve de conhecer de questão suscitada pelas partes e de que devesse conhecer (cfr. Alberto Reis, Código de Processo Civil anotado, volume V, Coimbra 1984 (reimpressão), p.140; e acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 11.9.2007, recurso 059/07, de 10.09.2008, recurso 0812/07, de 28.01.2009, recurso 0667/08, e de 28.10.2009, recurso 098/09).
O erro de direito não se integra no conceito de falta de fundamentação ou omissão de pronúncia.
O erro no enquadramento jurídico leva à revogação da sentença e não à declaração de nulidade, nos termos da invocada norma da alínea b), do n.º1 do artigo 615º do actual Código de Processo Civil.
A nulidade só ocorre quando a sentença ou acórdão não aprecie questões suscitadas e não argumentos apresentados no âmbito de cada questão, face ao disposto nos artigos 697º e 608º do Código de Processo Civil de 2013 (artigos 659º e 660º do Código de Processo Civil de 1995).
Efectivamente, o tribunal não tem de se pronunciar sobre todas as considerações, razões ou argumentos apresentados pelas partes, mas apenas fundamentar suficientemente em termos de facto e de direito a solução do litígio.
Questões para este efeito são todas as pretensões processuais formuladas pelas partes, que requerem a decisão do juiz, bem como os pressupostos processuais de ordem geral e os específicos de qualquer acto especial, quando realmente debatidos entre as partes (Antunes Varela, Revista de Legislação e Jurisprudência, Ano 122º, página 112), não podendo confundir-se as questões que os litigantes submetem à apreciação e decisão do tribunal com as razões, argumentos e pressupostos em que fundam a respectiva posição na questão (Alberto dos Reis, obra citada, 143, e Rodrigues Bastos, Notas ao Código de Processo Civil, volume III, 1972, página 228).
No mesmo sentido se orientou a jurisprudência conhecida, em particular os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 09.10.2003, processo n.º 03B1816, e de 12.05.2005, processo n.º 05B840; os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 21.02.2002, processo n.º 034852 (Pleno), de 02.06.2004, processo n.º 046570, e de 10.03.2005, processo n.º 046862.
Entendimento extensível aos acórdãos dos tribunais superiores por força do disposto no artigo 666º do Código de Processo Civil, ex vi do artigo 140º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
No caso o acórdão padece efetivamente de nulidade quanto aos peticionados juros de mora.
Na verdade tanto na petição inicial como no recurso jurisdicional esse pedido foi feito.
E apenas não foi atendido devido à deficiente “colagem” da conclusão XXXIII do recurso jurisdicional na parte do enquadramento jurídico do acórdão que omitiu essa parte.
Impondo-se agora suprir tal nulidade pronunciando-nos quanto ao pedido de juros.
Estes juros, quanto aos danos patrimoniais são devidos desde a citação - artigo 805º, n.1, n.º2, alínea b), e n.º 3, e artigo 806º, n.º1, do Código Civil.
Quanto aos danos morais trata-se já de uma importância actualizada ao momento em que foi elaborado o acórdão pelos que os juros são devidos desde a data do acórdão, 16.03.2018.

2. O Requerimento da AP, agora designada AGP, companhia de seguros.
Vem esta Requerente dizer que o acórdão recorrido padece de nulidade por excesso de pronúncia e por ir além do pedido.
Isto porque a AP, agora AGP, segundo defende, não é parte no processo apenas intervém como parte acessória e por isso não lhe foi dirigido nenhum pedido.
Vejamos.
Dispõe o n.º1 do artigo 615º do Código de Processo Civil, nas alíneas que aqui relevam que a decisão é nula quando:
“d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido”.
Em bom rigor, no entanto, o acórdão não apreciou questão que não devesse apreciar nem condenou em objecto diverso do pedido.
Quer na petição inicial quer nas alegações de recurso (conclusão XXXIII), o Autor e Recorrente pediu que fossem os “réus solidariamente condenados a pagar ao autor a a indemnização de 12.554,71 € (doze mil quinhentos e cinquenta e quatro euros e setenta e um cêntimos)”.
Sucede que este Tribunal integrou, bem ao mal, para esta questão não releva, a AP no leque de Réus.
E assim foi condenada solidariamente a pagar a indemnização fixada.
Tal pode constituir erro de julgamento mas não traduz qualquer nulidade.
Quanto à aclaração, pretende a AGP que o Tribunal esclareça “qual o fundamento legal da condenação do exponente, que intervém no processo como interveniente acessória”; o que se pretende dizer “sendo a seguradora nos termos do contrato de seguro” sendo certo que o teor do contrato não foi (nem tinha de ser) objecto de discussão e julgamento em 1ª instância e, tal como defendeu na contestação não cobre o sinistro e os danos peticionados; “nos termos do contrato de seguro” significa a condenação definitiva em quantia líquida ou nas quantias peticionadas ou, por outras palavras, a condenação da acção retira ou não a acção de regresso com fundamento na qual foi admitida a sua intervenção acessória?
Este pedido de aclaração é apenas a manifestação da sua divergência com o decidido o que não cabe nesta sede, de aclaração da decisão.
A decisão é perfeitamente clara, certa ou não, de acordo ou não com a lei, substantiva e processual, e o teor do seguro, concorde-se ou não com a decisão: condena a AP e o Município a pagar as importâncias referidas na alínea B).
Não há, portanto, nada a aclarar.
Pelo que se impõe o indeferimento deste requerimento no seu todo.
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Pelo exposto, os juízes da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte, ACORDAM em:
A) Suprir a nulidade por omissão de pronúncia arguida pelo Recorrente JPM e, no presente acórdão que passará a fazer parte integrante do acórdão de 16.03.2018, decidem:
I. Aditar à alínea B) do seu dispositivo o seguinte número:
5. Juros de mora à taxa legal, contados desde a citação quanto à indemnização por danos patrimoniais e contados desde a data do presente acórdão (16.03.2018) quantos à indemnização por danos morais, até ao efectivo e integral pagamento.
II. Manter o acórdão recorrido por não padecer de qualquer nulidade quanto ao que foi requerido pela AGP.
Custas por este requerimento a cargo da Requerente.
Porto, 26.10.2018
Ass. Rogério Martins
Ass. Luís Garcia
Ass. Alexandra Alendouro