Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00568/16.0BEBRG |
Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
Data do Acordão: | 01/11/2018 |
Tribunal: | TAF de Braga |
Relator: | Barbara Tavares Teles |
Descritores: | REVERSÃO GERÊNCIA CULPA |
Sumário: | 1. Concluindo que a sociedade não teria possibilidade de cumprir as suas obrigações tributárias, deveria o revertido ter tomado medidas no sentido de obviar a esta situação. Se pretende ilidir a presunção de culpa, o revertido não pode deixar de provar que se empenhou no pagamento dos créditos fiscais e/ou na preservação do património societário que há-de, a final, garantir o seu pagamento. 2. Esta exigência é o que se reputa de condição mínima para «desculpabilizar» a falta de pagamento de qualquer imposto, no entanto tratando-se do IVA, assim como de outros impostos retidos na fonte, a falta de pagamento tem particular gravidade na medida em que se trata de impostos que resultam de um fluxo monetário na empresa que ao não serem entregues nos cofres do Estado, são «desviados» do seu destino legal único, em proveito de «objectivos» totalmente alheios à sua finalidade. Quando o gestor procede ao «desvio» da destinação das verbas recebidas não pode deixar de indiciar um comportamento censurável, considerando até que no caso específico do IVA, a factura ou documento equivalente constitui como que um cheque sobre o Estado. 3. Esta forma de actuação era imposta pelo citado critério do “bom pai de família”, de um gerente competente e criterioso. Não pode, pois, considerar-se que o revertido tenha logrado ilidir a presunção de culpa pelo não pagamento da dívida exequenda que sobre si impendia.* * Sumário elaborado pelo Relator. |
Recorrente: | A... |
Recorrido 1: | Autoridade Tributária e Aduaneira |
Decisão: | Negado provimento ao recurso |
Aditamento: |
Parecer Ministério Publico: |
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. RELATÓRIO A..., inconformado com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que julgou improcedente a oposição à execução nº 00450200901043145 e apensos, contra si revertida e originariamente instaurada no serviço de finanças de V. N. Famalicão, contra a A… Lda., por dividas de IVA, referentes aos períodos 2009/03T, 2009/06T, 200/12T, 2011/06T, 2011/12T e 2012/09T, no montante global de € 12.297,96, veio dela interpor o presente recurso jurisdicional, terminando as suas alegações formulando as seguintes conclusões: “EM CONCLUSÃO A O ora recorrente, executado em reversão por ter sido gerente de sociedade comercial, opôs-se à reversão e execução alegando que não foi por culpa sua que os créditos fiscais em execução não foram pagos pela sociedade. B Alegou pois as especificidades e circunstâncias em que o crédito fiscal se venceu e porque não pôde ser pago. E que foram, (cfr. art.º 13.º desta alegação): “E assim, provado está nos autos: - que “o património da pessoa coletiva tornou-se insuficiente para a satisfação dos débitos que se iam avolumando, nomeadamente no período do nascimento das dívidas tributárias e seu vencimento, por factos que lhe foram estranhos e imprevisíveis.”, (art.º 4.º da oposição); - que “a atividade desenvolvida pela sociedade comercial, de confeção de artigos de vestuário a feitio, dependia absolutamente do fluxo periódico de encomendas com que desde o início do exercício da sua atividade o ora respondente foi contando.”, art.º 5.º da oposição); - que “sem o recebimento de encomendas a sociedade foi ficando sem poder exercer a sua atividade e acumulando prejuízos derivados dos custos com pessoal e outros que se acumularam e sem as correspondentes vendas ou receitas.”, (art.º 6.º da oposição; - que “imprevisivelmente as encomendas deixaram de ser recebidas no tempo esperado e foram faltando. Perante esta situação, e a consequente falta temporária de laboração por parte dos trabalhadores, a empresa não dispunha no final do mês dos esperados valores líquidos destinados aos encargos normais nomeadamente com os trabalhadores.”, (art.º 7.º da oposição); - que “perante esta situação ponderou o gerente e decidiu dar prioridade ao pagamento dos salários dos trabalhadores, em detrimento da satisfação de algumas dívidas, nomeadamente as fiscais ora em execução, com os quais podia assim continuar a contar, na expectativa de que com o restabelecimento do fluxo normal das encomendas pudesse assim ir satisfazendo os débitos existentes.”, (art.º 8.º da oposição); - que “esta expectativa foi-se prolongando no tempo, e veio a mostrar-se insolúvel pelo que nenhum outro remédio teve o gerente senão ir dispensando o pessoal e vendendo bens da firma para pagamento dos seus direitos salariais na expectativa de futuras melhorias económicas – acabando a sociedade por ficar sem trabalhadores e sem bens no seu ativo, e encerrando a laboração.”, (art.º 9.º da oposição); - que “esta opção de ir vendendo os bens da firma e pagando aos trabalhadores quando os ia dispensando, tomou-a o gerente para que nenhum trabalhador ficasse sem o recebimento dos seus direitos salariais, o que na realidade sucedeu. E até porque a sua esposa era também costureira trabalhando na sociedade e amiga e vizinha das restantes costureiras.”, (art.º 10.º da oposição). C Esta matéria de facto (narrada na conclusão anterior) não foi impugnada pela Fazenda Nacional – e por isso foi adquirida nos autos como provada. D Matéria de facto esta reveladora das especificidades e circunstâncias que o gerente, ora recorrente, enfrentou e das opções e decisões que como faria um “bom pai de família” teve de adotar. E Numa empresa que trabalha a feitio e depende exclusivamente do fluxo de encomendas, perante a falta ou diminuição das encomendas, tenta por todos os meios preservar os seus trabalhadores, condição essencial para que, retomadas as encomendas, possa retomar a laboração e encetar a recuperação económica e realizar o pagamento das dívidas vencidas – fiscais e outras. F É o procedimento “normal e comum” de qualquer gerente perante os “altos e baixos” do mercado, frequentes e até normais na vida das empresas. G E assim tendo optado o gerente ora recorrente, no seu caso concreto, agiu pois “como um bom pai de família” e sem culpa. H Foi violado o disposto no artigo 24.º n.º 1 al. b) da Lei Geral Tributária. I Tal disposição deveria ter sido aplicada e com o sentido de que perante as especificidades e o circunstancialismo vívido pelo gerente, e ora recorrente, este agiu como um “bom pai de família” (e como agiria qualquer outro gerente em tais especificidades e circunstancialismo) e portanto sem culpa. Termos em que pede a procedência do Recurso e da Oposição, assim se realizando JUSTIÇA.” * A Recorrida não apresentou contra-alegações.* Neste Tribunal, o Digno Magistrado do Ministério Público emitiu douto parecer, defendendo a improcedência do recurso, por a decisão não padecer de quaisquer vícios.* Colhidos os vistos legais, importa apreciar e decidir.* Objecto do recurso - Questão a apreciar e decidir: Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pela Recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer. As questões suscitadas consistem em apreciar se a sentença errou no julgamento de facto e de direito ao considerar que o ora Recorrente não logrou demonstrar a falta de culpa na insuficiência do património da sociedade executada originária. II.FUNDAMENTAÇÃO II. 1. Da Matéria de Facto A sentença recorrida deu como assente a seguinte matéria de facto: “FACTOS PROVADOS 1. A Administração Tributária, em 16/6/2009, instaurou contra a sociedade comercial “A…, Lda.”, Contribuinte Fiscal nº 5…, o Processo de Execução Fiscal nº 0450200901043145, e em 19/9/2009, 16/3/2011, 14/9/2011, 2/3/2012, 18/1/2013 e 26/2/2013 instaurou os processos apensos, com vista à cobrança de créditos de IVA referentes aos períodos 2009/03T, 2009/06T, 200/12T, 2011/06T, 2011/12T e 2012/09T, que admitiam pagamento voluntário respectivamente em 15/5/2009, 17/8/2009, 15/2/2011, 16/8/2011, 15/2/2012, 17/12/2012 e 31/1/2013, no montante global de € 12.297,96, processos que correm termos no Serviço de Finanças de Vila Nova de Famalicão-1. 2. Dão-se por reproduzidas as certidões de dívida que constam a fls. 3 a 9 do processo administrativo apenso, das quais emergiram os processos de execução aludidos em 1. 3. A sociedade comercial “A…, Lda.”, Contribuinte Fiscal nº 5…, foi declarada insolvente por sentença proferida no dia 18/1/2016, no Processo nº 254/16.0T8VNF, que corre termos no Tribunal do Comércio- J1 de Vila Nova de Famalicão, nos termos exarados na documentação que consta a fls. 10, 13/14 do processo administrativo apenso e se dá por reproduzida. 4. O Oponente, em 2/2/2016, apresentou o requerimento que consta a fls. 11/12 do processo administrativo apenso e se dá por reproduzido, no exercício do direito de audição em relação ao projecto de reversão lavrado no Processo de Execução Fiscal identificado em 1. 5. No Processo de Execução Fiscal aludido em 1, em 18/2/2016, foi lavrado o despacho de reversão constante de fls. 16/18 do processo administrativo apenso que se dá por reproduzido. 6. A Administração Tributária remeteu ao Oponente, sob registo postal, o ofício nº 1010, datado de 18/2/2016, que consta a fls. 19/20 do processo administrativo apenso e se dá por reproduzido, com vista à notificação do despacho aludido em 5. 7. O aviso de recepção relativo ao ofício aludido em 6 foi assinado em 22/2/2016. 8. A presente oposição foi apresentada em 16/3/2016. 9. O Oponente, enquanto gerente da sociedade comercial “A…, Lda.”, Contribuinte Fiscal nº 5…, vendeu bens daquela sociedade para pagamento dos salários dos trabalhadores, e para que nenhum deles deixasse de receber os vencimentos devidos. FACTOS NÃO PROVADOS Nada mais se provou com interesse para o conhecimento do mérito. * A convicção do Tribunal alicerçou-se na matéria de facto alegada e não contestada, na análise crítica da prova documental junta aos autos, e outra de conhecimento oficioso do Tribunal, dispensando a respectiva alegação, nos termos do artigo 412º Código de Processo Civil. “* Estabilizada a matéria de facto, avancemos para as questões que nos vêm colocadas. * II.2. Do Direito Conforme resulta de teor das alegações e conclusões de recurso o que está agora em causa é apenas saber se a decisão a quo incorreu em erro de julgamento quando julgou improcedente a oposição por entender que o Recorrido, sendo gerente da sociedade executada originária, não logrou demonstrar, como lhe competia, que não teve culpa na dissipação do seu património. |