Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00577/18.4BEVIS
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:06/12/2019
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:Ricardo de Oliveira e Sousa
Descritores:CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL; IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO; DEVER DE EXCLUSÃO DE PROPOSTAS; IMPOSSIBILIDADE DE OBTENÇÃO DE ESCLARECIMENTOS COMO FORMA DE SANAR IRREGULARIDADES DA APRESENTAÇÃO DA PROPOSTA;
ARTIGOS 146.º, N.º 2, AL. O) E 70º, Nº. 2, ALÍNEA B), AMBOS DO CCP.
Sumário:
I- O tribunal de recurso só deve modificar a matéria de facto quando a convicção do julgador, em 1ª instância, não seja razoável, isto é, quando seja manifesta a desconformidade dos factos assentes com os meios de prova disponibilizados nos autos, dando-se assim a devida relevância aos princípios da oralidade, da imediação e da livre apreciação da prova e à garantia do duplo grau de jurisdição sobre o julgamento da matéria de facto.
II- Da conjugação dos arts. 146.º, n.º 2, al. o) e 70º, nº. 2, alínea b), ambos do CCP, resulta que o júri, no relatório preliminar, deve propor, fundamentadamente, a exclusão das propostas que violem os parâmetros base do caderno de encargos ou cujos termos e condições violem aspetos por ele subtraídos à concorrência.
III- A referência a um dever jurídico de, no relatório preliminar, propor a exclusão das propostas demonstra claramente que os requisitos exigidos têm de estar cumpridos aquando da elaboração do relatório preliminar e que, detetada a falta, o júri fica vinculado a propor e o órgão adjudicante a decretar, tal exclusão, não existindo, assim, neste âmbito, qualquer margem de livre apreciação por parte desses órgãos.
Face a este regime imperativo, não poderia o júri solicitar esclarecimentos ao abrigo do art. 72.º, do CCP, ou admitir que, no decurso do pleito procedimental, fosse sanada a falta verificada, dado que o esclarecimento supõe que ainda não haja motivo para a exclusão da proposta, sendo de referir ainda que a audiência prévia não pode servir para juntar ou completar documentos inicialmente exigíveis [cf. Acs. do STA de 11/04/2012 –Proc.n.º 01166/11 e de 30/01/2013 – Proc. n.º 01123/12]. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:VNSRU, S.A.
Recorrido 1:ICC, LDA.
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Impugnação Urgente - Contencioso pré-contratual (arts. 100º e segs. CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:
Negar provimento aos recursos
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I – RELATÓRIO
ICC, LDA., com os sinais dos autos, intentou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu [doravante TAF de Viseu] a presente Ação de Contencioso Pré-Contratual contra a VNSRU, S.A., também com os demais sinais dos autos, peticionando o provimento do presente meio processual por forma a ser anulado “(…) o ato final, praticado pelo réu, de adjudicação da empreitada à contra-interessada FP, S.A., no âmbito do procedimento do concurso denominado “Empreitada de Reconstrução da CdB - Unidade de Saúde Familiar” (…)”, bem como por forma a “(…) ser o Réu condenado a praticar o ato legalmente devido, por mor da exclusão da proposta apresentada pela contra-interessada FP, S.A, e adjudicar a empreitada, objeto do concurso público, à Autora (…)”.
O T.A.F. de Viseu julgou a presente ação totalmente procedente e, em consequência, anulou a deliberação impugnada [e todos os atos subsequentes], e condenou a Ré a aprovar novo Relatório Final, que exclua a proposta apresentada pela Contrainteressada, gradue a proposta apresentada pela Autora em primeiro lugar e que lhe adjudique a supra identificada empreitada.
É desta sentença que a e a CONTRAINTERESSADA vêm interpor os presentes RECURSOS JURISDICIONAIS.
*
Alegando, aquela formulou as seguintes conclusões:
(…)
I. Vem o presente recurso interposto da douta Decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu que julga procedente a presente ação de contencioso pré-contratual.
II. Com o devido e maior respeito pelo Mm° Tribunal a quo, entende a ora Recorrente que face à prova que instruiu os presentes autos deviam ter sido dados como provados os dois factos que não o foram, o que implica uma alteração da matéria de facto e, consequentemente, uma Decisão em conformidade; mas, sem prescindir e assim não se entendendo, sempre o Tribunal a quo não devia ter decidido como decidiu. Vejamos então.
III. ALTERAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
O Mm° Tribunal a quo deu como não provados os seguintes factos:
1. Da proposta da Contrainteressada constam todos os artigos, mormente os preços unitários e descrição das espécies de trabalhos dos itens 10.20,10.21 e 10.22 da Lista de Preços Unitários;
2. Quando o ficheiro informático que continha tal lista, em formato "Excel", foi convertido para o formato "PDF", para efeitos de submissão na plataforma eletrónica por lapso involuntário ficaram omissos os artigos 10.20, 10.21 e 10.22. 
IV. No que a esta factualidade diz respeito entende-se, da análise de alguns dos documentos trazidos aos autos - cujo teor não foi impugnado ou sequer posto em causa pela ora Recorrida - que o Mm° Tribunal a quo não valorou, como devia, o seu teor o que, por si só, levaria a uma decisão diferente.
V. Estão em causa os seguintes documentos: Documento “2.2 b - 1) LPU - CdB - Resposta a erros e omissões’” (em Excel) da proposta apresentada pela CI, junto como documento 1 pela CI em sede de contestação e que instruiu a proposta da CI (cfr. submissão da proposta a fls. 667 vs do p.a.); Anexo I - Declaração de acordo com o art. ° 57.°, do Código dos Contratos Públicos, aprovado pelo Decreto-Lei n. ° 18/2008, de 29 de janeiro ”, junto como documento n° 2 pela CI em sede de contestação e que instruiu a proposta da CI (cfr. fls. 597 do p.a.); Lista de Preços Unitários em formato PDF, que instruiu a proposta da CI (cfr. fls. 559 vs do p.a.).
VI. Da análise e conjugação do teor destes documentos verifica-se que efetivamente, a CI instruiu a sua proposta com a LPU, em Excel, (documento denominado “2.2 b - 1) LPU- CdB - Resposta a erros e omissões” (em Excel)”), e que nesse documento constam os preços unitários e descrição das espécies de trabalhos dos itens 10.20,10.21 e 10.22.; para além disso, se confrontarmos o conteúdo da LPU, em Excel (cfr. doc. 1 junto pela CI), com o da LPU, em formato PDF, (cfr. fls. 559 vs do p.a.) constata-se que, do documento em Excel para o documento em PDF, desaparecem os três itens 10.20,10.21 e 10.22, aqui em causa; deste modo, deviam ter sido dados como provados os factos alegados pela CI nos artigos 16° e 17 da sua contestação.
VII. Assim sendo, como se entende, e atendendo ao teor dos documentos supra referidos, nos termos do artigo n.° 662° do CPC, aplicável ex vi artigo 1° do CPTA, deverá ser alterada a decisão proferida pelo Tribunal a quo sobre a matéria de facto, dando-se como provados, os seguintes factos (suprimindo-se os mesmos dos factos dados como não provados): i. Da proposta da Contrainteressada constam todos os artigos, mormente os preços unitários e descrição das espécies de trabalhos dos itens 10.20,10.21 e 10.22 da Lista de Preços Unitários; ii. Quando o ficheiro informático que continha tal lista, em formato "Excel", foi convertido para o formato "PDF", para efeitos de submissão na plataforma eletrónica por lapso involuntário ficaram omissos os artigos 10.20, 10.21 e 10.22.
VIII. Pelo exposto e consequentemente, da alteração a matéria de facto que se defende, entende-se que a situação fáctica apurada e provada permite concluir pela legal e correta admissão da proposta apresentada pela CI, pela sua correta ordenação em primeiro lugar e pela legalidade da adjudicação posta em crise nos presentes autos, o que, terá necessariamente que levar à revogação da Decisão recorrida, substituindo-a por outra que julgue procedente o presente recurso com todas as consequências legais.
» SEM PRESCINDIR,
A não se entender assim, o que só por hipótese académica se admite.
IX. Como bem refere a Mma Senhora Juiz do Tribunal a quo o cerne do presente dissídio prende-se - unicamente - com a apreciação da possibilidade que assistiria à ora Recorrente, em momento posterior à abertura das propostas, de dirigir um pedido de esclarecimentos à Contrainteressada, nos termos do constante no artigo 72°do CCP, atenta a omissão, na proposta por esta apresentada, de três artigos da lista de preços unitários (doravante abreviadamente LPU), sendo que, a Decisão proferida acolheu a tese de que numa situação como a dos autos não há lugar a pedido de esclarecimentos, razão pela qual a proposta da CI devia ter sido excluída.
X. Entende a Recorrente que a concreta factualidade apurada e o seu enquadramento legal e nos princípios gerais da contratação pública, impunham uma Decisão em sentido contrário. Vejamos:
XI. De entre esses cerca de 1100 trabalhos, preveem-se no Capítulo 10, respeitante às Redes de Gases, nos seus artigos 10.20, 10.21 e 10.22 os seguintes:“ (...)10.20.Fornecimento e execução de telas finais, de acordo com o Projeto executado e as indicações do Caderno de Encargos (3 exemplares em formato papel e 1 exemplar em formato digital (CD): 10.21. Formação do pessoal utilizador; 10.22. Apoio de construção civil inerente a todos os trabalhos da rede de gás.” [cfr.FP, alínea F)] 
XII. Estes concretos trabalhos, pela sua própria natureza, logo que executados, esgotam-se em si mesmo; e, por se esgotarem em si mesmo, na LPU, no que respeita às “unidades”, os mesmos estão definidos em “valor de grandeza”, “vg”, sendo que, quanto à sua “quantidade”, está fixado que os mesmos correspondem a - apenas - 1.000, [cfr. FP, alíneas E) e F)]
XIII. Também por isso, estes trabalhos, em sede de execução de contrato, não são suscetíveis de consubstanciarem trabalhos a mais, ou trabalhos a menos: são aqueles concretos trabalhos, não são repetíveis, têm que ser executados e, assim que executados, cumprem o exigido pela entidade adjudicante;
XIV. Acresce que, para além da natureza e quantidade dos trabalhos respeitantes aos artigos 10.20, 10.21 e 10.22, importa também analisar os mesmos no que diz respeito ao valor.
XV. Desde logo, sendo cada um dos trabalhos discriminados nos referidos artigos trabalhos únicos, o valor a dar a cada um destes três trabalhos é também um valor único, sem possibilidade de ser aumentado ou reduzido, ainda que haja uma qualquer alteração de circunstâncias em sede de execução do contrato, e por isso, como se disse, nunca estes trabalhos poderão consubstanciar trabalhos a mais, ou a menos.
XVI. Acresce ainda que, o valor dos trabalhos respeitante a estes três artigos, quando comparados com os valores totais dos trabalhos a executar (e que correspondem às propostas apresentadas), representam valores residuais, sem valor expressivo e de pequeníssima monta.
XVII. Ou seja, em propostas de € 1.957.000,00 (HT), de €1.999.350,37 (EB) e de € 1.950.045,53 (da ora Recorrida), temos - quanto aos três artigos do mapa de quantidades em questão - valores de, respetivamente, € 646,350, € 899,100 e € 714,000, o que representa um valor percentual relativamente às propostas, de aproximada e respetivamente, 0,033%, 0,045% e 0,037%. [cfr. fls. 156, 300 vs e 340 do p.a. e FP, al.s J) e K])
XVIII. Ainda de notar que a diferença de valores entre a proposta apresentada pela CI (€1.897.547,39) e a proposta da ora Recorrida (€1.950.045,53€), é de € 52.498,14, sendo que, ainda que se retire da proposta da Recorrida o valor respeitante aos artigos 10.20, 10.21 e 10.22 (€1.950.045,53 - € 740,00 = € 1.949.305,53), a diferença entre as duas propostas continua a ser de € 51.758,14 (€ 1.949.305,53 - €1.897.547,39).
XIX. Ora, na análise das propostas apresentadas, o Júri do procedimento constatou que na LPU apresentada pela CI, em formato “PDF”, não constavam os três artigos respeitantes à Rede de Gases, 10.20, 10.21, 10.22, (fls. 559 vs do p.a.), não tendo reparado, que tinha sido junto o documento completo em formato Excel (cfr. doc.1 junto pela CI na contestação).
XX. Mas, tendo presente o tipo de lapso em causa (nos termos supra referidos), entendeu o Júri poder - e dever - haver lugar a um pedido de esclarecimentos por parte da CI, esclarecimento que passaria por saber se, face àquela omissão, a mesma declarava, de forma inequívoca, que o valor a atribuir aos referidos artigos da LPU para os respetivos trabalhos, será efetuado pelo “preço unitário zero”. [cfr. FP, al.s L) e M)]
XXI. Uma resposta positiva não teria qualquer consequência ou interferência na análise comparativa das propostas, nem tão pouco na boa execução do contrato caso a respetiva proposta fosse adjudicada, - já que aqueles três artigos, pura e simplesmente, teriam o “preço unitário zero”, irrelevante no valor da proposta já apresentada, inócuo em sede de execução do contrato; por outro, permitia manter uma proposta € 52.498,14 mais baixa do que a da ora Recorrida e que, também por isso, melhor servia o interesse público e os princípios da contratação pública.
XXII. Acresce que, para além de ter apresentado o documento LPU, o certo é que noutros documentos que instruíram a proposta - designadamente na Memória Descritiva do Projeto de Instalações de Gases, na calendarização da execução das obras e nos planos apresentados - a CI compromete-se expressamente a executar os trabalhos respeitantes aos artigos em causa, ao que acresce que ao assinar o Anexo I há uma declaração séria, de vontade por parte da CI em aceitar o caderno de encargos, vinculando-se ao seu conteúdo.
XXIII. Apesar desta factualidade, o Mm° Tribunal a quo, entende que sendo a proposta apresentada pela CI omissa quanto a três dos artigos que compunham a LPU, não podia o júri do concurso ter solicitado esclarecimentos àquela concorrente, nos termos do disposto no artigo 72° do CCP, já que a falta de junção de documentos que contenham os atributos ou termos ou condições da proposta, como é a LPU, será sempre sancionada com a sua exclusão, nos termos do constante nas alíneas b) e c) do n° 1 do artigo 57°, no n° 2 do artigo 70° e da alínea d), do n.° 2, do artigo 146° do CCP. Permitimo-nos discordar.
XXIV. Contrariamente, entende a ora Recorrente que sendo a causa de exclusão prevista na alínea d) do n.° 2 do artigo 146.° do CCP uma causa de natureza formal, só poderá haver exclusão da proposta, sem mais, quando falte em absoluto um documento nos termos da alínea c) do n.° 1 do artigo 57.° do CCP, o que não ocorreu de todo em todo no presente caso, já que a CI apresentou o documento LPU.
XXV. E, para além da CI ter apresentado o documento LPU, o certo é - como se disse - noutros documentos que instruíram a proposta compromete-se expressamente a executar os trabalhos respeitantes aos artigos em causa. Deste modo, entende-se, nada impedia que o Júri solicitasse esclarecimentos.
XXVI. Acresce que, a falta de indicação daqueles 3 únicos artigos da LPU, em formato PDF, articulada com os esclarecimentos solicitados nos termos em que o foram, não teve qualquer implicação no preço da proposta, enquanto seu atributo, já que o preço manteve-se exatamente o mesmo depois daquele esclarecimento; não prejudica a igualdade entre os concorrentes ou a possibilidade duma imparcial comparação das propostas, incluindo a da aqui Recorrida cuja proposta face à da CI, continuou a ter um valor superior de € 52.498,14, descendo para € 51.758,14, se retirarmos à proposta da Recorrida os valores por ela considerados para os artigos 10.20, 10.21 e 10.22., nem interfere na boa execução do contrato.
XXVII. Deste modo, entende-se que o Júri bem decidiu quando considerou estarmos perante a falta de uma formalidade não essencial, constituindo-se como uma mera irregularidade, podendo ser sanada e, logo, que não o impedia de solicitar os esclarecimentos nos termos em que o foram.
XXVIII. Também não se pode concordar com a posição do Mm° Tribunal a quo quando diz que com o esclarecimento prestado pela CI há alteração da proposta quanto ao atributo preço, já que o valor da proposta apresentada pela CI, antes e depois do esclarecimento, foi de € 1.897.547,39, sendo exatamente o mesmo preço, antes e depois do esclarecimento prestado.
XXIX. Por isso mesmo, a atuação da ora Recorrente não pôs em causa o princípio da estabilidade ou da imutabilidade das propostas que impõe que com a entrega da proposta o respetivo concorrente fique vinculado à mesma, não a podendo retirar ou alterar até que seja proferido o ato de adjudicação, ou até decorrer o respetivo prazo de validade, sendo que o artigo 72° do CCP prevê um desvio a este princípio, permitindo que o júri do procedimento possa pedir aos concorrentes esclarecimentos sobre as propostas apresentadas desde que os considere «necessários para efeito da análise e da avaliação das mesmas», como foi o caso.
XXX. Tratando-se duma formalidade não essencial, como é, o Júri podia e devia ter pedido esclarecimentos, nos termos do artigo 72° do CCP, sendo que, por força do seu n°2, o esclarecimento dado pela CI, ficou a fazer parte integrante da proposta e qualquer falha, a existir, ficou totalmente sanada, vinculando-se a CI, com esse esclarecimento, a executar aqueles concretos trabalhos pelo preço unitário zero.
XXXI. Ora, este entendimento sufragado pela ora Recorrente tem suporte em parte da Jurisprudência e Doutrina que tem decidido e se tem pronunciado sobre esta matéria; veja-se a título de exemplo, o decidido no douto Acórdão Uniformizador de Jurisprudência do Tribunal de Contas n.° 1/2010, publicado no Diário da República, 1a Série, n.° 332, de 16 de fevereiro de 2010, trazido à colação pelo Ex.mo Júri, posição que aqui reiteramos porque claramente aplicável à situação sub iudice ou os doutos acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 16.08.2001 (Proc. n.° 03/04), de 22.01.2004 (Proc. n °047982) e de 01.10.2015 (Proc. n.° 0856/15), facilmente acessíveis em www.dgsi.pt.
XXXII. Deste modo, o esclarecimento da CI no sentido de dizer inequivocamente que o preço daqueles três artigos era zero, não belisca os princípios da igualdade, da transparência, da imparcialidade, da estabilidade ou da imutabilidade das propostas, e permite, muito concretamente, concretizar os princípios da proporcionalidade, da justiça, da concorrência e da prossecução do interesse público.
XXXIII. Ao decidir como decidiu, o Mm° Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, quanto à solução jurídica da causa, uma vez que a omissão de um preço unitário da proposta não implica a sua exclusão, podendo ser formulado pedido de esclarecimento nos termos do artigo 72° do CCP.
XXXIV. Tendo a Decisão recorrida concluído que os três itens em falta eram exigíveis nos termos do disposto na alínea c) do n.° 1 do artigo 57.° do CCP, aplicou erradamente o disposto na alínea d) do n.° 2 do artigo 146.° do CCP. De facto, tratando-se a causa de exclusão prevista na alínea d) do n.° 2 do artigo 146.° do CCP de uma causa formal, tal significa que a não apresentação de um documento nos termos da alínea c) do n.° 1 do artigo 57.° do CCP só ocorre com a falta em absoluto do documento - o que não aconteceu no caso em análise.
XXXV. A sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de facto e de Direito, violando designadamente, os artigos 57°, 70°, 72° e o n.° 2 do artigo 146.° do CCP, bem como os Princípios da Concorrência, da Proporcionalidade e da Prossecução do Interesse Público, pelo que deverá o presente recurso ser julgado totalmente procedente com todas as consequências legais.
TERMOS EM QUE,
Confiando-se no Douto suprimento de Vossas Excelências,
- Deve ser dado provimento ao presente recurso, com todas as consequências legais, ASSIM SE FAZENDO INTEIRA J U S T I Ç A.
(…)”.
*
Quanto ao seu recurso, concluiu a Contrainteressada nos seguintes termos:
“(…)
A) Vem o presente recurso interposto da douta Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu que julgou ação totalmente procedente a presente ação de Contencioso Pré-Contratual.
B) Salvo o devido respeito, pensa-se que o Tribunal a quo, ao considerar como não provados o ponto 1 e 2 dos factos não provados, salvo o devido respeito, fez errada valoração da prova documental - o que consubstancia erro na valoração da prova, na apreciação da matéria de facto e na consequente subsunção da mesma ao direito.
C) DO ERRO VALORAÇÃO DA PROVA.
Do ponto 1 e 2 dos “factos não provados”- pag. 19 (sentença), concretamente:
1. Da proposta da Contrainteressada constam todos os artigos, mormente os preços unitários e descrição das espécies de trabalhos dos itens 10.20, 10.21 e 10.22 da Lista de Preços Unitários; e “2. Quando o ficheiro informático que continha tal lista, em formato “Excel”, foi convertido para ‘PDF”, para efeitos de submissão na plataforma eletrónica, por lapso involuntário ficaram omissos os artigos 10.20,10.21 e 10.22”
D) Ora, o Tribunal a que, ao ter concluído como concluiu na douta Sentença, salvo o devido respeito, consideramos que, não valorou como devia a prova apresentada pela Recorrente, o que poderia ter levado a uma decisão diferente da douta decisão recorrida.
E) Com efeito, a Recorrente em 05-10-2018 apresentou os documentos que instruem a sua proposta sob pasta que compactou em formato zip - através da plataforma eletrónica de contratação “ anoGov” - cfr. resulta do PA.
F) Dos documentos que integravam a pasta zipada — consta, entre outros, o documento “ 2.2 b — 1) LPU - CdB - Resposta erros e omissões” (em Excel), (cfr. doc. fls. 667 verso do PA).
G) Os documentos que integram a proposta da Recorrente, quando submetidos na plataforma eletrónica — ficam igualmente acessíveis, visíveis aos restantes concorrentes.
H) O doc. “2.2 b - 1) LPU - CdB - Resposta erros e omissões” (em Excel) - que integra a proposta da Recorrente, foi submetido na plataforma e consta do Processo Administrativo (PA)- (cfr. doc. fls. 667 vrs - onde é manifesta a referencia aos três itens 10.20,10.21,10.21.
I) É certo que a LPU apresentada em ficheiro tipo “PDF” da proposta da Recorrente, era omissa quanto aos subitens 10.20,10.21, 10.22 do item «Rede de Gases», o que apenas se ficou a dever a um erro a quando da conversão do ficheiro “Excel” para “PDF” daquele documento.
J) Porém, como já vem demonstrado os mesmos subitens constavam do doc. 2.2 b - 1) LPU - CdB - Resposta erros e omissões” (em Excel) — da proposta da Recorrente - cfr. doc. fls. 667 vrs do PA.
K) Assim, importa notar que: (i)Documento “ 2.2 b - 1) LPU - CdB - Resposta erros e omissões” (em Excel) da proposta da Recorrente - consta do PA fls. 667 vs e encontra-se junto aos autos sob o doc. 1 em sede de contestação. (ü)Documento “2.1 -Declaração - Anexo I a Contrainteressada - declarou perentoriamente “ de acordo com o art.° 57.°, do Código dos Contratos Públicos, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 18/2008, de 29 janeiro — que “ (...) declara, sob compromisso de honra, que a sua representada (2) se obriga a executar o referido contrato em conformidade com o conteúdo do mencionado caderno de encargos, relativamente ao qual declara aceitar, sem reservas, todas as suas cláusulas. (...) no ponto 2.2-Documentos que, em função do objeto do contrato a celebrar e dos aspetos da sua execução submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, contenham os atributos da proposta, de acordo com os quais o concorrente se dispõe a contratar (.....) b-1) Suporte informático Excel da lista de preços unitários. - Doc. n.° 2 “ - consta do PA de fls. 597 - tendo igualmente sido junto sob o doc. n.° 2 em sede de contestação pela ora Recorrente, (iii) A Lista de Preços Unitária (LPU) em formato PDF - consta do PA de fls. 559 vs.
L) Ora, da análise conjugada dos elementos que instruíram a proposta da Recorrente - mormente do documento “ 2.2 b-1) LPU - CdB - Resposta erros e omissões” (em Excel), era pois, possível verificar que se encontravam descritos os subitens 10.20.10,21 e 10.22 quer quanto a espécie de trabalhos quer quanto ao preço unitário atribuído a cada item. - cfr. detalhe do doc. - 2.2 b - 1) LPU - CdB - Resposta erros e omissões” (em Excel; em formato “Excel” da proposta da Recorrente.
M) Assim, ainda que se considerasse que a omissão daqueles subitens da LPU (10.20, 10.21, 10.22 da «Rede de Gases») constituía formalidade essencial, sempre a mesma se deveria degradar em formalidade não essencial, na medida em que, apesar da sua inobservância, o resultado em vista acabou por ser atingido por outra via. - Neste sentido - Rodrigo Esteves de Oliveira, in Estudos da Contratação Pública, I, pág. 110 e ainda o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 0110-2015 - Relator: Teresa de Sousa - que a propósito de uma preterição de formalidade idêntica a dos presentes autos, refere “«Nesta matéria é preciso ter presente, como já tem observado este Tribunal em várias decisões, que frequentemente é possível deduzir os valores pretendidos da própria lista de preços unitários ou de outros elementos da proposta....”
N) No caso, bastava, para tanto, atentar ao documento “ 2.2 b-1) LPU - CdB - Resposta erros e omissões” (em Excel) da proposta entregue pela FP, para confirmar que quer o preço unitário quer as espécies de trabalhos em causa - designadamente dos subitens 10.20,10.21 e 10.22 constam da referida lista em Excel -( cfr. fls. 559 vs do PA e ainda doc. n.° 1 da contestação da Recorrente).
O) Do mesmo modo, resulta do documento 2.1 -Declaração - Anexo I da Recorrente - de fls. 597 reproduzido sob o Doc. 2 da contestação da Recorrente - no ponto “2.2- Documentos que, em função do objeto do contrato a celebrar e dos aspetos da sua execução submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, contenham os atributos da proposta, de acordo com os quais o concorrente se dispõe a contratar a) Documento com a proposta nos termos do modelo de proposta constante no Anexo 3, com uma definição de aproximação de três casas decimais;
b) Lista de Preços Unitários, com uma definição de aproximação de três casas decimais, de todas as espécies de trabalho previstas no projeto de execução, elaborada de acordo com mo Mapa de Quantidades de Trabalho incluindo no Caderno de Encargos; e
b 1) Suporte informático Excel da Lista de preços unitários. (cfr. fls.597 do PA)
P) É assim evidente e como decorre do doc. 2.1 -Declaração - Anexo I a proposta da Recorrente - junto ao PA -fls. 597 e reproduzido sob o doc. n.° 2 da sua contestação -que a proposta da aqui Recorrente fazia parte, para além do mais, o referido documento “ 2.2 b - 1) LPU - CdB - Resposta erros e omissões” (em Excel) - onde constavam os subitens 10.20,10.21 e 10.22 em análise.
Q) Como resulta do disposto do n.° 1 al. b) e n.° 3 do Art. 57° do CCP - Documentos da Proposta “A proposta é constituída pelos seguintes documentos: (..,) b) Documentos que, em junção do objeto do contrato a celebrar e dos aspetos da sua execução submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, contenham os atributos da proposta, de acordo com os quais o concorrente e dispõe a contratar; (...) 3- Integram também a proposta quaisquer outros documentos que o concorrente apresente por os considerar indispensáveis para os efeitos do disposto na parte final da al. b) do n. °1.”- como é o caso do doc. 2. 2 b - 1) LPU - CdB - Resposta erros e omissões” (em Excel) da proposta entregue pela FP.
R) Assim, não obstante a omissão dos três subitens 10.20,10.21 e 10,22 do item «Redes de gases», da LPU (PDF) da proposta da Recorrente, atendendo que os mesmos se encontravam descritos no documento “ 2.2 b - 1) LPU - CdB - Resposta erros e omissões” (em Excel) que integrava igualmente a proposta da Recorrente - sendo por essa via possível - confirmar quer a espécie de trabalhos aí descritos quer o preço unitário atribuído a cada um daqueles subitens - tal omissão, jamais poderia levar a exclusão da proposta da Recorrente — como incorretamente se decidiu na douta sentença recorrida,
S) Antes, consubstanciando uma mera irregularidade ou formalidade não essencial - passível de ser sanada, suprida - mais que não fosse por força do principio do aproveitamento do ato administrativo.
T) Posto isto, em face do que já vem sendo dito, entende a aqui Recorrente, que o Tribunal a quo - fez errada valoração da Prova documental - em especial no que contende aos itens 10.20,10.21 e 10.22 da LPU da proposta da Recorrente o que consubstancia erro na valoração da prova, na apreciação da matéria de facto e na consequente subsunção da mesma ao direito.
U) Salvo o devido respeito, que é muito, o Tribunal a quo deveria ter dado como provados os factos alegados pela Recorrente em sede de contestação — concretamente os Art.°. 16° e 17° - o que, quanto a nós, incorretamente não fez.
V) Em suma, atenta a conjugação dos elementos que instruíram a proposta da Recorrente - mormente do documento “ 2.2 b — 1) LPU - CdB - Resposta erros e omissões” (em Excel), e a errada valoração da prova na apreciação da matéria de facto - entende-se que deverá ser alterada a decisão recorrida no sentido de serem dados como provados os pontos 1 e 2 dos factos não provados - pág. 19 (decisão recorrida), concretamente: “1. Da proposta da Contrainteressada constam todos os artigos, mormente os preços unitários e descrição das espécies de trabalhos dos itens 10.20, 10.21 e 10.22 da Lista de Preços Unitários;”; e “2. Quando o ficheiro informático que continha tal lista, em formato “Excel”, foi convertido para “PDF”, para efeitos de submissão na plataforma eletrónica, por lapso involuntário ficaram omissos os artigos 10.20,10.21 e 10.22”
SEM PRESCINDIR, ou conceder, sempre se dirá,
W) A douta sentença recorrida do TAF de Viseu, salvo o devido respeito, que é muito, não fez quanto nós, uma correta aplicação do regime legal do disposto nos artigos 57°, n.° 1, al. b), c) e d), Artigo 70° n.° 2 al. a), b), c) e do Art 72° n.° 2 e 3 e 146° n.° 2, al. b) do Código de Contratos Públicos e dos princípios gerais da contratação pública que lhe são aplicáveis.
X) O Tribunal a quo, no âmbito da sentença proferida, em análise - atenta a factualidade acima vertida veio a considerar o pedido esclarecimentos da JC “ ....pedido de esclarecimentos inadmissível por extravasar os limites impostos pela lei uma vez que se encontravam em falta não só os preços respeitantes a três dos artigos da LPU, como a própria referência às espécies de trabalhos respetivas, previstas no projeto de execução da empreitada. Considera, assim, que ao dirigir tal pedido de esclarecimentos e ao admitir a proposta apresentada pela CL incorreu a Ré em vício de violação de lei das peças concursais por preterição de formalidade essencial mais violando os princípios que regem a contratação pública, especificamente, dos princípios da igualdade, da imparcialidade, da estabilidade, da comparabilidade das propostas e da transparência. ” a falta de junção de documentos que contenham os atributos ou termos ou condições da proposta, como é a LPU, será sempre sancionada com a sua exclusão, nos termos do constante nas alíneas b) e c) do nº 1 do artigo 576 e n° 2 do artigo 70“ do CCP, não podendo o júri, nestes casos, dirigir pedidos de esclarecimentos à concorrente. ”
Y) Salvo o devido respeito, pensa-se que o Tribunal a quo não fez quanto nós, uma correta aplicação do regime legal, violando do disposto nos artigos 57°, n.° 1, al. b), c) e d), Artigo 70° n.° 2 al. a), b), c) e do Art 72° n.° 2 e 3 e 146° n.° 2, al. d) do Código de Contratos Públicos e dos princípios gerais da contratação publica.
Z) Resulta do n.° 1 do Art. 56° do CCP “ 7- A proposta é a declaração pela qual o concorrente manifesta à entidade adjudicante a sua vontade de contratar e o modo pelo qual se dispõem fazê-lo.”
c) Resulta ainda do disposto no n.° 1 do Art. 57° do CCP “7 -A proposta é constituída pelos seguintes documentos: a) Declaração do anexo i ao presente Código, do qual faz parte integrante; b) Documentos que, em função do objeto do contrato a celebrar e dos aspetos da sua execução submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, contenham os atributos da proposta, de acordo com os quais o concorrente se dispõe a contratar; (... 2 - No caso de se tratar de procedimento de formação de contrato de empreitada ou de concessão de obras públicas, a proposta deve ainda ser constituída por: Uma lista dos preços unitários de todas as espécies de trabalho previstas no projeto de execução; (...) 3 - Integram também a proposta quaisquer outros documentos que a concorrente apresente por os considerar indispensáveis para os do disposto na parte final da alínea b) do n. °1”
AA) Por sua vez, resulta também do disposto nos n.°s 1 e 2 do Art. 72° do CCP - Esclarecimentos e suprimento de propostas e candidaturas: “1- O Júri do procedimento pode pedir aos concorrentes quaisquer esclarecimentos sobre as propostas apresentadas que considere necessárias para efeito da análise e da avaliação das mesmas. 2- Os esclarecimentos prestados pelos respetivos concorrentes fazem parte integrante das mesmas, desde que não contrariem os elementos constantes dos documentos que as constituem, não alterem ou completem os respetivos atributos, nem visem suprir omissões que determinam a sua exclusão nos termos do disposto na alínea a) do nº. 2 do Art. 70°.
BB) Ora, in casu, o JC - solicitou esclarecimentos à aqui Recorrente ao abrigo dos poderes que lhe são conferidos nos termos do disposto no n° 1 do Art.° 72° do CCP.
CC) Como resulta do ponto M) dos factos provados que a aqui Recorrente declarou “ b) Relativamente à lista de preços unitários e no que respeita aos artigos 10.20,10,21 e 10.22 do Capitulo «Rede de Gases», a FP, S.A, declara de forma inequívoca que o valor atribuído aos referidos artigos da lista de preços unitários, para os respetivos trabalhos, será efetuado com «preço unitário zero».”
DD) Contrariamente, ao entendimento adotado na sentença recorrida, em nosso humilde entendimento, tais esclarecimentos não acrescentaram ou alteraram nada a proposta da Recorrente - pois que, atribuir aos referidos itens 10.20,10.21 e 10.22 o preço unitário de zero ou não constar qualquer valor numérico atribuído aos artigos em apreço como resulta do documentos em “PDF” da Lista de Preços Unitária - da proposta da Recorrente - FP, S.A - chegaríamos exatamente ao mesmo resultado.
EE) Do mesmo modo, não implicariam qualquer consequência ou interferência quer na analise comparativa das propostas quer na boa execução do execução do contrato por terem « preço unitário zero» - já que face a globalidade da empreitada - a expressão daquela espécie de trabalhos era insignificante.
FF) De testo, também foi esse o entendimento do Tribunal a quo quando refere na Douta sentença - pág. 30 - e se pronuncia sobre os esclarecimentos apresentados, refere como se transcreve “ Apesar de não ter o esclarecimento prestado significado um efetivo acréscimo ou decréscimo do mesmo (...)”
GG) Com efeito, conforme se estabelece no Art. 72° n.° 1, o Júri “ pode pedir aos concorrentes quaisquer esclarecimentos sobre as propostas apresentadas que considere necessários para efeitos da analise e da avaliação das mesmas.”
HH) Por outro lado, também não pode acolher o entendimento do Tribunal a quo quando refere que “... se encontrava omissa qualquer menção aos subitens 10.20,10.21, 10.22 no âmbito do item “Rede de Gases e “..que se encontravam em falta não só os preços respeitantes a três dos artigos da LPU, como a própria referência às espécies de trabalhos respetivas..”
II) Contrariamente, ao vertido na douta sentença, basta atentar documento “ 2.2 b - 1) LPU - CdB - Resposta erros e omissões” (em Excel) da proposta entregue pela FP - designadamente dos itens 10.20,10.21 e 10.22 para confirmar que as espécies de trabalhos em causa, mormente dos itens 10.20, 10.21 e 10.22 - estão aí descritas e ainda pelo documento “2,1 -Declaração - Anexo I a Contrainteressada - declarou perentoriamente — cfr. - Doc. n.° 1 junto em sede de contestação.
JJ) Por sua vez, resulta do ponto H) dos factos provados - a Contrainteressada apresentou a sua proposta com o valor global de € 1.897.547,39, mencionando, na calendarização da execução das obras, entre outros, o item “rede de gases”, entre 14 e 23 de agosto de 2019 (cf. fls. 5 e ss. do PA Pasta 21 );
KK) Do doc. 2.3-b-l Plano de trabalhos da proposta da Recorrente — resulta concretamente na linha 11 - quanto ao nome das tarefas - 10-REDE DE GASES - quanto a duração - 352 d, a data de inicio e conclusão “07/09/19 “, “23/08/20” 4CI+60 d10”
LL) Da mesma forma, resulta do doc, 2.3-b- Plano de Mão e Obra da proposta da Recorrente a descrição do item “Rede de Gases”. “10-REDE DE GASES Chefe de equipa; Técnico de redes de gases medicinais; Ajudante de redes de gases medicinais”
MM) Ainda quanto, a Memória Descritiva e Justificativa - doc. 2.3. a) resulta do ponto “ 7 - DESCRIÇÃO DA EXECUÇÃO DOS 1RABALH0S” Esta obra é essencialmente constituída pelas seguintes fases de trabalho: (...) REDE DE GASES. (cfr. 614.1 do PA)
NN) Outrossim, o referido item “ Redes de Gases” resulta ainda do doc. 2.3-b 3) - Plano de Equipamento da proposta da Recorrente - pelo que, a proposta da Recorrente fazia referência aquelas espécies de trabalhos.
OO) Assim, o Tribunal a quo concluir como concluiu na douta Sentença que o júri do concurso não podia ter solicitado esclarecimentos a Recorrente “.... a falta de junção de documentos que contenham os atributos ou termos ou condições da proposta, como é a LPU, será sempre sancionada com a sua exclusão, nos termos do constante nas alíneas b) e c) do nº. 1 do artigo 57° e n9 2 do artigo 70° do CCP, não podendo o júri, nestes casos, dirigir pedidos de esclarecimentos à concorrente.” fez quanto nós, uma incorreta aplicação do regime legal do disposto nos artigos 57°, n.° 1, al. b) e c) e d), Artigo 70° n.° 2 al. a), b), c) e do Art 72° n.° 2 e 3 e 146° n.° 2, al. d) do Código de Contratos Públicos e dos princípios gerais da contratação publica, mormente do principio da Intangibilidade, da estabilidade da proposta, da Comparabilidade das propostas e da igualdade de tratamento.
PP) Desde logo, o disposto na al. d) do n.° 2 do Art. 146° do CCP apenas culmina com a exclusão da proposta a falta em absoluto de apresentação dos documentos referidos no n.° 1 do Art 57° do CCP - o que in casu não se verificou.
QQ) Sendo manifesto que da proposta da Recorrente consta a LPU em formato PDF, (apesar de omisso quanto aos subitens pelas razões já referidas).
RR) Além disso, constam da proposta da Recorrente outros documentos que a integram onde a Recorrente se compromete expressamente a executar os trabalhos atinentes aos subitens 10,20,10.21 e 10.22 .
SS) Declaração - Anexo I da proposta da Recorrente - onde declara perentoriamente de acordo com o art.° 57.°, do Código dos Contratos Públicos, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 18/2008, de 29 janeiro - “ (. .,)sob compromisso de honra, que a sua representada (2) se obriga a executar o referido contrato em conformidade com o conteúdo do mencionado caderno de encargos, relativamente ao qual declara aceitar, sem reservas, todas as suas cláusulas. (...)
TT) Assim sendo, entendemos que a Douta sentença recorrida fez igualmente incorreta interpretação e aplicação do regime legal, no que respeita aos esclarecimentos solicitados pelo JC e ainda dos princípios gerais contratação publica que lhe estão subjacentes, devendo em consequência o presente recurso ser julgado procedente por provado e ser revogada a Decisão recorrida.
SEMPRE PRESCINDIR;
UU) Salvo o devido respeito, que é muito, entendemos que a posição adotada pelo Tribunal a quo douta sentença recorrida é contraria aos princípios que regem a contratação pública, concretamente os Princípios da Concorrência, dos Interesse Público e da Proporcionalidade.
VV) A omissão verificada quanto aos itens 10.20,10.21 e 10.22 da Lista de Preço Unitários da proposta da Recorrente - não se assume como essencial para a análise e comparabilidade das propostas - como aliás, foi entendimento do júri do concurso
WW) Desde logo, correspondem aqueles artigos, a seguinte espécies de trabalhos: - Artigo 10.20 a “ Formação e execução de telas finais, de acordo com o projeto executado e as indicações do Caderno de Encargos (3 exemplares em formato papel e 1 exemplar em formato digital (CD) - Artigo 10.21 a “ Formação o pessoal utilizador, e ao - Artigo 10.22 “Apoio de construção Civil inerentes a todos os trabalhos de rede de gás”
XX) Ou seja, estamos perante espécie de trabalhos, com baixo grau de essencialidade e que com e de pouca relevância, fraca expressão no contexto global da empreitada.
YY) Quanto á espécie de trabalhos, pela sua própria natureza e uma vez executados não são suscetíveis de consubstanciar trabalhos a mais ou a menos.
ZZ) Com efeito, nenhuma das espécies de trabalhos em causa - “inviabiliza a análise comparativa das propostas apresentadas, nem interfere na boa execução do contrato tanto mais que se trate de prestações específicas, com uma certa autonomia conceptual, material e técnica, e que nem todos respeitam a execução de um trabalho propriamente dito, mas a uma exigência que já decorre da lei - como é o caso do item “10.21 — formação do pessoal utilizador”.
AAA) Ademais, a contrainteressada, sempre estaria obrigada a realizar os respetivos trabalhos, mais que não seja ao “preço unitário zero” - conforme resulta dos esclarecimentos prestados.
BBB) Assim sendo, entende-se que a omissão em concreto dos subitens 10.20,10.21 e 10.22, do item «Rede de gases» constitui uma mera irregularidade, formalidade não essencial, passível de ser sanada, como sucedeu. Neste sentido, o Acórdão n.° 1/2014 - do Tribunal de Contas — uniformização de jurisprudência refere “ (...) um caso é a ausência de um elemento que tenha uma importância física ou financeira decisiva, estrutural ou indispensável para a boa execução dos trabalhos. Outro, é quando tal elemento não tem qualquer relevância, ou uma relevância diminuta, para a realização da empreitada (., ,)a falta de indicação, na lista de preços unitários, de um preço correspondente a um bem, ou a uma atividade, não constitui, necessariamente, a preterição de uma formalidade essencial do procedimento pré-contratual, determinante da exclusão da proposta onde ocorreu tal falta.” (sublinhado e negrito nosso).
CCC) Ainda, mesmo sentido o Acórdão n.° 21/2009, de 2 de junho, da 1ª Secção, em Plenário: «um caso é a ausência de um elemento que tenha uma importância física ou financeira decisiva, estrutural ou indispensável para a boa execução dos trabalhos. Outro, é quando tal elemento não tem qualquer relevância ou uma relevância diminuta para a realização da empreitada. No primeiro caso, estaremos perante a falta de um elemento com elevado grau de essencialidade e tal falta gera a nulidade. No segundo caso, estaremos perante a falta de um elemento com baixo grau de essencialidade e tal ‘alta não pode gerar a nulidade». E acrescenta o mesmo Acórdão que “ Acrescente-se que aceitar proposta a que falte elemento no mapa de quantidades e trabalhos considerado não essencial, promover a sua correrão e avaliá-la em conformidade, em nada belisca a observância de princípios a que se subordina a contratação pública, designadamente: a) 0 principio da igualdade dos concorrentes, desde que a todos seja dada a mesma oportunidade de correção de elementos não essenciais; b) O princípio da imparcialidade, que fica salvaguardado com a equidistância mantida pelo dono da obra relativamente a todos os concorrentes e a todos os interesses em presença; c) O princípio da comparabilidade das propostas, assegurada pelo facto de se tratar de elementos não essenciais e suscetíveis de correção ou de integração; d) O princípio da transparência, assegurada pela fixação de regras iguais para todos os concorrentes e a todos comunicadas;
DDD) Ora, in casu, é evidente que a omissão dos preços ou itens na lista de preços unitários — mormente quanto aos artigos 10.20, 10.21 e 10.22 — revelam baixo grau de essencialidade, não apenas pelos fundamentos que já vem demonstrados, mas ainda pelo seu valor diminuto/reduzido, pela diminuta expressão, quer quanto à quantidade e tipo de trabalhos a realizar,
EEE) Os artigos omissos assinalados traduzem encargos sem significado face ao valor global da empreitada, não se configurando determinantes de quebra da qualidade global da obra nem tão pouco influenciando de forma relevante os encargos respetivos, trata-se pois de um valor residual, sem valor expressivo comparado com o valor global da empreitada.
FFF) Aliás, por confronto com as demais propostas admitidas é possível constatar que o preço médio apresentado pelas demais concorrentes (incluindo a proposta da A.) para esses trabalhos foi de € 808,13, o que face ao valor total da empreitada corresponde a 0,04% i.e. indubitavelmente irrelevante tanto no plano físico como no financeiro, pelo que, também por esse motivo deverá ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida.
GGG) Por outro lado, e salvo melhor entendimento, e ainda que assim não se entenda - os itens 10.20, 10.21 e 10.22, passaram a constar claramente dos compromissos contratuais da contrainteressada — desde logo - da resposta aos esclarecimentos da aqui contra interessada que aqui se reproduz “ Relativamente à lista de preços unitários e no eu respeita aos artigos 10.20, 10.21 e 10.22, do Capítulo de “ Rede de Gases”, a FP declara de forma inequívoca atribuir aos referidos artigos da lista de preços unitários, para os respetivos trabalhos, será efetuado com “preço unitário gero” — cfr. doc n.°12 junto a PI.
HHH) A este respeito, vide ainda o Acórdão 4/2010 - do Tribunal de Contas que refere “ E, se é certo que o n.° 1 do artigo 72º do CCP estabelece uma mera faculdade não é menos certo que a devida aplicação dos princípios da concorrência, da prossecução do interesse público e da proporcionalidade, determinava que se promovesse o necessário esclarecimento, com o objetivo de não colocar em causa o referido quadro de comparabilidade por mero desconhecimento da ração que levou o concorrente a não preencher o item referido e cuja expressão quantitativa era quase nula. ”E que, bastava que do esclarecimento resultasse a possibilidade do júri avaliar o preço global da proposta que veio a ser excluída, sem que daí decorresse a introdução de qualquer alteração nos documentos apresentados e no respetivo atributo (…)”
III. Ademais, sempre se dirá que e não obstante a omissão dos itens - 10.20, 10.21 e 10.22 da Lista de Preços Unitária da contrainteressada se revelar baixo grau de essencialidade como já vem demonstrado dada o seu valor e expressão diminutos - sempre será a proposta que apresenta um valor de empreitada mais baixo das demais concorrentes.
JJJ) Ainda de notar, que a proposta da Recorrente apresenta um valor global de € 1.897.547,39 e a proposta da Recorrida ÇLA.C) é de € 1.950.045,53 - cfr. fls. 156, 300 vs e 340 e pontos J) e Q) dos factos provados) - ou seja a proposta da Recorrida apresenta uma diferença superior em € 52.498,14 do valor da proposta da Recorrente e por conseguinte tomando-se num maior encargo o que contraria desde logo o vertido nos princípios que regem a contratação pública, concretamente os Princípios da Concorrência, dos Interesse Público e da Proporcionalidade.
KKK) De resto, a irrelevância da falta deste elemento, neste concreto procedimento e no resultado financeiro obtido, é reforçada pelo facto de que mesmo adicionando o provável valor para dos itens em falta da proposta da contrainteressada esta seria sempre a proposta economicamente mais vantajosa
LLL) Nestes termos, ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento - na apreciação da matéria de facto e na consequente subsunção da mesma ao direito - violando designadamente os Art.°. 57°, 70°, 72° e n.° 2 do Art. 146° do CCP e ainda os princípios da Concorrência, dos Interesse Público e da Proporcionalidade, pelo que, deve o presente recurso ser julgado procedente por provado e em consequência ser revogada a Decisão recorrida, devendo ser corrigida pelo Tribunal ad quem, no sentido de considerar admissão da proposta da Recorrente com as demais consequências legais.
TERMOS EM QUE, com o mui douto suprimento de V. Exas, deve ser dado provimento ao presente recurso, e em consequência ser revogada a Decisão recorrida, devendo ser corrigida pelo Tribunal ad quem, no sentido de considerar admissão da proposta da Recorrente com as demais consequências legais.
ASSIM SE FAZENDO ACOSTUMADA JUSTIÇA!
(…)”
*
Notificada que foi para o efeito, a Recorrida apresentou contra-alegações quanto a ambos os recursos, que concluiu da seguinte forma:
“(…)
I - A sentença proferida em 1a Instância não merece qualquer censura, não padecendo dos vícios que lhe são apontados tanto pela ré/recorrente, como pela contra- interessada/recorrente, devendo-se manter-se na íntegra a decisão ali proferida, mantendo-se igualmente inalterada a resposta que foi dada pelo tribunal a quo a toda a matéria de facto.
II - As questões novas suscitadas pela parte apenas em sede de recurso, que não foram alegadas oportunamente, nem consideradas pelo tribunal, nos termos do artigo 608°, n.° 2 do CPC, não podem ser levadas em conta, estando vedada a sua apreciação ao tribunal de recurso.
III - A aqui autora/recorrida pronunciou-se concretamente sobre os documentos juntos autos quer pela ré/recorrente, quer pela contra-interessada (vejam-se os requerimentos atravessado nos autos pela autora/recorrida em 18.01.2019 e em 04.02.2019).
IV - Não existiram documentos cujo teor não tenha sido corretamente valorado ou apreciado criticamente pelo tribunal a quo, ao contrário do alegado pela ré/recorrente e pela contra-interessada/recorrente.
V - O dito documento em formato “Excel”, que supostamente teria sido junto à proposta da contra-interessada/recorrente, a própria ré/recorrente (como de resto não poderia deixar de ser), na ponderação e avaliação da proposta da contra-interessada/recorrente, desconsiderou a sua relevância legal, reconhecendo a verificação da omissão em causa, por não ser tal documento o conformador da LPU em formato pdf, assinado digitalmente, insuscetível de alterações posteriores, e exigível pelo programa do procedimento. E saliente-se que tal documento em formato “Excel” nem consta do PA junto aos autos pela ré/recorrente.
VI- Também a contra-interessada/recorrente, em resposta ao “pedido de esclarecimento” que lhe foi dirigido pela ré/recorrente, jamais defendeu que não se verificava a apontada omissão, por estar junto à sua proposta o dito documento em formato “Excel” ou por se acharem na sua proposta quaisquer outros documentos. Pelo contrário, a contra- interessada/recorrente admitiu o cometimento da omissão.
VII- A declaração de aceitação do conteúdo do caderno de encargos contida no documento a que se refere o artigo 57° do CCP não prevalece sobre os termos ou condições da proposta que se mostrem divergentes com aspetos da execução do contrato que estejam subtraídos à concorrência pelo caderno de encargos, devendo essa proposta, nesse caso, ser excluída nos termos previstos no artigo 70°, n° 2, alínea b) do CCP.
VIII - A contra-interessada não deu cumprimento às exigências que se encontravam vertidas no programa do procedimento e citadas supra, omitindo da lista de preços unitários quer as espécies de trabalhos (termos relativos à execução do contrato não submetidos à concorrência pelo caderno de encargos e aos quais a entidade adjudicante pretende que o concorrente se vincule) e quer os respetivos preços unitários (atributos submetidos à concorrência), previstas no projeto de execução, lista essa, que deveria ser elaborada de acordo com o mapa de quantidades de trabalhos incluído no caderno de encargos, violando quer este, quer a lei.
IX- A lista de preços unitários desempenha um papel fundamental na execução do contrato, revelando especialmente a sua importância na determinação do valor dos trabalhos complementares (artigos 370°, 371°, 373° CCP), dos trabalhos suprimidos (artigo 379° CCP), no caso de inutilização de trabalhos (artigo 380° CCP), na revisão de preços (artigo 382° CCP), nas medições e pagamentos periódicos (artigos 387° a 393° CCP), na caducidade do contrato, na extinção do contrato.
X - Devem ter-se como inadmissíveis “esclarecimentos” prestados pelos concorrentes que contrariem elementos constantes de documentos das propostas, que alterem ou completem estas nas respetivas caraterísticas/atributos ou que se destinem ou visem suprir omissões da proposta a que faltasse algum dos atributos submetidos à concorrência pelo caderno de encargos e que seriam conducentes à sua exclusão, cfr arts. 70.°, n.° s 1 e 2 e 72.°, n.° 2 ambos do CCP.
XI- O “esclarecimento” prestado pela contra-interessada/recorrente representou verdadeiramente uma alteração à sua proposta inicialmente apresentada, conforme supra melhor explicitado na motivação.
XII- Se fizermos o somatório de todos os preços unitários, para as várias espécies de trabalhos, constantes da lista de preços unitários (em formato “pdf”, a única relevante) apresentada pela contra-interessada/recorrente, considerando o preço unitário de zero para as espécies de trabalhos omitidas, temos que o valor final/o preço final será diferente do preço inicial da proposta.
XIII- O “pedido de esclarecimento” feito pela ré/recorrente à contra- interessada/recorrente serviu, ilegalmente, para suprir uma omissão essencial (e não uma mera irregularidade) da proposta da contra-interessada/recorrente.
XIV - O interesse público não pode ser alcançado a qualquer custo, violando disposições legais.
XV - A calendarização da execução das obras, o plano de trabalhos e o plano de mão de obra, referidos pela contra-interessada/recorrente, falam genericamente dos títulos/itens dos artigos referentes às espécies de trabalhos a realizar, sem as especificar ou discriminar. Recorde-se que dentro de cada título/item dos artigos existem diferentes e variadas espécies de trabalhos, e estas não vêm discriminadas naquela calendarização, naquele plano de trabalhos e naquele plano de mão de obra da proposta da contra-interessada/recorrente.
XVI- O tribunal a quo não desconsiderou qualquer meio prova legalmente relevante para a decisão que proferiu nos autos e pronunciou-se criticamente sobre todos os meios de prova que lhe foram colocados para apreciação.
XVII- O exercício do direito ao contraditório resulta diretamente da lei, não carecendo o tribunal de oficiosamente determinar a notificação das partes para se pronunciarem concretamente sobre os documentos juntos por umas e outras.
XVIII- Assim, o ato de adjudicação impugnado nos autos violou efetivamente as disposições conjugadas dos artigos 57°, n.° 1, b), c) e n.° 2, a), 70°, n.° 2, a), b) e c), 146°, n.° 2, d) e o) todos do CPP e ainda do artigo 72°, n.° 2 do CCP e, consequentemente, deve manter-se a decisão proferida pela 1ª Instância e manter-se a condenação da ré/recorrente a excluir a proposta apresentada pela contra-interessada/recorrente e a adjudicar a empreitada à proposta apresentada pela autora/recorrida, com as legais consequências.
Termos em que, deve ser mantida na íntegra a sentença proferida em 1ª instância e serem julgados improcedentes os recursos apresentados pela ré/recorrente e pela contra-interessada/recorrente.
Assim decidindo, farão V. Ex.as.
JUSTIÇA!
(…)”
*
O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso, fixando os seus efeitos e o modo de subida, que não vincula este Tribunal Superior [cfr. artigo 641º, nº. 5 do CPC].
*
O Ministério Público neste Tribunal não emitiu o parecer a que alude o nº. 1 do artigo 146º do CPTA.
*
Com dispensa de vistos prévios – artigo 36.º n.º 2 do C.P.T.A. – cumpre, pois, apreciar e decidir, já que nada a tal obsta.
*
II – DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A DECIDIR
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, de acordo com o disposto nos artigos 144.º n.º 2 e 146.º n.º 4 do C.P.T.A. e dos artigos 5.º, 608.º n.º 2, 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do novo CPC ex vi dos artigos 1.º e 140.º do CPTA.
Neste pressuposto, as questões essenciais a dirimir resumem-se a saber se (i) deve ser alterada a matéria de facto fixada, bem como (ii) determinar se a sentença recorrida, incorreu em erro de julgamento de direito, por violação do disposto nos artigos 57º, 70º, 72º e o nº. 2 do artigo 146º do CPP, bem como dos princípios da concorrência, proporcionalidade e da prossecução do interesse público.
Assim sendo, estas serão, por razões de precedência lógica, as questões a apreciar e decidir.
*
III – FUNDAMENTAÇÃO
III.1 – DE FACTO
Na decisão recorrida deram-se como provados os seguintes factos:
“(…)
A) A 16/08/2018, a Ré deliberou lançar um concurso público para empreitada, para a “Reabilitação da CdB para Unidade de Saúde Familiar” (cfr. fls. 11 e ss. do PA - Pasta 1);
B) No seguimento de tal decisão, a Ré promoveu o procedimento concursal identificado como Procedimento 7317/2018, tendo por objeto a empreitada de obras públicas de reconstrução da CdB - Unidade de Saúde Familiar, tendo como preço base o de € 1.943.640,77 e prevendo um prazo de execução de 20 meses (cfr. publicação no Diário da República, 2a Série, n° 173, de 7 de setembro de 2018; documento junto com a petição inicial sob o n° 1);
C) Em setembro de 2018, foi elaborado o Programa do Procedimento, do qual consta, designadamente, o seguinte: “1 - Identificação do Concurso. O presente procedimento visa a celebração de um contrato, para a execução da empreitada de reconstrução da CdB - Unidade de Saúde Familiar (CP-03/2018) em Viseu, com a VNSRU, S.A. nos termos do Código dos Contratos Públicos (doravante CCP), aprovado pelo Decreto-Lei n° 111-B/2017, de 31 de agosto. (...) 3 - Preço base. 3.1. Nos termos e para os efeitos do disposto no art.° 47.° do CCP, o preço base do presente procedimento é de 1.943.640,77 € (um milhão, novecentos e quarenta e três mil, seiscentos e quarenta euros e setenta e sete cêntimos) (não inclui IVA). (.) 4 - Classificação da obra por categoria. Nos termos e para os efeitos do disposto no n° 2 do art.° 1.° da Portaria n° 701-H/2008, de 29 de julho, a obra considera-se classificada na Categoria III. (.) 12 - Documentos da proposta. 12.1 - A proposta é constituída pelos seguintes documentos: 12.1.1 - Declaração emitida conforme modelo constante do ANEXO I do CCP, assinado pelo concorrente ou por representante que tenha poderes para o obrigar. 12.1.2 - Documentos que, em função do objeto do contrato a celebrar e dos aspetos da sua execução submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, contenham os atributos da proposta, de acordo com os quais o concorrente de dispõe a contratar; a) Documento com a proposta nos termos do modelo de proposta constante no ANEXO 3, com uma definição de aproximação de três casas decimais; b) Lista de preços unitários, com uma definição de aproximação de três casas decimais, de todas as espécies de trabalho previstas no projeto de execução, elaborada de acordo com o Mapa de Quantidades de Trabalho incluindo no Caderno de Encargos; 12.1.3 - Documentos que, em função do objeto do contrato a celebrar e dos aspetos da sua execução, não são submetidos à concorrência pelo Caderno de Encargos e de acordo com os quais o concorrente se dispõe a contratar: a) Memória justificativa e descritiva do modo de execução da obra; b) Programação dos trabalhos (incluindo plano de trabalho, plano de mão-de-obra e plano de equipamento), identificando o caminho crítico e que integre a totalidade das atividades da Lista de Preços Unitários, indicando a sua duração e a respetiva relação de precedência, atendendo aos recursos afetos, que identifique a carga de pessoal por tipo de profissão afeta a todas as atividades e que identifique a carga de equipamento por tipo de equipamento e a sua afetação para todas as atividades; (...) 17 - Critério de adjudicação das propostas. 17.1 - O critério no qual se baseia a adjudicação é o da proposta economicamente mais vantajosa. 17.2 - A adjudicação é feita à proposta economicamente mais vantajosa para a entidade adjudicante determinada pela modalidade prevista na alínea b) do n.° 1 do art.° 74 do CCP: - Avaliação do preço enquanto único aspeto da execução do contrato a celebrar. 17.3 - Critério de desempate - No caso de a proposta economicamente mais vantajosa para a entidade adjudicante nos termos da alínea b) do n.° 1 do art.° 74 do CCP, constar de mais do que uma proposta, deve ser adjudicada: Em 1.° lugar - a proposta que considere o preço mais baixo no capítulo 12 correspondente ao Estaleiro e Diversos. Em 2.° lugar - a proposta que considere o preço mais baixo para o somatório dos artigos de espécie mais relevante, correspondentes à sub-categoria da categoria de classe que cubra o valor da proposta, designadamente: Trabalhos de conservação e Restauro: Artigos 1.1.1, 1.1.1.1.1, 1.1.1.1.2, 1.1.1.1.3, 1.1.1.1.4, 1.1.1.1.5, 1.1.1.1.6, 1.1.1.1.7, 1.1.2.1, 1.1.2.2, 1.1.2.3, 1.1.3.1, 1.1.3.2, 1.1.4.1. 17.4. Prazo de execução de 20 meses, contados nos termos do disposto no n.° 1 do artigo 362o do CCP. (...) Anexo 3 Modelo de proposta de preço. F.... (firma e sede), titular de Alvará emitido pelo Instituto dos Mercados Públicos do Imobiliário e da Construção (IMPIC) (ou, se for o caso, do certificado de inscrição na Lista Oficial de Empreiteiros Aprovados do Estado) . (indicar o número), contendo as autorizações . (indicar natureza e classe), depois de ter tomado conhecimento do objeto da «Empreitada de reconstrução da CdB - Unidade de Saúde Familiar (CP-03/2018)» a que se refere o anúncio datado de . (data do anúncio Diário da República), obriga-se a executar a referida empreitada, de harmonia com o caderno de encargos, pela quantia de . (por extenso e por algarismos, em euros), que não inclui o imposto sobre o valor acrescentado, conforme a lista de preços unitários apensa a esta proposta e que dela faz parte integrante. À quantia supra mencionada acrescerá o imposto sobre o valor acrescentado à taxa legal em vigor. Declara concluir a referida empreitada no prazo global de . dias, contados nos termos do disposto no nº. 1 do artigo 362° do Código dos Contratos Públicos, aprovado pelo Decreto-Lei n° 111-B/2017 de 31 de agosto. Mais se declara que renuncia a foro especial e se submete em tudo o que respeita à execução do seu contrato, ao que se achar prescrito na legislação portuguesa em vigor. (...)” (cfr. fls. 11 e ss. do PA - Pasta 3, e documento junto com a petição inicial sob o n° 7);
D) Na mesma data, foi elaborado o Caderno de Encargos, do qual consta, designadamente, o seguinte: “1 - Disposições Gerais. 1.1 - Disposições e cláusulas por que se rege a empreitada. 1.1.1 Na execução dos trabalhos e fornecimentos abrangidos pela empreitada e na prestação dos serviços que nela se incluem observar-se-ão: a) As cláusulas do contrato e o estabelecido em todos os documentos que dele fazem parte integrante; b) A restante legislação aplicável, nomeadamente a que respeita a construção, ambiente, à revisão de preços, às instalações do pessoal, à segurança social, ao desemprego, à higiene, segurança, prevenção e medicina no trabalho e à responsabilidade civil perante terceiros; c) Às regras da arte. 1.1.2 Para efeitos do disposto na alínea a) do número anterior, consideram-se integrados no contrato, sem prejuízo do disposto no n° 4 do artigo 96° do CCP: a) O clausulado contratual, incluindo os ajustamentos propostos de acordo com o disposto no artigo 99° do Código dos Contratos Públicos e aceites pelo adjudicatário nos termos do disposto no artigo 101º desse mesmo código (...); b) Os suprimentos dos erros e omissões do caderno de encargos identificados pelos concorrentes, desde que tais erros e omissões tenham sido expressamente aceites pelo órgão competente para a decisão de contratar, nos termos do disposto no artigo 50° do CCP; c) Os esclarecimentos e as retificações ao caderno de encargos; d) O caderno de encargos integrado pelo programa e pelo projeto de execução; e) A proposta adjudicada; f) Os esclarecimentos sobre a proposta adjudicada prestados pelo empreiteiro; g) Todos os outros documentos que sejam referidos no clausulado contratual ou no caderno de encargos. 1.2 - Regulamentos e outros documentos normativos. 1.2.1 Para além dos regulamentos e dos documentos normativos referidos neste caderno de encargos, fica o empreiteiro obrigado ao pontual cumprimento de todos os demais que se encontrem em vigor e que se relacionem com os trabalhos a realizar. 1.2.2 Devem ser respeitadas as especificações técnicas relativas à execução da presente empreitada que se encontram prescritas nos elementos do Projeto incluído no presente procedimento concursal. 1.2.3 O empreiteiro obriga-se a respeitar, no que seja aplicável aos trabalhos a realizar e não esteja em oposição com os documentos do contrato, as especificações técnicas constantes no presente concurso. 1.2.4 Todos os documentos fornecidos pelo empreiteiro no âmbito desta empreitada, bem como quaisquer legendas ou anotações, deverão ser redigidas em português. (...). 2 - Objeto e regime da empreitada (...) 2.2 - Modo de retribuição do empreiteiro. 2.2.1 O regime da empreitada, quanto ao modo de retribuição do empreiteiro, é o seguinte: As importâncias a receber pelo empreiteiro serão as que resultarem da aplicação dos preços unitários estabelecidos no contrato por cada espécie de trabalho a realizar às quantidades desses trabalhos realmente executas. (...) (cfr. fls. 1669 e ss. dos autos e documento junto com a petição inicial sob o n° 8);
E) Em anexo ao caderno de encargos, foi aprovada a designada lista de preços unitários para a empreitada identificada, lista esta que usa diversas unidades de medida, quais sejam, mililitros, metros quadrados ou a designação “vg”, para indicar “valor de grandeza” (cfr. idem);
F) Da referida lista, constam, designadamente, os seguintes itens:
Linha
Item
SAP
Item
LPU
Descrição ArtigoUn.QuantidadePreçoTotal
1432001010Rede de gases
(...)(...)(...)(...)(...)(...)(...)(...)
1452001010.19Ensaios e afinações da instalaçãovg1,00
1453001010.20Fornecimento e execução de telas finais, de acordo com o Projeto executado e as indicações do Caderno de Encargos (3 exemplares em formato papel e 1 exemplar em formato digital (CD))vg1,00
1454001010.21Formação do pessoal utilizadorvg1,00
1455001010.22Apoio de construção civil inerente a todos os trabalhos da rede de gásvg1,00
(cfr. idem);
G) A 27/09/2018, em virtude do pedido de esclarecimentos e apresentação de lista de erros e omissões pela empresa “HTC, S.A.”, foi o preço base do contrato aumentado para € 2.005.732,893 e inseridas e aceites algumas alterações à lista de preços unitários, que aqui se dão por integralmente reproduzidas (cfr. fls. 5 e ss. do PA Pasta 5);
H) A Contrainteressada apresentou a sua proposta com o valor global de € 1.897.547,39, mencionando, na calendarização da execução das obras, entre outros, o item “rede de gases”, entre 14 e 23 de agosto de 2019 (cfr. fls. 5 e ss. do PA Pasta 21);
I) A Contrainteressada juntou, na sua proposta, a Lista de Preços Unitários, na qual se encontrava omissa qualquer menção aos sub-itens 10.20, 10.21 e 10.22, no âmbito do item “Rede de Gases” (cfr. fls. 1 e ss. do PA Pasta 24);
J) A Autora apresentou a sua proposta com o valor global de € 1.950.045,53 (cfr. PA Pasta 20);
K) Na lista de preços unitários apresentada pela Autora, os artigos 10.20, 10.21 e 10.22 correspondiam, respetivamente, aos seguintes montantes: € 51,000; € 153,000 e € 510,000 (cfr. idem);
L) A 18/10/2018, o júri do concurso apresentou o seguinte pedido de esclarecimentos: “(...) 2. Concorrente no 9: FP, S.A.. a) Em análise aos documentos que constituem a proposta, verificou o júri do procedimento, que não há documento que relacione o assinante (...) com a função e os poderes de assinatura. Assim, entendeu o júri do procedimento, ao abrigo do n° 1 do artigo 72° do CCP (...), solicitar esclarecimentos e junção dos documentos em conformidade com o exigido, no prazo de 3 dias. b) Na Lista de Preços Unitários entregue, verifica-se a omissão dos Artigos 10.20, 10.21 e 10.22 do Capítulo “Rede de Gases”. Desta forma, o Júri do procedimento solicita que o concorrente declare de forma inequívoca, que o valor a atribuir aos referidos artigos da LPU para os respetivos trabalhos, será efetuado com “preço unitário zero”. O prazo concedido para resposta é de dias.” (cfr. fls. 11 e ss. do PA Pasta 25);
M) A 22/10/2018, a Contrainteressada prestou esclarecimentos ao júri do concurso, dos quais constam, designadamente, o seguinte: “(...) b) Relativamente à lista de preços unitários e no que respeita aos artigos 10.20, 10.21 e 10.22, do Capítulo «Rede de Gases», a FP, SA declara de forma inequívoca que o valor a atribuir aos referidos artigos da lista de preços unitários, para os respetivos trabalhos, será efetuado com «preço unitário zero».” (cfr. idem);
N) A 24/10/2018, o júri do concurso proferiu o relatório preliminar, do qual consta, designadamente, o seguinte: “(...) 2 - Identificação dos Concorrentes e das Propostas: Responderam ao concurso nove concorrentes, que aqui se apresentam com os valores das respetivas propostas: (...) 8. IAC, Lda. € 1.950.045,53; 9. FP, SA. € 1.897.547,39. (...) 4 - Esclarecimentos. Foram solicitados esclarecimentos aos concorrentes n° 7 (EB- Engenharia e Construção SA) e n° 9 (FP SA) nos termos do disposto no artigo 72° do DL 18/2008 de 29/01, na sua atual redação. Analisadas as respostas dos concorrentes, o Júri do Concurso decidiu admitir ambas as propostas. 5 - Apreciação das propostas. Na avaliação das propostas, o Júri do Concurso procedeu à sua ordenação para efeitos de adjudicação, de acordo com o critério de adjudicação definido no ponto 17 do Programa de Concurso, designadamente o da proposta economicamente mais vantajosa, determinada pela modalidade prevista na alínea b) do n.° 1 do art.° 74 do CCP - Avaliação do preço enquanto único aspeto da execução do contrato a celebrar. 6 - Conclusões. Tendo em consideração a apreciação das propostas tal como descritas no presente Relatório, o Júri do Concurso propõe a seguinte ordenação: (...) FP SA 1.897.547, 39€. 1o. ICC, Lda. 1.950.045,53€. 2°. (...)” (cfr. PA Pasta 25 e documento junto com a petição inicial sob o n° 3);
O) A 31/10/2018, a Autora exerceu o seu direito de pronúncia, que aqui se dá por integralmente reproduzida, pugnando, a final, pela exclusão da proposta apresentada pela Contrainteressada (cfr. Pasta 26 do PA);
P) A 08/11/2018, o júri do concurso proferiu o relatório final, do qual consta, designadamente, o seguinte: “(.) 5 - Reclamação. Após a notificação aos concorrentes do Relatório Preliminar e findo o prazo de 5 dias para se proceder à audiência prévia dos mesmos, o concorrente n° 8 - “IAC, Lda.” apresentou uma reclamação (.), contestando a decisão do Júri em não excluir o concorrente “FP SA”. 6 - Análise da Reclamação. Relativamente ao teor da pronúncia apresentada pelo concorrente n° 8, o Júri deliberou por unanimidade firmar, que de acordo com o disposto no artigo 72o do CCP, o Júri do procedimento pode pedir aos concorrentes quaisquer esclarecimentos sobre as propostas apresentadas que considere necessários para efeito da análise e da avaliação das mesmas. Os esclarecimentos prestados pelos concorrentes fazem parte integrante das propostas, desde que não contrariem os elementos constantes dos documentos que as constituem, não alterem ou completem os respetivos atributos, nem visem suprir omissões que determinam a sua exclusão nos termos do disposto na alínea a) do no 2 do art. 70o do CCP. Verificando-se efetivamente a omissão dos artigos 10.20 (Fornecimento e execução de Telas Finais), 10.21 (Formação de Pessoal Utilizador) e 10.22 (Apoio de construção civil) do Capítulo de «Rede de Gases» da proposta do concorrente no 9, o mesmo, em sede de esclarecimentos, declarou «de forma inequívoca que o valor a atribuir aos referidos artigos da lista de preços unitários para os respetivos trabalhos, será efetuado com ”preço unitário zero». Ora, em matéria da omissão de preços unitários nas propostas no âmbito de procedimentos adotados para a formação de contratos públicos vem sendo objeto de amplo tratamento, designadamente jurisprudencial. Refira-se nomeadamente o expresso no Tribunal de Contas no 1/2010: «(...) numa proposta em que se verifique que, na lista de preços unitários, falta um preço ou um item do mapa de quantidades, que não inviabiliza a análise comparativa das propostas apresentadas, nem interfere na boa execução do contrato, tal omissão não pode ter a virtualidade de revestir a natureza de elemento essencial. Do mesmo modo, a correção da proposta, para supressão dessa falta, constitui circunstância que não ofende os princípios a que deve subordinar-se a contratação pública». Embora o referido Acórdão tenha sido proferido no quadro vigente do regime das empreitadas de obras públicas aprovado pelo Decreto-Lei no 59/99, de 2 de março, este, no essencial, não era substancialmente diferente do regime do Código dos Contratos Públicos, atualmente vigente. No mesmo sentido se pronunciou a Secção Regional dos Açores do Tribunal de Contas, no âmbito do processo n° 04/2010 (Decisão n° 4/2010 - SRTCA): «(...) E, se é certo que o n° 1 do artigo 72º do CCP estabelece uma mera faculdade não é menos certo que a devida aplicação dos princípios da concorrência, da prossecução do interesse público e da proporcionalidade, determinava que se promovesse o necessário esclarecimento, com o objetivo de não colocar em causa o referido quadro de comparabilidade por mero desconhecimento da razão que levou o concorrente a não preencher o item referido e cuja expressão quantitativa era quase nula.» Face ao exposto, tendo em consideração os princípios subjacentes à contratação pública, designadamente, os da livre concorrência e da defesa do interesse público, o Júri do procedimento analisou detalhadamente a situação em apreço, tendo considerado o seguinte: a) A omissão dos artigos em causa, face à globalidade dos tratamentos que constituem a presente empreitada poderá ser considerada como a falta de um elemento não essencial, constituindo-se como uma mera irregularidade, podendo ser sanada. A aferição dessa “essencialidade” subjaz à natureza e valor das atividades omitidas. b) A omissão em causa não afeta a essência da proposta, tendo em consideração que atenta a diferença de valores entre as propostas, não permite por parte do concorrente e mesmo conhecendo este o valor da proposta dos demais concorrentes, manipular o resultado do concurso. Neste sentido, o Júri considerou ser possível corrigir a proposta suprimindo-se a referida omissão, sem, contudo, pôr em causa os anteriormente referidos princípios da contratação pública, com a declaração inequívoca de atribuir aos 3 artigos em causa o «preço unitário zero», do que resultou a admissão do concorrente no presente procedimento. Pelas questões de facto e de direito supra referidas, e contrariamente ao que defende o concorrente no 8, a omissão de 3 artigos da lista de preços unitários, não conduz à preterição de uma formalidade essencial, concorrencialmente irrelevante do procedimento concursal, não violando os princípios da igualdade, imparcialidade, estabilidade, transparência e da concorrência. Termos em que se justifica, a proposta cumprir com os requisitos legais de admissão, pelo que improcedem as conclusões da alegação constantes da reclamação apresentada pelo recorrente. Conclusão: Face ao exposto anteriormente, entende o Júri do Concurso manter a proposta de exclusões e a ordenação das propostas admitidas constantes do Relatório Preliminar, designadamente: (...). Face ao exposto, a proposta apresentada pelo concorrente no 9 - FP SA, no valor de 1.897.547,39€ (IVA não incluído), satisfaz os requisitos do Caderno de Encargos, sendo a proposta economicamente mais vantajosa para a Entidade Adjudicante.” (cfr. PA Pasta 27 e documento junto com a petição inicial sob o n° 4);
Q) A 09/11/2018, a Ré deliberou adjudicar o contrato de empreitada designado “Reconstrução da CdB” à Contrainteressada, pelo valor de € 1.897.547,39 (cfr. PA Pasta 28 e documento junto com a petição inicial sob o n° 5);
R) A petição inicial foi apresentada neste Tribunal a 12/12/2018 (cfr. fls. 1 e seguintes dos autos).
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Factos não provados:
Com pertinência para a apreciação da presente lide, foi dada como não provada a seguinte factualidade:
1. Da proposta da Contrainteressada constam todos os artigos, mormente os preços unitários e descrição das espécies de trabalhos dos itens 10.20, 10.21 e 10.22 da Lista de Preços Unitários;
2. Quando o ficheiro informático que continha tal lista, em formato “Excel”, foi convertido para o formato “PDF”, para efeitos de submissão na plataforma eletrônica, por lapso involuntário ficaram omissos os artigos 10.20, 10.21 e 10.22.
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Motivação da decisão sobre a matéria de facto:
Ao declarar quais os factos que considera provados, o juiz deve proceder a uma análise crítica das provas, especificar os fundamentos que foram decisivos para radicar a sua convicção e indicar as ilações inferidas dos factos instrumentais.
A convicção do Tribunal sobre a matéria de facto provada baseou-se na prova documental oferecida pelas partes, conforme foi sendo sucessivamente identificado.
Já quanto à matéria de facto dada como não provada, não logrou o Tribunal formar convicção quanto à sua veracidade, levando em consideração a prova documental junta aos autos, bem como o teor do PA junto.
(…)”.
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III.2 - DO DIREITO
Assente a factualidade que antecede, cumpre, agora, apreciar as questões suscitadas no recurso jurisdicionais em análise.
I- Da impugnação da matéria de facto
A primeira questão decidenda consubstancia-se em saber se deve ser alterada a decisão sobre a matéria de facto nos pontos indicados pelos Recorrentes.
Como se decidiu no aresto deste Tribunal Central Administrativo Norte editado em 11.02.2011, no Procº. n.º 00218/08BEBRG:“1. O Tribunal de recurso só deve modificar a matéria de facto quando a convicção do julgador, em 1.ª instância, não seja razoável, isto é, quando seja manifesta a desconformidade dos factos assentes com os meios de prova disponibilizados nos autos, dando-se assim a devida relevância aos princípios da oralidade, da imediação e da livre apreciação da prova e à garantia do duplo grau de jurisdição sobre o julgamento da matéria de facto. 2. Assim, se, na concreta fundamentação das respostas aos quesitos, o Sr. Juiz (...) justificou individualmente as respostas dadas, fazendo mesmo referência, quer a pontos concretos e decisivos dos diversos depoimentos, quer a comportamentos específicos das testemunhas, aquando da respetiva inquirição, que justificam a opção por uns em detrimentos de outros, assim justificando plena e convincentemente a formação da sua convicção, não pode o Tribunal de recurso alterar as respostas dadas”.
Posição que se desenvolveu no acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte de 12.10.2011, no Procº. n.º 01559/05BEPRT, que: “(…) pese embora a maior amplitude conferida pela reforma de processo civil a um segundo grau de jurisdição em sede de matéria de facto a verdade é que, todavia, não se está perante um segundo julgamento de facto (tribunal “ad quem” aprecia apenas os aspetos sob controvérsia) e nem o tribunal de recurso naquele julgamento está colocado perante circunstâncias inteiramente idênticas àquelas em que esteve o tribunal “a quo” apesar do registo da prova por escrito ou através de gravação magnética dos depoimentos oralmente prestados. XX. É que, como aludimos supra, o tribunal “ad quem” não vai à procura duma nova convicção, não lhe sendo pedido que formule novo juízo fáctico e sua respetiva fundamentação. O que se visa determinar ou saber é se a motivação expressa pelo tribunal “a quo” encontra suporte razoável naquilo que resulta do ou dos depoimento(s) testemunhal(ais) (registados a escrito ou através de gravação) em conjugação com os demais elementos probatórios existentes ou produzidos nos autos. XXI. Tal como tem sido jurisprudencialmente aceite, a garantia do duplo grau de jurisdição não subverte o princípio da livre apreciação das provas (cfr. art. 655.º, n.º 1 do CPC) já que o juiz aprecia livremente as provas e decide segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto, sendo que na formação dessa convicção não intervêm apenas fatores racionalmente demonstráveis, já que podem entrar também elementos que em caso algum podem ser importados para o registo escrito, para a gravação vídeo ou áudio. XXII. Será, portanto, um problema de aferição da razoabilidade, à luz das regras da ciência, da lógica e da experiência da convicção probatória do julgador no tribunal “a quo”, aquele que, no essencial, se coloca em sede de sindicabilidade ou fiscalização do julgamento de facto pelo tribunal “ad quem”. Daí que na reapreciação da matéria de facto ao tribunal de recurso apenas cabe um papel residual, limitado ao controle e eventual censura dos casos mais flagrantes, como sejam aqueles em que o teor de algum ou alguns dos depoimentos prestados no tribunal “a quo” lhe foram indevidamente indiferentes, ou, de outro modo, eram de todo em todo inidóneos ou ineficientes para suportar a decisão a que se chegou”.
E se manteve no acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte de 13.09.2013, no processo nº 00802/07.7 BEVIS:” (…) “Determina o artigo 712º do Código de Processo Civil, sob a epígrafe “Modificabilidade da decisão de facto”, no seu nº 1, aplicável por força do disposto no artigo 140º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, que:
«A decisão do tribunal de 1ª instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação:
a) Se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do artigo 685º B, a decisão com base neles proferida;
b) Se os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insuscetível de ser destruída por quaisquer outras provas;
(…)
Na interpretação deste preceito tem sido pacífico o entendimento segundo o qual em sede de recurso jurisdicional o tribunal de recurso, em princípio, só deve alterar a matéria de facto em que assenta a decisão recorrida se, após ter sido reapreciada, for evidente que ela, em termos de razoabilidade, foi mal julgada na instância recorrida (neste sentido os acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, de 19.10.05, processo nº 394/05, de 19.11.2008, processo nº 601/07, de 02.06.2010, processo nº 0161/10 e de 21.09.2010, processo nº 01010/09; e acórdãos do Tribunal Central Administrativo Norte, de 06.05.2010, processo nº 00205/07.3BEPNF, e de 14.09.2012, processo nº 00849/05.8BEVIS).
Isto porque o Tribunal de recurso está privado da oralidade e da imediação que determinaram a decisão de primeira instância: a gravação da prova, por sua natureza, não fornece todos os elementos que foram diretamente percecionados por quem julgou em primeira instância e que ajuda na formação da convicção sobre a credibilidade do testemunho (…)”.
(…)
Em sentido idêntico se pronunciaram os acórdãos do Tribunal Central Administrativo Norte:
- Proc. nº 00168/07.5BEPNF, de 24/02/2012:
“1- O tribunal de recurso só deve modificar a matéria de facto quando a convicção do julgador, em 1ª instância, não seja razoável, isto é, quando seja manifesta a desconformidade dos factos assentes com os meios de prova disponibilizados nos autos, dando-se assim a devida relevância aos princípios da oralidade, da imediação e da livre apreciação da prova e à garantia do duplo grau de jurisdição sobre o julgamento da matéria de facto.”
- E proc. nº 00906/05.0BEPRT, de 07/03/2013:
“2. O tribunal de recurso apenas e só deve alterar a decisão sobre a matéria de facto em casos excecionais de manifesto erro na apreciação da prova, de flagrante desconformidade entre os elementos probatórios disponíveis e essa mesma decisão.”
(…)”.
Acompanhando e acolhendo a interpretação assim declarada por este Tribunal Superior, importa, então, analisar a situação sob apreciação aferindo do acerto da matéria de facto sob impugnação.
Efetivamente, vieram os Recorrentes pugnar pela alteração da decisão sobre a matéria de facto, por entenderem que o Tribunal a quo teria feito uma errada interpretação e valoração da prova produzida, pois que da análise e da conjugação dos documentos denominados “2.2.b—1) LPU – CdB _ resposta a erros e omissões” (em excel) da proposta apresentada pela CI; “Anexo I – Declaração de acordo com o artigo 57º do Código dos Contratos Públicos, aprovado pelo Decreto-Lei nº. 18/2008, de 29 de janeiro”, junto como documento nº.2 pela CI em sede de contestação e que instruiu a proposta da CI; e “Lista de preços unitários em formato PDF”, que instruiu a proposta da CI, permitira que se dessem como demonstrados os seguintes factos:
(i) Da proposta da Contrainteressada constam todos os artigos, mormente os preços unitários e descrição das espécies de trabalhos dos itens 10.20,10.21 e 10.22 da Lista de Preços Unitários;
(ii) Quando o ficheiro informático que continha tal lista, em formato "Excel", foi convertido para o formato "PDF", para efeitos de submissão na plataforma eletrónica por lapso involuntário ficaram omissos os artigos 10.20, 10.21 e 10.22.
Não obstante as doutas alegações, falece-lhes, porém, razão.
Importa que se comece por sublinhar a aferição jurisdicional da conformidade [ou não] do procedimento concursal visado nos autos com o respetivo bloco legal aplicável apresenta como “ponto de partida e de saída” distintivo os elementos documentais apresentados pelos concorrentes, aqui integrando-se o teor integral das suas propostas, e validamente admitidas, para além de todo o registo documental da cadeia de atos procedimentais produzidos no concurso visado, tudo que melhor se encontra expressado no processo administrativo junto aos autos [doravante PA].
Nem podia deixar de ser assim, considerando os princípios gerais de imutabilidade de propostas, da transparência e da concorrência que regem a atividade concursal versada nos autos.
Isto para dizer que, não se impetrando ao P.A. qualquer insuficiência e/ou irregularidade material, o que ali não se mostrar validamente registado e documentado, naturalmente, e, como não podia deixar de ser, não se poderá considerar demonstrado como tendo ocorrido no procedimento concursal em questão.
Cientes destes considerandos de enquadramento, e volvendo ao caso concreto, cabe notar que, examinando o dito P.A., não se descortina em momento algum a submissão e registo do documento “2.2.b -1) LPU – CdB _ resposta a erros e omissões” [em excel] da proposta apresentada pela CI, do qual as Recorrentes extraem o erro de julgamento da matéria de facto apontado nos autos.
Quer isto tanto significar que, tal como supra expendeu, que não se pode ter como demonstrado que tal documento tenha, efetivamente, integrado a proposta da aqui Contrainteressada aquando da sua submissão e validação no concurso visado nos autos.
O que, aliás, faz todo o sentido, considerando o subsequente pedido de esclarecimento dirigido pelo júri do concurso à contra-interessada FP, devidamente espelhado a fls. 600 e seguintes do P.A., reconhecendo a especificada omissão de três rubricas na lista de preços unitários, que motivou a resposta desta que faz fls. 602 do PA, devidamente traduzida na assunção do valor a atribuir aos referidos artigos da lista de preço unitários como sendo de zero, e nunca, como agora se defende, no sentido da ausência da verificada omissão, pelo facto da existência de um ficheiro excel conjuntamente com a proposta que integrava as rubricas da lista de preços unitários em falta.
O que serve para concluir que a deficiência apontada à lista de preços unitários apresentada pela contra-interessada FP reconhecidamente existiu, situação que tem um verdadeiro efeito de implosão em relação à tese dos Recorrentes no tocante à existência de erro de julgamento da matéria de facto.
Refira-se que não é aceitável a alegação formulada pela Ré no ponto I das suas alegações de recurso no sentido da aceitação da prévia integração de tal documentação no âmbito da proposta da contrainteressada, o que não se verificou anteriormente por razões de logística procedimental, por se tratar de questão não dirimida na sentença recorrida, e, qua tale, excluído da “objeto confesso” do presente recurso.
Efetivamente, sendo a referida invocação uma “questão nova”, apenas tratada em sede de Recurso, não tendo sido invocada nem tratada anteriormente, nunca a mesma teria a virtualidade de se mostrar procedente.
Como se sumariou, entre muitos outros, no Acórdão deste T.C.A.N nº 613/17.1BEBRG, de 04.10.2017 “A decisão proferida em 1ª instância não pode ser revista em recurso jurisdicional com fundamento em questão nova. Os recursos jurisdicionais destinam-se a rever as decisões proferidas pelo tribunal recorrido, não a decidir questões novas. Com efeito, os recursos são meios para obter o reexame das questões já submetidas à apreciação dos tribunais inferiores, e não para criar decisões sobre matéria nova, não submetida ao exame do tribunal de que se recorre. Assim, não pode em sede de recurso conhecer-se de questão nova, que não tenha sido objeto da sentença pois os recursos jurisdicionais destinam-se a reapreciar as decisões proferidas pelos tribunais inferiores e não a decidir questões novas, não colocadas a esses tribunais, ficando, assim, vedado ao Tribunal de recurso conhecer de questões que podiam e deviam ter sido suscitadas antes e o não foram”
No mesmo sentido, vejam-se os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 27.06.2012, recurso 218/12, de 25.01.2012, recurso 12/12, de 23.02.2012, recurso 1153/11, de 11.05.2011, recurso 4/11, de 1.07.2009, recurso 590/09, 04.12.2008, rec. 840/08, de 30.10.08, rec. 112/07, de 2.06.2004, recurso 47978 (Pleno), de 2911.1995, recurso 19369 e do Supremo Tribunal de Justiça, recurso 259/06.0TBMAC.E1.S1.
Mais se refira que não é admissível ancorar-se a prova dos factos supra descritos com base em documentos comprovadamente juntos em sede contenciosa [contestação], pois, para além de não existir qualquer registo da sua submissão no P.A. dos autos, os mesmos foram expressamente impugnados pela Recorrida, desembocando em matéria controvertida, cujo ónus de prova impedia sobre os Recorrentes, e que não lograram demonstrar.
Derradeiramente, saliente-se ainda que o que se vem de expor em nada é contraditado pela existência do “Anexo I - Declaração de acordo com o artigo 57º do Código dos Contratos Públicos, aprovado pelo Decreto-Lei nº. 18/2008, de 29 de janeiro, junto como documento nº.2 pela CI em sede de contestação e que instruiu a proposta da CI”, pois esta declaração, até por ser de caráter generalista, não se sobrepõe aos específicos termos ou condições da proposta relativos à execução do contrato espelhados nos vários itens específicos da proposta apresentada, sendo de referir a circunstância da alegação dos Recorrentes nada aportar de relevante sentido das peças concursais corroborarem a matéria em questão, o que também contribuiu para a posição ora assumida pelo Tribunal no que diz respeita a esta matéria.
O que serve para concluir que a valoração da prova feita pelo Tribunal a quo apresenta-se racional, resultando das regras comuns da lógica, considerando que a azeitona é o fruto da oliveira.
De tudo o quanto vem de se expor deriva, naturalmente, que não se antolha a existência de qualquer elemento substancial que permita concluir que existe algo de grave e ostensivamente errado ou desacertado que permita alterar a matéria de facto, tanto mais que o senhor Juiz a quo especificou os meios de prova que serviram de suporte à concreta decisão da matéria de facto e fundamentou adequadamente, essa decisão, não se vislumbrando quaisquer erros ou contradições na motivação da dita resposta à Base Instrutória.
Nestes termos, improcede o invocado erro de julgamento da matéria de facto.
II- Do imputado erro de julgamento de direito
Cumpre, agora, apreciar se o Tribunal a quo, ao julgar totalmente procedente a presente ação, e, consequentemente, anular a deliberação impugnada [e todos os atos subsequentes], e condenar a Ré a aprovar novo Relatório Final, que exclua a proposta apresentada pela Contrainteressada, gradue a proposta apresentada pela Autora em primeiro lugar e que lhe adjudique a supra identificada empreitada, incorreu em erro de julgamento de direito, por violação do disposto nos artigos 57º, 70º, 72º e o nº. 2 do artigo 146º do CPP, bem como dos princípios da concorrência, proporcionalidade e da prossecução do interesse público.
Vejamos, sublinhando, desde já, que os presentes recursos jurisdicionais, com o alcance e fundamentação supra explicitados, serão objeto de análise conjunta, por serem indissociáveis em relação à matéria neles versada na decisão recorrida.
Para facilidade de análise, convoquemos, no que ao direito concerne, o que discorreu na 1ª instância:
“(…)
Pretende a Autora, com a presente ação, que seja anulada a decisão de adjudicação do contrato aqui em análise à Contrainteressada e ainda que seja a Ré condenada a proferir nova decisão de apreciação da proposta, determinando a exclusão da proposta apresentada pela Contrainteressada e, em consequência, à adjudicação do contrato à Autora.
Em sede de contestação, defende-se a Ré por impugnação.
O cerne do presente dissídio prende-se com a apreciação da possibilidade que assistiria à Ré, em momento posterior à abertura das propostas, de dirigir um pedido de esclarecimentos à Contrainteressada, nos termos do constante no artigo 72° do CCP, atenta a omissão, na proposta por esta apresentada, de três artigos da lista de preços unitários (doravante abreviadamente LPU).
Conforme o entendimento propugnado pela Autora, revela-se tal pedido de esclarecimentos inadmissível, por extravasar os limites impostos pela lei, uma vez que se encontravam em falta não só os preços respeitantes a três dos artigos da LPU, como a própria referência às espécies de trabalhos respetivas, previstas no projeto de execução da empreitada. Considera, assim, que ao dirigir tal pedido de esclarecimentos e ao admitir a proposta apresentada pela CI, incorreu a Ré em vício de violação de lei, das peças concursais, por preterição de formalidade essencial, mais violando os princípios que regem a contratação pública, especificamente, dos princípios da igualdade, da imparcialidade, da estabilidade, da comparabilidade das propostas e da transparência
Já sob a perspetiva da Ré, afigurava-se tal pedido de esclarecimentos como admissível, porquanto, atentas a natureza, quantidade e valor dos trabalhos em causa, (por serem apenas 3 artigos, num universo de cerca de 1400; por serem de prestação dita “única”, não dando azo a trabalhos a mais ou a menos, e corresponderem a cerca de 0,1% do valor total da proposta), a respetiva omissão assume a qualidade de formalidade não essencial, sendo assim suscetível de sanação. Alega ainda que a resposta positiva a este esclarecimento não teria qualquer consequência ou interferência na análise comparativa das propostas, nem tão pouco na boa execução do contrato, mais permitindo uma melhor prossecução do interesse público, por ser a proposta vencedora € 52.498,14 mais baixa do aquela apresentada pela Autora. Conclui, assim, inexistir qualquer vício de violação ou dos princípios que norteiam a contratação pública.
Perfilha de tal entendimento a Contrainteressada, mais arguindo que se tratou de um mero lapso, que sempre configuraria uma mera irregularidade suscetível de sanação. Alega, por outra via, que da sua proposta constavam todos os artigos descritos na LPU, sendo que aquando da conversão do ficheiro em suporte “Excel” para o suporte “PDF”, e por lapso involuntário, ficaram os referidos artigos 10.20, 10.21 e 10.22 omissos. Por fim, considera em nada ter ficada prejudicada a concorrência efetiva e a comparabilidade das propostas, assim pugnando pela improcedência da ação.
Para uma cabal compreensão da presente questão, impõe-se um enquadramento prévio do tipo de contrato público ora em causa bem como as disposições legais que lhe são aplicáveis, nos termos do previsto no CCP ou em legislação extravagante.
Refira-se, em primeiro lugar, de acordo com o constante no n° 1 do artigo 56° daquele diploma legal, a proposta é a declaração pela qual o concorrente manifesta à entidade adjudicante a sua vontade de contratar e o modo pelo qual se dispõe a fazê-lo.
Importa atender também ao previsto no artigo 57° do CCP. Nos termos impostos neste normativo,
“1 - A proposta é constituída pelos seguintes documentos:
a) Declaração do anexo i ao presente Código, do qual faz parte integrante;
b) Documentos que, em função do objeto do contrato a celebrar e dos aspetos da sua execução submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, contenham os atributos da proposta, de acordo com os quais o concorrente se dispõe a contratar;
c) Documentos exigidos pelo programa do procedimento ou convite que contenham os termos ou condições relativos a aspetos da execução do contrato não submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, aos quais a entidade adjudicante pretende que o concorrente se vincule;
d) (Revogada.)
2 - No caso de se tratar de procedimento de formação de contrato de empreitada ou de concessão de obras públicas, a proposta deve ainda ser constituída por:
a) Uma lista dos preços unitários de todas as espécies de trabalho previstas no projeto de execução; (...).”
Ora, nos termos das peças concursais, era exigível aos concorrentes, em sede de atributo da proposta (ou seja, aspetos da execução do contrato submetidos à concorrência), a apresentação de um documento com a proposta, nos termos do modelo de proposta do anexo 3 ao Programa do Procedimento, e a lista de preços unitários, com uma definição de aproximação de três casas decimais, de todas as espécies de trabalho previstas no projeto de execução, e elaborada de acordo com o mapa de quantidades de trabalho, incluído no Caderno de Encargos.
Por outro lado, e conforme disposto no artigo 70° do CCP:
“1 - As propostas são analisadas em todos os seus atributos, representados pelos fatores e subfatores que densificam o critério de adjudicação, e termos ou condições.
2 - São excluídas as propostas cuja análise revele:
a) Que não apresentam algum dos atributos ou algum dos termos ou condições, nos termos, respetivamente, do disposto nas alíneas b) e c) do n.° 1 do artigo 57.°;
b) Que apresentam atributos que violem os parâmetros base fixados no caderno de encargos ou que apresentem quaisquer termos ou condições que violem aspetos da execução do contrato a celebrar por aquele não submetidos à concorrência, sem prejuízo do disposto nos nºs. 4 a 6 e 8 a 11 do artigo 49.°;
c) A impossibilidade de avaliação das mesmas em virtude da forma de apresentação de algum dos respetivos atributos;
d) Que o preço contratual seria superior ao preço base;
e) Um preço ou custo anormalmente baixo, cujos esclarecimentos justificativos não tenham sido apresentados ou não tenham sido considerados nos termos do disposto no artigo seguinte;
f) Que o contrato a celebrar implicaria a violação de quaisquer vinculações legais ou regulamentares aplicáveis;
g) A existência de fortes indícios de atos, acordos, práticas ou informações suscetíveis de falsear as regras de concorrência.”
Dispõe ainda o n° 2 do artigo 146° do CCP (e já quanto a motivos formais, que não materiais) que: “No relatório preliminar a que se refere o número anterior, o júri deve também propor, fundamentadamente, a exclusão das propostas: (...) d) Que não sejam constituídas por todos os documentos exigidos nos termos do disposto no nº 1 do artigo 57º; (...) ”.
Por fim, e para o que aqui importa, especifica o artigo 72° do CCP:
“1 - O júri do procedimento pode pedir aos concorrentes quaisquer esclarecimentos sobre as propostas apresentadas que considere necessários para efeito da análise e da avaliação das mesmas.
2 - Os esclarecimentos prestados pelos respetivos concorrentes fazem parte integrante das mesmas, desde que não contrariem os elementos constantes dos documentos que as constituem, não alterem ou completem os respetivos atributos, nem visem suprir omissões que determinam a sua exclusão nos termos do disposto na alínea a) do n.° 2 do artigo 70.°.
3 - O júri deve solicitar aos candidatos e concorrentes que, no prazo máximo de cinco dias, procedam ao suprimento das irregularidades das suas propostas e candidaturas causadas por preterição de formalidades não essenciais e que careçam de suprimento, incluindo a apresentação de documentos que se limitem a comprovar factos ou qualidades anteriores à data de apresentação da proposta ou candidatura, e desde que tal suprimento não afete a concorrência e a igualdade de tratamento. (.)”
Feito este enquadramento jurídico, cumpre agora proceder à sua aplicação ao caso concreto.
Como se viu antes, o único aspeto da execução do contrato submetido à concorrência é o preço da proposta (nos termos do constante do artigo 17° do Programa do Procedimento), preço este que deve constar da declaração emitida pelo concorrente nos termos definidos no anexo I do CCP, mas também o que resulta da soma de todos os artigos constantes da LPU (conforme o previsto no n° 2 do artigo 57° do referido normativo).
Assim, e conforme afirmado pela jurisprudência dos tribunais superiores portugueses (vide Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul, de 24/11/2016, P. 13432/16, disponível em www.dgsi.pt),
“(...) A este nível, e neste contexto, que é o de um procedimento concursal para a celebração de um contrato de empreitada em que apenas o preço foi submetido à concorrência, a lista de preços unitários desempenha duas funções essenciais: uma, a de permitir, no âmbito do procedimento concursal, o cálculo do preço da proposta, por aplicação dos preços unitários às quantidades e espécies de todos trabalhos a executar, de acordo com o caderno de encargos e respetivo projeto de execução, achando, por comparação, a proposta com o preço mais baixo; a outra, a de permitir determinar, no âmbito da execução do contrato de empreitada, o valor das importâncias devidas (preço contratual) incluindo, designadamente, no que tange a trabalhos a mais (da mesma espécie) (cfr. artigo 373° n° 1 alínea a)), a trabalhos a menos (cfr. artigo 379°) ou à inutilização de trabalhos já executados (cfr. artigo 380°). O que significa que em tal circunstancialismo deve a lista dos preços unitários que integrante da proposta assegurar a sua completude, em termos que não seja omitido o preço unitário de algum dos seus items. (...)”
No caso em apreço, a proposta apresentada pela Contrainteressada era omissa quanto a três dos artigos que compunham a LPU, especificamente, os artigos 10.20, 10.21 e 10.21, referente à parte 10, quanto à “Rede de Gases.”
E foi entendimento do júri do concurso que, em tal caso, se justificava a apresentação de um pedido de esclarecimentos àquela concorrente, em cumprimento do disposto no artigo 72° do CCP
Ora, tal entendimento não encontra respaldo na lei aplicável, como vem sendo a mesma interpretada por jurisprudência unânime e reiterada dos tribunais superiores portugueses.
Como se pode ler no supra identificado Acórdão do TCAS, numa situação em tudo semelhante àquela ora em análise, “(.) o esclarecimento solicitado e aceite, extravasou os limites da sua admissibilidade previstos no artigo 72o no 2 do CCP, de acordo com o qual os esclarecimentos às propostas não podem (i) contrariar os elementos constantes dos documentos que as constituem, (ii) alterar ou completar os respetivos atributos, (iii) nem visar suprir omissões que determinem a sua exclusão nos termos do disposto na alínea a) do n.° 2 do artigo 70.°. Com efeito os esclarecimentos às propostas haverão de consistir apenas em informações, explicações destinadas a tornar claro, congruente ou inequívoco um elemento que na proposta estava apresentado ou formulado de forma pouco clara ou menos apreensível, tendo por escopo a melhor compreensão de um qualquer aspeto ou elemento da proposta. Pelo que em respeito pelo princípio da intangibilidade das propostas, que implica que não se possam retirar nem alterar até que seja proferido o ato de adjudicação ou até que decorra o respetivo prazo de validade, não é admitido ao concorrente, designadamente a coberto de “esclarecimentos” «mexer» ou alterar a proposta durante a pendência do procedimento, integrando, modificando, reduzindo ou aumentando a pretensão ou a oferta inicialmente apresentada, seja para a tornar conforme aos parâmetros vinculativos constantes das peças do procedimento, seja para a tornar mais competitiva, sendo irrelevante que a alteração resulte da iniciativa dos interessados ou da iniciativa da entidade adjudicante. Neste sentido, a este respeito, Mário Esteves de Oliveira, Rodrigo Esteves de Oliveira, in, Concursos e Outros Procedimentos de Contratação Pública, Almedina, 2011, págs. 601. E bem assim, entre outros, o acórdão do STA de 29-09-2016, Proc. 0867/16, em que se sumariou: «O pedido de esclarecimentos constitui uma prerrogativa do Júri, a exercer quando se sinta inseguro quanto ao exato significado da proposta e, consequentemente, necessitar que a clarifiquem. Por outro lado, os esclarecimentos prestados têm de incidir sobre os elementos já constantes da proposta pelo que os concorrentes não podem, a pretexto desta figura, corrigir ou melhorar a sua proposta ou aditar-lhe elementos novos por tal constituir violação do princípio da intangibilidade».(...) ”
No caso sub iudice, e a coberto do pedido de esclarecimentos apresentado pelo júri do concurso, a Contrainteressada veio proceder a uma verdadeira “alteração” da sua proposta, quanto ao seu atributo, o preço. Apesar de não ter o esclarecimento prestado significado um efetivo acréscimo ou decréscimo do mesmo, veio proceder a um aditamento à LPU inicialmente apresentada, com a indicação de que os artigos omissos seriam prestados por preço 0, o que consubstancia, igualmente, um aditamento de elementos novos que não constavam da proposta, em violação do previsto no n° 2 do artigo 72° do CCP.
Não colhe o entendimento propugnado pela Ré, de que se procurava sanar uma mera irregularidade, uma formalidade não essencial, nos termos do constante no n° 3 da referida norma, escudando-se, para o efeito, em jurisprudência prolatada pelo Tribunal de Contas.
Não obstante ter vindo o Decreto-Lei n° 111-B/2017, de 31 de agosto (que alterou o CCP, em transposição das Diretivas n°s 2014/23/UE, 2014/24/UE e 2014/25/UE), “recuperar a possibilidade de sanar a preterição de formalidades não essenciais pelas propostas, evitando exclusões desproporcionadas e prejudiciais para o interesse público”, não deve olvidar-se o referido campo de atuação, que se prende com os aspetos formais da proposta, respeitantes ao modo como a mesma deve ser exteriorizada, que já não quanto aos aspetos substantivos da mesma, nomeadamente, os respetivos atributos, ou aspetos da execução do contrato submetidos à concorrência, ou quanto a formalidades reputadas pela própria lei de essenciais.
Nas palavras de Luís Verde de Sousa (Comentários à Revisão do Código dos Contratos Públicos, AAFDL Editora, Lisboa, 2018, 2a Edição, pág. 829 e ss.), “(…) Nesta medida, e à semelhança do que acontece com as formalidades impostas à Administração, a regra geral será a de que todas as exigências legais atinentes a aspetos formais de uma proposta devem ser consideradas essenciais. (...) Em momento anterior ao CCP, e tendo por base o labor doutrinal acerca da cláusula geral de não admissão de propostas carecidas de elementos essenciais, sustentou-se que apenas as exigências formais cuja inobservância pudesse determinar uma violação de princípios estruturantes da contratação pública (igualdade, imparcialidade, transparência, concorrência, estabilidade e boa fé) seriam qualificadas como essenciais. Neste sentido, questiona-se se o disposto no n° 3 do artigo 72° do CCP não deve, também, permitir que se releve a preterição de formalidades quando os princípios não tenham, em concreto, sido postos em causa. Da nossa parte, temos muitas dúvidas quanto a essa possibilidade. Desde logo, porque o CCP não contém uma cláusula geral de exclusão das propostas com a amplitude da que constava dos diplomas ao abrigo dos quais se firmou este entendimento (onde se fazia referência à falta de elementos essenciais). Com efeito, quanto aos seus aspetos formais, o CCP veio tipificar (essencialmente no n° 2 do artigo 146o) um conjunto de irregularidades que devem determinar a exclusão da proposta. Ora, tais causas de exclusão não são mais do que o resultado da ponderação realizada pelo legislador a propósito das diferentes exigências de caráter formal colocadas às propostas. Com efeito, se o legislador optou por sancionar a inobservância de tais formalidades com a exclusão da proposta foi certamente porque o mesmo as reputa de essenciais para a salvaguarda dos princípios basilares da contratação pública. (...) Não nos parece, assim, que a propósito de cada caso concreto, o intérprete possa aferir, para efeitos de (des)qualificação de uma determinada formalidade, se a sua violação põe, ou não, em causa os mencionados princípio da contratação pública, no que seria uma verdadeira reponderação da solução legalmente prevista.(.)”
Assim, a falta de junção de documentos que contenham os atributos ou termos ou condições da proposta, como é a LPU, será sempre sancionada com a sua exclusão, nos termos do constante nas alíneas b) e c) do n° 1 do artigo 57° e n° 2 do artigo 70° do CCP, não podendo o júri, nestes casos, dirigir pedidos de esclarecimentos à concorrente.
Tampouco caberá aqui ao julgador postular qualquer possibilidade de derrogar tal solução legal, por apelo ao princípio da proporcionalidade e considerando que os artigos em falta consubstanciam uma pequeníssima percentagem do preço global da proposta, uma vez que sempre se sobreporão os princípios classificados de essenciais para o procedimento de contratação pública, como sejam os princípios da intangibilidade e da comparabilidade da proposta, que assim sairiam violados.
Neste mesmo sentido já teve ocasião de se pronunciar o Tribunal de Justiça da União Europeia (doravante TJUE), designadamente no seu Acórdão Manova (Processo C-336/12), afirmando que a candidatura pode ser corrigida ou completada desde que o pedido se refira a elementos ou dados cuja anterioridade relativamente ao termo do prazo fixado para apresentar a candidatura seja objetivamente verificável, mais esclarecendo que a junção de tais elementos seria impossível se os documentos do contrato impusessem a comunicação do documento ou da informação que falta sob pena de exclusão, uma vez que a entidade adjudicante deve observar estritamente os critérios que ela própria fixou.
Consequentemente, tendo a Ré exigido, em sede de programa de procedimento, e como documento que compõe a proposta, a entrega da LPU, em conformidade com o mapa de trabalhos, mais considerando que o único aspeto da execução do contrato submetido à concorrência é o preço, a omissão, na referida lista, de um ou mais artigos, ainda que o respetivo montante não tenha grande peso global, implicará a sua exclusão, que não a sua degradação em “formalidade não essencial”.
Apesar de ter vindo a Contrainteressada alegar que tais artigos constavam da LPU por si elaborada em formato “Excel”, e que só por mero erro, aquando da sua conversão em formato “PDF”, ficaram tais artigos omissos, é certo que não logrou a mesma provar tal alegação, não tendo junto qualquer meio de prova que surtisse tal efeito, motivo pelo qual a desconsiderou este Tribunal.
Face ao que antecede, está o ato impugnado ferido de vício de violação de lei, especificamente, os artigos 57°, n° 1, alíneas b) e c), 70°, n° 2, alíneas a), b) e c), 72°, n°s 2 e 3, e 146°, n° 2, alínea b), todos do CCP, vício este gerador da sua anulabilidade. Está ainda o ato impugnado ferido de anulabilidade por violação dos princípios da intangibilidade e da estabilidade da proposta (que proíbe a alteração desta nem momento posterior à sua apresentação), da comparabilidade das propostas (obrigatoriedade das propostas de responderem a um padrão comum) e da igualdade de tratamento (imposição à entidade adjudicante de um tratamento igual dos concorrentes até à adjudicação), o que desde já se declara.
Atenta a procedência do pedido anulatório, procederá também o pedido condenatório formulado pela Autora, motivo pelo qual se imporá à Ré anular os atos subsequentes à adjudicação e, consequentemente, retomar o procedimento concursal, com a exclusão da proposta apresentada à Contrainteressada e proceder à ulterior tramitação, especificamente, aprovar novo Relatório Final, que gradue a proposta apresentada pela Autora em primeiro lugar, mais devendo ser a Ré condenada a adjudicar o contrato à Autora, o que desde já se declara
(…)”.
Recapitulando o que ficou transcrito, temos que, quanto à “questão eleita” de saber da possibilidade que assistiria à Ré, em momento posterior à abertura das propostas, de dirigir um pedido de esclarecimentos à Contrainteressada, nos termos do constante no artigo 72° do CCP, atenta a omissão, na proposta por esta apresentada, de três artigos da lista de preços unitários, o Tribunal a quo considerou, no mais essencial, que, a coberto do pedido de esclarecimentos apresentado pelo júri do concurso, a Contrainteressada veio proceder a uma verdadeira “alteração” da sua proposta, quanto ao seu atributo, o preço, em violação do previsto no n° 2 do artigo 72° do CCP, sendo a falta de junção de documentos que contenham os atributos ou termos ou condições da proposta, como é a LPU, será sempre sancionada com a sua exclusão, nos termos do constante nas alíneas b) e c) do n° 1 do artigo 57° e n° 2 do artigo 70° do CCP, não podendo o júri, nestes casos, dirigir pedidos de esclarecimentos à concorrente.
Adiante-se, desde já, que não vislumbra razão para divergir do assim decidido.
Para facilidade de análise, convoquemos o teor pertinente do artigo 12º do Programa do Procedimento:
“(…)
12-DOCUMENTOS DA PROPOSTA
12.1 - A proposta é constituída pelos seguintes documentos:
12.1.1 - Declaração emitida conforme modelo constante do ANEXO I do CCP, assinada pelo concorrente ou por representante que tenha poderes para o obrigar.
12.1.2- Documentos que, em função do objeto do contrato a celebrar e dos aspetos da sua execução submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, contenham os atributos da proposta, de acordo com os quais o concorrente se dispõe a contratar;
a) Documento com a proposta nos termos do modelo de proposta constante no ANEXO 3, com uma definição de aproximação de três casas decimais;
b) Lista de preços unitários, com uma definição de aproximação de três casas decimais, de todas as espécies de trabalho previstas no projeto de execução, elaborada de acordo com o Mapa de Quantidades de Trabalho incluindo no Caderno de Encargos;
12.1.3- Documentos que, em função do objeto do contrato a celebrar e dos aspetos da sua execução, não são submetidos à concorrência pelo Caderno de Encargos e de acordo com os quais o concorrente se dispõe a contratar:
a) Memória justificativa e descritiva do modo de execução da obra;
b) Programação dos trabalhos (incluindo plano de trabalhos, plano de mão-de-obra e plano de equipamento), identificando o caminho critico e que integre a totalidade das atividades da Lista de Preços Unitários, indicando a sua duração e a respetiva relação de precedência, atendendo aos recursos afetos, que identifique a carga de pessoal por tipo de profissão afeta a todas as atividades e que identifique a carga de equipamento por tipo de equipamento e a sua afetação para todas as atividades;
Nota: Utilizando para o efeito software do tipo "MS Project’ ou similar, devendo o concorrente disponibilizar o respetivo suporte informático.
c) Cronograma Financeiro Mensal, justificativo do Preço Total da Proposta, decomposto de forma coerente com o Plano de Trabalhos e com o Mapa de Quantidades de Trabalho;
Nota: Utilizando para o efeito software do tipo ‘Excel’ ou similar, devendo o concorrente disponibilizar o respetivo suporte informático.
d) Documento com a indicação de que os preços parciais dos trabalhos que se propõe executar correspondem às habilitações contidas nos alvarás, ou nos títulos de registo ou nas declarações emitidas pelo Instituto dos Mercados Públicos, do Imobiliário e da Construção, I. P., nos termos da portaria referida no n.° 2 do artigo 81.°, para efeitos da verificação da conformidade desses preços com a classe daquelas habilitações.
12.1.4- Declaração do concorrente em que este confirme que se inteirou, por exame direto, das condições existentes no local de execução da Empreitada, e que as aceita, conforme ANEXO 2
12.1.5-Certidão do Registo Comercial, com todas as inscrições em vigor, para identificação dos titulares dos órgãos sociais de administração, direção ou gerência que se encontram em efetividade de funções.
12.1.6- Outros documentos que o concorrente apresente por os considerar indispensáveis para os efeitos do disposto no n.° 3 do art.° 570 do CCP.
12.2 - Todos os documentos da proposta devem ser assinados através de assinatura eletrónica pelo concorrente ou por representante que tenha poderes para o obrigar.
12.3 - Quando a proposta seja apresentada por um agrupamento concorrente, todos os documentos da proposta deverão ser assinados pelo representante comum dos membros que o integram, caso em que devem ser juntos às declarações os instrumentos de mandato emitidos por cada um dos seus membros ou, não existindo representante comum, devem ser assinados por todos os seus membros ou respetivos representantes.
12.4- Quando pela sua natureza, qualquer documento dos que constituem a PROPOSTA não possa ser apresentado, nos termos do disposto no Ponto 11.1, deve ser encerrado em envelope opaco e fechado, em cujo rosto se deve indicar a designação do procedimento e da entidade adjudicante, e enviado por correio registado à entidade adjudicante até ao fim do prazo estabelecido para entrega das propostas.
(…)”.
De igual modo, chamemos à colação o disposto n artigo 70.º n.º 2 do C.C.P. sob a epígrafe “Análise das propostas” o seguinte:
“(…)
2 - São excluídas as propostas cuja análise revele:
a) Que não apresentam algum dos atributos ou algum dos termos ou condições, nos termos do disposto na alínea b) e c) do nº 1 do artigo 57º;
b) Que apresentam atributos que violem os parâmetros base fixados no caderno de encargos ou que apresentem quaisquer termos ou condições que violem aspetos da execução do contrato a celebrar por aquele não submetidos à concorrência, sem prejuízo do disposto nos n.ºs 4 a 6 e 8 a 11 do artigo 49º;
(…)”
Com reporte para a alínea a) do artigo 70.º n.º 2, refere-se no artigo 57.º n.º 1, b) e c) , que, entre outros documentos mencionados neste preceito, a proposta é constituída pelos “documentos que, em função do objeto do contrato a celebrar e dos aspetos da sua execução submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, contenham os atributos da proposta, de acordo com os quais o concorrente se dispõe a contratar” e, bem assim, pelos “documentos exigidos pelo programa do procedimento ou convite que contenham os termos ou condições relativos a aspetos da execução do contrato não submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, aos quais a entidade adjudicante pretende que o concorrente se vincule”.
Fixado o quadro legal e regulamentar, e antes do mais, importa atentar no conceito legal de atributo da proposta expressamente plasmado no artigo 56.º, n.º 2, do CCP, no qual se estabelece o seguinte: “para efeitos do presente Código, entende-se por atributo da proposta qualquer elemento ou característica da mesma que diga respeito a um aspeto da execução do contrato submetido à concorrência pelo caderno de encargos” e sua distinção dos termos e condições das propostas que correspondem aos elementos ou características das mesmas incidentes sobre aspetos da execução do contrato não submetidos à concorrência.
Os atributos da proposta são assim “as prestações (com as suas características e circunstâncias) aí oferecidas ou pedidas à entidade adjudicante em relação aos aspetos da execução do contrato a celebrar submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, logo, com correspondência necessária no ou nos fatores de adjudicação, e de acordo com os quais, em caso de adjudicação, o concorrente fica obrigado a contratar” [Vd. Mário Esteves de Oliveira e Rodrigo Esteves de Oliveira in “Concursos e Outros Procedimentos de Contratação Pública”, Almedina, 2010, pág. 929].
Diferentes dos “atributos” serão os “termos e condições” das propostas que correspondem aos elementos ou características das mesmas incidentes sobre aspetos da execução do contrato não submetidos à concorrência e que, por isso, não relevam para a sua avaliação e adjudicação.
Na verdade, “o atributo é algo adjudicatoriamente relevante e o termo ou condição é adjudicatoriamente irrelevante e sabemos também que, apesar disso, ambos versam, sobre aspetos tidos por relevantes para os interesses ou objetivos prosseguidos pela entidade adjudicante com o contrato em causa […] só há um critério para o efeito: se esse aspeto encontrar tradução, de acordo com a fórmula aprovada, num qualquer fator ou subfator do critério de adjudicação, se ele portanto fizer parte dos elementos ou características da proposta em função dos quais a entidade adjudicante irá decidir a respetiva pontuação e a adjudicação do contrato, é porque se trata necessariamente de um aspeto submetido à concorrência, logo, de um atributo. Se não for assim, a proposição será a inversa, é dizer, tratar-se-á de um aspeto não submetido à concorrência, logo, um termo ou condição” [cfr. autores e obra citada, p. 584].
No caso, e como decorre da argumentação neste domínio, a proposta apresentada pelo concorrente FP incumpre com o estabelecido nas peças do procedimento, pois omite três rubricas no âmbito da lista de preços unitários.
Conforme decorre do ponto 12 do Programa do Procedimento, a lista de preços unitários constitui um atributo da proposta.
Nos termos do artigo 70.º, n.º 2, alínea b), do CCP, as propostas cujos atributos violem os parâmetros base do caderno de encargos ou cujos termos e condições violem aspetos por ele subtraídos à concorrência devem ser excluídas.
Assim, é evidente que a verificação de que os termos duma proposta se conformam com os requisitos obrigatórios do caderno de encargos é uma operação de análise da proposta, que se dirige a aferir da sua admissibilidade.
Se for constatada a não conformidade da proposta com o caderno de encargos, isso deve conduzir à sua exclusão.
Ora, da conjugação dos citados arts. 146.º, n.º 2, al. o) e 70º, nº. 2, alínea b), ambos do CCP, resulta que o júri, no relatório preliminar, deve propor, fundamentadamente, a exclusão das propostas que violem os parâmetros base do caderno de encargos ou cujos termos e condições violem aspetos por ele subtraídos à concorrência.
A referência a um dever jurídico de, no relatório preliminar, propor a exclusão das propostas demonstra claramente que os requisitos exigidos têm de estar cumpridos aquando da elaboração do relatório preliminar e que, detetada a falta, o júri fica vinculado a propor e o órgão adjudicante a decretar, tal exclusão, não existindo, assim, neste âmbito, qualquer margem de livre apreciação por parte desses órgãos [cf. Ac. do STA de 14/02/2013 – Proc. n.º 1257/12].
Face a este regime imperativo, não poderia o júri solicitar esclarecimentos ao abrigo do art. 72.º, do CCP, ou admitir que, no decurso do pleito procedimental, fosse sanada a falta verificada, dado que o esclarecimento supõe que ainda não haja motivo para a exclusão da proposta, sendo de referir ainda que a audiência prévia não pode servir para juntar ou completar documentos inicialmente exigíveis [cf. Acs. do STA de 11/04/2012 –Proc. n.º 01166/11 e de 30/01/2013 – Proc. n.º 01123/12].
Portanto, sendo a exclusão da proposta da Contrainteressada FP, S.A. a consequência necessária daquela violar um aspeto subtraído à concorrência, que, como vimos supra, se verifica, sempre seria irrelevante que, no decurso do procedimento concursal, essa falta viesse a ser suprida.
E, por não se estar perante uma formalidade inócua ou insignificante, não se pode afirmar que essa decisão de exclusão ofende o princípio da proporcionalidade.
Na verdade, já aqui vimos que, detetada a falta evidenciada nos autos, o júri fica vinculado a propor e o órgão adjudicante a decretar, tal exclusão, não existindo, assim, neste âmbito, qualquer margem de livre apreciação por parte desses órgãos.
Assim sendo, como é, considerando que a proposta apresentada pelo concorrente FP, S.A. não apresenta atributos submetidos à concorrência pelo Programa de Procedimento, na medida em que na lista de preço unitários não aborda todas as rubricas ali previstas, mostra-se violada tal diploma regulamentar no particular aspeto de exigência da previsão de todas as rubricas da lista de preço unitários, o que consubstancia motivo de exclusão da sua proposta por força da aplicação do disposto no art. 70º nº. 2 al. b), ambos do CCP.
Refira-se que não assiste razão às Recorrentes quando advogam que a previsão do referido artigo 70º, nº. 2 apenas se concretizaria na hipótese da Contrainteressada FP, S.A. não ter apresentado o documento na sua íntegra, o que não é o caso.
Na verdade, e como se viu supra, a “Lista de Preços Unitários” configura-se como um pleno “atributo”, resultando-lhe inteiramente aplicável a previsão do citado art. 70º.
Derradeiramente, saliente-se que a reduzida expressão da deficiência detetada na proposta apresentada pela contrainteressada FP, S.A. na “tarefa de graduação de propostas” nada releva no domínio em análise, por se tratar de uma etapa posterior ao “crivo” da admissão das propostas, que esta não conseguiu ultrapassar verdadeiramente.
Concludentemente, nenhum erro de julgamento de direito se divisa na sentença recorrida.
Mercê de tudo o quanto ficou exposto, deverá ser negado provimento aos presentes recursos jurisdicionais e mantida a sentença recorrida.
Assim se decidirá.
***
IV – DISPOSITIVO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Administrativa deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202º da CRP, em negar provimento aos recursos jurisdicionais “sub judice”, e manter a sentença recorrida.
Custas pelos Recorrentes.
Registe e Notifique-se.
Porto, 12 de junho de 2019,
Ass. Ricardo de Oliveira e Sousa
Ass. Fernanda Brandão
Ass. Frederico de Frias Macedo Branco