Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01154/19.8BEPNF
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:03/25/2021
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Cristina Travassos Bento
Descritores:OPOSIÇÃO JUDICIAL; ASSISTÊNCIA MÚTUA ENTRE ESTADOS-MEMBROS; COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL TRIBUTÁRIO PORTUGUÊS;
CUSTAS DO PROCESSO
Sumário:I - Estando-se perante um pedido de assistência mútua entre Estados-membros (da União Europeia (UE)) em matéria de cobrança de créditos respeitantes a impostos (e outros), nos termos dos artigos (arts.) 59.º do Código de Processo Civil (CPC), 14.º da Diretiva 2010/24/EU, do Conselho, de 16 de março de 2010 e 30.º do Decreto-Lei n.º 263/2012 de 20 de dezembro, aplicáveis ao caso, e em face das causas de pedir, da presente oposição à execução fiscal, o tribunal recorrido não podia delas conhecer, por não ser competente, em razão da nacionalidade.

II – Sendo os fundamentos invocados no processo de oposição judicial escolhidos pela opoente, é de a condenar em custas do processo ao não obter procedência no mesmo.*
* Sumário elaborado pela relatora
Recorrente:E,. Lda
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes desembargadores que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
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I - Relatório

E., Lda, com o NIPC (…), e melhor identificada nos autos veio interpor recurso da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel no processo de Oposição judicial ao processo de execução fiscal nº 4219201901089820 e apenso, que declarou a incompetência do mesmo em razão da nacionalidade, absolvendo a Fazenda Pública da instância.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:

1 - Vem o presente recurso interposto da sentença que julga o Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel incompetente em razão da nacionalidade e, em consequência, julga verificada a exceção dilatória da incompetência absolve e absolve a fazenda Pública da Instância.
2 – Na nota de citação entregue à recorrente consta que contra esta corre na Direção de Finanças do Porto processo executivo com os nºs 4219201901089820 e 4219201901089838.
3 – Da mesma nota de citação consta que a recorrente tem o prazo de 30 dias para deduzir oposição à execução, á qual são aplicáveis as disposições do CPPT 196º, 201º e 204º.
4 – A citação é o ato pelo qual se chama a juízo o réu numa dada acção, dando-lhe conhecimento dos termos da mesma e concedendo-lhe prazo para se defender (cfr. artº.228, do C.P.Civil; artºs.35, nº.2, e 189, do CPPT).
5- Por conseguinte, face à nota de citação entregue à recorrente estamos perante processo executivo que corre termos na Direção de Finanças do Porto, ao qual são aplicadas normas de Direito português.
6 – Desconhecendo a recorrente outra entidade onde eventualmente esteja a decorrer os processos executivos identificados na citação.
7 – Não conta da citação que á presente execução é aplicado o disposto do Dec. Lei nº 263/2012 de 20 de Dezembro, que transpôs para a ordem jurídica nacional a Diretiva nº 2010/24EU, do Conselho de 16 de Março de 2010, relativa à assistência mútua em matéria de cobrança de créditos respeitantes a impostos, direitos e outras medidas.
8 - Assim, sendo, não pode o Tribunal julgar-se incompetente em razão da nacionalidade e, em consequência, julgar verificada a exceção dilatória da incompetência absoluto e absolver a AT da instância.
9 – Á luz da citação efetuada à recorrente, tem o Tribunal de conhecer o que é alegado na petição inicial de oposição à execução e julgar a presente oposição procedente por provada, com todas as demais consequências legais.
10 – Se de facto o processo executivo não corre termos pela Direção de Finanças do Porto, conforme consta da citação, tem o Tribunal de julgar procedente a oposição com fundamento no artº 204º nº 1 al. a) b), c), e), h) e i) do CPPT.
11 – A sentença recorrida padece assim de nulidade nos termos do disposto no artº 615º nº 1 d) do CPC., poi deixou de apreciar matéria que devia ter apreciado e conheceu de matéria que não podia conhecer, tudo sempre em consideração ao que conta da nota de citação.
12 - Acresce que, também não pode a recorrente ser penalizada com o pagamento de custas por ter deduzido a oposição que a própria AT a induziu a fazer, conforme consta da nota de citação –“podendo, querendo, no prazo de 30 (trinta) dias a contar desta citação, requerer a dação em pagamento, nos termos do artigo 201º do CPPT, ou deduzir oposição, com fundamento previsto no 204º do CPPT.”

Termos em que, pelas razões aqui aduzidas, deve o presente recurso merecer provimento e consequentemente revogada a sentença recorrida, substituindo-a por sentença que julgue totalmente procedente, por provada a presente oposição com todas as demais consequências legais;
Ou, Caso assim se não entenda, ordenada a baixa dos presentes autos ao Tribunal de primeira instância para conhecimento da oposição à execução deduzida pela recorrente, como é de inteira JUSTIÇA!
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A Recorrida Fazenda Pública não apresentou contra-alegações.
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Após a subida dos autos ao Supremo Tribunal Administrativo este Tribunal declarou-se incompetente em razão da hierarquia.
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Remetidos autos a este Tribunal Central Administrativo Norte, foram os mesmos com vista ao Exmo Procurador-Geral Adjunto, que emitiu Parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.
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Dispensados os vistos legais, com a concordância das Exmas Juizes Desembargadoras Adjuntas, nos termos do artigo 657º, nº 4 do Código de Processo Civil (CPC), vem o processo à Conferência, para julgamento.

I.I Do Objecto do Recurso - Questões a apreciar e decidir

A questão suscitada pela Recorrente, delimitada pelas conclusões das alegações de recurso, nos termos do 608, nº 2, 635º, nº 4 e 5, todos do Código de Processo Civil, “ex vi” artigo 2º, alínea e) e artigo 281º do CPPT – é saber se a sentença recorrida incorreu em (i) nulidade por omissão e excesso de pronúncia (ii) em erro de julgamento ao declarar o Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel incompetente em razão da nacionaldiade.

II - Fundamentação

II.1 O Tribunal a quo, não autonomizou matéria de facto.
II.2 Para melhor intelecção da questão a apreciar, ao abrigo do n.º 1 do artigo art.º 662.º, do Código de Processo Civil, acorda-se em aditar os seguintes factos, em face dos documentos que os suportam:
“1 . Em 02.09.2019, foi instaurado o processo executivo n.º (PEF) 4219201901089820 e apenso n.º 4219201901089838, contra E., Lda, pela Comissão Interministerial para a Assistência Mútua em Matériad e Cobrança de Créditos – CIAMMCC, a pedido do Estado Membro França, para cobrança de uma dívida à Administração Fiscal Francesa – folhas 34 e ss dos autos (SITAF) ;
2 . Foram juntos aos autos os títulos executivos que deram origem ao processo executivo identificado no ponto anterior, e cujo teor, para além do mais, se inicia com a seguinte aposição “ Título executivo uniforme relativo aos créditos abrangidos pela Directiva 2010/24/EU. – cfr. folhas 36 a 49 dos autos (SITAF);

II.2 - O Direito

II.2.1 Da nulidade por omissão e excesso de pronúncia

II.2.1.1 A sentença recorrida declarou a incompetência em razão da nacionalidade do TAF de Penafiel, tendo entendido que estamos perante um caso de pedido de assistência mútua entre Estados-membros da União Europeia, em matéria de cobrança de créditos relativos a impostos e outros, de acordo arts. 23.º e 30.º do Decreto-Lei n.º (DL) 263/2012, de 20 de dezembro (que transpõe para a ordem jurídica interna a Diretiva n.º 2010/24/EU, do Conselho, de 16 de março de 2010), 2.º, alínea e), 16.º, n.ºs 1 e 2, 18.º do CPPT, 278.º, n.º 1, alínea a), 279.º, 576.º, n.º 2, e 577.º, alínea a), do Código do Processo Civil (CPC).

O Recorrente invectiva contra a sentença imputando-lhe nulidade por omissão e excesso de pronúncia. Alega para tal que foi entregue nota de citação à Recorrente onde constava que contra ela corria um processo executivo e apenso, e que tinha 30 dias para deduzir oposição, à qual eram aplicáveis os artigos 196º, 201º e 204º do CPPT. Que face à nota de citação entregue estavamos perante um processo executivo que corria termos na Direcção de Finanças do Porto, ao qual eram aplicadas normas do Direito português. Uma vez que não constava da citação que à execução era aplicado o disposto no Dec-Lei nº 263/2012, de 20 de dezembro, não podia o Tribnal declarar-se incompetente. À luz da citação efectuada tinha o tribunal de conhecer o que era alegado na petição inicial. A sentença padece, assim, de nulidade, nos termos do disposto no artigo 615º, nº 1 d) do CPC por ter deixado de apreciar matéria que devia ter apreciado e ter conhecido matéria que não devia conhecer. [Conclusões 1ª a 12ª]


Na sentença recorrida, foram elencadas várias questões a apreciar, tendo a mesma iniciado a sua apreciação pela excepção invocada pela Fazenda Pública, e corroborada pelo Ministério Público, da verificação da incompetência internacional dos Tribunais Administrativos e Fiscais portugueses para julgar a oposição.

Para assim decidir, plasmou a seguinte fundamentação:
”(…) A competência internacional dos tribunais portugueses está prevista nos arts. 59.º e seguintes do CPC, aplicáveis por força do art. 2.º, alínea e), CPPT.
Sem prejuízo do que se encontre estabelecido em regulamentos europeus e em outros instrumentos internacionais, os tribunais portugueses são internacionalmente competentes quando se verifique algum dos elementos de conexão referidos nos artigos 62.º e 63.º ou quando as partes lhes tenham atribuído competência nos termos do artigo 94.º.” (art. 59.º do CPC).
“Os tribunais portugueses são internacionalmente competentes:
a) Quando a ação possa ser proposta em tribunal português segundo as regras de competência territorial estabelecidas na lei portuguesa;
b) Ter sido praticado em território português o facto que serve de causa de pedir na ação, ou algum dos factos que a integram;
c) Quando o direito invocado não possa tornar -se efetivo senão por meio de ação proposta em território português ou se verifique para o autor dificuldade apreciável na propositura da ação no estrangeiro, desde que entre o objeto do litígio e a ordem jurídica portuguesa haja um elemento ponderoso de conexão, pessoal ou real.” (art. 62.º do CPC).
Por sua vez, o referido DL 263/2012 prevê no art. 23.º que:
“1 - A pedido de uma autoridade competente de outro Estado -Membro, as autoridades nacionais a que se refere o artigo 5.º promovem a cobrança dos créditos abrangidos pelo artigo 3.º que sejam objeto de um título executivo uniforme.
2 - O título executivo uniforme, que acompanha o pedido de cobrança, constitui base jurídica apta e suficiente para a execução da cobrança ou a adoção de medidas cautelares em território nacional.”.
Relativamente à competência para resolução de litígios os n.ºs 1 e 2 do art. 30.º do aludido DL 263/2012 estabelecem:
“1 - Cabe às autoridades nacionais a que se refere o artigo 5.º, de acordo com as competências legalmente definidas, a resolução de litígios relativos:
a) Ao crédito, ao título executivo inicial e ao título executivo uniforme, nas situações previstas nos artigos 24.º e 25.º;
b) À validade de uma notificação efetuada por uma autoridade nacional, ao abrigo disposto no artigo 21.º;
c) Aos procedimentos de execução da cobrança e de adoção de medidas cautelares efetuados pelas autoridades nacionais, ao abrigo do disposto nos artigos 23.º e 26.º
2 - Sendo apresentada por uma parte interessada, no decurso dos procedimentos de cobrança ou adoção de medidas cautelares solicitados às autoridades nacionais a que se refere o artigo 5.º, uma contestação do crédito, do título executivo inicial do Estado-Membro requerente ou do respetivo título executivo uniforme, aquelas informam a parte interessada em causa de que a ação deve ser por esta instaurada perante a instância competente do Estado-Membro requerente, nos termos das disposições legislativas em vigor nesse Estado.”.
A este propósito não podemos deixar de invocar o os n.ºs 1 e 2 do art. 14.º da aludida Diretiva, que estabelecem:
“1. Os litígios relativos ao crédito, ao título executivo inicial no Estado-Membro requerente ou ao título executivo uniforme no Estado-Membro requerido e os litígios sobre a validade de uma notificação efetuada por uma autoridade competente do Estado-Membro requerente são dirimidos pelas instâncias competentes do Estado-Membro requerente. Se, durante o processo de cobrança, o crédito, o título executivo inicial no Estado-Membro requerente ou o título executivo uniforme no Estado-Membro requerido for impugnado por uma parte interessada, a autoridade requerida informa essa parte de que a ação deve ser por ela instaurada perante a instância competente do Estado-Membro requerente, nos termos das disposições legislativas em vigor nesse Estado.
2. Os litígios relativos às medidas de execução tomadas no Estado-Membro requerido ou à validade de uma notificação efetuada por uma autoridade competente do Estado-Membro requerido são dirimidos pela instância competente desse Estado-Membro, nos termos das disposições legislativas e regulamentares que nele vigorem”.
Da análise conjugada destas disposições legais e da jurisprudência do Colendo Supremo Tribunal Administrativo resulta, em síntese, que os Tribunais Administrativos e Fiscais portugueses são internacionalmente competentes para a oposição deduzida à execução fiscal quando está em causa matéria de cobrança de créditos de impostos respeitantes a Estados membros da União Europeia.
Contudo, esta competência cinge-se apenas às medidas de execução levadas a cabo pela Autoridade Tributária e Aduaneira.
“Saber se os fundamentos invocados pelo oponente na petição inicial são ou não adequados ao pedido aí formulado é matéria que se situa já fora do âmbito da competência internacional” (Acórdão do Colendo Supremo Tribunal Administrativo de 25/3/2015, processo n.º 01951/13, in www.dgsi.pt). E se o Oponente “suscitar apenas questões atinentes à ilegalidade da liquidações e nulidade da citação não logra provimento na sua pretensão por a nulidade de citação não ser fundamento de oposição e por o outro fundamento invocado no caso concreto não poder sustentar uma procedência da oposição, sendo incompetente o tribunal tributário português para conhecer de tais ilegalidades” (Acórdão do Colendo Supremo Tribunal Administrativo de 4/12/2019, processo n.º 01677/17.3 BEBRG – 0705/18, in www.dgsi.pt).
Assim, a competência internacional dos tribunais portugueses tem de ser aferida em face do pedido deduzido e das concretas causas de pedir em que o Oponente o suporta (Citado acórdão de 25/3/2015).
Vejamos, então, o caso dos autos.
Pese embora identifique no artigo 37.º da petição inicial da oposição alguns dos diversos fundamentos de oposição previsto no art. 204.º, n.º 1, do CPPT, a Oponente alega apenas factos relativos à sua ilegitimidade, por não figurar a sua identificação no alegado título executivo, à falta de notificação da liquidação das dívidas exequendas e à consequente impossibilidade de as impugnar, pelo que cumpre apenas apreciar estes fundamentos.
Além disso, a Oponente invoca, em síntese, a nulidade da citação, a nulidade do título executivo, o facto de não ser sujeito passivo de impostos em França e de não ser devedora de quaisquer impostos em França.
Assim, temos de distinguir estes dois grupos de fundamentos e qualificá-los como fundamentos ou não do processo de oposição, questão que é da competência deste Tribunal por não contender com a sua competência internacional (“Saber se os fundamentos invocados pelo oponente na petição inicial são ou não adequados ao pedido aí formulado é matéria que se situa já fora do âmbito da competência internacional.” – aludido acórdão do Colendo Supremo Tribunal Administrativo de 25/3/2015).
O primeiro grupo, a ilegitimidade da Oponente, a falta de notificação da liquidação da dívida exequenda, a ilegalidade da liquidação da dívida exequenda, sempre que a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso e falta de notificação da dívida (no caso de falta de notificação da liquidação da dívida exequenda sem estar em causa a falta de notificação da liquidação no prazo de caducidade), são efetivamente fundamentos de oposição (art. 204.º, n.º 1, alíneas b), e), h) e i), do CPPT), pelo que cumpre apreciar a competência internacional dos tribunais portugueses para os julgar.

Conforme vimos acima, os tribunais portugueses são internacionalmente competentes para julgar os atos / medidas de execução levadas a cabo pela Autoridade Tributária e Aduaneira.

No caso em apreço e relativamente a estas causas de pedir, que são fundamento do processo de oposição e que têm como efeito a extinção do PEF, pedido formulado na petição inicial, a Oponente não tem razão, porquanto são questões que estão fora da alçada da competência internacional dos tribunais portugueses.
Com efeito, nessas causas de pedir a Oponente não suscita nenhuma ilegaliadde de qualquer ato ou medida de execução levada a cabo pelas autoridades portuguesas.

Senão vejamos.
A Oponente invoca a sua ilegitimidade na execução por não figurar no título executivo.
Aqui não tem razão, porque a eventual irregularidade do título executivo não pode ser julgada pelos tribunais portugueses por força dos referidos arts. 14.º, n.ºs 1 e 2, da Diretiva e 30.º, n.ºs 1 e 2, do DL 263/2012.

Com efeito, a Oponente não imputa qualquer irregularidade aos atos das autoridades portuguesas. A Oponente invoca a sua ilegitimidade por alegadamente, não estar identificada no título executivo, pelo que não põe em causa qualquer ato das autoridades portuguesas, já que a emissão e os elementos que constam do título executivo, bem como a sua identificação são fornecidos pelo Estado Francês. Ou seja, a Oponente sustenta a sua ilegitimidade numa alegada irregularidade do título executivo uniforme, pelo que os tribunais portugueses não são internacionalmente competentes para julgar esta causa de pedir e pedido.

O mesmo sucede com a invocada falta de notificação da liquidação das dívidas exequendas e a alegada falta de oportunidade para defender-se dessas dívidas.

Aqui os tribunais portugueses também são incompetentes internacionalmente para julgar estas causas de pedir e respetivo pedido, porquanto não são alegadas ilegalidades praticadas pelas autoridades nacionais. Estas eventuais ilegalidades a existirem foram praticadas pelas autoridades francesas, pelo que não podem ser os tribunais portugueses a julgá-las e a aplicar o direito francês.

Tendo essas alegadas ilegalidades de ser aferidas à luz da lei do Estado requerente, não poderão ser sindicados por um tribunal do Estado requerido (Neste sentido, a contrario, acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 7/1/2015, proferido no processo n.º 1570/13, citado no acórdão de 25/3/2015).

Logo, este Tribunal é internacionalmente competente para julgar os fundamentos do processo de oposição invocados pela Oponente na petição inicial.

O segundo grupo, a nulidade da citação, a nulidade do título executivo, o facto da Oponente não ser sujeito passivo de impostos em França e de não ser devedora de quaisquer impostos em França, não são fundamento do processo de oposição porquanto não são subsumíveis a nenhum dos fundamentos do art. 204.º, n.º 1, do CPPT.

Por outro lado, com exceção da nulidade da citação (por ser um ato das autoridades nacionais) as restantes causas de pedir (nulidade do título executivo, não ser a oponente sujeito passivo de impostos em França e de aí nada dever a título de impostos) são questões que contendem com a legalidade dos atos do Estado requerente e com a eventual ilegalidade das dívidas exequendas, que nunca determinariam a procedência da oposição por não serem fundamento do processo de oposição.

Por isso e porque a “nulidade da citação não logra provimento na sua pretensão por a nulidade de citação não ser fundamento de oposição e por o outro fundamento invocado no caso concreto não poder sustentar uma procedência da oposição, sendo incompetente o tribunal tributário português para conhecer de tais ilegalidades” (Acórdão do Colendo Supremo Tribunal Administrativo de 4/12/2019).

Nesta parte, os tribunais portugueses também são internacionalmente incompetentes para julgar estas causas de pedir e pedido (arts. 14.º, n.ºs 1 e 2, da Diretiva e 30.º, n.ºs 1 e 2, do DL 263/2012).

A incompetência internacional deste Tribunal consubstancia uma incompetência absoluta (art. 96.º, alínea a), do CPC), exceção dilatória que obsta a que o tribunal conheça do mérito da causa e dá lugar à absolvição da instância (arts. 278.º, n.º 1, alínea a), 576.º, n.ºs 1 e 2, 577.º, alínea a), e 578.º do CPC).
(…)
Com a verificação desta exceção dilatória fica prejudicada a apreciação e julgamento das restantes questões suscitadas pela Oponente (arts. 124.º do CPPT e 608.º, n.º 2, do CPC)(…)”

Apreciemos.
A nulidade por omissão e excesso de pronúncia, é uma das nulidades que podem ser imputadas à sentença, de acordo com o disposto no artigo 125º nº 1 do CPPT: “Constituem causas de nulidade da sentença (…) a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer”.
Comando legal idêntico encontra-se na alínea d) do artigo 615º, do Código de Processo Civil (CPC), em obediência ao fixado nº 2 do artigo 608º, segundo o qual “O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficiosos de outras.”

Existirá, pois, de acordo com o ínsito nos artigos agora referidos, omissão de pronúncia quando o tribunal deixa de apreciar e decidir uma questão, isto é, um problema concreto que haja sido chamado a resolver, (tendo em conta o pedido, a causa de pedir e as eventuais excepções invocadas). Na razão inversa, haverá excesso de pronúncia quando o tribunal aprecia uma quesão que não lhe foi colcoada pelas partes, nem é de conhceimento oficioso.

Tendo presente o vertido na sentença, é bem de ver que à mesma não lhe pode ser imputada tal nulidade.

E não pode, pois a questão da incompetência, em razão da nacionalidade, foi-lhe suscitada na contestação, tendo a agora Recorrente sido notificada da mesma. Logo, haveria que conhecer da questão. Mesmo que assim não fosse, como decorre do artigo 97º do Código de Processo Civil, ex vi artigo 2º alínea e) do CPPT, a questão da incompetência absoluta do tribunal, por violação da competência intenacional, teria sempre que ser suscitada oficiosamente enquanto não houvesse sentença, com trânsito em julgado, proferida sobre o fundo da causa.
Por outro lado, não se diga, como pretende a Recorrente, que em face da nota de citação, não tinha qualquer conhecimento de que se tratava de uma execução a que se aplicava o Decreto-Lei 263/2012, de 20 de Dezembro, porquanto como decorre do artigo 24ºda p.i. :
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

Acresce referir que consta dos autos, como decorre da matéria de facto por nós aditada, que conjuntamente com a nota de citação, constam em anexo os títulos executivos, sendo cada um deles encimado por:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

Ora, a ser assim, não podia a Recorrente desconhecer que o Decreto Lei que transpôs tal directiva para a ordem jurídica portuguesa teria aplicação.

Acresce dizer, que, como sublinhou a sentença recorrida, é em face do pedido e da(s) causa(s) de pedir que terá de se aferir a existência ou não de uma incompetência absoluta, em razão da nacionalidade, por banda do tribunal recorrido.

O que a sentença efectivamente fez. A Recorrente esquece toda a apreciação jurídica que ali foi efectuada em face do pedido e da sua causa de pedir arguidas na petição inicial, para de forma genérica imputar à sentença nulidade por não ter apreciado as questões por si formuladas.

Como decorre da lei, a saber, artigo 97º do Código de Processo Civil, no caso que aqui nos ocupa - a incompetência por infracção das regras de competência interncional - apesar de poder ser arguida pelas partes, deverá ser sempre suscitada oficiosamente pelo tribunal, enquanto não houver sentença com trânsito em julgado proferida sobre o fundo da causa. Ainda de acordo com o estipulado no artigo 99º do CPC, a verificação da incompetência absoluta, implica a absolvição do réu da instância, como bem decidiu a sentença recorrida.

Destarte, a sentença sob recurso não incorreu em qualquer nulidade por omissão ou excesso de pronúncia, sendo de negar provimento ao recurso, neste segmento.

II.2.2 Do erro de julgamento quanto a custas

II.2.2.1 A Recorrente insurge-se ainda contra a sentença, imputando-lhe erro de julgamento, no segmento da sua condenação em custas, por entender que não pode ser penalizada com o pagamento das custas por ter deduzido oposição que a própria AT a induziu a fazer, de acordo com a nota de citação. [Conclusão 12ª]

Mas também aqui não tem razão. Expliquemos.

Como se referiu na sentença a Oponente não imputou qualquer irregularidade cometida pelas autoridades portuguesas. Por tal razão, o M juiz aquo, iniciou a apreciação da questão sobre a incompetência que lhe foi suscitada, pela “decomposição” dos diversos fundamentos que seriam compatíveis com o processo de Oposição, e dentro desses, aqueles em que o Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel teria competência, em razão da nacionalidade. Só após tal apreciação o M juiz a quo avançou para concluir que, em face do pedido e dos fundamentos que sustentavam o TAF de Penafiel era incompetente em razão da nacionalidade.

Tudo isto para dizer que a nota de citação não pode ser tida como factor que levasse a agora Recorrente ao comportamento pela qual optou, porquanto os fundamentos invocados na p.i. foram por ela escolhidos, não podendo ignorar que os mesmos, ou não eram fundamento de Oposição, nos termos do artigo 204º do CPPT, ou o TAF de Penafiel poderia declarar-se incompetente naqueles que eram fundamento de Oposição, como, e bem, se apreciou na sentença.

Ora, como decidido em 1ª instãncia, relativamente à condenação em custas, estas são devidas pela Oponente, aqui Recorrente, nos termos do artigo 527º, nºs 1 e 2, do CPC, ex vi, alínea e) do cPPT, 1º, 2º, 7º, nº1, e Tabela II do Regulamento das Custas Processuais (RCP). Nada havendo a apontar ao assim decidido.

Soçobrando todas as conclusões de recurso, é de lhe negar provimento.


III.Decisão

Termos em que os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, acordam, em conferência, negar provimento ao recurso, e manter a sentença na ordem jurídica.
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Custas pela Recorrente, em ambas as instâncias.
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Porto, 25 de Março de 2021

Cristina Travassos Bento
Maria Celeste Oliveira
Maria do Rosário Pais