Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00162/05.0BECBR
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:03/25/2021
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:Tiago Miranda
Descritores:PRESCRIÇÃO, JUROS COMPENSATÓRIOS.
Sumário:I – Tendo o processo de impugnação judicial estado parado por motivo alheio ao impugnante por mais de um ano compreendido no período de vigência do nº 2 do artigo 49º da LGT, revogado pela lei nº 53-A/2006 de 29 de Dezembro, o efeito interruptivo do prazo de prescrição degradou-se em suspensivo por apenas um ano, contando-se, desta feita, todo o tempo decorrido até a autuação da PI da Impugnação, e não volta a poder interromper-se, atento o disposto no nº 3 do mesmo artigo 49º.

II – Porém, não havendo elementos nos autos que permitam excluir posterior suspensão do prazo nos termos do disposto no nº 4 do mesmo artigo, o Tribunal de recurso não pode declarar a prescrição.

III – Nos termos do artigo 35º nº 1 e 3 da LGT são devidos juros compensatórios quando haja atraso na liquidação, devido a motivo imputável ao contribuinte. Esta imputabilidade pode não ser censurabilidade, mas tem de haver um nexo de causalidade adequada entre a conduta do contribuinte e a falta de liquidação no tempo devido.*
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:A.
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Votação:Unanimidade
Decisão:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido da procedência do recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
*
I - Relatório
A., casado, NIF (…), interpôs o presente recurso de apelação relativamente à sentença proferida em 30 de Agosto de 2012, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, que julgou improcedente da liquidação adicional de IRS relativa a 2000 no valor de 3 3026,55 €.

Da alegação da recorrente seleccionamos e transcrevemos as conclusões:
Em conclusão:
I - Na data em que foi proferida a douta sentença recorrida, somando o tempo que decorreu desde o início do prazo de prescrição da dívida (01/01/2001) até à data da instauração da impugnação (04/03/2005) com o tempo que decorreu desde a data da cessação da interrupção da prescrição (19/12/2007) até à data da prolação da sentença, já se havia completado o prazo da prescrição de oito anos, estatuído no artigo 48° da Lei Geral Tributária.
II — Embora o artigo 90° da Lei n.° 53-A/2006 de 29/12 tenha revogado o n.° 2 do artigo 49° da Lei Geral Tributária que diz “a paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar o efeito previsto no número anterior, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação”, o artigo 91° da Lei n.° 53-A/2006 restringe essa revogação aos prazos de prescrição em curso objecto de interrupção, em que ainda não tenha decorrido o período superior a um ano de paragem do processo por facto não imputável ao sujeito passivo.
III — No caso em apreço, por à data da entrada em vigor da referida Lei n.°
53-A/2006 já ter ocorrido o período superior a um ano de paragem do processo [a impugnação judicial deu entrada no Tribunal em 4 de Março de 2005 e à data da entrada em vigor da citada Lei de 29 de Dezembro de 2006, o impugnante ainda não havia sido notificado da contestação da Fazenda Pública, o que só veio a acontecer em 19 de Dezembro de 2007], o n.° 2 do artigo 49° da Lei Geral Tributária, continua a aplicar-se.
IV — Por ser de conhecimento oficioso, deveria a douta sentença recorrida ter declarado a prescrição da dívida do IRS referente ao ano de 2000, não o tendo feito, invoca-se agora para os devidos e legais efeitos.
V - Os juros compensatórios que a liquidação impugnada integrou, assenta na subsistência de culpa no atraso da elaboração da liquidação.
VI — Como consta do ponto 4 da matéria considerada provada, o impugnante apresentou em 17 de Abril de 2001 a declaração para efeitos do Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares relativa ao ano de 2000, vertendo no Anexo G o rendimento do prédio vendido em 30 de Maio de 2000.
VII — Com base nessa declaração a Administração Tributária elaborou em 26 de Julho de 2001 a liquidação competente que o impugnante oportunamente liquidou. (Ponto 5 da matéria provada)
VIII — Em inícios de Janeiro de 2001 a Administração Tributária procedeu oficiosamente a uma avaliação do bem (Ponto 8) e deu conhecimento dessa avaliação ao impugnante somente em 20 de Setembro de 2004 (Ponto 9).
IX — Em 8 de Outubro de 2004 o impugnante apresenta uma declaração de
substituição para efeitos de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares referente ao ano de 2000 com o Anexo G alterado de acordo com a avaliação feita (ponto 11).
X — Como decorre do artigo 35 n.° 1 e 3 da Lei Geral Tributária, são devidos juros compensatórios quando haja atraso na liquidação, devido a motivos imputável ao contribuinte.
XI - Consta dos factos provados da fundamentação da sentença que a Administração Tributária deu conhecimento ao impugnante em 20 de Setembro de 2004 duma avaliação a que tinha procedido em inícios de Janeiro de 2001.
XII — Consta também dos factos provados que o impugnante, na sequência dessa notificação efectuada em 20 de Setembro de 2004, apresentou logo em 8 de Outubro de 2004 a declaração de substituição.
XIII — Com base em todos estes factos dados como provados, o Mmo Juiz “a quo” só poderia ter concluído que a culpa e a falta de diligência normal pertencem em exclusivo à Administração Tributária e nunca ao impugnante que estava impedido logicamente de verter no Anexo G apresentado em 2001, o resultado duma avaliação que lhe foi notificada em Setembro de 2004.
XIV — A douta sentença recorrida, faz assim uma incorrecta aplicação da lei conjugado com uma incorrecta interpretação dos factos dados como provados.

Nestes termos e nos melhores de direito, deve ser declarada a prescrição da dívida do IRS referente ao ano de 2000, por a mesma já se ter operado.
Para a hipótese meramente académica de não ser considerada a prescrição da dívida e somente por mera cautela e dever de patrocínio, deverá ser revogada a douta sentença no que diz respeito aos juros compensatórios, por eles não serem devidos.

Notificado, o Recorrido não contra-alegou.

A Digna Magistrada do Ministério Público neste Tribunal apresentou douto parecer no sentido da declaração da prescrição da dívida liquidada, de que destacamos o seguinte:
«Nos autos está em causa a cobrança uma dívida de IRS DO ANO DE 2000.
Sendo assim, o regime de prescrição aqui aplicável é o previsto na LGT, na redacção da Lei n° 100/99 de 26/7, uma vez que o regime consagrado na Lei n° 53-A/06 de 29/12 só entrou em vigor em 1/1/07.
Dispõe, então, o art° 48°, n° 1 daquele diploma legal que “as dívidas tributárias prescrevem, salvo o disposto em lei especial, no prazo de oito anos contados, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu”.
Por sua vez, estabelece o seu art.º 49º, nº 1 que “a citação, a reclamação, o recurso hierárquico a impugnação e o pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo interrompem a prescrição”.
E, no seu n° 2, acrescenta que “a paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar o efeito previsto no número anterior, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação”.
Posto isto e como vimos, está aqui em causa a cobrança de IRS reportado ao dia 30/5/2000.
Sendo assim, o prazo de prescrição começou a correr em 1/1/2001, por força do n° 1 do art° 48° da LGT.
Pelo que, se tivesse corrido ininterruptamente, o prazo de prescrição terminaria em 1/1/09.
Porém, no dia 4/3/2005 foi instaurada a IMPUGNAÇÃO JUDICIAL, facto este que, assume relevância, uma vez que o predito art° 49°, n° 1 lhe atribui efeito interruptivo da prescrição, inutilizando, assim, todo o tempo decorrido anteriormente, não começando a correr novo prazo, igual ao primitivo, enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo,(cf. art°s 326°, n°s 1 e 2 e 327°, n° 1 do CC e Jorge Sousa, in Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, ed. 2010, pág. 57)
Acontece que este processo de impugnação esteve parado, por facto não imputável ao oponente, no período compreendido entre 4/3/05 a 30/6/06 (vide fl. 60 dos autos
Este facto, a nosso ver assume relevância para a contagem do prazo de prescrição, por força do disposto no n° 2 do art° 49° antes da redacção introduzida pela Lei 53-A/06 DE 29/12, verificando-se, por efeito da paragem por mais de um ano (que ocorreu antes da entrada em vigor da lei 53-a/06) a degeneração do efeito interruptivo em suspensivo, a que alude a norma acabada de citar.
Neste contexto, se contarmos o prazo de harmonia com o disposto no n° 2 do art° 49º, verificamos que à data da douta decisão em crise, a divida exequenda já estava prescrita»

Dispensados os vistos, nos termos do artigo 657º nº 4 do CPC, cumpre apreciar e decidir.


II – Âmbito do recurso e questões a decidir:
Conforme jurisprudência pacífica, o âmbito do recurso é delimitado pelo objecto das conclusões das alegações.
Como é pacífico, a prescrição não pode ser causa de pedir da acção de impugnação judicial. Aquela só pode consistir na invalidade do acto tributário, a qual, obviamente, não releva para a questão da prescrição da obrigação por ele gerada.
Também, é, porém, pacifico, que a questão da prescrição da obrigação tributária, de oficiosa que é, pode e deve ser conhecida na impugnação sempre que desta constem, à partida, os elementos necessários para tal, enquanto factor da extinção da instância por inutilidade superveniente da lide.
Assim sendo, haverá, antes de mais, que conhecer, se possível, da prescrição da dívida liquidada pelo acto impugnado.
Só depois, no caso de não haver ou não ter ocorrido ou não se poder declarar a prescrição, haverá que apreciar e decidir o objecto do recurso, que consiste em saber se a sentença recorrida errou no julgamento de facto e de direito ao confirmar o acto impugnado na parte atinente à liquidação de juros compensatórios.

III – Apreciação do Recurso
O Mmº Juiz a quo deu como provados os seguintes factos, nos seguintes termos:
1. O terreno situado em (…), então inscrito sob o art.6.3540 da respectiva matriz predial rústica e correspondentemente descrito na Conservatória competente sob o art.4.500°, o qual adviera à posse e propriedade do Impugnante, A., como herdeiro de seu pai, falecido a 15 de Março de 1989 [ai ainda inscrito na matriz sob o art. 13.923o], cabendo-lhe em partilhas, foi por ele e sua mulher, M., vendido em 30 de Maio de 2000 a M., S. A., pelo preço declarado de 1.950.000$00, que disseram ter recebido.
1. Tal prédio, com a área de 1.720m2, tinha a configuração de uma faixa de terreno com 8m de largura, estendendo-se do lado Nascente ao longo de um caminho público, a Poente com vala de enxugo e, tanto a Sul como a Norte com outras propriedades particulares, mas aquando da compra e venda foi dito ser destinado a construção urbana.
2. Tal prédio tivera até então virtualidades agro-silvícolas, encontrando-se situado em área florestal de acordo com o Plano Director Municipal da Figueira da Foz, registado a favor do Impugnante, na sequência daquela partilha, desde 9 de Fevereiro de 1996, sob a designação de «terra de cultura», mas acabou servindo de leito de caminho público deslocado de área próxima e nessa ocasião objecto de melhoria.
3. Na declaração para efeitos de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares relativo ao ano de 2000, que o Impugnante e mulher apresentaram em 17 de Abril de 2000, inscreveram no respectivo anexo G o rendimento daquela venda e demais factos relevantes (data de aquisição e valor, data de alienação e preço).
4. Com base naquela declaração, a Administração Tributária elaboraria a 26 de Julho de 2001 a liquidação n° 5112409269 que, integrando as mais valias daquela venda, deu origem a uma dívida de imposto de 259.316$00/€, que o Impugnante e mulher oportunamente pagaram.
5. Contudo, a compradora do terreno, tal como descrito no ponto l.ss., aquando da preparação da sua aquisição — a que, aliás, procedeu sensivelmente na mesma época em que adquiriu outros terrenos contíguos, adjacentes à propriedade que possuía já - ao pedir que lhe fosse liquidado imposto municipal de sisa em vista da aquisição, em 17 de Maio de 2000, referiu que o terreno era “destinado a construção urbana”, sendo também então advertida de que tinha o prazo de 90 dias para apresentar a competente declaração de alterações, na matriz, de tal bem.
6. E, com efeito, viria a formular tal pedido de alterações a 23 de Maio imediato, quando era já, portanto dona daquele prédio.
7. Na sequência dessa, em inícios de Janeiro de 2001 a Administração Tributária procedeu oficiosamente a uma avaliação do bem, ora já inscrito na matriz predial urbana sob o art.2.6l9° da referida freguesia de Quiaios, tendo-lhe fixado o valor patrimonial de 4.816.000$00/€24.022,11, com base no valor do metro quadrado de 2.800S00, atendendo ainda ao tipo de ocupação previsto para o terreno, à sua área bruta de construção e localização, bem como às infra-estruturas existentes, do que de tudo deu conhecimento à dona do terreno logo nessa altura.
9. Contudo, já ao Impugnante a Administração Tributária só deu conhecimento daquela avaliação e valor patrimonial atribuído a 20 de Setembro de 2004, bem como da possibilidade de requerer nova avaliação do bem em dado prazo.
10. Mais lhe foi então dado conhecimento de que, conformando-se com o valor fixado ao em (sic) deveria então apresentar, em dado prazo subsequente àquele, declaração de substituição para efeitos de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares do ano de 2000.
11. E foi esta segunda via a que o Impugnante seguiu, apresentando com sua mulher, a 8 de Outubro de 2004, uma declaração de substituição para efeitos de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares de 2000, na qual, no adequado anexo G, indicava agora como valor de realização da venda do prédio não o referido no ponto 1., mas sim o valor patrimonial atribuído ao prédio, de € 24.022,11.
12. Novamente, na sequência de tal declaração a Administração Tributária procedeu, a 15 de Outubro de 2004, à elaboração da liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares do Impugnante e mulher, com o n° [2004]5004181623.
13. Esta nova liquidação determinou uma dívida de imposto de €3.795,22 que, em conjugação a compensação (sic) com o imposto pago de acordo com a liquidação referida no ponto 5., €1.293,47, mas atendendo à liquidação de juros compensatórios no montante de € 524,80, liquidação n°[2004]00002011576, de 8 de Novembro de 2004, determinou uma dívida final de €3.026,55, com prazo de pagamento findando a 15 de Dezembro de 2004. [
14. Não tendo sido satisfeita tal dívida naquele prazo, no Serviço "de Finanças da Figueira da Foz 1 foi depois instaurada a sua execução coerciva, a que coube o n° 0744200501000357.
15. Em 3 de Março de 2005 o impugnante deu início aos presentes autos.

Aditamento à matéria de facto provada:
Considerando que a prescrição da obrigação tributária é de conhecimento oficioso (artigo 175º do CPPT), este tribunal não deixa de indagar, em todo o processo, quaisquer outos factos documentalmente provados, susceptíveis de relevarem do ponto de vista da ocorrência ou não da prescrição.
Assim sendo, aos factos dados como provados na sentença recorrida acrescentam-se os seguintes:
16. Neste processo de impugnação, uma vez dada entrada da PI, nenhum acto foi praticado até à abertura de conclusão ao Juiz, praticada em 30 de Junho do ano seguinte. (cf. fls. 60 dos autos).
17. A sentença ora recorrida foi emitida em 30 de Agosto de 2012, registada em 3 de Setembro seguinte e notificada ao Impugnante por carta de 6 seguinte (fs. 162).

Estes são os factos, documentados no processo de execução, de algum modo relevantes para a alegação da prescrição.
Vejamos, então, se, conforme alega o Recorrente e opina o MP, bastam para a conclusão de que a mesma ocorreu.
Nos termos do artigo 48º da LGT o prazo de prescrição a considerar em abstracto é de 8 anos, contados, atenta a natureza directa e periódica do IRS, desde o termo do ano a que o imposto respeita.
Assim, o dies a quo do prazo foi o dia 1 de Janeiro de 2001.
Com a autuação da PI da acção de impugnação, em 4 de Março de 2005, atentos os termos do artigo 49º nº 1 da LGT na redacção dada pela Lei nº 100/99 de 26 de Julho, o prazo interrompeu-se, ficando inutilizado todo o tempo decorrido até então, conforme regime geral da interrupção da prescrição contido no artigo 326º nº 1 do CC.
Porém, com a paragem do processo de impugnação por motivo alheio ao Impugnante, entre 4 de Março de 2005 e 30 de Junho de 2006, atento o disposto no nº 2 do artigo 49º nº 2 da LGT na sobredita redacção, esta interrupção degradou-se em mera suspensão por um ano desde a autuação da impugnação, tornando a valer todo o tempo decorrido desde o sobredito dies a quo até ao dia da autuação da PI da impugnação (4 de Março de 2005.
A revogação do sobredito nº 2 do artigo 49º da LGT pela lei nº 53-A/2006 de 29 de Dezembro não buliu com aquela degradação da interrupção em suspensão, quanto mais não fosse atento o disposto no artigo 12º nº 1 do CC, mas também porque isso mesmo está ressalvado, posto que a contrario sensu, pelo artigo 91º da lei revogadora.
Acresce considerar que, nos termos do nº 3 do mesmo artigo 49º, na redacção acabada de referir, contra o que é a regra no CC, a interrupção da prescrição só tem lugar uma vez.
Nestes pressupostos, dir-se-ia que o prazo de prescrição se esgotou algures em Janeiro de 2010.
Nada nos autos se sabe, contudo, acerca de uma eventual ocorrência da suspensão do prazo por força dos nºs 3, primeiro, e 4, depois, do artigo 49º da LGT, nas redacções que vigoraram, designadamente se o processo executivo (cf. facto provado 14) esteve suspenso e desde quando, nos termos ali previstos.
Como assim, não é possível apreciar, nesta sede, a questão da prescrição.


Se assim é, cumpre julgar a questão a sentença recorrida errou no julgamento de facto e de direito ao confirmar o acto impugnado na parte atinente à liquidação de juros compensatórios.
Em suma, o Recorrente alega que não deve juros compensatórios porque o diferimento no tempo da liquidação lhe é imputável a qualquer omissão sua, censurável, mas sim e apenas à AT.

A fundamentação de direito da sentença recorrida quanto a esta questão, é redutível ao seguinte:
Por último, relativamente aos juros compensatórios que a liquidação impugnada integrou, que igualmente vem nessa parte impugnada, a sua liquidação assenta em abstracto na subsistência de uma culpa no atraso na elaboração da liquidação.
Para o caso presente, nos termos do art.35° n.ºs l e 3 da Lei Geral Tributária, são devidos juros compensatórios quando haja atraso na liquidação devido a motivo imputável ao contribuinte. Esse motivo sustenta-se em concreto no comportamento parcialmente omissivo da integral declaração de rendimentos, enquanto expressão de culpa do Impugnante e mulher, entendida como incumprimento de obrigações fiscais declarativas, devido a uma falta de diligência normal, arts.57°ss. do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, versão coeva. Sob um tal contexto a lei estabelece, para o caso, se vençam tais juros desde o termo do prazo da declaração de rendimentos imperfeita até à correção dessa deficiência, na sequência da qual se supriu a parcial omissão que retardara a liquidação subsequente, ou seja, com os dados com base nos quais ela deveria ter sido originalmente elaborada. Assim, in casu foram contados juros desde o termo do prazo de apresentação das declarações para efeitos de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares do ano de 2000, até à apresentação da declaração de substituição.
Invoca o Impugnante, a este como a outros propósitos, ter havido erro por parte do Serviços. Contudo, se bem se vê, é de si que parte a apresentação da declaração de substituição, quando expressamente fora advertido de poder provocar nova avaliação do terreno. Assim, a declaração de substituição reveste os mesmos foros de veracidade que a anterior, que apenas corrige no que ele próprio considerou estar errado, art.75°n°l da Lei Geral Tributária.
Como referido, para além do facto em si objectivo da omissão de declaração oportuna dos rendimentos, esses juros serão devidos se a omissão retardadora da liquidação tiver ficado a dever-se a falta culposa imputável ao contribuinte, o Impugnante e mulher. Ora, se bem se observa, no caso essa culpa não pode deixar de ter-se manifesta e devidamente consubstanciada na omissão verificada, não se pode deixar de a ter presente como normal num caso como este. Por isso, não há suporte legal para no caso não se proceder à liquidação dos juros compensatórios. Assim, ao Impugnante falece razão também nesta parte.
Mantém-se, por todo o exposto, a liquidação impugnada, com o que improcede, também, o pedido de condenação na restituição de montantes eventualmente pagos em sua satisfação, incluindo juros compensatórios.

Nos termos do artigo 35º nº 1 e 3 da LGT são devidos juros compensatórios quando haja atraso na liquidação, devido a motivo imputável ao contribuinte.

Esta imputabilidade pode não ser censurabilidade, mas tem de haver um nexo de causalidade adequada entre a conduta do contribuinte e a falta de liquidação no tempo devido.

A liquidação adicional aqui em causa respeita a IRS relativa a 2000 no valor de 3 3026,55 €. A ter sido feita no tempo devido não seria posterior a 31 de Junho de 2001.

Provou-se que a avaliação do prédio vendido, que determinou a alteração da matéria colectável, embora efectuada em inicio de Janeiro de 2001, só viria a ser notificada ao Impugnante, que se conformou com ela, em 20 de Setembro de 2004.

Mais se provou que esta avaliação foi determinada pelo facto de o comprador do prédio ter, entretanto requerido alteração da classificação matricial do prédio para urbano, declarando destinar o mesmo a construção fabril.

Provou-se, porém que na sequência, desta notificação, logo 8 de Outubro seguinte, o Impugnante apresentou uma declaração de substituição relativa ao IRS de 2000, em que declarou desta feita, como preço da venda, o valor patrimonial entretanto determinado – superior, que era, ao preço de venda inicialmente declarado.

Perante estes factos, não se vê que seja imputável ao Impugnante o facto de esta liquidação de IRS de 2000 só ter vindo a ser feita em 15 de Outubro de 2004.
Na verdade, até à definitividade, relativamente a si, do acto de avaliação do prédio, forçosamente posterior a 20 de Setembro de 2004, data da notificação, ele não tem o domínio do processo causal que resulta no diferimento da liquidação até Outubro de 2004 atraso.

Não se diga que ele bem sabia que o valor da venda fora outro, e superior ao declarado em 2000, tanto assim que na declaração de substituição declarou 24 022 €. Primeiro, não se pode afirmar isso, já que este valor é simplesmente o valor patrimonial, que, por ser superior ao declarado na venda, sempre valeria para a determinar a mais valia. Depois, o certo é que a avaliação que baseia a liquidação só foi dada a conhecer e aceite pelo Impugnante em Outubro de 2004.

Como assim, impunha-se julgar não serem devidos, efectivamente juros compensatórios, pelo que o recurso procede.


Dispositivo
Pelo exposto, acordam os juízes que compõe este colectivo em julgar procedente o recurso e, em conformidade, anular a liquidação de juros compensatórios.
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Custas do recurso pela AT e da acção por ambas as partes, na proporção do decaimento a final: artigo 527º do CPC.
*
Porto, 25/3/2021

Tiago Afonso Lopes de Miranda
Cristina Maria Santos da Nova
Ana Paula Santos