Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02071/13.0BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:05/15/2014
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Pedro Nuno Pinto Vergueiro
Descritores:RECLAMAÇÃO ART. 276º CPPT. NULIDADE DA SENTENÇA POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA E FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO.
JULGAMENTO DA MATÉRIA DE FACTO. TEMPESTIVIDADE.
Sumário:I) Em termos de omissão de pronúncia, embora o julgador não tenha que analisar todas as razões ou argumentos que cada parte invoca para sustentar o seu ponto de vista, incumbe-lhe a obrigação de apreciar e resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, isto é, todos os problemas concretos que haja sido chamado a resolver no quadro do litígio (tendo em conta o pedido, a causa de pedir e as eventuais excepções invocadas), ficando apenas exceptuado o conhecimento das questões cuja apreciação e decisão tenha ficado prejudicada pela solução dada a outras. E questão, para este efeito (contencioso tributário), é tudo aquilo que é susceptível de caracterizar um vício, uma ilegalidade do acto tributário impugnado.
II) No que concerne à nulidade da sentença por falta de fundamentação de facto e de direito, há que ter em atenção que, como é sabido, só se verifica tal nulidade quando ocorre falta absoluta de fundamentação, sendo que há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto.
III) Ao TCA assiste o poder de alterar a decisão de facto fixada pelo tribunal “a quo” desde que ocorram os pressupostos vertidos no art. 712.º, n.º 1 do CPC (actual art. 662º), incumbindo-lhe, nessa medida, reapreciar as provas em que assentou a decisão impugnada objecto de controvérsia, bem como apreciar oficiosamente outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre aqueles pontos da factualidade controvertidos.
IV) O prazo para apresentação da reclamação judicial a que se refere o artigo 276º e seguintes é de 10 dias ou 30 dias, conforme se trate decisão do órgão da execução fiscal ou de outra entidade da administração tributária, e conta-se da data em que o interessado tiver sido notificado da decisão reclamada, o que significa que esse prazo se aplica a todas as reclamações, independentemente de elas terem ou não a natureza urgente prevista no n.º 5 do artigo 278º do CPPT, além de que o artigo 20º do CPPT aponta que “os prazos do procedimento tributário e de impugnação judicial contam-se nos termos do artigo 279.º do Código Civil (nº 1), sendo que “os prazos para a prática de actos no processo judicial contam-se nos termos do Código de Processo Civil (nº 2) e tendo o processo de execução natureza judicial (mesmo na fase que corre perante o órgão da administração fiscal - artigo 103º da LGT), o prazo para deduzir este incidente de reclamação não pode deixar de ter natureza processual, a que se aplicam as regras contidas no artigo 144º do C. Proc. Civil.
V) A reclamação a apresentar pela Recorrente dependia do facto de esta ter sido notificada da realização da penhora no seu vencimento, sendo que, neste domínio, entende-se que a notificação à entidade patronal e o seu conhecimento pela ora Recorrente não é idónea para o efeito, pois que o acto em apreço pode revelar-se inconsequente, como muitas vezes sucede, quando a entidade patronal, por várias razões, vem dizer que não pode proceder nos termos solicitados, de modo que, só após a resposta da entidade patronal, é possível dizer se a penhora em apreço foi ou não concretizada, sendo que, só em caso afirmativo, se procede à notificação do executado, sendo que nessa notificação é também indicado o meio para reagir e o prazo a considerar para o efeito.
VI) Sendo assim, é manifesto que a ora Recorrente, com o requerimento de 20-09-2013, procurou, antes de discutir a bondade da penhora, evitar a concretização da mesma, o que se apreende com a peticionada por antecipação devolução de montantes, pois que, recebido o ofício em 19-09-2013, não é crível que no dia seguinte existissem já quantias depositadas para devolver, pelo que, perante o requerimento de 20-09-2013 e a posição assumida pela AT, que não se furtou à respectiva análise, em função do momento e do meio utilizado, desconsiderando a pretensão da ora Recorrente, é manifesto que estamos perante uma decisão que afecta a esfera jurídica da mesma, sendo susceptível de reclamação, de modo que, a partir do momento em que não é posta em crise a tempestividade da presente reclamação com referência a decisão comunicada ao abrigo do ofício n.º 86145 de 15.11.2013, é ponto assente que o presente recurso tem de proceder.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:M...
Recorrido 1:Fazenda Pública
Decisão:Concedido provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
1. RELATÓRIO
M..., devidamente identificada nos autos, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, datada de 27-02-2014, que julgou procedente a excepção da caducidade do exercício do direito de reclamar, deduzida pela Fazenda Pública na presente instância de RECLAMAÇÃO, relacionada com a decisão do órgão de execução fiscal (Chefe de Finanças Adjunta) proferida no PEF (processo de execução fiscal) n.º 3425200901014668 e apensos, comunicada pelo ofício n.º 86145 de 2013-11-15, na qual consta: “(…) cumpre-me informar V. Exª que se tratam de penhoras automáticas e que, à data, não estava constituída adequada garantia idónea para efeitos de suspensão da execução, ao abrigo do art. 169.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT)”, cfr. fls. 32 dos autos.

Formulou nas respectivas alegações (cfr. fls. 86-94), as seguintes conclusões que se reproduzem:
“ (…)
a) O tribunal “a quo” não fez uma avaliação correcta da situação em causa nos autos, tendo, inclusivamente, feito uma interpretação errada no nosso modesto entendimento, do disposto nos artigos 150º, 151.º e 276º e seguintes do CPPT.
b) Tendo considerado a reclamação intempestiva não apreciando
abstendo-se do mérito.

c) O Tribunal “a quo” centra a questão do presente processo, na
intempestividade da Reclamação, que no entender da Recorrente não se verifica.

d) A reclamação tem por objeto a decisão do órgão da execução
fiscal no que à arguição de nulidades interposta por requerimento, diz respeito, quanto à ilegalidade de penhora de saldos bancários e de vencimentos.

e) A tramitação processual adequada para a arguição de nulidades em processo de execução fiscal, deve consistir em arguição perante o órgão de execução fiscal e, em caso de indeferimento, reclamação para o tribunal nos termos do art. 276.º do CPPT.
f) Com a apresentação do requerimento de arguição de nulidades ou de vícios, para o conhecimento de todas elas, é primariamente competente o órgão de execução fiscal, e não o Tribunal, podendo este intervir, contudo, em caso de indeferimento da arguição de nulidade pelo órgão de execução fiscal (cfr. a titulo de exemplo, o Acórdão de 05.05.2010, rec. n.º 125/10).
g) Neste sentido, é igualmente sustentado por Jorge Lopes de Sousa, in CPPT anotado, 5ª Edição, volume II, pag. 648.
h) Assim, notificada a Recorrente em 19.09.2013 da penhora de vencimento.
i) Através de requerimento remetido ao Serviço de Finanças de Braga 2, em 20.09.2013, facto que não consta dos factos provados e dada a sua relevância para a decisão da causa, entende a Recorrente que o mesmo deveria constar, onde invocou vários fundamentos ou a arguição de nulidades, requerendo a final, que se ordenasse a imediata extinção da penhora realizada no processo de execução fiscal, até decisão do pleito, e em consequência, devolva os montantes penhorados à Requerente, dada a sua ilicitude.
j) Dos factos provados alínea E) deveria constar, para uma melhor decisão e percetibilidade, que: “Em 12.11.2013, o ora RR apresentou requerimento no qual solicita uma pronúncia da AT sobre a petição entregue junto desse Serviço de Finanças, em 20.09.2013.”
k) Com a apresentação do requerimento de arguição de nulidades em 20.09.2013, a recorrente pretendia que o órgão de execução fiscal ordenasse a imediata extinção da penhora realizada no processo de execução fiscal, com base em vícios que integram ilegalidade da conduta processual, desse mesmo órgão.
l) Com efeito, no entendimento do Recorrente, e que nos termos do art. 150.º do CPPT, confere ao OEF as atribuições e/ou competências para a apreciação da arguição de nulidades e de questões incidentais, que determinem um juízo de legalidade.
m) As nulidades processuais derivam de actos ou omissões praticados no processo e se substanciam em desvios ao formalismo processual prescrito na lei.
n) Estamos portanto, a nosso ver, perante alegações de nulidades de actos processuais praticados pela AT com deficiências, o que legitimará, e se nos afigura revelar, pois que, para conhecimento de todas elas é competente o órgão de execução fiscal, e não o Tribunal, podendo este intervir, contudo, em caso de indeferimento da arguição de nulidade pelo órgão de execução fiscal.
o) Assim sendo, indeferido o pedido (de 20.09.2013) pelo OEF pelo ofício n.º 86145 de 15.11.2013, a Recorrente tem sempre a possibilidade legal de reclamar - nos termos do artigo 276º do CPPT - do despacho que, em sede de execução, aprecie tais nulidades.
p) Com efeito, em 29.11.2013 a aqui Recorrente ao abrigo do artigo 276º e ss do CPPT, apresentou reclamação do despacho dado pelo ofício n.º
86145 de 15.11.2013.

q) Á verdade é que na situação sub júdice não é possível considerar-se como dies a que do prazo para reclamar outro que não aquele em que a Executado, aqui Recorrente, foi notificado do despacho proferido pelo ofício de 15.11.2013.
r) A partir do momento que o órgão da administração tributária profere uma decisão sobre um requerimento que lhe é dirigido pelo executado, está sempre e sem excepção, a admitir que este ultimo possa apresentar reclamação da sua decisão, nos termos dos artigos 276.º e 277.º do CPPT.
s) Não obstante, a administração tributária está obrigada a pronunciar-se sobre todos os assuntos da sua competência que lhe sejam apresentados por meio de reclamações, recursos, representações, exposições, queixas ou quaisquer outros meios previstos na lei pelos sujeitos passivos ou quem tiver interesse legítimo, com base no princípio de decisão plasmado no artigo 56º da LGT.
t) E nesses termos, a administração tributária proferiu decisão através do despacho de 15.11.2013, não pode agora ser negado à executada, aqui Recorrente, o direito consagrado no artigo 276.º do CPPT.
u) A reclamação do despacho é tempestiva, uma vez que foi interposta após 10 (dez) dias da notificação da decisão do órgão da administração tributária, que a lei consagra no n.º 1 do artigo 277.º do CPPT.
v) A douta decisão violou o preceituado na lei, nomeadamente, nos artigos 276.º e 277.º do CPPT.
w) Com efeito, o Tribunal “a quo” labora em erro.
x) De facto, é nula por omissão de pronúncia, a sentença que deixe de apreciar questão que deva conhecer e que não esteja prejudicada pela solução dada a outra, nos termos dos artigos 125º, n.º 1 do Código do Procedimento e do Processo Tributário e 668º, n.º 1, alínea d) e 660.º n.º 2 do Código de Processo Civil. (novo artigo)
y) A nulidade da Sentença recorrida por alegada “falta de fundamentação ou de abstenção de pronúncia”, em virtude de não ter apreciado as questões levantadas na reclamação, ao faze-lo incorreu, por falta de fundamentação ou abstendo-se de pronuncia, em nulidade prevista no n.º 1 do artigo 125.º do CPPT.
z) Deve, consequentemente, ser anulada, com a consequente baixa dos autos ao Tribunal “a quo” para reforma da decisão, nos termos do n.º 2 do artigo 731.º do CPC. (novo artigo)
aa) A não se entender que ocorre a nulidade invocada, ou não se ordenar a baixa dos autos para a reforma da decisão, sempre terá de entender-se que a douta Sentença recorrida incorreu em erro de julgamento.
Pelo exposto, e nos demais de direito, sempre com o douto suprimento de Vossas Excelências, deve o presente recurso ser procedente por provado, e, consequentemente, se dê como provado erro no julgamento das questões colocadas e reforma da decisão.”

A recorrida Fazenda Pública não apresentou contra-alegações.

O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu o parecer de fls. 123-125 dos autos, no sentido da improcedência do recurso.

Sem vistos, por se tratar de processo classificado de urgente, vem o processo à Conferência para julgamento.
2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO –QUESTÕES A APRECIAR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que as questões suscitadas resumem-se, em suma, em indagar da nulidade da sentença por omissão de pronúncia e falta de fundamentação, analisar o julgamento da matéria de facto e ainda apreciar se a decisão recorrida incorreu em erro ao julgar que as presentes reclamações foram instauradas para além do prazo legal de 10 dias previsto no artigo 277.º do CPPT.
3. FUNDAMENTOS
3.1 DE FACTO
Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:
“…
Com interesse para a apreciação e decisão da excepção apontada consideram-se provados os factos seguintes:
A) Em 05.04.2009 foi instaurado pelo Serviço de Finanças de Braga-2 o processo de execução fiscal (PEF) n.º 3425200901014668, por dívidas de IRS (retenção na fonte), contra a sociedade “M..., S.A.”;
B) Posteriormente, foram instaurados mais PEF’s referentes a dívidas de IRC, IRS (Retenção na Fonte) e Imposto do Selo, tendo estes sido apensados ao PEF n.º 3425200901014668 supra referido, ascendendo a quantia exequenda a 173.165,84 €;
C) Os PEF`s identificados em A. e B. reverteram contra os responsáveis subsidiários, entre eles a ora reclamante (RR);
D) Em 19/09/2013, foi a ora RR notificada da penhora de vencimento, cfr. o admite a reclamante no ponto 5. da PI;
E) Em 12.11.2013, o ora RR apresentou requerimento no qual solicita que a AT se pronuncie sobre as referidas penhoras;
F) Através do ofício n.º 86145 de 15.11.2013 foi o mandatário da ora RR notificado da decisão de indeferimento do requerido, onde consta:
“(…) cumpre-me informar V. Exª que se tratam de penhoras automáticas e que, à data, não estava constituída adequada garantia idónea para efeitos de suspensão da execução, ao abrigo do art. 169.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT)”., cfr. fls. 32 dos autos;
G) A petição inicial que deu origem à presente reclamação deu entrada no Serviço de Finanças em 29/11/2013.
Não se provaram outros factos com interesse para a decisão
Factos não provados
Inexistem.
Motivação da decisão de facto
A base probatória de todos os factos radica nos documentos juntos aos autos.”
Ao abrigo do disposto no art. 662º nº 1 do C. Proc. Civil, adita-se ao probatório o seguinte:
H) Em 20-09-2013, a ora Recorrente dirigiu requerimento ao Chefe do Serviço de Finanças de Braga – 2, peticionando a imediata extinção da penhora realizada no processo de execução fiscal até decisão do pleito, solicitando a devolução dos montantes penhorados à Requerente, dada a sua ilicitude, com todas as consequências legais (fls. 12-13 dos presentes autos)


3.2 DE DIREITO
Assente a factualidade apurada cumpre, então, antes de mais, entrar na análise da realidade em equação nos autos, sendo que a este Tribunal, está cometida, desde logo, a tarefa de indagar da nulidade da sentença por omissão de pronúncia e falta de fundamentação.
Com efeito, no âmbito das suas alegações, a Recorrente aponta que é nula por omissão de pronúncia, a sentença que deixe de apreciar questão que deva conhecer e que não esteja prejudicada pela solução dada a outra, nos termos dos artigos 125º, n.º 1 do Código do Procedimento e do Processo Tributário e 668º, n.º 1, alínea d) e 660.º n.º 2 do Código de Processo Civil. (novo artigo), defendendo ainda a nulidade da Sentença recorrida por alegada “falta de fundamentação ou de abstenção de pronúncia”, em virtude de não ter apreciado as questões levantadas na reclamação, ao faze-lo incorreu, por falta de fundamentação ou abstendo-se de pronuncia, em nulidade prevista no n.º 1 do artigo 125.º do CPPT e deve, consequentemente, ser anulada, com a consequente baixa dos autos ao Tribunal “a quo” para reforma da decisão, nos termos do n.º 2 do artigo 731.º do CPC. (novo artigo)
No que concerne ao núcleo essencial desta arguição, há que ter em atenção que, como é sabido, só se verifica tal nulidade quando ocorre falta absoluta de fundamentação - Ac. do S.T.A. de 16-11-2011, Proc. nº 0802/10, www.dgsi.pt - , sendo que tal como refere o Prof. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, volume V, página 140 “há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto.”.
Porém, como refere o Cons. Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, 5ª ed., Vol. I, pág. 909, “deverão considerar-se como falta absoluta de fundamentação os casos em que ela não tenha relação perceptível com o julgado ou seja ininteligível, situações em que se está perante uma mera aparência de fundamentação.
Com efeito, a fundamentação destina-se a esclarecer as partes, primacialmente a que tiver ficado vencida, sobre os motivos da decisão, não só para ficar convencida de que não tem razão, mas também porque o conhecimento daqueles é necessário ou, pelo menos, conveniente, para poder impugnar eficazmente a decisão em recurso ou arguir nulidades, designadamente a derivada de eventual contradição entre os fundamentos e a decisão.
Por isso, quando a fundamentação não for minimamente elucidativa das razões que levaram a decidir como se decidiu deverá entender-se que se está perante uma nulidade por falta de fundamentação”.
Diga-se ainda que segundo o disposto no artigo 125º nº 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário, é nula a sentença quando ocorra “a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer”, sendo que esta nulidade está directamente relacionada com o dever que é imposto ao juiz, pelo artigo 660º nº 2 do Código de Processo Civil, de resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação e de não poder ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras, determinando a violação dessa obrigação a nulidade da sentença por omissão de pronúncia.
Assim, embora o julgador não tenha que analisar todas as razões ou argumentos que cada parte invoca para sustentar o seu ponto de vista, incumbe-lhe a obrigação de apreciar e resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, isto é, todos os problemas concretos que haja sido chamado a resolver no quadro do litígio (tendo em conta o pedido, a causa de pedir e as eventuais excepções invocadas), ficando apenas exceptuado o conhecimento das questões cuja apreciação e decisão tenha ficado prejudicada pela solução dada a outras. E questão, para este efeito (contencioso tributário), é tudo aquilo que é susceptível de caracterizar um vício, uma ilegalidade do acto tributário impugnado.
A partir daqui, é manifesto que a Recorrente não tem razão no que diz respeito à invocada nulidade da sentença, dado que, a decisão recorrida ponderou a matéria da tempestividade da presente reclamação, o que significa que a partir do momento em que entendeu que a mesma não foi apresentada em prazo, como é evidente, nada mais tinha que apreciar, não tendo qualquer sentido a apresentação desta questão enquanto fundamento de nulidade da sentença neste domínio, além de que na decisão recorrida foi elencada a realidade de facto que esteve na base da decisão, a qual foi enquadrada em termos que permitiram à ora Recorrente apreender tal situação, tal como o presente recurso bem evidencia.
No mais, resta apenas acrescentar que também não tem qualquer virtualidade a alegação de que a sentença não está fundamentada, sendo de notar que esta nulidade apenas se verifica, como se disse, quando haja falta absoluta de fundamentos, e não quando a justificação seja apenas deficiente, visto o tribunal não estar adstrito à obrigação de apreciar todos os argumentos das partes, o que manifestamente não sucede no caso em apreço, impondo-se sublinhar que qualquer apreciação do mérito da reclamação dependia de uma resposta positiva (recusada pela decisão recorrida) à questão da tempestividade da presente reclamação.

Avançando, cumpre, então, antes de mais, entrar na análise da realidade em equação nos autos, sendo que a este Tribunal, está cometida a tarefa de indagar se a decisão recorrida incorreu em erro ao julgar que a presente reclamação foi instaurada para além do prazo legal de 10 dias previsto no artigo 277.º do CPPT.
Com efeito, segundo o disposto no artigo 277º do CPPT, o prazo para apresentação da reclamação judicial a que se refere o artigo 276º e seguintes é de 10 dias ou 30 dias, conforme se trate decisão do órgão da execução fiscal ou de outra entidade da administração tributária, e conta-se da data em que o interessado tiver sido notificado da decisão reclamada.
O que significa que esse prazo se aplica a todas as reclamações, independentemente de elas terem ou não a natureza urgente prevista no n.º 5 do artigo 278º do CPPT.
Por outro lado, o artigo 20º do CPPT aponta que “os prazos do procedimento tributário e de impugnação judicial contam-se nos termos do artigo 279.º do Código Civil (nº 1), sendo que “os prazos para a prática de actos no processo judicial contam-se nos termos do Código de Processo Civil (nº 2).
Quer isto dizer que os prazos substantivos se contam de acordo com o Código Civil e os prazos processuais de acordo com o Código de Processo Civil, sendo que, independentemente da adequada qualificação da reclamação judicial a que se refere o artigo 276º e seguintes do CPPT - como incidente, como recurso ou como impugnação, é inquestionável a sua dependência estrutural em relação à execução fiscal na qual é praticado o acto reclamado.
A reclamação de acto praticado na execução fiscal constitui, pois, uma verdadeira acção impugnatória incidental da execução fiscal, formulada no curso de execução pendente, tendo por objecto determinado acto que nela foi praticado pelo órgão da execução fiscal e por finalidade a apreciação da validade desse acto.
Ora, tendo o processo de execução natureza judicial (mesmo na fase que corre perante o órgão da administração fiscal - artigo 103º da LGT), o prazo para deduzir este incidente de reclamação não pode deixar de ter natureza processual, a que se aplicam as regras contidas no artigo 144º do C. Proc. Civil.
A partir daqui, colhe-se do probatório que em 05.04.2009 foi instaurado pelo Serviço de Finanças de Braga-2 o processo de execução fiscal (PEF) n.º 3425200901014668, por dívidas de IRS (retenção na fonte), contra a sociedade “M..., S.A.” e posteriormente, foram instaurados mais PEF’s referentes a dívidas de IRC, IRS (Retenção na Fonte) e Imposto do Selo, tendo estes sido apensados ao PEF n.º 3425200901014668 supra referido, ascendendo a quantia exequenda a 173.165,84 €, sendo que os PEF`s identificados reverteram contra os responsáveis subsidiários, entre eles a ora reclamante (RR).
Nesta sequência, consta do probatório que em 19/09/2013, foi a ora RR notificada da penhora de vencimento, cfr. o admite a reclamante no ponto 5. da PI.
Neste ponto, crê-se que o teor de fls. 14 exigia maior rigor de análise por parte do Tribunal, pois que o ofício em apreço é dirigido, não à ora Recorrente, mas a “J...2 - Obras Engenharia, Lda.”, na qualidade de entidade patronal da ora Recorrente, solicitando-se a penhora de 1/6 do seu vencimento nos termos dos arts. 227º do CPPT e 861º nº 1 do C. Proc. Civil, aí se consignando também que, nos termos e para efeitos do art. 856º nº 2 do C. Proc. Civil, no prazo de 10 dias, deverá ser confirmado se o executado é credor de vencimentos/abonos bem como informar de quaisquer outras circunstâncias que possam interessar à execução, sendo que tal ofício apresenta um carimbo com os seguintes dizeres: “RECEBIDO 19 SET. 2013”.
Com este pano de fundo, a afirmação da Reclamante na parte em que alude à penhora de vencimento em 19 de Setembro de 213 respeita ao conhecimento do ofício remetido à aludida empresa, de modo que, nos termos do art. 662º nº 1 do C. Proc. Civil, importa alterar o ponto d) do probatório nos seguintes termos:
d) Com data de 14-09-2013, foi emitido o ofício que consta de fls. 14 dos presentes autos, dirigido a “J...2 - Obras Engenharia, Lda.”, na qualidade de entidade patronal da ora Recorrente, solicitando-se a penhora de 1/6 do seu vencimento nos termos dos arts. 227º do CPPT e 861º nº 1 do C. Proc. Civil, aí se consignando também que, nos termos e para efeitos do art. 856º nº 2 do C. Proc. Civil, no prazo de 10 dias, deverá ser confirmado se o executado é credor de vencimentos/abonos bem como informar de quaisquer outras circunstâncias que possam interessar à execução, sendo que tal ofício apresenta um carimbo com os seguintes dizeres: “RECEBIDO 19 SET. 2013”, verificando-se que a ora Recorrente tomou conhecimento do mesmo nessa mesma data.
Do mesmo modo, e já que falamos de rigor, não podemos de deixar de reconhecer pertinência ao exposto pela Recorrente quando refere que dos factos provados alínea E) deveria constar, para uma melhor decisão e perceptibilidade, que: “Em 12.11.2013, o ora RR apresentou requerimento no qual solicita uma pronúncia da AT sobre a petição entregue junto desse Serviço de Finanças, em 20.09.2013”, o que significa que se impõe alterar a al. E) do probatório, na medida em que o requerimento de 12-11-2013 está relacionado com o requerimento anterior (de 20-09-2013), reclamando a ora Recorrente uma pronúncia sobre o mesmo, pelo que, o citado ponto do probatório passará a ter a seguinte redacção:
E) Em 12.11.2013, o ora RR apresentou requerimento no qual solicita que a AT se pronuncie sobre o requerimento id. em H).

A partir daqui, cumpre ter presente que a decisão recorrida ponderou que:
Analisada a PI não restam dúvidas que a reclamante pretende atacar o despacho que ordenou a penhora, esse sim um despacho que afecta os direitos e interesses legítimos da executada, aqui reclamante, como o concebeu o legislador no texto da norma do art. 276.º do CPPT.
Assim, alegar a reclamante que pretende reclamar, como o faz logo no início da PI que pretende reclamar do despacho notificado a coberto do ofício n.º 86145 de 2013-11-15, cujo autor é a Exma. Chefe de Finanças Ajunta, no qual consta: “(…) cumpre-me informar V. Exª que se tratam de penhoras automáticas e que, à data, não estava constituída adequada garantia idónea para efeitos de suspensão da execução, ao abrigo do art. 169.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT)”., afigura-se-nos, com o devido respeito, que o faz ou que o invoca para poder lançar mão do mecanismo do art. 276.º do CPPT, dentro do prazo legal, pois aquele ofício data de 15/11/2013 e a presente acção foi apresentada em 29/11/2013.
No entanto, não podemos descurar que é a própria reclamante quem no ponto V das conclusões refere que a reclamação tem por objecto a decisão do órgão da execução fiscal que ordenou a penhora de saldos bancários e de vencimentos.
Sucede que, como se retira dos factos acima enunciados a petição inicial dos presentes autos apenas foi apresentada em 29.11.2013, sendo que, apesar da RR identificar como ato impugnável o despacho dado pelo ofício n.º 86145 de 15.11.2013, o ato do qual ora reclama é o ato de penhora que havia sido notificado em 28.10.2013.
Acontece que à data da apresentação da petição inicial já havia decorrido há muito tal prazo de 10 dias, encontrando-se naquela data o referido prazo totalmente esgotado.
Aqui chegados, importa dizer que a procedência desta excepção prejudica o conhecimento de todas as outras questões invocadas pelo reclamante. …”.

Nas suas alegações, a Recorrente refere que o Tribunal “a quo” centra a questão do presente processo, na intempestividade da Reclamação, que no entender da Recorrente não se verifica, pois que a reclamação tem por objecto a decisão do órgão da execução fiscal no que à arguição de nulidades interposta por requerimento, diz respeito, quanto à ilegalidade de penhora de saldos bancários e de vencimentos, sendo que a tramitação processual adequada para a arguição de nulidades em processo de execução fiscal, deve consistir em arguição perante o órgão de execução fiscal e, em caso de indeferimento, reclamação para o tribunal nos termos do art. 276.º do CPPT.
Com a apresentação do requerimento de arguição de nulidades ou de vícios, para o conhecimento de todas elas, é primariamente competente o órgão de execução fiscal, e não o Tribunal, podendo este intervir, contudo, em caso de indeferimento da arguição de nulidade pelo órgão de execução fiscal (cfr. a titulo de exemplo, o Acórdão de 05.05.2010, rec. n.º 125/10).
Assim sendo, indeferido o pedido (de 20.09.2013) pelo OEF pelo ofício n.º 86145 de 15.11.2013, a Recorrente tem sempre a possibilidade legal de reclamar - nos termos do artigo 276º do CPPT - do despacho que, em sede de execução, aprecie tais nulidades, sendo que em 29.11.2013 a aqui Recorrente ao abrigo do artigo 276º e ss do CPPT, apresentou reclamação do despacho dado pelo ofício n.º 86145 de 15.11.2013.
Que dizer?
Como se colhe do que ficou exposto, o Tribunal recorrido entendeu que a ora Reclamante pretendia colocar em crise o “ato do qual ora reclama é o ato de penhora que havia sido notificado em 28.10.2013”.
No entanto, crê-se que ao tentar ver mais longe, o Tribunal recorrido descurou a matéria mais elementar em análise.
Desde logo, é ponto assente que a presente reclamação é apresentada na sequência da notificação efectuada ao abrigo do ofício n.º 86145 de 15.11.2013, sendo que ninguém discute a tempestividade da reclamação com referência à comunicação agora apontada.
Na contestação apresentada, a Fazenda Pública suscita a questão entretanto apreciada pelo Tribunal, apontando que o acto em crise é o acto de penhora de que a reclamante foi notificada em 28-10-2013.
Pois bem, embora na sua reclamação, a ora Recorrente, na parte das conclusões, aponte que a reclamação tem por objecto a decisão do órgão da execução fiscal que ordenou a penhora de saldos bancários e de vencimentos, tem de entender-se que a referência aos saldos bancários é o elemento que extravasa o objecto da reclamação.
Com efeito, importa voltar à sequência factual descrita para referir que no requerimento de 20-09-2013 (que motivou depois o requerimento de 12-11-2013), em nenhum momento a Reclamante alude a saldos bancários, do mesmo modo que, na presente reclamação e em toda a exposição que antecede a matéria das conclusões, não existe qualquer alusão a saldos bancários, falando-se apenas em penhora de vencimento.
Assim sendo, como é evidente, não pode aceitar-se a afirmação da decisão recorrida no sentido de que “apesar da RR identificar como ato impugnável o despacho dado pelo ofício n.º 86145 de 15.11.2013, o ato do qual ora reclama é o ato de penhora que havia sido notificado em 28.10.2013”, o que significa que a questão que realmente interessa é a situação da penhora de vencimento a que se reporta a ora Recorrente, sendo ainda de sublinhar que, apesar do exposto, no probatório fixado na decisão recorrida não se alude a qualquer penhora notificada em 28-10-2013, o que também deixa sem o competente suporte factual a análise que está na origem da decisão recorrida.
Em todo o caso, e com referência à penhora de vencimento, cabe indagar se a ora Recorrente deveria ter adoptado outro tipo de procedimento, até porque, ao contrário do que esta parece supor, a lei não faz depender o exercício deste direito de uma prévia reclamação, autónoma, para o órgão da Administração que praticou o acto com o qual o reclamante se não conforma, nem ela se apresenta como necessária, ou, sequer, vantajosa, pois corresponderia a exigir que a mesma questão fosse suscitada repetidamente perante o mesmo órgão.
No entanto, no caso presente, a situação não é enquadrável nesta situação, na medida em que a possibilidade de reclamação de qualquer acto da administração tributária pressupõe que a sua realização seja comunicada àqueles que por ela são afectados.
Nesta perspectiva, a reclamação a apresentar pela Recorrente dependia do facto de esta ter sido notificada da realização da penhora no seu vencimento, sendo que, neste domínio, entende-se que a notificação à entidade patronal e o seu conhecimento pela ora Recorrente não é idónea para o efeito, pois que o acto em apreço pode revelar-se inconsequente, como muitas vezes sucede, quando a entidade patronal, por várias razões, vem dizer que não pode proceder nos termos solicitados.
Tal significa que, só após a resposta da entidade patronal, é possível dizer se a penhora em apreço foi ou não concretizada, sendo que, só em caso afirmativo, se procede à notificação do executado, sendo que nessa notificação é também indicado o meio para reagir e o prazo a considerar para o efeito.
Sendo assim, é manifesto que a ora Recorrente, com o requerimento de 20-09-2013, procurou, antes de discutir a bondade da penhora, evitar a concretização da mesma, o que se apreende com a peticionada por antecipação devolução de montantes, pois que, recebido o ofício em 19-09-2013, não é crível que no dia seguinte existissem já quantias depositadas para devolver.
Deste modo, perante o requerimento de 20-09-2013 e a posição assumida pela AT, que não se furtou à respectiva análise, em função do momento e do meio utilizado, desconsiderando a pretensão da ora Recorrente, é manifesto que estamos perante uma decisão que afecta a esfera jurídica da mesma, sendo susceptível de reclamação, de modo que, a partir do momento em que não é posta em crise a tempestividade da presente reclamação com referência a decisão comunicada ao abrigo do ofício n.º 86145 de 15.11.2013, é ponto assente que o presente recurso tem de proceder, impondo-se a revogação da sentença recorrida e a baixa dos autos ao Tribunal recorrido para apreciação da Reclamação.
4. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em conceder provimento ao recurso, revogar a decisão recorrida, ordenando-se a baixa dos autos para apreciação da Reclamação.
Sem custas.
Notifique-se. D.N..
Porto, 15 de Maio de 2014
Ass. Pedro Vergueiro

Ass. Mário Rebelo

Ass. Irene Neves