Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00801/06.6BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:03/04/2010
Relator:Álvaro Dantas
Descritores:INCENTIVOS FINANCEIROS - PRESCRIÇÃO - LEGALIDADE DA LIQUIDAÇÃO - OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
Sumário:1. O prazo de prescrição da obrigação de restituição de incentivos financeiros concedidos ao abrigo do DL 194/80, de 19 de Junho, é o prazo ordinário de 20 anos e conta-se a partir do momento em que, por despacho, foi declarada a caducidade desses incentivos;
2. A ilegalidade da liquidação só é susceptível de discussão na oposição à execução fiscal quando é a própria lei que não prevê meio de impugnação contenciosa e não quando esse meio de reacção não foi posto à disposição do sujeito passivo, por ter sido omitida a necessária notificação.
3. A convolação da oposição na forma processual adequada é inviável nas situações em que ocorre uma cumulação de fundamentos e relativamente a um desses fundamentos a forma processual eleita é a legalmente prevista.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. Relatório

Rocha & , Lda. (doravante, Recorrente), dizendo-se inconformada com a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que julgou improcedente a oposição à execução fiscal com o 2321200601004964 que contra si foi instaurada e corre termos no Serviço de Finanças de Ponte de Lima, dela veio interpor o presente recurso.

Em sede de alegações, concluiu a Recorrente do seguinte modo:
1 - Ora, a Recorrente não conforma com a decisão proferida nos presentes autos.
2 - Porquanto, quanto à prescrição da dívida, na versão da recorrente a dívida a que os presentes autos se reportam encontra-se prescrita e, como tal deveria a referida oposição ser declarada procedente e, consequentemente extinguir-se o acto tributário - cf. nº 2, do artigo 5° do DL 398/98 de 17 de Dezembro e art. 48° da LGT.
3 - Na versão da recorrida a referida dívida não se encontra prescrita, porquanto, no caso sub judice não estão em causa impostos abolidos, mas sim incentivos financeiros, pelo que o regime da prescrição aplicado é o estatuído nos artigos 306° e 309° do Código Civil.
4 - O Meritíssimo Juiz a quo acolheu a tese da ora Recorrida e, em consequência, declarou a excepção da prescrição improcedente, daí a primeira razão do presente recurso.
5 - Além disso, salvo o devido respeito por outra opinião, entende-se que a dívida ora reclamada tem por base não só os incentivos financeiros, mas, também, incentivos fiscais, como sejam a contribuição industrial e imposto complementar secção B, reintegrações e amortizações e custos ou perdas do exercício, para efeitos do art. 26° do Código da Contribuição Industrial.
6 - Assim, o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, Processo nº 0429/02, contencioso tributário - 1 ° juízo liquidatário, de 29/06/2004 decidiu que “Ora, estando em causa, pelo menos em parte impostos abolidos nos termos do nº 2, do art. 5° do DL 398/98 de 17 de Dezembro, que aprovou a Lei Geral Tributária e, assim, tendo sido ultrapassado o prazo prescricional em relação a essas obrigações, estaremos face a uma situação em que as liquidações acabam sendo atingidas por via da obrigação tributária originária estar prescrita, situação aliás compreensível, na harmonia do sistema tributário, pois, que não teria qualquer sentido estar-se em sede de impugnação e/ou recurso a avançar com a apreciação contenciosa de uma liquidação, cuja originária obrigação tributária se encontra prescrita, devendo assim ser sentenciada em sede de execução fiscal". Neste sentido, ainda, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, CT, de 20/12/2000, no recurso nº 025616.
7 - Quanto à ilegalidade do despacho do Exmo. Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, de 30/09/1996.
8 - A Recorrente em 05 de Julho de 1982 foi notificada do despacho de concessão provisória dos incentivos previstos nos artigos 12° e 13° da Lei 194/80. Posteriormente, em 08 de Novembro de 1996, foi aquela notificada do despacho definitivo, que determinou a caducidade dos incentivos fiscais e financeiros provisoriamente concedidos. Sem que o referido despacho tivesse previsto prazo de impugnação.
9 - Mesmo assim, a Recorrente, em exposição por si enviada ao Ministro das Finanças, entre outros factos, requereu o pagamento da dívida em trinta e seis prestações. Ficando a aguardar a respectiva resposta, que nunca chegou.
10 - Somente em 07 de Setembro de 2005 foi notificada, para proceder ao depósito no prazo de trinta dias da quantia de € 31.395,83 e, nunca para exercer qualquer direito de audição e, muito menos recepcionou qualquer resposta ao seu requerimento de 1996.
11 - Ora, salvo o devido respeito por outra opinião, as notificações proferidas pela Administração Central aos contribuintes, devem conter a súmula do objecto da notificação, dos fins a que a mesma se destina, das disposições legais com base nas quais as mesmas são efectuadas e, ainda de todos os meios de que o contribuinte se pode socorrer para a sua defesa.
12 - O que nunca aconteceu no caso sub judice.
13 - Assim, contrariamente ao alegado não foi dado à ora Recorrente o direito de se defender através de qualquer meio legal e, nomeadamente, para deduzir impugnação, ou reagir e questionar quer a legalidade do despacho proferido, quer a dívida exequenda, ou ainda qualquer outro fundamento previsto no art. 99° da LGT.
14 - Pelo que, se entende que o fundamento invocado na oposição se enquadra na alínea h) do art. 204° do CPPT.
Não houve contra-alegações.

Neste Tribunal, o Digno Magistrado do Ministério Público emitiu douto parecer no qual, após muito aprofundada análise das questões em litígio, concluiu no sentido de ser negado provimento ao recurso.

Colhidos os vistos legais cumpre agora decidir já que a tal nada obsta.

As questões a decidir:
As questões sob recurso, suscitadas e delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, nos termos dos artigos 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, nºs 3 e 4 e 690.º, n.º 1 todos do Código de Processo Civil (CPC) “ex vi” art. 2º alínea e) do CPPT, são as seguintes:

- A questão de saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento de direito por ter considerado que não ocorre a prescrição da dívida exequenda;
- A questão de saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento de direito por ter considerado que os fundamentos invocados pela Oponente, à excepção da prescrição, não são enquadráveis nos fundamentos de oposição à execução fiscal.

2. Fundamentação
2.1. De facto
2.1.1. Matéria de facto dada como provada na 1ª instância
É a seguinte a matéria de facto dada como provada na 1ª instância e que aqui se reproduz ipsis verbis:

FACTOS PROVADOS
Pelos documentos juntos aos autos com relevância para o caso, considero provados os seguintes factos:

1. Foi deduzida execução fiscal nº 2321-06/900008.9, por dívidas proveniente de incentivos fiscais e financeiros, concedido à oponente no ano de 1982, ao abrigo do Sistema Integrado de Incentivos ao Investimento (SIII), no montante de 31 395.83 €, nos termos do art. 12° e 13° do Dec-lei nº 194/80 de 16.06;
2. Por despacho de 30.09.1996, do Senhor Secretário do estado dos Assuntos Fiscais, revogou o despacho provisório, determinando a caducidade dos incentivos recebidos pela oponente;
3. Em 07.09.2005 a oponente foi notificada para repor ao Estado a quantia de 31 395.83 €;
4. Em 27.04.2006 foi instaurado o processo de execução fiscal para cobrança da dívida exequenda;
5. Em 04.05.2006 foi citado para proceder ao pagamento ou para deduzir oposição;
6. Em 08.06.2006 foi deduzida a presente oposição;

Alicerçou -se a convicção do Tribunal na consideração dos factos provados nos teores dos documentos constantes dos autos.
Não resultam provados ou não provados quaisquer outros factos com interesse para a decisão.

2.1.2. Alteração oficiosa da matéria de facto provada
Ao abrigo do disposto na norma do artigo 712º nº 1 alínea a) do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 2º alínea e) e 281º do CPPT, iremos proceder à alteração da matéria de facto provada com base nos documentos que se discriminam após cada um dos factos:

1. No Serviço de Finanças de Ponte de Lima foi instaurada contra a sociedade comercial Rocha , Lda., ora Recorrente, a execução fiscal com o nº 2321200601004964 - (cf. fls. 24 dos autos).
2. Serve de base à execução referida na alínea anterior a “Certidão nº 70/2005” emitida pela Direcção-Geral do Tesouro do Ministério das Finanças e da Administração Pública, cujo teor consta de fls. 33 dos autos e aqui se dá por reproduzido integralmente e da qual consta, entre o mais, o seguinte “(…) certifica, para efeito do disposto no artigo 4º do DL nº 210/95, de 17 de Agosto, com a redacção que lhe foi dada pelo D.L. nº 246/96, de 21 de Dezembro e pelo art. 103º, da Lei 60-A/2005, de 30 de Dezembro, que Rocha & , Lda. (…), é devedora ao Estado, da quantia de 32.163,09 (trinta e dois mil cento e sessenta e três euros e nove cêntimos), por não ter procedido ao reembolso de incentivos financeiros concedidos a título provisório, nos termos do Despacho Definitivo do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais de 30 de Setembro de 1996, proferido no âmbito do D.L. nº 194/80, de 19 de Junho, conforme se discrimina: (…)” – (cf. fls. 33 dos autos).
3. A Direcção de Finanças de Viana do Castelo enviou à Oponente ofício datado de 8 de Novembro de 1996 com o seguinte teor: “Para conhecimento e devidos efeitos, tenho a honra de enviar a V. Exa. fotocópia do despacho definitivo exarado em 30/09/96, pelo Senhor secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, por delegação do Sr. Ministro das Finanças. Tenho ainda a honra de comunicar a V. Exa. que o despacho de concessão provisória proferido em 5/07/82, fica revogado, cuja cópia se anexa.” - (cf. fls. 109 dos autos).
4. O “despacho definitivo” do Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais datado de 30 de Setembro de 1996, tem o seguinte teor: “Nos termos do nº 1 do art. 2º do D.L. 210/95, de 17 de Agosto, determino a caducidade dos incentivos fiscais e financeiros provisoriamente concedidos à empresa “Rocha , Lda.” em, virtude da pontuação final do projecto não atingir o limiar mínimo estipulado nº 3 do artigo 8º do D.L. 194/80. Fica deste modo revogado o despacho de concessão provisória de incentivos proferido em 5 de Julho de 1982. (…)” – (cf. fls. 110 dos autos).
5. O “despacho de concessão provisória” referido na alínea anterior datado de 5 de Julho de 1982 tem o seguinte teor: “Nos termos do nº 1 do art. 41º do D.L. 194/80, determino que sejam concedidos à Empresa “Rocha & , Lda.”, os incentivos fiscais e financeiros propostos pela Direcção-geral das Contribuições e Impostos e pelo Banco de Portugal: Incentivos Fiscais: - Contribuição Industrial e Imposto Complementar, Secção B – isenção por sete anos; - Reintegrações e Amortizações – aceleração para o dobro durante dez anos, relativamente aos bens do activo imobilizado integrado no projecto de investimento; - Custos ou perdas do exercício para efeitos do artigo 26º do Código de Contribuição Industrial – consideração como custo, da totalidade dos gastos suportados com a formação e aperfeiçoamento de pessoal. Incentivos financeiros: os correspondentes à taxa básica de bonificação de 8,506%. A concessão destes incentivos fica condicionada à realização, sujeita a verificação, dos objectivos constantes do projecto de investimento, dentro dos correspondentes prazos” – (cf. fls. 111 e 112 dos autos).
6. Em 7 de Agosto de 2005, a Oponente recebeu o ofício que consta de fls. 30 dos autos e cujo teor aqui se dá por reproduzido e do qual consta, entre o mais, o seguinte: “No âmbito do processo de concessão de incentivos financeiros, foi atribuído a essa empresa, ao abrigo do Sistema Integrado de Incentivos ao Investimento (SIII), um subsídio de 31.395,83 euros. Entretanto, tendo em consideração o despacho ministerial de concessão definitiva desses mesmos incentivos, oportunamente remetido a V. Exas. Que veio determinar a caducidade dos incentivos recebidos, verifica-se a necessidade dessa empresa repor ao Estado os mesmos. Nesta conformidade, solicita-se a V. Exas que seja depositada no prazo de 30 dias contados a partir da data desta notificação, a quantia de 31.395,83 euros (…)” – (cf. fls. 30, 31 e 32 dos autos).

Em consequência da alteração da matéria de facto que antecede, os factos anteriormente numerados com os nºs 4, 5 e 6 passam a ter os números 7, 8 e 9.

2.2. De direito
2.2.1. Questão de saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento de direito por ter considerado que não ocorre a prescrição da dívida exequenda

Alega a Recorrente a dívida exequenda reporta-se não apenas a incentivos financeiros mas também fiscais e que estes se reportam a impostos abolidos, estando, por isso, prescritas as obrigações tributárias correspondentes.

Salvo o devido respeito, a recorrente não tem razão.

Desde logo, deveremos começar por salientar que, ao contrário do que sustenta a Recorrente, a dívida exequenda, tal como resulta do título executivo, reporta-se exclusivamente a incentivos financeiros que lhe foram concedidos ao abrigo do DL 194/80, de 19 de Junho, que criou o chamado Sistema Integrado de Incentivos ao Investimento (SIII) e não já a incentivos fiscais.

Isto assente, diremos sobre a questão de saber se ocorreu a prescrição da obrigação exequenda aquilo que se consignou em fundamentação do acórdão STA 25 Mar. 2009, recurso 918/08, disponível em www.dgsi.pt, e que merece a nossa inteira concordância: “A concessão dos incentivos previstos neste diploma [DL 194/80] ficava condicionada à realização dos objectivos constantes do projecto de investimento, dentro dos correspondentes prazos, bem como à observância das demais condições eventualmente constantes da decisão que os concedia.

O não cumprimento desses objectivos e condições implicava, nos termos do n.º 3 do artigo 43.º do citado DL, além da caducidade de todos os benefícios concedidos à empresa promotora, a obrigação de, no prazo de trinta dias a contar da respectiva condição, restituir as importâncias correspondentes aos benefícios financeiros já recebidos, acrescidas de juros calculados à taxa aplicável a operações activos de prazo correspondente.

A caducidade destes incentivos financeiros era declarada por despacho do Ministro das Finanças e do Plano, de acordo com o disposto no n.º 4 do artigo 43.º do DL 194/80, de 19/6.

A concessão de tais benefícios ficava, assim, sujeita a uma condição resolutiva (artigo 270.º do CC), isto é, a um evento futuro e incerto, sendo que tais benefícios só se consolidavam na esfera jurídica do beneficiário a partir do momento em que se verificassem as condições e objectivos esperados do investimento realizado.

E só o não cumprimento destes, implicava a declaração da caducidade dos incentivos atribuídos, com a consequente obrigação de restituição das importâncias correspondentes aos benefícios recebidos.

Ou seja, nos termos do regime definido no aludido artigo 43.º do DL 194/80, de 19/6, criam-se, como contrapartida da concessão dos benefícios, obrigações autónomas de pagamento de quantias, subordinadas à condição resolutiva que impende sobre a concessão de incentivos de «não cumprimento dos objectivos e condições».

No caso de incentivos financeiros, a obrigação que é contrapartida da concessão consiste na restituição das quantias recebidas.

A fonte desta obrigação não é o despacho de concessão dos benefícios financeiros mas sim o facto de não serem cumpridos os objectivos e as condições a que estava subordinada a concessão de incentivos.

Tal obrigação só se constitui, pois, pelo facto de não serem cumpridos tais objectivos e condições a que estava subordinada a concessão de incentivos, e tal incumprimento há-de resultar da declaração de caducidade dos incentivos efectuada por despacho do Ministro das Finanças.

Por isso, o direito a exigir a restituição de tais quantias só a partir daí pode ser exercido.

Ora, se o prazo de prescrição, por força do que dispõe o n.º 1 do artigo 306.º do CC, começa a correr assim que o direito puder ser exercido, no caso em apreço, esse prazo há-de contar-se, pois, a partir do momento em que, por despacho (…) foi declarada a caducidade dos incentivos financeiros concedidos à oponente, com a consequente revogação do despacho que os concedeu”no mesmo sentido, acórdão STA 27 Mai. 2009, recurso, 211/09, disponível em www.dgsi.pt.

Por outro lado, o prazo de prescrição da referida obrigação de restituição é o prazo ordinário de 20 anos a que alude o artigo 309º do Código Civil – é também neste sentido jurisprudência pacífica do STA, entre outros, acórdão STA 25 Mar. 2009, recurso 918/08 e acórdão STA 27 Mai. 2009, www.dgsi.pt.

Assim, contando o prazo de 20 anos a partir do momento em que foi declarada a caducidade dos incentivos financeiros (30 de Setembro de 1996) é manifesto que não ocorreu a alegada prescrição – sempre se diga que, mesmo que estivessem em causa os incentivos fiscais, não seria aplicável o regime da prescrição das dívidas tributárias uma vez que, como se referiu no acórdão STA 19 Dez. 2007, recurso 617/07, disponível em www.dgsi.pt, “não se trata, aqui, directamente, de pagamento dos impostos devidos, mas do pagamento de uma quantia como contrapartida da concessão de incentivos financeiros, derivada do não cumprimento dos objectivos ou condições a que a concessão ficou subordinada, obrigação esta que é autónoma e distinta das obrigações de pagamento do imposto que poderiam resultar das respectivas liquidações, autonomia essa que, aliás, é evidenciada pela taxa de juros compensatórios especialmente fixada, de 12% ano, que não coincide com a taxa desses juros prevista quer no art. 80.º do CIRC. Isto é, a obrigação prevista no art. 43.º DL n.º 194/80 não é directamente de pagamento dos impostos que não foram liquidados acrescida dos juros compensatórios que deveriam ser cobrados, mas, como resulta do seu texto, uma obrigação distinta, de pagamento de importâncias correspondentes às receitas fiscais não arrecadadas, acrescidas do juro compensatório de 12% ao ano. A fonte desta obrigação não são já os factos tributários que são considerados para cálculo da importância a pagar, mas sim o facto de não serem cumpridos os objectivos e condições a que estava subordinada a concessão de incentivos. Como resulta literalmente do texto do citado n.º 3 do art. 43.º, é esse não cumprimento dos objectivos e condições que «implicará, além da caducidade de todos os benefícios concedidos à empresa promotora, a obrigação de, no prazo de trinta dias a contar da respectiva notificação», pagar as quantias referidas nas suas alíneas a) e b).

2.2.2. Questão de saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento de direito por ter considerado que os fundamentos invocados pela Oponente, à excepção da prescrição, não são enquadráveis nos fundamentos de oposição à execução fiscal

Esta questão foi ponderada na sentença recorrida nos seguintes termos: “Na sua petição o oponente invoca ilegalidade do despacho do senhor Secretario de Estado dos Assuntos Fiscais, proferido em 30.09.1996, o qual determinou a caducidade dos incentivos fiscais e financeiro concedido á oponente alegando não ter sido exercido o direito de audição e de falta de fundamentação, para além de desconhecer quais as condições e objectivos do empreendimento realizado pela oponente que não foram cumpridos estando convencida que atingiu, pelo menos, os limites mínimos previstos no art. 8° do Dec- Lei n° 194/80 de 16.07 . O art. 204°do CPTT estabelece taxativamente os motivos em que pode ser deduzida oposição. O vício de violação de lei - ilegalidade da liquidação do imposto que deu origem à execução a que a presente oposição respeita - não é fundamento de oposição”.

Contra este entendimento, insurge-se a Recorrente alegando que, quando foi notificada do despacho definitivo que determinou a caducidade dos incentivos fiscais e financeiros e que originou a dívida exequenda, dessa notificação não constava o prazo de que dispunha para a respectiva impugnação e, por isso, conclui que não lhe foi dada qualquer oportunidade para reagir contenciosamente contra o referido despacho.

Vejamos.

Não suscita dúvidas que a Recorrente, na douta petição inicial, abstraindo agora da questão da prescrição, limitou-se à invocação de vícios atinentes à legalidade do acto que determinou a caducidade dos incentivos financeiros e fiscais que lhe foram concedidos, mais concretamente o vício da falta da fundamentação legalmente exigida, o vício de preterição da audiência prévia da Recorrente e o vício de violação de lei.

Dito de outra forma, temos por pacífico que o Recorrente, através da presente oposição, pretende discutir a legalidade, em concreto, do acto do qual emergiu a obrigação exequenda.

Será isso legalmente admissível? A resposta é, como já decorre da sentença recorrida, negativa.

Estabelece-se no artigo 204º do CPPT:
1. A oposição só poderá ter algum dos seguintes fundamentos:
(…)
h) Ilegalidade da liquidação da dívida exequenda, sempre que a lei não assegure meio judicial de impugnação ou recurso contra o acto de liquidação;
(…)”.

Resulta da citada norma que a ilegalidade em concreto do acto que originou a dívida exequenda só poderá ser invocada como fundamento de oposição à execução fiscal quando a lei não previr meios para a respectiva impugnação contenciosa.

Embora a lei se refira, na sua letra, à ilegalidade da “liquidação”, a mesma abrange, naturalmente, outros actos dos quais resultem obrigações exigíveis coercivamente através do processo de execução fiscal. Como se refere no acórdão STA 23 Out. 2002, processo 0966/02, www.dgsi.pt, “nos casos em que não existe um acto de liquidação propriamente dito, não deve admitir-se a discussão da sua legalidade quando a lei prevê a sua impugnação contenciosa, não podendo, pois, deslocar-se a respectiva sindicância judicial para o meio processual de oposição à execução”.

No caso concreto, é manifesto que o acto de declaração de caducidade dos incentivos financeiros e fiscais consubstancia um acto administrativo sujeito, como tal e nos termos gerais, a impugnação contenciosa.

Assim, impõe-se a conclusão de que bem andou a sentença recorrida ao ter considerado inviável a sustentação da presente oposição em fundamentos que se reconduzem à discussão da legalidade, em concreto, do acto administrativo do qual resultou a dívida exequenda.

Não colhe, em contrário, a alegação da Recorrente segundo a qual, da notificação que lhe foi efectuada não constava a indicação dos meios de que se poderia socorrer para a sua defesa e que, por isso, não lhe foi dado o direito de se defender (cf. conclusões 11 a 13).

Isto porque, a ilegalidade da liquidação só é susceptível de discussão na oposição à execução fiscal quando é a própria lei que não prevê meio de impugnação contenciosa e não quando esse meio de reacção não foi posto à disposição do sujeito passivo, por ter sido omitida a necessária notificaçãonestes termos, Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e Processo Tributário, anotado e comentado, volume II, 2007, pág. 366. Por maioria de razão, também a discussão da legalidade não será admitida quando esteja em causa, como na situação sub judice, uma notificação meramente irregular.

Sempre se diga que não há aqui que colocar a questão da convolação da oposição na forma processual adequada porquanto este mecanismo correctivo não é utilizável nas situações em que, como sucede no caso presente, ocorre uma cumulação de fundamentos e relativamente a um desses fundamentos a forma processual eleita é a legalmente prevista – neste mesmo sentido, Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, volume II, 2007, pág. 116.

De tudo o que vimos de dizer se conclui que a sentença recorrida julgou bem e que, por isso, deverá ser mantida, assim improcedendo o presente recurso.

3. Decisão
Assim, pelo exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em:
Negar provimento ao recurso.
Custas pela Recorrente.
Porto, 4 de Março de 2010
(Álvaro Dantas)
(Moisés Rodrigues)
(Francisco Rothes)