Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00338/13.7BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:12/18/2014
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Ana Patrocínio
Descritores:COMPETÊNCIA EM RAZÃO DA MATÉRIA
PENSÃO COMPLEMENTAR
RECEITAS PARAFISCAIS
Sumário:I – A fundamentação da sentença é aquela que se encontra expressamente transcrita na mesma, consubstanciada em citação de acórdão do STA, não sendo causa da nulidade prevista no artigo 125.º, n.º 1 do CPPT, pois não constitui falta de motivação da sentença o facto de assentar numa transcrição.
II - A competência do tribunal, em razão da matéria, afere-se em função da relação material controvertida, atendendo aos termos em que é formulada a pretensão do autor, incluindo os seus fundamentos.
III - A CGA exerce uma função administrativa, dotada dos devidos poderes de autoridade na fixação de pensões de aposentação e sobrevivência.
IV - Assim, se praticou actos administrativos considerando a recorrente responsável por pensões complementares ao abrigo do DL n.º 141/79, de 22 de Maio, e a notificou para ir efectuando os pagamentos que se vão vencendo, é o tribunal administrativo o competente para conhecer da legalidade ou ilegalidade de tais pensões e não o tribunal tributário através do meio processual da impugnação judicial, uma vez que não estamos aqui perante mera liquidação de receitas parafiscais, antes perante actos administrativos dos quais resultam os valores a pagar.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:A..., SA
Recorrido 1:Caixa Geral de Aposentações
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Relatório

A…, S.A., interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto (TAF), proferida em 14/02/2014, que julgou aquele TAF (área tributária) incompetente, em razão da matéria, para conhecer da impugnação judicial deduzida contra a Caixa Geral de Aposentações (CGA), versando actos desta de fixação de encargos com pensões de aposentação e de sobrevivência, e competente o TAF, área administrativa; apresentando, para o efeito, alegações nas quais concluiu:
A) A Recorrente/A… impugnou judicialmente as liquidações de que foi notificada e que lhe foram enviadas pela Entidade Recorrida/CGA, ou seja, impugnou cada um dos actos de liquidação que fixaram a concreta contribuição alegadamente devida pela A... para o financiamento daquela CGA, pretendendo ver apreciada a sua legalidade.
B) São duas as questões que se levantam: saber se a sentença está ferida de nulidade e, subsidiariamente, saber se enferma de vício de julgamento.
C) Ora, a sentença é efectivamente nula, por violação do disposto no artigo 668.º, n.º1, alínea b) do C.P.C., porquanto não se encontra fundamentada de direito, nem sequer de facto, não explicando o tribunal recorrido em que medida é que a CGA actua mensalmente, para com a Recorrente A..., no âmbito dos seus poderes de autoridade, delineando-se entre ambas uma relação jurídico-administrativa.
D) Por outro lado, ainda que assim não se entenda, sempre se impõe que a sentença deva ser revogada e substituída por uma outra que conclua pela competência da jurisdição tributária, por a sentença recorrida padecer de vício de julgamento.
E) Salvo o devido respeito por entendimento diverso, o Acórdão proferido no âmbito do Processo n.º 016/11 pelo Tribunal de Conflitos nada tem a ver com a situação dos autos.
F) A questão sub iudice nada tem a ver com as pensões concretas que a CGA entende ser de pagar a cada um dos 4 subscritores referidos na p.i.; tem sim a ver com a concreta contribuição da Recorrente para a pensão global que aqueles beneficiários auferem mensalmente da CGA.
G) Os descontos para a CGA são verdadeiras quotizações sociais com natureza parafiscal que se encontram no âmbito das imposições financeiras públicas a favor de organismos do Estado - os actos impugnados são, pois, actos tributários parafiscais (artigo 3.º/1 da LGT).
H) Os documentos que corporizam os actos impugnados materializam todos os elementos típicos e constitutivos de uma liquidação (concretamente, o valor a pagar, o período a que se reportam as obrigações, a sua espécie, a data limite de pagamento e a entidade responsável pelo pagamento).
I) Os tribunais tributários são, nos termos do artigo 49.º/1/a)/i) do ETAF, os competentes para conhecer das acções de impugnação dos actos de liquidação de receitas parafiscais.
J) Nos termos do artigo 97.º/1/a) do CPPT, o processo judicial tributário compreende a impugnação da liquidação dos tributos, incluindo os parafiscais.
K) O quid disputatum impõe que se conclua pela competência do tribunal tributário, por o meio competente, para a apreciação da legalidade da fixação de cada um dos encargos mensais, ser a impugnação judicial prevista no CPPT.
L) A Caixa Geral de Aposentações, I.P., é um instituto público que tem por missão gerir o regime de segurança social público em matéria de pensões de aposentação, de reforma, de sobrevivência e outras de natureza especial (cfr. artigo 3.º do DL n.º 84/2007, de 29.03), sendo, nesta matéria, semelhante ao Instituto da Segurança Social, I.P..
M) Os descontos para a Caixa Geral de Aposentações são verdadeiras quotizações sociais com natureza parafiscal que se encontram no âmbito das imposições financeiras públicas a favor de organismos do Estado.
N) Sobre esta matéria, interessa lembrar o que tem sido decidido pelos tribunais superiores, destacando-se, por exemplo:
n.1) os Acórdãos do Tribunal dos Conflitos de 23.06.2006 (Proc. n.º 24/05), de 19.10.2006 (Proc. n.º 9/06), de 29.06.2005 (Proc. n.º 1/05, de 19.11.2009 (Proc. n.º 015/08);
n.2) o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 08.04.2008 (proc. n.º 02211/08);
n.3) o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 04.11.2011 (Proc. n.º 00086/11.2BECBR;
n.4) os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 24.10.1996 (Processo n.º 039 623), de 11.02.2004 (Proc. n.º 01927/03) e de 23.05.2007 (Processo n.º 063/07), de 24.03.2004 (Recurso n.º 1906/03).
O) A decisão recorrida violou, pois, o artigo 49.º/1/a)/i) do ETAF, o artigo 3.º/1 da LGT, o artigo 97.º/1/ do CPPT e o art. 668.º/1/b) do CPC.
Revogando-a e substituindo-a por douto acórdão que julgue competente a jurisdição tributária para apreciação da acção e, consequentemente, que ordene ainda o prosseguimento dos autos, far-se-á JUSTIÇA!
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Não houve contra-alegações.
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O Ministério Público junto deste Tribunal requereu a baixa dos autos ao tribunal recorrido, a fim de ser apreciada a arguida nulidade da decisão, nos termos do disposto nos artigos 615.º, n.º 1, alínea b) e 617.º, n.º 1/5 do Código de Processo Civil (CPC) ex vi artigo 2.º, alínea e) do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT). Na medida em que o juiz a quo não se pronunciou sobre a invocada nulidade, tendo-se limitado a referir que “a sentença recorrida não padece de qualquer nulidade, encontrando-se fundamentada de facto e de direito, com correcta interpretação e aplicação dos factos e do direito, pelo que a mantenho”, sem expor qualquer fundamento nesse sentido.
Entende este tribunal que o juiz a quo não omitiu o despacho previsto no artigo 617.º, n.º 1 do CPC, pois tendo sido suscitada a questão da nulidade da sentença, com motivação na não especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificaram a decisão, se considera, com o despacho proferido, que pretendeu remeter para os fundamentos de facto e de direito que constam da própria sentença recorrida, que expressamente mantém.
De todo o modo, este tribunal não considera indispensável a baixa dos autos, nos termos do artigo 617.º, n.º 5 do CPC, pelo que os mesmos prosseguem para conhecimento do objecto do recurso.
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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.
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O objecto do recurso resume-se à apreciação da suscitada nulidade e a saber se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento.

II. Fundamentação

Começando pela nulidade da decisão, sustenta a recorrente que a sentença recorrida não especificou os fundamentos de facto e de direito que justificam a sua decisão.
Na verdade, a sentença recorrida tem o seguinte teor:
«A... –, S.A. veio deduzir impugnação judicial contra os actos de fixação de encargos com pensões de aposentação e de sobrevivência, relativos aos períodos de Novembro e Dezembro de 2012 e Janeiro de 2013, praticados pela Caixa Geral de Aposentações.
A impugnante pretende ver apreciada a legalidade dos actos de liquidação praticados pela Caixa Geral de Aposentações que fixaram e lhe impuseram o pagamento de determinadas quantias, a título de encargos com pensões de aposentação e de sobrevivência relativas a trabalhadores que, durante parte da sua vida, estiveram ao seu serviço.
Na contestação apresentada, a entidade demandada, Caixa Geral de Aposentações, invocou, além do mais, a incompetência absoluta do Tribunal, em razão da matéria.
Dada vista ao Ministério Público, foi emitido parecer no sentido da procedência da excepção invocada, por se entender que a impugnante pretende a apreciação de um acto administrativo que não tem natureza tributária.
Vejamos:
No processo de impugnação nº 431/10.8BEPRT, que corre termos neste Tribunal e em que se discute matéria idêntica a esta, havendo identidade de partes, foi proferido acórdão pelo STA, em 23.10.2013 (rec. nº 0641/13), confirmando a sentença que considerou o Tribunal incompetente em razão da matéria.
Concordamos inteiramente com o teor do referido aresto, que passamos a citar e seguiremos de perto.
“Escreveu-se no acórdão do Tribunal dos Conflitos, de 20.06.2013 – Processo nº 016/11, para além do mais, o seguinte:
“A competência dos tribunais administrativos e fiscais está definida no art. 212º, nº 3 da CRP:
“Compete aos tribunais administrativos e fiscais o julgamento das acções e recursos contenciosos que tenham por objecto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais.”
E está também fixada no art. 1°, nº 1 do ETAF (correspondente ao art. 3º do ETAF/84):
“Os tribunais da jurisdição administrativa e fiscal são os órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo, nos litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais”.
O quadro legal transcrito aponta pois para a consideração dos tribunais administrativos como os tribunais ordinários da jurisdição administrativa, competindo-lhes o exercício da justiça administrativa, ou seja, o julgamento dos litígios emergentes de relações jurídicas administrativas, não podendo, em princípio, os litígios emergentes de relações dessa natureza ser dirimidos por outros tribunais (cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3ª ed., pg. 814). As relações jurídicas administrativas são as reguladas por normas de direito administrativo, ou seja, “normas que regulam as relações estabelecidas entre a Administração e os particulares no desempenho da actividade administrativa de gestão pública” (Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, Vol. I, pg. 134), ou, segundo a jurisprudência do Pleno do STA e do Tribunal dos Conflitos, “os vínculos que intercedem entre a Administração e os particulares (ou entre entidades administrativas distintas) emergentes do exercício da função administrativa” (Ac. do Pleno do STA de 16.04.97 - Rec. nº 31.873, e Ac. deste Tribunal dos Conflitos de 28.11.2000 - Proc. 345).
Por outro lado, a competência dos tribunais é normalmente aferida em função dos termos em que a acção é proposta, ou seja, tendo em conta o pedido e a causa de pedir tal como se encontram formulados pelo Autor (Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, 1979, pág. 91)”.
Atento o teor do pedido da recorrente e embora aparentemente pareça que estamos perante liquidações de receitas parafiscais (à semelhança do que sucede com as contribuições para a Segurança Social), entendemos que não é essa a situação dos autos.
Na verdade, no caso dos autos, a CGA exercendo uma função administrativa e dotada de poderes de autoridade, praticou actos administrativos de concessão de pensões de aposentação e de sobrevivência e considerou a recorrente responsável por pensões complementares ao abrigo do diploma acima citado.
Sendo assim, não estamos perante meros actos de liquidação de receitas parafiscais, antes perante liquidações decorrentes de actos administrativos. E são estes que devem ser atacados.
É certo que a fixação da pensão em si, é matéria alheia à recorrente. Já assim não é (são), todavia, o(s) acto(s) administrativo(s) praticado (s) pela CGA, que ao abrigo do DL nº 171/79, de 22 de maio, imputa(m) a mesma a responsabilidade pelas pensões complementares.
Deste modo, estabeleceu-se entre a recorrente e a recorrida uma relação jurídico administrativa, tal como delineada no acórdão acima transcrito e para cujo diferendo são competentes os tribunais administrativos.”
Seguindo o entendimento sufragado no acórdão transcrito, considera-se que a apreciação da legalidade dos encargos em apreço compete ao tribunal administrativo, pelo que este Tribunal é materialmente incompetente. (…)»
Com efeito a sentença recorrida, apreciando a invocada excepção de incompetência em razão da matéria do tribunal, transcreveu o acórdão do STA, de 23/10/2013, proferido no âmbito do processo n.º 431/10.8BEPRT (recurso n.º 0641/13), e, com base na fundamentação constante daquele acórdão, julgou procedente a respectiva excepção de incompetência do tribunal. Ora, ao seguir a jurisprudência de um tribunal superior o tribunal a quo adoptou a posição ali expressa, e repare-se que não se trata de uma mera remissão, o tribunal transcreveu a parte do acórdão relevante para o caso dos autos e fez constar a sua fundamentação na sentença. Saliente-se que o âmbito e objecto do processo n.º 431/10.8BEPRT são absolutamente idênticos aos presentes autos, somente com a nuance de se referir a encargos respeitantes aos meses de Novembro e de Dezembro de 2009, enquanto o presente processo se reporta aos meses de Novembro de 2012, Dezembro de 2012 e Janeiro de 2013.
Deste modo, a fundamentação da sentença é aquela que se encontra expressamente transcrita na mesma, consubstanciada na citação do acórdão do STA, não constituindo falta de motivação da sentença o facto de assentar numa transcrição, pelo que não se verifica a nulidade invocada.
Note-se, ainda, que estava em causa somente a apreciação da excepção de incompetência do tribunal para decidir o presente pleito.
Ora, a competência em razão da matéria afere-se pelo pedido formulado e pela natureza da relação jurídica que serve de fundamento a esse pedido (causa de pedir), tal como a configura o autor – cfr. neste sentido abundante jurisprudência e, na doutrina, Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, 1ª ed., vol. I, página 88.
A sentença recorrida ao mencionar: «A... –, S.A. veio deduzir impugnação judicial contra os actos de fixação de encargos com pensões de aposentação e de sobrevivência, relativos aos períodos de Novembro e Dezembro de 2012 e Janeiro de 2013, praticados pela Caixa Geral de Aposentações.
A impugnante pretende ver apreciada a legalidade dos actos de liquidação praticados pela Caixa Geral de Aposentações que fixaram e lhe impuseram o pagamento de determinadas quantias, a título de encargos com pensões de aposentação e de sobrevivência relativas a trabalhadores que, durante parte da sua vida, estiveram ao seu serviço.»; permite sindicar que o juiz a quo se preocupou em apurar que a questão tratada no acórdão do STA e nos presentes autos era exactamente igual, por referência ao pedido, às causas de pedir e à excepção suscitada.
Assim, uma vez que a apreciação da excepção invocada se afere pelo pedido formulado e pela causa de pedir, tal como configurados pela autora, não havia que reproduzir ipsis verbis o teor da petição inicial, autonomizando-o, pois a decisão da matéria de facto acaba por se encontrar ínsita na sentença recorrida.
Nesta conformidade, não obstante o disposto no artigo 123.º, n.º 2 do CPPT, consideramos que a interpretação do mesmo permite concluir que, no caso, se basta com a referência efectuada na sentença recorrida ao pedido e causa de pedir, conforme transcrito supra.
A não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão constitui causa de nulidade da sentença, nos termos do artigo 125.º, n.º 1 do CPPT. Contudo, in casu, os mesmos mostram-se transcritos na decisão, por excerto do julgamento efectuado no STA. Não existe uma estrita necessidade de apreciar casuisticamente a excepção de incompetência se a situação de facto e de direito é absolutamente idêntica à já julgada no tribunal superior. O facto de se referir acórdão do Tribunal de Conflitos (o STA menciona o acórdão proferido no âmbito do processo n.º 016/11), que a recorrente sustenta “nada ter a ver com a situação dos autos”, não remete para a nulidade em apreciação, mas, eventualmente, para o erro de julgamento.
Em suma, não se verifica a nulidade da sentença arguida pela recorrente.

Resta, agora, apreciar o julgamento da excepção de incompetência do tribunal para decidir o presente pleito.
Reitera-se que a competência em razão da matéria se afere em função da relação material controvertida, atendendo aos termos em que é formulada a pretensão do autor, incluindo os seus fundamentos.
Saber se a configuração fáctica e jurídica que os interessados dão à sua pretensão é ou não correcta, ou se procedem as razões por eles invocadas, é questão que já contende com o mérito do processo e que não deve interferir na decisão sobre a competência do tribunal ou da jurisdição - vide neste sentido, entre muitos, o acórdão do STA, de 09/12/2009, proferido no âmbito do processo n.º 0301/09.
Por este motivo, ater-nos-emos à forma como a ora recorrente configurou a sua acção, mostrando-se suficiente colher directamente essa formulação dos autos.
Aos tribunais administrativos cabe dirimir os litígios emergentes de relações jurídico-administrativas (artigo 1.º, n.º 1, do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, aprovado pela Lei n.º 13/2002, de 19 de Fevereiro, e artigo 212.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa).
Aos tribunais tributários cabe, em particular, conhecer das acções de impugnação relativas a “actos de liquidação de receitas fiscais estaduais, regionais ou locais, e parafiscais (…)” - artigo 49.º, n.º 1, alínea a) i), do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais.
No caso concreto, a impugnante, ora recorrente, invocou a seguinte factualidade:
Estão a ser-lhe imputados encargos com as pensões de sobrevivência e de aposentação de subscritores da Caixa Geral de Aposentações que, durante parte da sua vida activa, estiveram de alguma forma ao seu serviço, no caso, actos de fixação de encargos com pensões de aposentação e de sobrevivência relativos ao período de Novembro de 2012, com o n.º de liquidação 541221503197001, no valor de €1377,57, ao período de Dezembro de 2012, com o n.º de liquidação 541221560651001, no valor de €1377,57, ao período de Janeiro de 2013, com o n.º de liquidação 541231624142301, no valor de €1377,57, praticados pela Caixa Geral de Aposentações.
Invocou o seguinte Direito aplicável:
Decreto-Lei n.º 141/79, de 22 de Maio;
Decreto-Lei n.º 301/79, de 18 de Agosto;
Portaria n.º 514/80, de 12 de Agosto;
Resolução do Conselho de Ministros n.º 219/78, de 15 de Novembro;
Decreto-Lei n.º 571/80, de 15 de Dezembro;
Decreto-Lei n.º 32/2012, de 13 de Fevereiro (alteração do Decreto-Lei n.º 141/79, de 22 de Maio).
Concluindo: porque não existe dispositivo legal nesse sentido, não é imputável à impugnante o valor das pensões complementares de aposentação, reforma ou sobrevivência referentes aos subscritores em causa. Relativamente a três subscritores, à data da publicação do Decreto-Lei n.º 571/80, de 15 de Dezembro, não se encontravam a prestar serviço na A...: o n.º 2 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 141/79 previu que os encargos com as pensões complementares de reforma atribuídas por força do disposto no n.º 1 do mesmo artigo fossem suportados pelos serviços em que o pessoal tivesse sido integrado e não por aqueles em que, mais tarde, o pessoal viesse a prestar serviço ou aí estivesse quando se aposentasse.
E terminou formulando os seguintes pedidos:
a) ser anulados os actos de fixação de encargos com pensões de aposentação e de sobrevivência, praticados pela Caixa Geral de Aposentações, relativos ao período de Novembro de 2012, com o n.º de liquidação 541221503197001, no valor de €1377,57, ao período de Dezembro de 2012, com o n.º de liquidação 541221560651001, no valor de €1377,57, ao período de Janeiro de 2013, com o n.º de liquidação 541231624142301, no valor de €1377,57;
b) ser fixada a indemnização peticionada no artigo 99.º da petição inicial, nos termos conjugados dos artigos 53.º da LGT e 171.º do CPPT.
O que está aqui em causa é, na formulação da própria impugnante, indagar se, perante a lei, a ora recorrente pode ser considerada responsável pelos encargos de aposentação e sobrevivência dos subscritores referidos na petição inicial.
A questão que se coloca é, portanto, a de saber se discutir a legalidade da fixação à A... destes encargos com pensões é - ou não – colocar em crise liquidações consubstanciadas em receitas parafiscais.
Vejamos, então, se existe algum fundamento para nos afastarmos do julgamento efectuado pelo STA e seguido na sentença recorrida.
Insurge-se a recorrente contra o facto de se ter mencionado a fundamentação constante do Acórdão do Tribunal de Conflitos, de 20/06/2013, proferida no âmbito do processo n.º 016/11, por nada ter a ver com a situação dos autos.
Ora, a transcrição de um excerto deste acórdão deveu-se, somente, a aproveitamento de um enquadramento jurídico respeitante à questão da competência dos tribunais administrativos e fiscais, que pode ser comum a muitas outras decisões sobre a mesma excepção. O segmento decisório reportado à subsunção da situação concreta é inédito e nenhum motivo ponderoso foi carreado pela recorrente que nos convença ao afastamento do já decidido pelo tribunal superior, não obstante os inúmeros acórdãos referidos nas suas alegações de recurso:
«(…) Atento o teor do pedido da recorrente e embora aparentemente pareça que estamos perante liquidações de receitas parafiscais (à semelhança do que sucede com as contribuições para a Segurança Social), entendemos que não é essa a situação dos autos.
Na verdade, no caso dos autos, a CGA exercendo uma função administrativa e dotada de poderes de autoridade, praticou actos administrativos de concessão de pensões de aposentação e de sobrevivência e considerou a recorrente responsável por pensões complementares ao abrigo do diploma acima citado.
Sendo assim, não estamos perante meros actos de liquidação de receitas parafiscais, antes perante liquidações decorrentes de actos administrativos. E são estes que devem ser atacados.
É certo que a fixação da pensão em si, é matéria alheia à recorrente. Já assim não é (são), todavia, o(s) acto(s) administrativo(s) praticado (s) pela CGA, que ao abrigo do DL nº 171/79, de 22 de maio, imputa(m) à mesma a responsabilidade pelas pensões complementares.
Deste modo, estabeleceu-se entre a recorrente e a recorrida uma relação jurídico administrativa, tal como delineada no acórdão acima transcrito e para cujo diferendo são competentes os tribunais administrativos (…).»
Sustenta a recorrente que a questão sub iudice nada tem a ver com as pensões concretas que a CGA entende ser de pagar a cada um dos quatro subscritores referidos na petição inicial; tem sim a ver com a concreta contribuição da recorrente para a pensão global que aqueles beneficiários auferem mensalmente da CGA.
Todavia, falece razão à recorrente, pois estão, efectivamente, em causa encargos fixados à A... com pensões complementares de reforma. Salienta-se que “encargos com pensões” pressupõe o pagamento da própria pensão (complementar), divergindo da realidade “prestações ou contribuições para a segurança social” que, unicamente após reunião de determinados requisitos e operações de cálculo, dará origem ao acto de fixação de uma pensão.
Seguindo o entendimento sufragado no acórdão do STA, transcrito na sentença recorrida, considera-se que a apreciação da legalidade dos encargos em apreço compete ao tribunal administrativo, sendo de manter que o tribunal tributário é materialmente incompetente para apreciação do presente pleito. Na verdade, os actos administrativos praticados pela CGA imputam à A..., ao abrigo do DL n.º 171/79, de 22 de Maio, a responsabilidade pelas pensões complementares; sendo as liquidações impugnadas resultantes desses actos administrativos.
Nesta conformidade, não merece provimento, na íntegra, o presente recurso.

Conclusão/Sumário

I – A fundamentação da sentença é aquela que se encontra expressamente transcrita na mesma, consubstanciada em citação de acórdão do STA, não sendo causa da nulidade prevista no artigo 125.º, n.º 1 do CPPT, pois não constitui falta de motivação da sentença o facto de assentar numa transcrição.
II - A competência do tribunal, em razão da matéria, afere-se em função da relação material controvertida, atendendo aos termos em que é formulada a pretensão do autor, incluindo os seus fundamentos.
III - A CGA exerce uma função administrativa, dotada dos devidos poderes de autoridade na fixação de pensões de aposentação e sobrevivência.
IV - Assim, se praticou actos administrativos considerando a recorrente responsável por pensões complementares ao abrigo do DL n.º 141/79, de 22 de Maio, e a notificou para ir efectuando os pagamentos que se vão vencendo, é o tribunal administrativo o competente para conhecer da legalidade ou ilegalidade de tais pensões e não o tribunal tributário através do meio processual da impugnação judicial, uma vez que não estamos aqui perante mera liquidação de receitas parafiscais, antes perante actos administrativos dos quais resultam os valores a pagar.

III. Decisão

Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso e manter a decisão recorrida.

Custas a cargo da recorrente, nos termos da tabela I-B – cfr. artigos 6.º, n.º 2 e 7.º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais.
Porto, 18 de Dezembro de 2014
Ass. Ana Patrocínio
Ass. Ana Paula Santos
Ass. Fernanda Esteves