Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01163/17.1BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:04/26/2018
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Barbara Tavares Teles
Descritores:PRESCRIÇÃO
IVA
Sumário:1.Os factos interruptivos da prescrição previstos no n.º 1 do art. 49.º da LGT têm dois efeitos sobre a prescrição: para além de um efeito instantâneo, qual seja a eliminação do tempo decorrido anteriormente, um efeito duradouro, que consiste em obviar ao início do novo prazo durante o tempo em que estiver pendente o processo que provoca o efeito interruptivo.
2. Assim, interrompido o prazo prescricional por força da instauração de impugnação judicial, só se inicia a contagem do novo prazo após o trânsito em julgado da decisão que puser termo a esse processo.
3. As causas de interrupção ou suspensão da prescrição, antes da entrada em vigor da referida redacção do nº 3 do art. 49º da LGT, devem todas elas ser consideradas autonomamente, para efeitos de contagem do respectivo prazo, em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 12.º do Código Civil.
4. As causas de interrupção ou suspensão da prescrição atendíveis para o cômputo em concreto do prazo de prescrição são as previstas na lei vigente à data da respectiva ocorrência, em LGT, introduzida pela Lei 53-A/2006, ou seja, antes de 01.01.2007, produzem os efeitos que a lei vigente no momento em que elas ocorreram associava à sua ocorrência: eliminam o período de tempo anterior à sua ocorrência e obstam ao decurso do prazo de prescrição, enquanto o respectivo processo estiver pendente ou não estiver parado por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte.
5. Ocorrendo sucessivas causas de interrupção da prescrição, antes da entrada em vigor da referida redacção do nº 3 do art. 49º da LGT, devem todas elas ser consideradas autonomamente, para efeitos de contagem do respectivo prazo, desde que susceptíveis de influir no seu decurso.”*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:R...
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. RELATÓRIO
R..., inconformado com a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Braga que julgou improcedente a reclamação deduzida contra o despacho do Chefe de Serviço de Finanças de Ponte de Lima que, no âmbito do processo de execução fiscal nº232120050100523, indeferiu o requerimento para conhecimento da prescrição da dívida em execução de IVA relativo aos anos de 2000 a 2002, veio dela interpor o presente recurso jurisdicional:
O Recorrente terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:
“CONCLUSÕES
I-A sentença ora recorrida julgou verificada a inutilidade superveniente da lide, relativamente ao reconhecimento da prescrição das dívidas exequendas, no âmbito do processo n.º 2321200501001485,
II- Tendo, no demais, injustamente e sem fundamento válido, julgado improcedente a reclamação apresentada pelo Recorrente, por entender não se verificar a prescrição da dívida exequenda, no âmbito do processo n.º 2321200501001523.
III- Foi instaurado contra o aqui Recorrente processo executivo n.º 2321200501001523, tendo por objeto dívidas decorrentes de Imposto sobre o Valor Acrescentado, referente aos anos de 2000, 2001 e 2002.
IV- Por se ter verificado a prescrição das dívidas exequendas em causa, requereu o aqui Recorrente, junto do órgão de execução fiscal, que tal fosse declarado, que indeferiu, forçando este a apresentar reclamação.
V- Preceitua o artigo 48.º, n.º1 da Lei Geral Tributária que “as dívidas tributárias prescrevem, salvo o disposto em lei especial, no prazo de oito anos contados (…) a partir do inicio do ano civil seguinte àquele em que se verificou”.
VI- Significa isto que, o prazo de prescrição para as dívidas relativas ao I.V.A. de 2000 iniciou-se em 01.01.2001, relativas ao I.V.A. de 2001 em 01.01.2002 e relativas ao I.V.A. de 2002 em 01.01.2003.
VII- Prescrevendo, as mesmas, desta forma, e respetivamente, em 01.01.2009, 01.01.2010 e 01.01.2011.
VIII- Porém, com a apresentação de impugnação judicial das liquidações de I.V.A. em causa, bem como da citação do processo de execução fiscal ao Recorrente, o prazo prescricional interrompeu o seu decurso (cfr. artigo 49.º, n.º1 da Lei Geral Tributária).
IX- O aqui Recorrente apresentou impugnação judicial, junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, em 14 de março de 2005, dando origem ao processo n.º 412/05.3BEBRG,
X- Processo que conheceu decisão judicial apenas em 28.02.2007.
XI- À data desta causa interruptiva do prazo prescricional, o n.º2 do artigo 49.º da L.G.T. preceituava do seguinte modo:
“2. A paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar o efeito previsto no número anterior, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação.”
XII- Significa isto que, até à entrada em vigor da Lei n.º 53-A/2006, de 31 de dezembro, ocorrida em 01.01.2007, a paragem do processo por período superior a um ano, por facto não imputável ao sujeito passivo, também fazia cessar o efeito interruptivo,
XIII- Pelo que, neste caso, se somava o tempo decorrido, após o período de um ano, ao que tivesse decorrido até à data da autuação.
XIV- O efeito próprio da interrupção de inutilização do tempo decorrido anteriormente desaparecia, tudo se passando como se o facto - que era interruptivo - fosse um facto suspensivo (neste sentido, veja-se Jorge Lopes de Sousa, “Sobre a prescrição da obrigação tributária, notas práticas”, 2010, Áreas Editora).
XV- A Lei n.º 53-A/2006 revogou a regra segundo a qual a paragem do processo a que a lei atribuiu efeito interruptivo, por período superior a um ano, por facto não imputável ao sujeito passivo, faz cessar o efeito interruptivo (artigo 89.° da Lei n.º 53-A/2006)
XVI- E veio determinar que «a revogação do n.º 2 do artigo 49.º da LGT aplica-se a todos os prazos de prescrição em curso, objeto de interrupção, em que ainda não tenha decorrido o período superior a um ano de paragem do processo por facto não imputável ao sujeito passivo» (artigo 91º da Lei n.º 53-A/2006).
XVII- Uma vez que começou a correr novo prazo de prescrição a partir do facto interruptivo, cuja contagem se suspende enquanto não houver decisão definitiva ou transitada em julgado, que ponha termo ao processo, quando a reclamação, impugnação, recurso ou oposição determinem a suspensão da cobrança da dívida. (neste sentido vejam-se, entre outros, os acórdãos do S.T.A. de 16.11.2011, in proc. n.º 0289/11 e de 02.03.2011, in proc. n.º 0125/11).
XVIII- No caso em apreço, a impugnação judicial foi apresentada em 14.03.2005,
XIX- Desde a apresentação da impugnação judicial até 14.03.2006 (um ano após), o processo em causa esteve parado, sem que tal se pudesse imputar ao Recorrente.
XX- Desta feita, certo é que em 14.03.2006, a interrupção existente transformou-se em suspensão, aproveitando-se o prazo anterior já decorrido, isto porque, ainda não se encontrava vigente a Lei n.º 53-A/2006, de 29/12, e consequentemente a nova redação do artigo 49.º,
XXI- Pelo que, e ao abrigo do disposto no artigo 91.º do supra referenciado diploma legal, não é aplicável aos presentes autos, esta alteração legislativa.
XXII- Em 14.03.2005, interrompeu-se o prazo prescricional do Imposto sobre o Valor Acrescentado, dos anos de 2000, 2001 e 2002,
XXIII- Tendo, até a essa data, decorrido já quatro anos, três anos e dois anos, respetivamente.
XXIV- Uma vez que o processo de impugnação judicial se encontrou parado por mais de um ano,
XXV- Em 14.03.2006, retomou-se o prazo de prescrição, aproveitando-se, porém, o tempo já decorrido anteriormente.
XXVI- Contudo, certo é que, em 18.01.2006, ocorreu nova causa de interrupção, com a citação do Recorrente no processo de execução fiscal, instaurado com base naqueles impostos referenciados.
XXVII- Tal processo de execução fiscal conheceu o seu término com a declaração insolvência do aqui Recorrente,
XXVIII- Até porque é o próprio tribunal a quo, que refere a avocação do processo de execução fiscal para o processo de insolvência pessoal do Recorrente.
XXIX- Processo de insolvência essa que terminou em 21.09.2009.
XXX- Significa isto que, nessa mesma data, retomou-se o prazo prescricional da dívida exequenda.
XXXI- Desta feita temos o seguinte esquema para cada Imposto ora em causa:
I.V.A. 2000
Prazo
I.V.A. 2001
I.V.A. 2002
- Inicio do prazo em 01.01.2001
- Suspensão em 14.03.2005, nos termos e para os efeitos do artigo 49.º, n.º2 da L.G.T. (redação vigente no momento dos factos)
04 anos, 02 meses
e
13 dias
- Inicio do prazo em 01.01.2002
- Suspensão em 14.03.2005, nos termos e para os efeitos do artigo 49.º, n.º2 da L.G.T. (redação vigente no momento dos factos)
03 anos, 02 meses
e
13 dias
- Inicio do prazo em 01.01.2003
- Suspensão em 14.03.2005, nos termos e para os efeitos do artigo 49.º, n.º2 da L.G.T. (redação vigente no momento dos factos)
02 anos, 02 meses
e
13 dias
- Retoma um ano após a paragem do mesmo, em 14.03.2006 (porém, o processo mantém a sua interrupção por força da interrupção da citação do processo executivo) - Retoma um ano após a paragem do mesmo, em 14.03.2006 (porém, o processo mantém a sua interrupção por força da interrupção da citação do processo executivo) - Retoma um ano após a paragem do mesmo, em 14.03.2006 (porém, o processo mantém a sua interrupção por força da interrupção da citação do processo executivo)
Reinício por término do processo de insolvência, em 21.09.2009 até à presente data 06 anos e 08 meses Reinício por término do processo de insolvência, em 21.09.2009 até à presente data 06 anos e 08 meses Reinício por término do processo de insolvência, em 21.09.2009 até à presente data 06 anos e 08 meses
Total: 10 anos, 10 meses e 13 dias 09 anos, 10 meses e 13 dias 08 anos, 10meses e 13 dias


XXXII- Assim, e decorridos mais de oito anos desde a exigibilidade dos impostos ora em causa, e acima identificados, como se verificou, certo é que a dívida exequenda ora em causa encontra-se há muito prescrita,
XXXIII- Prescrição essa que se invoca para todos os efeitos legais.

Termos em que, e nos melhores de direito, V/Exas. Venerandos Desembargadores deverão decidir no sentido de revogar a sentença recorrida proferida pelo tribunal a quo, julgando totalmente procedente a reclamação apresentada pelo Recorrente.”
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A Recorrida não apresentou contra-alegações.
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Por Acórdão de 21/01/2018, o Supremo Tribunal Administrativo julgou-se incompetente em razão da hierarquia para conhecer do presente recurso, declarando competente para esse efeito este Tribunal Central Administrativo.
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Aqui chegados os autos foram com vista ao Digno Magistrada do Ministério Público que emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso (cf. fls. 191 a 193 dos autos).
*
Objecto do recurso - Questão a apreciar e decidir:
Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.
A questão suscitada pela Recorrente e delimitada pelas alegações de recurso e respectivas conclusões é a de saber se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento, ao ter entendido que não se verifica a prescrição das dívidas exequendas.
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II. FUNDAMENTAÇÃO
II. 1. Da Matéria de Facto
“Mostra-se PROVADO que:
1- Em 27.01.2005, foi instaurado contra R… o Processo de Execução Fiscal n.º 2321200501001485, por dívidas de IRS referentes aos anos 2001 e de 2001, no valor global de € 6.816,92 – cfr. fls. 01 e 02 das cópias do identificado processo executivo, que se encontra apensa aos presentes autos (doravante apenso 1).
2- Em 14.03.2005, deu entrada no S.F. de Ponte de Lima petição inicial apresentada pelo Reclamante tendente à Impugnação das liquidações de IRS relativas aos anos de 2001 e de 2002, tendo o Impugnante solicitado que fosse ordenada a suspensão da execução – fls. 06 e 07 do apenso 1;
3- Em 13.04.2005, foi o Reclamante notificado para prestar garantia tendo em vista a suspensão do PEF n.º 2321200501001485, mas não apresentou qualquer garantia – fls. 08 a 12 do apenso 1;
4- O Oponente foi citado para a execução em 18.01.2006 – 13 a 15 do apenso 1;
5- Em 18.01.2006, foi efectuada a penhora do direito e acção na herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de J… ocorrido em 20.12.2005, a que correspondia o quinhão hereditário de 1/6 do prédio urbano inscrito na matriz predial da extinta freguesia de Freixo – fls. 14 do apenso 1;
6- Em 08.06.2007, foi efectuada a venda do bem penhorado no âmbito do PEF 23212007010001868 – fls. 18 do apenso 1;
7- A petição referida em 2-, após ter sido remetida a este Tribunal, deu origem ao processo de Impugnação Judicial n.º 410/05.7BEBRG;
8- Por sentença proferida em 02.05.2008, a Impugnação Judicial foi julgada totalmente improcedente – fls. 31 do apenso 1.
9- Correu termos no 2º Juízo do Tribunal Judicial de Ponte de Lima o processo de insolvência singular n.º 1062/07.5TBPTL, no âmbito do qual, e por sentença proferida em 05.05.2008, o Reclamante foi declarado insolvente, tendo o processo sido encerrado mediante despacho proferido em 21.09.2009 – cfr. doc. de fls. 36 a 39 do suporte físico dos autos;
10- Em 13.01.2011, o órgão de execução fiscal declarou o PEF 2321200501001485 em falhas, por inexistência de bens penhoráveis – fls. 30 do apenso 1;
11- Por despacho proferido em 26.09.2017, foi declarada a prescrição das dívidas que se encontravam em execução no PEF 2321200501001485, com a consequente extinção do identificado processo executivo – cfr. informação constante de fls. 113 do suporte físico dos autos;
12- Em 04.02.2005, foi instaurado contra R... o Processo de Execução Fiscal n.º 2321200501001523, por dívidas de IVA referentes aos anos de 2000, 2001 e de 2002, no valor global de € 12.054,50 – cfr. fls. 01 a 12 das cópias do identificado processo executivo n.º 2321200501001523, que se encontram apensas aos presentes autos (doravante Apenso 2).
13- Em 07.02.2005, através do ofício sob registo n.º 862, de 04.02.2005, foi expedida para o Reclamante citação para a execução fiscal, tendo a comunicação sido devolvida com a menção “não reclamado” – cfr. fls. 11 a 24 do apenso 2;
14- Mediante despacho proferido em 12.04.2005, foi determinada a penhora de quaisquer acções, títulos e saldos de depósitos à ordem e/ou a prazo existentes em qualquer dependência das instituições bancárias com estabelecimento no concelho de Ponte de Lima em nome do executado ou em que este figurasse como titular, sendo ainda ordenada a penhora de quaisquer títulos de obrigações, certificados de aforo ou de outros produtos existentes no Instituto de Gestão de Crédito Público, até ao montante da dívida que se mostrava em execução – fls. 32 do apenso 2;
15- No seguimento do pedido de penhora acabado de referir, foram efectuadas as seguintes penhoras:
a) Em 02.11.2005, foi efectuada junto do Banco… a penhora do montante de € 4645,05, o qual foi aplicado em 19.12.2005 – fls. 114 a 116 do apenso 2;
b) Em 19.12.2005, foi efectuada junto do Banco… a penhora do montante de € 669,60, o qual não foi ainda aplicado – fls. 130 ss do apenso 2;
c) Em 27.04.2006, foi efectuada junto do Banco… a penhora do montante de € 533,78, o qual não foi ainda transferido para o processo executivo – fls. 167 ao apenso 2;
d) Em 02.01.2013, foi efectuada junto do Banco… a penhora do montante de € 5.499,40, o qual foi transferido para aplicação no processo de execução fiscal em 27.10.2016, tendo o mesmo sido aplicado em 28.10.2016 – fls. 178 e 179 do apenso 2;
16- Em 14.03.2005, deu entrada no S.F. de Ponte de Lima petição inicial apresentada pelo Reclamante tendente à Impugnação das liquidações de IVA relativas aos anos de 2000, 2001 e de 2002 que estão na origem do identificado processo de execução fiscal n.º2321200501001523, tendo o Impugnante solicitado que fosse ordenada a suspensão da execução – fls. 135 e 136 do Apenso 2;
17- O Oponente foi pessoalmente citado para a execução em 18.01.2006 – 137 do apenso 2;
18- Em 18.01.2006, foi efectuada a penhora do direito e acção na herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de J… ocorrido em 20.12.2005, a que correspondia o quinhão hereditário de 1/6 do prédio urbano inscrito na matriz predial da extinta freguesia de Freixo – fls. 138 e 139 do apenso 2;
19- Em 08.06.2007, foi efectuada a venda do bem penhorado no âmbito do PEF 23212007010001868 – fls. 18 do apenso 1;
20- A petição referida em 16-, após ter sido remetida a este Tribunal, deu origem ao processo de Impugnação Judicial n.º 412/05.3BEBRG – fls. 202 do apenso 2;
21- Por sentença proferida em 28.02.2007, a Impugnação Judicial foi julgada parcialmente improcedente, aí se declarando a caducidade do direito à liquidação quanto às liquidações de IVA relativas ao 1º e 3º trimestres de 2000, anulando-se as respectivas liquidações de IVA associadas liquidações de juros, decisão que foi mantida pelo acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte de 10.09.2013 – fls. 202 do apenso 2.
22- Mediante ofício datado de 09.05.2008, o Serviço de Finanças de Ponte de Lima remeteu o processo de execução fiscal n.º processo de execução fiscal n.º 2321200501001523 ao processo de insolvência singular n.º 1062/07.5TBPTL, no seguimento da avocação do identificado processo – fls. 165 do apenso 2;
23- Este processo de execução fiscal veio, posteriormente, a ser devolvido ao Serviço de Finanças de Ponte de Lima, tendo os respectivos autos aí sido recebidos em 09.08.2009 – fls. 165 do apenso 2;
24- Mediante requerimento entrado no S.F. de Ponte de Lima em 07.03.2017, o Reclamante solicitou que o órgão de execução fiscal declarasse prescritas as dívidas em execução no âmbito dos PEF n.ºs 2321200501001485 e 2321200501001523, o qual apresenta o teor constante de fls. 180 e 181 do apenso 2, cujo teor aqui se tem por integralmente reproduzido;
25- Por despacho proferido em 10 de Março de 2017, foi indeferido o pedido de reconhecimento da prescrição das dívidas em execução, nos termos e com os fundamentos constantes de fls. 202 (frente e verso) do apenso 2, cujo teor aqui se considera inteiramente transcrito;
26- O Reclamante foi notificado desta decisão em 11.05.2017 – fls. 207 a 212 do apenso 2;
27- A petição de reclamação foi remetida ao órgão de execução fiscal, via correio electrónico, no dia 25.05.2017, tendo o Reclamante pago a respectiva multa processual, por ter procedido à entrega do requerimento no 3º dia útil seguinte ao termo do prazo legal – fls. 30 e 92/93, todas do suporte físico dos autos;

FACTOS NÃO PROVADOS
Para além da matéria dada como provada, inexiste outra matéria que releve para a boa apreciação e decisão da causa.

MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO
Os factos dados como provados resultam da análise dos documentos constantes dos autos e que se mostram expressamente identificados por referência a cada um dos factos que foram levados ao probatório.”
*
Estabilizada a matéria de facto, avancemos para as questões que nos vêm colocadas.
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II.2. Do Direito
Conforme resulta dos autos, o Recorrente, no âmbito do processo de execução fiscal nº 232120050100523, requereu a prescrição da dívida exequenda ao órgão de execução fiscal que, por sua vez, indeferiu a sua pretensão por entender que a dívida não se encontrava prescrita.
Não se conformando com essa decisão, o Recorrente apresentou reclamação para o TAF de Braga invocando a prescrição da dívida de IVA correspondente ao período compreendido entre 2000 e 2002.
A Meritíssimo juiz do TAF de Braga julgou improcedente a reclamação, adoptando a jurisprudência do acórdão do acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA de 2008-05-28, proferido no recurso n.º 840/07, consultável em www.dgsi.pt, dizendo em conclusão o seguinte:
“Temos, então, no caso concreto – e mesmo que nos abstraíssemos da primeira causa interruptiva (a proposição do processo de impugnação judicial) – a interrupção do prazo de prescrição operada com a citação do Executado em 18.01.2006, momento em que ainda se não havia completado o prazo de prescrição de 8 anos.
Em virtude da ocorrência deste facto interruptivo, operou-se a inutilização de todo o prazo até aí decorrido, apenas se reiniciando a contagem do prazo de prescrição com o termo do processo que deu causa à interrupção, in casu, o próprio processo de execução fiscal n.º 2321200501001523, interrupção esta que, no presente, se mantém, e uma vez que o processo de execução fiscal não se mostra, por ora, extinto ou declarado em falhas. Portanto, a dívida de IVA em análise não se mostra prescrita.”

Posto isto, vejamos então, se a dívida exequenda se encontra prescrita.

No caso dos autos a dívida exequenda diz respeito a IVA, relativa aos anos 2000, 2001 e 2002, pelo que aplica-se o regime da Lei Geral Tributária (LGT) que entrou em vigor em 1 de Janeiro de 1999, estabelecendo o prazo de prescrição de oito anos (art. 48.º da LGT).
Comecemos então pelas dívidas do ano 2000, que por serem mais antigas, se estas tiverem prescritas, por maioria de razão, as outras também estarão.
Estando em causa dívidas de IVA e sendo este imposto de obrigação única (e não um imposto periódico) o termo inicial do prazo de prescrição (de 8 anos) que se contava, à luz da inicial redacção do n.º 1 do art. 48.º da LGT, a partir da data da ocorrência dos respectivos factos tributários, e não a partir do início do ano civil seguinte, passou a contar-se, por via da alteração que o art. 40.º da Lei nº 55-B/2004 introduziu neste n.º 1, a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou a exigibilidade do imposto (cfr. Ac. do STA de 14/01/2015, proc. n.º 01684/13).
Por conseguinte, in casu, o início do prazo de prescrição é o dia 01/01/2001, e o término o dia 02/01/2009.
Os factos que podem relevar para efeitos de interrupção da prescrição, que constam da matéria assente não impugnada nesta sede, são os seguintes:
- O aqui Recorrente apresentou impugnação judicial, junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, em 14/03/2005, dando origem ao processo n.º 412/05.3BEBRG,
- A citação do Recorrente ocorreu em 18/01/2006, conforme consta da alínea 17 do probatório, que não foi nesta sede impugnado.
- Mediante ofício datado de 09/05/2008, o Serviço de Finanças de Ponte de Lima remeteu o processo de execução fiscal n.º processo de execução fiscal n.º 2321200501001523 ao processo de insolvência singular n.º 1062/07.5TBPTL, no seguimento da avocação do identificado processo – fls. 165 do apenso 2;
- Este processo de execução fiscal veio, posteriormente, a ser devolvido ao Serviço de Finanças de Ponte de Lima, tendo os respectivos autos aí sido recebidos em 09/08/2009.

Verifica-se assim que em 14/03/2005 ou seja, antes de completado o referido prazo de prescrição, foi deduzida impugnação judicial contra o acto de liquidação de IVA que deu origem à dívida exequenda, impugnação que integra um acto interruptivo do prazo de prescrição à luz do n.º 1 do art. 49.º da LGT, na redacção então vigente e que, como tal, é a aplicável (As causas de interrupção ou suspensão da prescrição atendíveis para o cômputo em concreto do prazo de prescrição são as previstas na lei vigente à data da respectiva ocorrência, em conformidade com o disposto no n.º 2 do art. 12.º do CC.).
Essa causa de interrupção – a impugnação judicial – tem dois efeitos sobre a prescrição: para além de um efeito instantâneo, qual seja a eliminação do tempo decorrido anteriormente, também um efeito duradouro, que consiste em obviar ao início do novo prazo durante o tempo em que estiver pendente o processo que provoca o efeito interruptivo.
Na verdade, a interrupção da prescrição, como resulta expressamente do n.º 1 do art. 326.º do CC, aplicável às obrigações, quer civis quer tributárias, significa que todo o tempo decorrido até ao acto interruptivo é inutilizado para efeitos de prescrição. Mas, relativamente às obrigações de natureza tributária, a interrupção tem também um outro efeito, dito duradouro, só no caso de ocorrer uma paragem do processo por período superior a um ano, por facto não imputável ao contribuinte, é que o facto potencialmente interruptivo passava a ter um efeito meramente suspensivo, caso essa paragem tenha ocorrido antes da revogação do n.º 2 do art. 49.º da LGT,veja-se sobre este assunto no recente acórdão do STA de 10/05/2017, proferido no processo nº 0452/17:
“(A regra geral para as obrigações civis é a de que o facto interruptivo apenas tem efeito instantâneo, com a inutilização para a prescrição de todo o tempo decorrido anteriormente e imediato início do novo prazo, nos termos do n.º 1 do art. 326.º do CC («A interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do acto interruptivo, sem prejuízo do disposto nos n.ºs 1 e 3 do artigo seguinte»). A excepção, em que, a par desse efeito instantâneo, o facto interruptivo tem também um efeito duradouro (de impedir o início do novo prazo enquanto se mantiver pendente o processo) é a situação prevista no art. 327.º, n.º 1, do CC, ou seja, quando «a interrupção resultar de citação, notificação ou acto equiparado, ou de compromisso arbitral», caso em que «o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo».), quer no domínio da vigência do Código de Processo das Contribuições e Impostos (cfr. art. 27.º, § 1), quer no domínio da vigência do Código de Processo Tributário (cfr. art. 34.º, n.º 3), quer enquanto vigorou o n.º 2 do art. 49.º da LGT, que viria a ser revogado pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro: o acto interruptivo obviava ao início da contagem do novo prazo de prescrição enquanto se mantivesse pendente o processo que determinou a interrupção, a menos que se verificasse a «paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo», caso em que se somava «o tempo que decorrer após este período ao que tiver decorrido até à data da autuação» ( Para maior desenvolvimento JORGE LOPES DE SOUSA, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2.ª edição, págs. 57 e segs.).”
Ou seja, a eficácia do facto interruptivo prolongava-se no tempo, obviando ao imediato início de contagem de um novo prazo prescricional.
Só no caso de ocorrer uma paragem do processo por período superior a um ano, por facto não imputável ao contribuinte, é que o facto potencialmente interruptivo passava a ter um efeito meramente suspensivo (idêntico aos das causas suspensivas), pois se limitava então a impedir o decurso do prazo de prescrição entre a ocorrência do facto e a data em que se perfizesse um ano de paragem do processo por motivo não imputável ao sujeito passivo. Na expressiva terminologia deste Supremo Tribunal Administrativo, nesse caso o efeito interruptivo degradava-se em suspensivo.
Sucede, no entanto, que a referida Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro (Orçamento do Estado para 2007), que entrou em vigor em 1 de Janeiro de 2007 (art. 163.º), revogou o n.º 2 do art. 49.º da LGT, salvaguardando apenas os casos em que, nessa data, tivesse já decorrido período superior a um ano de paragem do processo por facto não imputável ao sujeito passivo (arts. 90.º e 91.º).” (destaque nosso)

Vejamos então se até 01/01/2007 o processo de impugnação esteve parado por mais de um ano.
Ora, por consulta do processo de impugnação judicial nº 412/05.3BEBRG, verifica-se que, após a entrada da PI no serviço de finanças competente, o processo foi remetido ao TAF de Braga em 23/03/2005 e a 1ª conclusão ao Juiz Titular no processo ocorreu apenas em 20/06/2006, pelo que o processo esteve parado por mais de um ano por motivo não imputável ao Recorrente, aí Impugnante, antes da revogação da referida norma. Assim sendo, a partir de 24/03/2006 (1 ano após o inicio da paragem) o prazo prescricional volta a correr.
No entanto, a citação do Recorrente ocorreu em 18/01/2006, conforme consta da alínea 17 do probatório.
Ora, a citação interrompe a prescrição, pois embora a prescrição já estivesse interrompida por força da impugnação judicial, a nova interrupção decorrente da citação releva porque ocorreu antes da entrada em vigor Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro e da nova redacção do nº 3 do artigo 49º da LGT que diz, “Sem prejuízo do disposto no número seguinte, a interrupção tem lugar uma única vez, com o facto que se verificar em primeiro lugar.”
Leia-se, neste sentido, a jurisprudência do STA no acórdão de 15/06/2013, processo nº 1800/13, entre outros,
“No mesmo sentido aliás se pronunciou já e por várias vezes este Supremo Tribunal designadamente no acórdão de 05 06 2013 in processo nº 0903/13 cujo sumário dada a sua capacidade de síntese e clareza, com a devida vénia se transcreve:
I - As causas de interrupção ou suspensão da prescrição, antes da entrada em vigor da referida redacção do nº 3 do art. 49º da LGT, devem todas elas ser consideradas autonomamente, para efeitos de contagem do respectivo prazo, em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 12.º do Código Civil.
II - Assim as causas de interrupção da prescrição que ocorreram antes da alteração ao nº 3 do art. 49º da seu decurso. As causas de interrupção ou suspensão da prescrição atendíveis para o cômputo em concreto do prazo de prescrição são as previstas na lei vigente à data da respectiva ocorrência, em LGT, introduzida pela Lei 53-A/2006, ou seja, antes de 01.01.2007, produzem os efeitos que a lei vigente no momento em que elas ocorreram associava à sua ocorrência: eliminam o período de tempo anterior à sua ocorrência e obstam ao decurso do prazo de prescrição, enquanto o respectivo processo estiver pendente ou não estiver parado por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte.
III - Ocorrendo sucessivas causas de interrupção da prescrição, antes da entrada em vigor da referida redacção do nº 3 do art. 49º da LGT, devem todas elas ser consideradas autonomamente, para efeitos de contagem do respectivo prazo, desde que susceptíveis de influir no seu decurso.”

Assim, a citação ocorreu em 18/01/2006. Uma vez que a citação inutiliza o tempo entretanto decorrido, mantem-se a prescrição interrompida, no caso sub judice, independentemente da paragem do processo de impugnação judicial.
Interrompido o prazo de prescrição pela citação fica inutilizado todo prazo decorrido anteriormente (art. 326.º, n.º 1 do Código Civil) sendo que o novo prazo de prescrição de 8 anos previsto no n.º 1 do art. 48.º da LGT não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo (art. 327.º, n.º 1 do Código Civil) [Ac. do STA de 19/09/2012, proc. n.º 0883/12, Ac. do STA de 20/05/2015, proc. n.º 01500/14, Ac. do TCAS de 19/03/2015, proc. n.º 08542/15, Ac. do TCAS de 18/06/2015, proc. n.º 06446/13],
Aqui chegados diz agora o Recorrente, nas suas conclusões do recurso, o seguinte:
Contudo, certo é que, em 18.01.2006, ocorreu nova causa de interrupção, com a citação do Recorrente no processo de execução fiscal, instaurado com base naqueles impostos referenciados.
Tal processo de execução fiscal conheceu o seu término com a declaração insolvência do aqui Recorrente,
Até porque é o próprio tribunal a quo, que refere a avocação do processo de execução fiscal para o processo de insolvência pessoal do Recorrente.
Processo de insolvência essa que terminou em 21.09.2009.
Significa isto que, nessa mesma data, retomou-se o prazo prescricional da dívida exequenda.”

No entanto, ao contrário do que aí vem dito, a execução fiscal não termina com a declaração de insolvência do Recorrente. Relativamente a dívidas anteriores à declaração de insolvência, o processo de execução fiscal prossegue nas hipóteses previstas nos n.ºs 4 e 5 do art. 180.º do CPPT, ou seja nos casos em que, findo o processo de insolvência, os processos de execução fiscal avocados são devolvidos no prazo de oito dias ao respectivo órgão da execução fiscal ou ao tribunal tributário, devolução que tem como finalidade a possibilidade de, em caso de o falido adquirir bens, prosseguirem os processos para cobrança do que esteja em dívida à Fazenda Pública, sem prejuízo das obrigações contratuais por esta assumidas, e sem prejuízo também da prescrição da dívida exequenda.
Ora, conforme resulta do probatório - alínea 15 d) e do PE apenso, após a devolução do Processo Executivo em 09/08/2009, foram efectuadas diligências, nomeadamente penhoras, com vista à cobrança da divida, pelo que o respectivo processo prosseguiu os seus termos.
Assim sendo, a divida de IVA de 2000, atendendo às interrupções da prescrição a saber, em 14/03/2005 e 18/01/2006 com a impugnação judicial e a citação, uma vez que, pelo menos esta ultima, inutilizou o tempo entretanto decorrido, ainda que se suspenda com o período em que o processo foi avocado á insolvência entre 09/05/2008 e 09/08/2009, fácil é concluir que, o novo prazo de prescrição de 8 anos previsto no n.º 1 do art. 48.º da LGT não tendo começado a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo, as dividas em causa não estão prescritas. E, por maioria de razão, também não estarão as dívidas de IVA de 2001 e 2002, porque posteriores.
Falecem assim todas as alegações e conclusões de recurso.
*
III. DECISÃO
Termos em que, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do TCA Norte em negar provimento ao recurso e, em consequência, confirmar a decisão recorrida.
Custas pelo Recorrente.
Porto, 26 de Abril de 2018.
Ass. Barbara Tavares Teles
Ass. Mário Rebelo
Ass. Cristina da Nova