Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00341/09.1BEAVR
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:04/12/2018
Tribunal:TAF de Aveiro
Relator:Pedro Vergueiro
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
IRC
NULIDADE DA SENTENÇA POR FALTA DE ESPECIFICAÇÃO DOS FUNDAMENTOS DE FACTO
JULGAMENTO DA MATÉRIA DE FACTO
MÉTODOS INDIRECTOS
QUANTIFICAÇÃO DA MATÉRIA TRIBUTÁVEL
CRITÉRIO
Sumário:I) Em relação à nulidade da sentença por não especificação dos fundamentos de facto, há que ter em atenção que, como é sabido, só se verifica tal nulidade quando ocorre falta absoluta de fundamentação, sendo que há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade.
II) A lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, o que significa que o Recorrente tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida, sendo que não cumprindo a recorrente os ónus fixados pelo artigo 685-B do Código de Processo Civil, o recurso quanto à matéria de facto terá de ser rejeitado.
III) A AT tem de indicar e justificar os critérios que utiliza na determinação da matéria tributável por métodos indiciários, por forma a que o contribuinte deles fique ciente e apto a discutir a valorimetria aplicada, isto é, para que possa provar que os critérios utilizados são desadequados e/ou inadmissíveis para a sua actividade, que houve erro ou manifesto excesso na matéria tributável quantificada e que permitam extrapolar uma adequada ponderação da decisão.
IV) Se a margem média - apurada com base também na margem anual do período a que vai ser aplicada - reflecte adequadamente o resultado da actividade efectivamente exercida no período a que se refere (2003 a 2006), então não se justificava fazer qualquer correcção e a sua aplicação é injustificada e se a AT reconhece que os inventários de 2002 e 2003 não merecem qualquer crítica, isso significa que, conhecendo as existências finais de 2003, iniciais de 2004, e conhecendo o valor das compras e vendas de cada ano (que não vêm postas em causa), a AT poderia ter calculado rigorosamente, através de simples operações aritméticas, o valor das existências finais de 2005 e 2006, o que significa que a AT subverteu a teleologia e a metodologia subjacentes à avaliação indirecta, que se quer subsidiária da avaliação directa também no sentido de que as regras destas são de aplicar sempre que possível mesmo no âmbito da avaliação indirecta (artigo 85º da LGT).
V) Além disso, a aludida margem foi inicialmente designada como “margem liquida” e a partir de então sempre designada como “margem bruta”, sendo que, tal como se afigura que o cálculo da margem média em causa contém erros conceituais e aritméticos que conduzem a assinalável desvio (a taxa de 72% deveria ser reduzida para 70,105%, arredondando razoavelmente para 70%), conforme demonstração de fls. 477 do PA não impugnada pela AT e ainda que se a AT tivesse utilizado esta margem teria concluído, mantendo todos os outros pressupostos em que assentaram as correcções propostas no relatório, que não haveria lugar a tributação, realidade que a Recorrente em nenhum momento desmonta no âmbito do presente recurso, limitando-se a repetir o discurso do RIT sem afastar por qualquer forma as objecções agora descritas.
VI) Como quer que seja, é ponto assente que a taxa de 72% foi apurada através da média apurada com base nas declarações modelo 22 apresentadas, e não com base, directamente, em inventários, o que equivale a dizer que o critério usado pela AT padece do vício que lhe vem imputado, na medida em que a taxa média inclui os valores de 2005 e 2006 que indirectamente se encontram influenciados pelos inventários considerados errados e que justificaram o recurso a métodos indirectos. *
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Direção de Finanças de Aveiro
Recorrido 1:D..., Lda.
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
1. RELATÓRIO
A Excelentíssima Representante da Fazenda Pública, devidamente identificada nos autos, inconformada veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, datada de 10-07-2017, que julgou procedente a pretensão deduzida por “D…, Lda.” na presente instância de IMPUGNAÇÃO relacionada com as liquidações nº 2009.8310011779 (Impug. 341/09.1BEAVR) e 2009.8310011764 (Impug. 343/09.8BEAVR), de 18/3/2009, relativas a IRC e juros compensatórios dos anos de 2006 e 2005, respectivamente, no total de € 33.875,85.

Formulou nas respectivas alegações (cfr. fls. 1021-1028), as seguintes conclusões que se reproduzem:
“ (…)
1) O Tribunal a quo considerou que é ilegal o critério utilizado na quantificação da matéria tributável, e fundamenta a sua decisão na conclusão de que o critério usado é desadequado na medida em que é aplicada a margem bruta sobre as vendas de 72% que foi apurada através da média que incluiu os valores de 2005 e 2006 que indiretamente se encontram influenciados pelos inventários considerados errados e que justificaram o recurso a métodos indiretos.
2) De salientar que o comportamento do contribuinte foi pautado por uma ação falsificadora dos inventários em 2003 e 2004 e que o resultado dela consistiu na efetiva alteração dos resultados fiscais e na violação dos “deveres acessórios”, contabilístico e declarativo, conforme resulta do ponto 10 dos factos provados e se refere na douta sentença na pág. 9, 3º e 4º parágrafo e pág. 10, 6º parágrafo.
3) E se a AT se viu obrigada a aplicar os métodos indiretos, tal deve-se a um comportamento culposo do contribuinte.
4) Ora perante as lacunas de informação da contabilidade, a inspeção tributária teve que escolher um método para quantificar as operações omitidas á contabilidade.
5) Ora o método adotado encontra-se justificado e interpretado pelo tribunal a quo da seguinte forma;
6) Primeiro, assenta no pressuposto de que foi efetuada a falsificação dos inventários de produtos acabados nos anos de 2005 e 2006, o que acarretou a correção dos mesmos, tendo por base uma taxa média de crescimento de 2,5%, que foi justificada como tratar-se da percentagem de crescimento do inventário final de produtos acabados verificada no ano de 2003, e tratar-se do reflexo da taxa de inflação.
7) E assenta ainda no facto de após a referida correção aos inventários dos produtos acabados, e após a correção da variação da produção a inspeção ter apurado as margens brutas corrigidas relativas aos anos de 2005 e 2006 de 70% e 69% respetivamente, margens essas inferiores às margens declaradas para as vendas que foram de 77% (Ano 2005) e 68% (Ano 2006).
8) Na quantificação das vendas em falta foi adotada a margem bruta sobre as vendas de 72%, justificada com o facto de refletir o resultado da atividade efetivamente praticada pela empresa, porquanto nos anos de 2003 a 2006 a margem média destes foi de 72,77%.
9) O douto tribunal a quo levanta dúvidas quanto á aplicação da margem de 72%, na medida em que alegadamente essa taxa média inclui os valores de 2005 e 2006 que indiretamente se encontram influenciados pelos inventários considerados errados e que justificaram o recurso a métodos indiretos.
10) Ora no que respeita aos inventários, conforme se descreve na douta sentença, na página 19, a AT começou por analisar os inventários, verificando um anormal crescimento das existências de bens em stock, depois de proceder a diligências de verificação da coerência dos inventários, a inspeção tributária conclui que os mesmos se encontravam sobrevalorizados em cerca de 25%.
11) De seguida a inspeção tributária solicitou á impugnante que procedesse à elaboração de inventários corrigidos relativos aos exercícios de 2004 a 2006, solicitação á qual a impugnante não respondeu por alegadamente falta de condições.
12) O que levou a inspeção a proceder á correção dos inventários, em 2005 e 2006.
13) Os cálculos da matéria coletável foram efetuados com base na aplicação da média de 72%, apurada com base nas declarações apresentadas pelo SP nos anos de 2003 a 2006.
14) O método adotado resultou da aplicação de uma margem média declarada pelo SP, o por isso com grande probabilidade de corresponder á realidade.
15) A lei no artº 90º da LGT começa com a seleção exemplificativa de um certo número de índices – margens médias do lucro, taxas médias de rentabilidade, coeficientes técnicos, e elementos e informações relativas a empresas ou entidades que tenham relações económicas com o contribuinte, que podem ser utilizados isoladamente ou articulados entre si, para proceder á quantificação.
16) Ora se considerarmos os critérios de decisão propostos no artº 90º da LGT, podemos verificar como eles têm implícita uma remissão para a prova probabilística, com base em estatísticas.
17) No caso concreto foram utilizados os elementos e informações declarados á administração tributária pelo próprio sujeito passivo.
18) E ao ser utilizado um indicador que parte dos elementos declarados pelo sujeito passivo á AT nas suas declarações de rendimentos, é utilizado um método que relaciona de uma forma congruente e justificada os factos apurados e a situação concreta do contribuinte.
19) Ao contrário do entendido pelo Mº Juiz do Tribunal a quo, o método utilizado é proporcional á situação concreta do sujeito passivo, e nada tem de desadequado.
20) O Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao ter entendido que a aplicação da percentagem de 72%, é um critério desadequado, porque alegadamente tal percentagem inclui os valores de 2005 e 2006 que indiretamente se encontram influenciados pelos inventários considerados errados e que justificaram o recurso a métodos indiretos, pois conforme trás se expôs tal percentagem é a que resulta dos elementos declarados pelo sujeito passivo, não sendo imputável á AT “os erros” nos inventários que o SP manipulou.
21) A AT teve a preocupação de aplicar uma margem que refletia o resultado da atividade efetivamente praticada pelo sujeito passivo, já que aplicou a margem por ele declarada nos anos de 2000 a 2004.
22) A AT teve o cuidado de solicitar ao contribuinte que procedesse à elaboração de inventários corrigidos relativos aos exercícios de 2004 a 2006, quando constatou que os mesmos se encontravam sobrevalorizados em cerca de 25%, o que nunca veio a suceder.
23) Assim se a margem de lucro bruto que foi aplicada de 72%, indiretamente se encontra influenciada pelos inventários que foram manipulados pelo SP, só a ele lhe pode ser imputável.
24) E se a douta sentença dá como provado no ponto 10 do probatório que o representante do SP alterou o resultado dos inventários de 2005 e 2006, e que manipulou as quantidades e valores dos artigos aí descritos, a consequência a tirar é que os “supostos erros” dos inventários só aquele podem ser imputados.
25) E se estamos perante inventários que foram manipulados pelo sujeito passivo, que tão pouco teve a preocupação de os corrigir quando para tal foi convidado, nunca pode acarretar o vício que é imputado pelo Tribunal á atuação da AT, de que a margem de lucro bruto sobre as vendas que foi utilizada é incongruente com os “referidos erros” dos inventários.
26) É indiscutível que a violação dos deveres de cooperação praticada pelo contribuinte na fase do procedimento de inspeção vai acarretar que a decisão de quantificação assente num raciocínio quantitativo e que a decisão tomada leve em conta um elevado grau de probabilidade.
27) O Meritíssimo Juiz do tribunal a quo ao não relevar este facto, está a favorecer a violação dos deveres de cooperação.
28) Demonstra-se que a inspeção tributária utilizou elementos objetivos e concretos que, segundo as regras da experiência, pautadas por critérios de razoabilidade e de normalidade e tendo em linha de conta as especificidades próprias da atividade dos contribuintes inspecionados, conduziram á quantificação das vendas omitidas.
29) A quantificação efetuada pela AT tem base suficientemente seguras e adequadas a sustentar o apuramento das vendas omitidas.
30) Conforme foi decidido no Ac do STA de 19/11/2014, rec. nº 0407/12 “ O critério usado pela AT na quantificação da matéria tributável por métodos indiciários tem de revelar-se adequado e racionalmente justificado – um modo adequado de aproximação à realidade -, mas não pode ser atacado com o fundamento de que outro ou outros se revelariam mais ajustados, pois não pode perder-se de vista que a quantificação por presunção é imputável exclusivamente ao contribuinte, que se queria ser tributado pelo lucro real, deveria ter cumprido com as obrigações que sobre ele recaíam”
31) Por conseguinte a decisão do Meritíssimo Juiz pode e deve ser alterada, porquanto tal é permitido pela aplicação subsidiária do artº 712º do CPC, pois do processo constam todos os elementos de prova da matéria de facto em causa.
32) Deve ser alterada a referida decisão considerando-se que a quantificação efetuada pela AT tem bases suficientemente seguras e adequadas a sustentar o apuramento das vendas omitidas.
33) A douta sentença sob recurso, fez uma incorreta apreciação da prova e violou o artigo 90º da LGT.
TERMOS EM QUE, deve ordenar-se a revogação da douta sentença, como é de LEI E JUSTIÇA”

A Recorrida D…, Lda., apresentou contra-alegações, tendo concluído da seguinte forma (cfr. fls. 1055-1060):
“(…)
1 - O presente recurso foi interposto pela Fazenda Pública contra a Douta Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, que julgou totalmente procedente o processo de impugnação judicial n.º 341/09.1BEAVR e apenso apresentado pela sociedade D…, Lda., contra os actos de liquidação de IRC referente aos anos de 2005 e 2006;
2 - A referida sentença considerou as impugnações judiciais apresentadas totalmente procedentes, porque a aplicação da margem de 72% no caso dos autos resulta na utilização de um critério desadequado à quantificação por métodos indirectos de avaliação, o que determina a anulação das liquidações impugnadas.
3 - Ora, a sociedade recorrida concorda com a referida sentença, uma vez que ficou provado que durante a inspecção, e numa primeira fase, os respectivos técnicos concluíram pela existência de incorrecções nos inventários da sociedade recorrida, nomeadamente por terem verificado que os stocks se apresentavam manifestamente elevados, e sempre crescentes, apresentando um valor exagerado face ao nível de actividade.
4 - Ora, com esse fundamento, os técnicos da inspecção procederam à determinação da matéria colectável dos anos de 2005 e 2006, com recurso à aplicação de métodos indirectos, por força do disposto no artigo 88º da Lei Geral Tributária (LGT).
5 - Para determinação da matéria tributável com recurso à aplicação dos métodos indirectos na determinação da matéria colectável dos anos de 2005 e 2006, foi invocada a alínea a) do nº 1 do artigo 90º da LGT, ou mais concretamente “as margens médias do lucro líquido sobre as vendas e prestações de serviços ou compras e fornecimentos de serviços de terceiros”.
6 - Na página 34 do relatório de Inspecção Tributária, começaram os técnicos por invocar as margens líquidas de lucro, mas apresentaram cálculos que concluem pela margem bruta das vendas.
7 - O mais absurdo é que se utiliza em todos os cálculos esta base de margens brutas para alcançar a situação tributária do contribuinte para os anos de 2005 e 2006, através da aplicação de métodos indirectos, esquecendo que as margens utilizadas estavam influenciadas pelos inventários, que os próprios técnicos tinham começado por pôr em causa.
8 - A técnica da fiscalização tributária afirmou que foram feitas correcções/ajustes aos inventários de produtos acabados dos anos aqui em causa, através da aplicação de uma taxa média de crescimento de 2,5% retirada dos anos de 2002 e 2003, uma vez que a Administração Fiscal nos cálculos que efectuou, presumiu que os inventários da sociedade recorrida referentes a estes dois exercícios eram reais.
9 - Ora, o técnico oficial de contas da sociedade recorrente afirmou peremptoriamente não se lembrar se os inventários referentes ao exercício de 2002 foram ou não manipulados, mas relativamente ao ano de 2003 não teve dúvidas em afirmar que os respectivos inventários foram manipulados, no sentido de uma sobrevalorização.
10 - Assim, os cálculos efectuados pela Administração Fiscal, na quantificação do imposto aqui em causa encontram-se feridos de erros, porque assentes em premissas claramente erradas.
11 - Ficou provado que os serviços da sociedade recorrida recolheram e compilaram elementos para poder dar uma resposta sobre a situação real da respectiva matéria colectável, caso não fossem praticadas as anomalias nos inventários, com acréscimos de valores e/ou quantidades e que conduziram a níveis de matéria colectável mais elevada.
12 - Como forma de validar o trabalho de elaboração dos inventários reais levado a cabo pela sociedade recorrida, esta contratou um revisor oficial de contas, que enquanto técnico isento, efectuou um exercício de análise exaustiva das variações dos inventários reais de um ano para o outro, com vista a averiguar se as mesmas apresentam consistência, isto é, se têm uma justificação concreta e razoável.
13 - Este revisor oficial de contas prestou depoimento em Tribunal e validou o trabalho efectuado pela sociedade recorrida, reconhecendo como verdadeira a informação revelada pelos inventários reais apresentados pela sociedade recorrida com o presente processo de impugnação judicial.
14 - Ora, o Acórdão invocado pela Fazenda Pública nas suas alegações não é aplicável no caso concreto, uma vez que no processo aqui em causa ficou provado que o critério utilizado pela Administração Tributária não se revelou adequado nem racionalmente justificado, não se apresentando sequer como um modo adequado de aproximação à realidade.
15 - Com efeito, no caso sub judice, o critério usado pela Administração Tributária na quantificação da matéria tributável está à partida ferido, uma vez que foram utilizados elementos retirados de inventários apresentados pela sociedade recorrida e considerados à partida pela própria Administração Tributária como sobrevalorizados, justificando inclusivamente o recurso à aplicação de métodos indirectos.
16 - É evidente que o critério usado pela AT padece do vício que lhe vem imputado, na medida em que a taxa média inclui os valores de 2005 e 2006 que indirectamente se encontram influenciados pelos inventários considerados errados e que justificaram o recurso a métodos indirectos.
17 - Acresce que se a AT reconhece que os inventários de 2002 e 2003 não merecem qualquer crítica, isso significa que, conhecendo as existências finais de 2003, iniciais de 2004, e conhecendo o valor das compras e vendas de cada ano (que não vêm postas em causa), a AT poderia ter calculado rigorosamente, através de simples operações aritméticas, o valor das existências finais de 2005 e 2006.
18 - Não o tendo feito, a AT subverteu a teleologia e a metodologia subjacentes à avaliação indirecta, que se quer subsidiária da avaliação directa também no sentido de que as regras destas são de aplicar sempre que possível mesmo no âmbito da avaliação indirecta (artigo 85º da LGT).
19 - Acresce que conhecendo a AT o contexto de abrandamento da actividade da empresa no período em causa, com diminuição das compras e do volume de negócios (além dos despedimentos e perda de acesso a crédito externo), em vez de pressupor a existência de um crescimento anual de 2,5% (embora este corresponda apenas ao crescimento da inflação, e não a crescimento real da actividade) e de, consequentemente, presumir a existência de omissão de vendas, a AT deveria ter dedicado um pouco mais de esforço à averiguação da real situação tributária do contribuinte ou, em caso de dúvida, abster-se de tributar, com fundamento nos artigos 58º da LGT e 100º, nº 1, do CPPT.
20 - Portanto, pelo facto de os inventários exibidos não merecerem credibilidade, e isso justificar o recurso a métodos indirectos de avaliação, não fica a AT dispensada de procurar a verdade material de acordo com as regras legais aplicáveis, designadamente tendo em conta que a “tributação” deve incidir preferencialmente sobre o rendimento real e não se confunde com “sanção” por mais censurável que seja a prática que a justifica.
21 - Em suma, afigura-se que a aplicação da margem de 72% no caso dos autos resulta na utilização de um critério desadequado à quantificação por métodos indirectos de avaliação, o que determina a anulação das liquidações impugnadas.
Nestes termos, deverão V. Exas. negar provimento ao presente recurso, devendo a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro ser mantida, por legalidade, porque a aplicação da margem de 72% no caso dos autos resulta na utilização de um critério desadequado à quantificação por métodos indirectos de avaliação, o que determina a anulação das liquidações impugnadas, seguindo-se os ulteriores termos do processo até final.
Só desta forma, farão V. Exas. a costumada JUSTIÇA!”

O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso.

Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.


2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que as questões suscitadas resumem-se, em suma, em analisar a suscitada nulidade da sentença por falta de especificação dos fundamentos de facto, apreciar o alcance do exposto quanto ao erro de julgamento de facto e bem assim indagar do apontado erro de julgamento de direito com referência ao critério utilizado na quantificação em termos do seu enquadramento quer em função do exposto no RIT quer de acordo com o teor do art. 90º da LGT.
3. FUNDAMENTOS
3.1. DE FACTO
Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:
“…
Com base nos documentos junto aos autos e no processo administrativo (PA) apenso, bem como nos depoimentos das testemunhas, considera-se provada a seguinte matéria de facto, com relevância para a decisão:
1. A sociedade Impugnante encontra-se fiscalmente registada para o exercício da atividade de “fabricação e comercialização de embalagens de plástico- CAE 22220” mas a sua atividade principal consiste na compra, produção e comercialização de artigos plásticos e de papel tendo como mercado alvo o ramo da ourivesaria e da joalharia (embalagem e decoração) e setor dos vinhos (embalagem em caixas de madeira e papel/juta) – pág. 1 e 2 do relatório, a fls. 5 e 6 do PA;
2. A Impugnante comercializa cerca de três mil (3000) produtos com referências diferentes – segunda e terceira testemunhas;
3. Todos os anos, nos primeiros dias de janeiro, a Impugnante procede à contagem física dos artigos em existência, sendo essa tarefa executada pelos trabalhadores do armazém e dos setores fabris através do averbamento em fichas fornecidas pela empresa – terceira, quarta, quinta e sexta testemunhas e fls. 516 e seguintes do processo físico;
4. Essas fichas de inventário são posteriormente conferidas pela Drª E…, Gestora da Impugnante e quarta testemunha, por comparação com o sistema informático “PRC” de gestão utilizado pela empresa e com ajuda do pessoal do armazém e dos setores fabris - terceira, quarta, quinta e sexta testemunhas;
5. Em seguida, com base nas fichas corrigidas, a Dr.ª E… procede à consolidação de toda a informação e elabora o documento de “inventário”, discriminando qualidade, quantidade e valor - terceira, quarta, quinta testemunhas;
6. A valorimetria feita pela Dr.ª E… assenta no custo documentado em faturas, quanto às compras de matérias-primas e de mercadorias, e nas “fichas de produção” quanto aos artigos transformados – terceira e quarta testemunhas;
7. Depois, a Drª E… comunica o resultado do inventário ao gerente, A..., e disponibiliza o respetivo documento por via informática em rede interna, aos vários utilizadores, designadamente o contabilista e terceira testemunha – terceira e quarta testemunhas;
8. Pelo menos até ao ano 2000 a situação da empresa era boa ou muito boa, e o resultado dos inventários elaborados com base na metodologia acima descrita não era sujeito a qualquer adulteração – terceira testemunha e contabilista;
9. A certa altura, no período entre os anos 2000 e 2005, a situação da empresa sofreu alguma deterioração, que conduziu à redução dos investimentos em obras, equipamentos e pessoal, redução das compras e do volume de negócios – segunda terceira e quarta testemunhas e ponto II do Relatório de fls. 5 a 11 do PA;
10. Pelo menos em 2005 e 2006, o contabilista e o gerente A... alteraram o resultado dos respetivos inventários efetuados pela Dr.ª E…, sem conhecimento desta ou de outras pessoas, manipulando as quantidades e valores dos artigos ali descritos com intenção deliberada de distorcer a informação fornecida a terceiros em relação à realidade – terceira testemunha (principalmente) e também segunda e quarta testemunhas;
11. Por despacho de 2/4/2008, proferido na Ordem de Serviço nº OI200800664, foi autorizada a abertura do procedimento de inspeção externa à atividade da agora impugnante, com âmbito geral e extensão aos anos 2005 e 2006 – fls. 65 do PA;
12. Da carta-aviso relativa à ordem de serviço acima referida consta a declaração manuscrita “Recebi cópia em 03/04/2008” assinada com nome legível “Ab…” – fls. 64 do PA;
13. O Técnico Oficial de Contas (TOC) e da agora Impugnante é o Sr. Ab…, que assinou o recebimento da carta-aviso – artigo 20º da contestação, pág. 2 do Relatório, a fls.6, 65, 75 do PA;
14. Em 3/4/2008, o Técnico Oficial de Contas (TOC) acima referido assinou a ordem de serviço a que alude o ponto 2 supra – fls. 65 do PA;
15. No decurso da ação inspetiva a AT analisou os inventários exibidos e, com base neles, calculou as margens brutas sobre as vendas e efetuou amostragem que incidiu sobre 66 produtos e 123 mercadorias, que no conjunto representam cerca de 49% das vendas do ano 2006, a qual revelou que a margem bruta sobre as vendas de produtos acabados é de 83,51% e nas mercadorias é de 47,64%, concluindo que os inventários de 2004, 2005, 2006 e 2007 se encontram sobrevalorizados em cerca de 25% - fls. 21 do PA;
16. A AT comparou os inventários de 2002 e 2003 relativos a produtos acabados e concluiu que evidenciam um crescimento de 2,5% - fls. 39 do PA;
17. Por considerar que esse crescimento de 2,5% é razoável e próximo da taxa de inflação dessa época, a AT corrigiu o inventário final de 2005, inicial de 2006 e final de 2006 na proporção de 2,5% ao ano, e recalculou a “variação da produção” e verificou a diminuição das margens brutas sobre as vendas de 2005 e 2006 para 70% e 69% respetivamente – fls. 39 e 40 do PA;
18. Como critério de quantificação a AT escolheu a margem bruta sobre as vendas de 72%, por ser aproximadamente essa a margem bruta média dos anos 2003 a 2006 declarada pelo sujeito passivo (72,77%) e da margem bruta após correção da variação da produção do anos 2005 e 2006 (70%) – fls. 39 a 41 do PA;
19. A AT notificou a agora Impugnante do teor do projeto de Relatório - admissão, artigo 13º da p.i. e fls. 67 a 69 do PA;
20. A agora Impugnante exerceu o direito de audição relativamente ao dito projeto de Relatório – admissão, artigo 4º da p.i. e fls. 59 a 63 do PA;
21. Em 12/9/2008 a AT elaborou o Relatório final da inspeção, que foi homologado por despacho de 22/9/2008, apurando correções à matéria tributável do IRC dos anos de 2005 e 2006, com recurso a métodos indiretos e a avaliação direta, a saber:
Correções em IRC
2005
2006
Métodos Indiretos
34.114,93
135.316,14
CT (Tributações Autónomas)
168,16
103,85
– fls. 1 e seguintes do PA;
22. Notificada do Relatório e da fixação dos rendimentos, a agora Impugnante pediu revisão da matéria tributável nos termos do artigo 91º da LGT – artigos 5º e 6º p.i. e fls. 70 a 453 do PA;
23. Os peritos do contribuinte e da AT reuniram-se em 26/11/2008 e 2/12/2008 sem que fosse possível chegarem a acordo – artigo 7º p.i. e fls. 454 e 478 do PA;
24. Por despacho de 3/3/2009 o Diretor de Finanças de Aveiro pôs termo ao procedimento de revisão mantendo os valores do lucro tributável inicialmente fixado, a saber: € 52.501,28, para o ano 2005, e € 82.868,20, para o ano 2006 – fls. 479 a 503 do PA;
25. Em 18/3/2009 a AT emitiu as liquidações nº 2009.8310011764 e nº 2009.831001179, relativas ao IRC e derrama, tributação autónoma e juros compensatórios de 2005 e 2006, nos montantes globais de € 10.532,48 e de € 23.343,37, respetivamente - fls. 29 da Impug. 343/09.8BEAVR e fls. 28 da Impug. 341/09.1BEAVR;
26. Em 23/3/2009 a AT emitiu a compensação nº 2009.000396196, e a respetiva demonstração, relativa ao IRC do ano 2005, apurando saldo a pagar de € 10.471,14, com data limite de pagamento até 29/4/2009 – fls. 27 da Impug. 343/09.8BEAVR;
27. Em 2/4/2009 a AT emitiu a compensação nº 2009.000430937, e a respetiva demonstração, relativa ao IRC do ano 2006, apurando saldo a pagar de € 23.716,10, com data limite de pagamento até 13/5/2009 – fls. 27 da Impug 341/09.1BEAVR;
28. Em 2/7/2009 foram apresentadas as petições iniciais das presentes impugnações – fls. 1 e 2 dos processos 341/09.1BEAVR e 343/09.8BEAVR;
3.2 Matéria de facto dada como não provada:
Não se apuraram outros factos com relevância para a boa decisão das questões a apreciar que devam considerar-se não provados
4 – Motivação de facto
O Tribunal julgou provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa com base na análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos e ao PA, que não foram impugnados, e bem assim na parte dos factos alegados pelas partes que não tendo sido impugnados – art.º 74º da LGT - também são corroborados pelos documentos juntos aos autos art.º 76º nº 1 da LGT e arts. 362º e ss do Código Civil (CC) – identificados em cada um dos factos descritos no probatório.
Do conjunto da materialidade apurada resultou a convicção de que a agora Impugnante se dedica à atividade de compra, produção e comercialização de artigos plásticos e de papel tendo como mercado alvo o ramo da ourivesaria e da joalharia (embalagem e decoração) e setor dos vinhos (embalagem em caixas de madeira e papel/juta) – facto 1 de 3.1 supra. Para isso, compra matérias-primas que transforma para vender sob a forma de produtos acabados, podendo também vender aquelas matérias-primas como mercadoria (sem qualquer transformação), e compra mercadorias, geralmente importadas, para vender no mesmo estado aos seus clientes, conforme resultou claramente dos depoimentos das testemunhas inquiridas.
Em 2008 a AT efetuou ação inspetiva externa à atividade da agora Impugnante relativa aos anos 2005 e 2006 e apurou correções técnicas e, também, por métodos indiretos com efeitos no respetivo IRC (artigos 2 e 8 de 3.1 supra).
Para isso, entregou à agora Impugnante a carta-aviso a que alude o artigo 49º do RCPIT. Porém, essa carta foi entregue em mão, em 3/4/2008, no próprio dia do início da ação inspetiva, tendo esses atos praticados na pessoa do TOC (técnico oficial de contabilidade) da Impugnante (factos 3 a 5 de 3.1 supra).
Ou seja, a carta-aviso não foi remetida com a antecedência mínima de 5 dias em relação ao início da ação inspetiva (em violação do artigo 49º, nº1, do RCPIT).
Na ação inspetiva a AT verificou que a contabilidade do sujeito passivo não se encontra executada e organizada nos termos da lei, sendo manifesto que os inventários relativos aos anos 2005 e 2006 não espelham a realidade da empresa e que existem situações sujeitas a tributações autónomas que não tinham sido declaradas.
Com esse fundamento a AT efetuou correções técnicas, quanto às tributações autónomas e corrigiu por métodos indiretos a matéria coletável declarada nos anos 2005 e 2006 (pontos III. 2 e IV do Relatório).
As correções técnicas referem-se a despesas (combustível e portagens) relacionadas com utilização de automóveis ligeiros de passageiros.
As correções por métodos indiretos resultaram de inconsistência das demonstrações financeiras e dos respetivos balancetes e de sobrevalorização dos inventários por empolamento dos preços de custo e consequente manipulação das margens brutas declaradas (ponto IV do Relatório).
Para quantificação das correções por métodos indiretos a AT começou por fazer a análise dos inventários exibidos, de 2002 a 2006, e concluiu que os valores não têm credibilidade por se encontrarem empolados. Essa conclusão assentou também na divergência encontrada entre as margens resultantes da contabilidade e as margens apuradas através de amostragem referida no ponto 15 de 3.1 supra. Por isso, a AT notificou a agora Impugnante para exibir os inventários verdadeiros, mas não obteve os elementos pretendidos. Pelo que partindo da comparação dos inventários de 2002 e 2003 a AT verificou um crescimento de 2,5%, que considerou ser aceitável para correção dos inventários de 2005 e 2006 por nesta altura ser aquele o valor da inflação.
Corrigidas as “existências” dos inventários de 2005 e 2006, a AT procedeu à correspondente correção da variação da produção e apurou as margens brutas corrigidas relativas aos anos 2005 e 2006 (70% e 69% respetivamente)
Em seguida a AT calculou vendas omitidas aplicando a margem bruta de 72% sobre o CMVMC contabilístico dos anos 2005 e 2006 (fls. 41 e 42 e 102vº do PA). Essa taxa (72%) corresponde à média das margens brutas resultantes dos elementos contabilísticos do sujeito passivo relativos aos anos de 2003, 2004, 2005 e 2006 (fls. 38 e 39 do PA). A escolha desta taxa assentou na “convicção de que a média da margem do lucro liquido reflectiria de uma forma aproximada o resultado da atividade efectivamente praticada pela empresa” e na conclusão retirada pela AT de que “o efeito dos erros (existentes) no inventário final seria anulado pelos vícios ocorridos no inventário inicial” (resposta ao direito de audição, a fls. 47 do PA). Em fase de inquirição de testemunhas, a Inspetora autora do Relatório (primeira testemunha) acrescentou que esse critério lhe pareceu “justo”
Notificada do Relatório de inspeção, a Impugnante requereu a abertura do procedimento de revisão previsto nos artigos 91 e 92º da LGT, mas não foi possível realizar acordo entre os peritos das partes, pelo que o Diretor Distrital pôs termo ao procedimento e a AT procedeu às liquidações agora sob impugnação.
Na presente instância, na inquirição de testemunhas a Impugnante investiu bastante esforço na descrição dos procedimentos de inventariação levados a cabo pela empresa logo nos primeiros dias de cada ano (factos 3 a 7 de 3.1 supra). Nessa parte os depoimentos das testemunhas inquiridas mostraram-se coerentes e pormenorizados, e por isso, credíveis.
Já a explicação para a existência de “manipulação” ou adulteração dos resultados dos inventários (para “melhorar a imagem da empresa junto da banca”), dada pela segunda testemunha (contabilista) apresenta incoerências e exigiria a apresentação de provas complementares, pelo que não pode ser aceite.
De facto, se a empresa pretendia melhorar a sua imagem junto da banca poderia ter usado outros meios, que não a alteração dos documentos de inventários. Não se percebe como esse objetivo pode explicar tanto investimento nos procedimentos de inventariação pormenorizada e criteriosa, com paragem da atividade em alguns setores da empresa durante alguns dias ou semanas para contagem física de mais de 3000 artigos diferentes, conferência detalhada das respetivas fichas de inventário, cuidada valorimetria dos custos, para depois o contabilista e o gerente destruírem todo esse trabalho, adulterando as quantidades e valores sem guardarem qualquer cópia dos verdadeiros inventários. Além disso, se essa “adulteração” ou “manipulação” dos inventários visava dar aos financiadores uma imagem mais sã da situação patrimonial da empresa, para quê destruir os inventários verdadeiros? E porque razão essa atividade falsificadora conduziu ao resultado inverso no ano 2006, aumentando o prejuízo real?
Seja como for, para além de a confessada ação falsificadora ser censurável a todos os títulos, independentemente da verdadeira intenção subjacente, sabe-se que o resultado dela consistiu na efetiva alteração dos resultados fiscais e na violação dos “deveres acessórios”, contabilístico e declarativo, nos anos em que aquela ocorreu.
No entanto, a Impugnante não discute a existência de motivo para recorrer à aplicação de métodos indiretos de avaliação, que admite, mas apenas o critério de quantificação concretamente utilizado, sobretudo quanto à escolha da margem média de 72%.
Por outro lado, a terceira testemunha (contabilista) não foi muito assertiva quanto à indicação do ano em que essa prática falsificadora se terá iniciado, sendo certo que isso não terá acontecido antes de 2002. Alegou, com algumas dúvidas de o resultados dos inventários terá sido “mexido” em 2004 e até em 2003, mas crê-se que tal extensão ao ano 2003 visou intencionalmente desvalorizar o trabalho do inspetor na parte em que começou por apurar a taxa de crescimento entre os inventários dos anos 2002 para 2003 (factos 16 e 17 de 3.1 supra).
Essa desconfiança assenta também no facto de essa testemunha aparentemente não ter pejo em proceder da maneira que confessou, mesmo sabendo perfeitamente que a sua conduta era censurável, e por ter interesse “pessoal”, na qualidade de contabilista, em contrariar as correções efetuadas pela AT aos resultados do seu próprio trabalho.
Sem prejuízo, do seu depoimento resulta que pelo menos até ao exercício relativo ao ano 2000 não haveria qualquer manipulação dos inventários e que a partir de então se verificou o início da alteração da situação em que a atividade da empresa era exercida, com progressivo abrandamento e consequente queda dos resultados.
Isso resulta dos factos, referidos no Relatório e pela testemunha, de que desde 2000 cessaram os investimentos, se reduziram os proveitos, as compras e os lucros, ocorreram despedimentos de pessoal e terá aumentado a dificuldade de acesso ao crédito já que os financiamentos externos foram substituídos por suprimentos dos sócios. A questão que se coloca é a de saber qual o momento a partir do qual se iniciou a confessada prática de falsificar os inventários: logo em 2001 ou em 2002 ou em 2003 ou em 2004? (sendo certo que em 2005 e 2006 isso já sucedeu).
Do depoimento dessa testemunha, única que se referiu ao assunto, resulta que até ao ano 2000 a situação da empresa era boa e não havia “necessidade” de qualquer falsificação dos resultados contabilístico-fiscais e que depois de 2001 começou o “decréscimo da empresa” provocado alegadamente pelo aumento da concorrência, designadamente provinda dos baixos preços de artigos similares com origem na China.
Não é possível determinar exatamente o ano em que se iniciou a dita prática de falsificar os inventários, embora se saiba que isso sucedeu em 2003 ou 2004. Por isso, não se vê qualquer razão para descredibilizar os pressupostos em que assentam os factos descrito em 16 e 17 de 3.1 supra.”
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3.2. DE DIREITO
Assente a factualidade apurada cumpre, então, entrar na análise da realidade em equação nos autos e que se prende, num primeiro momento, com a questão da nulidade da sentença por falta de especificação dos fundamentos de facto suscitada pelo Ministério Público, referindo, em termos essenciais, que o Sr. Juiz não discrimina os factos não provados e, na motivação da matéria de facto não especifica o teor dos depoimentos prestados por cada uma das testemunhas inquiridas para se poder concluir pela sua credibilidade bem como não faz qualquer apreciação crítica ou confronto dos meios de prova conflituantes - documental e testemunhal - inviabilizando deste modo a percepção dos motivos que levaram o Tribunal a quo a decidir como decidiu.
Relativamente ao núcleo essencial desta arguição, há que ter em atenção que, como é sabido, só se verifica tal nulidade quando ocorre falta absoluta de fundamentação - Ac. do S.T.A. de 16-11-2011, Proc. nº 0802/10, www.dgsi.pt - , sendo que tal como refere o Prof. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, volume V, página 140 “há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto.”.
Porém, como refere o Cons. Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, 5ª ed., Vol. I, pág. 909, “deverão considerar-se como falta absoluta de fundamentação os casos em que ela não tenha relação perceptível com o julgado ou seja ininteligível, situações em que se está perante uma mera aparência de fundamentação.
Com efeito, a fundamentação destina-se a esclarecer as partes, primacialmente a que tiver ficado vencida, sobre os motivos da decisão, não só para ficar convencida de que não tem razão, mas também porque o conhecimento daqueles é necessário ou, pelo menos, conveniente, para poder impugnar eficazmente a decisão em recurso ou arguir nulidades, designadamente a derivada de eventual contradição entre os fundamentos e a decisão.
Por isso, quando a fundamentação não for minimamente elucidativa das razões que levaram a decidir como se decidiu deverá entender-se que se está perante uma nulidade por falta de fundamentação”.
Por outro lado, quanto à nulidade decorrente da falta de exame crítico das provas, é sabido que nos termos do disposto nos arts. 123º nº 2 do CPPT e 659º nº 3 do C. Proc. Civil, na elaboração da decisão final o julgador está vinculado a elencar discriminadamente, a factualidade demonstrada da não provada, fundamentando porque veio a tomar o sentido decisório final, seja no que concerne ao julgamento da matéria de direito, seja, como é axiomático e evidente, no que diz respeito ao julgamento da matéria de facto, na medida em que aquele mais não será do que subsunção desta última ao enquadramento jurídico tido por relevante e aplicável.
“A razão da exigência de indicação da matéria de facto não provada, além da provada, que não aparece no art. 659.º, n.º 2, do CPC, «está em que, no contencioso tributário, não há lugar à decisão da matéria de facto, por meio de acórdão ou despacho, próprios e autónomos, como acontece no processo civil - art. 653º nº 2 -, em que se exige a indicação dos “factos que o tribunal julga provados e quais os que julga não provados”. No contencioso tributário, é na própria sentença que se opera tal julgamento.
Aí, pois, a exigida discriminação dos factos provados e não provados é absolutamente essencial pois que não existe outra peça processual que concretize tal julgamento da matéria de facto. Compreende-se assim a não referência, no artº 659º do CPCivil, aos factos não provados pois que, ai, na sentença, não resta se não aplicar o direito aos factos provados, já que, como é óbvio, os não provados não interessam para o efeito.
É, pois, a necessidade absoluta de julgamento da matéria de facto efectuada, no contencioso tributário, na própria sentença, que leva directamente à exigência da predita discriminação entre “a matéria provada da não provada” (Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado, II volume, Áreas Editora 2011, pág. 320 - citando a declaração de voto do Senhor Conselheiro Dr. Brandão de Pinho proferida no acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 2003-05-07, no processo n.º 0869/02, disponível em redacção integral
in www.dgsi.pt).

Nesta sequência, cumpre notar que o vício em apreço, em qualquer das vertentes apontada, apenas ocorre quando haja ausência total de fundamentos, sendo que, é ponto assente que na sentença posta em crise foi analisada a prova produzida, nomeadamente a prova testemunhal, pois consignou-se que “O Tribunal julgou provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa com base na análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos e ao PA, que não foram impugnados, e bem assim na parte dos factos alegados pelas partes que não tendo sido impugnados – art.º 74º da LGT - também são corroborados pelos documentos juntos aos autos art.º 76º nº 1 da LGT e arts. 362º e ss do Código Civil (CC) – identificados em cada um dos factos descritos no probatório.
Do conjunto da materialidade apurada resultou a convicção de que a agora Impugnante se dedica à atividade de compra, produção e comercialização de artigos plásticos e de papel tendo como mercado alvo o ramo da ourivesaria e da joalharia (embalagem e decoração) e setor dos vinhos (embalagem em caixas de madeira e papel/juta) – facto 1 de 3.1 supra. Para isso, compra matérias-primas que transforma para vender sob a forma de produtos acabados, podendo também vender aquelas matérias-primas como mercadoria (sem qualquer transformação), e compra mercadorias, geralmente importadas, para vender no mesmo estado aos seus clientes, conforme resultou claramente dos depoimentos das testemunhas inquiridas.
Em 2008 a AT efetuou ação inspetiva externa à atividade da agora Impugnante relativa aos anos 2005 e 2006 e apurou correções técnicas e, também, por métodos indiretos com efeitos no respetivo IRC (artigos 2 e 8 de 3.1 supra).
Para isso, entregou à agora Impugnante a carta-aviso a que alude o artigo 49º do RCPIT. Porém, essa carta foi entregue em mão, em 3/4/2008, no próprio dia do início da ação inspetiva, tendo esses atos praticados na pessoa do TOC (técnico oficial de contabilidade) da Impugnante (factos 3 a 5 de 3.1 supra).
Ou seja, a carta-aviso não foi remetida com a antecedência mínima de 5 dias em relação ao início da ação inspetiva (em violação do artigo 49º, nº1, do RCPIT).
Na ação inspetiva a AT verificou que a contabilidade do sujeito passivo não se encontra executada e organizada nos termos da lei, sendo manifesto que os inventários relativos aos anos 2005 e 2006 não espelham a realidade da empresa e que existem situações sujeitas a tributações autónomas que não tinham sido declaradas.
Com esse fundamento a AT efetuou correções técnicas, quanto às tributações autónomas e corrigiu por métodos indiretos a matéria coletável declarada nos anos 2005 e 2006 (pontos III. 2 e IV do Relatório).
As correções técnicas referem-se a despesas (combustível e portagens) relacionadas com utilização de automóveis ligeiros de passageiros.
As correções por métodos indiretos resultaram de inconsistência das demonstrações financeiras e dos respetivos balancetes e de sobrevalorização dos inventários por empolamento dos preços de custo e consequente manipulação das margens brutas declaradas (ponto IV do Relatório).
Para quantificação das correções por métodos indiretos a AT começou por fazer a análise dos inventários exibidos, de 2002 a 2006, e concluiu que os valores não têm credibilidade por se encontrarem empolados. Essa conclusão assentou também na divergência encontrada entre as margens resultantes da contabilidade e as margens apuradas através de amostragem referida no ponto 15 de 3.1 supra. Por isso, a AT notificou a agora Impugnante para exibir os inventários verdadeiros, mas não obteve os elementos pretendidos. Pelo que partindo da comparação dos inventários de 2002 e 2003 a AT verificou um crescimento de 2,5%, que considerou ser aceitável para correção dos inventários de 2005 e 2006 por nesta altura ser aquele o valor da inflação.
Corrigidas as “existências” dos inventários de 2005 e 2006, a AT procedeu à correspondente correção da variação da produção e apurou as margens brutas corrigidas relativas aos anos 2005 e 2006 (70% e 69% respetivamente)
Em seguida a AT calculou vendas omitidas aplicando a margem bruta de 72% sobre o CMVMC contabilístico dos anos 2005 e 2006 (fls. 41 e 42 e 102vº do PA). Essa taxa (72%) corresponde à média das margens brutas resultantes dos elementos contabilísticos do sujeito passivo relativos aos anos de 2003, 2004, 2005 e 2006 (fls. 38 e 39 do PA). A escolha desta taxa assentou na “convicção de que a média da margem do lucro liquido reflectiria de uma forma aproximada o resultado da atividade efectivamente praticada pela empresa” e na conclusão retirada pela AT de que “o efeito dos erros (existentes) no inventário final seria anulado pelos vícios ocorridos no inventário inicial” (resposta ao direito de audição, a fls. 47 do PA). Em fase de inquirição de testemunhas, a Inspetora autora do Relatório (primeira testemunha) acrescentou que esse critério lhe pareceu “justo”
Notificada do Relatório de inspeção, a Impugnante requereu a abertura do procedimento de revisão previsto nos artigos 91 e 92º da LGT, mas não foi possível realizar acordo entre os peritos das partes, pelo que o Diretor Distrital pôs termo ao procedimento e a AT procedeu às liquidações agora sob impugnação.
Na presente instância, na inquirição de testemunhas a Impugnante investiu bastante esforço na descrição dos procedimentos de inventariação levados a cabo pela empresa logo nos primeiros dias de cada ano (factos 3 a 7 de 3.1 supra). Nessa parte os depoimentos das testemunhas inquiridas mostraram-se coerentes e pormenorizados, e por isso, credíveis.
Já a explicação para a existência de “manipulação” ou adulteração dos resultados dos inventários (para “melhorar a imagem da empresa junto da banca”), dada pela segunda testemunha (contabilista) apresenta incoerências e exigiria a apresentação de provas complementares, pelo que não pode ser aceite.
De facto, se a empresa pretendia melhorar a sua imagem junto da banca poderia ter usado outros meios, que não a alteração dos documentos de inventários. Não se percebe como esse objetivo pode explicar tanto investimento nos procedimentos de inventariação pormenorizada e criteriosa, com paragem da atividade em alguns setores da empresa durante alguns dias ou semanas para contagem física de mais de 3000 artigos diferentes, conferência detalhada das respetivas fichas de inventário, cuidada valorimetria dos custos, para depois o contabilista e o gerente destruírem todo esse trabalho, adulterando as quantidades e valores sem guardarem qualquer cópia dos verdadeiros inventários. Além disso, se essa “adulteração” ou “manipulação” dos inventários visava dar aos financiadores uma imagem mais sã da situação patrimonial da empresa, para quê destruir os inventários verdadeiros? E porque razão essa atividade falsificadora conduziu ao resultado inverso no ano 2006, aumentando o prejuízo real?
Seja como for, para além de a confessada ação falsificadora ser censurável a todos os títulos, independentemente da verdadeira intenção subjacente, sabe-se que o resultado dela consistiu na efetiva alteração dos resultados fiscais e na violação dos “deveres acessórios”, contabilístico e declarativo, nos anos em que aquela ocorreu.
No entanto, a Impugnante não discute a existência de motivo para recorrer à aplicação de métodos indiretos de avaliação, que admite, mas apenas o critério de quantificação concretamente utilizado, sobretudo quanto à escolha da margem média de 72%.
Por outro lado, a terceira testemunha (contabilista) não foi muito assertiva quanto à indicação do ano em que essa prática falsificadora se terá iniciado, sendo certo que isso não terá acontecido antes de 2002. Alegou, com algumas dúvidas de o resultados dos inventários terá sido “mexido” em 2004 e até em 2003, mas crê-se que tal extensão ao ano 2003 visou intencionalmente desvalorizar o trabalho do inspetor na parte em que começou por apurar a taxa de crescimento entre os inventários dos anos 2002 para 2003 (factos 16 e 17 de 3.1 supra).
Essa desconfiança assenta também no facto de essa testemunha aparentemente não ter pejo em proceder da maneira que confessou, mesmo sabendo perfeitamente que a sua conduta era censurável, e por ter interesse “pessoal”, na qualidade de contabilista, em contrariar as correções efetuadas pela AT aos resultados do seu próprio trabalho.
Sem prejuízo, do seu depoimento resulta que pelo menos até ao exercício relativo ao ano 2000 não haveria qualquer manipulação dos inventários e que a partir de então se verificou o início da alteração da situação em que a atividade da empresa era exercida, com progressivo abrandamento e consequente queda dos resultados.
Isso resulta dos factos, referidos no Relatório e pela testemunha, de que desde 2000 cessaram os investimentos, se reduziram os proveitos, as compras e os lucros, ocorreram despedimentos de pessoal e terá aumentado a dificuldade de acesso ao crédito já que os financiamentos externos foram substituídos por suprimentos dos sócios. A questão que se coloca é a de saber qual o momento a partir do qual se iniciou a confessada prática de falsificar os inventários: logo em 2001 ou em 2002 ou em 2003 ou em 2004? (sendo certo que em 2005 e 2006 isso já sucedeu).
Do depoimento dessa testemunha, única que se referiu ao assunto, resulta que até ao ano 2000 a situação da empresa era boa e não havia “necessidade” de qualquer falsificação dos resultados contabilístico-fiscais e que depois de 2001 começou o “decréscimo da empresa” provocado alegadamente pelo aumento da concorrência, designadamente provinda dos baixos preços de artigos similares com origem na China.
Não é possível determinar exatamente o ano em que se iniciou a dita prática de falsificar os inventários, embora se saiba que isso sucedeu em 2003 ou 2004. Por isso, não se vê qualquer razão para descredibilizar os pressupostos em que assentam os factos descrito em 16 e 17 de 3.1 supra.”, referindo antes que “3.2 Matéria de facto dada como não provada: Não se apuraram outros factos com relevância para a boa decisão das questões a apreciar que devam considerar-se não provados

Presente o exposto, e considerando os termos da decisão recorrida, é manifesto que a invocada nulidade não pode ser atendida na medida em que foram fixados os factos descritos no probatório relacionados com a problemática em causa, retirando-se relevância ao mais nesta sede (sendo que não se vislumbra, nem o Ministério Público especifica quaisquer factos relevantes para a decisão que, tendo sido alegados, devem ser considerados no julgamento de facto, dando-os como provados ou não provados, considerando todas as soluções plausíveis da questão de direito), procedendo-se depois à análise das questões apontadas nos autos, o que significa que, nesta matéria, se exteriorizam as razões de facto e de direito que fundamentam a decisão, de modo que, a matéria apontada pelo Ministério Público não é susceptível de suportar a invocada nulidade da sentença por falta de especificação dos fundamentos de facto.

Assim, e com referência à matéria do presente recurso, nas suas alegações, a Recorrente refere que a violação dos deveres de cooperação praticada pelo contribuinte na fase do procedimento de inspecção vai acarretar que a decisão de quantificação assente num raciocínio quantitativo e que a decisão tomada leve em conta um elevado grau de probabilidade, sendo que o Meritíssimo Juiz do tribunal a quo ao não relevar este facto, está a favorecer a violação dos deveres de cooperação, demonstrando-se que a inspecção tributária utilizou elementos objectivos e concretos que, segundo as regras da experiência, pautadas por critérios de razoabilidade e de normalidade e tendo em linha de conta as especificidades próprias da actividade dos contribuintes inspeccionados, conduziram á quantificação das vendas omitidas, o que significa que a quantificação efectuada pela AT tem base suficientemente seguras e adequadas a sustentar o apuramento das vendas omitidas e por conseguinte a decisão do Meritíssimo Juiz pode e deve ser alterada, porquanto tal é permitido pela aplicação subsidiária do artº 712º do CPC, pois do processo constam todos os elementos de prova da matéria de facto em causa, o que quer dizer que deve ser alterada a referida decisão considerando-se que a quantificação efectuada pela AT tem bases suficientemente seguras e adequadas a sustentar o apuramento das vendas omitidas.
Neste ponto, diga-se que a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, o que significa que o Recorrente tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida, verificando-se que se a decisão do julgador, devidamente fundamentada, for uma das soluções plausíveis, segundo as regras da lógica, da ciência e da experiência, ela será inatacável, visto ser proferida em obediência à lei que impõe o julgamento segundo a livre convicção.

Com este pano de fundo, a realidade apontada pela Recorrente não se traduz na invocação de um verdadeiro erro de julgamento ao nível da matéria de facto, até porque estão em causa elementos que constam do RIT que o Tribunal a quo acolheu no âmbito do probatório, mas sim a sua consideração na discussão do núcleo essencial da matéria em análise nos autos, o que nos remete para o erro de julgamento no domínio agora descrito.

Avançando para a realidade nuclear em apreciação nos autos, temos que, nas suas alegações, a Recorrente salienta que o comportamento do contribuinte foi pautado por uma acção falsificadora dos inventários em 2003 e 2004 e que o resultado dela consistiu na efectiva alteração dos resultados fiscais e na violação dos “deveres acessórios”, contabilístico e declarativo, conforme resulta do ponto 10 dos factos provados e se refere na douta sentença na pág. 9, 3º e 4º parágrafo e pág. 10, 6º parágrafo e se a AT se viu obrigada a aplicar os métodos indirectos, tal deve-se a um comportamento culposo do contribuinte, pois que, perante as lacunas de informação da contabilidade, a inspecção tributária teve que escolher um método para quantificar as operações omitidas á contabilidade.
Ora o método adoptado encontra-se justificado e interpretado pelo tribunal a quo da seguinte forma;
Primeiro, assenta no pressuposto de que foi efectuada a falsificação dos inventários de produtos acabados nos anos de 2005 e 2006, o que acarretou a correcção dos mesmos, tendo por base uma taxa média de crescimento de 2,5%, que foi justificada como tratar-se da percentagem de crescimento do inventário final de produtos acabados verificada no ano de 2003, e tratar-se do reflexo da taxa de inflação e assenta ainda no facto de após a referida correcção aos inventários dos produtos acabados, e após a correcção da variação da produção a inspecção ter apurado as margens brutas corrigidas relativas aos anos de 2005 e 2006 de 70% e 69% respetivamente, margens essas inferiores às margens declaradas para as vendas que foram de 77% (Ano 2005) e 68% (Ano 2006), sendo que na quantificação das vendas em falta foi adoptada a margem bruta sobre as vendas de 72%, justificada com o facto de reflectir o resultado da actividade efectivamente praticada pela empresa, porquanto nos anos de 2003 a 2006 a margem média destes foi de 72,77%.
O douto tribunal a quo levanta dúvidas quanto á aplicação da margem de 72%, na medida em que alegadamente essa taxa média inclui os valores de 2005 e 2006 que indirectamente se encontram influenciados pelos inventários considerados errados e que justificaram o recurso a métodos indirectos, verificando-se que no que respeita aos inventários, conforme se descreve na douta sentença, na página 19, a AT começou por analisar os inventários, verificando um anormal crescimento das existências de bens em stock, depois de proceder a diligências de verificação da coerência dos inventários, a inspeção tributária conclui que os mesmos se encontravam sobrevalorizados em cerca de 25% e de seguida a inspecção tributária solicitou à impugnante que procedesse à elaboração de inventários corrigidos relativos aos exercícios de 2004 a 2006, solicitação á qual a impugnante não respondeu por alegadamente falta de condições, o que levou a inspecção a proceder á correcção dos inventários, em 2005 e 2006 e em que os cálculos da matéria colectável foram efectuados com base na aplicação da média de 72%, apurada com base nas declarações apresentadas pelo SP nos anos de 2003 a 2006, ou seja, o método adoptado resultou da aplicação de uma margem média declarada pelo SP, o por isso com grande probabilidade de corresponder á realidade.
A lei no artº 90º da LGT começa com a selecção exemplificativa de um certo número de índices - margens médias do lucro, taxas médias de rentabilidade, coeficientes técnicos, e elementos e informações relativas a empresas ou entidades que tenham relações económicas com o contribuinte, que podem ser utilizados isoladamente ou articulados entre si, para proceder á quantificação, de modo que, se considerarmos os critérios de decisão propostos no artº 90º da LGT, podemos verificar como eles têm implícita uma remissão para a prova probabilística, com base em estatísticas e no caso concreto foram utilizados os elementos e informações declarados á administração tributária pelo próprio sujeito passivo e ao ser utilizado um indicador que parte dos elementos declarados pelo sujeito passivo á AT nas suas declarações de rendimentos, é utilizado um método que relaciona de uma forma congruente e justificada os factos apurados e a situação concreta do contribuinte.
Ao contrário do entendido pelo Mº Juiz do Tribunal a quo, o método utilizado é proporcional à situação concreta do sujeito passivo, e nada tem de desadequado, sendo que o Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao ter entendido que a aplicação da percentagem de 72%, é um critério desadequado, porque alegadamente tal percentagem inclui os valores de 2005 e 2006 que indirectamente se encontram influenciados pelos inventários considerados errados e que justificaram o recurso a métodos indiretos, pois conforme trás se expôs tal percentagem é a que resulta dos elementos declarados pelo sujeito passivo, não sendo imputável á AT “os erros” nos inventários que o SP manipulou, além de que a AT teve a preocupação de aplicar uma margem que reflectia o resultado da actividade efectivamente praticada pelo sujeito passivo, já que aplicou a margem por ele declarada nos anos de 2000 a 2004 e teve o cuidado de solicitar ao contribuinte que procedesse à elaboração de inventários corrigidos relativos aos exercícios de 2004 a 2006, quando constatou que os mesmos se encontravam sobrevalorizados em cerca de 25%, o que nunca veio a suceder, pelo que, se a margem de lucro bruto que foi aplicada de 72%, indirectamente se encontra influenciada pelos inventários que foram manipulados pelo SP, só a ele lhe pode ser imputável e se a douta sentença dá como provado no ponto 10 do probatório que o representante do SP alterou o resultado dos inventários de 2005 e 2006, e que manipulou as quantidades e valores dos artigos aí descritos, a consequência a tirar é que os “supostos erros” dos inventários só aquele podem ser imputados e se estamos perante inventários que foram manipulados pelo sujeito passivo, que tão pouco teve a preocupação de os corrigir quando para tal foi convidado, nunca pode acarretar o vício que é imputado pelo Tribunal á actuação da AT, de que a margem de lucro bruto sobre as vendas que foi utilizada é incongruente com os “referidos erros” dos inventários.
Por outro lado, a violação dos deveres de cooperação praticada pelo contribuinte na fase do procedimento de inspecção vai acarretar que a decisão de quantificação assente num raciocínio quantitativo e que a decisão tomada leve em conta um elevado grau de probabilidade, sendo que o Meritíssimo Juiz do tribunal a quo ao não relevar este facto, está a favorecer a violação dos deveres de cooperação, demonstrando-se que a inspecção tributária utilizou elementos objectivos e concretos que, segundo as regras da experiência, pautadas por critérios de razoabilidade e de normalidade e tendo em linha de conta as especificidades próprias da actividade dos contribuintes inspeccionados, conduziram á quantificação das vendas omitidas, o que significa que a quantificação efectuada pela AT tem base suficientemente seguras e adequadas a sustentar o apuramento das vendas omitidas.

Que dizer?
Como é sobejamente sabido, o nosso ordenamento jurídico consagra o princípio do sistema declarativo, como meio de apuramento do valor tributável, surgindo as outras vias da sua determinação, da iniciativa da AF, como meios subsidiários ou residuais.
De facto e como é bem de ver o sistema jurídico tinha, necessariamente de prever meios alternativos ao apuramento da matéria colectável dos impostos, no caso daquele princípio não operar por motivos imputáveis ao contribuinte. É que, se por um lado o sistema parte do princípio da boa fé dos contribuintes na revelação dos seus reais e efectivos rendimentos tributáveis, por outro, não pode ignorar que a simples existência de regras parte do pressuposto da possibilidade do seu incumprimento que, nessa medida, não pode deixar de se mostrar acautelada pelo legislador.
Por isso que o referido sistema do princípio da veracidade do declarado pelos distintos sujeitos passivos seja «temperado» velo verdadeiro dever de cooperação que, sobre eles, impende de prestarem todos os esclarecimentos e revelarem todos os elementos que, nos casos menos “transparentes”, desde logo por inusuais, permitam esclarecer e eventualmente confirmar, dentro do que lhes seja exigível, a aderência do declarado à realidade. Daí que, nos casos em que se mostre ilegitimamente violado aquele dever de cooperação, como será, v.g. e designadamente, o caso de não se não disponibilizar, sem justificação atendível, os elementos necessários ao controlo da sua situação tributária, por parte da AT, no exercício do poder vinculado que a esta está conferido por lei, se dê a automática legitimação desta entidade no recurso aos referidos meios alternativos disponibilizados por lei, desde que com observância dos restantes pressupostos, por esta, estipulados.
Ou seja e sinteticamente, o alcançar da tributação dos rendimentos reais auferidos, por via do aludido sistema declarativo pressupõe que os contribuintes disponibilizem à AT todos e quaisquer elementos que lhes sejam exigíveis e que se apresentem como indispensáveis ao correcto apuramento dos mesmos.
E, como se referiu, quando assim não suceda, isto é, quando ocorra a quebra daquele dever de colaboração, designadamente pela não apresentação daqueles referidos elementos, cujo ónus impende sobre o contribuinte como meio de assegurar a presunção de aderência á realidade do declarado, inviabilizando a concretização, por parte da AT, do dever estritamente vinculado a que esta, por seu turno, está obrigada pelo princípio da legalidade, do controle e apuramento do efectivo valor tributável, a AF ficará legitimada automaticamente a recorrer a meio alternativo de tributação.
Isto tendo presente que nos movemos no âmbito tributário, em que, por um lado e por força de aí imperarem os princípios do inquisitório e, por consequência, o da oficialidade na investigação, tendo por desiderato último, a descoberta da verdade material é inexistente uma particular incumbência de provar, por parte de quem quer que seja, por outro, tal não significa que neste contencioso, em particular, não exista um direito probatório que regulamente quem tem que provar o quê para que se alcance uma qualquer pretensão formulada. Daí que, porque a questão que se controverte não pode deixar de ser objecto de definição, se os factos relevantes se não provarem, seja por iniciativa das partes, seja por iniciativa do Tribunal, ela não possa deixar de ser decidida de forma que seja desfavorável àquele sobre quem impender, nos termos legais, o respectivo ónus probatório (1).
Assim, por princípio e sempre que a conduta da AT se consubstancie na prática de actos positivos e constitutivos do direito a que se arrogue com consequências negativas na esfera dos direitos dos contribuintes, é a ela que cabe a obrigação de demonstrar da factualidade relevante ou dito de outra forma é à AT que cabe fazer a “...prova da verificação dos pressupostos legais (vinculativos) da sua actuação, designadamente se agressiva (positiva e desfavorável) ...” pertencendo, por contrapartida, “...ao administrado apresentar prova bastante da ilegitimidade do acto, quando se mostrem verificados esses pressupostos ...” (2).
Do que resulta que, tendo os elementos contabilísticos do contribuinte de se encontrar organizados segundo os sãos princípios da lei comercial e fiscal, quer do ponto de vista da forma, quer do ponto de vista substancial, casos em que gozam de uma presunção de veracidade, tal não implica, no entanto e “a contrario”, como já acima se referiu, - pela circunstância de tais elementos se encontrarem organizados correctamente do ponto de vista meramente formal -, a inibição da AT, no uso daqueles poderes de controlo, de se servir dos meios legais alternativos ao declarativo no apuramento da matéria colectável, já que o que importa é apurar, tanto quanto possível e ao que aqui releva, o rendimento tributável efectivo.
Tal, contudo não preclude o princípio de que o lançar mão de qualquer dos meios alternativos disponíveis, - correcções técnicas/avaliação indirecta -, e de um deles em detrimento do outro, não depende de um critério discricionário da AT, antes, qualquer deles constitui um seu poder vinculado, sendo que, ao que aqui nos importa considerar, a AT se encontra vinculada ao recurso às correcções técnicas, quando, apesar da violação dos deveres de cooperação do contribuinte, se encontre, sem embargo, em condições de apurar com efectividade os rendimentos a tributar e, ao invés, se e na medida em que tal apuramento se venha a revelar inviável, não pode, então, deixar de lançar mão da metodologia indirecta, o que vale por dizer que esta pressupõe uma situação que se mostre “Marcada por uma inultrapassável incerteza e exigindo uma cuidadosa fundamentação”, revelando-se como “uma última ratio fisci, ...” (3).
Importa, também, referir que a demonstração dos necessários pressupostos legais ao recurso a metodologia alternativa, designadamente a indiciária, cabe à AF (4) (5), sendo certo que, em caso de utilização de metodologia indirecta, ainda e apesar da opção do legislador em abdicar de um grau de certeza na tributação - inerente á maior subjectividade própria da mesma em que, só por circunstâncias meramente fortuitas, a quantificação apurada será aderente à realidade - ela não deixa, no entanto, de ter como baliza, o princípio, com assento constitucional, de que a sua utilização há-de permitir alcançar, na medida do possível, as circunstâncias de facto mais próximas da realidade, com susceptibilidade de apreciação, nomeadamente, jurisdicional (6).
E, quando se verifiquem – isto é, quando a AT demonstre a ocorrência - (d)os necessários e legais pressupostos para se lançar mão da avaliação indirecta, o eventual excesso da quantificação, por tal via, operada passa a impender sobre o contribuinte.
Contudo o que se vem de dizer não esgota o tema relativo aos princípios que regem o regime jurídico da avaliação indirecta, particularmente no que concerne ao ónus que vincula a AT.
Isto porque, em sede de avaliação indirecta, o ónus da AT não se consome na necessidade do elencar, e provar, das razões que lhe subjazem, enquanto conduta vinculada que lhe está imposta. Na realidade, o ónus que impende sobre a AF, em tais casos, para além do da demonstração dos necessários e legais pressupostos do recurso à avaliação indirecta, exige, ainda e também, que, simultânea e complementarmente, fundamente adequada e criteriosamente as circunstâncias em que faça suportar a matéria tributável que, no uso daqueles, vier a quantificar.
Na realidade e como já acima se teve oportunidade de referir, sendo embora, em tais casos, opção do legislador abdicar de um grau de certeza na tributação, por falta de colaboração do contribuinte, como única solução de evitar a evasão fiscal e de fazer repartir, na medida do possível, a carga fiscal entre todos os súbditos nacionais que revistam, casuisticamente, a qualidade de sujeitos passivos, não deixa, a actuação da AT, neste domínio, no entanto, de ter como baliza, o princípio de que a metodologia em causa há-de permitir alcançar, na medida do possível, a tributação daquele pelo seu lucro real/efectivo.
Apelando, à jurisprudência do TCA Sul (7) (8) “... cabendo à AF o ónus de provar os pressupostos da tributação por métodos indiciários, é a ela que cumpre demonstrar que a liquidação não pode assentar nos elementos fornecidos pelo contribuinte e que o recurso àquele método se tornou a única forma de calcular o imposto, competindo-lhe, por isso, especificar os motivos da impossibilidade da comprovação e quantificação directa e exacta da matéria colectável e indicar os critérios utilizados na sua determinação, fazendo assentar o volume da matéria colectável presumida em dados objectivos, racionais e fundamentados, aptos a inferir os factos tributários [...].
Na verdade, tendo a determinação da matéria tributável por métodos indiciários de ser feita por aproximação à realidade que se procura apurar, é necessário que se demonstre que teve por suporte elementos de facto possíveis e prováveis, extraídos de parâmetros gerais e comuns, adequados à situação. E, por isso, a AF tem de utilizar elementos de facto conhecidos que, segundo as regras da experiência, pautadas por critérios de razoabilidade e de normalidade e tendo em linha de conta as especificidades próprias da actividade do contribuinte, conduzam à extrapolação dos factos conhecidos ou à aproximação da realidade que se procura alcançar.
A AF tem, assim, de indicar e justificar os critérios que utiliza na determinação da matéria tributável por métodos indiciários, por forma a que o contribuinte deles fique ciente e apto a discutir a valorimetria aplicada, isto é, para que possa provar que os critérios utilizados são desadequados e/ou inadmissíveis para a sua actividade, que houve erro ou manifesto excesso na matéria tributável quantificada.” (sublinhados da nossa responsabilidade), e que, acrescentamos agora, que permitam extrapolar uma adequada ponderação da decisão.
Só então passará a caber, ao contribuinte e como acima referido, demonstrar a falta de aderência à realidade da matéria colectável que veio a ser fixada, e sendo caso disso, a medida em que tal sucedeu, sob pena de a dúvida sobre tal matéria se ter de revelar desfavorável à sua pretensão, já que, como é axiomático a sua existência não será, então, mais do que o resultado de uma conduta violadora do princípio da colaboração, que lhe está imposto, com transparência e verdade e que, nessa medida, a tornam infundada.
Como vimos, e este é o elemento nuclear no âmbito da discussão que envolve os autos, a AT tem, assim, de indicar e justificar os critérios que utiliza na determinação da matéria tributável por métodos indiciários, por forma a que o contribuinte deles fique ciente e apto a discutir a valorimetria aplicada, isto é, para que possa provar que os critérios utilizados são desadequados e/ou inadmissíveis para a sua actividade, que houve erro ou manifesto excesso na matéria tributável quantificada e que permitam extrapolar uma adequada ponderação da decisão.
Neste particular, a decisão recorrida ponderou que:
“…
No caso dos autos não se discutem os pressupostos da decisão de aplicar métodos indiretos de avaliação, na medida em que se verificou, e a Impugnante admite, que a contabilidade não reflete a real situação financeira e patrimonial do contribuinte e não permitem conhecer direta a exatamente o resultado fiscal (designadamente por inexistência de inventários credíveis, que se encontram claramente empolados por “existências” que não se encontram efetivamente em stock).
Nos autos discute-se unicamente a adequação do critério de quantificação, isto é, discute-se a questão de saber se a margem de 72%, correspondente à margem média evidenciada pela contabilidade relativa aos anos 2003 a 2006, é adequada a servir de base de cálculo do resultado fiscal dos anos 2005 e 2006.
A Impugnante considera que tal critério é inadequado por não se encontrar corretamente calculada e por assentar em pressupostos incoerentes com a finalidade do seu uso.
De facto, a Impugnante critica o facto de essa margem assentar em elementos, relativos aos anos 2005 e 2006, que previamente a AT considera estarem errados.
Nessa tese, a AT não deveria recorrer a uma taxa média de um período (2003 a 2006), calculada em 72%, que se destina a ser aplicada a uma parte desse período (2005 e 2006) por se considerar que as respetivas taxas anuais (de 2005 e 2006) estão erradas e se encontram propositadamente “empoladas”.
Além disso, a amostragem efetuada pela AT não é suficientemente representativa, na medida em que terá incidido sobre poucos (5) artigos de um universo de mais de 3.000 referências.
De facto, a AT começou por analisar os inventários, verificando um anormal crescimento das “existências” de bens em stock. Para verificar a coerência dos inventários exibidos a AT efetuou amostragens, que incidiram sobre 66 produtos e 123 mercadorias, que no conjunto representam cerca de 49% das vendas do ano 2006, concluindo que a margem bruta sobre as vendas de produtos acabados é de 83,51% e nas mercadorias é de 47,64%, e que os inventários de 2004, 2005, 2006 e 2007 se encontram sobrevalorizados em cerca de 25% (facto 15 de 3.1 supra).
Por isso, a AT solicitou à agora Impugnante que procedesse à elaboração de inventários corrigidos relativos aos exercícios de 2004 a 2006 (artigos 25º e 26º da p.i.) mas, apesar de ter intenção de o fazer, a Impugnante não respondeu a tal solicitação por falta de condições, pelo que a certa altura a AT prosseguiu as inspeções sem aqueles elementos (artigos 27º da p.i.).
Para isso, a AT começou por comparar os inventários de 2002 e 2003, cujos resultados não estão “adulterados” ou “manipulados” e concluiu que evidenciam um crescimento de 2,5%, que considerou adequado para efeitos de correção dos inventários de 2005 e 2006 por neste período ser essa a taxa de inflação, corrigiu a variação da produção nos anos sob análise e concluiu que isso evidencia a diminuição da margem bruta sobre as vendas que reflete a omissão de vendas, “pelo que, irão ser determinadas as vendas omitidas do sujeito passivo com base na margem já anteriormente referida de 72,77% (margem média declarada nos últimos quatro anos)”.
Assim, com base no CMVMC contabilístico e naquela taxa de 72% a AT calculou as vendas corrigidas e as vendas omitidas em cada ano bem como os respetivos resultados corrigidos de 2005 e 2006.
A margem concretamente utilizada, de 72%, resulta claramente de um arredondamento simplificativo da taxa concretamente apurada, de 72,77%, sendo certo que desse arredondamento por defeito não poderia resultar qualquer erro na quantificação que determine excesso de tributação com efeitos anulatórios.
Por outro lado, essa margem foi inicialmente designada como “margem liquida” e a partir de então sempre designada como “margem bruta”, afigurando-se que ao longo do relatório a AT confunde “margem líquida” com “margem bruta” sobre as vendas, tal como se afigura que o cálculo da margem média em causa contém erros conceituais e aritméticos que conduzem a assinável desvio (a taxa de 72% deveria ser reduzida para 70,105%, arredondando razoavelmente para 70%), conforme demonstração de fls. 477 do PA não impugnada pela AT.
Se a AT tivesse utilizado esta margem teria concluído, mantendo todos os outros pressupostos em que assentaram as correções propostas no relatório, que não haveria lugar a tributação.
Por outro lado, a Impugnante sustenta que “se utiliza em todos os cálculos seguintes esta margem base de margens brutas para alcançar a situação tributária do contribuinte para os anos de 2005 e 2006, através da aplicação de métodos indiretos, esquecendo que as margens estavam influenciadas pelos inventários, que os próprios técnicos tinham começado por pôr em causa” (artigo 35º p.i.).
Na realidade, a taxa de 72% foi apurada através da média apurada com base nas declarações modelo 22 apresentadas, e não com base, diretamente, em inventários.
No entanto, é evidente que o critério usado pela AT padece do vício que lhe vem imputado, na medida em que a taxa média inclui os valores de 2005 e 2006 que indiretamente se encontram influenciados pelos inventários considerados errados e que justificaram o recurso a métodos indiretos.
A AT reconhece expressamente esse vício, mas não reconhece a existência de qualquer incoerência por considerar que a escolha da taxa de 72% assentou na “convicção de que a média da margem do lucro liquido reflectiria de uma forma aproximada o resultado da atividade efectivamente praticada pela empresa” e na conclusão retirada pela AT de que “o efeito dos erros (existentes) no inventário final seria anulado pelos vícios ocorridos no inventário inicial” (resposta ao direito de audição, a fls. 47 do PA) e a primeira testemunha, Inspetora autora do Relatório, acrescentou já na presente instância que esse critério lhe pareceu “justo”.
Tal explicação, além de parca, parece violar as regras da lógica e de alguns princípios do direito tributário.
Se a margem média - apurada com base também na margem anual do período a que vai ser aplicada - reflete adequadamente o resultado da atividade efetivamente exercida no período a que se refere (2003 a 2006), então não se justificava fazer qualquer correção e a sua aplicação é injustificada e violadora, designadamente, do disposto nos artigos 266º da CRP e 16º da LGT e 100º do CPPT. E se o efeito dos erros no inventário final é anulado pelos vícios ocorridos no inventário final, deveria concluir-se que afinal não existe qualquer erro relevante que justifique correção do resultado declarado.
Acresce que se a AT reconhece que os inventários de 2002 e 2003 não merecem qualquer crítica, isso significa que, conhecendo as existências finais de 2003, iniciais de 2004, e conhecendo o valor das compras e vendas de cada ano (que não vêm postas em causa), a AT poderia ter calculado rigorosamente, através de simples operações aritméticas, o valor das existências finais de 2005 e 2006.
Não o tendo feito, a AT subverteu a teleologia e a metodologia subjacentes à avaliação indireta, que se quer subsidiária da avaliação direta também no sentido de que as regras destas são de aplicar sempre que possível mesmo no âmbito da avaliação indireta (artigo 85º da LGT).
Acresce que conhecendo a AT o contexto de abrandamento da atividade da empresa no período em causa, com diminuição das compras e do volume de negócios (além dos despedimentos e perda de acesso a crédito externo), em vez de pressupor a existência de um crescimento anual de 2,5% (embora este corresponda apenas ao crescimento da inflação, e não a crescimento real da atividade) e de, consequentemente, presumir a existência de omissão de vendas, a AT deveria ter dedicado um pouco mais de esforço à averiguação da real situação tributária do contribuinte ou, em caso de dúvida, abster-se de tributar, com fundamento nos artigos 58º da LGT e 100º, nº 1, do CPPT.
Portanto, pelo facto de os inventários exibidos não merecerem credibilidade, e isso justificar o recurso a métodos indiretos de avaliação, não fica a AT dispensada de procurar a verdade material de acordo com as regras legais aplicáveis, designadamente tendo em conta que a “tributação” deve incidir preferencialmente sobre o rendimento real e não se confunde com “sanção” por mais censurável que seja a prática que a justifica.
Nenhuma ilegalidade do Estado se pode justificar com base em ilegalidade eventualmente praticada pelos sujeitos passivos ou outros obrigados (artigo 2º da CRP).
Em suma, afigura-se que a aplicação da margem de 72% no caso dos autos resulta na utilização de um critério desadequado à quantificação por métodos indiretos de avaliação que determina a anulação das liquidações impugnadas. …”.

Na sequência do exposto, o que importa verdadeiramente é aferir se o critério eleito se revelou nas circunstâncias concretas ajustado e adequado ao fim tido em vista e se essa adequação e justeza de mostra comprovada pelos factos apurados, ou seja, tudo está em perceber se a utilização daquele critério constituiu no caso concreto uma forma válida de aproximação à realidade que se visa determinar (pressuposto e objectivo da consagração deste recurso de fixação da matéria tributável) ou, pelo contrário, como defende a decisão recorrida, conduziu a erro de quantificação da matéria tributável.

Com interesse nesta matéria, cabe ter presente o disposto no art. 90º da L.G.T., o qual estabelece que na determinação do lucro tributável por métodos indiciários, basear-se-á em todos os elementos de que a administração fiscal disponha, e, designadamente, em:
_margens médias de lucro bruto ou líquido sobre as vendas e prestações de serviços ou compras e fornecimentos e serviços de terceiros, al. a) e art. 90º,nº1, al. a) da LGT) que fala apenas em margens médias de lucro líquido;
_taxas médias de rentabilidade do capital investido (al. b) e art. 90º, nº1, al. b) da LGT);
_coeficientes técnicos de consumo ou utilização de matérias-primas ou de outros custos directos al. c) e art. 90º, nº1, al. c) ad LGT;
_elementos e informações declarados à administração, incluindo os relativos a outros impostos e, bem assim, os obtidos em empresas ou entidades que tenham relações com o contribuinte, al. d) e art. 90º, nº1, al. d) da LGT;
_A localização e dimensão da actividade exercida (art. 90º, nº1, al. e);
_ os custos presumidos em função da condições concretas do exercício da actividade (art. 90º, nº1, al. f) da LGT);
_A matéria tributável do ano ou anos mais próximos que se encontre determinada pela administração fiscal (art. 90º, nº1, al.g) da LGT).
São estes, a título meramente exemplificativo, na LGT, os factores a atender na, impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável, não sendo obrigatório atender a todos os factores mas recorrer-se apenas aos que, em cada caso, se afigurem como mais seguros para permitir com maior rigor aquele desiderato.

Além disso, tendo a determinação da matéria tributável por métodos indiciários de ser feita por aproximação à realidade que se procura apurar, é necessário que se demonstre que teve por suporte elementos de facto possíveis e prováveis, extraídos de parâmetros gerais e comuns, adequados à situação.
Para tanto, a AT tem de utilizar elementos de facto conhecidos que, segundo as regras da experiência, pautadas por critérios de razoabilidade e de normalidade e tendo em linha de conta as especificidades próprias da actividade do contribuinte, conduzam à extrapolação dos factos conhecidos ou à aproximação da realidade que se procura alcançar.
A AT tem, assim, de indicar e justificar os critérios que utiliza na determinação da matéria tributável por métodos indiciários, de modo a que o contribuinte deles fique ciente e apto a discutir a valorimetria aplicada, isto é, para que possa provar que os critérios utilizados são desadequados e/ou inadmissíveis para a sua actividade, que houve erro ou manifesto excesso na matéria tributável quantificada e que permitam extrapolar uma adequada ponderação da decisão.
Só então passará a caber, ao contribuinte demonstrar a falta de aderência à realidade da matéria colectável que veio a ser fixada, e sendo caso disso, a medida em que tal sucedeu, sob pena de a dúvida sobre tal matéria se ter de revelar desfavorável à sua pretensão, já que, como é axiomático a sua existência não será, então, mais do que o resultado de uma conduta violadora do princípio da colaboração, que lhe está imposto, com transparência e verdade e que, nessa medida, a tornam infundada.

No caso presente, nas suas alegações, a Recorrente reconhece que na quantificação das vendas em falta foi adoptada a margem bruta sobre as vendas de 72%, justificada com o facto de reflectir o resultado da actividade efectivamente praticada pela empresa, porquanto nos anos de 2003 a 2006 a margem média destes foi de 72,77%, sendo que o douto tribunal a quo levanta dúvidas quanto á aplicação da margem de 72%, na medida em que alegadamente essa taxa média inclui os valores de 2005 e 2006 que indirectamente se encontram influenciados pelos inventários considerados errados e que justificaram o recurso a métodos indirectos.
Depois, no que respeita aos inventários, conforme se descreve na douta sentença, na página 19, a AT começou por analisar os inventários, verificando um anormal crescimento das existências de bens em stock, depois de proceder a diligências de verificação da coerência dos inventários, a inspeção tributária conclui que os mesmos se encontravam sobrevalorizados em cerca de 25% e de seguida a inspeção tributária solicitou á impugnante que procedesse à elaboração de inventários corrigidos relativos aos exercícios de 2004 a 2006, solicitação á qual a impugnante não respondeu por alegadamente falta de condições, o que levou a inspecção a proceder á correcção dos inventários, em 2005 e 2006, sendo que os cálculos da matéria colectável foram efectuados com base na aplicação da média de 72%, apurada com base nas declarações apresentadas pelo SP nos anos de 2003 a 2006 e o método adoptado resultou da aplicação de uma margem média declarada pelo SP, o por isso com grande probabilidade de corresponder á realidade, ou seja, no caso concreto foram utilizados os elementos e informações declarados á administração tributária pelo próprio sujeito passivo e ao ser utilizado um indicador que parte dos elementos declarados pelo sujeito passivo á AT nas suas declarações de rendimentos, é utilizado um método que relaciona de uma forma congruente e justificada os factos apurados e a situação concreta do contribuinte, o que significa que o método utilizado é proporcional á situação concreta do sujeito passivo, e nada tem de desadequado e o Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao ter entendido que a aplicação da percentagem de 72%, é um critério desadequado, porque alegadamente tal percentagem inclui os valores de 2005 e 2006 que indirectamente se encontram influenciados pelos inventários considerados errados e que justificaram o recurso a métodos indirectos, pois conforme trás se expôs tal percentagem é a que resulta dos elementos declarados pelo sujeito passivo, não sendo imputável á AT “os erros” nos inventários que o SP manipulou, verificando-se que a AT teve a preocupação de aplicar uma margem que reflectia o resultado da actividade efectivamente praticada pelo sujeito passivo, já que aplicou a margem por ele declarada nos anos de 2000 a 2004.

Com este pano de fundo, é manifesto que o presente recurso está condenado ao insucesso.

Na verdade, tal como se refere na decisão recorrida, se a margem média - apurada com base também na margem anual do período a que vai ser aplicada - reflecte adequadamente o resultado da actividade efectivamente exercida no período a que se refere (2003 a 2006), então não se justificava fazer qualquer correcção e a sua aplicação é injustificada e se a AT reconhece que os inventários de 2002 e 2003 não merecem qualquer crítica, isso significa que, conhecendo as existências finais de 2003, iniciais de 2004, e conhecendo o valor das compras e vendas de cada ano (que não vêm postas em causa), a AT poderia ter calculado rigorosamente, através de simples operações aritméticas, o valor das existências finais de 2005 e 2006, o que significa que a AT subverteu a teleologia e a metodologia subjacentes à avaliação indirecta, que se quer subsidiária da avaliação directa também no sentido de que as regras destas são de aplicar sempre que possível mesmo no âmbito da avaliação indirecta (artigo 85º da LGT).

Por outro lado, mostra-se também pertinente a referência ao facto de a aludida margem ter sido inicialmente designada como “margem liquida” e a partir de então sempre designada como “margem bruta”, mais referindo a decisão recorrida que tal como se afigura que o cálculo da margem média em causa contém erros conceituais e aritméticos que conduzem a assinalável desvio (a taxa de 72% deveria ser reduzida para 70,105%, arredondando razoavelmente para 70%), conforme demonstração de fls. 477 do PA não impugnada pela AT e ainda que se a AT tivesse utilizado esta margem teria concluído, mantendo todos os outros pressupostos em que assentaram as correcções propostas no relatório, que não haveria lugar a tributação, realidade que a Recorrente em nenhum momento desmonta no âmbito do presente recurso, limitando-se a repetir o discurso do RIT sem afastar por qualquer forma as objecções agora descritas.

Como quer que seja, é ponto assente que a taxa de 72% foi apurada através da média apurada com base nas declarações modelo 22 apresentadas, e não com base, directamente, em inventários, o que equivale a dizer que o critério usado pela AT padece do vício que lhe vem imputado, na medida em que a taxa média inclui os valores de 2005 e 2006 que indirectamente se encontram influenciados pelos inventários considerados errados e que justificaram o recurso a métodos indirectos.

Nesta medida, perante a realidade aqui sistematizada ficou demonstrado que a AT não lançou mão de critérios credíveis, por coerentes e adequados à quantificação exacta e justa, ou seja, não existe aqui qualquer dúvida sobre a actuação da AT; antes existe uma certeza total sobre a desadequação do seu procedimento, o que significa que a decisão recorrida, que assim entendeu, não merece qualquer censura.

Neste ponto, cabe ainda notar que, estabelecida a legitimidade do recurso aos métodos indirectos, que nos autos, bem ou mal, está assente, é sobre quem impugna que recai o ónus de comprovar o erro ou manifesto excesso na quantificação da matéria tributável, do mesmo modo que, em caso de dúvida deve esta ser negativamente valorada contra a Impugnante por não ser de aplicar à prova indirecta o regime de dúvida razoável na medida em que a avaliação indirecta é sempre menos exacta da que é feita, nos termos legais, pelo contribuinte.

Independentemente do exposto, é à AT que cabe escolher o critério para o fim descrito competindo à impugnante provar, sem que a dúvida lhe seja aproveitável, o excesso de quantificação, sem prejuízo da aludida legitimação para a escolha do critério não ser ilimitada, antes controlável pela sua fundamentação, adequação e razoabilidade.
Ora, é em função dos elementos presentes nos autos que temos por adquirida a prova do erro de quantificação por ter ficado demonstrado, mercê do desajuste no caso concreto do critério utilizado pela AT nos termos acima descritos para determinar a matéria tributável, situação que conduz à afirmação da ilegalidade do acto impugnado, matéria que tem um verdadeiro efeito de implosão no que concerne ao presente recurso.
Daí que na improcedência das conclusões da alegação da recorrente, se impõe, nos termos acima expostos, confirmar a decisão aqui sindicada, com todas as legais consequências.
Improcede, por conseguinte, o presente recurso jurisdicional.
4. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente, mantendo-se a decisão judicial recorrida.
Custas pela Recorrente.
Notifique-se. D.N..
Porto, 12 de Abril de 2018
Ass. Pedro Vergueiro
Ass. Ana Patrocínio
Ass. Ana Paula Santos

(1) Neste sentido, entre muitos outros e a título meramente exemplificativo, veja-se o Ac. do TCA Sul de 99.12.14, Rec. Nº. 2.467/99.
(2) Cfr. Ac. do TCA Sul, de 02.06.04, tirado no Rec. 3.279/00.
(3) Cfr. JLSaldanha Sanches em “A Quantificação da Obrigação Tributária”, 302/303.
(4) Uma vez que nos termos das regras do ónus da prova em sede de direito administrativo tributário, -onde, há luz dos vigentes princípios de descoberta da verdade material e, da consequente, oficiosidade de investigação e indagação das provas, não há uma particular incumbência de provar, por parte de quem quer que seja, sem embargo de, pela impossibilidade de manutenção de um “non liquet”, a ausência de prova de factos relevantes não possa deixar de desfavorecer quem com ela estava onerado-, é à AT que cabe a obrigação “... da prova da verificação dos pressupostos legais (vinculativos) da sua actuação, designadamente se agressiva (positiva e desfavorável) ...” pertencendo, por contrapartida, “...ao administrado apresentar prova bastante da ilegitimidade do acto, quando se mostrem verificados esses pressupostos ...”.
(5) Cfr. Ac. de 02.06.18, Rec. Nº. 6.388/02.
(6) Cfr. Prof. Saldanha Sanches in “A Quantificação da Obrigação Tributária”, 305.
(7) Cfr. Ac. de 02.06.18, Rec. nº. 6.388/02.
(8) Ainda que por reporte ao aludido art.º 81.º do CPT, mas, como decorre do que acima se mencionou, com aplicabilidade ao preceituado no art.º 84.º/3 da LGT.