Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00622/16.8BEAVR
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:12/21/2017
Tribunal:TAF de Aveiro
Relator:Pedro Vergueiro
Descritores:RECURSO DE CONTRA-ORDENAÇÃO
PAGAMENTO POR CONTA
COIMA
PRESSUPOSTOS
Sumário:I) As entidades que exerçam, a título principal, actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, bem como as não residentes com estabelecimento estável em território português, devem proceder ao pagamento do imposto em três pagamentos por conta, com vencimento em Julho, Setembro e 15 de Dezembro do próprio ano a que respeita o lucro tributável.
II) Se as referidas entidades não procederem a esse pagamento, ainda que parcialmente, no prazo de 90 dias, contado do terminus de cada uma daquelas “prestações”, incorrem, pelo menos, na prática de uma infracção punível com coima variável entre o valor da prestação em falta e o seu dobro ou, sendo essa infracção imputada a título de negligência, variável entre 15% e metade do imposto em falta (arts. 104º nº 1 al. a) do CIRC e 114º nºs 2 e 5 al. f) do RGIT).
III) Os pagamentos por conta são calculados com base no imposto liquidado nos termos do nº 1 do artigo 90º relativamente ao período de tributação imediatamente anterior àquele em que se devam efectuar esses pagamentos, devendo o sujeito passivo proceder à sua entrega nos termos do nº 1 do art. 104º do CIRC.
IV) Não comete a infracção referida em II) o sujeito passivo que num determinado ano procede tempestiva e integralmente ao pagamento por conta por referência ao imposto que à data desse pagamento se encontrava liquidado relativamente ao ano anterior, ainda que posteriormente, por força da apresentação de nova declaração de rendimentos (Mod. 22) venha a ser liquidado, relativamente ao ano transacto, um imposto de valor superior.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Autoridade Tributária e Aduaneira
Recorrido 1:A..., Lda.
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
1. RELATÓRIO

A Excelentíssima Representante da Fazenda Pública, devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, datada de 22-05-2017, que julgou procedente a pretensão deduzida por “A…, Lda.” na presente instância de RECURSO DE CONTRA-ORDENAÇÃO relacionada com a aplicação à ora Recorrida de uma coima, por decisão proferida em 25.04.2015 pelo Exmo. Chefe do Serviço de Finanças de Aveiro - 1, que condenou a sociedade “A…, Lda.”, no pagamento de uma coima no valor de € 1.754,94, por falta de entrega de pagamento por conta nos termos do art. 104º do Código do IRC.

Formulou nas respectivas alegações (cfr. fls. 76-87), as seguintes conclusões que se reproduzem:
“(…)
1. É objecto do presente recurso a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, de 22/05/2017, que julgou procedente o recurso apresentado pela Arguida da decisão de aplicação de coima proferida, em 25/04/2015, pelo Exmo. Chefe do Serviço de Finanças de Aveiro 1, no âmbito do processo de contra-ordenação com o n.º 00512015060000064817, que lhe aplicou uma coima no montante de € 1.754,94, acrescida de € 76,50 de custas, pela prática de infracção prevista e punida pelos artigos 104.º, n.º 1, alínea a) do CIRC e 114.º, n.ºs 2 e 5, alínea a) e 26.º, n.º 4, ambos do RGIT.
2. O Tribunal a quo julgou procedente o recurso, revogando-se a decisão recorrida, por considerar que a Arguida não incorreu na infracção prevista e punida pelo artigo 114.º, n.ºs 2 e 5, alínea f) do RGIT.
Para assim decidir, considerou na sua douta fundamentação de direito que, “(…) Tendo por base a matéria de facto dada como assente, conclui-se que a decisão de fixação de coima em discussão nos presentes autos respeita ao apuramento de uma diferença nos pagamentos por conta efectuados em 2014 na sequência da apresentação de uma declaração de substituição para o exercício de 2013, que a recorrente alega ter sido apresentada após correcções efectuadas pela inspecção tributária.
Com efeito e considerando os documentos que foram juntos pela recorrente, verifica-se que em 26.02.2015 foi apresentada uma declaração de substituição modelo 22 de IRC para o exercício de 2013.
(...) A diferença do pagamento por conta tem por base uma declaração de substituição que foi apresentada em 26.02.2015. O que significa que só naquela data foram apurados valores distintos dos que haviam sido declarados em 2013, originando a rectificação nos valores para efeitos de pagamento por conta do imposto devido para o ano de 2014.
Na verdade, à data da entrega dos pagamentos por conta em 2014 (com base no imposto apurado em 2013), o pagamento por conta agora pedido, não era devido, ou seja, naquela data não havia lugar à entrega por conta de um imposto que não era devido nem tão pouco se encontrava apurado. Pelo que a conduta da recorrente não é censurável por lhe faltar o elemento da ilicitude conforme acima enunciado.
Face ao que se acaba de expor, conclui-se que a recorrente não incorreu na infracção prevista e punida pela alínea f) do n.º 5 do art.114.º do RGIT.”
3. Contudo, salvo o devido respeito por melhor opinião, não concorda a Fazenda Pública com tal entendimento, pois considera que perante os factos dados como provados a conduta da Arguida preencheu todos os elementos constituintes do ilícito contra-ordenacional tipificado na alínea f) do n.º 5, do artigo 114.º do RGIT.
4. Nos termos do artigo 104.º, n.º 1, alínea a) do CIRC as entidades que exerçam, a título principal, actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, bem como as não residentes com estabelecimento estável em território português, devem proceder ao pagamento do imposto de IRC em três pagamentos por conta, com vencimento em Julho, Setembro e 15 de Dezembro do próprio ano a que respeita o lucro tributável.
5. Por força do preceituado no artigo 105.º, n.º 1 do CIRC, tais pagamentos por conta devem ser calculados com base no imposto liquidado nos termos do n.º 1 do artigo 90.º relativamente ao período de tributação imediatamente anterior àquele em que se devam efectuar esses pagamentos, líquido das retenções na fonte.
6. Para efeitos contra-ordenacionais é punível como falta de entrega da prestação tributária a falta de pagamento, total ou parcial, da prestação tributária devida a título de pagamento por conta do imposto devido a final (artigo 114.º, n.ºs 2 e 5, alínea f) do RGIT).
7. Na tipificação da infracção tributária prevista na alínea f), do n.º 5, do artigo 114.º do RGIT, a falta de entrega da prestação de pagamento por conta constitui uma “infracção de resultado”, e não “de perigo”, sendo esse resultado – imposto devido que não tenha sido entregue, que importa para efeitos de punição.
8. Nos termos do artigo 33.º da LGT, “As entregas pecuniárias antecipadas que sejam efectuadas pelos sujeitos passivos no período de formação do facto tributário constituem pagamentos por conta do imposto devido a final.”
9. O pagamento por conta é nos próprios termos da lei, uma entrega pecuniária antecipada, feita, por conta do imposto devido a final, no período de formação do facto tributário, configurando um adiantamento sobre o imposto devido a final. São pagamentos provisórios, apenas podendo tornar-se definitivos quando o montante do imposto a pagar estiver efectivamente determinado, pelo que se se verifica um adiantamento do pagamento do imposto devido a final. Tais pagamentos são calculados com base no imposto liquidado relativamente ao período de tributação imediatamente anterior àquele em que se devam efectuar esses pagamentos, líquido das retenções na fonte.
10. É esta falta de entrega da prestação tributária “pagamento por conta” que releva para efeitos contra-ordenacionais nos termos do artigo 114.° n.º 5, alínea f) do RGIT, e é o valor entregue a esse título que, por força do disposto no referido artigo 33.º da LGT, é posteriormente relevado aquando da liquidação do imposto devido a final por conta do qual foi antecipadamente pago.
11. A Arguida estava obrigada a entregar os valores do pagamento por conta calculados com base no imposto liquidado relativamente ao período de tributação imediatamente anterior àquele em que se devam efectuar esses pagamentos, líquido das retenções na fonte (cfr. artigo 105.º do CIRC).
12. Em 31/05/2014, a Arguida apresentou a declaração de rendimentos modelo 22 de IRC respeitante ao exercício de 2013, que consta de fls. 46 a 51 dos autos (cfr. página 2 da sentença sob recurso).
13. Em 26/02/2015, a Arguida apresentou declaração de rendimentos modelo 22 de substituição, referente ao exercício de 2013, que consta de fls. 52 a 56 dos autos (cfr. página 2 da sentença sob recurso).
14. A Arguida procedeu à alteração da declaração de rendimentos de IRC relativa ao exercício de 2013, cujo imposto liquidado serve de base de cálculo do pagamento por conta a efectuar em 2014.
15. A apresentação de tal declaração de rendimentos de substituição implicou a variação do pagamento por conta a efectuar em 2014, pelo facto de ser diverso o montante de imposto autoliquidado relativo a 2013.
16. Assim, à data da apresentação da modelo 22 de substituição o valor do pagamento por conta efectuado pela Arguida deixou de se conformar com o exigido nos artigos 104.º e 105.º do CIRC no tempo em que o devia ter sido.
17. O pagamento por conta que a Arguida deveria efectuar é o que decorre do novo imposto liquidado e não o que efectuou à data com elementos que não reflectiam o efectivo imposto liquidado para o exercício de 2013.
18. A Arguida não efectuou o pagamento por conta considerando o imposto liquidado relativo ao ano imediatamente anterior, mas antes considerando um valor que veio a ser alterado por subsequente liquidação de IRC referente ao exercício de 2013.
19. Não obstante, a diferença apurada nos pagamentos por conta ter sido detectada em momento posterior ao pagamento dos mesmos em 2014, por recurso a correcções tributárias de natureza indiciária, estas correcções demonstraram ter repercussão na matéria colectável do ano imediatamente anterior (ou seja 2013) e que os pagamentos por conta efectuados em 2014, não foram pagos na totalidade, tendo existido, desta forma apenas um pagamento parcial dos mesmos.
20. A obrigação de pagamento da diferença apurada nos pagamentos por conta, entretanto efectuados e o montante alegadamente devido, em resultado da apresentação da declaração de substituição apresentada pela Arguida, por decorrer da obrigação inicial de pagamento está manifestamente também implícita nesta última.
21. Se nos termos do n.º 1 do artigo 105.º do CIRC para efeitos de cálculo dos pagamentos por conta, os mesmos têm como base o imposto relativo ao período de tributação imediatamente anterior àquele em que deva efectuar os pagamentos, se tal base for objecto de alterações (rectificações/substituições), consequentemente, os referidos pagamentos também o serão, mas nada altera quanto à obrigação de pagamento de uma eventual diferença que advém da obrigação “originária” de proceder ao pagamento do imposto de IRC em três pagamentos por conta com vencimentos nos meses de Julho, Setembro e 15 de Dezembro nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 104.º do CIRC, sob pena de ser feito um pagamento parcial do mesmo.
22. Assim, para efeitos contra-ordenacionais é punível como falta de entrega da prestação tributária a falta de pagamento total ou parcial da prestação tributária devida a título de pagamento por conta do imposto devido a final – artigo 114.º, n.ºs 2 e 5, alínea f) do RGIT, é de se concluir, por conseguinte, pela existência da referida contra-ordenação tributária como facto ilícito tal como se encontra tipificado na referida disposição normativa.
23. Mostrando-se preenchida a conduta típica descrita na norma de incriminação e que se reconduz à falta de entrega total ou parcial da prestação tributária devida a título de pagamento por conta do imposto devido a final, entende a Fazenda Pública salvo o devido respeito que a douta sentença incorreu em errado julgamento de facto e de direito, determinante da não inclusão da conduta da Arguida na norma do artigo 114.º, n.º 5 alínea f) do RGIT.

***
Nestes termos e nos mais de Direito que V. Ex.as, mui doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, ser revogada a douta sentença de que se recorre e o recurso interposto da decisão de aplicação da coima ser julgado improcedente, como se nos afigura mais conforme com o que consideramos ser a melhor realização do Direito e Justiça.

A Recorrida “A…, Lda.” apresentou contra alegações em defesa da manutenção da sentença sob recurso, embora sem formular conclusões.

O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu o parecer de fls. 107/108 dos autos, no sentido da improcedência do recurso.

Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.


2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO –QUESTÕES A APRECIAR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que a questão suscitada resume-se, em suma, em apreciar o invocado erro de julgamento tendo presente que decisão recorrida concluiu no sentido da não verificação dos pressupostos com referência ao ilícito imputado à ora Recorrida.

3. FUNDAMENTOS
3.1 DE FACTO
Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:
“…
1 – Em 22.03.2015 em nome da ora recorrente foi levantado um auto de notícia por falta de entrega de pagamento por conta do IRC respeitante ao ano de 2014 no valor de € 5.679,45, cfr. fls. 8 destes autos e que aqui se dá por reproduzida.
2 – Em 25.04.2015 pelo Exmo. Chefe do Serviço de Finanças de Aveiro, 1, foi proferida a decisão de fixação de coima nos termos dos artºs 114º nºs 2 e 5 alínea f) e 26º nº 4 do RGIT, cfr. fls. 12 destes autos e que aqui se dá por reproduzida.
3 - A coima fixada foi no valor de € 1.754,94 por violação aos artºs 104º nº 1 alínea a) do CIRC, cfr. fls. 12 destes autos.
4 - Em 31.05.2014 a ora recorrente apresentou a declaração de rendimentos modelo 22 de IRC respeitante ao exercício de 2013, cfr. fls. 46 a 51 destes autos e que aqui se dão por reproduzidas.
5 - Em 26.02.2015 a recorrente apresentou declaração de rendimentos modelo 22 (de substituição) respeitante ao exercício de 2013, cfr. fls. 52 a 56 destes autos e que aqui se dão por reproduzidas.
6 – O presente recurso foi apresentado em 27.05.2015, cfr. fls. 15 destes autos.
A matéria de facto dada como assente, tem por base os documentos acima identificados em cada um dos artigos mencionados e que não foram impugnados.
Factos não provados:
Inexistem com interesse para a presente decisão.”
3.2 DE DIREITO
Assente a factualidade apurada cumpre, agora, entrar na análise do recurso jurisdicional “sub judice”, sendo que, como já ficou dito, a questão sucitada pela Recorrente resume-se, em suma, em indagar da bondade da sentença posta em crise que julgou procedente o recurso apresentado pela ora Recorrida da decisão de aplicação de coima proferida, em 25/04/2015, pelo Exmo. Chefe do Serviço de Finanças de Aveiro 1, no âmbito do processo de contra-ordenação com o n.º 00512015060000064817, que lhe aplicou uma coima no montante de € 1.754,94, acrescida de € 76,50 de custas, pela prática de infracção prevista e punida pelos artigos 104.º, n.º 1, alínea a) do CIRC e 114.º, n.ºs 2 e 5, alínea a) e 26.º, n.º 4, ambos do RGIT.

Para atender a pretensão da ora Recorrida, a decisão recorrido ponderou, além do mais, que:
“…
Como vimos, a diferença do pagamento por conta tem por base uma declaração de substituição que foi apresentada em 26.02.2015. O que significa, que só nesta data foram apurados valores distintos dos que haviam sido declarados em 2013, originando a retificação nos valores para efeitos de pagamentos por conta do imposto devido para o ano de 2014.
Considerando o teor dos preceitos legais acima enunciados e a matéria de facto dada como assente, conclui-se que a razão se encontra do lado da recorrente.
Na verdade, à data da entrega dos pagamentos por conta em 2014 (com base no imposto apurado no ano de 2013), o pagamento por conta agora pedido, não era devido, ou seja, naquela data não havia lugar à entrega por conta de um imposto que não era devido nem tão pouco se encontrava apurado.
Pelo que a conduta da recorrente não é censurável por lhe faltar o elemento da ilicitude conforme acima enunciado.
Face ao que se acaba de expor, conclui-se que a recorrente não incorreu na infração prevista e punida pela alínea f), nº 5 do artº 114º do RGIT. …”.
Nas suas alegações, a Recorrente insiste que, à data da apresentação da modelo 22 de substituição o valor do pagamento por conta efectuado pela Arguida deixou de se conformar com o exigido nos artigos 104.º e 105.º do CIRC no tempo em que o devia ter sido, pois que o pagamento por conta que a Arguida deveria efectuar é o que decorre do novo imposto liquidado e não o que efectuou à data com elementos que não reflectiam o efectivo imposto liquidado para o exercício de 2013 e a Arguida não efectuou o pagamento por conta considerando o imposto liquidado relativo ao ano imediatamente anterior, mas antes considerando um valor que veio a ser alterado por subsequente liquidação de IRC referente ao exercício de 2013 e não obstante, a diferença apurada nos pagamentos por conta ter sido detectada em momento posterior ao pagamento dos mesmos em 2014, por recurso a correcções tributárias de natureza indiciária, estas correcções demonstraram ter repercussão na matéria colectável do ano imediatamente anterior (ou seja 2013) e que os pagamentos por conta efectuados em 2014, não foram pagos na totalidade, tendo existido, desta forma apenas um pagamento parcial dos mesmos.
A obrigação de pagamento da diferença apurada nos pagamentos por conta, entretanto efectuados e o montante alegadamente devido, em resultado da apresentação da declaração de substituição apresentada pela Arguida, por decorrer da obrigação inicial de pagamento está manifestamente também implícita nesta última e se nos termos do n.º 1 do artigo 105.º do CIRC para efeitos de cálculo dos pagamentos por conta, os mesmos têm como base o imposto relativo ao período de tributação imediatamente anterior àquele em que deva efectuar os pagamentos, se tal base for objecto de alterações (rectificações/substituições), consequentemente, os referidos pagamentos também o serão, mas nada altera quanto à obrigação de pagamento de uma eventual diferença que advém da obrigação “originária” de proceder ao pagamento do imposto de IRC em três pagamentos por conta com vencimentos nos meses de Julho, Setembro e 15 de Dezembro nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 104.º do CIRC, sob pena de ser feito um pagamento parcial do mesmo, de modo que, para efeitos contra-ordenacionais é punível como falta de entrega da prestação tributária a falta de pagamento total ou parcial da prestação tributária devida a título de pagamento por conta do imposto devido a final - artigo 114.º, n.ºs 2 e 5, alínea f) do RGIT, é de se concluir, por conseguinte, pela existência da referida contra-ordenação tributária como facto ilícito tal como se encontra tipificado na referida disposição normativa, ou seja, mostrando-se preenchida a conduta típica descrita na norma de incriminação e que se reconduz à falta de entrega total ou parcial da prestação tributária devida a título de pagamento por conta do imposto devido a final, a douta sentença incorreu em errado julgamento de facto e de direito, determinante da não inclusão da conduta da Arguida na norma do artigo 114.º, n.º 5 alínea f) do RGIT.
Que dizer?
Desde logo, importa ter presente que o referido art. 105º do CIRC dispõe o seguinte:
“1 - Os pagamentos por conta são calculados com base no imposto liquidado nos termos do n.º 1 do artigo 90.º relativamente ao período de tributação imediatamente anterior àquele em que se devam efetuar esses pagamentos, líquidos da dedução a que se refere a alínea e) do n.º 2 desse artigo do mesmo artigo (redacção anterior à Lei 2/2014 de 16.01, aplicável apenas aos períodos de tributação que se iniciem, ou aos factos tributários que ocorram, em ou após, 01-01-2014).
2 - Os pagamentos por conta dos sujeitos passivos cujo volume de negócios do período de tributação imediatamente anterior àquele em que se devam efetuar esses pagamentos seja igual ou inferior a €500 000 correspondem a 80% do montante do imposto referido no número anterior, repartido por três montantes iguais, arredondados, por excesso, para euros (redacção da Lei nº 66-B/2012, de 31-12, com entrada em vigor em 01-01-2013).
3 - Os pagamentos por conta dos sujeitos passivos cujo volume de negócios do período de tributação imediatamente anterior àquele em que se devam efetuar esses pagamentos seja superior a € 500 000 correspondem a 95% do montante do imposto referido no n.º 1, repartido por três montantes iguais, arredondados, por excesso, para euros.” (redacção da Lei nº 66-B/2012, de 31-12, com entrada em vigor em 01-01-2013).
Por seu lado, o art. 104º do CIRC aponta que “As entidades que exerçam, a título principal, actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola, bem como as não residentes com estabelecimento estável em território português, devem proceder ao pagamento do imposto nos termos seguintes:
a) Em três pagamentos por conta, com vencimento em Julho, Setembro e 15 de Dezembro do próprio ano a que respeita o lucro tributável ou, nos casos dos nºs 2 e 3 do artigo 8.º, no 7.º mês, no 9.º mês e no dia 15 do 12.º mês do respectivo período de tributação;
b) Até ao último dia do prazo fixado para o envio da declaração periódica de rendimentos, pela diferença que existir entre o imposto total aí calculado e as importâncias entregues por conta,
c) Até ao dia do envio da declaração de substituição a que se refere o artigo 122º, pela diferença que existir entre o imposto total aí calculado e as importâncias já pagas,
(…)”
Por seu turno, estabelece o art. 114º nº 1 e 2 do RGIT, aprovado pela Lei n.º15/2001, de 5 de Junho, com a epígrafe “Falta de entrega da prestação tributária” o seguinte:
“1 - A não entrega, total ou parcial, pelo período até 90 dias, ou por período superior, desde que os factos não constituam crime, ao credor tributário, da prestação tributária deduzida nos termos da lei é punível com coima variável entre o valor da prestação em falta e o seu dobro, sem que possa ultrapassar o limite máximo abstractamente estabelecido.
2 - Se a conduta prevista no número anterior for imputável a título de negligência, e ainda que o período da não entrega ultrapasse os 90 dias, será aplicável coima variável entre 15% e metade do imposto em falta, sem que possa ultrapassar o limite máximo abstractamente estabelecido.
3 - Para os efeitos do disposto nos números anteriores considera-se também prestação tributária a que foi deduzida por conta daquela, bem como aquela que, lendo sido recebida, haja obrigação legal de liquidar nos casos em que a lei o preveja.
4 - As coimas previstas nos números anteriores são também aplicáveis em qualquer caso de não entrega, dolosa ou negligente, da prestação tributária que, embora não tenha sido deduzida, o devesse ser nos termos da lei.
5 - Para efeitos contra-ordenacionais são puníveis como falta de entrega da prestação tributária: (...) f) A falta de pagamento, total ou parcial, da prestação tributária devida a título de pagamento por conta do imposto devido a final, incluindo as situações de pagamento especial por conta.
(...).”
Em função do que fica exposto, resulta claro que as entidades a que alude o art. 104º do CIRC devem proceder ao pagamento do imposto em três pagamentos por conta, com vencimento em Julho, Setembro e 15 de Dezembro do próprio ano a que respeita o lucro tributável e se o não fizerem, ainda que de forma parcial, no prazo de 90 dias contado do terminus de cada uma daquelas “prestações” incorrem, pelo menos, na prática de uma infracção, a qual é punível com coima variável entre o valor da prestação em falta e o seu dobro ou, sendo essa infracção imputada a título de negligência, variável entre 15 % e metade do imposto em falta. Numa e noutra das situações a coima nunca poderá ultrapassar o limite máximo abstractamente estabelecido.
Pois bem, é sabido que em 31/05/2014, a ora Recorrida apresentou a declaração de rendimentos modelo 22 de IRC respeitante ao exercício de 2013, que consta de fls. 46 a 51 dos autos, sendo que em 26/02/2015, a Arguida apresentou declaração de rendimentos modelo 22 de substituição, referente ao exercício de 2013, que consta de fls. 52 a 56 dos autos, verificando-se que a ora Recorrida procedeu à alteração da declaração de rendimentos de IRC relativa ao exercício de 2013, cujo imposto liquidado serve de base de cálculo do pagamento por conta a efectuar em 2014 e a apresentação de tal declaração de rendimentos de substituição implicou a variação do pagamento por conta a efectuar em 2014, pelo facto de ser diverso o montante de imposto autoliquidado relativo a 2013.
Ora, é este elemento que a Recorrente coloca em destaque, referindo que nada altera quanto à obrigação de pagamento de uma eventual diferença que advém da obrigação “originária” de proceder ao pagamento do imposto de IRC em três pagamentos por conta com vencimentos nos meses de Julho, Setembro e 15 de Dezembro nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 104.º do CIRC, sob pena de ser feito um pagamento parcial do mesmo, de modo que, para efeitos contra-ordenacionais é punível como falta de entrega da prestação tributária a falta de pagamento total ou parcial da prestação tributária devida a título de pagamento por conta do imposto devido a final - artigo 114.º, n.ºs 2 e 5, alínea f) do RGIT.

Nesta matéria, crê-se pertinente a alusão ao Ac. do TCA Sul de 09-03-2017, Proc. nº 3110/15.6BESNT, www.dgsi.pt, a que alude o Parecer do Ex.mo PGA e onde se refere que “… uma vez que a obrigação se cumpriu com a entrega do pagamento por conta em Setembro por referência ao valor que efectivamente se mostrava apurado naquela data, sendo irrelevantes, para efeitos de mero ilícito contra-ordenacional as alterações (rectificações/substituições) que o sujeito passivo venha a realizar na declaração pontualmente apresentada. Dito de outro modo: se o sujeito passivo procedeu, em conformidade com a declaração apresentada e com o imposto então apurado, ao pagamento por conta do imposto, no tempo legalmente oportuno, não pode, de todo, entender-se que, sendo apresentada uma nova declaração (substituição), do qual resulte o apuramento de um valor de imposto superior, que aquele contribuinte não cumpriu a sua obrigação, isto é, que não pagou na totalidade o valor relativo ao “pagamento por conta” e que, consequentemente, cometeu a infracção que a nossa recorrida vem acusada.
Aliás, não pode ignorar-se a específica função e natureza destes pagamentos: o pagamento por conta é uma antecipação do imposto que será devido a final, calculado com base no imposto liquidado relativamente ao período de tributação imediatamente anterior àquele em que se devam efectuar esses pagamentos, o qual poderá, ou não, coincidir com o valor que venha a ser efectivamente devido, razão pela qual a lei prevê, inclusive, que o contribuinte fique dispensado de tal obrigação quando tenha tido, no exercício anterior, um lucro inferior a determinado montante ou, sendo o valor do lucro tributável do exercício em curso inferior ao do anterior e se comprovar que os pagamentos por conta a que o sujeito passivo está obrigado resultam excessivos, isto é, correspondendo ao adiantamento de um imposto não devido, o sujeito passivo suspenda os pagamentos por conta (cfr.art°s.96, n°.4, e 99, nº1, do C.I.R.C.). E tais pagamentos antecipados do imposto “a final devido” constitui uma imposição do Estado determinada por interesses próprios de arrecadação de valores que, em bom rigor ou por princípio, não fora esta determinação legal de “antecipação” apenas seriam entregues/pagos ulteriormente. O que significa que, seguramente, não pode ter estado na mente do legislador abarcar no ilícito em causa a punição do sujeito passivo que observando integralmente a sua obrigação - determinada pelas condições ou pressupostos de facto e direito existentes à data em que essa obrigação deva ser cumprida -, se vê confrontado, posteriormente, com alterações das circunstâncias de facto que de todo não podia ter considerado aquando do cumprimento daquela obrigação.
Aliás, e se bem vemos, o que a factualidade apurada revela é que a Administração Tributária não pretende punir a arguida por não ter cumprido a sua obrigação ou porque desconheça que nessa data outro comportamento lhe era exigível mas, sim, porque tendo apresentado posteriormente uma declaração de substituição dela resultou um valor de imposto a pagar superior, o que, em nosso entender não cabe na previsão da norma e constitui mesmo uma pretensão arrepiante à luz dos princípios fundamentais que estão subjacentes ao ordenamento jurídico-penal. …”.
Perante a bondade do que fica exposto, relativamente ao qual não se vê razão para divergir, até porque a matéria em apreciação nestes autos é essencialmente idêntica, e não se vislumbrando na alegação da Recorrente matéria capaz de determinar uma outra leitura da realidade em apreço, tal significa que não pode afirmar-se um qualquer juízo de censura sobre a decisão proferida nos autos.
Daí que na improcedência das conclusões da alegação da recorrente, se impõe, nos termos acima expostos, confirmar a decisão aqui sindicada, com todas as legais consequências.
Improcede, por conseguinte, o presente recurso jurisdicional.
4. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente, mantendo-se a decisão judicial recorrida.
Custas pela Recorrente.
Notifique-se. D.N..
Porto, 21 de Dezembro de 2017
Ass. Pedro Vergueiro
Ass. Ana Patrocínio
Ass. Ana Paula Santos