Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00287/16.7BEBRG
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:10/07/2016
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Maria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Descritores:PROVIDÊNCIA CAUTELAR; SUSPENSÃO DA EFICÁCIA
Sumário:I-Cabe ao Requerente da providência o ónus do oferecimento de prova sumária dos requisitos de que depende a suspensão, incluindo dos factos que integram o requisito do periculum in mora;
I.1-e cabe ao Requerido fazer a prova, sumária, dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do Requerente bem como a matéria de impugnação;
I.2-o tribunal não pode substituir-se às partes no seu ónus de alegar e provar os factos que interessam a cada uma, porquanto o dever de investigação que a lei processual comete ao juiz apenas abarca a matéria de facto trazida ao processo, os factos notórios ou de conhecimento geral;
I.3-no caso em concreto, da leitura da sentença decorre que o senhor juiz fundamentou, de forma clara e suficiente, o seu entendimento jurídico, de modo a concluir pela não verificação do requisito do periculum in mora, cuja existência era absolutamente essencial ao deferimento da requerida providência. Considerou antes que a não concessão da requerida providência cautelar não iria acarretar prejuízos de difícil reparação na esfera jurídica do Requerente;
I.4-e, vistos os autos, também cremos que perante o quadro factual exposto pela parte e o teor das normas invocadas, não se pode dizer que quanto a estas haja um sustentado receio de constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação;
I.5-assim, afastado o pressuposto do periculum in mora, não será decretada a pretendida suspensão da eficácia das normas sub judice;
I.6-é que, atenta a necessária cumulatividade dos requisitos, fica prejudicado o conhecimento do fumus boni iuris e, ainda, do pressuposto negativo de deferimento, previsto no nº 2 do artº 120º, assente numa ponderação de todos os interesses em presença (públicos e/ou privados).*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Instituto de Desenvolvimento Educativo do Centro, Lda
Recorrido 1:Ministério da Educação e Ciência
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Procedimento Cautelar Suspensão Eficácia (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
RELATÓRIO
O Instituto de Desenvolvimento Educativo do Centro, Lda., com sede na Av. …, intentou providência cautelar contra o Ministério da Educação e Ciência, sito na Avenida….
Pediu:
a) a suspensão da eficácia das normas a que correspondem o nº 9 do artigo 3º e o nº 3 do artigo 25º do despacho normativo nº 7-B/2015, de 7/5, na redação introduzida pelo despacho normativo nº 1-H/2016, de 14/4;
b) que não se permita a aplicação das citadas normas ao Requerente.
Por sentença proferida pelo TAF de Coimbra foram julgados improcedentes os pedidos formulados e deles absolvida a entidade demandada.
Desta decisão vem interposto recurso.
Alegando, o Requerente concluiu o seguinte:

1) É verdade que nem o ordenamento jurídico, nem os contratos de associação celebrados em julho e agosto de 2015 (cfr. matéria de facto assente) consagram qualquer limitação geográfica à frequência de estabelecimento de ensino associados, em contrato de associação, muito menos com fundamento na área de residência e ou local de trabalho dos alunos e encarregados de educação;

2) De todo o modo, a redação do nº 9 do artigo 3º e o nº 3 do artigo 25º do despacho normativo nº 7-B/2015, de 7/5, na redação introduzida pelo despacho normativo 1-H/2016, publicado em 14/4, introduziu (“contra legem”) essa limitação geográfica.

3) A decisão sobre a matéria de facto é insuficiente para a decisão a proferir segundo as várias soluções plausíveis de direito, devendo aditar-se à referida decisão pelo menos os factos alegados em 7º, 8º, 9º, 11º, 15º, 104º, 105º e 126º do Requerimento Inicial (cfr. artigo 29º da oposição) e os factos alegados em 125º, 130º, 131º, 132º, 144º e 145º do Requerimento Inicial (cfr. artigo 38º da oposição);

4) E uma vez considerados provados estes factos, resulta à saciedade o “periculum in mora”, mas mesmo que assim se não entenda, o que não se admite e apenas se coloca por mera hipótese académica, e recorrendo quer à posição das partes nos articulados, quer aos normativos aplicáveis (mormente o valor de financiamento público, por turma), quer ao número de turmas contratualizado, quer ao número de alunos e de turmas que a Requerente perderá, quer aos documentos juntos aos autos, deviam igualmente ter sido considerados provados pelo menos os factos alegados em 125º, 126º, 130º, 131º, 132º, 144º e 145º do RI (estes por aceitação expressa do Requerido), 127º a 129º do RI, 133º a 136º do RI e 137º a 153º, também do RI.

5) E quando assim se não entenda, o que não se admite e apenas se coloca por mera hipótese académica, o tribunal “a quo” devia ter ordenado a produção de prova adicional (testemunhal e ou documental), ao invés de dispensar a sua realização através do despacho de 18/07/2016, na parte ora impugnada, por violação além do mais do disposto no nº 3 do artigo 118º e artigo 7º do CPTA.

6) Os nºs 9 do artigo 3º e o nº 3 do artigo 25º do Despacho Normativo nº 7-B/2015, publicado no DR, 2ª Série, nº 88, de 7/5/2015, na redação introduzida pelo Despacho Normativo nº 1-H/2016, publicado no DR, 2ª Série, nº 73, de 14/04/2016, são claramente inconstitucionais e ilegais, pelos vícios invocados no RI e sucintamente resumidos na presente peça processual;

7) Pelo que deve ser concluído pela existência de “fumus boni iuris” e pela supremacia dos interesses da Recorrente em face dos interesses do Recorrido e por conseguinte, deve a providência cautelar ser julgada procedente, sob pena de continuar a ser violado o disposto nos nºs 1 e 2 do artigo 120º do CPTA.

Face ao exposto, e por tudo o mais que suprirão, deve o presente recurso ser julgado totalmente procedente e por via do mesmo, revogar-se a decisão “sub judice”, substituindo-a por outra que decrete as providências requeridas ou quando assim se não entenda, que ordene a baixa dos autos para produção de prova adicional e prolação de subsequente decisão judicial de mérito, com todas as consequências legais.

O Requerido juntou contra-alegações, concluindo nestes termos:
A) Atentas as declarações do Recorrente nas suas Alegações (“não obstante reconhecer que a fundamentação da sentença é a favorável à requerente quando consagra …”), admite a Recorrida que não exista interesse processual do Recorrente no mesmo âmbito, e que, enquanto tal, esteja prejudicado o direito a recorrer, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 631.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, aplicável ex vi o disposto no art. 140.º, n.º 3, do CPTA, com consequente extinção da lide.
B) A Recorrente veio requerer, em momento subsequente ao do presente Processo judicial e Alegações, através do processo judicial n.º 1856/16.0BELSB, que corre termos na 5.ª Unidade Orgânica do Tribunal Administrativo e Círculo de Lisboa, diversas providências cautelares que sendo distintas, em termos formais, da presente iniciativa processual, coincidem, em termos materiais, com a mesma.
C) Existirá aceitação tácita da decisão judicialmente proferida, o que, nos termos do disposto no art. 632.º, n.ºs 1, 2 e 3, do Código de Processo Civil, aplicável ex vi o disposto no art. 140.º, n.º 3, do CPTA, determina renúncia ao presente recurso, e também necessária extinção da lide.
D) Por Sentença Judicial foi julgado improcedente o pedido de decretamento de providência cautelar, rejeitando-se a suspensão dos efeitos das normas contidas no art. 3.º, n.º 9, e art. 25.º, n.º 3, do Despacho Normativo n.º 7-B/2015, de 7 de maio, na redação introduzida pelo Despacho Normativo n.º 1-H/2016,
E) A referida Sentença consiste numa de oito Sentenças Judiciais, duas de 11.07.2016, e uma de 18.07.2016, proferidas pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra (Unidade Orgânica 1 – Juiz CF), nos processos judiciais n.º 345/16.8BECBR, 327/16.0BECBR, 287/16.7 BECBR, outra de 25.07.2016, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria (Juiz EAP), no processo judicial n.º 641/16.4BELRA, outra de 05.08.2016, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela (Juiz TMS), no processo judicial n.º 175/16.7BEMDL, e outras três, de 12.08.2016, proferidas pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria (Unidade Orgânica 1 – Juiz FVD), nos processos judiciais n.º 770/16.4BELRA, 742/16.9BELRA e 613/16.9BELRA, que julgaram improcedentes todos os pedidos formulados pelas Requerentes em sede cautelar.
F) Revela-se absolutamente fantasiosa a alteração da matéria de facto por si pretendida pela Recorrente: a mesma pretende (1) dar como provados factos especificamente impugnados pela Recorrida, bem como (2) introduzir diligências probatórias que o Tribunal, atenta a fundamentação de facto empregue na Sentença, poderia sempre desconsiderar.
G) A respeito do periculum in mora, não foi alegado no Requerimento Inicial qualquer facto consumado ou a produção de prejuízos de difícil reparação que possam fundadamente verificar-se até ao início do ano letivo 2016/2017, ou, sequer, até à decisão final do processo principal, em resultado da vigência das normas cuja suspensão não foi decretada.
H) O disposto no n.º 9 do art. 3.º do Despacho 7-B/2015, de 7 de maio, na redação conferida pelo Despacho 1-H/2016, de 14 de abril, não obstará à homologação das turmas de continuidade de ciclo iniciado em anos anteriores à sua entrada em vigor, ao abrigo de contrato de associação, ainda que constituídas por alunos cujos encarregados de educação residam ou desenvolvam a sua atividade profissional em área geográfica distinta da área geográfica de implantação da oferta do estabelecimento de ensino abrangida pelo contrato em causa, na medida em que foi emitida pela Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares a Circular 1-DEstE/2016, de 02.06.2016
I) São igualmente erróneas as considerações jurídicas realizadas nas Alegações a respeito do fumus boni iuris, e da ponderação de interesses (realizada em juízo sem a ponderação de qualquer efectiva factualidade no mesmo âmbito).
J) A fundamentação das Alegações da Recorrente remete na integra para as duas Sentenças Judiciais existentes em sentido contrário ao propugnado, ambas não transitadas em julgado, ignorando, desde logo, a douta fundamentação constante das Sentenças proferidas pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria – cujo crivo técnico-jurídico é evidentemente distinto das Sentenças juntas pela Recorrente – discorrendo-se nas mesmas, em suculentas 57 (cinquenta e sete) páginas, sobre todos os elementos jurídicos em abstrato consideráveis, a saber, (i) a falta de habilitação legal; (ii) os vícios do procedimento regulamentar; (iii) a violação do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo; (iv) a violação do princípio da igualdade; e (v) a violação da tutela da confiança e da boa-fé.
K) O aviso de publicitação de início de procedimento tendente à elaboração do Despacho Normativo relativo ao regime de matrícula no âmbito da escolaridade obrigatória foi, para os efeitos previstos no art. 98.º do Código de Procedimento Administrativo, publicado no site oficial do Governo em 24.02.2016, ainda se encontrando disponível no mesmo portal.
L) Nem a Recorrente nem as entidades referidas no seu Requerimento Inicial se constituíram como interessadas no procedimento tendente à elaboração do Despacho Normativo relativo ao regime de matrícula no âmbito da escolaridade obrigatória,
M) Não existindo, como aliás resulta do ac. do Tribunal Central Administrativo Norte, de 05.02.2016 (Relator: JOAQUIM CRUZEIRO) e do ac. do Supremo Tribunal Administrativo, de 01.06.2016 (Relator: ALBERTO AUGUSTO OLIVEIRA),qualquer ilegalidade a perspectivar no mesmo âmbito.
N) A alegada falta de habilitação legal para regulamentar a frequência escolar, a que igualmente se alude nas Alegações, é claramente inexistente, consoante, uma vez mais, foi reconhecido pelo ac. do Tribunal Central Administrativo Norte de 05.02.2016 (Relator: JOAQUIM CRUZEIRO).
O) A única interpretação conforme à Lei de Bases do Ensino Particular e Cooperativo e conforme à Constituição é a de que o EEPC não revogou o anterior “paradigma” legal de supletividade da celebração de contratos de associação, consoante resulta do Parecer n.º 11/2016 da Procuradoria-Geral da República.
P) Os alunos que não pertençam à área geográfica identificada no aviso do procedimento de contratação como sendo a área onde o Estado sentiu a necessidade de contratar apoio para a rede escolar, através de contrato de associação, ficam impedidos de beneficiar de gratuitidade em condições de igualdade com os alunos do ensino oficial no que se refere a despesas com propinas e matrículas
Q) Só esta interpretação permite afirmar que tais contratos respeitam as leis habilitantes, porquanto se conformam com o disposto no art. 8.º, n.º 2, alínea a), e n.º 4, da Lei n.º 9/79, como concluiu o Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República (cfr. 18.ª conclusão do Parecer n.º 11/2016), sendo, ainda a que melhor se conforma com a Lei fundamental.
R) A requerida suspensão normativa, consiste, em síntese, pretender que a Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares desrespeite o objeto contratual, e que viole o disposto no art. 10.º, n.º 3, no art. 16.º, n.º 2, e alíneas c) e g) do art. 18.º, do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo, bem como na alínea a) do n.º 2 e no n.º 4 do art. 8.º da Lei de Bases do Ensino Particular e Cooperativo.
S) Os prejuízos que a Apelante receia – mas que tão pouco logrou demonstrar, ou, sequer, idoneamente alegar – não resultam das normas em causa mas dos contratos de associação que celebrou, maxime de suposto incumprimento contratual por parte da Apelante.
T) As normas a que se referem o n.º 9 do artigo 3.º e o n.º 3 do artigo 25.º, ambos do despacho normativo n.º 7-B/2015, de 7/5, na redação introduzida pelo despacho normativo n.º 1-H/2016, de 14/04, não são imediatamente operativas e, por si só, não prejudicarão a Apelada em momento algum: tais normas, consoante reconhecido pela jurisprudência, para surtirem aqueles efeitos na esfera jurídica da Apelada, carecem necessariamente da prática de um ato administrativo de concreta aplicação.
U) Quanto à ponderação de interesses, era imperativo que, o quanto antes, as normas cuja suspensão foi determinada fossem publicadas em local idóneo, precisamente para obstar a efeitos que se referem no Requerimento Inicial; nesse mesmo sentido veio a público em 19.05.2016 um comunicado da MEPEC – Movimento de Escolas com Ensino Público Contratualizado.
V) Pretender a suspensão das normas em causa é visar que a Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares (i) desrespeite o objeto contratual, e (ii) viole o disposto no art.º 16.º, n.º 2 e alíneas c) e g) do art.º 18.º, do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo e o n.º 4 do art.º 8.º da Lei de Bases do Ensino Particular e Cooperativo, com resultado lesivo inadmissível para o erário público, através da atribuição de apoios financeiros indevidos.
W) A suspensão da norma implicaria a aceitação provisória – e antecipatória – de matrículas de crianças que veriam depois o seu percurso educativo interrompido caso a providência cautelar não viesse a ser decretada (uma vez que se aguarda a sua revogação no mesmo âmbito), criando uma perturbação no início ou decurso do ano escolar que não pode ser aceite
X) A Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares já no procedimento de homologação de turmas para o ano letivo 2015/2016 esclareceu vários estabelecimentos com contrato de associação a respeito desta limitação contratual, rejeitando inclusive a homologação de determinadas turmas com tal fundamento, como resulta inclusivamente de anteriores processos judiciais
Y) Atenta a falência (rectius, indeferimento) de outros procedimentos cautelares de teor essencialmente análogo ao presente procedimento cautelar (cfr. os docs. juntos), o interesse público de uniformidade de condições de ensino e de normalização do início de frequência escolar aquando do começo do ano letivo 2016/2017 depõe, também, inexoravelmente, no sentido da revogação da Sentença Judicial proferida.
Nestes termos, e nos demais de Direito julgados aplicáveis, deve ser rejeitado provimento ao recurso de Apelação apresentado pela Recorrente, sendo mantido o Despacho Judicial que indeferiu a presente providência cautelar solicitada, como é de elementar JUSTIÇA!

O MP, notificado ao abrigo do disposto no artº 146º/1 do CPTA, emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso.
Cumpre apreciar e decidir.

FUNDAMENTOS
DE FACTO
Na sentença foi fixada a seguinte factualidade:
A. A Requerente é titular da autorização definitiva relativamente ao estabelecimento de ensino denominado por «Instituto Educativo de L...» (cf. doc. a fls. 42 a 44 dos autos em proc. fls. que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).
B. A Requerente e o Estado Português, este representado pela Direção Geral da Administração Escolar, em 20.07.2015, subscreveram um acordo escrito que designaram por «Contrato de Associação» (cf. doc. a fls. 45 a 51 dos autos em proc. fls. que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).
C. A Requerente e o Estado Português, este representado pela Direção Geral da Administração Escolar, em 10.09.2015, subscreveram um acordo escrito que designaram por «Adenda ao Contrato de Associação» (cf. doc. a fls. 52 a 53 dos autos em proc. fls. que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).
D. A Requerente e o Estado Português, este representado pela Direção Geral da Administração Escolar, em 20.08.2015, subscreveram um acordo escrito que designaram por «Contrato de Associação» (cf. doc. a fls. 54 a 61 dos autos em proc. fls. que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).
E. Foi publicado em DR II Série n.º 73/2016, de 14.04.2016, o despacho normativo n.º 1-H/2016, que alterou várias normas do despacho normativo n.º 7-B/2015, de 7 de maio, entre as quais o n.º 9 do art.º 3.º e o n.º 3 do art.º 25.º que, respetivamente passaram a ter a seguinte redação:
- A frequência de estabelecimentos de ensino particular e cooperativo com contrato de associação, na parte do apoio financeiro outorgado pelo Estado, é a correspondente à área geográfica de implantação da oferta abrangida pelo respetivo contrato” (n.º 9 do art.º 3.º)
- “Compete à Inspeção-Geral da Educação e Ciência, em articulação com a DGEstE, proceder à verificação do cumprimento, pelos estabelecimentos do ensino particular e cooperativo com contrato de associação, da respetiva área geográfica de implantação da oferta abrangida pelo contrato outorgado” (n.º 3 do art.º 25.º)
F. O r.i. inicial do presente meio processual deu entrada neste Tribunal em 11.05.2016 (cf. fls. 1 a 204 dos autos).

Em sede de factualidade não provada o Tribunal exarou que: “Não resultaram como provados outros factos com interesse para a decisão do mérito da causa, tendo apenas sido selecionados os que se nos afiguram como relevantes para as várias soluções plausíveis de direito.”
E no que à motivação da decisão de facto concerne consignou-se o seguinte: ”Os factos dados como provados resultam dos documentos juntos aos autos.”

DE DIREITO
É objecto de recurso a sentença proferida pelo TAF de Coimbra que indeferiu a providência cautelar em apreço.
Como é sabido, o objecto do recurso jurisdicional é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, como resulta do disposto nos artigos 608°/2, 635°/4, 639° e 640°/1, todos do CPC, ex vi artºs 1° e 140°/3, estes do CPTA.
Assim, o tribunal ad quem só pode conhecer das questões suscitadas pelo recorrente, nas respectivas conclusões alegatórias e, bem assim, das que forem do seu conhecimento oficioso.
Ora, analisada a peça processual do aqui Recorrente, constata-se que o mesmo veio reagir contra a dispensa da prova testemunhal e, ainda, assacar à sentença recorrida erros de julgamento, quanto às matérias de facto e de direito, com o que se mostraria violado o disposto nos artºs 18º/3, 7º e 120º/1 e 2, todos do CPTA.
Cremos que não lhe assiste razão.
Antes, porém, atente-se no discurso jurídico fundamentador da decisão em crise:
No caso dos presentes autos, recorde-se, a Requerente pretende que seja declarada a suspensão de eficácia do n.º 9 do artigo 3.º e ao n.º 3 do art.º 25.º do despacho normativo n.º 7-B/2015, de 7 de maio, na redação introduzida pelo despacho normativo n.º 1-H/2016, de 14 de abril.
Assim, dispõe o art.º 130.º do CPTA que:
Artigo 130.º
Suspensão de eficácia de normas
1 - O interessado na declaração da ilegalidade de norma emitida ao abrigo de disposições de direito administrativo cujos efeitos se produzam imediatamente, sem dependência de um ato administrativo ou jurisdicional de aplicação, pode requerer a suspensão da eficácia dessa norma, com efeitos circunscritos ao seu caso.
2 - O Ministério Público e as pessoas e entidades referidas no n.º 2 do artigo 9.º podem pedir a suspensão, com força obrigatória geral, dos efeitos de qualquer norma em relação à qual tenham deduzido ou se proponham deduzir pedido de declaração de ilegalidade com força obrigatória geral.
3 - [Revogado].
4 - Aos casos previstos no presente artigo aplica-se, com as adaptações que forem necessárias, o disposto no capítulo I e nos dois artigos precedentes.
Assim, por força da remissão do n.º 4 do art.º supra citado é de aplicar à presente forma processual, entre outras normas, o disposto no art.º 120.º do CPA, onde se estatui que:
Artigo 120.º
Critérios de decisão
1 - Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, as providências cautelares são adotadas quando haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal e seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente.
2 - Nas situações previstas no número anterior, a adoção da providência ou das providências é recusada quando, devidamente ponderados os interesses públicos e privados em presença, os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adoção de outras providências.
3 - As providências cautelares a adotar devem limitar-se ao necessário para evitar a lesão dos interesses defendidos pelo requerente, devendo o tribunal, ouvidas as partes, adotar outra ou outras providências, em cumulação ou em substituição daquela ou daquelas que tenham sido concretamente requeridas, quando tal se revele adequado a evitar a lesão desses interesses e seja menos gravoso para os demais interesses públicos ou privados, em presença.
4 - Se os potenciais prejuízos para os interesses, públicos ou privados, em conflito com os do requerente forem integralmente reparáveis mediante indemnização pecuniária, o tribunal pode, para efeitos do disposto no número anterior, impor ao requerente a prestação de garantia por uma das formas previstas na lei tributária.
5 - Na falta de contestação da autoridade requerida ou da alegação de que a adoção das providências cautelares pedidas prejudica o interesse público, o tribunal julga verificada a inexistência de tal lesão, salvo quando esta seja manifesta ou ostensiva.
6 - Quando no processo principal esteja apenas em causa o pagamento da quantia certa, sem natureza sancionatória, as providências cautelares são adotadas, independentemente da verificação dos requisitos previstos no n.º 1, se tiver sido prestada garantia por uma das formas previstas na lei tributária.
Assim, nos termos do artigo 120.º, n.º1 do CPTA, para que as providências requeridas sejam decretadas é necessário que se verifiquem cumulativamente dois requisitos de carácter positivo:
- periculum in mora (1.ª parte do n.º 1 do art.º 120.º do CPTA);
- fumus boni iuris (2.ª parte do n.º 1 do art.º 120.º CPTA).
No entanto, o n.º 3 do art.º 120.º do CPTA vem acrescentar mais um critério de decisão, que diríamos de carácter essencialmente negativo, ao estatuir que a concessão da providência será, no entanto, recusada, quando devidamente ponderados os interesses públicos e privados em presença, os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adopção de outras providências.
Assim, verifica-se o periculum in mora quando “haja fundado receio da constituição da situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação”. Assim são duas situações distintas previstas naquela parte do normativo legal citado: o fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado e o sustentado temor da produção de prejuízos de difícil reparação.
No caso presente, a Requerente sustenta que os citados normativos cuja suspensão é pedida serão aplicados aos contratos de associação que firmou com o Estado Português e que tal se traduzirá, em síntese, numa diminuição do número de alunos, com consequentes e vastos prejuízos para o seu estabelecimento de ensino (cf., designadamente, os artigos 102.º, 103.º, 110.º e, sobretudo, 125.º a 153.º do r.i.).
Mas a questão que ora se levanta é se das apontadas normas, poderão decorrer as apontadas fatalidades invocadas pela Requerente. Assim, relembremos que as normas em causa estatuem que:
- A frequência de estabelecimentos de ensino particular e cooperativo com contrato de associação, na parte do apoio financeiro outorgado pelo Estado, é a correspondente à área geográfica de implantação da oferta abrangida pelo respetivo contrato” (n.º 9 do art.º 3.º)
- “Compete à Inspeção-Geral da Educação e Ciência, em articulação com a DGEstE, proceder à verificação do cumprimento, pelos estabelecimentos do ensino particular e cooperativo com contrato de associação, da respetiva área geográfica de implantação da oferta abrangida pelo contrato outorgado” (n.º 3 do art.º 25.º)
Neste momento e de acordo com as normas citadas, ainda não é possível definir o tal limite correspondente à «área geográfica de implantação da oferta abrangida pelo respetivo contrato». Não se sabendo esta, por não estar atualmente legal ou contratualmente delimitada, não se pode afirmar que a mesma se refere unicamente à localidade onde se insere a Requerente, tal como esta alega.
Consequentemente, não se pode minimamente extrapolar, quais as consequências quanto aos alunos que poderão, ou não, inscrever-se no estabelecimento de ensino da Requerente (com todas as demais supostas consequências invocadas por esta, sendo até incerto se a sobredita limitação geográfica se repercute nas condições de admissão de alunos). Mais se diga, que a suposta limitação decorrente das apontadas normas pressupõe que nos contratos de associação firmados e vigentes ou que no quadro legal que neles se diretamente repercute, estivesse inscrita uma qualquer limitação e que essa viesse a ser objeto de compressão. Contudo, analisados os contratos em causa e a demais legislação aplicável, tal (nova) limitação geográfica inexiste. Assim sendo, por isso, tais normas só poderão valer quando por contrato, por ato administrativo ou por ato normativo for concretizado o apontado conceito de «área geográfica de implantação da oferta abrangida pelo respetivo contrato».
Deste modo, perante este quadro factual e atento o teor das normas invocadas, não se pode dizer que quanto a estas haja um sustentado receio de constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação. Ora, este receio não é um mero elemento subjetivo e tem que ter suporte em dados de facto que, sob um crivo objetivo, apontem no sentido de verosimilhança quanto aos alegados efeitos perniciosos das normas suspendendas. Ora, não se sabendo o alcance, quase diríamos… geográfico, das normas a suspender, não se pode delas retirar qual o alcance eventualmente adverso das mesmas, sobretudo quando a Requerente tem os seus direitos assentes em contratos que nada referem quanto à apontada limitação, inexistindo, também, por ora, qualquer outro elemento jurídico conformador que este limite defina.
Conclui-se, por isso, que inexiste o requisito do periculum in mora.
Assim sendo e considerando que a concessão das providências requeridas está sujeita à verificação cumulativa do apontado requisito do periculum in mora, acrescido do fumus boni iuris, à falta de preenchimento daquele terá que soçobrar a providência requerida, sendo ocioso fazer qualquer análise quanto a este.
Deste modo, terá que improceder o pedido de suspensão de eficácia aqui formulado.”
X
Vejamos:
Dispõe o artigo 112º/1 do CPTA, que “Quem possua legitimidade para intentar um processo junto dos tribunais administrativos pode solicitar a adopção da providência ou das providências cautelares, antecipatórias ou conservatórias, que se mostrem adequadas a assegurar a utilidade da sentença a proferir nesse processo”.
A redacção deste artigo, na sua parte final, expressa o propósito essencial da tutela cautelar, que se reconduz a assegurar a utilidade da lide principal, ou seja, salvaguardar o efeito útil de uma sentença a proferir em sede de acção principal, que pela sua cognição plena poderá comportar um período mais longo até ser definitivamente decidida.
Tal equivale a dizer que a providência cautelar (no caso conservatória) está intimamente ligada aos autos principais, sendo nestes que a pretensão do Requerente irá ser analisada e decidida com a profundidade necessária, tratando-se, em sede cautelar, apenas de assegurar a utilidade da sentença que aí venha a ser proferida mediante a adopção de medidas urgentes baseadas necessariamente numa apreciação sumária e perfunctória do caso.
Daí que ao julgador de um processo cautelar em que é solicitada uma providência conservatória se imponha que proceda a uma apreciação sucinta e sumária das ilegalidades apontadas pelo requerente cautelar ao acto impugnado ou a impugnar com o objectivo de constatar se ocorre a sua manifesta ilegalidade, não lhe competindo analisar e apurar com exaustão se as ilegalidades imputadas ao acto impugnado ocorrem ou não.

Deste modo, o julgador, colocando-se na situação futura de uma hipotética sentença de procedência da acção principal, terá de indagar e ajuizar se existem ou não razões para temer que tal decisão venha a tornar-se inútil, sem qualquer alcance prático, por entretanto se ter consumado uma situação de facto incompatível com ela, ou por se terem produzido prejuízos dificilmente reparáveis para quem dela pretende beneficiar, que obstem à reconstituição natural ou à reintegração da esfera jurídica do beneficiado com a sentença.
Na redacção actual, dada pelo DL 214-G/2015, de 2 de outubro, o fumus boni iuris apresenta-se sempre sob a formulação positiva (condizente com a formulação que na redacção anterior se encontrava plasmada na al. c) do n° 1 do artº 120° do CPTA)
Ponderada a tutela cautelar em função dos critérios agora estatuídos no artigo 120°/1 do CPTA, a análise da verificação da aparência do bom direito assume particular relevância nos presentes autos, na medida em que é necessário que se verifique uma forte probabilidade de procedência da pretensão principal.
A “formulação positiva do fumus boni iuris é-nos dada pela introdução na redacção do n. ° 1 do artigo 120. ° do CPTA do substantivo "provável", que imprime uma maior rigidez ao conceito. Assim, do direito convocável para subsumir os factos descritos, tem de ser possível chegar-se à probabilidade do êxito da acção; tem de se verificar uma aparência de que o requerente ostenta, de facto, o direito que considera lesado pela actuação administrativa.
Como refere a Prof. Isabel Celeste Fonseca, o requisito do fumus boni iuris na formulação positiva, obriga a um juízo positivo de probabilidade através da "intensificação da cognição cautelar", ou seja, duma "apreciação mais profunda e intensa da causa" - (em Dos Novos Processos Urgentes no Contencioso Administrativo (função e estrutura), págs. 66/68).
A apreciação judicial sobre a probabilidade da procedência da pretensão formulada no processo principal deve ser feita em moldes de summario cognitio, materializada num juízo de verosimilhança ou mera previsibilidade e razoabilidade dos indícios, que permita ao Tribunal acreditar na probabilidade do êxito da pretensão principal. Designadamente, verificar-se-á o critério referenciado quando a ilegalidade do acto a suspender resulte de forma clara dos autos, sem necessidade de mais provas, ou, por outras palavras, quando se esteja perante uma ilegalidade evidente.
In casu, o tribunal a quo, perante o requerimento de providência cautelar indeferiu a realização de diligências probatórias, mormente a inquirição das testemunhas arroladas no requerimento inicial.
É sabido que nos meios cautelares a prova testemunhal está na inteira disponibilidade do tribunal, ou seja, apenas terá lugar quando este a considere necessária -cfr. os artºs 118°/ 1, 3 e 5, do CPTA e 367°/1, do CPC.
Está aqui em causa o princípio do inquisitório na busca da verdade material, que caracteriza e norteia os processos cautelares.
Do conteúdo desta norma legal, que presta tributo ao chamado princípio do inquisitório, conclui-se que o julgador, na averiguação da verdade material, não está limitado aos meios de prova requeridos pelas partes. Isto significa que o julgador poderá ordenar diligências de prova que não lhe foram requeridas, desde que as considere necessárias, e significa, também, que poderá recusar diligências de prova que lhe foram solicitadas, desde que as repute dispensáveis - note-se que o mesmo princípio vigora no âmbito da tramitação processual das providências cautelares cíveis, conforme decorre do artigo 386°/1 do CPC.
Cumpre ao julgador, por conseguinte, e uma vez apresentado o rol de testemunhas, ponderar se a produção desta prova pessoal é ou não indispensável para o apuramento da matéria de facto pertinente.
“Importa sublinhar, a propósito e com interesse, que o legislador concebeu as providências cautelares como medidas de natureza instrumental e provisória, tramitadas em processo de caráter sumário, adequado à celeridade necessária à efetivação da tutela em causa” - ac. deste TCAN, de 12/06/2008, proc. 01507/07.4BEBRG, aqui trazido pela Senhora PGA.
É, pois, claro que, ao contrário do que pretende o Recorrente, não se exige uma prova total para a decisão cautelar, como é - e deve ser - exigida para a decisão da acção principal que - esta sim - exige uma avaliação e uma indagação muito mais cuidada e sólida. Dito de outro modo, ao contrário do que alega o Recorrente, o tribunal a quo não tinha que esgotar o dever inquisitório, na precisa medida em que se está no quadro de um processo cautelar e, consequentemente, de uma decisão meramente sumária.
No caso dos autos, o tribunal foi categórico ao afirmar que, para a decisão a proferir, tendo em conta as várias soluções plausíveis da questão de direito, não se mostrava necessária a produção de outra prova para além da documental já trazida aos autos, sendo inúteis outras indagações. E, nesta sequência, dispensou a prova testemunhal arrolada pelas partes nos articulados. Ficou, pois, patente o juízo de desnecessidade de prova testemunhal para a formação da convicção sumária do julgador do Tribunal a quo.
E, visto o material fáctico contido no probatório e a factualidade que o Recorrente se propunha provar, conclui-se que esta decisão não merece reparo.
É que, mesmo que que o julgador admitisse a prova testemunhal e as testemunhas arroladas fossem inquiridas sobre os factos alegados e admitindo que os mesmos viessem a ser dados como assentes, ainda assim tais factos não teriam virtualidade para demonstrar os invocados prejuízos de difícil reparação para os interesses que o Requerente visa assegurar no processo principal.
Na verdade, tais factos revelam-se inócuos para a comprovação do periculum in mora, porquanto a sua julgada inverificação radicou no sentido e alcance das normas invocadas, sendo que destas não decorrem as fatalidades invocadas pelo Requerente.
Como bem observou o tribunal a quo “este receio não é um mero elemento subjetivo e tem que ter suporte em dados de facto que, sob um crivo objetivo, apontem no sentido de verosimilhança quanto aos alegados efeitos perniciosos das normas suspendendas. Ora, não se sabendo o alcance, quase diríamos… geográfico, das normas a suspender, não se pode delas retirar qual o alcance eventualmente adverso das mesmas, sobretudo quando a Requerente tem os seus direitos assentes em contratos que nada referem quanto à apontada limitação, inexistindo, também, por ora, qualquer outro elemento jurídico conformador que este limite defina.”
Tal equivale a dizer que a produção de prova testemunhal redundaria numa diligência desnecessária ao conhecimento, necessariamente sumário e perfunctório, da matéria de facto alegada, com relevo para a decisão final cautelar, pelo que bem andou o senhor juiz ao dispensá-la.
E, assim sendo, está comprometido o êxito da providência.
Na verdade, face ao CPTA de 2015, as providências cautelares serão deferidas, desde que se verifiquem cumulativamente os seguintes requisitos: i) fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal (periculum in mora); ii) que seja provável que a pretensão formulada ou a formular no processo principal venha a ser julgada procedente (fumus boni juris); iii) que da ponderação dos interesses públicos e privados em presença resulte que os danos decorrentes da concessão da providência não se mostram superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, ou que, sendo superiores, possam ser evitados ou atenuados pela adoção de outras providências (proporcionalidade e adequação da providência).
Acresce que, tal como já ocorria no regime anterior, a verificação destes requisitos tem que ser cumulativa e, ademais, a concessão da providência cautelar depende da invocação e demonstração de factos donde se conclua pela verificação dos supra aludidos requisitos, sendo que incumbe ao requerente da providência o ónus de alegar e provar a matéria de facto integradora do periculum in mora (através de factos ou circunstâncias suficientemente determinadas que, segundo um juízo de normalidade e pelas regras de experiência comum, abarquem a situação de perigo justificativa da concessão da medida pretendida) não podendo o tribunal substituir-se, a não ser na atendibilidade de factos instrumentais que resultem da instrução e discussão.
Cabe, pois, ao Requerente o ónus do oferecimento de prova sumária dos requisitos de que depende a suspensão, incluindo dos factos que integram o requisito do periculum in mora. E cabe ao Requerido fazer a prova, sumária, dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do Requerente bem como a matéria de impugnação - artºs 342º/2 do CC e 487º e 516º, estes do CPC.
O tribunal não pode substituir-se às partes no seu ónus de alegar e provar os factos que interessam a cada uma, porquanto o dever de investigação que a lei processual comete ao juiz apenas abarca a matéria de facto trazida ao processo, os factos notórios ou de conhecimento geral - artºs 264º, 514º e 664º/2ª parte, do CPC.
Estas asserções não foram postas em causa pelo CPC de 2015 que, no seu nº 1, consagra o princípio do dispositivo, em relação aos factos essenciais que constituem a causa de pedir, e, no seu nº 2, à sombra do princípio da aquisição, permite ao julgador que tome em consideração os factos instrumentais e, outrossim, os que constituam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado, desde que tais factos resultem da instrução da causa. Mas essa possibilidade está sempre condicionada pela prévia alegação desses factos essenciais e, obviamente, pela necessidade da sua atendibilidade e ponderação pelo julgador, o que equivale a dizer, pela sua relevância para a decisão a proferir.
Voltando ao caso em concreto, da leitura da sentença decorre que o senhor juiz fundamentou, de forma clara e suficiente, o seu entendimento jurídico, de modo a concluir pela não verificação do requisito do periculum in mora, cuja existência era absolutamente essencial ao deferimento da requerida providência. Considerou antes que a não concessão da requerida providência cautelar não iria acarretar prejuízos de difícil reparação na esfera jurídica do Requerente.
E, vistos os autos, também cremos que perante o quadro factual exposto pela parte e o teor das normas invocadas, não se pode dizer que quanto a estas haja um sustentado receio de constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação.
Como, aliás, bem advoga o Recorrido, outras decisões proferidas em casos semelhantes tiveram o mesmo desfecho e foram secundadas quer por este TCAN quer pelo STA.
Assim, afastado o pressuposto do periculum in mora, não será decretada a pretendida suspensão da eficácia das normas sub judice.
Efectivamente, atenta a necessária cumulatividade dos requisitos, fica prejudicado o conhecimento do fumus boni iuris e, ainda, do pressuposto negativo de deferimento, previsto no nº 2 do artº 120º, assente numa ponderação de todos os interesses em presença (públicos e/ou privados).
Em suma:
-os requisitos para o decretamento de uma providência cautelar são, em termos muito simplistas, os seguintes: que haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal (periculum in mora); seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente (fumus boni juris); que da ponderação dos interesses públicos e privados em presença decorra que os danos resultantes da concessão da providência não se mostram superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, ou que, sendo superiores, possam ser evitados ou atenuados pela adopção de outras providências (proporcionalidade e adequação da providência);
-a verificação destes requisitos tem que ser cumulativa;
-a apreciação judicial dos requisitos em presença deve ser feita em moldes de summario cognitio, materializada num juízo de verosimilhança ou mera previsibilidade e razoabilidade dos indícios;
-o tribunal a quo arredou a presença de um dos pressupostos e, deste modo, a sentença recorrida concluiu pelo indeferimento do pedido cautelar deduzido pelo Requerente;
-e, face ao juízo a adoptar nesta sede (cautelar), que terá sempre de ser um juízo indiciário, de verosimilhança e de probabilidade, sob pena de se estar a entrar no domínio da apreciação de mérito, ele mostra-se assertivo, face aos elementos insertos nos autos.
Improcedem, pois, as conclusões do Recorrente.

DECISÃO
Termos em que se nega provimento ao recurso.
Custas pelo Recorrente.
Notifique e D.N.

Porto, 07/10/2016
Ass.: Fernanda Brandão
Ass.: Frederico Branco
Ass.: Rogério Martins