Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01441/07.8BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:10/14/2021
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Irene Isabel Gomes das Neves
Descritores:IVA; DESVALORIZAÇÃO DE FACTURA; ÓNUS DA PROVA
Sumário:I - Os concretos pontos de facto impugnados devem ser feitos nas respectivas conclusões, porque delimitadoras do âmbito do recurso e constituírem o fundamento da alteração da decisão. Já quanto à especificação dos meios probatórios, a lei não impõe que seja feita nas conclusões, podendo sê-lo no corpo da motivação, mas em todo o caso impõe-se a obrigatoriedade de conexionar cada facto censurado com os elementos probatórios correspondentes, nomeadamente prova testemunhal.

II - A Administração Fiscal tem o ónus de provar a factualidade que a levou a desconsiderar operações consubstanciadas em determinada facturas, factualidade essa que tem de ser susceptível de abalar a presunção de veracidade que verte a escrita do contribuinte e dos respectivos documentos de suporte, só então passando a competir ao contribuinte o ónus de prova de que as operações se realizaram efectivamente.*
* Sumário elaborado pela relatora
Recorrente:Fazenda Pública
Recorrido 1:Z., LDA
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de o recurso não merecer provimento.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
*
1. RELATÓRIO

1.1. A Fazenda Pública, inconformada com a notificada da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, em que foi julgada totalmente procedente a impugnação judicial deduzida por Z. Ld.ª contra a liquidação de IVA e de juros compensatórios, referentes ao 4º trimestre de 2002, com os n.ºs 07061405 e 07061406, no valor de €6.156,00 e €1,023,41, vem dela interpor o presente recurso jurisdicional.

Alegou, formulando as seguintes conclusões:

«A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou procedente a impugnação deduzida contra a liquidação adicional de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), e respectivos juros compensatórios, relativa ao quarto trimestre do ano de 2002, no montante global de € 7.179,41 (sete mil cento e setenta e nove euros e quarenta e um cêntimos), efectuadas na sequência da Autoridade Tributária e Aduaneira (doravante, AT) haver apurado e concluído, resultante do apuramento de um conjunto de factos e provas, no decurso de acção inspectiva à actividade desenvolvida pela impugnante, que a factura n.º 79 registada na contabilidade da Impugnante não consubstancia operações reais.
B. Nos termos da douta sentença, a procedência da presente impugnação ficou a dever-se ao facto de a Impugnante ter logrado infirmar as conclusões apresentadas pela AT em sede inspectiva, demonstrando a realização das operações tituladas pela factura aqui em causa, de onde decorreu a anulação das liquidações impugnadas e a procedência da impugnação.
C. Considerou o Tribunal a quo que (fls. 14 e 15 da sentença) “Assim, resultando provada a efectividade das prestações de serviços facturados, não é aplicável à situação dos autos o disposto no art.º 19/3, do CIVA. O IVA suportado pela Impugnante é dedutível, nos termos gerais, pelo que as liquidações ora impugnadas não se podem manter.”
D. Não pode a Fazenda Pública conformar-se com o assim doutamente decidido por entender que a sentença a quo incorreu em erro de julgamento no tocante à apreciação que fez da matéria de facto, nomeadamente por ter dado absoluta credibilidade à prova trazida pela Impugnante, designadamente a prova testemunhal, desrespeitando por isso as regras da prova, bem como as regras da sua repartição.
E. Resulta da douta sentença que é pacífico que a AT satisfez o seu ónus probatório (fls. 12 da sentença), ou seja, a AT, como lhe competia, cumpriu o ónus da prova quanto aos factos constitutivos do seu direito de atuação, i. e., do seu direito de tributar, devidamente explicitado no Relatório de Inspecção Tributária (RIT).
F. Por seu lado, e ao contrário do que reza a douta sentença de que se recorre, a Impugnante não logrou demonstrar, como lhe competia, a materialidade das operações económicas postas em causa pela AT, ou seja, que as operações tituladas pela factura, utilizada para o exercício do direito à dedução, efectivamente tiveram lugar, foram efectuadas pela entidade emitente dessa factura, pelos valores na mesma inscrita, não lhe aproveitando a mera criação de dúvida, ainda que fundada, a esse propósito.16
16 Cf. resulta do Acórdão do TCA – Sul, de 16.03.2001, no processo 01024/03, Acórdão do TCA - Norte, de 24.02.2005, no processo 00271/04, posição conformada pelo Acórdão do STA, de 30.04.2003 no recurso 241/03, e ainda, daquela suprema instância, pelos Acórdãos de 20.11.2002 no processo 1483/02, Acórdão de 17.04.2002, no processo 26635, Acórdão de 07.05.2003, no processo 1026/02 e Acórdão de 12.05.2009.
G. Do probatório não consta, nem poderia constar, na perspectiva da Fazenda Pública, que a Impugnante adquiriu ao seu fornecedor os serviços constantes da factura melhor identificada nos autos, sendo que tal factura inclui IVA suportado pela Impugnante, que lhe confere direito à dedução.
H. A convicção do Tribunal baseou-se na prova apresentada pela Impugnante, nomeadamente no depoimento das testemunhas por si arroladas, desvalorizando toda a prova documental plasmada no Relatório da Inspecção Tributária, de onde se concluiu que as operações em causa nestes autos eram fictícias.
I. Considera a Fazenda Pública que da conjugação dos elementos reputados na douta sentença sob recurso como susceptíveis de abalar a prova produzida pela AT não resulta minimamente a demonstração da materialidade das operações, nem sequer foram aptos a abalar os elementos recolhidos em sede inspectiva.
J. Entendeu a douta sentença a quo que a prova testemunhal foi bastante para contrariar as declarações proferidas em auto de declarações pelos emitentes das facturas, bem como toda a prova documental evidenciada no relatório da Inspecção Tributária.
K. Não pode a Fazenda Pública conformar-se com a valoração da prova testemunhal constante da douta sentença sob recurso, por se questionar a sua consistência, isenção, imparcialidade, credibilidade e suficiência, no sentido da prova positiva dos factos.
L. Impunha-se que dos depoimentos das testemunhas resultasse, de modo pormenorizado, inequívoco e coerente os termos em que se realizaram as prestações de serviços tituladas pela factura em causa, o que não sucedeu.
M. De modo algum o conteúdo dos testemunhos permite estabelecer relação entre os serviços prestados e os custos documentados, nem em termos de quantificação, nem em sede temporal.
N. A prova testemunhal encontra-se desacompanhada de outros elementos probatórios, designadamente de natureza documental (contratos de empreitada, autos de medição, mapas de horas de trabalho prestado, cheques nominativos depositados nas contas dos beneficiários; listagens de identificação de trabalhadores) que permitam, com a segurança judicialmente exigida, concluir pela prestação dos serviços titulados pelas facturas e nas quantidades que das mesmas constam.17
17. Neste sentido o Acórdão do TCA-N, de 28.02.2013, no processo n.º 383/08.4BEBRG, disponível em www.dgsi.pt
O. Apesar de as testemunhas afirmarem que era feita a contabilização das horas de trabalho por cada trabalhador, faz-se notar que ao longo da inspecção não foram juntos elementos documentais que demonstrassem a tese da Impugnante quanto à prestação de serviços (os já referidos contratos de empreitada, autos de mediação, mapas de horas de trabalho prestado, cheques nominativos depositados nas contas dos beneficiários; listagens de identificação de trabalhadores).
P. Não se justifica o valor probatório atribuído ao depoimento das testemunhas apresentadas pela Impugnante, atentos os laços de subordinação jurídica e a multiplicidade de aspectos relacionados com a relação laboral que liga um qualquer trabalhador e a sua entidade patronal.
Q. Não podiam os depoimentos prestados pelas testemunhas terem sido valorados da forma que o foram, permitindo-se destruir todos os indícios e elementos probatórios apurados no procedimento inspectivo e constante do Relatório da Inspeção Tributaria (RIT).
R. Na verdade, os elementos recolhidos em sede inspectiva são de tal modo sólidos que não podem ficar abalados por singelas constatações.
S. Analisado o RIT, continuam por explicar muitos dos indícios recolhidos, designadamente:
I. A contabilidade da Impugnante não regista adiantamentos nas contas dos fornecedores em causa (conta 21.8 – fornecedores c/adiantamentos);
II. A contabilidade não espelha o registo dos movimentos entre as contas de sócios, contas de outros credores (gerente), contas de fornecedores adiantamentos e fornecedores contas-correntes;
III. A contabilidade não releva pagamentos directos ao Gerente;
IV. Todas as facturas foram pagas, ou em (I) numerário, ou através de (II) meros movimentos contabilísticos da conta-corrente de sócios, ou através de (III) cheques, levantados ou depositados por pessoas com ligações à Impugnante e nunca pelos (alegados) destinatários;
V. A insuficiência de meios humanos dos prestadores de serviços subcontratados;
VI. Quem eram os trabalhadores ao serviço das sociedades subcontratadas? Quais os seus nomes? Quais as suas moradas?
VII. Porque não foram oferecidos documentos comprovativos da sua presença nas obras (por exemplo, folhas de seguro)?
VIII. Porque não foram chamados a depor?
IX. Todas as sociedades subcontratadas tinham as respectivas sedes em salas, escritórios, apartamentos, espaços demasiado exíguos para armazenar material utilizado em obras de construção civil (seja matéria prima, seja maquinaria) que permitissem concluir que pudessem utilizar nas obras “as suas próprias máquinas e ferramentas de construção civil”, conclusão retirada no facto dado como provado n.º 34;
X. Inexistência de outros elementos probatórios, designadamente de natureza documental, seja contratos de empreitada, autos de medição, mapas de horas de trabalho prestado, cheques nominativos depositados nas contas dos beneficiários, listagem de identificação de trabalhadores que permita, com a segurança judicialmente exigida, concluir pela prestação dos serviços titulados pela factura e nas quantidades que da mesma constam;
T. É entendimento da Fazenda Publica que, da análise do probatório da sentença recorrida, nenhum indício, das quase duas dezenas acima indicados, foi contrariado ou sequer abalado.
U. Entende a Fazenda Pública, que a matéria constante do probatório da sentença que ora se recorre não é suficiente para dar como provado que os serviços prestados constantes da factura emitida pelos fornecedores foram efectivamente adquiridos e prestados à Impugnante.
V. Para admitir a existência daquelas prestações de serviços, seria necessário que a Impugnante demonstrasse nos autos – com a necessária certeza e segurança – que as prestações de serviços eram as constantes da factura desconsiderada pela AT no seu relatório de inspecção.
W. Não foi apurada qualquer factualidade que, considerada que fosse, permitisse concluir de modo diverso da AT.
X. Considera-se que o Tribunal a quo não especificou suficientemente os factos que considera provados e não provados e que motivaram as razões da decisão, uma vez que não especificou as razões pelas quais desconsiderou os factos constantes do Relatório de Inspecção, nem especificou as razões pelas quais valorou a prova testemunhal em detrimento da prova testemunhal e documental recolhida em sede de procedimento inspectivo.
Y. In casu, sopesada a prova testemunhal produzida perante a prova documental apresentada pela Administração Tributária, não se pode concordar com a valoração probatória, da matéria de facto provada e não provada, feita na sentença recorrida.
Z. Da prova testemunhal, não se pode concluir, como fez a Sentença de que se recorre, que a factura em causa corresponde a serviços efectivamente prestados, não podendo aquela relevar para a prova da materialidade das operações em causa.
AA. Concluiu a sentença ora recorrida, contrariando toda a jurisprudência e anulando completamente um esforço sério de fundamentação constante do relatório de inspecção, que a detecção de facturas falsas é facilmente contrariada por três testemunhas, empregadas da Impugnante.18
18 Sobre esta matéria versam os Acórdãos do TCA – Norte de 12-10-2006 (processo n.º 00300/04), de 11.03.2010 (processo n.º 2794/04 – Viseu), de 28.02.2013 (processo n.º 383/08.4BEBRG), de 27.11.2014 (processo 92/07.1BEPNF), de 12.12.2014 (processo n.º 612/05.6BEBRG), de 12.02.2015 (processo n.º 00968/05.0BEBRG) e de 16.04.2015 (processo n.º 448/07.0BEPNF), e do TCA – Sul, de 04.06.2013 (processo n.º 6478/13), disponíveis em www.dgsi.pt.
BB. Em conclusão, a prova produzida pela Impugnante nos presentes autos é insusceptível de satisfazer o ónus que sobre si impendia, porque nessa matéria os depoimentos não foram isentos, consistentes, imparciais, credíveis e suficientes, no sentido da prova positiva dos factos.
CC. Do exposto se infere que a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento no tocante à apreciação que fez da matéria de facto, nomeadamente por ter considerado que o esforço probatório da Impugnante foi satisfatório para ter considerado demonstrada a realização das operações tituladas por factura falsa, com base na prova testemunhal, desrespeitado assim as regras de repartição do ónus da prova e a sua valoração através da violação do disposto nos artigos 74.º da LGT e 19.º, n.º 3, do Código do IVA (CIVA).
DD. Deveria o Tribunal ter decidido no sentido da total improcedência do pedido formulado pela Impugnante.
Termos em que, e pelo muito que V. Exas. doutamente suprirão, se requer seja concedido provimento ao presente recurso jurisdicional e ser, em consequência, revogada a douta sentença recorrida, declarando-se a total improcedência do pedido formulado pela Impugnante, com as legais consequências, assim se fazendo a desejada JUSTIÇA

1.2. A Recorrida (Z., Lda.), notificada da apresentação do presente recurso, veio contra-alegar, concluindo:

«I – Nota prévia sobre a sentença recorrida
1ª – A Impugnante/Recorrida acompanha integralmente os muito bem elaborados e rigorosos fundamentos de facto e de Direito, que fundamentam a justa sentença recorrida pela Fazenda Pública, para o Tribunal Central Administrativo do Norte – Secção de Contencioso Tributário.
2ª – Contrariamente ao alegado pela RFP, na sentença recorrida, a Meritíssima Juíza julgadora, em obediência ao disposto no art. 607º do CPC, fez uma exaustiva, rigorosa, equilibrada e justa valoração de toda a prova, quer da documental quer da testemunhal, baseada na apreciação que fez das provas, segundo as máximas de experiência e as regras da lógica, tendo concluído pela certeza jurídica que foi vertida para a sentença produzida.
3ª – Por sua vez, o Digno Magistrado do Ministério Público pronunciou-se pela procedência da impugnação, por ser de parecer que face aos elementos probatórios juntos e, do que resulta da prova testemunhal produzida, que a impugnante logrou demonstrar que os serviços facturados tinham sido efectivamente prestados, dissipando as dúvidas quanto à verificação dos pressupostos que legitimaram a actuação da Administração Tributária.
II – Sobre as alegações apresentadas pela Fazenda Pública
4ª – Começando por referir que a Impugnante/Recorrida não aceita nenhuma das conclusões apresentadas pela Fazenda Pública nas suas alegações do recurso, das opostas às conclusões da sentença recorrida, nem sequer os pressupostos e motivações das mesmas, pelos fundamentos que vai apresentar nestas suas contra-alegações.
5ª – Verifica-se que em síntese, a Fazenda Pública acompanhou nas suas alegações e conclusões, os elementos e juízos que constam do relatório de inspecção fundamentante das liquidações em causa. Elementos e juízos esses que na sua larga maioria, são infundamentados, especulativos ou meros palpites, assentes em factos desgarrados, não aprofundados e contraditados (tal como impunha o princípio da legalidade e do contraditório, e foi requerido durante o procedimento inspectivo), elementos esses por vezes até ajuizados em erro, tal como se demonstrou na instrução probatória do processo de impugnação.
6ª – A invocada fundamentação das correcções do IVA deduzido, foi a alegada violação do disposto no artigo 19º nº 3 do CIVA, tal como consta do Relatório de Inspecção Tributária, e consta na fundamentação de Direito da sentença recorrida.
7ª – Por outro lado, a correcção em causa assentou no fundamento que consta nesse RIT, na pág. 2, onde consta:
“III. DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS
Os factos apurados no decurso dos procedimentos inspectivos demonstram que a empresa “Z., Lda” contabilizou facturas, no exercício de 2002, relativamente às quais existem fortes indícios de não corresponderem a operações reais...”
Tendo ainda referido nesse RIT...
“Verifica-se que a factura não identifica, concretamente, o local das obras executadas.”
8ª – Ora, desde logo aquando do exercício do direito de audição pela Impugnante/Recorrida sobre o projecto do RIT, demonstrou-se que tal afirmação conclusiva não estava correcta, já que a factura 079, de 25/11/2002, a qual foi anexada como – (doc. «1»), no seu descritivo consta que as respectivas obras foram efectuadas na “R.”.
Facturas essas, que eram relativas a prestações de serviços anteriores às respectivas datas, efectuados nas especificadas lojas da “R.”, elementos estes que esclarecem cabalmente a completa efectividade das operações realizadas.
Tal como foi também confirmado pelos depoimentos de todas as testemunhas.
9ª – Elementos estes que esclarecem cabalmente a completa efectividade dessas operações realizadas, e que constam das correspondentes facturas da Impugnante/Recorrida, as quais desde logo se discriminaram no ponto “17” do direito de audição, o qual se recorda por transcrição:
17Os quais podem ser comprovadas nos respectivos locais e junto do cliente onde foram prestadas, como se indica e tal como consta das respectivas facturas:
Factura nº 37, de 16/04/2002, de 16.485,52 €, na “Loja (...)”.
(Construção civil no valor de 16.485,52 €)
Factura nº 39, de 19/04/2002, de 9.939,00 €, na “Loja (...)”.
(Construção civil no valor de 1.500,00 €)
Factura nº 40, de 19/04/2002, de 1.705,00 €, na “Loja (...)”.
(Construção civil no valor de 540,00 €)
Factura nº 41, de 19/04/2002, de 39.969,28 €, na “Loja (...)”.
(Construção civil no valor de 9.641,53 €)
Factura nº 42, de 11/11/2002, de 38.718,90 €, na “Loja (...)”.
(Construção civil no valor de 38.718,90 €)
10ª – Efectividade essa que, também poderia (e deveria, note-se), ter sido comprovada pela Inspecção Tributária, no respectivo local e junto do cliente onde foram prestados os serviços (diligência que não foi efectuada),
Mesmo tendo sido requerida pela Impugnante/Recorrida, para que fosse averiguado e verificado junto das obras, e dos seus donos, quer sobre a sua efectividade, quer sobre a identidade de quem prestou esses serviços, esta não efectuou uma única dessas diligências requeridas.
11ª – Ora, a douta decisão da sentença recorrida pela RFP, relativamente ao conjunto de indícios carreados pela Fazenda Pública para os autos para provar a sua actuação, conjugados coma prova produzida pela Impugnante/Recorrida, devidamente valorada toda essa prova, justamente decidiu no sentido da procedência da impugnação deduzida, com os fundamentos que constam a págs. 14/15:
12ª – Considera a Impugnante/Recorrida relevante para os presente autos, nos termos dos artigos 7º, 8º e 417º do Código do Processo Civil, aplicáveis por força da alínea e) do artº 2º do Código Procedimento e de Processo Tributário, segundo os princípios da cooperação, boa-fé, e do apuramento da verdade, tendo em conta que os pressupostos de facto e de direito em ambos os processos são similares, que igualmente no Processe de Impugnação Judicial nº 1659/08.6BEPRT, a Impugnante/Recorrente impugnou as liquidações de IVA e juros compensatório, relativamente aos anos de 2003, 2004 e 2005, nas quais similarmente haviam sido consideradas “falsas” as facturas deste mesmo fornecedor emitidas à Impugnante/Recorrida nesses anos.
Nessa impugnação então deduzida, similarmente ao que aconteceu nos presentes autos, o Digno Magistrado do Ministério Público pronunciou-se pela procedência dessa impugnação, que nesse sentido foi justamente decidida em 1ª instância.
13ª – Por sua vez, a Fazenda Pública igualmente não se conformou então com o decidido, e apresentou recurso para o TCAN.
Este Venerando Tribunal, em douto acórdão, de 27/10/2016, negou provimento a esse recurso interposto pela Fazenda Pública.
Em extenso acórdão, que à data da apresentação das presentes contra-alegações, não se encontra disponível no site da IGFEJ – Instituto Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, IP – http://www.dgsi.pt/jtcn.nsf?OpenDatabase, pelo que, por economia processual, apenas se vai juntar cópia da sua página inicial e das conclusões (fls. 1 e de 81 a 86), desse acórdão (doc. 1).
Bem como transcrever as suas conclusões finais, o que se passa a fazer:
“Assim sendo, cremos que os elementos descritos no probatório, tomados no seu conjunto, são suficientes (argumentos tantas vezes utilizado para legitimar a actuação da AT no que diz respeito aos indícios apresentados), tal como se decidiu, para evidenciar a materialidade das operações subjacentes às facturas descritas nos autos, na medida em que, lendo e relendo a matéria de facto apurada nos autos, tem de entender-se que existe, em termos globais, matéria capaz de viabilizar a pretensão da Recorrida em função da prova documental valorada e da credibilidade conferida à prova testemunhal (nos termos da motivação descrita), o que significa que a matéria disponível é suficiente para a caracterização e enquadramento da actividade da ora Recorrida, nomeadamente com referência às obras em causa, situação que, no seu conjunto, e de forma consistente, permite a leitura das facturas correspondentes.
Deste modo, é ponto assente que a Recorrida logrou provar que adquiriu os serviços que constam das facturas e que os mesmos lhes foram prestados pelos emitentes das mesmas, o que significa que, tendo feito tal prova, a impugnação teria, como sucedeu, de procede neste âmbito e, assim, bem andou a sentença recorrida ao atender a pretensão da Recorrida nesta matéria.
Termos em que a Recorrida confia que a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, será mantida pelo Tribunal Central Administrativo do Norte – Secção de Contencioso Tributário, nos precisos termos em que foi proferida.
Como sempre, farão V.(s) Ex.ª(s), inteira e objectiva JUSTIÇA!»

1.3. O Ministério Público junto deste Tribunal pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso, emitindo parecer com o seguinte teor:

«O Magistrado do Mº Pº junto deste Tribunal Central Administrativo Norte, solicitado a emitir parecer sobre o mérito do presente recurso jurisdicional, vem fazê-lo nos termos seguintes:
A Fazenda Pública veio recorrer da sentença do TAF do Porto constante de fls. 178 a 185, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação adicional de IVA e respectivos juros compensatórios, relativa ao quarto trimestre do ano de 2002, no montante global de € 7.179,41.
Em síntese, mostra-se submetida a Tribunal:
A reapreciação das questões que a recorrente fez constar da sua Alegação, concretamente das respectivas CONCLUSÕES (fls. 193 a 201 v. º), pois são estas que definem o objecto e delimitam o âmbito do recurso, sem embargo das questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontram nos autos os elementos necessários à sua consideração (art.º s 608, n.º 2, 639. º e 640, todos do CPC, ex- vi art.º 2.º e) do CPPT).
A Fazenda Pública, em síntese, pugna pela revogação da sentença recorrida invocando erro de julgamento no tocante à apreciação da matéria de facto, com violação das regras de repartição do ónus da prova e a sua valoração – art. ºs 74.º da LGT e 19.º, n.º 3, do CIVA, ao considerar demonstrada a realização das operações tituladas por factura falsa, apoiando-se na prova testemunhal.
Apesar de as testemunhas afirmarem que era feita a contabilização das horas de trabalho por cada trabalhador, a verdade é que ao longo da inspecção não foram juntos elementos documentais que demonstrassem a tese da impugnante nem as dadas como provadas prestações de serviços facturados.
Atenta a legalidade e suficiência da fundamentação constantes do Relatório da Inspeção Tributária efectuada pela AT para a operada liquidação adicional de IVA e respectivos juros compensatórios, ora impugnadas, deveria o Tribunal ter decidido no sentido da total improcedência do pedido formulado pela Impugnante.
É nosso entendimento que à recorrente não assiste razão.
Na verdade, nenhum dos documentos ou qualquer dos restantes elementos de prova reunidos pelos serviços de fiscalização tributária constitui prova plena dos factos que pretende sejam dados como provados justificativos das correcções operadas conducentes a liquidação adicional do IVA do quarto trimestre do ano de 2002 e respectivos juros compensatórios.
Nos termos do disposto pelo art.º 74.º, n.º 1, da LGT,
“O ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque.”
Ao contrário do que afirma a recorrente, os depoimentos de M. – contabilista, J. – electricista e J. – electricista, ainda que só no “papel”, funcionários da F. e realizando trabalhos para a impugnante, conforme confessaram em sede de inquirição de testemunhas, foram aptos a abalar os elementos recolhidos em sede inspectiva.
A livre apreciação de todos os elementos de prova apresentados pela AT e pela impugnante que documentou com facturas as operações tributadas e arrolou as testemunhas supra referidas, ainda que com funções estreitamente ligadas, não pode inquinar a credibilidade dos depoimentos no expresso convencimento do Tribunal de que as operações tributadas tiveram, efectivamente, lugar.
Os indícios reunidos pela AT foram abalados face ao tipo de serviços/obras de construção civil facturados à Impugnante e os que esta, por sua vez, facturou à cliente R., em cujas instalações foram efectuados.
O que a sentença recorrida fixou nos factos dados como provados:
“14. Na factura n.º 079 consta: 25/11/2002, trabalho de construção civil, pladur e tectos falsos e aplicação de tijoleira nas vossas obras na radio popular – fls. 26, do PA;“
O legislador não estatui a necessidade de qualquer certeza para conduzir à decidida anulação, pois, tal com dispõe o art.º 100.º, n.º 1, do CPPT:
“Sempre que da prova produzida resulte fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário, deverá o acto impugnado ser anulado.”
Soçobra, pelo exposto, o invocado erro de julgamento quanto à valoração dos factos em que se o Tribunal se baseou para decidir da forma como decidiu, vingando o princípio da livre apreciação da prova.
Nos termos do art.º 607.º, n.ºs 4 e 5, do C.P. Civil:
“4. (....) compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas por lei ou por regras de experiência.
5. O juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto ...“
“Resulta daquele princípio que ao tribunal de recurso apenas é permitida a modificação da matéria de facto fixada no tribunal a quo se ocorrer erro manifesto ou grosseiro na sua apreciação, ou se os elementos documentais fornecerem uma resposta inequívoca em sentido diferente.” Ac. do TCAS de 2/6/2014 no processo 01220/06 in www.dgsi.pt.
Nestes termos e pelas razões expostas, damos parecer no sentido de que o recurso não merece provimento, uma vez que a sentença fez acertada interpretação e aplicação dos dispositivos legais aplicáveis e não merece a censura que lhe faz a recorrente.»

1.4. Com dispensa dos vistos legais dos Exmos. Desembargadores Adjuntos (cfr. art. 657º, n.º 4 do Código de Processo Civil (CPC), submete-se desde já à conferência o julgamento do presente recurso.

Questões a decidir:

As questões sob recurso e que importam decidir, suscitadas e delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, são as seguintes:
Ø Se a sentença recorrida incorreu em nulidade, por falta de especificação dos fundamentos de facto, e em erro de julgamento, de facto e, subsequentemente, de direito, ao concluir pela ilegalidade da liquidação de IVA impugnada, ao considerar demonstrada a realização das operações tituladas por factura falsa, apoiando-se na prova testemunhal - artigos 74.º da LGT e 19.º, n.º 3, do CIVA.

2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. De facto
2.2. Matéria de facto dada como provada e não provada na 1ª instância e respectiva fundamentação:

«Factos provados
1. A Impugnante encontra-se colectada pela actividade de “Construção de Edifícios”, com o CAE 45211 - cfr. relatório de inspecção;
2. Com base na ordem de serviço n.º OI200601263, a Impugnante foi submetida a uma acção de inspecção, visando o IRC e o IVA do exercício de 2002 - cfr. relatório de inspecção;
3. Que teve início em 13/09/2006 e conclusão em 05/02/2007 - cfr. relatório de inspecção;
4. Foi elaborado o Projecto de Relatório de Acção Inspectiva, que foi notificado à Impugnante em 05/02/2007 – fls. 17, do PA e 52 e ss., dos autos;
5. A Impugnante exerceu o direito de audição prévia conforme fls. 19 a 41, do PA;
6. Em 19/02/2007 foi elaborado o Relatório de inspecção, de fls. 46 a 57, do PA, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
7. No referido relatório consta que a factura n.º 79, no valor de €32.400,00 mais IVA no montante de €6.156,00 foi indevidamente deduzido por este, com a consequente entrega nos cofres do Estado de um valor de imposto inferior ao devido no montante de €6.156,00, tendo sido proposta a correcção deste valor – fls. 52, do PA;
8. Foram assim emitidas as liquidações adicionais n.º 07061405 e 07061406, nos montantes de €6.156,00 e €1.023,41 – fls. 28 e 29;
9. Foi instaurado contra a ora Impugnante o processo de execução fiscal n.º 1910200701058118 – fls. 63, do PA;
10. A Impugnante não tem trabalhadores contratados no seu quadro de pessoal, recorrendo à subcontratação para a execução de obras adjudicadas – relatório de inspecção e prova testemunhal;
11. A Impugnante apresentou no exercício de 2002 aquisições de serviço à empresa “A., Lda.” - relatório de inspecção;
12. A “A., Lda., foi sujeita a inspecção tendo-se apurado: tratar-se de contribuinte não declarativo; que não apresentou escrita; não consta como contribuinte da SS.; da consulta às contas bancárias não resultam movimentos que justificassem os valores dos recebimentos ou pagamentos dos custos suportados; tendo a sócia gerente declarado que relativamente à impugnante efectuou serviços esporádicos não tendo preenchido as facturas emitidas – relatório de inspecção;
13. Do relatório de inspecção consta relativamente à Impugnante o seguinte: que a factura n.º 079 não identifica o local das obras executadas; que não existem orçamentos nem contractos; o pagamento da factura terá sido efectuado por cheque da conta do sócio não existindo cópia do cheque nem foi identificado o cheque ou a conta bancária; não existe documento de suporte do movimento contabilístico da conta corrente de empréstimos sócios; não existe um controlo rigoroso das contas bancárias da empresa; não foram identificados os funcionários que estiveram a trabalhar nas obras; não foi identificado qualquer funcionário da “A.” sendo que esta emitiu facturas nos anos de 2002, 2003, 2004 e 2005 no valor de €348.052,39 – relatório de inspecção;
14. Na factura n.º 079 consta: 25/11/2002, trabalho de construção civil, pladur e tectos falsos e aplicação de tijoleira nas vossas obras na radio popular – fls. 26, do PA;
15. Esta foi a única factura emitida por “A.” em 2002;
16. Posteriormente J. (sócio da A., Lda.) deslocava-se com regularidade ao escritório da Impugnante para apresentar facturas e levantar pagamentos;
17. A Impugnante recorria à subcontratação de pessoal para executar as suas obras;
18. As empresas subcontratadas pela Impugnante utilizavam nas obras as suas próprias máquinas e ferramentas de construção civil;
19. A Impugnante emitiu à Radio popular as facturas seguintes:
a) Factura n.º 37, de 16/04/2002, trabalhos de construção civil na Loja (...), no valor de €16.485,52 – fls. 69;
b) Factura n.º 39, de 19/04/2002, trabalhos de construção civil na loja do N., com os valores de €9.939,00 e €5.315,00 - fls. 70 e 71;
c) Factura n.º 40, de 19/04/2002, trabalhos de construção civil na Loja (...), no valor de €1.165.00 e €1.705,00 – fls. 72 e 73;
d) Factura n.º 41, de 19/04/2002, trabalhos de construção civil na loja do N., no valor de €39.969,28 – fls. 74 a 77;
e) Factura n.º 42, de 11/11/2002, empreitada de construção civil na Loja (...), no valor de €38.718,90,
20. Em 12/08/2002 a Impugnante remeteu fax dirigida à Radio Popular do qual consta a proposta de efectuar a empreitada em assunto (Loja (...)) pelo valor de €38.718,90 – fls. 79 e ss.
*
Factos não provados:
Não há factos que cumpra julgar não provados com interesse para a decisão da causa, de acordo com as várias soluções plausíveis de direito.
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Motivação:
A convicção do Tribunal baseou-se na prova documental oferecida pelas partes, nos termos expressamente referidos no final de cada facto, e nos depoimentos prestados pelas testemunhas M., H.; J.; e J..
Relativamente à actividade exercida pela Impugnante e ao procedimento de acção inspectiva, o tribunal baseou-se nos documentos juntos aos autos e PA, com particular enfoque no teor do Projecto de Relatório de Acção Inspectiva, da exposição apresentada pela Impugnante em sede de direito de audição prévia e, sobretudo, do Relatório de Acção Inspectiva, do qual constam os fundamentos veiculados pela Inspecção Tributária para as liquidações adicionais ora impugnadas.
As testemunhas quer funcionários da Impugnante, quer da F., cujos sócios gerentes são os mesmos da Impugnante, revelaram um conhecimento sólido do funcionamento da actividade da Impugnante, em virtude da identidade de sócios e de gerente entre ambas as sociedades.
Estas testemunhas declararam que a Impugnante não tinha empregados e que subcontratava a outras empresas a maior parte dos trabalhos de construção civil que lhe eram adjudicados.
No que concerne aos serviços prestados pela Impugnante à R., S.A. o Tribunal formou a sua convicção com base nos depoimentos das testemunhas conjugados com a análise do Relatório de Inspecção e ainda das facturas e orçamentos juntos pela Impugnante a fls. 69 a 83, dos autos.
Com efeito, J. e J. relataram ao Tribunal, de forma clara e precisa, as diferentes obras adjudicadas pela R., S.A. à Impugnante e nas quais exerceram funções de coordenação enquanto encarregados da F., que também prestou serviços nessas obras na parte da electricidade. A testemunha M., que à data dos factos era empregada de escritório da F. e também tratava da contabilidade da Impugnante, referiu com segurança que esta última recebia os pagamentos dos clientes, nomeadamente da R., S.A., apenas quando as obras adjudicadas se encontravam finalizadas.
Os depoimentos das testemunhas revelaram-se objectivos, claros e coerentes, tendo sido valorados como credíveis.
A testemunha J. referiu que a Impugnante, sempre que lhe eram adjudicadas obras, tinha de recorrer a outras empresas para a sua execução, porque não tinha trabalhadores para tal. Esclareceu que participou, como encarregado da parte eléctrica, na execução de várias obras da R. e afirmou que viu algumas vezes J. nas obras em que esteve presente e que contactava muitas vezes com os trabalhadores ligados às empresas de J. que também estavam nas obras. Mais explicou que era o escritório que o informava da deslocação às obras dos trabalhadores das empresas subcontratadas pela Impugnante e que, com base nessa informação, preenchia as folhas de pessoal com os nomes dos trabalhadores envolvidos nas obras.
A testemunha J., que trabalhava igualmente na F. como electricista à data dos factos, corroborou grande parte do depoimento de J., tendo participado igualmente em diversas obras da R., enquanto encarregado da parte eléctrica e que viu várias vezes J. e os respectivos trabalhadores nas obras em que esteve presente, tendo preenchido folhas com os nomes dos trabalhadores e empresas subcontratadas que enviava para o escritório.»

2.2. De direito

A Recorrente (FP) insurge-se contra a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou procedente a impugnação judicial apresentada pela ora Recorrida contra as liquidações adicionais de IVA e juros compensatórios, do quatro trimestre de 2002, considerando, no que aqui importa, que, atenta a factualidade carreada para os autos, a Z., Ld.ª (Recorrida) não logrou provar a realização da operação subjacente a emissão da factura emitida àquela pela sociedade A., Ld.ª.
Inconformada, alega a Recorrente, em síntese, que a sentença incorreu erro de valoração da prova carreada para os autos, nomeadamente na ponderação dos documentos juntos ao Relatório de inspecção e na valoração de credibilidade no depoimento das testemunhas do Impugnante, pelo que padece a mesma de erro de julgamento, de facto e de direito, na apreciação e valoração da factualidade que serviu de suporte à decisão de considerar não verificados os pressupostos que legitimaram a actuação da Administração.

Contudo, antes de entrarmos na apreciação da questão a tratar, importa referir que a acção de inspecção realizada pelos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças do Porto foram ainda efectuadas correcções aritméticas à matéria coletável da qual resultaram liquidações de IRC, por AT não ter aceite como custo de exercício uma factura contabilizada pela recorrida, que tinha sido emitida pela “A., Ld.ª por não titular operações reais, factura essa determinante da liquidação adicional de IVA e juros compensatórios impugnados nos presentes autos.

Ora, no que respeita às mencionadas liquidações adicionais de IRC e juros compensatórios, suportadas no mesmo procedimento e relatório final de inspecção, a Impugnante, ora Recorrida, apresentou a competente impugnação judicial, relativamente à qual já se pronunciou este Tribunal Central Administrativo Norte, por Acórdão de 05 de Novembro de 2020, proferido no Processo nº 1446/07.9BEPRT, sem publicação, que negou provimento ao recurso interposto da sentença proferida naqueles autos, de teor absolutamente idêntico à sentença aqui recorrida - no que respeita à factualidade considerada provada e sua motivação, assente na mesma diligência de produção de prova testemunhal, divergindo, apenas, no imposto em causa - desatendendo a pretensão recursiva da Fazenda Pública, assente em alegações de recurso similares às apresentadas nos presentes autos, nas quais as questões enunciadas são rigorosamente as mesmas: o alegado erro de julgamento, de facto e de direito, na apreciação e valoração da factualidade que serviu de suporte à decisão, concretizando aqui e ali, alega que o Tribunal a quo não especificou suficientemente os factos que considera provados e não provados e que motivaram as razões da decisão, uma vez que não especificou as razões pelas quais desconsiderou os factos constantes do Relatório de Inspecção, nem especificou as razões pelas quais valorou a prova testemunhal em detrimento da prova testemunhal e documental recolhida em sede de procedimento inspectivo, no sentido de aquela, em termos que a lei permita, poder destruir esta [cfr. conclusão X ].

Atendendo ao exposto, a apreciação levada a efeito naquele processo apresenta-se como sendo inteiramente válida e transponível para os presentes autos, por se tratar de casos rigorosamente idênticos, pelo que, considerando o comando constante do nº 3 do artigo 8º do Código Civil - que impõe ao julgador o dever de considerar todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito - acolhemos o decidido naquele Acórdão, aderindo integralmente ao seu discurso fundamentador, aqui aplicável, com as necessárias adaptações, ou seja, onde ali, por exemplo, se refere liquidação de IRC, deve aqui entender-se como se reportando a liquidação de IVA.

Desta forma, ponderou-se no referido Acórdão nos seguintes termos: (inicio de transcrição)

«A Recorrente Fazenda Pública insurge-se contra a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou procedente a impugnação judicial deduzida pela ora Recorrida da liquidação adicional de IRC que resultou de correcção à matéria tributável declarada relativamente ao exercício de 2002, emitida na sequência de uma acção de inspecção na qual a Administração Tributária concluiu ter sido relevado indevidamente na contabilidade um custo contido em factura emitida pela sociedade «A. Lda», por ter entendido que esta factura não correspondia a uma efectiva prestação de serviços, entendimento que a sentença recorrida, no entanto, não sancionou.

Na sentença recorrida, considerou o Tribunal a quo, no essencial, que a Administração Tributária cumpriu o ónus de demonstrar a pertinência do seu juízo, mediante a enunciação dos indícios objectivos e credíveis que, conjugados uns com os outros e apreciados à luz das regras da experiência, lhe permitiram concluir que estava perante uma “factura falsa”, e que a Impugnante, por seu lado, logrou demonstrar que as operações tituladas pela factura em causa foram efectivamente realizadas, não obstante aqueles indícios recolhidos em sentido contrário.

A Recorrente não se conforma com o decidido nesta parte, vindo alegar, além do mais [cfr. conclusão U.], que o Tribunal a quo não especificou suficientemente os factos que considera provados e não provados e que motivaram as razões da decisão, uma vez que não especificou as razões pelas quais desconsiderou os factos constantes do Relatório de Inspecção, nem especificou as razões pelas quais valorou a prova testemunhal em detrimento da prova testemunhal e documental recolhida em sede de procedimento inspectivo, no sentido de aquela, em termos que a lei permita, poder destruir esta.

A este Tribunal cumpre, assim, desde logo, a tarefa de indagar da nulidade da sentença, por vício de falta de fundamentação de facto.
Vejamos.
De acordo com o disposto no artigo 205º da Constituição da República Portuguesa (CRP), as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei.

Nos termos dos artigos 125º, nº 1 do CPPT e 615º, nº 1, alínea b) do CPC, ocorre a nulidade da sentença quando não sejam especificados os fundamentos de facto e de direito da decisão.
A nulidade - por falta de especificação dos fundamentos de facto - abrange tanto a falta de discriminação dos factos provados e não provados, exigida pelo artigo 123º, nº 2 do CPPT, como a falta do exame crítico das provas previsto no artigo 607º, nº 4 do CPC - neste sentido, vd. Jorge Lopes de Sousa, “Código de Procedimento e Processo Tributário - anotado e comentado”, volume II, 6ª edição, Áreas Editora, 2011, p. 358.
Com efeito, decorre do disposto nos citados normativos que o juiz tem o dever de declarar quais os factos que o tribunal julga provados e não provados, fundamentando a decisão sobre a matéria de facto, devendo especificar os fundamentos que foram decisivos para a sua convicção, analisando criticamente as provas.
Exige-se assim, por um lado, a análise crítica dos meios de prova produzidos e, por outro, a especificação dos fundamentos que foram decisivos para a convicção do juiz, expressa na resposta positiva ou negativa dada à matéria de facto controvertida.

O exame crítico da prova deve consistir na indicação dos elementos de prova que foram utilizados para formar a convicção do juiz e na sua apreciação crítica, de forma a ser possível conhecer as razões por que se decidiu no sentido decidido e não noutro. Ou seja, a fundamentação de facto não se deve limitar à mera indicação dos meios de prova em que assentou o juízo probatório sobre cada facto, devendo revelar o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo juiz ao decidir como decidiu sobre os pontos da matéria de facto – cfr. Autor e ob. cit., p. 321.
O julgador não se deve limitar, pois, a uma simples e genérica indicação dos meios de prova produzidos, impondo-se-lhe que analise criticamente a prova produzida.

Todavia, a falta de fundamentação susceptível de integrar a nulidade prevista na alínea b) do nº 1 do artigo 615º do CPC é apenas a que se reporta à falta absoluta de fundamentos (quer referentes aos factos, quer ao direito), que não a uma fundamentação escassa ou deficiente [cfr. Antunes Varela e outros, “Manual de Processo Civil”, 2ª edição, Coimbra, p. 687, e Fernando Amâncio Ferreira, “Manual dos Recursos em Processo Civil”, 6ª edição, p. 55].

Tal como refere Alberto dos Reis, in “Código de Processo Civil Anotado”, volume V, p. 140, “há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto.”

Porém, como salienta Jorge Lopes de Sousa, in obra citada, volume II, p. 360, “deverão considerar-se como falta absoluta de fundamentação os casos em que ela não tenha relação perceptível com o julgado ou seja ininteligível, situações em que se está perante uma mera aparência de fundamentação.
Com efeito, a fundamentação destina-se a esclarecer as partes, primacialmente a que tiver ficado vencida, sobre os motivos da decisão, não só para ficar convencida de que não tem razão, mas também porque o conhecimento daqueles é necessário ou, pelo menos, conveniente para poder impugnar eficazmente a decisão em recurso ou arguir nulidades, designadamente a derivada de eventual contradição entre os fundamentos e a decisão.
Por isso, quando a fundamentação não for minimamente elucidativa das razões que levaram a decidir como se decidiu deverá entender-se que se está perante uma nulidade por falta de fundamentação”.

Concluindo-se, assim, que o vício em apreço, em qualquer das vertentes apontadas, apenas ocorre quando haja ausência absoluta de fundamentação, constata-se, porém, de regresso ao caso dos autos, que tal vício não se detecta na sentença posta em crise, na qual foi, efectivamente, analisada a prova produzida, tendo-se consignado, em concreto, que “O acervo de factos provados baseou-se no exame do teor dos documentos constantes dos autos e do P.A., que não foram impugnados e nos depoimentos prestados pelas testemunhas, conforme referido, em concreto, em cada uma das alíneas do probatório.

No que concerne à prova testemunhal, M., H., J. e J., prestaram depoimentos que se revelaram objectivos, claros e coerentes, tendo sido valorados como credíveis.

As testemunhas, embora na qualidade de funcionários da Impugnante, quer da sociedade “F. , Lda” (em diante “F.”), cujos sócios gerentes são os mesmos da Impugnante, revelaram um conhecimento sólido do funcionamento da actividade da Impugnante, em virtude da identidade de sócios e de gerente entre ambas as sociedades.
H., J. e J. afirmaram que a Impugnante não tinha empregados e que subcontratava a outras empresas a maior parte dos trabalhos de construção civil que lhe eram adjudicados.
Mais relataram ao Tribunal, de forma clara e precisa, as diferentes obras adjudicadas pela “R.” à Impugnante e nas quais exerceram funções de coordenação enquanto encarregados da sociedade “F.”, sociedade que prestou serviços de electricidade nessas obras.
A testemunha J. referiu ainda que eram as empresas subcontratadas que normalmente levavam para as obras, além de pessoal, maquinaria de construção civil, de pequena dimensão.
Esclareceu que participou, como encarregado da parte eléctrica, na execução de várias obras da “R.” e afirmou que viu algumas vezes J., nas obras em que esteve presente e que contactava muitas vezes com os trabalhadores ligados às empresas de J. que também estavam nas obras. Mais explicou que era o escritório que o informava da deslocação às obras dos trabalhadores das empresas subcontratadas pela Impugnante e que, com base nessa informação, preenchia as folhas de pessoal com os nomes dos trabalhadores envolvidos nas obras.
A testemunha J., que à data dos factos trabalhava na “F.” como electricista corroborou grande parte do depoimento de J., tendo participado igualmente em diversas obras na “R.”, enquanto encarregado da parte eléctrica, afirmando que viu várias vezes J. e os respectivos trabalhadores nas obras em que esteve presente, tendo preenchido folhas com os nomes dos trabalhadores e empresas subcontratadas que enviava para o escritório.
A testemunha M. que, à data dos factos, era empregada de escritório da “F.” e também tratava da contabilidade da Impugnante, referiu que esta recebia os pagamentos dos clientes, nomeadamente da “R.”, apenas quando as obras adjudicadas se encontravam finalizadas.
Mais referiu que J., se deslocava ao escritório da Impugnante para apresentar facturas e pedir dinheiro e que se recorda com clareza das suas visitas, porquanto a sua aparência era marcante.”

Assim sendo, e considerando os termos da decisão recorrida, resulta claro que a invocada nulidade não pode ser atendida na medida em que o Tribunal a quo consignou no probatório a factualidade que entendeu necessária à decisão das questões suscitadas nos autos, a qual teve por base os documentos e os depoimentos das testemunhas supra enunciados, tendo sido especificadas as razões da valoração da prova produzida, deste modo exteriorizando os fundamentos da decisão sobre a matéria de facto.
Saber se essa factualidade é, ou não, suficiente para suportar a decisão proferida já se prende - tal como, de resto, a Recorrente alegou em termos essenciais - com um eventual erro de julgamento quanto à matéria de facto, e não com a nulidade da sentença.

Improcede, por isso, a arguida nulidade.

Prosseguindo.
Nas suas conclusões de recurso, a Recorrente defende, ainda, que a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento no tocante à apreciação que fez da matéria de facto, em síntese, ao considerar demonstrada a realização das operações tituladas por factura falsa com base na exígua e inócua prova documental e, essencialmente, por ter dado absoluta credibilidade à prova testemunhal trazida pela Impugnante.

Entende a Recorrente que não se justifica o valor probatório atribuído aos depoimentos das testemunhas apresentadas pela Impugnante, os quais não permitem estabelecer relação entre os serviços prestados e o custo documentado, nem em termos de quantificação, nem em sede temporal, e atentos os laços de subordinação jurídica e a multiplicidade de aspectos relacionados com a relação laboral que liga um qualquer trabalhador e a sua entidade patronal, pelo que os mesmos não podiam ter sido valorados da forma que o foram, permitindo-se destruir todos os indícios sólidos e elementos probatórios apurados no procedimento inspectivo e constante do RIT.

Vejamos.
Dispõe o nº 1 do artigo 627º do CPC que “as decisões judiciais podem ser impugnadas por meio de recursos”, ou seja, o recurso é o meio processual que se destina a impugnar as decisões judiciais, e nessa medida, o tribunal superior é chamado a reexaminar a decisão proferida e os seus fundamentos.

A alteração da matéria de facto - ou errada apreciação e valoração da prova, como a Recorrente reclama - pressupõe o erro no seu julgamento. O que ocorre quando se conclua, da confrontação entre os meios de prova produzidos e os factos dados por provados ou não provados, que o juízo feito está em desconformidade com a prova produzida, independentemente da convicção pessoal do juiz acerca de cada facto.

Com efeito, ao consagrar o princípio da livre apreciação da prova a lei elege como princípio norteador que o julgador não se encontra sujeito às regras rígidas da prova tarifada - cfr. artigo 607º, nº 5 do CPC.
Isso não quer dizer, evidentemente, que a actividade de valoração da prova seja arbitrária, mas antes vinculada à busca da verdade e limitada pelas regras da experiência comum e pelas restrições legais.
No entanto, tal princípio concede ao julgador uma margem de discricionariedade na formação do seu juízo de valoração, que terá - e deverá - encontrar fundamento na fundamentação lógica e racional, e por isso, escrutinável pelas partes e pelo tribunal «ad quem».

Segundo o princípio da livre apreciação da prova (ou da liberdade de julgamento ou da livre convicção do julgador), o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas (cfr. o citado artigo 607º, nº 5 do CPC).
Somente nos casos de prova legal, formal ou vinculada, ou seja, os casos em que a própria lei confere força probatória a determinados meios de prova (v.g., a força probatória plena dos documentos autênticos - cfr. artigo 371º do Código Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.
Como é natural, a tarefa de apreciação da prova, vinculada ao princípio da descoberta da verdade material, configura-se de diferente graduação e intensidade entre a 1.ª instância e o tribunal de recurso, dado o benefício que aquela dispõe da imediação e da oralidade e por estar, este, limitado à prova documental e ao registo de declarações e depoimentos. Enquanto o tribunal a quo aprecia a prova em ambiente de «imediação», o tribunal ad quem fá-lo em contexto «mediato».
Por isso se entende que o princípio da livre apreciação da prova e o princípio da imediação de algum modo limitam o reexame da matéria de facto fixada no tribunal a quo, pelo que o controle do Tribunal de recurso sobre a convicção alcançada pelo tribunal de 1ª instância deve restringir-se aos casos de erro manifesto ou grosseiro ou se os elementos documentais apontarem inequivocamente em sentido diverso (neste sentido, cfr., entre outros, o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 30 de Outubro de 2014, proferido no Processo nº 00390/05.9BEBRG, e o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 30 de Setembro de 2019, proferido no Processo nº 29/09.3BEALM, ambos integralmente disponíveis em www.dgsi.pt).

Tal erro deve ser demonstrado pelo recorrente através do exercício de um duplo ónus: delimitar o âmbito do recurso indicando claramente os segmentos da decisão que considera padecerem de erro e fundamentar as razões da sua discordância, especificando e apreciando criticamente os meios probatórios constantes do processo que, no seu entender, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da adoptada pela decisão recorrida.

O erro deve ser evidenciado pela Recorrente, no caso da prova testemunhal, através da indicação exacta das passagens da gravação relevantes, rejeitando-se a admissibilidade de recursos genéricos contra a errada decisão da matéria de facto, mas apenas de concretas questões de facto controvertidas, com indicação, no seu entender, de qual a decisão alternativa deve ser proferida pelo tribunal de recurso, em sede de reapreciação dos meios de prova – cfr. artigo 640º, nºs 1 e 2 do CPC.

Como tal, não basta ao recorrente manifestar de forma não concretizada a sua discordância com a decisão da matéria de facto efectuada pelo Tribunal a quo, impondo-se-lhe um ónus de alegação rigoroso, que não se confunde com a mera manifestação de inconformismo com tal decisão, e cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, quanto ao fundamento em causa (cfr. António Santos Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2014, 2.ª edição, Almedina, pp. 134-135.)

Em face do que se vem de expor, no caso vertente, almejando a ora Recorrente colocar em causa a decisão sobre a matéria de facto, impunha-se que, se dela discordava e pretendia impugná-la, tivesse indicado os concretos pontos da matéria de facto que considerava incorrectamente julgados, e os meios probatórios constantes do processo ou do registo ou gravação realizada, que impunham uma decisão diversa daquela que consta da sentença, em observância do disposto no citado artigo 640º, nºs 1 e 2 do CPC, o que não fez.

Com efeito, não obstante alegar ter ocorrido errada apreciação e valoração da prova, a Recorrente não identifica os erros concretos de que padece a sentença nesse âmbito, não dizendo o que, concretamente, de errado se fez na apreciação da prova, de molde a que este tribunal avalie do acerto ou não do julgamento de facto, posto que, também não se detecta erro grosseiro ou de tal modo flagrante que dispensaria por parte da Recorrente a sua identificação.

No que, em concreto, respeita à prova testemunhal, a Recorrente coloca em crise, de forma geral, os depoimentos prestados em função da relação laboral das testemunhas com a Impugnante, nomeadamente, na ausência de outros elementos probatórios, defendendo que a sua valoração não poderia ter sido feita nos termos em que o foi, mas sem que tivesse procedido a uma identificação clara de cada uma das questões em concreto, não podendo atender-se a uma análise global nos termos propostos.

No entanto, questionando a Recorrente a isenção, imparcialidade e credibilidade dos depoimentos prestados, atentos os laços de subordinação jurídica que ligam as testemunhas, como qualquer trabalhador, à sua entidade patronal, sempre se dirá que tal circunstancialismo, per se, não descredibiliza os depoimentos prestados.

Com efeito, sendo indisputado que a relação das testemunhas com as partes é um elemento a ter em consideração na valoração da prova, podendo consubstanciar motivo justificado para se dar mais ou menos relevo ao depoimento prestado (como, por exemplo, quando a testemunha hesite, caia em contradições ou manifeste qualquer sinal exterior discursivo ou comportamental que revele que o relacionamento existente com alguma, ou ambas das partes, está a influenciar ou condicionar, de algum modo, o seu depoimento), não se pode, no entanto, pretender que se desconsidere um depoimento sempre que uma testemunha tenha um relacionamento com uma das partes, pois essa situação não constitui nem incapacidade, nem impedimento para depor, inabilidades previstas na lei processual civil (cfr. artigos 495º e 496º do CPC), pelo que, como tal, o seu depoimento é livremente apreciado pelo juiz.

Deste modo, cabe ao juiz a quo aferir da credibilidade da testemunha, não cabendo ao tribunal de recurso, por respeito ao princípio da imediação, desqualificar o valor do depoimento da testemunha com o fundamento de que aquela tem um vínculo laboral com a Impugnante.

No caso vertente, o que a Recorrente, efectivamente, pretende é, não impugnar a factualidade dada como provada na sentença, mas sim contestar as ilações que o Tribunal a quo retirou dessa mesma factualidade quanto à prova da materialidade das operações tituladas pela factura questionada pela Administração Tributária.

Ora, tal constitui matéria que será analisada seguidamente, a propósito do alegado erro de julgamento por errónea subsunção jurídica dos factos dados como provados, os quais se mostram, assim, estabilizados.

Neste âmbito, alega a Recorrente que a sentença incorreu em erro de julgamento porquanto a prova produzida nos autos não permite concluir, como sucedeu, que à factura emitida pelo fornecedor correspondem os efectivos serviços nela descritos, pelo que é insusceptível de satisfazer o ónus que impendia sobre a Impugnante, tendo sido violado o disposto nos artigos 74º da LGT e 23º do Código do IRC.

Constitui, portanto, esta a questão ora a apreciar.
Vejamos, começando por referir que, nesta matéria, vem a jurisprudência realçando, reiterada e uniformemente, que o ónus da prova se reparte, em processo onde o contribuinte impugne a actuação da Administração Tributária, desconsiderando operações consubstanciadas em determinadas facturas existentes na escrita daquele, no sentido de caber a esta (AT) a prova dos pressupostos da sua actuação e àquele (contribuinte) a prova de que as questionadas operações tiveram, efectivamente, lugar. Ou seja, obtendo a Administração Tributária indícios sérios e credíveis de que determinada operação comercial titulada por uma factura não é real, cabe ao contribuinte o ónus da prova da veracidade dessa transacção (cfr., entre outros, o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 24 de Janeiro de 2008, proferido no Processo nº 02887/04, integralmente disponível em www.dgsi.pt).

Sublinhe-se que, ainda de acordo com a jurisprudência, quando está em causa a correcção de liquidações de IRC por desconsideração dos custos documentados por facturas reputadas de falsas pela Administração Tributária, e porque a liquidação de IRC tem por fundamento o não reconhecimento de custos declarados pelo sujeito passivo, competindo à Administração Tributária fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, não é, no entanto, necessário que a Administração Tributária prove os pressupostos da simulação previstos no artigo 240º do Código Civil (a existência de divergência entre a declaração e a vontade negocial das partes por força de acordo entre o declarante e o declaratário, no intuito de enganar terceiros), sendo bastante a prova de elementos indiciários que levem a concluir nesse sentido, isto é, de indícios, sérios e objectivos, que traduzam uma probabilidade elevada de que as facturas postas em crise, que suportam os custos desconsiderados, não titulam operações reais (veja-se, por todos, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 27 de Outubro de 2004, proferido no Processo nº 810/04, integralmente disponível em www.dgsi.pt).
Com efeito, não sendo imperioso que a Administração Tributária efectue uma prova directa da simulação, haverá que recorrer à prova indirecta, a “factos indiciantes, dos quais se procurará extrair, com o auxílio das regras de experiência comum, da ciência ou da técnica, uma ilação quanto aos factos indiciados. A conclusão ou prova não se obtém directamente, mas indirectamente, através de um juízo de relacionação normal entre o indício e o tema de prova” - cfr. Alberto Xavier, Conceito e Natureza do Acto Tributário, pág. 154. Tal significa que a Administração Tributária não precisa de demonstrar a falsidade das facturas, bastando-lhe evidenciar a consistência daquele juízo, invocando factos que traduzem uma probabilidade elevada de as operações referidas nas facturas serem simuladas, capaz de abalar a presunção legal de veracidade das declarações dos contribuintes e dos dados constantes da sua contabilidade – cfr. artigo 75º da Lei Geral Tributária.
Conforme João de Castro Mendes, citado por José Luís Saldanha Sanches, in “A Quantificação da Obrigação Tributária”, 2ª edição, p. 311, os indícios são definidos como sendo aqueles factos que “permitem concluir pela verificação ou não verificação de outros factos, em virtude de leis naturais conhecidas pelos homens e que funcionam como máximas de experiência”.
Acresce que, nesta tarefa, poderá a Administração Tributária lançar mão de elementos obtidos com recurso à fiscalização cruzada, junto de outros contribuintes, para obter os referidos indícios, pelo que tais indicadores de falsidade das facturas não têm necessariamente que advir de elementos do próprio contribuinte fiscalizado.

Por sua vez, o contribuinte poderá invectivar contra os indícios carreados pela Administração Tributária. Ou demonstrando a sua ineptidão para o fim visado, evidenciando que, ainda que sejam verdadeiros, deles não se pode inferir a falsidade das facturas; ou demonstrando que tais indícios não são verdadeiros, mas sendo que não lhe basta criar dúvida sobre a sua veracidade, ainda que fundada, pois, neste caso, o artigo 100º, nº 1 do CPPT não tem aplicação: na verdade, o ónus consagrado neste normativo contra a Administração Tributária (de que a dúvida quanto à existência e quantificação do facto tributário deve ser decidida contra a Administração Tributária - in dubio contra Fisco) apenas existe quando seja esta a afirmar a existência dos factos tributários e respectiva quantificação e não quando, como in casu, é ao contribuinte que compete demonstrar a existência e quantificação dos custos em que alega ter incorrido e que pretende ver reflectidos no apuramento do lucro tributável. (cfr., neste sentido, por todos, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (Pleno) de 7 de Maio de 2003, proferido no Processo nº 1026/02, integralmente disponível em www.dgsi.pt).

No presente caso, a sentença concluiu, num primeiro momento, que a Administração Tributária cumpriu o ónus de demonstrar a pertinência do seu juízo, mediante a enunciação dos indícios objectivos e credíveis que, conjugados uns com os outros e apreciados à luz das regras da experiência, lhe permitiram concluir que estava perante uma “factura falsa”, e, num segundo momento, que a Impugnante logrou demonstrar, como era seu ónus, que as operações tituladas pela factura em causa foram efectivamente realizadas, não obstante aqueles indícios recolhidos em sentido contrário.
Tal significa que, estando ultrapassada a primeira questão - na medida em que entendeu que a Administração Tributária cumpriu o ónus de demonstrar que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, cabe analisar do acerto da decisão recorrida, quando concluiu que a Impugnante logrou demonstrar a veracidade dos serviços prestados pela empresa subcontratada.

Para tanto, a sentença ponderou nos seguintes termos:
“Assim, cumprido o ónus que recai sobre a A.T., cabe agora averiguar, se a Impugnante logrou demonstrar que as operações tituladas pela factura em causa foram efectivamente realizadas, não obstante os indícios recolhidos em sentido contrário.
Da factualidade provada (alínea F)) extrai-se que a Impugnante, cuja actividade se desenvolve no ramo da construção civil, recorre habitualmente à subcontratação de empresas para execução das obras que lhe vão sendo adjudicadas, dada a inexistência de trabalhadores contratados ao seu serviço.
Ficou igualmente provado que a impetrante realizou, em 2002, diversas obras para a “R.”, tendo-lhe facturado valores pela prestação de serviços de construção civil (tais como acertos de medições, empreitadas, de pladurs, tectos falsos e divisórias, serralharia, carpintaria, colocação de pavimentos, calhas metálicas, plataformas para armazéns, coberturas para cais de carga), os quais lhe eram pagos quando as obras se encontravam finalizadas (alíneas H) a J) dos factos provados).

Mais ficou provado que a sociedade “A., Lda” facturou à Impugnante, no mesmo período, trabalhos de construção civil para as obras da “R.” e que os trabalhadores daquela empresa estiveram presentes em obras específicas da “R.” e que o seu sócio J. também foi visto nos mesmos locais onde as obras estavam a ser executadas, bem como no escritório da Impugnante (alíneas D), K), L) e M) dos factos provados).

Assim, a factualidade descrita, tomada no seu conjunto, permite concluir que a Impugnante logrou demonstrar a veracidade dos serviços prestados pela empresa subcontratada. Com efeito, os factos alegados e provados afiguram-se reveladores da materialidade das operações tituladas pela factura questionada e sustentam uma demonstração congruente da efectiva necessidade de tais serviços face às obras que a Impugnante à data desenvolvia para a sua cliente “R.”.

Por um lado, é possível imputar os serviços facturados pela emitente a obras concretas e específicas da Impugnante (que não dispunha de pessoal próprio para a sua execução), bem como é possível comprovar a “quase” identidade entre o tipo de serviços facturados à Impugnante e os que esta, por sua vez, facturou à cliente “R.” (reveladores da incorporação dos serviços prestados nas obras em referência).

Por outro lado, a presença de trabalhadores e de responsável ligado à sociedade “A., Lda”, nos locais onde as obras estavam a ser executadas, denota também que tais operações ocorreram na realidade.”

Ora, desde logo adiantamos que nos revemos no julgamento assim efectuado, acompanhando as ilações que o Tribunal a quo retirou da factualidade provada nos autos quanto à prova da materialidade das operações tituladas pela factura emitida à Impugnante, ora Recorrida, no ano de 2002, pelo fornecedor “A. Lda”, questionada pela Administração Tributária.

Com efeito, a Impugnante alegou e logrou provar, com recurso à prova documental e testemunhal, um conjunto de factos que, ponderados de forma articulada, permitem concluir pela demonstração de uma relação comercial com a empresa emitente da factura em causa, a «A. Lda», à qual a Impugnante recorreu para execução de trabalhos de construção civil nas obras que tinha adjudicadas na «R.» no ano de 2002, dada a inexistência de trabalhadores contratados ao seu serviço, estando demonstrada a presença de trabalhadores e do responsável da referida empresa naquelas obras específicas, tal como está evidenciado que os serviços facturados pela emitente da factura respeitam àquelas obras concretas da Impugnante e comprovada a “quase” identidade entre o tipo de serviços facturados à Impugnante e os por esta facturados à «R.», o que se afigura revelador da incorporação de tais serviços prestados nas obras adjudicadas à Impugnante por esta sua cliente, circunstâncias que, de resto, a Autoridade Tributária não questionou. Neste ponto, importa notar que a Autoridade Tributária não pôs em causa a realização material das obras da Impugnante, também nunca tendo referido que tais obras pudessem ter sido realizadas com recurso a outras empresas subcontratadas, que não a emitente da factura em apreço.

A prova apresentada pela ora Recorrida - documental e testemunhal -, revelou-se, assim, bastante para nos convencer da materialidade das prestações de serviços subjacentes à factura emitida pela «A. Lda» no ano de 2002, permitindo concluir, tal como na sentença recorrida, que a Recorrida cumpriu o ónus que sobre si impendia de demonstrar aquela realidade.

E o julgamento assim empreendido não contende com a doutrina que resulta da jurisprudência citada pela Recorrente nas suas alegações de recurso, a propósito da suficiência da prova testemunhal para a prova positiva dos factos tendentes à comprovação da efectividade das operações tituladas por facturas questionadas pela Administração Tributária, e à qual, no entender da Recorrente, sempre teriam de acrescer outros elementos de prova, concretamente, documentais, pois nem da referida jurisprudência resulta a inelutável impossibilidade de a demonstração da materialidade das operações ser alcançada com recurso exclusivo à prova testemunhal [antes vindo reconhecer, nesta matéria, os princípios da livre admissibilidade dos meios de prova (cfr. artigo 115º, nº 1 do CPPT) e da livre apreciação da prova (cfr. artigo 607º do CPC)], nem, no caso dos autos, tal demonstração foi alcançada apenas com recurso àquele meio de prova, tendo, antes, resultado, como se referiu supra, da apreciação conjugada dos diversos factos considerados provados tendo por base quer os documentos apresentados quer os depoimentos das testemunhas acima enunciados, elementos de prova que foram valorados nos termos da motivação da matéria de facto provada aí transcrita.

Nesta matéria, acompanha-se, assim, o decidido por este Tribunal Central Administrativo Norte nos Acórdãos de 12 de Julho de 2018 e 27 de Outubro de 2016 (Relator: Pedro Vergueiro), transitados em julgado, ainda não disponíveis na base de dados, proferidos, respectivamente, nos Processos nºs 1658/08.8BEPRT e 1659/08.6BEPRT (este trazido à colação pela Impugnante, nas suas contra-alegações), emitidos em casos análogos ao que ora nos ocupa, em que a Impugnante era a mesma e em que também estavam em causa facturas desconsideradas pela AT emitidas pela referida «A. Lda», mas nos anos de 2003 a 2005, e nos quais foram confirmadas as sentenças de procedência da impugnação, por se ter concluído que a Impugnante logrou demonstrar a veracidade dos serviços prestados pelas empresas subcontratadas, considerando, para tanto, no que concretamente respeita àquela emitente, factualidade similar à apurada nos presentes autos, a qual, no que resultou da produção da prova testemunhal, teve, inclusive, origem na inquirição das mesmas testemunhas.

Como se discorreu no primeiro dos citados Acórdãos, em apreciação das alegações de recurso da Fazenda Pública contendo argumentação globalmente coincidente com a desenvolvida nas alegações do presente recurso, e por referência à mesma jurisprudência ali invocada:
“(...) cremos que a decisão recorrida não merece censura.
Na verdade, o pertinente aresto a que alude a Recorrente aponta para uma descrição mais circunstanciada e, nessa medida, mais clara da situação em apreço, por referência aos elementos típicos da relação estabelecida entre os vários agentes envolvidos, verificando-se que, no caso presente, essa análise passa pela alusão a um conjunto de elementos que têm de ser lidos em conjunto em função do enquadramento da matéria que parte daquilo que é descrito no próprio RIT, o que inculca a ideia de que se dá por adquirida a operação e parte-se para a consideração de um conjunto de factores que, como que, credibilizam ou não a operação.
Isto para dizer que, muitas vezes, a prática que é seguida nos Tribunais de 1a Instância segue aquilo que é apontado nos presentes autos, o que podendo conhecer substancial melhoria em termos técnicos, não deixa de ter de ser ponderado por este Tribunal ad quem em função do enquadramento da situação em apreço.
Assim sendo, cremos que os elementos descritos no probatório, tomados no seu conjunto, são suficientes (argumento tantas vezes utilizado para legitimar a actuação da AT no que diz respeito aos indícios apresentados), tal como se decidiu, para evidenciar a materialidade das operações subjacentes às facturas descritas nos autos, na medida em que, lendo e relendo a matéria de facto apurada nos autos, tem de entender-se que existe, em termos globais, matéria capaz de viabilizar a pretensão da Recorrida em função da prova documental valorada e da credibilidade conferida à prova testemunhal (nos termos da motivação acima descrita), o que significa que a matéria disponível é suficiente para a caracterização e enquadramento da actividade da ora Recorrida, nomeadamente com referência às obras em causa, situação que, no seu conjunto, e de forma consistente, permite a leitura das facturas correspondentes.”

Acolhendo o assim decidido, concluímos, no caso vertente, como no citado aresto, no sentido de que a Impugnante, ora Recorrida, efectuou prova bastante da veracidade das prestações de serviços que constam da factura questionada pela Administração Tributária, o que significa que a impugnação teria, como sucedeu, de proceder neste âmbito, pelo que, a sentença recorrida, ao atender a pretensão da Recorrida nesta matéria, não errou no seu julgamento, sendo, como tal, de manter na ordem jurídica.» (fim de citação)

Acolhendo o discurso fundamentador do Acórdão que vimos de citar, o qual, em face da factualidade nele adquirida e da argumentação jurídica produzida, detém, como se referiu, perfeita adequação no caso dos autos, com pequenas nuances ao nível do discurso inerentes a julgadores distintos em 1ª instância, nenhumas outras considerações se afigura necessário acrescentar, restando, pois, concluir, face a tudo o que foi dito na análise relativa a cada uma das questões que nos foi dirigida, que a sentença não enferma da eventual nulidade que lhe foi assacada de falta de fundamentação da matéria de facto (a qual não considerar-mos-íamos dissociável do erro de julgamento de facto, como questão a ser tratada), nem errou no julgamento de facto e de direito que fez, pelo que, em consequência, é a mesma de manter na ordem jurídica.

O recurso não merece, assim, provimento, o que se decidirá seguidamente.


2.3. Conclusões

I. Os concretos pontos de facto impugnados devem ser feitos nas respectivas conclusões, porque delimitadoras do âmbito do recurso e constituírem o fundamento da alteração da decisão. Já quanto à especificação dos meios probatórios, a lei não impõe que seja feita nas conclusões, podendo sê-lo no corpo da motivação, mas em todo o caso impõe-se a obrigatoriedade de conexionar cada facto censurado com os elementos probatórios correspondentes, nomeadamente prova testemunhal.

II. A Administração Fiscal tem o ónus de provar a factualidade que a levou a desconsiderar operações consubstanciadas em determinada facturas, factualidade essa que tem de ser susceptível de abalar a presunção de veracidade que verte a escrita do contribuinte e dos respectivos documentos de suporte, só então passando a competir ao contribuinte o ónus de prova de que as operações se realizaram efectivamente.

3. DECISÃO

Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso.
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Custas pela Recorrente.
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Porto, 14 de Outubro de 2021

Irene Isabel das Neves
Ana Paula Santos
Margarida Reis