Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01250/07.4BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:04/26/2012
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Paula Fernanda Cadilhe Ribeiro
Descritores:CIMI
AVALIAÇÃO
TERRENOS PARA CONSTRUÇÃO
COEFICIENTE DE AFECTAÇÃO
Sumário:1- Apenas deve ser levado ao probatório os factos relevantes para a decisão.
2- Não devem ser levados ao probatório conceitos jurídicos.
3- O Tribunal de recurso não pode conhecer questões que não foram tratadas pelo Tribunal recorrido, com excepção daquelas que são do conhecimento oficioso.
4- A avaliação reporta-se à data da apresentação da declaração modelo 1, não sendo relevante para o efeito a data da celebração da escritura de compra e venda.
5- Nos termos do n.º 1 artigo 45.º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis o valor dos terrenos para construção corresponde ao somatório do valor de duas áreas: (1) o valor da área de implantação do edifício a construir; 2) o valor do terreno adjacente à implantação.
6- Por força do disposto no n.º 2 do artigo 45.º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis, que estabelece que o valor da área de implantação varia entre 15% e 45% do valor das edificações autorizadas ou previstas, a determinação do valor da área de implantação implica a apuramento do valor das edificações autorizadas ou previstas, o qual só pode ser efectuado através das regras da avaliação dos prédios urbanos - artigos 38.º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis – nas quais se inclui o coeficiente de afectação (artigo 41.º do mesmo diploma legal).*
* Sumário elaborado pelo Relator
Recorrente:G..., S.A.
Recorrido 1:Fazenda Pública
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
I – RELATÓRIO
G…, S.A., com sede no Edifício…, Viana do Castelo, 4900 – 000 Viana do Castelo, contribuinte fiscal n.º 5…, não se conformando com a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que julgou improcedente a impugnação deduzida contra o Valor Patrimonial Tributário (VPT) resultante da segunda avaliação efectuada a dois terrenos para construção inscritos na matriz urbana da freguesia de Lanheses sob os artigos 1194 e 1195, interpôs o presente recurso jurisdicional, formulando as seguintes conclusões:
A) Foi omitida da matéria dada como provada na sentença recorrida a existência de duas Reclamações Graciosas apresentadas pela aqui Recorrente: uma em 18.07.2007, na sequência da liquidação adicional dos Impostos de Sisa e do Selo notificada por ofício datado de 28.06.07, na sequência da segunda avaliação das parcelas de terreno dos autos, a outra, apresentada em 07.08.2007, via fax, na sequência de ter a primeira notificação sido dada sem efeito - tais documentos foram juntos aos autos pela Recorrente por requerimento de 05.01.2010.
B) A existência de tais reclamações, bem como o respectivo conteúdo deveria ter sido incluída nos factos e matéria provados, por se afigurar de toda a pertinência e relevância para a decisão, devendo ser modificada a decisão proferida por forma a incluir tal matéria na matéria provada nos termos e para os efeitos do disposto no art. 712º do C.P.C.
C) Deveria ter sido incluída na matéria dada como provada que o valor de mercado para os bens avaliados o constante da escritura: € 163,791,16 e € 7.347,29, respectivamente (ressalvado o mero lapso, ou erro de escrita, que decorre da menção na sentença do valor de € 173.791,16 quando deveria ser € 163.791,16) por não ter sido impugnada a escritura dos autos que assim faz prova plena nos termos do disposto no art. 546º do C.PC. e por tal ter sido referido por todas as testemunhas inquiridas, designadamente J, M… e A… devendo ser modificada a decisão proferida por forma a incluir tal matéria na matéria provada nos termos e para os efeitos do disposto no art. 712º do C.P.C.
D) O CIMI e consequente regime de avaliações ali previsto, exceptuada a circunstância da inscrição de prédios omissos, apenas entrou em vigor no dia 1 de Dezembro de 2003, ou seja, em momento posterior aos factos tributários que determinaram a avaliação dos prédios em causa transmitidos por escritura de compra e venda outorgada a 21.10.2003,
E) Pelo que, o regime legal aplicável às avaliações dos prédios dos autos é o que decorre da aplicação do Código da Contribuição Autárquica, que vigorou até 30 de Novembro 2003, tendo a sentença recorrida ao assim não decidir violado o princípio da irretroactividade da lei fiscal imposto pelo artigo 12.º da Lei Geral Tributária.
Sem conceder,
F) A avaliação dos prédios dos autos não reflecte as características respectivas dos imóveis no momento que releva no âmbito da avaliação e fixação do respectivo valor patrimonial tributário: os imóveis não poderiam ser considerados como urbanos aquando da sua aquisição pela Recorrente mas, sim, como prédios rústicos, a tal não obstando a declaração inserta na escritura de compra e venda de que se destinavam a construção urbana.
G) As avaliações efectuadas não expurgaram do valor dos prédios quaisquer características novas decorrentes de alterações e benfeitorias efectuadas pela Recorrente em momentos posteriores aos das aquisições tomando em consideração edificações e outros aspectos valorativos que não existiam à data da verificação do facto tributário
H) Os valores patrimoniais tributários apurados pela administração fiscal em consequência de avaliação efectuada superiores em 710% e 353%, respectivamente, ao valor de mercado efectivamente praticado e constante da escritura celebrada contrariam a expressa intenção do legislador inserta na parte final do preâmbulo ao CIMT.
I) Os imóveis foram avaliados como se de prédios urbanos já edificados se tratasse, aplicando-se uma fórmula especialmente vocacionada para prédios destinados a habitação, aplicação que se tem por ilegal mesmo que se considerassem os imóveis como terrenos para construção.
J) De acordo com o artigo 45.º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis, o valor patrimonial tributário dos terrenos para construção corresponde à soma do valor da área de implantação do edifício a construir e do valor do terreno adjacente à implantação. Contudo, foi tomado em consideração o coeficiente de afectação, desconhecendo-se em concreto o fim a que os prédios iriam estar sujeitos, utilização que, errada, injustificada e ilegal, afectou substancialmente o valor dos imóveis.
K) A avaliação efectuada enferma de graves vícios de violação de lei que impõem a sua anulação tendo a decisão recorrida feito errada aplicação e interpretação do direito violando o art. 12º da L.G.T, 32.º do Decreto-Lei n.º 287/2003, arts. 3º, 6º e 45º do CIMI, 3º e 6º do CCA e 49º, nº 3 do CIMSISSD.».
Não houve contra-alegações.

Neste Tribunal o Digno Magistrado do Ministério Público emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
Questões a decidir:
- Saber se há erro no julgamento da matéria de facto por não ter sido levado ao probatório a existência de duas Reclamações Graciosas e o valor de mercado dos terrenos;
- Saber se há erro de julgamento de direito por o tribunal recorrido: a) ter aplicado o Código do Imposto Municipal sobre Imóveis na avaliação dos terrenos; b) ter considerado na avaliação que os terrenos eram para construção; c) não ter relevado as benfeitorias realizadas no terreno após a compra pela ora recorrente; d) ter considerado legal a aplicação do coeficiente de afectação na avaliação.
II– FUNDAMENTAÇÃO
II.1. DE FACTO
O Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga deu como provada a seguinte factualidade:
1) G…, SA, é uma entidade participada pela Câmara Municipal de Viana do Castelo, pela A.E.P. - Associação Empresarial de Portugal, que tem como objecto social a construção, promoção, comercialização e gestão de Parques Empresariais do concelho de Viana do Castelo - doc. 3 junto com a p.i.
2) Em 24.11.2000, foi celebrado entre a Câmara Municipal de Viana do Castelo, a A.E.P. - Associação Empresarial de Portugal e a Associação Empresarial de Viana do Castelo, um Protocolo relativo à instalação e gestão de Parques Empresariais do concelho de Viana do Castelo, com os termos constantes de fls. 1 a 5 do doc. 4 junto com a p.i., que aqui se consideram por integralmente reproduzidas, dele constando, no que mais releva:
(...)
“CLÁUSULA PRIMEIRA
Objecto
O presente protocolo tem por objecto estabelecer os termos em que será promovida a implantação dos Parques Empresariais do Concelho de Viana do Castelo.
(...)
CLÁUSULA TERCEIRA
Sociedade a constituir
As outorgantes acordam em constituir uma sociedade anónima denominada
G…, S.A., adiante designada por G…, sendo:
a) O objecto social “a construção, promoção, comercialização e gestão de Parques Empresariais no Concelho de Viana do Castelo;
b) O capital social inicial de Esc. 50.000.000$00, integralmente realizado em dinheiro, dos quais 80% subscrito pela Parque-Invest, 15% pela Câmara Municipal de Viana do Castelo, e 5% pela Associação Empresarial de Viana do Castelo.
c) Futuramente será considerada a participação da empresa intermunicipal de parques empresariais que vier a ser constituída no âmbito da Associação de Municípios do Vale do Lima no capital social da G… 1 ou em sua alternativa, a participação da própria Associação de Municípios do Vale do Lima.
(...)
CLÁUSULA SÉTIMA
Objecto da sociedade a constituir
1. As Outorgantes acordam que competirá à G… a construção, promoção, venda ou cedência dos direitos de utilização dos lotes infraestruturados, integrados nos Parques Empresariais nas condições que venha a considerar adequadas.
2. Em concretização do disposto no número anterior, competirá à G…;
a) Adquirir os terrenos a afectar aos Parques Empresariais a criar e desenvolver;
b) Promover a elaboração ou revisão dos projectos e a execução das obras de infraestruturação necessárias à instalação dos Parques Empresariais.
c) Providenciar a instalação dos equipamentos principais que qualifiquem os Parques Empresariais;
d) Instruir os respectivos processos de licenciamento.
e) Elaborar o Regulamento do Parque Empresaria que estabelecerá as regras da sua utilização, e que contemplará, nomeadamente:
I) O pagamento das taxas de condomínio.
II) A necessidade de prévia autorização da G… para a alienação de lotes de terrenos pelos condóminos.
III) As condicionantes de natureza ambiental.
CLÁUSULA OITAVA
Projecto Piloto
1. As Outorgantes elegem como prioritário o desenvolvimento do Parque Empresarial de Lanheses como um projecto piloto de grande relevância, com uma área de intervenção inicial prevista de 18 há e uma área de expansão de mais 25 ha.
2. É integralmente aplicável ao projecto do Parque Empresarial de Lanheses o disposto nas cláusulas anteriores, excepto no que concerne ao projecto de loteamento e execução em elaboração sob promoção da Valima.
(...)”
3) Por escritura pública celebrada em 21.10.2003, no 2° Cartório Notarial de Viana do
Castelo, M… e M… declararam vender à G…, S.A., pelo preço de € 188.545,60, os seguintes bens imóveis situados na freguesia de Lanheses, concelho de Viana do Castelo:
“NÚMERO UM
Prédio rústico, composto de terreno de mato, destinado a construção urbana, situado em Fonte Fria, descrito na Conservatória do Registo Predial competente sob o número trezentos e trinta e um de Lanheses, inscrito na matriz predial respectiva sob o artigo 2531, com o valor patrimonial de 6 2,51, vendido por sete mil trezentos e quarenta e sete euros e vinte e nove cêntimos.
NÚMERO DOIS
Prédio rústico, composto de leira de mato, destinado a construção urbana, situado em
Fonte Fria, descrito na Conservatória do Registo Predial competente sob o número
quatrocentos e catorze de Lanheses, inscrito na matriz predial respectiva sob o artigo
2530, com o valor patrimonial de 62,51, vendido por sete mil quatrocentos e sete euros
e quinze cêntimos;
NÚMERO TRÊS
Prédio rústico, composto de terreno de mato e pinheiros, destinado a construção urbana, situado em Salvaterra, descrito na Conservatória do Registo Predial competente sob o número mil seiscentos e três de Lanheses, inscrito na matriz predial respectiva sob o artigo 2257, com o valor patrimonial de 73,66, vendido por cento e sessenta e três mil setecentos e noventa e um euros e dezasseis cêntimos.”- docs. 5 e 6 juntos com a p.i.
4) A Impugnante apresentou, em 10.02.2004, a Mod. 1 do IMI, relativamente ao prédio inscrito na matriz rústica sob o artigo 2257, aí declarando como motivo da entrega da declaração “prédio novo”, e que o tipo de prédio a avaliar corresponde a “terrenos para construção”, tendo o referido prédio dado origem ao artigo P1194 da matriz predial urbana respectiva - doc. 10 junto com a p. i., cujo conteúdo se tem aqui por integralmente transcrito.
5) A Impugnante apresentou, em 10.02.2004, a Mod. 1 do IMI, relativamente ao prédio inscrito na matriz rústica sob o artigo 2531, aí declarando como motivo da entrega da declaração “prédio novo”, que o tipo de prédio a avaliar corresponde a “terrenos para construção”, tendo o referido prédio dado origem ao artigo P1196 da matriz predial urbana respectiva - doc. 11 junto com a p.i., cujo conteúdo se tem aqui por integralmente transcrito.
6) O prédio inscrito sob o artigo P1194, foi objecto de l avaliação, efectuada em
26.04.2005, tendo sido fixado o valor patrimonial tributário, de € 1.408.070,00, valor que resulta da seguinte fórmula: € 1.408.070,00 (Vt) 600,00 (Vc) x [18.468,5600 (A)
x 18 (%) + (586,9610 (Ac) + 0,0000 (Ad))J x 1,00 (Cl) x 0,60 (Ca) x 1,00 (Cq) - fls. 14 e 15 do PA.
7) O prédio inscrito sob o artigo P1196, foi objecto de ia avaliação efectuada em
26.04.2005, tendo sido fixado o valor patrimonial tributário, de € 33.290,00 valor que resulta da seguinte fórmula: €33.290,00 (Vt) 600,00 (Vc) x [436,480 (A) x 18 (%) + (13,8880 (Ac) + 0,0000 (Ad))] x 1,00 (Cl) x 0,60 (Ca) x 1,00 (Cq) - fls. 16 e 17 do PA.
8) Em 21.07.2005, a Impugnante, requereu segunda avaliação relativamente aos prédios P1194 e P1196, nos termos e com os fundamentos de fls. 2 a 13 do P.A., que se têm por integralmente reproduzidas.
9) Em 04.05.2007, foram lavrados os Termos de Avaliação relativamente aos prédios P1194 e P1196, mantendo-se o valor patrimonial resultante da 1a avaliação, neles sendo aposta declaração do representante do sujeito passivo com o seguinte teor: “Não concordo com o valor atribuído visto tratar-se de terreno interior não infra estruturado, com características geológicas que obrigaram a intervenção de drenagem com o consequente aumento do custo de infraestruturação. Assim, deverão ser considerados o valor do terreno o declarado na reclamação” - fls. 20 a 28 do P.A..
10) A Impugnante foi notificada dos resultados da 2a avaliação através dos ofícios n.°s
3446221 e 3446282, datados de 22.05.2007 - docs. 1 e 2 juntos com a p.i..
11) Em 16.08.2007, foi dada entrada, no S.F. de Viana do Castelo, da petição inicial - cfr. carimbo aposto na fl. 3 dos autos.
Não se provou que:
A) O valor de mercado para os bens avaliados seja de € 173.791,16 e de €7.347,29, respectivamente.
Motivação da Matéria de Facto dada como assente
Os factos dados como provados resultam da análise dos documentos juntos aos autos, nomeadamente dos elementos constantes do Processo Administrativo, e dos documentos juntos com a petição inicial, os quais não foram objecto de impugnação.
A prova testemunhal produzida não contribuiu para a fixação da matéria dada como assente, tendo em conta que parte da matéria a que as testemunhas foram inquiridas (relativa à constituição, fins, e a actividade desenvolvida pela Impugnante) já resultava provada em face da prova documental que já constava dos autos.
No mais, nomeadamente à matéria dada não provada, tal resultou, no essencial, de não ter sido produzida prova suficiente quanto à mesma, por forma a permitir que o Tribunal formasse uma convicção positiva quanto a mesma.
Neste particular, os depoimentos das testemunhas J…, M… e A…, não obstante terem sido prestados de forma convicta e credível, relevaram-se genéricos ou conclusivos, no que tange ao valor de mercado dos prédios avaliados.».

II.2. DE DIREITO
II.2.1. Erro de julgamento da matéria de facto: Reclamações Graciosas
A ora recorrente não se conforma com a decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que julgou improcedente a impugnação deduzida contra o resultado da 2ª avaliação efectuada a dois imóveis começando por questionar a matéria de facto dada como provada.
Entende a recorrente que deve ser levado ao probatório, por entender ser pertinente e relevante para a decisão, a existência de duas Reclamações Graciosas apresentadas pela ora recorrente, uma em 18-07-2007, na sequência da liquidação adicional dos Impostos de Sisa e do Selo notificada por ofício datado de 28-06-2007, na sequência da segunda avaliação das parcelas de terreno dos autos, a outra apresentada em 07-08-2007, via fax, na sequência de ter a primeira notificação sido dada sem efeito.
Apreciando.
O juiz deve seleccionar a matéria de facto relevante para a decisão da causa, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, que deva considerar-se controvertida – artigo 511.º, n.º 1 do Código de Processo Civil.
Ora, apesar de a recorrente referir que tais factos são pertinentes e relevantes para a decisão, não explica porquê nem nas conclusões nem nas alegações de recurso.
E na verdade não se vislumbra que assim seja pois, como refere o Exmo. Procurador-Geral Adjunto no seu douto Parecer, as reclamações graciosas tiveram por objecto actos distintos daquele cuja validade é agora objecto de apreciação.
Improcede nesta parte o recurso.
II.2.2. Erro de julgamento da matéria de facto: Valor de Mercado
Sustenta a recorrente que deveria ter sido incluída na matéria dada como provada que o valor de mercado para os bens avaliados o constante da escritura: € 163,791,16 e € 7.347,29, (ressalvado o mero lapso, ou erro de escrita, que decorre da menção na sentença do valor de € 173.791,16 quando deveria ser € 163.791,16) por não ter sido impugnada a escritura dos autos que assim faz prova plena nos termos do disposto no artigo 546.º do Código de Processo Civil e por tal ter sido referido por todas as testemunhas inquiridas, designadamente J…, M… e A….
Importa salientar que a recorrente não pede que seja levado ao probatório o valor que pagou pela compra de cada um dos imóveis. Valor que não é controvertido nos autos.
O que pretende é que esse valor, o constante da escritura, seja considerado o valor de mercado e assim seja levado ao probatório.
Entendemos que no contexto deste processo o “valor de mercado” não é um facto mas antes um conceito jurídico e como tal não pode ser levado ao probatório.

Os factos abrangem as ocorrências da vida real, bem como o estado, a qualidade ou situação real das pessoas ou das coisas e os acontecimentos do mundo exterior, directamente captável pelas percepções do homem.
Já Alberto dos Reis dizia que o juiz deve ter na sua mente que «o questionário serve, em primeira linha, para fixar o quadro dentro do qual se há-de produzir a prova e que esta só pode ter por objecto factos positivos, materiais e concretos; tudo o que sejam juízos de valor, induções, conclusões, raciocínios, valorações de factos, é actividade estranha e superior à simples actividade instrutória» - Código de Processo Civil anotado, volume III, 4ª edição, Coimbra Editora, p. 212. «O tribunal colectivo há-de ser perguntado sobre factos simples, e não sobre factos complexos, sobre factos puramente materiais, e não sobre factos jurídicos, sobre meras ocorrências concretas e não sobre juízos de valor, induções ou conclusões a extrair dessas ocorrências» - Código de Processo Civil anotado, citado, p. 215.
Também Manuel de Andrade - Noções Elementares de Processo Civil, p. 187 – refere que «o questionário deve conter só matéria de facto», «deve estar rigorosamente expurgado de tudo quanto seja questão de direito; de tudo quanto envolva noções jurídicas»; «os factos materiais que possam interessar a estas noções é que devem ser quesitados».
Anselmo de Castro - Direito Processual Civil Declaratório, vol. III, 1982, pp. 268 e 269, depois de dizer que «são factos não só os acontecimentos externos, como os internos ou psíquicos, e tanto os factos reais, como os simplesmente hipotéticos», acrescenta que «só, (…), acontecimentos ou factos concretos no sentido indicado podem constituir objecto da especificação e questionário, o que importa não poderem aí figurar nos termos gerais e abstractos com que os descreve a norma legal, porque tanto envolveria já conterem a valoração jurídica própria do juízo de direito ou da aplicação deste».
Também Abrantes Geraldes - Temas da Reforma do Processo Civil, vol. II, 1997, p.. 138 refere que «devem ser irradicadas da condensação as alegações com conteúdo técnico-jurídico, de cariz normativo ou conclusivo, a não ser que porventura tenham, simultaneamente, uma significação corrente e da qual não dependa a resolução das questões jurídicas que no processo se discutem (v. g., renda, contrato, proprietário, residência permanente, etc.), logo acrescentando que «de nada vale a integração na base instrutória de verdadeiras questões de direito, na medida em que, se tal ocorrer e o tribunal, depois de produzida a prova, lhe der resposta, esta considera-se não escrita».
Efectivamente determina o artigo 646.º n.º 4 do Código de Processo Civil, que no julgamento da matéria de facto ter-se-ão por não escritas as respostas do tribunal sobre questões de direito. E esta solução aplicar-se-á, por analogia, às respostas que incidam sobre conclusões de facto, ou melhor, que constituam conclusões de facto, - cfr., Lebre de Freitas, Código de Processo Civil anotado, vol. II, Coimbra Editora, 2001, pp. 605 a 607), maxime quando tais conclusões têm a virtualidade de por si resolverem questões de direito a que se dirigem.
O valor de mercado será aquele por que o bem seria vendido em circunstâncias normais.
A concretização factual do conceito poderia ser levada ao probatório de modo a permitir ao julgador concluir pelo valor de mercado do bem. Mas não o conceito em si, como é a pretensão da recorrente, que assim não pode ser atendida.
II.2.3. Erro de julgamento de direito: (IN)aplicação do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis
Defende a recorrente que “o regime legal aplicável às avaliações dos prédios dos autos é o que decorre da aplicação do Código da Contribuição Autárquica, que vigorou até 30 de Novembro 2003, tendo a sentença recorrida ao assim não decidir violado o princípio da irretroactividade da lei fiscal imposto pelo artigo 12.º da Lei Geral Tributária.”.
Esta questão não foi levantada pela ora recorrente na petição inicial nem foi tratada pelo tribunal recorrido na sentença sindicada.
Tendo o recurso por objecto a sentença recorrida – cfr. artigo 676.º do Código de Processo Civil – ficam de fora do seu âmbito as questões que nela não tenham sido apreciadas, com excepção daquelas que sejam do conhecimento oficioso. E deste modo a questão enunciada, por ser uma questão nova, não pode ser conhecida por este Tribunal.
II.2.4 Erro de julgamento de direito: terrenos para construção
Defende a recorrente que “A avaliação dos prédios dos autos não reflecte as características respectivas dos imóveis no momento que releva no âmbito da avaliação e fixação do respectivo valor patrimonial tributário: os imóveis não poderiam ser considerados como urbanos aquando da sua aquisição pela Recorrente mas, sim, como prédios rústicos, a tal não obstando a declaração inserta na escritura de compra e venda de que se destinavam a construção urbana.”
Está em causa a discordância da recorrente quanto à avaliação dos prédios como terrenos para construção, admitindo no entanto que na escritura de compra e venda ficou mencionado tal destino para os terrenos.
Porém, mais uma vez estamos perante uma questão nova, que não foi tratada na sentença que ora se examina e que, por isso, e porque não é do conhecimento oficioso, não pode ser por este Tribunal de recurso apreciada.
II.2.5. Erro de julgamento de direito: benfeitorias realizadas após a compra
Diz a recorrente que “As avaliações efectuadas não expurgaram do valor dos prédios quaisquer características novas decorrentes de alterações e benfeitorias efectuadas pela Recorrente em momentos posteriores aos das aquisições tomando em consideração edificações e outros aspectos valorativos que não existiam à data da verificação do facto tributário”.
Sobre esta questão pronunciou –se o Meritíssimo juiz a quo nos seguintes termos: «Relativamente às invocadas benfeitorias que terão sido realizadas pela Impugnante, também se dirá que as mesmas não se afiguram irrelevantes [há um manifesto lapso de escrita porquanto resulta do contexto que o que era pretendido dizer era que “se afiguram irrelevantes”] para efeitos de determinação do V.P.T. dos prédios em causa, uma vez que as mesmas em nada contribuem para a determinação do valor da avaliação, atenta a objectividade de critérios avaliativos implementada pelo C.I.M.I., e tendo presente que a avaliação se reporta à data em que é efectuado o pedido de inscrição ou actualização da matriz, como resulta do artº 37º, n.º 4, do C.I.M.I.”.
Não nos merece qualquer censura o assim decidido. Na verdade, a recorrente parte de pressuposto errado de que o momento a que a avaliação se há-de reportar é o do acto de transmissão do terreno, quando nos termos da lei – do artigo 37.º, n.º 4 do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis - o momento a considerar para efeitos de avaliação é a data de apresentação da declaração modelo 1. O que implica que quaisquer modificações que surjam ou ocorram no prédio determinantes de indicies e/ou valores após aquela data não são de tomar em conta para efeitos de determinação do valor patrimonial – cfr. Martins Alfaro, Código do Imposto Municipal sobre Imóveis Comentado e Anotado, 2004. p. 426 - , mas será de considerar tudo o que surgiu ou aconteceu no prédio até lá. Acresce que a recorrente apesar de mencionar que as benfeitorias tiveram influência no valor patrimonial fixado, não o demonstra, pois para o fazer teria de dizer em qual dos coeficientes previstos na fórmula legal aplicada (cfr. factos provados sob os n.ºs 6 e 7) as benfeitorias foram ponderadas, em que medida o foram e não o faz.
Não existem, assim, razões que determinem nesta parte a alteração do julgado.
II.2.6. Erro de julgamento de direito: Coeficiente de afectação
Insurge-se a recorrente contra a aplicação do coeficiente de afectação na avaliação dos terrenos: “Os imóveis foram avaliados como se de prédios urbanos já edificados se tratasse, aplicando-se uma fórmula especialmente vocacionada para prédios destinados a habitação, aplicação que se tem por ilegal mesmo que se considerassem os imóveis como terrenos para construção.
De acordo com o artigo 45.º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis, o valor patrimonial tributário dos terrenos para construção corresponde à soma do valor da área de implantação do edifício a construir e do valor do terreno adjacente à implantação. Contudo, foi tomado em consideração o coeficiente de afectação, desconhecendo-se em concreto o fim a que os prédios iriam estar sujeitos, utilização que, errada, injustificada e ilegal, afectou substancialmente o valor dos imóveis.”.
Também quanto a esta matéria não nos merece qualquer censura o decidido pelo Meritíssimo juiz a quo, que se transcreve:
“Enfrentando, em seguida a problemática relativa à utilização do coeficiente de afectação, na avaliação de prédios urbanos categorizados como terrenos para construção. Por força do disposto no art.° 45°, n.°1, do C.I.M.I., verifica-se que o valor dos terrenos para construção corresponde ao somatório do valor de duas áreas, a saber: (1) o valor da área de implantação do edifício a construir; e, (ii) o valor do terreno adjacente à implantação. A determinação do V.P.T. dos terrenos para construção tem, assim, por referência, o valor dos edifícios a construir, estabelecendo o art.° 45°, n.°2, do C.I.M.I. que o valor da área de implantação corresponde a uma percentagem do valor das edificações autorizadas e previstas, previamente fixada, e que poderá variar entre os 15% e os 45%.
Daí que, para estes efeitos, não possam deixar de relevar as características dos edifícios cuja construção resulte autorizada ou prevista.
Ora, uma das variáveis que influi na determinação do valor patrimonial tributário de um prédio urbano é justamente a finalidade de utilização do prédio, o que se compreende, uma vez que, por um lado, o valor de um prédio é também condicionado pelas possibilidades de fruição e utilização que confere ao seu titular e, por outro, atendendo a que os fins da construção influem também na própria natureza e características construtivas do prédio, e, consequentemente, no seu valor.
Assim, cuidou o legislador de fazer reflectir essa mesma variável, na determinação do V.P.T. à luz das regras do C.I.M.I., através da consagração, na fórmula prevista no art.° 38° do referido Código, um coeficiente de afectação, o qual variará em função da utilização a que o prédio se destina (cfr. art..° 41° do C.I.M.I.).
Se isto é realidade insofismável para efeitos da avaliação de prédios urbanos construídos, por imperativo das disposições de lei que têm vindo a ser citadas, também não poderá deixar de o ser relativamente aos terrenos para construção, atenta a relevância preponderante que nesta sede assume a edificação projectada para o terreno para construção, maxime, em sede de determinação do valor da área de edificação, a qual deverá corresponder a uma percentagem, normativamente fixada, do valor das edificações autorizadas ou previstas.
Na situação vertente, não é sequer controvertido que os terrenos para construção objecto de avaliação se destinam a construção de pavilhões industriais, razão pela qual, o concreto coeficiente utilizado (0,60), se mostra conforme ao disposto no art.° 45°, n.°2, em articulação com o resultante da tabela constante do art.° 41°, ambos do C.I.M.I., sendo aliás o coeficiente de menor valor legalmente previsto para prédios destinados à prossecução de uma actividade económica.
E não pode deixar de se assinalar que o coeficiente de afectação concretamente aplicado (0,60), funciona como verdadeiro factor minorativo do valor patrimonial, uma vez que se trata de factor multiplicativo inferior à unidade (1,00), resultando da sua aplicação um valor patrimonial inferior ao que resultaria, acaso o coeficiente de afectação fosse expurgado da fórmula de cálculo utilizada.
Pelo exposto, não enferma, também aqui, o acto impugnado de qualquer vício.”.
Na avaliação de terreno para construção, ao contrário do que defende a recorrente, e como bem fundamentou o tribunal recorrido, há-de entrar o coeficiente de afectação do imóvel, o que é determinado pelo disposto no n.º 2 do artigo 45.º do Código do Imposto Municipal sobre os Imóveis que dispõe que “O valor da área de implantação varia entre 15% e 45% do valor das edificações autorizadas ou previstas”.
Não podemos deixar de salientar que o coeficiente de afectação concretamente aplicado (0,60) funcionou, como é referido pelo Meritíssimo juiz a quo, como factor minorativo do valor patrimonial, pois o VPT encontrado seria superior se aquele coeficiente não tivesse sido utilizado na formula do cálculo. Facto a que a recorrente não atentou ao dizer nas suas conclusões que utilização daquele coeficiente “afectou substancialmente o valor dos imóveis.”, pretendendo com isso dizer que foi determinante na sobrevalorização do VPT quando, na verdade, o efeito foi exactamente o contrário.
Também quanto a esta parte não existem razões que determinem a alteração do julgado.
Sumariando:
A) Apenas deve ser levado ao probatório os factos relevantes para a decisão.
B) Não devem ser levados ao probatório conceitos jurídicos.
C) O Tribunal de recurso não pode conhecer questões que não foram tratadas pelo Tribunal recorrido, com excepção daquelas que são do conhecimento oficioso.
D) A avaliação reporta-se à data da apresentação da declaração modelo 1, não sendo relevante para o efeito a data da celebração da escritura de compra e venda.
E) Nos termos do n.º 1 artigo 45.º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis o valor dos terrenos para construção corresponde ao somatório do valor de duas áreas: (1) o valor da área de implantação do edifício a construir; 2) o valor do terreno adjacente à implantação.
F) Por força do disposto no n.º 2 do artigo 45.º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis, que estabelece que o valor da área de implantação varia entre 15% e 45% do valor das edificações autorizadas ou previstas, a determinação do valor da área de implantação implica a apuramento do valor das edificações autorizadas ou previstas, o qual só pode ser efectuado através das regras da avaliação dos prédios urbanos - artigos 38.º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis – nas quais se inclui o coeficiente de afectação (artigo 41.º do mesmo diploma legal).
III – DECISÃO
Em conformidade como exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso.
Custas pela recorrente.
Porto, 26 de Abril de 2012
Ass. Paula Ribeiro
Ass. Fernanda Esteves
Ass. Álvaro Dantas