Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00476/04.7BECBR-C
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:02/01/2019
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:Maria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Descritores:EXECUÇÃO DE SENTENÇA ANULATÓRIA; SANÇÃO PECUNIÁRIA COMPULSÓRIA
Sumário:
I-A sanção pecuniária compulsória não é um fim em si mesmo: a sua utilização visa obter a realização de uma prestação, judicialmente reconhecida, a que o credor tem direito, constituindo, apenas, uma forma de protecção do credor contra o devedor relapso e um reforço da tutela específica do direito daquele à realização in natura da prestação que por este lhe é devida;
I.1-esta sanção é, assim, um meio indirecto de constrangimento decretado pelo juiz, destinado a induzir o devedor a cumprir a obrigação a que se encontra adstrito e a obedecer à injunção judicial;
I.2-a sanção pecuniária compulsória é uma condenação acessória da condenação principal do devedor no cumprimento da prestação que deve, visando exercer pressão sobre a sua vontade e determiná-lo a cumprir;
I.3-atento o formato desta figura jurídica e atentando, ainda, na especificidade patente nos autos, forçoso é concluir que no caso concreto estamos perante uma sanção pecuniária aplicada a um terceiro, já que nem sequer é o “devedor”, com a agravante de que nunca foi chamado ao processo principal e, outrossim, à presente execução, a fim de fazer valer a sua posição e, assim, se defender de uma condenação que recai, inapelavelmente, na sua esfera jurídica;
I.4-os factos apurados nos autos não são compatíveis com a afirmação vertida na sentença de que o “Executado apresentou uma postura processual que não demonstra uma vontade inequívoca de proceder ou ordenar a demolição nos termos decididos”;
I.5-o Executado não pôs em causa a decisão exequenda e pretendeu executá-la, desenvolvendo diligências nesse sentido que culminaram no início da demolição do muro para uma determinada altura;
I.6-a imposição duma tal sanção, sem a audição do visado, permitindo-lhe a possibilidade de tomar posição sobre a concreta temática e, assim, assegurar o contraditório no âmbito da mesma afigura-se-nos inaceitável e violadora das mais elementares regras de defesa - artigos 6º, 169º e 179º/3 do CPTA e 3º do CPC. *
*Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:Câmara Municipal da Figueira da Foz
Recorrido 1:MECT
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Execução de sentenças de anulação de actos administrativos - arts. 173.º e seguintes CPTA - Recurso Jurisdicional
Decisão:
Conceder provimento ao recurso
Revogar a sentença na parte recorrida
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido do provimento do recurso
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

RELATÓRIO
MECT deduziu execução de sentença anulatória contra o Presidente da Câmara Municipal da Figueira da Foz, indicando como Contrainteressado JAMN, todos já melhor identificados nos autos, referente à decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra no processo nº 476/04, em 27/04/2011, que julgou parcialmente procedente a acção administrativa de pretensão conexa com actos administrativos, decidindo: “Assim a legalização estará sempre na dependência de uma demolição parcial de modo a que o muro não ultrapassasse a altura de 2,50 metros, a contar da cota de terreno da Autora até ao seu coroamento.”
Pediu:
a) ao abrigo do artigo 179.º do CPTA, deve ser ordenado à executada e ao contra-interessado a reposição do muro à altura então legalmente permitida, de modo a que o muro de vedação em questão não podia elevar-se acima de 2,50m, a contar da cota mais baixa, situada no terreno da Autora, tudo com as legais consequências;
b) sejam condenados os Réus no pagamento da indemnização emergente dos prejuízos e danos materiais decorrentes das despesas e encargos não patrimoniais causados, nos montantes respetivamente de € 384,48 e de € 4.000,00, o que perfaz a quantia de € 4.384,48 a que acrescem juros vincendos até integral e efetivo pagamento à taxa legal, sem prejuízo de outros danos inerentes e causados pela própria demolição que, por serem incertos se relegam para execução de sentença;
c) sejam os executados condenados a remover imediatamente todo o entulho decorrente da demolição iniciada na fração A do lote B, depositado no prédio, fixando-se um prazo para o efeito não inferior a 15 dias, com as legais consequências.
O TAF de Coimbra decidiu assim:
a) Determino que o Sr. Presidente da Câmara Municipal da Figueira da Foz, pessoa que representa o Município nos termos legais, de per si, ou por imposição a que possa e deva proceder nos termos legais aos proprietários dos lotes ou frações envolvidas e identificadas nos presentes autos, executar a demolição do muro identificado nos autos até à altura de 2,50m, medidos da cota terreno da Exequente, considerando-se a cota natural, o solo, sem considerar os resíduos provenientes da demolição já operada ou que venha a ser executada e que se encontram ou encontrem em terreno propriedade da Exequente, bem assim, a proceder à remoção integral dos resíduos que se encontram e possam vir a encontrar-se em face da demolição que importa executar, no prédio da Exequente, desobstruindo a vala longitudinal e o acesso situados na propriedade da Exequente e que se encontram próximas do muro a cuja demolição, embora que parcial e até à altura dos mencionados 2,50m, deve proceder;
b) Que, concluída a demolição nos termos supra, deve a Exequente facultar o acesso à sua propriedade para que o Executado, dentro do prazo definido em c), proceda à remoção integral dos resíduos que se encontram e possam vir a encontrar-se em face da demolição que importa executar, no prédio da Exequente, desobstruindo a vala longitudinal e o acesso situados na propriedade da Exequente e que se encontram próximas do muro a cuja demolição, embora que parcial e até à altura dos mencionados 2,50m, deve proceder.
c) Determino o cumprimento da presente decisão no prazo de 30 dias;
d) Determino a aplicação de sanção pecuniária compulsória no montante de 10% do salário mínimo nacional mais elevado ao Senhor Presidente da Câmara Municipal da Figueira da Foz, por cada dia de atraso além do prazo determinado em c), para cumprimento da presente decisão
Desta, cingido à matéria sancionatória, vem interposto recurso.
Alegando, o Município/Executado formulou as seguintes conclusões:
I. O presente recurso é restrito à parte da decisão que impôs ao Presidente da Câmara Municipal da Figueira da Foz uma sanção pecuniária compulsória de 10% do salário mínimo mais elevado por cada dia de atraso além dos 30 dias fixados para ser executada a demolição do muro identificado nos autos até à altura de 2,50m medidos da cota terreno da Exequente.
II. Impõem os arts. 44º e 175º/3 do CPTA que a aplicação de uma sanção pecuniária no âmbito do processo executivo de uma sentença de anulação de acto administrativo se mostre justificada. Essa justificação há-de encontrar correspondência nos factos, designadamente numa actuação desconforme com os comandos enunciados no art. 173º do CPTA, que dispõe sobre a actuação da Administração no seguimento de uma decisão anulatória de acto administrativo.
III. A justificação do Tribunal a quo que conduziu à imposição de uma sanção pecuniária compulsória (sintetizada na consideração de que “pese embora ser inequívoca a decisão exequenda quanto à altura máxima do muro em causa, 2,50m, o Executado apresentou uma postura processual que não demonstra uma vontade inequívoca de proceder ou ordenar a demolição nos termos decididos), resulta de uma total desconsideração de factos alegados pelo executado na contestação à execução e que, forçosamente, impõem decisão diversa da recorrida.
IV. Para se decidir sobre a matéria sancionatória torna-se imperativo, antes de mais, levar à matéria de facto dada como provada tudo quanto se acha vertido nos artigos 31 a 52º e 59º da contestação do Município, matéria que se encontra incorrectamente julgada. A prova de cada um desses factos a aditar encontra-se nos documentos juntos pelo executado e que vão referenciados em cada um daqueles artigos; impõem-se, também, dar como provado que a presente execução deu entrada em 29/11/2013, facto a que a decisão recorrida se refere (cfr. pagina 22) e que resulta dos próprios autos mas que não encontra expressão nos factos dados como provados.
V. Só através do aditamento destes factos à matéria assente se poderá fazer uma ponderação justa, adequada e equilibrada da actuação do Município executado perante o Acórdão anulatório e, a partir daí, apurar se se mostra justificada a imposição de uma sanção pecuniária compulsória à luz do critério legal do art. 179º do CPTA.
VI. Ora, os factos a aditar demonstram que o executado, ainda antes de transitado em julgado o Acórdão anulatório, promoveu pelo cumprimento do determinado pelo art. 173º do CPTA: ora notificando o contra-interessado JMN a demolir o muro em 15 dias; ora notificando os actuais proprietários das fracções do lote B para o imperativo dessa demolição; ora procedendo a um levantamento topográfico do muro; ora emitindo, através dos seus serviços, um parecer técnico com base no qual se ponderou o segmento da decisão anulatória nos termos da qual “previamente a qualquer demolição ou ordem de demolição, o réu deve proceder a nova análise do processo nos termos apontados na fundamentação que precede, de modo a determinar qual a parte do muro que é legalizável e a parte que tem de ser demolida.”; ora ponderando, à luz do novo Regulamento Urbanístico da Figueira da Foz (DR, II Série, nº 230 de 28/11/2012), que revogou o RUETCU ao abrigo do qual o Acórdão foi proferido, qual a parte do muro a demolir; ora conseguindo que os actuais proprietários iniciassem a demolição que só vieram a sustar por força da actuação da exequente.
VII. Estes factos, a serem levados à matéria assente, não são compatíveis com a conclusão extraída pelo Tribunal de que “pese embora de ser inequívoca a decisão exequenda quanto à altura do muro em causa, 2,50 m, o Executado apresentou uma postura processual que não demonstra uma vontade inequívoca de proceder ou ordenar a demolição nos termos decididos”.
VIII. Estas conclusões, além de se mostrarem contrariadas pelos factos que o executado alegou, mostram-se juridicamente erradas: por um lado, porque a decisão exequenda não é inequívoca quanto à altura do muro, nem podia sê-lo, pois limitou-se a anular um acto sem especificar “os actos e operações a adoptar”, sendo esta matéria que só pode ser determinada ou pelo próprio executado (a quem incumbe, definir em primeira linha o conteúdo da execução) ou pelo Tribunal num processo de execução, por força do que prevê o nº 1 do art. 179º do CPTA; por outro lado, porque, com o devido respeito, a sentença confunde o não cumprimento voluntário da sentença - consubstanciado na omissão de dar execução ao decidido -, com o cumprimento da sentença com um conteúdo que se vem a decidir não ser o correcto, mas que se revela ter sido devidamente ponderado à luz de um quadro legal em vigor diferente daquele que existia à data da anulação, associado à jurisprudência proferida no domínio da mesma matéria, designadamente o Acórdão de 27/05/2011 do TCAN (processo 00516-A/03).
IX. Ao invés do decidido, pode concluir-se que o Município quis executar a sentença, definiu o conteúdo dessa execução e desenvolveu diligências nesse sentido que se vieram a traduzir em actos concretos de demolição.
X. Coisa diversa é entender-se que as operações necessárias a essa execução não estão inteiramente de acordo com essa execução que impõe fazer, circunstância que, todavia, não justifica que se imponha para já uma sanção pecuniária, porque nada permite deduzir ou concluir que a autarquia não irá cumprir com o que agora foi ditado pela decisão recorrida no que toca à altura do muro.
XI. A postura processual da autarquia, contrariamente ao decidido, foi a de defender apenas um outro conteúdo do dever de executar, que também passava pela demolição do muro.
XII. O Tribunal fez errado julgamento dos factos e errou igualmente na interpretação e aplicação das normas dos arts. 44º, 173º/1 e 179º/3 do CPTA, pelo que se impõe a sua revogação, nesta parte.
Termos em que, sempre com o suprimento, deve a sentença recorrida ser revogada na parte impugnada, assim se fazendo JUSTIÇA!
*
A Exequente ofereceu contra-alegações, concluindo:
1.º O recorrente limitou o objecto de recurso à matéria sancionatória da sentença em crise proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra.
2.º Contudo, discordando do recurso apresentado, sufraga-se, inteiramente, a bem fundamentada decisão proferida que no tocante a essa parte do aresto condenatório determinou “ d) (…) a aplicação de sanção pecuniária compulsória no montante de 10% do salário mínimo nacional mais elevado ao Senhor Presidente da Câmara Municipal da Figueira da Foz, por cada dia de atraso além do prazo determinado em c), para cumprimento da presente decisão.”
3.º Desde logo, o Mm Juiz do Tribunal a quo justificou – e bem - a decisão tomada, fundamentando-a, designadamente elencando os factos e a tramitação processual dos presentes autos, à luz dos artºs.176, nº 4, e 169, do C.P.T.A. (cfr.artº.179, nº 3, do C.P.T.A.).
4.º Como refere o Tribunal a quo “ Uma das principais inovações introduzidas pela reforma do contencioso administrativo consistiu na instituição do poder de os Tribunais administrativos imporem sanções pecuniárias compulsórias aos titulares dos órgãos administrativos obrigados a cumprir determinações judiciais. O exame da figura revela a sua dualidade característica: trata-se, em primeira linha, de uma medida coercitiva, de carácter patrimonial, seguida de uma sanção pecuniária, em caso de incumprimento pontual. Não constitui, portanto, uma medida de cariz executivo, antes tendo por objetivo a prevenção do incumprimento (cfr. artº. 66, nº 3, do C.P.T.A.). Por isso mesmo, a correspondente figura de direito privado não está regulada no C.P. Civil, mas antes no C. Civil (cfr. artº 829-A, do C.Civil). No que respeita à vertente de execução de sentenças, tal figura visa estimular o cumprimento voluntário e rápido da decisão judicial, resultando da lei que a sanção pecuniária compulsória deve ser imposta pelo Tribunal quando tal se justifique (cfr.artº.179, nº.3, do C.P.T.A.). A imposição da sanção depende de uma avaliação do juiz sobre a sua necessidade e adequação, quer no momento da pronúncia da sentença declarativa (em que será excecional), quer no processo de execução. (…)”
5.º Nesse sentido, refere o tribunal a quo no seu aresto decisório que a aplicação da sanção pecuniária compulsória pressupõe “(…) um juízo de valor sobre o eventual incumprimento da decisão, juízo de ponderação esse assente em factos concretos que permitam concluir se o eventual incumprimento é, ou não, desculpável, o que se alcançará através de um juízo de censura à conduta processual e extraprocessual desenvolvida pela parte não cumpridora, juízo esse sempre fundado em razões objetivas, isto é, comprovadas nos autos (cfr. ac. T.C.A.Sul-1ª Secção, 31/1/2008, proc. 3362/07)..
6.º Destarte, o tribunal a quo sopesou as razões de aplicação da sanção pecuniária compulsória, assente nos factos e na prova carreada e na conduta processual das partes, como aliás fundamentou e refere expressamente na sua decisão, em que refere que “Revertendo ao caso dos autos, é manifesto que se encontram preenchidos os pressupostos para o Tribunal fazer uso desta figura. Recorde-se que a decisão exequenda transitou em julgado em 07/07/2013; A presente execução foi intentada em 29/11/2013. Até à presente data e volvidos que estão mais de três anos sobre a data de cumprimento voluntário da decisão exequenda e sem que para isso se vislumbrem efetivas circunstâncias impeditiva desse cumprimento, em face dos poderes que a Lei confere ao executado, acrescendo que, pese embora ser inequívoca a decisão exequenda quanto à altura máxima do muro em causa, 2,50m, o Executado, apresentou uma postura processual que não demonstra uma vontade inequívoca de proceder ou ordenar a demolição nos termos decididos.”
7.º Assim, fundamentadamente, o tribunal a quo estribou a sua convicção e decidiu – e bem - pela aplicação da sanção pecuniária compulsória.
8.º Efectivamente, concordando com os fundamentos subjacentes à decisão proferida, salienta-se que a sanção pecuniária compulsória veio ultrapassar uma lacuna até aí existente no ordenamento jurídico português, que consistia na escassez de meios compulsórios privados, decretados pelo juiz, tendo em vista obter maior celeridade na execução do direito declarado – cfr. RUI DE ALARCÃO, Direito das obrigações, Coimbra, 1993, pág. 30.
9.º Neste sentido, refere o Acórdão do STJ de 9 de Outubro de 2001, ser “o fim específico de tal previsão o de forçar o devedor a cumprir, vencendo a resistência da sua oposição ou do seu desleixo, indiferença ou negligência, constrangendo-o a obedecer a decisão condenatória, assim se gerando uma nova obrigação (…)”
10.º Neste sentido, PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA frisam que a finalidade da sanção pecuniária compulsória é compelir o devedor a cumprir, no mais reduzido espaço temporal, porque só deste modo o credor conseguirá a satisfação plena do seu interesse – in Código Civil anotado, anot.º 4 ao art. 829-A, pág.104.
11.º Também CALVÃO DA SILVA refere que o “fim da sanção pecuniária compulsória não é o de indemnizar os danos sofridos pelo credor com a mora, mas o de forçar o devedor a cumprir, vencendo a resistência da sua oposição ou o seu desleixo, indiferença ou negligência” – vd Cumprimento e sanção pecuniária compulsória, 1987, pág. 407 e segs.
12.º No fundo, tudo conforme bem fundamentou e decidiu o Mm Juiz de Direito do Tribunal a quo ao referir expressamente que “(…) Até à presente data e volvidos que estão mais de três anos sobre a data de cumprimento voluntário da decisão exequenda e sem que para isso se vislumbrem efetivas circunstâncias impeditiva desse cumprimento, em face dos poderes que a Lei confere ao executado, (…).
13.º Por outro lado, a sanção pecuniária compulsória tem por base a circunstância do incumprimento ser posterior ao momento da condenação, pelo tribunal, à prática do facto, o que amplia a gravidade do problema, visto que já não está, apenas, em causa a obrigação entre devedor e credor, mas passamos a ter uma atitude antagónica à decisão do tribunal que constitui uma ameaça ao prestigio e à credibilidade dos tribunais.
14.º Ora, no caso, não obstante o Tribunal a quo já ter condenado o Recorrente a cumprir, de uma forma linear e cristalina, à demolição do edificado em violação da lei – sendo inequívoca a decisão quanto “(…) à altura máxima do muro em causa, 2,50m” do lado do terreno da autora -, o Recorrente escudou-se a cumprir o decidido a pretexto da aprovação de um novo Regulamento Municipal (doravante RU)– e defendendo-se com o mesmo invocando em oposição à presente execução de sentença uma norma do mesmo RU que sequer se aplicava ou contendia com a situação da exequente !
15.º Com tal conduta do Recorrente a exequente viu a situação da decidida demolição de obra ilegal executada pelos contra-interessados adiada por mais anos – desde, pelo menos, 8.08.2013 (em face da ordem do Município/Recorrente aos contra-interessados para cessarem a demolição por eles iniciada (vd. declarações de JMSSNC no despacho do MP nos autos de proc. 895/13.8TAFIG, junto aos autos a fls. - até à prolação da sentença ora proferida.
16.º Donde, é manifesto que bem andou o Tribunal a quo ao decidir como decidiu, pela aplicação de uma sanção pecuniária compulsória com o intuito de evitar novo incumprimento pelo Recorrente do decidido.
17.º Mais, não corresponde à verdade que o Recorrente “tudo fez para executar a sentença anulatória e actuar nos termos do art. 173º do CPTA”.
18.º Neste sentido, basta atentar às comunicações da A./Recorrida para o Recorrente, juntas aos autos a fls…, que demonstram que a A. sucessivamente interpelou os contra-interessados e o Município para o cumprimento do decidido, as quais foram sucessivamente ignoradas.
19.º Na verdade, contrariamente ao alegado pelo Recorrente no seu recurso, este ao notificar os contra-interessados, “tudo fez” para que não fosse cumprido o decidido, designadamente ordenando expressamente aos contra-interessados para não procederem á demolição e ordenando a realização de um “levantamento topográfico” ao local por técnicos da autarquia – quando a sentença assentou e decidiu em função de um relatório pericial colegial e das medições por eles efectuadas e dadas ao processo.
20.º Neste sentido, basta atentar às comunicações da recorrente e informações prestadas pelos contra-interessados no tocante às instruções dadas pelos fiscais do Município, no âmbito de participação criminal apresentada pela A./Recorrida e que deu lugar ao inquérito nº 895/13.8TAFIG, que correu termos no Ministério Publico da Figueira da Foz, e que ora se transcrevem: “ JMSSNC (…) referiu que os fiscais da Câmara Municipal da Figueira da Foz foram ao local e deram-lhe ordem para não fazer mais qualquer tipo de demolição no muro até novas instruções, aguardando as mesmas para finalizar a obra e recolher os resíduos existentes no terreno da participante” - vd os documentos juntos com o requerimento de prova da A./Recorrida, concretamente pág. 6 do despacho do MP nos autos de proc. 895/13.8TAFIG.
21.º Mais, como resulta dos autos, o prédio da autora permaneceu desde, pelo menos, 8.08.2013 (cfr. inquérito crime 895/13.8TAFIG) até à data da prolação da sentença em 10.01.2017, ora recorrida, com o entulho da demolição parcial do muro depositado no prédio da autora, com o entupimento da vala e constrangimentos no atravessamento do terreno da A. por causa da “ordem para não fazer mais nada” dada pelo Município, ora recorrente – vd também doc. 7 a 9 de registos fotográficos juntos com o requerimento de prova da autora.
22.º Também, além do aludido protelamento, o recorrente ainda logrou sustentar o incumprimento com fundamento num novo Regulamento Municipal aprovado posteriormente à sentença transitado em julgado – Regulamento urbanístico aprovado em 21.09.2012 (publicado no DR 230 – II Série de 28.11.2012, com alterações aprovadas em 30.12.2013, republicado no DR nº67, II Série, de 4.04.2014), ou seja, considerando um novo quadro normativo posterior ao decidido no âmbito do qual sustentou o não cumprimento da sentença, para tanto invocando uma disposição regulamentar desse regulamento urbanístico (o art. 16º, nº4, do RU) que não tinha qualquer aplicação ao caso concreto, ou seja, não contendia com a situação do prédio da autora, desnivelado e a uma cota mais baixa do que o prédio dos contra-interessados!
23.º Efectivamente referia o nº 4, do art. 16º, do RU aprovado 21.09.2012 que: “Existindo desnível entre os terrenos confinantes, o proprietário do lote ou parcela situada a cota mais baixa tem o direito de elevar o seu muro até 2,40 m acima do nível do terreno vizinho”.
24.º Ora, por sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra de 27 de Abril de 2011 foi decidido e citamos “Assim a legalização estará sempre na dependência de uma demolição parcial de modo a que o muro não ultrapasse a altura de 2,50 metros, a contar da cota de terreno da Autora até ao seu coroamento. (cfr. pág. 20 da sentença proferida pelo TAFC).
25.º Dúvidas não existiam, portanto, que “a contar da cota do terreno da Autora” devia ser medida a referida altura “de 2,50m”, sendo tudo o que ultrapasse essa altura até ao coroamento ilegal.
26.º Contudo, contrariamente ao decidido e transitado em julgado, o R/Recorrente não aceitou – como conclui o Tribunal a quo na sentença de 10.01.2017 – o decidido, tendo, ao invés, se escusado invocando uma norma de um regulamento municipal que não tinha adequação à situação em causa.
27.º Efetivamente, o Réu fez uma errada interpretação de uma norma de um regulamento municipal aprovado e publicado em 28.11.2012, alterado e republicado em 4 de Abril de 2014, o qual não tinha aplicação ao presente processo na medida em que decorre do nº4, do art. 16º, do RU que “Existindo desnível entre os terrenos confinantes, o proprietário do lote ou parcela situada a cota mais baixa tem o direito de elevar o seu muro até 2,40 m acima do nível do terreno vizinho”, sendo que, no caso, manifestamente, a autora não pretendia elevar qualquer muro, pois tratava-se, contrariamente ao alegado pelo Réu/Recorrente, da A. pretender a demolição do muro para além da altura legalmente permitida, os referidos “2,50 m a contar do terreno da autora”!
28.º Assim, em suma, o recorrente manifesta e reiteradamente tudo fez para não cumprir com o cristalinamente decidido por sentença.
29.º Por outro lado, salienta-se que a decisão exequenda era de tal forma inequívoca e transparente que tendo a nova sentença determinado e mantido os mesmos 2,50 m a contar do terreno da A./recorrida, o Recorrente já iniciou a demolição, após a prolação da sentença recorrida sob a comunicação da sanção, sem qualquer nova concretização ou especificação nela vertida sobre “os actos e operações a adoptar”.
30.º Assim, o Recorrente iniciou desta feita a execução do decidido só porque foi cominada a sanção pecuniária compulsória – ou não teria iniciado a demolição, como não iniciou face à sentença condenatória anterior.
31.º Contrariamente ao alegado pelo R./recorrente nas suas alegações de recurso, bem demonstrativo do incumprimento do recorrente Município, e da sua clamorosa má-fé, é ter agora adjudicado e iniciado a demolição do muro de suporte de terras/vedação para a altura determinada judicialmente – de 2,50 metros a contar do terreno da autora – e, simultaneamente, estar a proceder à edificação de um novo intra-muro ou muro interior com cerca de 1,20 metros, tudo, de novo, perfazendo do lado do terreno da A./Recorrida, uma altura superior à legalmente permitida e mandada demolir – cfr. doc nº 1 cuja junção ora se requer por ser superveniente á prolação da sentença em crise.
32.º Donde, bem andou o Tribunal a quo ao condenar, cautelar e preventivamente, em sanção pecuniária compulsória o titular máximo do órgão Recorrente, como bem fundamentou, desde logo por não se vislumbrarem “efetivas circunstâncias impeditiva desse cumprimento, em face dos poderes que a Lei confere ao executadomas também porque “pese embora ser inequívoca a decisão exequenda quanto à altura máxima do muro em causa, 2,50m, o Executado, apresentou uma postura processual que não demonstra uma vontade inequívoca de proceder ou ordenar a demolição nos termos decididos”, tudo como bem resulta também da factualidade material provada (e não recorrida), a aplicar no caso de não cumprimento do ordenado, não tendo, em suma, o Tribunal a quo violado as invocadas normas ou dispositivos legais aplicáveis.
Termos em que, com o suprimento, deve a sentença recorrida ser mantida, por não ter violado qualquer norma ou dispositivo legal aplicável, e ter feito correcta aplicação do direito, assim se fazendo JUSTIÇA!
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O MP, notificado nos termos e para os efeitos do artº 146º/1 do CPTA, emitiu parecer no sentido do provimento do recurso.
*
Cumpre apreciar e decidir.
FUNDAMENTOS
DE FACTO
Na sentença foi fixada a seguinte factualidade:
1. Por Acórdão proferido por este Tribunal em 27/04/2011, no processo n.º 476/04.7 BECBR, transitada em julgado em 07/07/2013, foi julgada parcialmente procedente a Ação Administrativa Especial interposta pela Aqui Exequente, pela qual se decidiu entre o mais:
“…
O despacho impugnado de 18.05.2004 procede à legalização de diversas edificações efectuadas no lote B, com especial incidência no muro de vedação/suporte existente entre este lote e a propriedade da Autora e que foi edificado sem a respectiva licença de construção.
O artigo 17º do Regulamento Municipal de Urbanização, Edificação e Taxas e Compensações Urbanísticas, publicado no Diário da República, II Série, nº 140 de 20.06.2002, Apêndice nº 80, em anexo ao edital nº 280/2002, dispõe o seguinte:
Artigo 17.º
Muros de vedação
1 — Os muros de vedação confinantes com a via pública não poderão ter altura superior a 1,2 m acima do nível dessa mesma via pública, considerando o ponto correspondente ao respectivo desenvolvimento médio, podendo, porém, elevar-se a vedação acima dessa altura com recurso à utilização de sebes vivas, redes ou gradeamento.
2 — Poderão vir a ser encaradas soluções diversas:
a) Em construções cujo alçado principal atinja, parcialmente, a via pública;
b) Em construções implantadas sobre terrenos destinados a cota bastante superior à da via ou arruamento confinante;
c) Quando plenamente justificado face à envolvente e à solução arquitectónica adoptada para a construção.
3 — Os muros de vedação entre proprietários não poderão exceder 2 m de altura, contados a partir do nível do terreno natural ou da rasante obtida através da movimentação de terras, desde que devidamente autorizado pela Câmara Municipal.
4 — Registando-se desnível entre os terrenos confinantes, o proprietário do lote ou parcela situado a cota mais baixa tem o direito de elevar o seu muro até 2 m acima do nível do terreno vizinho.
5 — Acima dos níveis referidos nos n.ºs 4 e 5, poderá sempre elevar-se a vedação com recurso à utilização de sebes vivas, grades ou redes de arame.
Nos presentes autos, o denominado “muro de suporte de terras” é um muro em betão armado que passou a delimitar e a separar os dois prédios confinantes.
Trata-se, portanto, de um muro entre proprietários – estando em causa nos presentes autos a secção que confina entre o terreno, propriedade da Autora, e o lote B, propriedade do contra-interessado –, pelo que, importa ter em consideração o disposto nos números 3, 4 e 5 do artigo supra transcrito.
Resulta destes normativos que o muro entre vizinhos não pode ter uma altura superior a 2 metros a contar do nível do terreno natural.
Ficou provado que, antes da construção do muro, os prédios da Autora e do contrainteressado eram delimitados entre si por um declive natural de terra, ficando o terreno da Autora abaixo da cota daquele em 0,50 metros, o que significa que, o muro de vedação em questão não podia elevar-se acima dos 2,50 metros, a contar da cota mais baixa, situada no terreno da Autora.
Do probatório resulta, ainda, que o muro em análise tem, desde o seu coroamento até ao terreno natural antes do depósito de terras ali efectuado, 2,95 metros a norte e 2,55 metros a sul.
Assim, não restam dúvidas de que o Réu, ao ter aprovado a legalização do muro de vedação entre os dois terrenos, violou a norma em apreço.
É certo que, como afirma o Réu na contestação apresentada, a legalização é sempre preferível à demolição, porém a legalização só é possível se a edificação em causa respeitar as normas legais e regulamentares aplicáveis, o que tem sido uniformemente consagrado na jurisprudência dos tribunais superiores – cfr. Acórdãos do STA de 24.09.2009, Proc. 0656/08;do TCA Norte de 08.07.2010, Proc. 01656/06.6BEVIS; e do TCA Sul de 05.03.2009, Proc. 01582/06.
Porém tal não ocorre relativamente ao muro de suporte/vedação aqui em causa; a legalização do muro não é possível nos exactos termos em que foi feita, por o muro ter uma altura superior à regulamentarmente admitida.
Assim a legalização estará sempre na dependência de uma demolição parcial de modo a que o muro não ultrapassasse a altura de 2,50 metros, a contar da cota de terreno da Autora até ao seu coroamento.” cfr. fls. Acórdão proferido em 27/04/2011, no Processo de Ação Administrativa Especial n.º 476/04.7 BECBR, apensos aos presentes autos, que se dá por bem e fielmente reproduzida, o mesmo se dizendo em relação às demais que seguem.
2. Realizada a perícia ordenada nos presentes autos, do Relatório pericial resulta o seguinte:
“PRONÚNCIA SOBRE AS QUESTÕES SUSCITADAS: O perito, por Vª Exª nomeado no presente processo procedeu a vistoria ao local da perícia a apresenta ordenadamente a pronúncia às questões colocadas.
8º - Deveria o executado ter ordenado a reposição do muro" à altura legalmente permitida", de molde, como concretizou a sentença proferida, a não ultrapassar a altura de 2.50 metros, medidos desde a cota natural do terreno da autora até ao seu coroamento, encetando, para tanto, as diligências tidas por adequadas e convenientes, designadamente a notificação do contra-interessado para os respetivos termos, e, em caso de não cumprimento voluntário pelo contra-interessado, promovido a execução coerciva das obras.
PRONÚNCIA; O perito constatou que a altura do muro nas traseiras da fração B do lote B foi reduzida entre cerca de 30 a 50 centímetros, de forma irregular, mantendo-se a armadura correspondente a essa redução à vista. Uma vez que a maior altura do muro era antes de 3,90 metros, o muro ficou com a altura mínima de cerca 3,50 metros no ponto correspondente. Se considerarmos que a armadura é uma vedação, a altura do muro mantém-se como antes (com uma diferença de poucos centímetros correspondente ao recobrimento).
A parte do muro correspondente à fração A do lote B não sofreu qualquer alteração mantendo-se como antes.
14º - O que significa que do lado de dentro do lote - face ao desnível de 50 centímetros entre as cotas naturais dos terrenos conforme peritagens realizadas, como resulta dos factos comprovados - este muro terá de ter 2,00 metros de altura.
PRONÚNCIA: Do lado de dentro da parcela B do lote B, a altura do muro de suporte foi parcialmente reduzida entre 30 e 50 centímetros, pelo que a sua altura no local onde tinha 3,90 m (impossível de medir) terá cerca de: 3,50 m - 0,40 m * 3,10 metros.
21º - Deixando o muro apenas em parte demolido mas numa altura superior à doutamente decidida por sentença transitada em julgado,
PRONÚNCIA: Sim, como nas anteriores pronúncias já se referiu.
22º - E atirando e deixando todo o entulho e partes da demolição do muro para o terreno da autora.
PRONÚNCIA: Sim, como pode verificar-se pelas fotografias.
29º - Estando o entulho (de blocos em betão armado, cimentos, e outros materiais) vazado sobre o terreno da autora,
PRONÚNCIA: Sim, conforme pronúncia anterior.
30º - Ocupando a serventia de passagem e,
PRONÚNCIA: Sim, o caminho existente no interior da propriedade da autora encontra –se ocupado com detritos da demolição.
31º - Por outro lado, entupindo a vala longitudinal que acompanha o muro a fim de receber as águas provenientes do prédio do contra-interessado.
PRONÚNCIA: A valeta adjacente ao muro encontra-se preenchida a pelos já referidos detritos na zona em que se verificou a aludida demolição.
40º - Não podendo, consequentemente, ser utilizada a serventia de passagem atual de que a autora se serve para atravessar o seu prédio,
PRONÚNCIA: Apesar dos detritos o caminho no interior da propriedade da autora é transitável a pé.
41º - Além da vala transversal estar impedida de receber as águas e de consequentemente as canalizar para a vala longitudinal que foi executada pelo marido da A. para conduzir as águas provenientes do dito lote B,
PRONÚNCIA: Os detritos constituem um obstáculo à condução das águas pluviais, conforme pode verificar-se no conjunto das três fotografias referidos na pronúncia ao nº 22º. cfr. fls. 615 a 618 dos autos, onde se incluem as fotografias a que o mesmo se aludem e não se transpõem para este ponto do probatório, por razões de qualidade futura de tais fotos.
3. O Sr. Perito apresentou os seguintes esclarecimentos às questões colocadas pela Exequente e pelo Executado, relativamente ao relatório antes transcrito.
NOTA PRÉVIA
O perito, por Vª Ex.ª nomeado no presente processo, apresenta os esclarecimentos solicitados pelos ilustres mandatários.
Entende porém justificar-se uma nota prévia para esclarecimento de que, quer no relatório inicial de "pronúncia sobre as questões solicitadas", quer no presente relatório, se atende à irregularidade dos elementos a medir, designadamente quanto à parte demolida do muro (patente nas fotografias) e à distância do muro ao caminho. Vale aqui para o perito o entendimento que faz do princípio da proporcionalidade e daí que tenha que utilizar expressões como "cerca de".
Nestes termos e com a devida vénia, entende que, para melhor esclarecer os ilustres mandatários e se tal for o entendimento do Meritíssimo Juiz, poderá, no local, melhor explicar todas as questões técnicas suscitadas.
À superior consideração de Vª Exª.
Esclarecimentos requeridos pela Ré:
1.
a) Com que fundamento, na página 2 do seu relatório, refere que "a maior altura do muro era antes de 3,90 m"?
RESPOSTA: Com base na resposta aos quesitos da perícia incluída no processo judicial.
b) Com que fundamento refere, na mesma página, ficou com a altura mínima de
3,50 metros"?
RESPOSTA: Com base na verificação no local.
c) Aclare a afirmação da página 2 de que a altura do muro mantém-se como antes, depois de dizer que o mesmo foi demolido cerca de 30 a 50 centímetros.
RESPOSTA: O perito pronunciou-se da seguinte forma "...Se considerarmos que a armadura é uma vedação, a altura do muro mantém-se como antes (com uma diferença de poucos centímetros correspondente ao recobrimento)."
Tal significa o seguinte: O muro é composto por betão reforçado com varões de aço.
A utilização de varões de aço em betão (pedra artificial composta de uma mistura de inertes com um cimento e água, permite ultrapassar a sua baixa resistência à tracção, tornando este material muito resistente tanto a esforços de tracção como de compressão.
Os varões têm que ser recobertos com a mínima espessura regulamentar de betão que envolve uma armadura de betão armado.
Sendo retirado o betão e mantida a armadura (varões de aço), a altura mantém-se como antes (com uma diferença de POUCOS centímetros correspondente ao recobrimento superior)." A situação é clara nas fotografias que integram o relatório inicial.
Reitera-se ainda que "a parte do muro correspondente à fração A do lote B não sofreu qualquer alteração mantendo-se como antes.".
d)Esclareça se foi realizado levantamento topográfico do muro.
RESPOSTA: Elaborado ou mandado elaborar pelo perito, não.
Um levantamento topográfico visa determinar as coordenadas de pontos da superfície de um terreno, a partir de uma origem pré-definida, geóide ou lipsoide.
Os levantamentos são planimétricos e altimétricos, não cabendo, (no entender do perito) qualquer justificação para a sua elaboração.
2.
a)Era viável demolir o muro sem a queda de detritos para o terreno da exequente?
RESPOSTA: Não.
b)A que distância se encontra o caminho situado no interior da propriedade da autora do muro?
RESPOSTA: O caminho é adjacente à valeta encostada ao muro, mantendo um ligeiro afastamento irregular e indefinido, sem delimitação visível e, por isso, não mensurável com um mínimo de rigor.
Esclarecimentos requeridos pela Autora:
1.Foi executada e/ou cumprida a demolição de molde a este não ultrapassar 2,50 metros medidos da cota natural do terreno da autora até ao seu coroamento e 2 metros do lado de dentro do lote ... em toda a extensão do muro do lote B (frações A e B)?
RESPOSTA: O perito não conhece a "cota natural do terreno" no local da construção do muro. Se tal cota corresponde ao terreno da autora, não foi cumprida a "demolição de molde a este não ultrapassar 2,50 metros".
2. Face ao estado do muro no local nesta data, que altura então falta demolir na fração A (onde parece nada foi demolido) e na fração B (onde terá sido demolido entre 30 a 50 cm) até perfazer a dita altura máxima (coroamento) de 2,50 metros medidos da cota natural do terreno da autora e os 2 metros medidos do lado de dentro do lote?
RESPOSTA: Se a "cota natural do terreno" é a do terreno da autora, faltará demolir cerca de 3,10 m - 2,50 m = 0,60 m (sessenta centímetros). - cfr. fls. 655 a 57 dos autos.
Em sede de factualidade não provada o Tribunal consignou: Não resultam factos, com interesse para a decisão que importa proferir, a considerar como não provados.
E no que à motivação da factualidade tida por assente respeita esclareceu que a sua convicção resultou da análise crítica e conjugada do teor dos documentos não impugnados juntos aos autos, conforme referido em cada ponto do probatório e também da posição assumida pelas partes.
Atendendo à decisão que importa proferir nos presentes autos, é determinante para a avaliação do cumprimento ou incumprimento da decisão Exequenda, a perícia realizada na medida em que dela se pode apurar se efetivamente foi demolida a parte do muro que excede a altura passível de licenciamento /legalização, no estrito cumprimento da decisão em causa.
A junção aos autos pelo Executado de um laudo pericial, fls. 673 e ss., resulta de um contexto diferente do que resulta dos presentes autos e as condições em que foi realizada é estranha aos presentes, tal como é estranha aos poderes de conformação deste Tribunal, pelo que não considera este Tribunal que tal documento assuma relevância.
E mesmo que assim se não entendesse, sempre se poderia afirmar que estando em causa nos presentes autos a prolação de decisão de cumprimento de decisão judicial que determinou a demolição parcial de um muro por este exceder altura admissível por regulamento que o próprio Executado aprovou e devia fazer cumprir, o que se pode constatar de tal documento junto aos autos é que na alínea b) do ponto 2 desse laudo, é referido que a altura do muro do lote B:
3,00mts, até à zona demolida, é inequívoco que esta altura excede a que, à luz do Acórdão que a Exequente pretende ver cumprido, era possível construir.
*
DE DIREITO
Na óptica do Recorrente a sentença, na parte posta em crise, padece de erro de julgamento de facto atinente à concreta questão decidenda e de direito, este por violação dos artigos 44º, 173º/1 e 179º/3 do CPTA.
Cremos que lhe assiste razão.
Antes, atente-se no seu discurso fundamentador:
Vem a exequente peticionar o integral cumprimento do decidido pelo Acórdão proferido por este TAF de Coimbra em 27/04/2011, que determinou “Assim a legalização estará sempre na dependência de uma demolição parcial de modo a que o muro não ultrapassasse a altura de 2,50 metros, a contar da cota de terreno da Autora até ao seu coroamento.”
Do probatório resulta que, apesar de haver ocorrido o início da demolição do muro objeto dos autos, tal demolição não ocorreu de modo a respeitar o decidido naquele Acórdão.
Isto independentemente de, com a demolição iniciada, o muro, parte de betão haver ficado a 3,00m, a 3,10, ou mesmo a 2,90m
Efetivamente resulta claro da decisão exequenda que o muro em causa haveria de ser demolido até ficar com uma altura de 2,50m, a contar da cota natural do terreno da exequente, obviamente medida desde a parte superficial do terreno da autora, sem consideração os resíduos que se encontram no terreno da autora resultantes do início da demolição e cuja queda para o terreno da Autora era inevitável, como, aliás, ficou provada.
A decisão Exequenda alicerçou-se no que resulta do regulamento Municipal aplicável na altura, cujo artigo 17.º, n.º 1 determinava, “1 — Os muros de vedação confinantes com a via pública não poderão ter altura superior a 1,2 m acima do nível dessa mesma via pública, considerando o ponto correspondente ao respectivo desenvolvimento médio, podendo, porém, elevar-se a vedação acima dessa altura com recurso à utilização de sebes vivas, redes ou gradeamento.”
Quer isto dizer que, como resulta provado, a parte do muro demolida, mantém a estrutura do ferro que foi utilizada para a construção do muro em causa e não vem excluída pelo réu ou pelos contrainteressados a possibilidade de remoção de tal estrutura de ferro, porquanto não adiantaram ser sua intenção aproveitar tal estrutura para encimar o muro depois de demolido até à altura de 2,50m com rede ou gradeamento.
Assim sendo, também tal estrutura de ferro, deveria ser demolida ou removida por forma a que removidos sejam todos os elementos que constituem a estrutura do muro em causa, também até à altura limite de 2,50m, medidos da cota natural do terreno da autora, que deverá ser assumida sem os resíduos provenientes da demolição e visíveis nas fotografias que constituem o laudo pericial.
A decisão Exequenda transitou em julgado em 07/07/2013.
E independentemente da alegação do Executado e contrainteressados quanto às causas da impossibilidade de dar execução a tal demolição, a verdade é que a demolição não foi executada nos termos determinado pelo Acórdão Exequendo e isso é por todos reconhecido.
E quanto ao que alega o Executado no que concerne à aprovação em 2014 de novo regulamento municipal que alterou as condições de edificabilidade deste tipo de muros, tal consideração não releva na medida em que a decisão exequenda é inequívoca ao determinar que “Assim a legalização estará sempre na dependência de uma demolição parcial de modo a que o muro não ultrapassasse a altura de 2,50 metros, a contar da cota de terreno da Autora até ao seu coroamento.
Ou seja, ao tempo em que tal decisão foi tomada e tendo presente os termos regulamentares aplicáveis, outra solução não resta que não seja a de o Executado proceder ou promover pelos meios considerados mais adequados e eficazes, que o muro seja demolido até à altura de 2,50m, medidos da cota natural do terreno da Exequente, considerando-se como natural, o solo, sem considerar os resíduos provenientes da demolição já operada ou que venha a ser executada e que se encontram ou encontrem em terreno propriedade da Exequente.
Nesta conformidade, impõe-se conceder procedência à pretensão da Exequente, determinando-se que o Executado na pessoa do Presidente da Câmara Municipal da Figueira da Foz, proceda à demolição, por si, ou por imposição a que possa e deva proceder nos termos legais aos proprietários dos lotes ou frações envolvidas e identificadas nos presentes autos.
Sendo que tal demolição, considerando as operações que é necessário desenvolver, deve estar concluída no prazo de 30 dias, como deve também, dentro do mesmo prazo, proceder à remoção integral dos resíduos que se encontram e possam vir a encontrar-se em face da demolição que importa executar, no prédio da Exequente, desobstruindo a vala longitudinal e o acesso situados na propriedade da Exequente e que se encontram próximas do muro a cuja demolição, embora que parcial e até à altura dos mencionados 2,50m, deve proceder.
Da mesma forma e de modo a que o Executado possa dar cumprimento ao que agora é determinado, impõe-se que a Exequente conceda acesso à sua propriedade a fim de serem removidos os resíduos resultantes da demolição e desimpedir a vala longitudinal e o acesso antes referido.
Daqui se concluindo que o prazo proposto pela Exequente para o efeito, de 15 dias, se mostra exíguo em face do que importa efetuar.
Por outro lado, pede a Exequente que o aqui determinado ocorra com todas as consequências legais.
E essas consequências legais, para além das que possam resultar de responsabilidade criminal, subsumem-se à determinação de sanção pecuniária compulsória.
Nos termos do artº.176, nº.4, do C.P.T.A., pode o Exequente na petição de execução de julgado, além do mais, pedir ao Tribunal para que fixe um prazo para o cumprimento do dever de executar por parte da entidade demandada, no mesmo sentido indo a norma constante do artº.179, nº.4, do mesmo diploma, especificamente no que respeita ao pagamento de quantias pecuniárias, assim se devendo concluir pela inclusão de tal prazo a fixar no leque de poderes que o Tribunal detém no que se refere à execução de sentenças de anulação de atos administrativos, espécie a que se reconduzem normalmente os processos de impugnação de atos tributários em que o sujeito passivo tem ganho de causa (cfr. Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Comentário ao C.P.T.A., Almedina, 3ª.edição, 2010, pág.1131; José Carlos Vieira de Andrade, A Justiça Administrativa, Lições, 11ª. Edição, Almedina, 2011, pág.373 e seg.).
Pelo que, nos termos do artº.176, nº.4, do C.P.T.A., entende o Tribunal fixar em trinta dias o prazo de cumprimento do dever de executar que incumbe ao Executado, Presidente da Câmara Municipal da Figueira da Foz, pessoa que representa o Município, nos termos legais de, por si, ou por imposição a que o Exequente possa e deva proceder nos termos legais aos proprietários dos lotes ou frações envolvidas e identificadas nos presentes autos, executar a demolição do muro identificado nos autos até à altura de 2,50m, medidos da cota terreno da Exequente, considerando-se a cota natural, o solo, sem considerar os resíduos provenientes da demolição já operada ou que venha a ser executada e que se encontram ou encontrem em terreno propriedade da Exequente, bem assim, a proceder à remoção integral dos resíduos que se encontram e possam vir a encontrar-se em face da demolição que importa executar, no prédio da Exequente, desobstruindo a vala longitudinal e o acesso situados na propriedade da Exequente e que se encontram próximas do muro a cuja demolição, embora que parcial e até à altura dos mencionados 2,50m, deve proceder.
Quanto à imposição de uma sanção pecuniária compulsória a aplicar, nos termos dos artºs.176, nº.4, e 169, do C.P.T.A. (cfr.artº.179, nº.3, do C.P.T.A.).
Uma das principais inovações introduzidas pela reforma do contencioso administrativo consistiu na instituição do poder de os Tribunais administrativos imporem sanções pecuniárias compulsórias aos titulares dos órgãos administrativos obrigados a cumprir determinações judiciais.
O exame da figura revela a sua dualidade característica: trata-se, em primeira linha, de uma medida coercitiva, de carácter patrimonial, seguida de uma sanção pecuniária, em caso de incumprimento pontual. Não constitui, portanto, uma medida de cariz executivo, antes tendo por objetivo a prevenção do incumprimento (cfr.artº.66, nº.3, do C.P.T.A.). Por isso mesmo, a correspondente figura de direito privado não está regulada no C.P.Civil, mas antes no C.Civil (cfr.artº.829-A, do C.Civil).
No que respeita à vertente de execução de sentenças, tal figura visa estimular o cumprimento voluntário e rápido da decisão judicial, resultando da lei que a sanção pecuniária compulsória deve ser imposta pelo Tribunal quando tal se justifique (cfr.artº.179, nº.3, do C.P.T.A.). A imposição da sanção depende de uma avaliação do juiz sobre a sua necessidade e adequação, quer no momento da pronúncia da sentença declarativa (em que será excecional), quer no processo de execução.
Estamos, portanto, perante uma faculdade de que o Tribunal dispõe para prevenir, quando tal se justifique, o eventual incumprimento do julgado.
Numa ótica subjetiva, a sanção pecuniária compulsória apresenta, no mundo administrativo, uma especificidade que se manifesta na circunstância de a lei não a fazer recair sobre o Estado ou os entes públicos, mas antes sobre os titulares dos órgãos incumbidos da execução (cfr.artº.169, nº.1, do C.P.T.A.).
Tal implica uma identificação individual dos responsáveis pelo cumprimento das sentenças, situação que nem sempre é inequívoca ou fácil para o Tribunal (a sanção pecuniária compulsória é imposta “intuito personae”).
A este propósito, suscita-se a questão de saber se, tratando-se de uma sanção, ainda que compulsória, deve relevar a culpa. Parece-nos que, tendo em consideração a incidência da sanção na esfera patrimonial de pessoas individuais, se deve exigir um nexo de culpa, o qual relevará, tanto para a imposição, como para a fixação do montante pecuniário concreto (cfr. Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Comentário ao C.P.T.A., Almedina, 3ª.edição, 2010, pág.1095 e seg.; José Carlos Vieira de Andrade, A Justiça Administrativa, Lições, 11ª. Edição, Almedina, 2011, pág.380 e seg.).
Mais se dirá que a sanção pecuniária compulsória só é aplicável quando tal se justifique, pressupondo este critério de justificação um juízo de valor sobre o eventual incumprimento da decisão, juízo de ponderação esse assente em factos concretos que permitam concluir se o eventual incumprimento é, ou não, desculpável, o que se alcançará através de um juízo de censura à conduta processual e extraprocessual desenvolvida pela parte não cumpridora, juízo esse sempre fundado em razões objetivas, isto é, comprovadas nos autos (cfr.ac.T.C.A.Sul-1ª.Secção, 31/1/2008, proc.3362/07)..
Revertendo ao caso dos autos, é manifesto que se encontram preenchidos os pressupostos para o Tribunal fazer uso desta figura.
Recorde-se que a decisão exequenda transitou em julgado em 07/07/2013;
A presente execução foi intentada em 29/11/2013.
Até à presente data e volvidos que estão mais de três anos sobre a data de cumprimento voluntário da decisão exequenda e sem que para isso se vislumbrem efetivas circunstâncias impeditiva desse cumprimento, em face dos poderes que a Lei confere ao executado, acrescendo que, pese embora ser inequívoca a decisão exequenda quanto à altura máxima do muro em causa, 2,50m, o Executado, apresentou uma postura processual que não demonstra uma vontade inequívoca de proceder ou ordenar a demolição nos termos decididos.
Nesta conformidade encontram-se reunidos os pressupostos que determinam a possibilidade de aplicação de sanção pecuniária compulsória, caso não se mostre cumprida a presente sentença no prazo de 30 dias, sanção essa devida por cada dia de atraso em relação ao término do prazo aqui estabelecido para cumprimento, no montante de 10% (dez por cento) do salário mínimo nacional mais elevado em vigor, cuja responsabilidade impende sobre o Senhor Presidente da Câmara Municipal da Figueira da Foz, contra quem vem dirigida a presente Execução de sentença.
X
Vejamos:
No âmbito dos presentes autos a Exequente requereu a execução do acórdão que anulou o acto administrativo de 18/05/2004 do Presidente da Câmara Municipal da Figueira da Foz, pelo qual se tinha aprovado o projecto de alterações de moradia e muros de suporte de terras do lote B, sito na Rua F…, B….
Não obstante a contestação apresentada pelo Executado e as diversas questões aí suscitadas, o Tribunal recorrido julgou procedente a execução, condenando o Réu a, no prazo de 30 dias, executar a demolição do muro identificado nos autos até à altura de 2,50m medidos da cota terreno da Exequente, considerando-se a cota natural, o solo e bem assim, a proceder à remoção integral dos resíduos que se encontram e possam vir a encontrar-se em face da demolição que importa executar, no prédio da exequente, desobstruindo a vala longitudinal e o acesso situados na propriedade e que se encontram próximas do muro a cuja demolição, embora que parcial e até à altura dos mencionados 2,50 m.
Mais fez cominar uma sanção pecuniária compulsória no montante de 10% do salário mínimo mais elevado ao Presidente da Câmara Municipal, por cada dia de atraso além dos 30 dias fixados.
O âmbito do recurso cinge-se à matéria sancionatória.
Ora, dispõe o artº 44º/1 do CPTA que “o tribunal tem o poder de fixar oficiosamente um prazo para o respectivo o cumprimento, que, em casos justificados, pode ser prorrogado, bem como, qual tal se justifique, o poder de impor sanção pecuniária compulsória destinada a prevenir o incumprimento, segundo o disposto no artigo 169º”.
Por outro lado, especificamente a propósito da decisão judicial proferida em sede de execução de sentença de anulação de acto administrativo, diz o artº 179º/3 do mesmo diploma que “Quando tal se justifique, o tribunal condena ainda os titulares dos órgãos incumbidos de executar a sentença ao pagamento de uma sanção pecuniária compulsória, segundo o disposto no artigo 169º.”
Resulta da análise destes normativos que o legislador impõe que a fixação de uma sanção compulsória seja justificada pelo tribunal “em considerações ou antecedentes que tornem previsível a dificuldade de obter uma execução espontânea da sentença” - (Mário Aroso de Almeida e Carlos Cadilha, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais, Almedina, 2005, anotação ao artigo 44º).
No caso concreto o Tribunal justificou e fundamentou a aplicação da sanção do seguinte modo: Revertendo ao caso dos autos, é manifesto que se encontram preenchidos os pressupostos para o Tribunal fazer uso desta figura. Recorde-se que a decisão exequenda transitou em julgado em 7/7/2013. A presente execução foi intentada em 29/11/2013. Até à presente data e volvidos que estão mais de 3 anos sobre a data de cumprimento voluntário da decisão exequenda e sem que para isso se vislumbrem efectivas circunstâncias impeditivas desse cumprimentos, em face dos poderes que a Lei confere ao executado, acrescendo que, pese embora ser inequívoca a decisão exequenda quanto à altura máxima do muro em causa, 2,50m, o Executado apresentou uma postura processual que não demonstra uma vontade inequívoca de proceder ou ordenar a demolição nos termos decididos. Nesta conformidade encontram-se preenchidos os pressupostos que determinam a possibilidade de aplicação de sanção pecuniária compulsória, caso não se mostre cumprida a presente sentença no prazo de 30 dias.
O Executado/Recorrente assaca à sentença recorrida erro de julgamento na valoração e fixação da matéria de facto levada ao probatório, pugnando pelo aditamento da factualidade invocada nos artigos 31º a 52º e 59º da contestação.
Analisado o probatório constata-se que, não obstante a vasta matéria factual alegada pelo Réu, o Tribunal deu apenas como provados 2 pontos: o primeiro relativo à decisão que se executa e o segundo em que reproduz todo o relatório pericial e esclarecimentos prestados pelo perito.
Deu o Tribunal como provado, sob o ponto 1, que, além do mais, a decisão exequenda transitou em julgado em 7/7/2013.
Impunha-se, no entanto, que também desse como provada a data em que foi intentada a execução, isto é, 25/09/2013, pois a mesma reveste-se de particular interesse para a apreciação da actuação do Réu no dever legal de execução da sentença anulatória.
Na sua contestação, e para contrariar o entendimento da Exequente de que o Réu não tinha dado início à execução da sentença, o Executado alegou, sob os artigos 31 a 52 e 59, o seguinte:
Por despacho da Directora do Departamento Municipal de Urbanismo, foi ordenado ao gestor da zona que em cumprimento do acórdão elaborasse a devida notificação ao contra-interessado, no sentido de repor o muro (documento 4).
Em 17/10/2011 foi notificado JAMN para, nos termos do Acórdão proferido pelo TAF Coimbra proceder, no prazo de 15 dias, à demolição parcial do muro de suporte de terras de modo a que a sua altura não ultrapasse os 2,50 (art. 17º do RUETCU) a contar da cota de terreno da autora D. ME, até ao seu coroamento (doc. 5).
Cópia deste ofício foi enviado à mandatária da Exequente (documento 6).
Por despacho da directora do DMU de 13/01/2012 o processo foi remetido à fiscalização para cumprimento da notificação, tendo-se apurado que o notificando não deu cumprimento ao ofício de 17/10/2011, pelo que se levantou auto de notícia para instauração de processo de contra-ordenação (cfr. documentos 5 e 7).
Com a informação de que o proprietário do lote B já não seria JMN, os serviços camarários obtiveram informação junto da Conservatória do Registo Predial de que os proprietários da fracção B do lote B eram AEFG e SMNP (documento 8).
Na posse da referida informação, o Executado notificou os referidos proprietários da fracção B do lote B pelo ofício 11671/2012 de 21/11/2012, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido (doc. 9), dando conhecimento à mandatária da Exequente (doc. 10).
Entretanto, na sequência de apresentado pela mandatária da Exequente (doc. 11), o Executado, com conhecimento à mandatária da Exequente, remeteu notificação aos proprietários da fracção A do lote B, por ofício de 4/01/2013 (docs. 12 e 13).
Em 31/1//2013 os proprietários das fracções do Lote B apresentaram requerimento onde sustentaram que não eram parte no processo judicial, tendo adquirido as moradias nos termos em que estavam actualmente, tudo conforme cfr. documentos 14 e 15.
Por informação de 13/02/2013, junta sob o documento 16, a jurista do DMU Drª Teresa Baptista, propôs que os serviços de topografia acompanhados pela equipa de fiscalização e do Gestor da DGU, se deslocassem ao local, notificando-se previamente os proprietários das fracções a franquearem as portas, de modo a constatar em planta quais os muros e altura a que deviam ficar, a fim de se dar cumprimento ao acórdão do TAFC.
Tal proposta mereceu despacho de concordância da Directora do DMU e do Sr. Vereador do Pelouro de 22/02/2013 (cfr. documento 16), pelo que, acertada a data para deslocação ao local (documento 17 verso) e efectuadas as devidas notificações aos proprietários das fracções do lote B e à Exequente, todas de 13/03/2013, comunicou-se o agendamento da realização da diligência para 25/03/2013, com início às 09.30h (documentos 18, 19 e 20).
Por força das condições climatéricas não foi possível realizar a diligência com o levantamento topográfico em 25/03/2013 (vide documento 17), pelo que foi designada nova data para 10/04/2013, enviando-se novos ofícios aos proprietários e reclamante, todos de 25/03/2013 (cfr. documentos 21, 22 e 23).
Cumprida tal diligência no dia 10/04/2013, o gestor da DGU elaborou a informação n° 1918/DMU/DGU-GZ2/2013, datada de 23/05/2013, em que anexou o levantamento topográfico realizado e alçados do muro, propondo (documento 24):
a)que perante o actual Regulamento Urbanístico (RU, que substituiu entretanto o revogado RUETCU), designadamente o constante do n° 4 do seu artº 16°, actualmente o muro divisório de propriedade poderá ter uma altura máxima de 2,90m (2.40m + 0,50m), sendo os 2.40m permitidos no RU e os 0,50m o desnível entre o terreno da Autora e o terreno dos contra-interessados, pelo que aplicando o actual RU e porque a demolição é a ultima ratio, deve permitir-se que o muro de vedação tenha uma altura máxima de 2,90m contrariamente ao anterior RUETCU que só permitia 2,50m;
b)que de acordo com o levantamento topográfico, o muro divisório tem, desde o seu coroamento até à cota da face superior da sapata, 3,45m a norte e 2,57m a sul desde o seu coroamento até à cota do terreno da autora ME;
c)que considerando o levantamento topográfico efectuado em que o muro em análise tem, desde o seu coroamento ate à face superior da sapata, 3,45 metros a norte e 2,57 metros a sul, para cumprimento da sentença do TAFC e tendo em conta o preconizado no n° 4 do artº 16° do RU, deve o muro divisório ser demolido em 0,55m (55 centímetros) a começar do norte (início do lote B) numa extensão de 32,36 metros, ponto esse que define a intersecção das linhas da parte a demolir com a parte que respeita o regulamento.
Tal proposta, após despacho da Directora do DMU e do Vereador do Pelouro, mereceu a deliberação de câmara por unanimidade de 02/07/2013, da qual foi dado conhecimento ao TAFC e à mandatária da Exequente, tendo sido os proprietários das duas fracções notificados para cumprimento no prazo de 30 dias, em 10/07/2013 (cfr. documentos 24 a 29).
Na exposição com registo n° 2967 de 08/08/2013, JC, proprietário da fracção A do lote B, informou que iria iniciar as obras de demolição parcial do muro no tardoz da sua habitação, mais informando que seria inevitável que caíssem alguns detritos na propriedade da D. ME e que depois seria necessário entrar na sua propriedade para proceder a limpezas ou trabalhos complementares (documento 30).
Também a proprietária SMNP, por exposição com registo n° 2981, informou que ira iniciar as obras de demolição no dia 13/08/2013, e que apesar das obras se iniciarem na sua propriedade seria inevitável que caíssem alguns detritos na propriedade da D. ME, pelo que seria necessário entrar depois na mesma para proceder a limpezas ou trabalhos complementares (documento 31).
Por exposição apresentada em 12/08/2013 a proprietária Sandra Elisa Baptista Simões informou que as obras de demolição pararam porque a D. ME chamou a Polícia e que esta informou o seu marido de que não poderiam cair detritos no seu terreno, tudo conforme documento 32.
Por requerimento da proprietária SMNP recebido a 14/08/2013 esta informou o Município que as obras de demolição iriam ser adiadas até que o empreiteiro tivesse garantias por parte da autarquia que as pode realizar em condições de segurança, porque iniciados os trabalhos de demolição pelo empreiteiro na fracção A, os mesmos foram parados porque a D. ME colocou entraves à feitura dos mesmos, tendo inclusive movido uma queixa na Polícia contra os proprietários da fracção A (doc. 33).
Por carta de 22/09/2013 o proprietário da fracção A do Lote B, JMC, solicitou à Exequente, com conhecimento à sua mandatária, permissão para entrar no seu terreno para remoção dos restos de demolição e reinício dos trabalhos (doc. 34).
A Exequente, representada pela sua mandatária, respondeu ao proprietário, impondo como condição a “demolição parcial do muro de modo a que o muro não ultrapasse a altura de 2,50 metros, a contar da cota do terreno da m/ constituinte até ao seu coroamento e para a respectiva e urgente remoção do entulho das obras já realizadas” (documento 35).
Nessa sequência, o Vereador do Pelouro do Urbanismo e o Presidente da Câmara Municipal remeteram à Exequente o ofício constante do documento 36, no qual, além do mais, determinam:
25. Face a tudo o exposto, o teor do presente ofício irá ser devidamente notificado aos proprietários das fracções, à D. ME e sua advogada, e ainda ao TAFC, informando todos que:
a)o Município cumpriu a sua missão, levando a cabo imensas diligências no sentido das partes envolvidas cumprirem voluntariamente a sentença do TAFC, que culminou na sua deliberação de 02/07/2013 devidamente notificada a todos;
b)assim sendo, as partes envolvidas - proprietários das fracções A e B onde se localiza o muro divisório e reclamante D. ME - devem colaborar mútua e reciprocamente no cumprimento dos termos de execução da sentença conforme ordenado pelo Município em cumprimento do ordenado pelo TAFC;
c)essa colaboração recíproca só às partes diz respeito, não tendo o Município que garantir seja o que for pois se trata do cumprimento duma sentença judicial;
d)terminado que seja o prazo concedido para a sua execução e se for verificado, eventualmente, o seu incumprimento pela Fiscalização Municipal, o Município comunicará tal facto ao Tribunal nos termos do art. 100° do RJUE (Regime Jurídico da Urbanização e Edificação), que remete para o art. 348° do CP (Código Penal), por entender poder existir crime de desobediência por desrespeito a ato administrativo);
e)qualquer diferendo sobre os termos de execução da sentença, pode sempre ser dirimido pelas entidades competentes - tribunais - bastando para tal que as partes interponham as acções/medidas adequadas a tais fins.
t)do presente oficio e de toda a documentação constante do processo de obras desde a folha 1308/verso até à folha 1343, que engloba as exposições/requerimentos/fichas elencados supra e informação do topógrafo JG em resposta às acusações da reclamante D. ME, será dado conhecimento ao TAFC bem como às partes intervenientes, isto é, a D. ME e proprietários das duas fracções;
g)o Município desde já expressa que se absterá de, doravante, responder a quaisquer exposições/requerimentos que as partes intervenientes lhe dirijam futuramente, que insistam e/ou abordem as mesmas questões já trazidas ao processo, nos termos do n° 2 do artº 9° do CPA.
O referido ofício foi também remetido à mandatária da Exequente, tudo com conhecimento ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra (docs. 37 e 38), tendo o TCAN ordenado o seu desentranhamento e devolvido o expediente ao mandatário do Executado (cfr. documento 39).
O artigo 16º do novo Regulamento Urbanístico da Figueira da Foz (DR, II Série, nº 230 de 28/11/2012), que revogou o RUETCU reza assim:
3-Os muros de vedação entre proprietários não poderão exceder 2,40 m de altura, contados a partir do nível do terreno natural ou da rasante obtida através da movimentação de terras, podendo porém elevar-se a vedação com recurso à utilização de sebes vivas ou redes/gradeamento vazado até ao limite máximo acumulado de 3,50 m.
4-Existindo desnível entre os terrenos confinantes, o proprietário do lote ou parcela situada a cota mais baixa tem o direito de elevar o seu muro até 2,40 m acima do nível do terreno vizinho.
X
Ora, tal como advogado, a alegação destes factos foi acompanhada de vasta prova documental nomeada em cada um dos pontos da contestação. “Por isso, não se compreende como pôde o Tribunal recorrido fazer tábua rasa de tudo quanto foi alegado, como se o executado tivesse agido indiferente à anulação do acto” - lê-se nas alegações e aqui corrobora-se.
Na verdade, examinado o probatório, constata-se que o Senhor Juiz aí omitiu, pura e simplesmente, a menção a qualquer conduta do Executado e, consequentemente, do próprio Presidente da edilidade, tendente a dar espontâneo cumprimento ao julgado anulatório.
Em contraponto, perscrutada a fundamentação jurídica da sentença sob recurso, verifica-se que o Senhor Juiz aí debateu e decidiu a questão da imposição da sanção pecuniária compulsória ao Senhor Presidente da Câmara Municipal da Figueira da Foz, sopesando, para tanto, a factualidade que reputou necessária e relevante para a concreta decisão que se lhe impunha. O que significa que desconsiderou totalmente essa factualidade, no domínio da fundamentação de facto, pese embora a mesma tenha servido de suporte à decisão de condenação na referida sanção.
Tal omissão não fulmina de nulidade a sentença posta em crise, mas configura um erro de julgamento, que importa colmatar, em homenagem ao princípio do contraditório.
Assim, aditam-se ao probatório os factos apontados pelo Recorrente - 31 a 52 e 59 da contestação -, nos termos dos artigos 607º/3 a 5 e 662º/1, ambos do CPC de 2013, aqui aplicável ex vi artigos 1º e 140º do CPTA.
É que, aqueles factos, amparados na prova documental junta, invariavelmente levam a concluir que o Executado Município iniciou a execução espontânea da sentença, com o que fica arredado o critério legal que permite a imposição de uma sanção compulsória.
Dito de outro modo, os factos supra descritos não são compatíveis com a afirmação vertida na sentença de que o “Executado apresentou uma postura processual que não demonstra uma vontade inequívoca de proceder ou ordenar a demolição nos termos decididos”, antes pelo contrário.
A circunstância de o Executado ter aferido que a altura do muro a demolir era outra que não a agora decidida (2,50m), não belisca minimamente o que se disse.
Na verdade, o Executado não pôs em causa a decisão exequenda e pretendeu executá-la. Porém, no cumprimento dessa decisão não olvidou o que se escreveu no Acórdão anulatório: “da anulação de tal despacho não decorre necessariamente a demolição do muro em questão, nos termos pretendidos pela Autora, já que o muro não é de todo insusceptível de legalização. É certo, contudo, que o muro não poderá subsistir nos exactos termos em que foi construído, dado violar a norma referida, mas importa que o Réu, previamente a qualquer demolição ou ordem de demolição, proceda a nova análise do processo nos termos apontados na fundamentação que precede, de modo a determinar qual a parte do muro que é legalizável e a parte que tem de ser demolida.”
Neste quadro, também se não secunda a afirmação vertida na decisão recorrida de que é “inequívoca a decisão exequenda quanto à altura máxima do muro em causa, 2,50m”.
A decisão exequenda não é inequívoca nem podia sê-lo, pois limitou-se a anular um acto sem especificar “os actos e operações a adoptar”. O conteúdo da execução - traduzido nos actos e operações materiais a adoptar no seguimento de uma sentença de anulação -, ou é determinado pela Administração, tal qual prevê o artº 173º do CPTA, ou é determinado pelo Tribunal, ao abrigo do nº 1 do artº 179º, na sequência de um processo executivo.
O Executado cumpriu as determinações do artº 173º do CPTA, procurando reconstituir a situação que existiria se o acto anulado não tivesse sido praticado.
Nessa reconstituição, cabia-lhe apurar o conteúdo dos actos executivos, tendo, nesse caminho, ponderado o novo quadro legal em vigor, decorrente do novo Regulamento Urbanístico da Figueira da Foz (DR, II Série, nº 230 de 28/11/2012) - que revogou o RUETCU em vigor à data da sentença de anulação -, e ainda a jurisprudência proferida no domínio da mesma matéria, designadamente o Acórdão de 27/05/2011 do TCAN (processo 00516-A/03), onde se decidiu que a actuação apenas terá de consistir na demolição do edificado na medida em que uma nova situação não venha legitimamente afastar essa consequência, sendo que essa nova situação poderá advir da alteração da situação no plano dos factos com realização de trabalhos de correcção e/ou de alteração, ou da emissão de novo(s) acto(s) administrativo(s) no âmbito dos procedimentos urbanísticos e suas consequentes conformações em termos de pressupostos, ou ainda através da modificação do quadro normativo aplicável, na certeza de que o caso julgado será respeitado se, uma vez retomado o procedimento, nele forem desenvolvidos diligências e actos que não revelem padecer da ilegalidade que inquinava o acto licenciador antecedente declarado nulo.
Isto é: não há dúvidas que o Município quis executar a sentença e desenvolveu diligências nesse sentido que culminaram no início da demolição do muro para uma determinada altura. Coisa diversa é entender-se que as operações necessárias a essa execução não estão inteiramente de acordo com a execução que se impõe fazer, nomeadamente que a altura do muro permitida não é de 2,90m mas de 2,50m.
Todavia, esta circunstância não justifica que se imponha, para já, uma sanção pecuniária, porque nada permite deduzir ou concluir que a autarquia não irá cumprir com o que agora foi ditado pela decisão recorrida no que toca à altura do muro.
A postura processual da autarquia, contrariamente ao decidido, foi a de defender apenas um outro conteúdo do dever de executar.
O Tribunal, conforme alegado, interpretou e aplicou erradamente os artsº 44º e 179º/3 do CPTA.
Em suma:
-veio o Executado/Recorrente assacar à sentença erros de julgamento na valoração e fixação da matéria de facto levada ao probatório, pugnando pelo aditamento da factualidade invocada nos artigos 31º a 52º e 59º da contestação;
-examinado o probatório, constata-se que, efectivamente, o Tribunal aí omitiu, pura e simplesmente, a menção a qualquer conduta do Executado e, consequentemente, do próprio Presidente da edilidade, tendente a dar espontâneo cumprimento ao julgado anulatório;
-paralelamente, analisada a fundamentação jurídica da sentença sob recurso, verifica-se que o Senhor Juiz aí debateu e decidiu a questão da imposição da sanção pecuniária compulsória ao Senhor Presidente da Câmara Municipal da Figueira da Foz, sopesando, para tanto, a factualidade que reputou necessária e relevante para a concreta decisão que se lhe impunha;
-o que significa que desconsiderou totalmente essa factualidade, no domínio da fundamentação de facto, impondo-se, por isso, o seu aditamento à factualidade provada;
-é inegável que o Executado é o Município da Figueira da Foz e que o Senhor Presidente da Câmara Municipal da Figueira da Foz, a quem foi imposta a sanção pecuniária compulsória, não interveio a qualquer título nos presentes autos;
-quanto à natureza da aludida sanção decidiu-se no Acórdão do STA de 26/09/2013, rec. 01052/12: “I-A sanção pecuniária compulsória não é um fim em si mesmo: a sua utilização visa obter a realização de uma prestação, judicialmente reconhecida, a que o credor tem direito, constituindo, apenas, uma forma de protecção do credor contra o devedor relapso e um reforço da tutela específica do direito daquele à realização in natura da prestação que por este lhe é devida. II-A sanção pecuniária compulsória é, assim e por definição, um meio indirecto de constrangimento decretado pelo juiz, destinado a induzir o devedor a cumprir a obrigação a que se encontra adstrito e a obedecer à injunção judicial. A sanção pecuniária compulsória é uma condenação acessória da condenação principal do devedor no cumprimento da prestação que deve, visando tal sanção exercer pressão sobre a sua vontade e determiná-lo a cumprir”;
-atento o formato desta figura jurídica e atentando, ainda, na especificidade patente nos autos, forçoso é concluir que in casu estamos perante uma verdadeira sanção pecuniária aplicada a um terceiro, já que nem sequer é o “devedor”, com a agravante de que nunca foi chamado ao processo principal e, outrossim, à presente execução, a fim de fazer valer a sua posição e, assim, se defender de uma condenação que recai, inapelavelmente, na sua esfera jurídica;
-quanto à argumentação apresentada pelo Recorrente diremos que, do processado, emerge que o Executado Município da Figueira da Foz agiu com probidade, já que providenciou no sentido de dar cumprimento ao acórdão exequendo;
-o que vale por dizer que, da matéria fáctica adquirida nos autos, mas não valorada pelo Tribunal a quo, resulta que o Recorrente não se furtou, voluntaria e intencionalmente, a esse cumprimento;
-tal conduz a um entendimento diverso do defendido pelo Tribunal recorrido, quer no que tange à matéria de facto seleccionada e levada ao probatório, quer no tratamento jurídico que deu à concreta questão de direito;
-são destituídos de suporte os juízos de valor formulados pelo Tribunal, quando considerou e decidiu inaceitável a justificação do incumprimento parcial do julgado anulatório, por parte do Recorrente e, ademais, não atendeu às particulares circunstâncias do caso em presença e, como decorrência, condenou o Senhor Presidente da Câmara Municipal da Figueira da Foz, sem que previamente o ouvisse, a fim de auscultá-lo e, assim, poder ponderar as suas razões, na decisão a proferir, quanto a esta específica questão;
-a imposição duma tal sanção, sem a audição do visado, permitindo-lhe a possibilidade de tomar posição sobre a concreta temática e, assim, assegurar o contraditório no âmbito da mesma afigura-se-nos inaceitável e violadora das mais elementares regras de defesa - cfr. artºs 6º, 169º e 179º/3 do CPTA e 3º do CPC;
-a imposição da sanção pecuniária compulsória exige para a sua legitimação/legalidade que seja proferida na sequência da abertura do contraditório, mediante audição do titular do órgão a quem compete dar execução à decisão judicial exequenda - acórdão deste TCAN de 14/12/2012 no proc. 00608-A/99-Coimbra;
-como alegado, a decisão sob escrutínio fez incorrecto julgamento dos factos e errou na interpretação/aplicação dos preceitos visados - artigos 44º, 173º/1 e 179º/3 do CPTA- , pelo que não pode ser mantida na ordem jurídica.
Procedem as conclusões do Recorrente.
***
DECISÃO
Termos em que se concede provimento ao recurso, revogando-se a sentença na parte posta em crise.
Custas pela Recorrida.
Notifique e DN.
Porto, 01/02/2019
Ass. Fernanda Brandão
Ass. Frederico Branco
Ass. Nuno Coutinho