Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00366/04.3BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:01/11/2018
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Ana Patrocínio
Descritores:FACTURAS FALSAS
ÓNUS DA PROVA
PRESCRIÇÃO
DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO
ERROS DE QUANTIFICAÇÃO
Sumário:I - Muito embora a prescrição da obrigação tributária não constitua vício invalidante do acto de liquidação e não seja fundamento da respectiva impugnação, isso não deve impedir que o Tribunal no processo de impugnação não considere a prescrição da obrigação para concluir pela inutilidade superveniente da lide, pois que prescrita a obrigação se torna inútil a decisão sobre a legalidade do acto da liquidação.
II - Para que em sede de impugnação judicial seja proferido julgamento de extinção da instância por inutilidade superveniente da lide (cfr. artigo 287.º, n.º 1, alínea e), do CPC) com fundamento na prescrição da obrigação tributária que teve origem na liquidação impugnada, exige-se que estejam disponíveis do processo todos os elementos que permitam concluir com segurança nesse sentido, designadamente todos os elementos necessários à apreciação de eventuais causas de interrupção e suspensão da prescrição, que poderão ter ocorrido noutros processos administrativos ou contenciosos.
III - No domínio da vigência do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, é pacífico o entendimento de que o artigo 100.º deste diploma estabelece uma causa de suspensão da contagem do prazo de prescrição desde a prolação da sentença que decreta a insolvência até ao termo do respectivo processo, sendo tal causa de suspensão oponível à devedora originária do tributo.
IV – Se, no probatório concretamente impugnado, o Tribunal apenas se limitou a transcrever partes do Relatório elaborado pela Administração Tributária no âmbito da acção inspectiva carece de fundamento a pretensa alteração desses factos com fundamento no depoimento prestado por qualquer testemunha ou outra prova.
V – Compete à administração tributária, quando desconsidera as facturas que reputa de falsas, fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, ou seja, de que existem indícios sérios de que a operação constante da factura não corresponde à realidade e, realizada tal prova, passa a recair sobre o sujeito passivo o ónus da prova da veracidade da transacção (cfr. artigo 74.º da LGT).
VI – Se o impugnante alegar e provar, ainda que parcialmente, a veracidade da transacção, isto é, que pelo menos parte das facturas indiciariamente falsas correspondem a serviços efectivamente prestados, deve a liquidação impugnada ser anulada na parte em que desconsiderou o valor daquelas facturas.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:D..., Lda.
Recorrido 1:Fazenda Pública
Decisão:Concedido parcial provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Relatório

D..., Lda., com o número de identificação de pessoa colectiva 5…e os demais sinais nos autos, interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, proferida em 21/09/2010, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação adicional de IVA do ano de 1997, no valor de €78.133,39.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as conclusões que se reproduzem de seguida:
“I - A presente impugnação respeita a liquidações oficiosas de IVA e juros compensatórios inerentes ao ano de 1997 (Liquidações nºs 01197453 – IVA, 01211246 – IVA, 01197449 – JC, 01211244 – JC, 01197450 – JC, 01197451 – JC, 01211245 – JC e 01197452 - JC), o que significa existir um hiato temporal de 14 (catorze) anos, desde o facto tributário até ao presente.
II - Atento o preceituado nos artigos 34º do C.P.T., 48º e 49º da LGT e 297º, nº1, do Cód. Civil, a causa interruptiva da prescrição que se verificou em primeiro lugar foi a Reclamação Graciosa, apresentada em 24.04.2002, sendo manifesto que após esta data o processo esteve parado durante mais de um ano por facto não imputável à Contribuinte.
III - Mesmo descontando um ano de interrupção causada pela Reclamação Graciosa, já estavam transcorridos 10 anos, 9 meses e 4 dias à data da prolação da douta sentença recorrida, logo, verifica-se a prescrição das obrigações tributárias em causa nestes autos, o que se invoca para todos os efeitos, sem prejuízo do seu conhecimento oficioso (art. 259º C.P.T. e art. 175º C.P.P.T.).
IV - Em absoluta discordância com a douta sentença recorrida, entendemos que a apresentação da impugnação judicial não inutilizou o tempo já decorrido para a prescrição, porquanto a Lei nº 53-A/2006, de 29.12, não tem efeitos retroactivos, logo aqui há que contar com a anterior redacção do nº 2, do art. 49º da L.G.T., segundo a qual “a paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar o efeito previsto no número anterior (interrupção da prescrição) somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação”.
V – A prova produzida apoia o êxito da Impugnação, sendo que a Recorrente impugna o conteúdo substancial da matéria de facto dada como provada nos pontos 4, 7, 8 e 14 da douta sentença posta em crise.
VI - Os factos insertos no ponto 4 respeitam essencialmente aos subempreiteiros J..., R... e P..., pelo que, se foram detectadas irregularidades ou suspeitas de falta de veracidade nas relações destes com a Administração Tributária, não deve a Recorrente ser penalizada no lugar dos pretensos infractores.
VII - Aliás, a Impugnante juntou aos autos de Reclamação Graciosa documentos que desmentem as declarações prestadas pelo R... e pelo P... quando estes, no intuito de alhearem responsabilidades, afirmam que não trabalharam para a ora recorrente ou que o fizeram só uma vez – sem ser exaustiva (não era possível à distância de vários anos), juntou diversos cheques passados a um e a outro, bem assim, alguns autos de medição em que está mencionado o R... como prestador dos serviços.
VIII - Importante é notar que, mesmo tentando escapulir-se às suas próprias obrigações tributárias, o P... não deixou de reconhecer ter recebido uma avultada quantia - 1.696.500$00 / 8.462,11 € - em dinheiro, o que não pode deixar de ponderar-se como prova de que era corrente e normal, no género de subempreitadas em causa, haver pagamentos que não eram titulados por qualquer meio de pagamento (cheque, letra …).
IX - Com a Impugnação Judicial juntou a Impugnante um conjunto significativo de facturas emitidas por si para os empreiteiros principais das obras, o que significa que as construções foram materializadas, têm corpo e podem ser visitadas por quem tiver interesse, constituindo mais uma prova, inequívoca, de que a facturação sobre a qual incidiram as suspeitas não representa operações simuladas.
X - Também não podem ignorar-se as declarações (que se encontram a fls. , destes autos) em que o J... se responsabiliza pelo valor de cada uma das facturas que emitiu para a Impugnante, declarações essas que, como esclareceu a testemunha M... (então empregado de escritório da Recorrente), foram sugeridas pela empresa encarregue da contabilidade, quando a Administração começou a levantar dúvidas sobre a facturação, destinando-se a confirmar e reforçar a veracidade das facturas.
XI - Não é aceitável a desvalorização da prova testemunhal oferecida, constituída pelos depoimentos de V... (00:01 a 12:15, lado A da cassete original dos autos com o nº 359/04.0BEPRT, gravação aproveitada para prova nestes autos, conforme requerimento e douto despacho registados na Acta de Inquirição de Testemunhas) e M... (na fita magnética da cassete nº 1, lado A, rotações 000-2140, destes autos).
XII - Pela audição do registo magnético, e sem perder de vista que se encontram a depor à distância de 10 anos decorridos sobre os factos, as testemunhas foram assertivas quanto a conhecer bem quer a actividade da Impugnante, quer as relações de subempreitada desta com os mencionados subempreiteiros; confirmaram que, nos anos de 1996 e 1997, esses eram dos subempreiteiros habitualmente contratados pela Impugnante, em cujas obras colocavam equipas de vários homens, consoante as necessidades específicas de cada obra; afirmaram serem correntes e normais os pagamentos em dinheiro, até por solicitação dos próprios subempreiteiros que tinham dificuldade em movimentar cheques e vantagem em receber dinheiro “vivo” para poderem pagar no dia-a-dia aos trabalhadores; falando do seu caso pessoal, o Vítor Pinto disse que o patrão lhe pagava sempre em dinheiro e que não estava inscrito na Segurança Social; não tiveram quaisquer dúvidas em comprovar que toda a obra representada nas facturas está corporizada e foi facturada aos empreiteiros gerais / Clientes da Impugnante, não foi inventada.
XIII - Enquanto tal, entre o mais supra aludido, deveria ter-se dado também como provado que:
a) o J... sempre mostrou capacidade de resposta às encomendas de trabalho que aceitou da Impugnante;
b) o R... não só emitiu as facturas constantes do ponto 1.2 do Relatório da Inspecção Tributária, como ainda executou para a Impugnante outros serviços, dos quais nunca passou facturas, como se alcança da relação de obras, quantidades e preços, autos de medição e cheques emitidos pela Impugnante a favor do mesmo e que este recebeu (docs. nºs. 4 a 15, juntos com a Reclamação Graciosa e, entretanto, anexados aos presentes autos);
c) nas relações da Impugnante com os seus clientes e subempreiteiros existem, frequentemente, pagamentos de avultadas quantias em dinheiro;
d) o P... foi também um dos subempreiteiros que trabalharam para a Impugnante, como indicia o conjunto de cheques que esta lhe passou, correspondentes a pagamentos de trabalhos por si executados, em diversas obras, a saber: na Rua Damião de Góis (A…, Lda.), na Cidade do Porto, em Gondim – Maia (C…), Bairro da Sendim (S…) e na Expo 98 (S…) - docs. nºs 16 a 21, juntos com a Reclamação Graciosa, anexada aos presentes autos;
e) toda a obra representada na facturação em causa está materializada e foi facturada pela Impugnante aos seus clientes (docs. nºs 10 a 48, juntos com a petição de impugnação).
XIV - Os contribuintes não precisam demonstrar que os documentos da sua contabilidade correspondem a operações efectivamente realizadas, porquanto essa documentação se presume verdadeira e assim, de acordo com o disposto no art. 74º da LGT, é à Administração Tributária que compete elidir tal presunção. Por isso, a prova de que as transacções ocorreram compete ao contribuinte, desde que a Administração consiga elidir a inerente presunção de veracidade, ou seja, convencer que há indícios fundados de que as facturas não reflectem a realidade, mas uma simulação.
XV - A impugnante fez prova da realização dos trabalhos nas obras identificadas nas facturas, estando tal facto plenamente confirmado na sua contabilidade e, designadamente, nos documentos que acompanharam quer a Reclamação Graciosa, quer a Impugnação Judicial, bem assim nas Declarações emitidas pelo J... (também autuadas) para reforçar a veracidade das facturas que emitiu e nos depoimentos testemunhais.
XVI - Aliás, a Administração Fiscal não põe em causa que as obras foram realizadas a mando da Impugnante, apenas entende que os documentos emitidos pelos sobreditos subempreiteiros não correspondem a operações efectivamente cumpridas por estes, mas não encontrou na contabilidade da Impugnante outros documentos relativos a tais obras, que comprovassem a duplicação de pagamentos, pelo que, a ser como a Administração Fiscal pretende, a impugnante teria como resultado final de tais obras apenas lucros, sem quaisquer custos, uma vez que os valores que diz ter pago seriam falsos.
XVII – É de justiça a procedência da Impugnação Judicial, devendo anular-se a liquidação em causa, por vício de violação de lei, concretamente por ser contrária à verdade material e errónea na qualificação e quantificação dos rendimentos da Impugnante / Recorrente.
XVIII – Aqui tem pertinência o extracto do Acórdão do STA, de 15.11.2000, no Recurso nº 25.244: “ ... não basta o mero «palpite» de que a realidade é diferente daquilo que os documentos traduzem para que a liquidação se pudesse manter. Era necessário que a Administração Fiscal provasse que, de facto, se tinha verificado a situação que a tinha levado a proceder à sindicada liquidação.” SEM PRESCINDIR,
XIX - Os pontos 7 e 8 da matéria de facto dada como provada também estão incorrectamente julgados, porquanto as liquidações em causa padecem de erros de cálculo, como emerge cristalino, quer da compaginação do Projecto de Relatório com o Relatório definitivo da Inspecção Tributária, quer do depoimento da testemunha António Fernando Silva Teixeira, responsável pela contabilidade da Impugnante, entre 1993 e 2003, gravado na fita magnética da cassete nº 1, lado A, rotações 2140-2525, e lado B, 000-1064.
XX - Esta testemunha acompanhou a acção inspectiva e colaborou com o inspector no fornecimento de documentos que lhe foram solicitados, colhendo-se do seu depoimento que, sem margem para dúvidas, ocorreram os seguintes erros de liquidação: a) Dado que o P... confirmou ter prestado para a impugnante os serviços relacionados na sua factura nº 12, de 24.03.97, no valor de Esc. 1.696.500$00, não deveria esta ter contado para o apuramento das correcções efectuadas, como se escreveu no Projecto de Relatório, mas, contraditoriamente, foi considerada no Relatório definitivo, o que implica que as liquidações correctivas levadas a cabo estejam “inflacionadas” com os respectivos valores específicos, ou seja, Esc. 1.450.000$00 / 7.232,57 € de IRC e Esc. 246.500$00 / 1.229,54 € de IVA e, por consequência, também em Esc. 121.906$00 / 608,04 € de juros compensatórios; b) Dado que as facturas nºs 13 e 14, de 30.05.97 e de 30.06.97, respectivamente, emitidas pelo P…, ambas do valor de Esc. 2.500.000$00 + 425.000$00 de IVA, não figuram na conta de subcontratos, nem foram contabilizadas pela Impugnante, não deviam ter entrado nas liquidações correctivas, mas, como entraram, há que concluir que tais liquidações estão também “inflacionadas” em Esc. 5.000.000$00 / 24.939,90 € de IRC e em Esc. 850.000$00 / 4.239,80 € de IVA e ainda nos inerentes juros compensatórios.
XXI - Consequentemente, deveriam ter-se dado como provados os factos integrantes dos arts. 26º a 38º da petição de Impugnação Judicial.
TERMOS EM QUE, E NOS DE DOUTO SUPRIMENTO DE V.EXAS., DEVERÁ SER PROVIDO O RECURSO E, CONSEQUENTEMENTE: A – DECLARAR-SE A EXTINÇÃO DAS OBRIGAÇÕES TRIBUTÁRIAS EM CAUSA, POR PRESCRIÇÃO; OU
B – SER REVOGADA A DOUTA SENTENÇA RECORRIDA E SUBSTITUÍDA POR DECISÃO QUE JULGUE PROCEDENTE A IMPUGNAÇÃO, VIA PELA QUAL SE FARÁ JUSTIÇA!
****
Não houve contra-alegações.
****
O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
****
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
****
II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa decidir se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento sobre a matéria de facto; se o Tribunal a quo errou no julgamento relativo à prescrição ao julgá-la improcedente; se na sentença sob recurso foi efectuado um correcto julgamento quando aí se decidiu pela legalidade da actuação da administração tributária ao corrigir os valores constantes das facturas contabilizadas pela Recorrente, no pressuposto de que as mesmas não titulam operações efectivas, para efeito de dedução do IVA.

III. Fundamentação

1. Matéria de facto

Da sentença prolatada em primeira instância, consta decisão da matéria de facto com o seguinte teor:
“MATÉRIA DE FACTO PROVADA COM RELEVÂNCIA PARA A DECISÃO:
1 - A impugnante foi objecto de uma fiscalização por parte dos Serviços de Inspecção Tributária do Porto, respeitante aos exercícios económicos dos anos de 1997 a 2000.
2 - O objecto social da impugnante consiste na construção de edifícios, sendo especializada na arte de gessos projectados.
3 - Na acção inspectiva identificada em 1) foi apurado pelos respectivos serviços que a ora impugnante havia contabilizado no exercício económico de 1997 (exercício que importa agora analisar), valores correspondentes a facturas emitidas por J..., R... e P....
4 - Os Serviços de Inspecção Tributária concluíram que tais facturas não correspondiam efectivamente a serviços prestados, conforme relatório constante do PA a fls. 70 a 85, e que aqui se dão por reproduzidas, mas cujos extractos a seguir se transcrevem: “A empresa não possui um quadro de pessoal, para o exercício da sua actividade. Deste modo, os serviços a executar são feitos através de subcontratos. (...) 1.2. - Da análise efectuada à conta 6211 - Subcontratos, verificou-se o registo contabilístico de várias facturas emitidas pelos seguintes sujeitos passivos: (...) J... (...) R... (...) P... (....) Foram emitidos pela sociedade diversos cheques para os sujeitos passivos acima referidos como segue: (...) Foi ouvido o sócio gerente Artur Licínio (...) que sucintamente declara que até ao momento não foram encontrados quaisquer contratos ou autos de medição das obras constantes das facturas referidas no ponto 1.2. O serviço da medição das obras era executado por O…, (...) A empresa não possui quaisquer folhas de presença dos sujeitos passivos que emitiram as facturas, em virtude de não serem trabalhadores da empresa, mas sim subempreiteiros. Por último o declarante apresentou dez declarações assinadas com o nome de J.... (...) Quanto às declarações agora apresentadas e que o sócio gerente diz serem de J..., chama-se à atenção para os seguintes factos: (...) As facturas recolhidas na sociedade D..., Lda., e emitidas por J... têm todas elas uma assinatura/rubrica totalmente ilegível. (...) Na consulta efectuada ao arquivo verificou-se que o referido sujeito passivo teve uma acção inspectiva (...) Do relatório elaborado em 09/11/00, consta várias facturas emitidas para a empresa N… (...) no ano de 1997, as quais têm uma assinatura perfeitamente legível, que não corresponde à das facturas encontradas na empresa D… (...) J... (…) não remeteu aos serviços do IVA qualquer declaração periódica referente aos trimestres de 1997
(...) Foi apresentada a declaração de rendimentos (…) relativa ao exercício de 1997, todavia não foram declarados os valores das facturas emitidas para D..., Lda. (...) Não declarou qualquer valor relativamente a remunerações com pessoal. (...) Na nossa deslocação à morada do sujeito passivo, (...) não foi possível estabelecer contacto, a casa encontrava-se abandonada, sendo desconhecido no local qualquer outra morada. (...) Por fim, não há conhecimento que o sujeito passivo tenha qualquer equipamento ou pessoal ao seu serviço, para executar o valor da facturação para D… (...) R... (...) Dos documentos recolhidos na contabilidade da sociedade D… (...) verificou-se que as facturas constantes do ponto 1.2, não entraram na escrita do sujeito passivo (...) O sujeito passivo somente tem registado a factura n° 57 para D…, (...) no ano de 1997 (esta factura não consta da contabilidade da sociedade) (...) O sujeito passivo está indiciado como utilizados de facturação falsa em co-autoria com O… (...) não tem despesas c/pessoal. (...) Foi ouvido (...) em auto de declarações relativo às facturas emitidas em 1997 para D… (...) Sucintamente declara que não emitiu as facturas constantes do ponto 1.2, nem efectuou qualquer serviço para a referida empresa, à excepção do serviço relativo à factura n° 57 de 30/12/97, no valor de 1.000.000$00 (s/IVA). (...) P... (...) não enviou as declarações periódicas do IVA dos trimestres de 1997. (...) não apresentou a declaração de rendimentos mod. 2 do IRS, relativa ao exercício de 1997. (...) foi ouvido em auto de declarações relativo às facturas emitidas em 1997 para D…. (…) sucintamente declara que não efectuou qualquer serviço para a referida empresa, excepto o serviço relativo à factura n° 12 de 24/03/97, no valor de 1.696.500$00, o qual foi recebido a dinheiro. Os cheques emitidos pela sociedade respeitam apenas a comissões sobre os valores facturas. O sujeito passivo esteve em Lisboa na Expo-98. a trabalhar para a referida empresa auferindo uma quantia mensal de 150.000$00, (…) Em face do exposto (...) pode-se concluir que há indícios suficientes para considerar que, os documentos emitidos por J… (...), R… (...) e P… (...) não correspondem a nenhuma transacção comercial, traduzindo-se assim, em facturação falsa.”.
5 - As facturas cujos valores não foram aceites para efeitos de dedução de IVA, encontram-se discriminadas a fls. 80 a 82 do PA e que aqui se dão por reproduzidas.
6 - A fls. 82 onde consta a relação das facturas emitidas pelo P..., encontra-se a seguinte observação: “A factura n° 12 de 24/03/97, não entrou no apuramento das correcções efectuadas em IRC/IVA”.
7 - As notas de liquidação adicional do IVA do ano de 1997 são no valor de 8.144.447$00, €40.624,33 e de Esc: 2.818.500$00, € 14.058,62 e encontram-se a fls. 15 a 16 destes autos e que aqui se dão por reproduzidas.
8 - As liquidações de juros compensatórios encontram-se nas notas de liquidação a fls. 17 a 21 e que aqui se dão por reproduzidas.
9 - A impugnante para o exercício da sua actividade recorre habitualmente a subempreiteiros.
10 - No período de 1996 e 1997 a impugnante tinha várias obras a seu cargo.
11 - No seu quadro de pessoal constam, um engenheiro, um empregado de escritório e um motorista.
12 - Dão-se por aqui por reproduzidas as declarações constantes de fls. 227 a 236 destes autos.
13 - A impugnante apresentou reclamação graciosa contra o acto de liquidação do IVA do ano de 1997 em 24.04.2002, cfr. fls. 2 do processo apenso.
14 - A reclamação graciosa a que se refere a liquidação do IVA ora em discussão não esteve parada por mais de um ano, desde a data da sua apresentação até à apresentação da presente impugnação judicial.
15 - Em 23 de Fevereiro de 2004 foi apresentada a presente impugnação judicial.
16 - No período de 15/12/2004 a 16/02/2006 estes autos estiveram sem qualquer movimentação processual.
17 - Em 04.07.2002 foi instaurada a execução fiscal para cobrança da dívida exequenda.
18 - A ora impugnante foi citada em 26.11.2004 e na mesma data foi emitido o respectivo mandado de penhora, cfr. fls. 49 da execução apensa.
19 - Em 03.10.2009 foi lavrado o auto de penhora e constante da execução a fls. 43 a 45 destes autos.
Alicerçou-se a convicção do Tribunal na consideração da matéria de facto dada como assente, nos factos provados e não impugnados, no teor dos documentos identificados e não impugnados e no depoimento das testemunhas.
FACTOS NÃO PROVADOS:
Não se provou que os serviços mencionados nas facturas identificadas na matéria de facto dada como assente, tenham sido efectivamente prestados por J..., R... e P..., porque a prova testemunhal apresentada foi claramente insuficiente para colocar em causa os factos apurados pela inspecção tributária.
Com efeito, a 1ª testemunha, prestou um depoimento impreciso, confundindo o P… com o R…, não sabendo identificar com precisão quais as obras que estes realizaram, que tipo de serviços em concreto fizeram, limitando-se a referir que os conhece “vagamente” e de “vista”.
No que se refere à segunda testemunha (funcionário de escritório da impugnante), prestou igualmente um depoimento muito vago, limitando-se a afirmar que os serviços mencionados nas facturas foram prestados pelas pessoas em causa e que as conhece, no entanto, não justifica de onde lhe vem esse conhecimento, nem especifica quais as obras realizadas pelas pessoas em causa, até porque a sua função não era, “a de ir às obras”.
Quanto à terceira testemunha, (pessoa responsável pela contabilidade da impugnante), limitou-se a fazer uma apreciação no que se refere ao relatório elaborado pela inspecção tributária com especial incidência sobre questões contabilísticas.”
*
Ao abrigo do disposto na norma do artigo 712.º, n.º 1, alínea a), do Código de Processo Civil (na redacção aplicável) ex vi artigo 281.º do CPPT, decide-se, tendo em conta os documentos ínsitos na reclamação graciosa apensa aos autos, alterar a formulação dada ao ponto 14 do probatório o qual passará a ter a seguinte redacção:
«14. Na reclamação graciosa referida em 13. veio:
- A 23 de Dezembro de 2002, a ser elaborada informação na qual, com fundamento no objecto da reclamação, se propôs a sua apreciação pela Divisão de Processos Criminais Fiscais (cfr. fls. 47 e 48);
- A 20 de Janeiro de 2003, sobre essa informação, foi proferido despacho do Chefe de Finanças em exercício no Serviço de Finanças da Maia 1, ordenando a remessa dos autos à referida Divisão (cfr. fls. 47);
- A 12 de Fevereiro de 2003, e após a análise dos autos, foi ordenada a remessa do processo à Área da Inspecção Tributária a fim de serem prestadas informações e facultados outros elementos julgados por relevantes (cfr. fls. 51);
- Tais informações, apuradas e reduzidas a escrito a 7 de Novembro de 2003, obtiveram a concordância do Chefe de Divisão absorvida no despacho de 10 de Novembro de 2003 (cfr. 52 a 55);
- Devolvidos os autos à DJAC foi elaborado projecto de decisão, notificado à Reclamante a 5 de Dezembro de 2003 que, a 23 desse mesmo mês e ano exerceu o seu direito de audição prévia (cfr. fls. 56 a 65);
- A 27 de Janeiro de 2004 foi proferida decisão final de indeferimento da reclamação, notificada à Reclamante por carta registada a 6 de Fevereiro de 2004 (cf. fls. finais da reclamação graciosa não numeradas).»

Nos termos e com os mesmos fundamentos legais, o Tribunal decide aditar ao probatório fixado na 1ª instância a seguinte matéria de facto:
20. Em 25/01/2008, o processo de execução fiscal vindo a referir foi suspenso devido à declaração de insolvência da ora Recorrente – cfr. fls. 49 da cópia do processo executivo apenso aos autos.
21. Em 20/02/2008, foi dada publicidade à sentença de declaração de insolvência da Recorrente proferida em 25/01/2008 – cfr. Anúncio n.º 1055/2008, publicado no DR, II Série, n.º 36, de 20/02/2008.

2. O Direito

A primeira questão que expressamente vem suscitada pela Recorrente nas suas alegações de recurso, e vertida nas conclusões formuladas, é a da prescrição das obrigações tributárias resultantes dos actos de liquidação aqui impugnados.
Vejamos o que se nos oferece dizer, começando por deixar bem claro que, como é sabido, através da impugnação judicial o que se visa é a fiscalização da legalidade do acto tributário e a consequente anulação, total ou parcial, do mesmo.
Assim, como se referiu no Acórdão deste TCAN, de 11/03/2010, proferido no âmbito do processo n.º 02794/04-Viseu, “a sede própria para invocar a prescrição da obrigação tributária, quando esta não seja oficiosamente conhecida – como deve ser, nos termos do artigo 175.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) – é a execução fiscal, onde o executado pode argui-la, ou mediante requerimento endereçado ao órgão da execução fiscal, com possibilidade de reclamação judicial de eventual decisão desfavorável, nos termos do disposto no artigo 276.º do CPPT, ou, se estiver em tempo, mediante oposição à execução fiscal (cf. arts. 203.º e 204.º, n.º 1, alínea d), do CPPT).
Em todo o caso, o prosseguimento da impugnação, no caso de a obrigação tributária não estar ainda solvida e de ser inquestionável o decurso do prazo da respectiva prescrição, constitui acto inútil: a AT, ainda que a impugnação seja julgada improcedente, não poderá instaurar execução com vista à cobrança da dívida correspondente, bem como deverá oficiosamente declarar extinta a execução, caso esta tenha já sido instaurada. Assim, apesar de a prescrição não poder constituir fundamento de impugnação judicial da liquidação, a jurisprudência tem vindo a admitir que pode ser apreciada nessa sede como motivo da inutilidade superveniente da lide: verificada a prescrição da obrigação tributária, que determina a inexigibilidade da correspondente dívida, com a consequente impossibilidade de cobrança coerciva, a impugnação judicial em que se visa apenas a apreciação da legalidade da liquidação que lhe deu origem deixa de ter utilidade; nesse circunstancialismo, deve extinguir-se a instância por inutilidade superveniente da lide (cf. art. 287.º, n.º 1, alínea e), do CPC).”
Todavia, como também não deixou de se afirmar no mesmo acórdão, “a referida possibilidade de conhecer prejudicialmente da prescrição em sede de impugnação judicial apenas se impõe ao tribunal caso constem dos autos todos os elementos que permitam uma avaliação segura dessa questão (Cf. JORGE LOPES DE SOUSA, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, pág. 22.), tanto mais que, se a obrigação tributária estiver realmente prescrita, sempre a prescrição deverá ser conhecida oficiosamente na execução fiscal, bem como sempre o impugnante aí poderá invocá-la com sucesso, nos termos que deixámos já referidos.”
Ora, no caso vertente, os elementos que constam dos autos, e contrariamente ao defendido pela Recorrente, não permitem concluir no sentido da verificação da prescrição. Vejamos por que motivo.
A sentença recorrida, tendo em vista aferir da utilidade da prossecução da lide, apreciou a questão da prescrição, tendo concluído não se encontrarem as dívidas prescritas, com o que não se conforma a Recorrente, tendo dedicado as primeiras quatro conclusões das suas alegações a essa questão.
Efectivamente, o que está em causa é uma obrigação tributária respeitante a IVA relativo ao ano de 1997, ano em que vigorava o Código de Processo Tributário (CPT).
Ora, tendo em conta que no dia 1 de Janeiro de 1999, entrou em vigor a Lei Geral Tributária (LGT), coloca-se, desde logo, uma questão de aplicação da lei no tempo cuja resolução se impõe no sentido de determinar, prioritariamente, qual o prazo de prescrição da obrigação tributária exequenda.
Importa, pois, como já ficou dito no Acórdão deste TCA Norte a que supra fizemos referência, ver quais os prazos de prescrição das obrigações tributárias que se sucederam no tempo por referência às previsões legais ínsitas no CPT e na LGT.
Ora, de acordo com a norma do artigo 34.º, n.º 1, do CPT, “a obrigação tributária prescreve no prazo de 10 anos, salvo se outro mais curto estiver fixado na lei” e, por sua vez, o artigo 48.º, n.º 1 da LGT determina que “as dívidas tributárias prescrevem, salvo o disposto em lei especial, no prazo de oito anos contados, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário (…)”.Mas, conhecidos os prazos de prescrição que se sucederam no tempo, haverá agora que proceder à determinação do prazo aplicável no caso concreto, o qual encontrará a sua concreta definição no artigo 279.º do Código Civil que, sob a epígrafe “alteração de prazos”, dispõe que:
“1. A lei que estabelecer, para qualquer efeito, um prazo mais curto do que o fixado na lei anterior é também aplicável aos prazos que já estiverem em curso, mas o prazo só se conta a partir da data da entrada em vigor da nova lei, a não ser que, segundo a lei antiga, falte menos tempo para o prazo se completar.
2. A lei que fixar um prazo mais longo é igualmente aplicável aos prazos que já estejam em curso, mas computar-se-á neles todo o tempo decorrido desde o momento inicial.
3. (…)”
Portanto, a determinação do prazo de prescrição a aplicar faz-se no momento da entrada em vigor da nova lei. No caso de leis que encurtam o prazo de prescrição, que são as que têm ocorrido em matéria tributária, se no momento da entrada em vigor da nova lei, falta menos tempo para se completar à face da lei antiga, é esta que se aplica. Nos outros casos, aplica-se o prazo da lei nova, contado da data da sua entrada em vigor [neste sentido, Jorge Lopes de Sousa, Sobre a Prescrição da obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2008, pág. 86 e 87].
Revertendo, agora, ao caso concreto destes autos, em que está em causa uma obrigação tributária relativa ao ano de 1997, temos que, o prazo de prescrição da obrigação tributária, se iniciou em 1 de Janeiro de 1998, por força do estabelecido no artigo 34.º, n.º 2, do CPT [ “o prazo de prescrição conta-se desde o início do ano seguinte àquele em que tiver decorrido o facto tributário, salvo regime especial.”], pelo que, na data da entrada em vigor da LGT (1-1-1999), havia corrido um ano para a prescrição. Ou seja, o tempo que naquela data faltava para o prazo se completar de acordo com a lei antiga é maior do que segundo a lei nova sendo, por isso, de aplicar o prazo de 8 anos previsto na LGT [neste mesmo sentido, Jorge Lopes de Sousa, ob. cit., pág. 98].
Definido, assim, o prazo e lei a aplicar, importa agora apurar se os elementos constantes dos autos permitem concluir sobre a ocorrência, ou não, de factos interruptivos e suspensivos da contagem do prazo prescricional e quais.
A este propósito consta da decisão da matéria de facto que:
13 - A impugnante apresentou reclamação graciosa contra o acto de liquidação do IVA do ano de 1997 em 24.04.2002, cfr. fls. 2 do processo apenso.
14. Na reclamação graciosa referida em 13. veio:
- A 23 de Dezembro de 2002, a ser elaborada informação na qual, com fundamento no objecto da reclamação, se propôs a sua apreciação pela Divisão de Processos Criminais Fiscais (cfr. fls. 47 e 48);
- A 20 de Janeiro de 2003, sobre essa informação, foi proferido despacho do Chefe de Finanças em exercício no Serviço de Finanças da Maia 1, ordenando a remessa dos autos à referida Divisão (cfr. fls. 47);
- A 12 de Fevereiro de 2003, e após a análise dos autos, foi ordenada a remessa do processo à Área da Inspecção Tributária a fim de serem prestadas informações e facultados outros elementos julgados por relevantes (cfr. fls. 51);
- Tais informações, apuradas e reduzidas a escrito a 7 de Novembro de 2003, obtiveram a concordância do Chefe de Divisão absorvida no despacho de 10 de Novembro de 2003 (cfr. 52 a 55);
- Devolvidos os autos à DJAC foi elaborado projecto de decisão, notificado à Reclamante a 5 de Dezembro de 2003 que, a 23 desse mesmo mês e ano exerceu o seu direito de audição prévia (cfr. fls. 56 a 65);
- A 27 de Janeiro de 2004 foi proferida decisão final de indeferimento da reclamação, notificada à Reclamante por carta registada a 6 de Fevereiro de 2004 (cf. fls. finais da reclamação graciosa não numeradas).
15 - Em 23 de Fevereiro de 2004 foi apresentada a presente impugnação judicial.
16 - No período de 15/12/2004 a 16/02/2006 estes autos estiveram sem qualquer movimentação processual.
17 - Em 04.07.2002 foi instaurada a execução fiscal para cobrança da dívida exequenda.
18 - A ora impugnante foi citada em 26.11.2004 e na mesma data foi emitido o respectivo mandado de penhora, cfr. fls. 49 da execução apensa.
19 - Em 03.10.2009 foi lavrado o auto de penhora e constante da execução a fls. 43 a 45 destes autos.
20. Em 25/01/2008, o processo de execução fiscal vindo a referir foi suspenso devido à declaração de insolvência da ora Recorrente – cfr. fls. 49 da cópia do processo executivo apenso aos autos.
21. Em 20/02/2008, foi dada publicidade à sentença de declaração de insolvência da Recorrente proferida em 25/01/2008 – cfr. Anúncio n.º 1055/2008, publicado no DR, II Série, n.º 36, de 20/02/2008.
Ora, a Recorrente sustenta que se encontra demonstrada a prescrição invocada com base no facto de a reclamação graciosa apresentada em 24/02/2002, causa interruptiva que se verificou em primeiro lugar, ter estado parada durante mais de um ano por facto não imputável à contribuinte.
Todavia, compulsando o probatório, não se verifica esta alegada paragem do processo de reclamação graciosa.
É verdade que com a apresentação desta reclamação graciosa em 24/04/2002 se verificou, efectivamente, interrupção do prazo de prescrição (cfr. artigo 49.º, n.º 1 da LGT). Porém, como a partir daí e até à decisão final, o processo não esteve parado por mais de um ano, a referida interrupção teve como efeito a eliminação do prazo decorrido até 24/04/2002, iniciando-se, a partir da data de decisão da reclamação, em 27/01/2004, a contagem de novo prazo de 8 anos (cfr. artigo 326.º, n.º 1 e 327.º, n.º 1 do Código Civil).
Prazo esse que, contudo, viria a ser novamente interrompido a 23/02/2004, com a entrada em juízo da impugnação judicial (artigo 49.º, n.º 1 da LGT).
A Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, deu nova redacção ao n.º 3 do artigo 49.º da LGT estabelecendo que «sem prejuízo do disposto no número seguinte, a interrupção tem lugar uma única vez, com o facto que se verificar em primeiro lugar».
Porém, esta Lei (Orçamento do Estado para 2007) entrou em vigor em 01/01/2007 e, sendo aquela uma norma que estabelece os efeitos (ou não) de factos, ela só se aplica após a sua entrada em vigor, por força da regra do artigo 12.º, n.º 2, do Código Civil (CC).
Por isso, as causas de interrupção da prescrição que ocorreram anteriormente produziram os efeitos que a lei vigente no momento em que elas ocorreram associava à sua ocorrência.
Isso significa, assim, que as causas de interrupção da prescrição que ocorram a partir de 01/01/2007 só têm efeito interruptivo se, antes de elas ocorrerem, não ocorreu qualquer outra com idêntico efeito; mas, as que ocorreram anteriormente têm o seu efeito interruptivo próprio, de eliminar para a prescrição o tempo anteriormente decorrido e obstar ao decurso do prazo de prescrição até ao termo do processo ou até à paragem do processo por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte.
Depois da reclamação graciosa, ocorreu, como referimos, outra causa de interrupção, com a instauração da presente impugnação judicial em 23/02/2004, que esteve parada desde 15/12/2004 a 16/02/2006 – cfr. ponto 16 do probatório.
De seguida, ocorreu uma nova causa de interrupção, com a citação da impugnante (cfr. artigo 49.º da LGT), em 26/11/2004, no âmbito do processo de execução fiscal (cuja cópia se encontra apensa aos autos) e que não teve qualquer movimentação desde a sua autuação, em 04/07/2002, até à citação e desta até à data em que foi lavrado o auto de penhora em 03/10/2009 – cfr. pontos 17, 18 e 19 do probatório.
Estamos, portanto, perante causas de interrupção da prescrição que ocorreram até 01/01/2007, verificando-se a paragem do processo por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte. Assim, a segunda causa interruptiva da prescrição passa a ter efeito suspensivo da prescrição, obstando ao seu decurso entre o momento da instauração do processo e o momento em que se completou esse ano de paragem do processo.
Quando é deduzida a impugnação judicial e efectuada a citação no processo executivo, elas têm o seu efeito interruptivo próprio, eliminando para a prescrição o tempo já decorrido, sendo indiferente que existisse um período que já estava eliminado pelo efeito interruptivo que teve a reclamação graciosa.
Como a impugnação judicial e o processo de execução fiscal também vieram a parar por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte, perderá o seu efeito de eliminar o tempo já decorrido para a prescrição e o seu efeito passará a ser suspensivo, desde a instauração do processo e da citação até se completar um ano de paragem.
Por isso, na situação em apreço, como existe uma sobreposição de datas, contar-se-á para a prescrição, grosso modo, somente o período posterior ao momento em que a impugnação judicial parou por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte, ou seja, desde 15/12/2005 (note-se que desde a decisão final da reclamação graciosa até à instauração da impugnação judicial nem sequer decorreu um mês).
Não obstante os autos não nos darem conhecimento da existência de outras causas interruptivas da prescrição, são igualmente relevantes eventuais causas suspensivas que possam ter ocorrido; havendo que apreciar se o prazo prescricional se suspendeu por efeito de qualquer facto previsto no artigo 49.º, n.º 4 da LGT: “o prazo de prescrição legal suspende-se em virtude de pagamento de prestações legalmente autorizadas, ou enquanto não houver decisão definitiva ou passada em julgado, que puser termo ao processo, nos casos de reclamação, impugnação, recurso ou oposição, quando determinem a suspensão da cobrança da dívida”.
Ora, cumpre notar que das normas contidas nos artigos 169.º, n.º 1 do CPPT e 49.º, nº 3 da LGT decorre que a execução fica suspensa até à decisão do pleito que tenha por objecto a legalidade da dívida exequenda “desde que tenha sido constituída garantia nos termos do artigo 195.º ou prestada nos termos do artigo 199.º ou a penhora garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido” e que o “prazo de prescrição legal suspende-se por motivo de paragem do processo de execução fiscal em virtude de (…) impugnação ou recurso”.
Além disso, a suspensão da execução nos termos do artigo 169.º, n.º 1 do CPPT opera-se, ope legis, por força da prestação de garantia ou efectivação da penhora que garanta a totalidade da quantia exequenda e acrescido, desde que sejam utilizados os meios processuais de discussão da legalidade da dívida exequenda ali elencados – cfr. Acórdão do STA, de 19/12/2012, proferido no âmbito do processo n.º 01372/12.
Trata-se, pois, de acto predominantemente processual em que o órgão de execução fiscal actua no âmbito do processo executivo, vinculado a um quadro normativo que regula o legal andamento do processo, e sujeito a estritas regras e princípios processuais.
Tal significa que, uma vez constituída ou prestada garantia ou realizada penhora de bens suficientes para garantia do pagamento da dívida e acrescido, aliada à pendência de processo de impugnação judicial, fica legalmente suspensa a execução fiscal até à decisão do pleito, e esta suspensão determina, por sua vez, a suspensão do próprio prazo de prescrição que esteja em curso ou daquele que houvesse de reiniciar-se por virtude da cessação de algum efeito interruptivo da prescrição (cfr. Acórdãos do STA, de 04-03-2009, Proc. nº 0160/09, de 26-01-2011, Proc. nº 01/11 e de 25-05-2011, Proc. nº 0465/11). Assim, a presente impugnação judicial, desde que a dívida exequenda esteja garantida ou haja dispensa de prestação de garantia, determina a suspensão do prazo de prescrição até que haja decisão transitada em julgado - cfr. Acórdão do STA, de 08/05/2013, proferido no âmbito do processo n.º 0629/13.
Todavia, ainda antes de ter sido realizada penhora na execução – e de se averiguar se ela garante a quantia exequenda e o acrescido (cfr. ponto 19 do probatório), o processo de execução fiscal foi suspenso devido à declaração de insolvência da ora Recorrente, em 25/01/2008 – cfr. fls. 49 da cópia do processo executivo apenso aos autos e ponto 20 do probatório.
Dispõe o artigo 100.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE) que "a sentença de declaração de insolvência determina a suspensão de todos os prazos de prescrição e de caducidade oponíveis pelo devedor, durante o decurso do processo".
No Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência (CPEREF) existia norma similar - artigo 29.º, n.º 1 -, mas inserida no Título II relativo ao processo de recuperação de empresa, motivo pelo qual a jurisprudência do STA entendia que a declaração de falência não suspendia o prazo de prescrição, com o entendimento de que a remessa da execução fiscal ao tribunal de falência não determinava a sua paragem, uma vez que apensado ao processo de falência com ele seguia a sua normal tramitação - cfr. Acórdãos do STA de 12/06/2007, proc. 0436/07, de 12/03/2008, proc. 01058/07, e mais recentemente, de 17/11/2012, proc. 0115/12.
Assim, no domínio da vigência do CIRE, é pacífico o entendimento de que o artigo 100.º deste diploma estabelece uma causa de suspensão da contagem do prazo de prescrição desde a prolação da sentença que decreta a insolvência até ao termo do respectivo processo, sendo tal causa de suspensão oponível à devedora originária do tributo, ora Recorrente.
Por tudo o exposto, somente a partir de 15/12/2005 se considera a contagem do prazo prescricional, e por virtude da suspensão, “a prescrição não começa nem corre” – cfr. artigo 318.º, do Código Civil, até 25/01/2008 (data da prolação da sentença que decretou a insolvência da Recorrente).
Os elementos dos autos não permitem percepcionar quando terá ocorrido o termo do processo de insolvência, pelo que, sem mais, não se mostra inquestionável a prescrição, tudo indicando ser útil o conhecimento do presente recurso.
Esteve bem, pois, o Tribunal a quo, ao não julgar procedente o pedido de declaração de prescrição da dívida exequenda, confirmando-se, assim, nesta parte, a decisão recorrida.
No entanto, como havíamos referido, se a obrigação tributária estiver realmente prescrita, sempre a prescrição deverá ser conhecida oficiosamente na execução fiscal, bem como sempre o Recorrente aí poderá invocá-la com sucesso.

Passemos, então, à análise das restantes questões colocadas no recurso, começando-se pelo erro de julgamento em sede de matéria de facto, já que a Recorrente impugna o conteúdo substancial da matéria de facto dada como provada nos pontos 4, 7, 8 e 14 da sentença recorrida.
Entende a Recorrente que foi efectuada prova inequívoca nos autos de que a facturação sobre a qual incidiram as suspeitas não representa operações simuladas, tendo feito prova da realização dos trabalhos nas obras identificadas nas facturas, estando tal facto plenamente confirmado na sua contabilidade, designadamente, nos documentos que acompanharam quer a reclamação graciosa, quer a impugnação judicial, bem assim nas declarações prestadas pelo J... para reforçar a veracidade das facturas que emitiu e nos depoimentos testemunhais.
Afigura-se-nos, porém, que não lhe assiste razão e, mais do que isso, que a Recorrente labora em erro manifesto de interpretação da selecção de facto realizada.
Efectivamente, a factualidade vertida no ponto 4 constitui mera transcrição de partes do relatório elaborado pela Administração Tributária após a realização da acção inspectiva. Isto é, o Tribunal, e nesta parte bem, exarou ou seleccionou como facto relevante o teor do relatório da Administração Tributária e no qual esta expôs os factos, documentos e raciocínio seguido até concluir pela existência de indícios de facturação falsa por parte da Recorrente e sustentava a legitimidade da liquidação adicional correctiva.
E que assim é resulta à saciedade quer da redacção utilizada, quer da utilização de aspas antes das transcrições respectivas quer, por último, pela remissão expressa em sede de fundamentação para as folhas do relatório cujas partes se afirmava transcrever.
Carece, pois, de razão, e adiantamos mesmo, de qualquer sentido, a pretensa alteração desse facto, o mesmo é dizer, do relatório efectivamente produzido com fundamento no depoimento prestado por quaisquer testemunhas (ou outras provas) que, se susceptíveis de porem em causa os factos ou conclusões extraídas e vertidas no mesmo Relatório de todo não apagam o conteúdo que lhe foi imprimido.
Improcede, pois, nesta parte, o recurso relativo à matéria de facto.
De todo o modo, o tribunal recorrido não elencou na decisão da matéria de facto factos simples, mas antes, em alguns casos, juízos de valor, conclusões de facto e de direito que condicionam irremediavelmente a subsunção ao direito e o desfecho da acção. A matéria não provada é o exemplo mais gritante de uma conclusão de facto que condicionou forçosamente o desfecho da impugnação:
“Não se provou que os serviços mencionados nas facturas identificadas na matéria de facto dada como assente, tenham sido efectivamente prestados por J..., R... e P...”.
Saber se os serviços mencionados nas facturas foram ou não realmente prestados é a conclusão a que o tribunal terá que chegar a partir de factos simples alegados e provados.
Nesta conformidade, a matéria não provada constante da decisão recorrida nunca poderia manter-se, tendo-se como não escrita, nos termos do disposto no artigo 646.º, n.º 4 do Código de Processo Civil, na redacção aplicável à data.
Mas a Recorrente sustenta ainda o erro de julgamento relativo à matéria de facto alegando que, face aos depoimentos prestados pelas testemunhas, cuja desvalorização, sem fundamento, foi realizada pelo Tribunal, e face ao teor dos documentos constantes dos autos, deveriam ainda ter sido dados como assentes os seguintes factos:
a) o J... sempre mostrou capacidade de resposta às encomendas de trabalho que aceitou da Impugnante;
b) o R... não só emitiu as facturas constantes do ponto 1.2 do Relatório da Inspecção Tributária, como ainda executou para a Impugnante outros serviços, dos quais nunca passou facturas, como se alcança da relação de obras, quantidades e preços, autos de medição e cheques emitidos pela Impugnante a favor do mesmo e que este recebeu (docs. nºs. 4 a 15, juntos com a Reclamação Graciosa e, entretanto, anexados aos presentes autos);
c) nas relações da Impugnante com os seus clientes e subempreiteiros existem, frequentemente, pagamentos de avultadas quantias em dinheiro;
d) o P... foi também um dos subempreiteiros que trabalharam para a Impugnante, como indicia o conjunto de cheques que esta lhe passou, correspondentes a pagamentos de trabalhos por si executados, em diversas obras, a saber: na Rua Damião de Góis (A..., Lda.), na Cidade do Porto, em Gondim – Maia (C...), Bairro da Sendim (S...) e na Expo 98 (S...) - docs. nºs 16 a 21, juntos com a Reclamação Graciosa, anexada aos presentes autos;
e) toda a obra representada na facturação em causa está materializada e foi facturada pela Impugnante aos seus clientes (docs. nºs 10 a 48, juntos com a petição de impugnação).
Adiantemos, desde já, que, pese embora a formulação conclusiva de parte dos factos cuja incorporação no probatório é peticionada ou a inadmissível inclusão, em sede de matéria de facto de elementos que apenas poderiam ser relevados como fundamento ou elemento de prova, ligação que é patente na formulação dos factos supra proposta, existem factos que podem ser colhidos das declarações prestadas - e da conjugação destes com documentos constantes dos autos - que podem ser relevantes para a decisão de mérito e que este Tribunal pode e deve seleccionar.
Na verdade, do depoimento das testemunhas resulta que J..., R... e P... eram subempreiteiros a que a Recorrente recorria, entre outras, para realizar obras que lhe eram adjudicadas e que muitas vezes a Recorrente realizava pagamento de serviços de subempreitada em numerário.
Estas foram respostas directas dadas pelas testemunhas ouvidas, M... e V..., respectivamente empregado da Recorrente e trabalhador de um terceiro empreiteiro.
Porém, contrariamente ao pretendido pela Recorrente, dos mesmos depoimentos, ou mesmo da conjugação destes com os citados documentos constantes dos autos, não pode dar-se como assente nada mais do que isso.
Assim, nenhuma das testemunhas disse ter conhecimento das facturas em causa nos autos ou de que esses trabalhos prestados por aqueles subempreiteiros o tivessem sido no ano de 1997.
Por outro lado, das facturas emitidas e que constituem os documentos n.ºs 23 a 61 do processo físico tudo quanto se pode concluir é que tais obras foram efectivamente realizadas pela Recorrente, com recurso a subempreiteiros mas não que no âmbito das mesmas haja existido qualquer prestação de serviço pelos referidos J..., R... ou P... ou, tendo-o sido, qual o seu valor.
Acresce ainda que, no que tange aos cheques cujas cópias constam de fls. 124 a 135 do processo físico, alguns destes com identificação da pessoa à ordem de quem eram emitidos – R... ou P..., foram emitidos no ano de 1997 e um no ano de 1998 (embora surja rasurado), o que até está em conformidade com as declarações prestadas pelos próprios sacadores em sede de inspecção e com as declarações apresentadas por estes em sede fiscal.
Donde, pode-se concluir que, do facto de a Recorrente recorrer habitualmente a subempreiteiros e de J..., R... ou P... serem empreiteiros a quem a Recorrente, regular ou esporadicamente, recorreu para a realização de obras, tal como outros, é inteiramente irrelevante para demonstrar que lhe prestaram os serviços que constam das facturas.
Em suma, para que o Tribunal de 1ª instância, ou este Tribunal em sua substituição, pudesse dar como provado que os referidos subempreiteiros realizaram os trabalhos constantes das referidas facturas postas em causa pela Administração Tributária, impunha-se que tivesse resultado dos depoimentos prestados ou da sua conjugação com os documentos dos autos, de modo pormenorizado e inequívoco, quais os concretos serviços prestados por aqueles, em que condições contratuais e quais as datas da sua realização.
O que, como já mencionamos, no caso, não sucedeu, quer porque nessa matéria os depoimentos não foram claros nem precisos, quer porque os documentos juntos pela Recorrente e que a mesma refere como sendo susceptíveis de demonstrar que os serviços constantes das facturas foram prestados pelo seu emitente são a esse propósito, salvo o devido respeito, completamente inócuos pelas razões já supra expostas.
Contudo, o Tribunal, julgando parcialmente procedente o recurso interposto, em parte relativa ao julgamento de facto, adita ao probatório factualidade com o seguinte teor (além da que já havia aditado supra):
22. J..., R... e P... eram alguns dos subempreiteiros a que a Impugnante recorreu no exercício da sua actividade nos anos de 1996 e 1997 [depoimento das testemunhas e relatório da inspecção].
23. A Recorrente realizava muitas vezes pagamentos em numerário aos subempreiteiros a que recorria, incluindo os subempreiteiros identificados no ponto antecedente [depoimento das testemunhas].
24. Encontram-se nos autos declarações emitidas por J... a 30 de Março, 30 de Outubro, 30 de Novembro e 30 de Dezembro de 1997, cuja apresentação foi realizada perante a Administração Tributária no âmbito da inspecção realizada e nas quais aquele subempreiteiro assume a responsabilidade pela emissão das facturas infra descriminadas e pelos valores nelas apostos:
. factura n.º 49, de 30-03-97, no valor de Esc. 2.649.962$00;
. factura n.º 19, de 30-10-97, no valor de Esc. 12.850.000$00;
. factura n.º 20, de 30-11-97, no valor de Esc. 11.682.450$00;
. factura n.º 21, de 30-12-97, no valor de Esc. 4.071.600$00;
. factura n.º 26, de 30-12-97, no valor de Esc. 4.680.000$00; [cf. fls. 232 a 236 do processo físico e relatório de inspecção, ponto 1.2.).
No que tange ao ponto 14 da decisão da matéria de facto, embora a Recorrente pugne pela sua alteração, por entender que a reclamação graciosa esteve parada durante mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte, o certo é que a modificação que já lhe foi efectuada supra não permite retirar essa conclusão, como vimos.
Por último, também os pontos 7 e 8 da decisão da matéria de facto se mostram impugnados:
“7 - As notas de liquidação adicional do IVA do ano de 1997 são no valor de 8.144.447$00, €40.624,33 e de Esc: 2.818.500$00, € 14.058,62 e encontram-se a fls. 15 a 16 destes autos e que aqui se dão por reproduzidas.
8 - As liquidações de juros compensatórios encontram-se nas notas de liquidação a fls. 17 a 21 e que aqui se dão por reproduzidas.”
Sustenta a Recorrente que as liquidações em causa padecem de erros de cálculo, apoiando-se na compaginação do projecto de relatório com o Relatório definitivo de Inspecção Tributária, bem como no depoimento da testemunha António Fernando Silva Teixeira, responsável pela contabilidade da impugnante, entre 1993 e 2003.
No entanto, se bem entendemos, a Recorrente invocou erros no cálculo das próprias liquidações, não se vislumbrando que a factualidade vertida nos pontos 7 e 8 esteja desconforme com os documentos que a suportam, antes pelo contrário, reflecte precisamente alguns elementos aí constantes e ter-se considerado reproduzido cada um desses documentos assegura uma completa percepção do teor dos mesmos (apesar da técnica jurídica não ser a mais feliz, dado que na decisão da matéria de facto pretende-se elencar factos simples e não transcrever ou reproduzir documentos).
Mas, na última conclusão das alegações, a Recorrente afirmou que deveriam ter-se dado como provados os factos integrantes dos artigos 26.º a 38.º da petição de Impugnação Judicial, tendo em vista, certamente, demonstrar os erros de cálculo detectados.
Ora, o artigo 26.º da petição inicial é somente uma conclusão ao afirmar que as liquidações estão inquinadas de erros de cálculo, não sendo possível, por isso, levar tal matéria ao probatório.
O teor do artigo 27.º do mesmo articulado já se mostra vertido no ponto 4 da decisão da matéria de facto, que se refere à factualidade e à motivação constante do Relatório de Inspecção Tributária, já aí estando transcrito que o P... confirmou ter prestado à Impugnante os serviços relativos à sua factura n.º 12, de 24/03/1997, no valor de Esc. 1696.500$00 (1450.000$00+246.500$00 de IVA) que recebeu em dinheiro.
O artigo 28.º está acautelado no ponto 6 da decisão da matéria de facto, consubstanciando, por isso, também uma repetição inútil o aditamento de tal factualidade.
Os artigos 29.º a 38.º encerram essencialmente matéria conclusiva e de direito, por forma a evidenciar e fundamentar os erros cometidos no próprio relatório de inspecção e na transposição das correcções constantes da decisão final para as liquidações adicionais.
De todo o modo, considerando a alegação, os elementos disponíveis, consubstanciados em documentos ínsitos nos autos em concatenação com o depoimento da testemunha, António Fernando Silva Teixeira, responsável pela contabilidade da Impugnante, impõe-se, para melhor análise e esclarecimento dos invocados erros, aditar, igualmente, a seguinte factualidade, nos termos do artigo 712.º do CPC:
25. Na relação das facturas emitidas por P…, o resultado da soma das diversas parcelas correspondentes a IVA teve em conta o valor deste imposto constante da factura/recibo n.º 12, de 24/03/1997, no montante de 246.500$00, conforme seguinte concretização da operação: 46.500$00+425.000$00+425.000$00+425.000$00+425.000$00+425.000$00+425.000$00+425.000$00+425.000$00=3.646.500$00 – cfr. fls. 82 do processo administrativo apenso, correspondente ao terceiro anexo do relatório inspectivo.
26. As facturas n.º 13 e n.º 14 emitidas por P…, ambas no montante de Esc. 2.500.000$00+Esc.425.000$00 referente a IVA, respectivamente em 30/05/1997 e 30/06/1997, não figuram na conta “6211 – Subcontratos” da contabilidade da Recorrente – cfr. fls. 16 a 22 da reclamação graciosa apensa aos autos e fls. 111 a 117 do processo físico.

Mas a Recorrente vem ainda imputar à sentença recorrida erro de julgamento de direito por ter concluído pela legalidade da actuação da administração tributária ao desconsiderar as facturas contabilizadas pela Recorrente no pressuposto de que as mesmas não titulam operações efectivas.
Vejamos, pois, se nesta parte assiste razão à Recorrente sendo que, nesse sentido, importará, antes de mais, apurar se a Administração Fiscal reuniu, ou não, os elementos necessários que legitimassem a sua actuação, isto é, que as facturas em causa eram falsas (fundamentação substancial) e se tais factos se encontram acolhidos no probatório da sentença posta em crise.
A este propósito importa desde já salientar que, como tem sido jurisprudência uniforme deste Tribunal, aplicando as regras do ónus da prova do artigo 74.º da LGT, compete à administração tributária, quando desconsidera as facturas que reputa de falsas, fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, ou seja, de que existem indícios sérios de que a operação constante da factura não corresponde à realidade.
E que, realizada tal prova, passa a recair sobre o sujeito passivo o ónus da prova da veracidade da transacção [cfr., entre muitos outros, Acórdãos do TCA Norte de 24-01-2008, processo n.º 01834/04 Viseu, de 24-01-2008, processo n.º 2887/04 Viseu, de 27-01-2011, processo n.º 455/05.7BEPNF e de 18-03-2011, processo n.º 456/05BEPNF].
Ora, tendo nós visto já o que diz a Recorrente relativamente à fundamentação da Administração Fiscal [cfr. as alegações de recurso e em especial as suas conclusões VI e seguintes) vejamos agora quais os factos invocados pela Administração Tributária para desconsiderar as facturas a fim de poderemos concluir, ou não, que aquela recolheu indícios sérios de que a operação referida naquelas facturas foi simulada. Tudo, em ordem a ajuizarmos do acerto, ou não, da conclusão extraída pelo Tribunal a quo na sentença sob recurso de que a administração tributária fez a prova que lhe competia da verificação de indícios que permitem concluir que as facturas contabilizadas pela Impugnante são falsas por às mesmas não subjazerem as prestações de serviços que, alegadamente, teriam implicado a respectiva emissão.
Tendo, porém, sempre presente que (i) não é imperioso que a administração tributária efectue uma prova directa da simulação já que, «como em muitos outros casos, haverá que recorrer à prova indirecta, a “factos indiciantes, dos quais se procurará extrair, com o auxílio das regras de experiência comum, da ciência ou da técnica, uma ilação quanto aos factos indiciados. A conclusão ou prova não se obtém directamente, mas indirectamente, através de um juízo de relacionação normal entre o indício e o tema de prova” – cfr. Alberto Xavier, Conceito e Natureza do Acto Tributário, pág. 154.» e (ii) uma delimitação ou definição muito clara de indícios identificados como factos que “permitem concluir pela verificação ou não verificação de outros factos, em virtude de leis naturais conhecidas pelos homens e que funcionam como máximas de experiência” (cfr., João de Castro Mendes citado por José Luís Saldanha Sanches, in «A Quantificação da Obrigação Tributária, 2ª edição, pág. 311»).
Ora, conforme resulta dos autos, mais concretamente do Relatório de Inspecção e do acolhimento de tais factos no probatório, a Administração Tributária considerou que as facturas contabilizadas pela Recorrente não correspondem a efectivas operações, essencialmente, com base nos seguintes factos indiciários:
- A Impugnante está registada em IRC/IVA pela actividade de “Construção de Edifícios/Gessos projectados - CAE 45211” e que “não possui um quadro de pessoal para o exercício da sua actividade. Deste modo os serviços são feitos através de subcontratos”.
- Detectou-se na conta 6211 - Subcontratos, o registo contabilístico de várias facturas emitidas por: J... - contribuinte n° 1…, R... - contribuinte no 1…e P... - contribuinte n° 1…, que os SPIT consideraram como falsas.
- Os SIT alicerçaram a sua decisão dizendo que “Foi ouvido o sócio gerente Artur… - 1…, em auto de declarações, que sucintamente declara que até ao momento não foram encontrados quaisquer contratos ou autos de medição das obras constantes das facturas referidas no ponto 1.2. O serviço da medição das obras era executado por O…, contribuinte n° 1…, (...) A empresa não possui quaisquer folhas de presença dos sujeitos passivos que emitiram as facturas, em virtude de não serem trabalhadores da empresa, mas sim subempreiteiros. Por último o declarante apresentou dez declarações assinadas com o nome de J.... Quanto às declarações agora apresentadas e que o sócio gerente diz serem de J..., chama-se a atenção para os seguintes factos: As facturas recolhidas na sociedade D…, Lda., e emitidas por J... têm todas elas uma assinatura / rubrica totalmente ilegível. Na consulta efectuada ao arquivo verificou-se que o referido sujeito passivo teve uma acção inspectiva através do despacho n° 18819. Do relatório elaborado em 09/11/00, consta várias facturas emitidas para a empresa N…, Lda., 5…, no ano de 1997, as quais têm uma assinatura perfeitamente legível, que não corresponde à das facturas encontradas na empresa D..., Lda., é de estranhar assim, que agora surjam dez declarações nas quais J..., se responsabiliza pelo valor das facturas emitidas para a sociedade em causa. Finalmente pode-se concluir que as assinaturas nelas contidas são parecidas com as que constam nas facturas emitidas para a empresa N….
- Em relação ao J..., “encontra-se inscrito no cadastro IVA/IR, pelo exercício de actividade de construção de edifícios - CAE 045200, tendo em consideração as designações constantes das facturas, os serviços nelas contidos referem-se a estucagem/aplicação de gesso projectado (...) Enviou as declarações periódicas de IVA relativas ao 2ºT/96, 3ºT/96 e 4ºT/96 (…) pelos documentos recolhidos na contabilidade da sociedade D..., Lda., verifica-se que os valores constantes das facturas de 1996 não entraram na respectiva declaração periódica. Por outro lado não remeteu aos serviços do IVA qualquer declaração periódica referente aos trimestres de 1997”.
- J... “Não apresentou a declaração de rendimentos de 1996. Foi apresentada declaração de rendimentos mod./2 do IRS, relativa ao exercício de 1997, todavia não foram declarados os valores das facturas emitidas para D..., Lda. (…) não declarou qualquer valor relativamente a remunerações com pessoal. (…) Por fim não há conhecimento que o sujeito passivo tenha qualquer equipamento ou pessoal ao seu serviço, para executar o valor da facturação para D..., Lda.”
- Relativamente ao sujeito passivo R..., os SPJT apuraram que “o sujeito passivo encontra-se inscrito no cadastro de IR/IVA pelo exercício da actividade de acabamento n.e. - CAE 045450, desde 04/01/1994. Tendo em consideração as designações constantes das facturas, os serviços nelas contidos referem-se a estucagem/aplicação de gesso projectado. (...) Dos documentos recolhidos na contabilidade da sociedade D..., Lda., verificou-se que as facturas constantes do ponto 1.2 não entraram na escrita do sujeito passivo. O sujeito passivo somente tem registada a factura n° 57 para D..., Lda., no ano de 1997 (esta factura não consta da contabilidade da sociedade). O sujeito passivo está indiciado como utilizador de facturação falsa em co- autoria com O…. O sujeito passivo não tem despesas com pessoal. Foi ouvido o sujeito passivo em auto de declarações relativo às facturas emitidas em 1997 para D..., Lda. Sucintamente declara que não emitiu as facturas constantes do ponto 1.2., nem efectuou qualquer serviço para a referida empresa, à excepção do serviço relativo à factura n° 57 de 30/12797, no valor de 1.000.000$00 (s/IVA). Esta factura encontra-se registada e arquivada na sua escrita”.
- Quanto ao P..., os SPIT apuraram que “o sujeito passivo encontra-se inscrito no cadastro de IR/IVA, pelo exercício da actividade de pintura e colocação de vidros – CAE 045440, desde 8/11/1995, tendo em consideração as designações constantes das facturas, os serviços nelas contidos referem-se a estucagem/aplicação de gesso projectado. (...). Foi ouvido o sujeito passivo em auto de declarações relativo às facturas emitidas em 1997 para D... Lda. Sucintamente declara que não efectuou qualquer serviço para a referida empresa, excepto o serviço relativo à factura n° 12 de 24/03/97, no valor de 1.696.500$00 o qual foi recebido a dinheiro. Os cheques emitidos pela sociedade respeitam apenas a comissões sobre os valores facturados. O sujeito passivo esteve em Lisboa na Expo-98, a trabalhar para a referida empresa auferindo uma quantia mensal de 150.000$00”.
- Em face destas conclusões os SPIT consideraram que “pode-se concluir que há indícios suficientes para considerar que, os documentos emitidos por J..., R... e P... não correspondem a nenhuma transacção comercial, traduzindo-se, assim, em facturação falsa” e por essa razão foi feita a correcção aritmética para efeitos de IVA, do ano de 1997, sendo considerado imposto indevidamente deduzido no montante de 10.962.947$00, tendo sido processadas notas de apuramento mod/382 para arrecadação do imposto em falta, que originou as liquidações adicionais n.º 01197453 no montante de Esc. 8.144.447$00 (€40.624,33) e n.º 01211246 no montante de Esc.2.818.500$00 (€14.058,62) e respectivas liquidações de juros compensatórios.
Como se disse no Acórdão deste Tribunal Central Administrativo de 09/02/2012, proferido no âmbito do processo n.º 359/04.0BEPRT, a que vimos fazendo referência e em que esta questão foi igualmente analisada no âmbito de um processo que opunha as mesmas partes, divergindo tão-só no tipo de imposto (IRC de 1996), «Estes “factos-índice”, analisados de forma integrada em concatenação e vistos à luz das regras da experiência, são suficientes para permitir justificar a actuação da administração tributária no sentido de desconsiderar o IVA constante das facturas, com o fundamento de que as operações referidas nessa factura são simuladas.»
Mais se diz no mesmo acórdão, que «Particularmente impressivo é, a nosso ver, o facto de os pagamentos dos elevados montantes titulados pelas facturas terem sido registados contabilisticamente a partir da conta Caixa, o que equivale a dizer que teriam sido feitos, alegadamente, pela utilização de numerário» (…)
Tudo, para aí se concluir, «(…) que a administração tributária demonstrou os pressupostos da sua actuação, passou a caber à Impugnante a prova de que as facturas titulam e documentam efectivas prestações de serviços.
Conclusão que, forçosamente, tem que ser realizada nestes autos, pois destes não consta como apurada qualquer factualidade que, considerada que fosse permitisse concluir de modo diverso.
Efectivamente, não vemos como possa defender-se que a Administração, face à factualidade que vimos relevando, na ausência doutros elementos documentais e, considerando, em especial o teor das declarações produzidas por dois dos alegados emitentes das facturas (R... e P...) pudesse ter agido doutro modo, ou seja, pudesse ter entendido que os factos recolhidos eram irrelevantes do ponto de vista da legitimação do dever de verdade da Impugnante perante as declarações fiscais prestadas perante a Administração Fiscal.
Tais factos, repita-se, são manifestamente indiciadores de que havia uma probabilidade séria de que as facturas emitidas não correspondiam a efectivas transacções ou, o mesmo é dizer que, no caso concreto, a Administração Tributária fez prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, ou seja, de que existem indícios sérios de que a operação constante da factura não corresponde à realidade.
Mas sendo assim, e tendo aqui em consideração a repartição de ónus de prova a que supra fizemos alusão, passou a recair sobre o sujeito passivo o ónus da prova da veracidade da transacção. (…)»
Ora, é precisamente nesta sede que este Tribunal não pode subscrever integralmente, face à prova produzida, o entendimento professado na sentença recorrida, à semelhança do julgamento efectuado no Acórdão deste TCAN, de 09/02/2012, proferido no âmbito do processo n.º 359/04.0BEPRT.
É que, como resulta dos factos apurados, se relativamente às facturas apresentadas e emitidas por R... e P..., a Impugnante não logrou provar, minimamente, que tais facturas titulem verdadeiras operações materiais, o mesmo não ocorreu no que concerne às facturas emitidas por J....
Efectivamente, resulta dos factos apurados que a Impugnante no exercício da sua actividade recorria a subempreiteiros, que um desses subempreiteiros a que recorria nos anos de 1996 e 1997 era J..., que muitas vezes procedia ao pagamento dos valores facturados em numerário e que esse subempreiteiro declarou, em 30 de Março, 30 de Outubro, 30 de Novembro e 30 de Dezembro de 1997, isto é, muito antes do início da realização da acção inspectiva, assumir a responsabilidade total pelos valores constantes das facturas 49, 19, 20, 21 e 26, todas do ano de 1997, no valor total de Esc. 35.934.012$00, precisamente as facturas (e valor), apresentados pela Impugnante em sede de IVA do ano de 1997 e que não foram aceites para efeitos de dedução de IVA (Esc. 5.139.087$00) pela Administração Tributária [cfr. factualidade apurada em 3, 4, 5, 22, 23 e 24].
E não se diga que a alegada ilegibilidade da assinatura de J... nessas declarações ou a existência de inquéritos – crime, em que o referido J... possa ser arguido ou estar indiciado pela eventual prática de crimes de fraude fiscal, afastam a prova realizada já que, nem tal ilegibilidade ou desconformidade de assinatura se mostra comprovada nos autos, nem foi realizada prova de pendência desses processos-crime e, muito menos, da que nesses processos haja sido, pelos factos e facturas vertidos na inspecção destes autos, condenado pelos crimes que alegadamente lhe são imputados.
Donde, e salvo melhor opinião, não assiste razão para que não seja concluído que a Impugnante cumpriu o ónus de prova que sobre si impedia de demonstração da veracidade das operações subjacentes à emissão de tais facturas e, consequentemente, pela procedência, nesta parte, da impugnação judicial deduzida e a subsequente anulação parcial da liquidação efectuada.

Por fim, sustenta, ainda, a Recorrente que ocorreram os seguintes erros de liquidação:
a) Dado que o P... confirmou ter prestado para a impugnante os serviços relacionados na sua factura n.º 12, de 24.03.97, no valor de Esc. 1.696.500$00, não deveria esta ter contado para o apuramento das correcções efectuadas, como se escreveu no Projecto de Relatório, mas, contraditoriamente, foi considerada no Relatório definitivo, o que implica que as liquidações correctivas levadas a cabo estejam “inflacionadas” com os respectivos valores específicos, ou seja, Esc. 1.450.000$00/7.232,57€ de IRC e Esc. 246.500$00/1.229,54 € de IVA e, por consequência, também em Esc. 121.906$00/608,04 € de juros compensatórios;
b) Dado que as facturas nºs 13 e 14, de 30.05.97 e de 30.06.97, respectivamente, emitidas pelo P…, ambas do valor de Esc. 2.500.000$00 + 425.000$00 de IVA, não figuram na conta de subcontratos, nem foram contabilizadas pela Impugnante, não deviam ter entrado nas liquidações correctivas, mas, como entraram, há que concluir que tais liquidações estão também “inflacionadas” em Esc. 5.000.000$00/24.939,90€ de IRC e em Esc. 850.000$00/4.239,80€ de IVA e ainda nos inerentes juros compensatórios.
Estas questões já haviam sido colocadas em sede de reclamação graciosa e na presente impugnação judicial. A decisão da reclamação omitiu pronúncia sobre as mesmas e a sentença recorrida julgou o seguinte:
“Ora, resulta da matéria de facto dada como assente que as facturas objecto de correcção e respeitantes ao ano de 1997 são as constantes de fls. 80, 81 e 82 do PA. Se efectuarmos o confronto entre os valores apurados pela inspecção tributária e os constantes das notas de liquidação adicionais (actos tributários impugnados), concluímos que os valores em causa são os mesmos, pelo que não há qualquer lapso de cálculo”.
Note-se que a Administração Tributária ao longo de todo o procedimento e processo judicial nunca emitiu qualquer observação acerca destes alegados erros.
Efectivamente, quanto à factura n.º 12, de 24/03/1997, emitida por P..., tudo aponta para um erro de cálculo.
Por um lado, a fundamentação do relatório de inspecção aponta claramente para a veracidade dos serviços prestados que contam desta factura, dado que o próprio P... declara não ter efectuado qualquer serviço para a Recorrente, excepto o serviço relativo à factura n.º 12 de 24/03/97, no valor de 1.696.500$00, o qual foi recebido a dinheiro – cfr. ponto 4 do probatório.
Por outro lado, resulta provado, no ponto 6 da decisão da matéria de facto, que a fls. 82 onde consta a relação das facturas emitidas pelo P..., se encontra a seguinte observação: “A factura n° 12 de 24/03/97, não entrou no apuramento das correcções efectuadas em IRC/IVA”.
Contudo, o resultado da soma das diversas parcelas de IVA em falta aponta inequivocamente para a consideração do IVA constante dessa factura n.º 12 – cfr. ponto 25 aditado ao probatório:
“25. Na relação das facturas emitidas por P…, o resultado da soma das diversas parcelas correspondentes a IVA teve em conta o valor deste imposto constante da factura/recibo n.º 12, de 24/03/1997, no montante de 246.500$00, conforme seguinte concretização da operação: 246.500$00+425.000$00+425.000$00+425.000$00+425.000$00+425.000$00+425.000$00+425.000$00+425.000$00=3.646.500$00 – cfr. fls. 82 do processo administrativo apenso, correspondente ao terceiro anexo do relatório inspectivo.”
Se não se tivesse considerado tal valor, como se pretendeu na decisão ora impugnada, a adição teria como resultado Esc. 3.400.000$00 e não 3.646.500$00.
Os pontos 7 e 8 do probatório revelam claramente que nas liquidações adicionais realizadas se considerou o valor de Esc. 246.500$00 e que sobre o mesmo foram liquidados juros compensatórios:
A soma das duas liquidações adicionais, relativas a IVA de 1997, perfaz o valor de Esc. 10.962.947$00 (8.144.447$00+2.818.500$00). Correspondendo precisamente ao valor considerado no relatório inspectivo com a soma da parcela no montante de Esc. 246.500$00, que a AT não quis incluir, afirmando mesmo que o valor dessa factura n.º 12 não entrou no apuramento das correcções efectuadas em IVA. Mas foi, efectivamente, contabilizada:
5.139.087$00+2.177.360$00+3.646.500$00 (e não 3.400.000$00)=10.962947$00
Nesta conformidade, impõe-se também aqui uma anulação parcial das liquidações impugnadas, dado que não falta IVA no montante de Esc. 246.500$00, nem são devidos os respectivos juros compensatórios sobre este específico valor, que foram liquidados conforme consta de fls. 18 do processo físico. A liquidação de juros compensatórios n.º 01211244, no montante de Esc. 121.906$00 - €608,06, é totalmente indevida, uma vez que se reporta à dita factura n.º 12, de 24/03/1997, que foi considerada válida pela Administração Tributária.
Quanto ao segundo erro apontado pela Recorrente, é verdade que a fundamentação do relatório de inspecção tributária aponta para o apoio na contabilidade da Recorrente, mais concretamente para a conta “6211-Subcontratos”:
“Da análise efectuada à conta 6211 - Subcontratos, verificou-se o registo contabilístico de várias facturas emitidas pelos seguintes sujeitos passivos: (...) J... (...) R... (...) P... (...)”.
Por outro lado, aditámos à decisão da matéria de facto o ponto 26, tendo resultado apurado que as facturas n.º 13 e n.º 14 emitidas por P…, ambas no montante de Esc. 2.500.000$00+Esc.425.000$00 referente a IVA, respectivamente em 30/05/1997 e em 30/06/1997, não figuram na conta “6211 – Subcontratos” da contabilidade da Recorrente – cfr. fls. 16 a 22 da reclamação graciosa apensa aos autos e fls. 111 a 117 do processo físico.
Realmente, no anexo 3 ao Relatório Inspectivo, referente à listagem das facturas emitidas por P..., enumeram-se as facturas supostamente contabilizadas pela Recorrente, que, segundo o ponto 1.2 do Capítulo III, foram detectadas através da análise da conta “6211-Subcontratos”. Sucede que as facturas n.º 13 e n.º 14, aí constando em ambas IVA no valor de Esc. 425.000$00, não figuram nessa conta de subcontratos.
Nestes termos, atentos os documentos mencionados em concatenação com o depoimento da testemunha, A…, responsável pela contabilidade da Impugnante, podemos concluir que estas duas facturas não terão sido contabilizadas pela Recorrente, tanto mais que a Administração Tributária não demonstrou essa contabilização; pelo que, mais uma vez, haverá que anular parcialmente a liquidação, dado não estar em causa uma indevida dedução de IVA nos montantes de Esc.425000$00+Esc.425000$00=Esc.850.000$00, nem serem devidos os respectivos juros compensatórios.
Procede, pois, parcialmente, o presente recurso.

Conclusões/Sumário

I - Muito embora a prescrição da obrigação tributária não constitua vício invalidante do acto de liquidação e não seja fundamento da respectiva impugnação, isso não deve impedir que o Tribunal no processo de impugnação não considere a prescrição da obrigação para concluir pela inutilidade superveniente da lide, pois que prescrita a obrigação se torna inútil a decisão sobre a legalidade do acto da liquidação.
II - Para que em sede de impugnação judicial seja proferido julgamento de extinção da instância por inutilidade superveniente da lide (cfr. artigo 287.º, n.º 1, alínea e), do CPC) com fundamento na prescrição da obrigação tributária que teve origem na liquidação impugnada, exige-se que estejam disponíveis do processo todos os elementos que permitam concluir com segurança nesse sentido, designadamente todos os elementos necessários à apreciação de eventuais causas de interrupção e suspensão da prescrição, que poderão ter ocorrido noutros processos administrativos ou contenciosos.
III - No domínio da vigência do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, é pacífico o entendimento de que o artigo 100.º deste diploma estabelece uma causa de suspensão da contagem do prazo de prescrição desde a prolação da sentença que decreta a insolvência até ao termo do respectivo processo, sendo tal causa de suspensão oponível à devedora originária do tributo.
IV – Se, no probatório concretamente impugnado, o Tribunal apenas se limitou a transcrever partes do Relatório elaborado pela Administração Tributária no âmbito da acção inspectiva carece de fundamento a pretensa alteração desses factos com fundamento no depoimento prestado por qualquer testemunha ou outra prova.
V – Compete à administração tributária, quando desconsidera as facturas que reputa de falsas, fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, ou seja, de que existem indícios sérios de que a operação constante da factura não corresponde à realidade e, realizada tal prova, passa a recair sobre o sujeito passivo o ónus da prova da veracidade da transacção (cfr. artigo 74.º da LGT).
VI – Se o impugnante alegar e provar, ainda que parcialmente, a veracidade da transacção, isto é, que pelo menos parte das facturas indiciariamente falsas correspondem a serviços efectivamente prestados, deve a liquidação impugnada ser anulada na parte em que desconsiderou o valor daquelas facturas.

IV. Decisão

Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em conceder parcial provimento ao recurso e, revogando a sentença recorrida, anular a liquidação impugnada na parte em que a Administração Tributária não aceitou para efeitos de dedução de IVA o valor das facturas identificadas no ponto 24 do probatório, bem como na parte em que liquidou adicionalmente o IVA constante da factura n.º 12, de 24/03/1997, devendo anular-se também a respectiva liquidação de juros compensatórios n.º 01211244, no montante de Esc. 121.906$00 - €608,06, e, ainda, na parte em que liquidou adicionalmente o IVA inserto nas facturas n.º 13 e n.º 14, aí constando em ambas IVA no valor de Esc. 425.000$00 - €2.119,89 (4.239,78€), e respectivos juros compensatórios sobre esse valor, nos termos e com os fundamentos expostos.

Custas a meias e em partes iguais pela Recorrente e pela Recorrida, em ambas as instâncias, sem prejuízo do benefício de apoio judiciário que foi concedido à Recorrente na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo.
Nesta instância, quanto à Recorrida, as custas não incluem a taxa de justiça, uma vez que não contra-alegou.
Porto, 11 de Janeiro de 2018
Ass. Ana Patrocínio
Ass. Ana Paula Santos
Ass. Pedro Vergueiro