Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00860/13.5BEBRG-A
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:05/29/2014
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Helena Ribeiro
Descritores:REGULAÇÃO PROVISÓRIA DO PAGAMENTO DE QUANTIAS
ARTIGO 133.º DO CPTA
Sumário:I- A providência cautelar de regulação provisória do pagamento de quantias, regulada no artigo 133.º do C.P.T.A configura um tipo especial de providência cautelar antecipatória, em que o requisito do periculum in mora, é especialmente qualificado.
II- O tribunal só pode dar como demonstrado o requisito do periculum in mora, caso conclua estar (a) adequadamente comprovada a situação de grave carência económica do requerente e caso (b) seja de prever que o prolongamento dessa situação possa acarretar consequências graves e dificilmente reparáveis.
III- A circunstância de ter sido concedido ao requerente o benefício de apoio judiciário, embora aponte no sentido da existência de fracos recursos económicos não prova uma situação de “grave insuficiência económica”, como a que é pressuposta para o decretamento da providência requerida.
IV- O fumus boni iuris exigido pela alínea c) do n.º2 do artigo 133.º do C.P.T.A demanda que seja provável que a pretensão formulada ou a formular no processo principal venha a ser julgada procedente.
V- Estando em causa a formulação de juízos especializados de natureza médica, a decisão proferida pela Comissão de Verificação das Incapacidades insere-se na chamada discricionariedade técnica da Administração;
VI- Assim, só perante uma situação de erro manifesto, grosseiro ou palmar de tal decisão médica é que o tribunal estaria autorizado a exercer o controlo sobre a validade do juízo pericial que considerou o requerente apto para o trabalho.
VII- Não se estando perante uma tal situação, não se verifica o requisito do fumus boni iuris. *
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:MCS...
Recorrido 1:Instituto Segurança Social, IP
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Intimação para pagamento provisório de quantias, artigo 133.º CPTA
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO ADMINISTRATIVA DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO DO NORTE.
I. RELATÓRIO
MCS..., residente no lugar do P..., C..., 4990-000 Ponte de Lima, inconformado, interpôs recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, em 16.12.2013, que julgou improcedente a providência cautelar por si requerida contra o INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P. (doravante ISS, IP), com sede na Rua Rosa Araújo, n.º 43, em Lisboa, de intimação para pagamento provisório de quantias, ao abrigo do artigo 133.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (doravante CPTA).
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O RECORRENTE, nas alegações de recurso que apresentou, formulou as seguintes conclusões:
“A. A sentença recorrida merece censura e deve ser revogada já que assentou em razões puramente formais e paradoxais que serviram de fundamento ao acto administrativo.
B. A decisão recorrida fez tábua rasa do facto notório, que aliás já foi reconhecida anteriormente pela Administração/Recorrida, da situação de insuficiência económica do Recorrente quando lhe foi deferido o Apoio Judiciário em 02 de Abril de 2013.
C. Situação essa grave a todos os títulos e bem demonstrada pelo facto de o aqui Recorrente estar incapacitado para o trabalho e de o seu cônjuge auferir um diminuto salário mensal de €196,00 (cento e noventa e seis euros), inferior ao salário mínimo nacional, e que por vezes nem tão pouco alcança tal quantia.
D. Situação que também tem (como é facto notório e incontroverso que não carece de prova) consequências danosas, graves e dificilmente reparáveis, contrariamente ao que decidiu a sentença recorrida.
E. Tem que se reconhecer, nessa conformidade e em tais termos que essa situação existe, que é grave e que o seu prolongamento até à decisão final da acção principal (Acção Administrativa Especial), que pode demorar bastante tempo, pode acarretar consequências graves e de difícil reparação.
F. O rendimento do agregado familiar resume-se apenas ao magro salário do cônjuge do Recorrente, sendo ele, como já foi referido, para além de incerto, inferior ao salário mínimo nacional.
G. O Recorrente cumpriu à saciedade os ónus de alegação e de prova que lhe competiam, por isso nenhuma culpa lhe pode ser assacada e nem pode sofrer qualquer penalização apenas porque a Recorrida pugna pela justiça formal e não pela justiça material, esquece o Homem e só vê os números, o que é grave para quem tem na sua denominação “Segurança Social”.
H. A grave situação de carência económica e financeira do Recorrente é e continua a ser actual, já que não mudaram as suas circunstâncias de vida atribulada com consequências gravosas e danosas da não concessão do subsídio de doença, actuais com iminência de se tornarem ainda mais desastrosas.
I. A tutela cautelar antecipada que V/Exas., com toda a certeza decretarão, irá acudir a todo este estado grave de carência económica e de carência de vida, que a sentença recorrida olvidou por completo.
J. O estado de saúde do Recorrente na altura da deliberação da Comissão de Verificação de Incapacidade Temporária de 05 de Abril de 2012 era grave e era o mesmo desde a altura em que lhe foi concedido o subsídio de doença que vinha a auferir desde Novembro de 2011.
K. O médico de família atestou tal estado de saúde e emitiu os competentes Certificados de Incapacidade Temporária, os quais foram entregues nos Serviços da Segurança Social, e estão juntos no processo administrativo que se encontra na acção principal.
L. É surpreendente e não tem qualquer fundamento a afirmação feita na sentença recorrida de que o acto da Administração não é ilegal e de que no caso em apreço não estão preenchidos os pressupostos para a concessão da providência cautelar de Regulação Provisória do Pagamento de quantias.
M. É manifesto que se encontram preenchidos todos os requisitos previstos nos artigos 120º e 133º do C.P.T.A.
N. Está adequadamente comprovada a situação de grave carência económica,
O. é de prever que o prolongamento dessa situação acarrete consequências graves e dificilmente reparáveis, e
P. é provável que a pretensão que foi formulada no processo principal venha a ser julgada procedente.
Q. Pelo que se impõe a revogação da sentença recorrida por V/Exas. nos termos já supra referidos”.
Termina pedindo a revogação da decisão recorrida e que seja decretada a providência cautelar de regulação provisória do pagamento requerido.
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O RECORRIDO contra-alegou, apresentando as seguintes conclusões:
A - Considera-se que a douta decisão recorrida não enferma de quaisquer vícios, mostrando-se inteiramente válida e legal.
B - O recorrente apresentou a presente providência cautelar, ao abrigo do disposto no artigo 133º, do CPTA, identificando-a como “conservatória”, mas a providência cautelar prevista no mencionado artigo 133º do CPTA, consiste numa providência antecipatória,
C - A distinção entre as providências cautelares antecipatórias e conservatórias tem grande importância prática, uma vez que são diferentes os critérios de que depende, de acordo com o artigo 120º, n.º 1 do CPTA, a adopção de cada um destes dois tipos de providências.
D - O n.º 2, do mencionado artigo 133º, do CPTA, enuncia 3 condições para que a regulação provisória seja decretada, estando presentes os requisitos de periculum in mora e fumus boni iuris(“aparência do direito”), encontrando-se o primeiro nas alíneas a) e b) e o segundo na alínea c), daquele artigo.
E - Quanto ao primeiro requisito, o requerente tem que comprovar adequadamente a existência da situação de grave carência económica, para que seja possível prever que a sua continuação trará consequências graves e dificilmente reparáveis, facto que o recorrente não logrou provar – uma vez que o facto de lhe ter sido deferido apoio judiciário apenas indicia fracos recursos económicos e não grave insuficiência económica.
F - Quanto ao requisito fumus boni iuris – “O juiz tem agora o poder e o dever de, ainda que em termos sumários, avaliar a probabilidade da procedência da acção principal, isto é, em regra, de avaliar a existência do direito invocado pelo particular ou da ilegalidade que ele diz existir, ainda que esteja em causa um “verdadeiro” acto administrativo.”, ora é claramente improvável a procedência da acção principal uma vez que o acto impugnado não padece de qualquer vício.
G – O recorrente invoca o direito a receber um subsídio de doença que cessou por ser considerado apto para trabalhar, uma vez que de acordo com as queixas apresentadas e os relatórios médicos apresentados pelo mesmo foi realizada a avaliação médica pela CVIT.
H – O recorrente foi submetido a uma intervenção cirúrgica num local diferente ao qual apresentava queixas pelo que, obviamente, não poderá receber o “mesmo” subsídio de doença atribuído com fundamento numa “doença” diferente daquela que levou a operação e, como alega, está incapacitado para o trabalho.
I – Pelo que, o recorrente não provou que ao não receber o subsídio de doença, ainda que provisoriamente, não tem meios de subsistência, ficando numa situação de grave carência económica, bem como não provou que com o não decretamento da providência cautelar requerida venha a sofrer danos mais graves e dificilmente reparáveis,
E
J - Sendo clara a improcedência da pretensão do recorrente na acção principal, não estão, de todo, preenchidos os requisitos previstos nos artigos 120º e 133º do CPTA, pelo que deve manter-se a decisão recorrida nos seus termos.”
Termina, pedindo a manutenção da sentença recorrida.
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O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto no artigo 146.º do CPTA, emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
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Com dispensa de vistos, nos termos do disposto no artº 36º, nºs 1 e 2 do CPTA, os autos foram submetidos à Conferência para julgamento.
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II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
II.1 MATERIA DE FACTO
A sentença recorrida deu como assentes, com relevância para a decisão proferida, os seguintes factos:
A-A Entidade Requerida atribuiu ao Requerente subsídio de doença com início em 21 de Novembro de 2011 (Cfr. Fls. 3 e 4 do PA aqui reproduzidas para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos).
B- Ao Requerente foi pago mensalmente e sem interrupções o aludido subsídio de doença até 31 de Março de 2012 (Cf. Fls.2 do PA, aqui para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).
C- Em 05 de Abril de 2012 a Comissão de Verificação de Incapacidade Temporária após avaliação médico-pericial ao Requerente, com base nos documentos clínicos apresentados pelo Requerente e exame objectivo efectuado ao mesmo, deliberou não subsistir a incapacidade temporária para o trabalho, a partir daquele dia [Cfr. Fls. 9 a 15 do PA – Sistema de Verificação de Incapacidade Temporária (SVIT), que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido].
D- O Requerente em 05 de Abril de 2012 foi, pessoalmente notificado da decisão e ainda de que a não subsistência da incapacidade para o trabalho leva à suspensão do subsídio de doença em curso, a qual cessará, nomeadamente, se não for requerida a intervenção da Comissão de Reavaliação (al. d) do n.º2 do art.º 24.º e al. d) do art.º 41.º do Decreto-Lei n.º 28/2004, de 04 de Fevereiro), bem como foi também aí informado de que a deliberação a que alude o ponto C é susceptível de reavaliação se se verificar as condições: a) a manutenção da situação de incapacidade pelos serviços se saúde e b) ser requerida a reavaliação da deliberação, acompanhada de fundamentação médica atendível (Cfr. Fls.15 do PA – SVIT, que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos).
E- O Requerente em 09 de Abril de 2012 apresentou, nos Serviços da Requerida requerimento de “Recurso da deliberação sobre Incapacidade Temporária” (Cfr. Fls.19 do PA – SVIT, que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos).
F- Na sequência de notificação recebida o Requerente juntou em 24 de Abril de 2012 uma declaração médica emitia por médico da Extensão USF L... do Centro de Saúde de Ponte de Lima, onde é referido que aquele “ sofre de sinais/ sintomas da região lombar (lombalgia com irradiação aos membros inferiores com vários meses de evolução que o impedem de trabalhar).
Aguarda consulta de Ortopedia (…) “(Cfr. Fls. 21 do PA – SVIT, que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos).
G- Em 27 de Abril de 2012 a Assessora Técnica de Coordenação Médica, sobre o requerimento supra emitiu parecer no sentido do requerente não ser convocado para a comissão de reavaliação para avaliação da incapacidade temporária para o trabalho, com a fundamentação de que os motivos apresentados para reavaliação pericial terem sido alvo do exame na última sessão, não alega novos elementos; por na data do da revisão pericial o exame físico ser negativo de acordo com os elementos clínicos apresentados, e o facto de aguardar consulta de ortopedia só por si não justifica a manutenção da ITPT“(Cfr. Fls. 22 e 23 do PA – SVIT, que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos).
H- Em 30 de Abril de 2012 com base nos fundamentos constantes do parecer supra, proferiu o Chefe de Equipa de Verificação de Incapacidades o Despacho seguinte: “Concordo. Notifique o interessado, nos termos do Parecer…” (Cfr. Fls. 22 do PA –SVIT, que aqui se dão, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzidos).
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II. 2 DO DIREITO
QUESTÕES DECIDENDAS
(1) Cumpre apreciar as questões suscitadas pelo ora Recorrente, o que deverá ser efetuado dentro das balizas estabelecidas, para tal efeito, pela lei processual aplicável - ver artigos 5.º, 608.º, n.º2, 635.º, n.ºs 4 e 5, e 639.º do C.P.C., na redação conferida pela Lei n.º 41/2013, ex vi art.º 1.º do C.P.T.A, e ainda conforme o disposto no artigo 149º do C.P.T.A.
(2) De acordo com a motivação e conclusões apresentadas pelo Recorrente, as questões a decidir reconduzem-se a saber se a decisão recorrida padece de erro de julgamento ao ter julgado como não verificados os requisitos previstos nas alíneas a), b) e c) do n.º2 do artigo 133.º do C.P.T.A.
(3) O requerente cautelar, ora Recorrente, pediu ao tribunal administrativo e fiscal de Braga (TAF de BRAGA) que fosse decretada provisoriamente a continuação do pagamento do subsídio de doença que vinha auferindo, “desde o dia 05 de Abril de 2012 até à presente data”, articulando para o efeito que se encontra gravemente doente desde 21 de novembro de 2011, e que por causa do seu estado de saúde o médico de família emitiu-lhe “certificados de incapacidade temporária para o trabalho por estado de doença que foram entregues nos Serviços da Segurança Social da área da sua residência”, tendo, porém, a Comissão de Reavaliação do Serviço de Verificação de Incapacidades considerado que o mesmo estava em condições de trabalhar, pelo que foi determinada a cessação do pagamento do subsídio de doença a partir de 05 de abril de 2012. Mais alega, ser «deveras evidente que o acto administrativo…será anulado nos autos de processo principal e, em consequência ser-lhe-á reconhecido o direito a manter o subsídio de doença que vinha a receber mensalmente» e que a cessação das prestações de subsídio de doença que vinha recebendo provocam-lhe prejuízos irreparáveis, por se encontrar numa situação de grave carência económica, tendo de viver, juntamente com a sua mulher, do rendimento que a mesma retira como empregada doméstica, com o qual tem ainda de custear as elevadas despesas médicas e medicamentosas que gera.
(4) O TAF de Braga, após ter enquadrado os requisitos indispensáveis ao deferimento da pretensão antecipatória, passou a apreciar os elementos fornecidos pelo caso concreto, tendo concluído pela não verificação dos requisitos do periculum in mora e do fumus boni iuris previstos nas
várias alíneas do n.º2 do artigo 133.º do C.P.T.A, necessários para o decretamento da providência requerida.
É contra este julgamento que o Recorrente se insurge.
Vejamos.
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DO PERICULUM IN MORA
(5) Tendo presente as sobreditas questões que constituem objeto do recurso jurisdicional em apreciação, importa analisar, primacialmente, o requisito do periculum in mora.
(6) A respeito da providência cautelar de regulação provisória do pagamento de quantias, estabelece o artigo 133.º do C.P.T.A que:
1. Quando o alegado incumprimento do dever de a Administração realizar prestações pecuniárias provoque uma situação de grave carência económica, pode o interessado requerer ao tribunal, a título de regulação provisória, e sem necessidade da prestação de garantia, a intimação da entidade competente a prestar as quantias indispensáveis a evitar a situação de carência.
2. A regulação provisória é decretada quando:
a) Esteja adequadamente comprovada a situação de grave carência económica;
b) Seja de prever que o prolongamento dessa situação possa acarretar consequências graves e dificilmente reparáveis;
c) Seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente.”
(7) Está em causa uma providência cautelar que configura um tipo especial de providência cautelar antecipatória, que se subsume na modalidade de regulação provisória de uma situação jurídica a que se reporta o artigo 112.º, n.º2, alínea e) do CPTA, e que, como qualquer providência cautelar visa impedir que, durante a pendência da ação, a situação de facto se altere de modo a que a sentença nela proferida, sendo favorável ao requerente, perca toda a sua eficácia ou parte dela, o mesmo é dizer, obviar a que a sentença não se torne numa decisão para “encaixilhar” ou puramente “platónica”, da qual o seu destinatário retire apenas um ganho moral, com a particularidade de se reportar especificamente ao segmento de situações da vida em que esteja em jogo a proteção de “ situações subjetivas dirigidas à obtenção do cumprimento de obrigações de pagar quantias em dinheiro, seja qual for a fonte de onde provenham, de modo a obviar a situações prementes de carência económica”.
(8) O requisito do periculum in mora, na providência cautelar em causa, tem a sua configuração específica traçada nas alíneas a) e b) do n.º2 do artigo 133.º do CPTA, das quais resulta que o mesmo apenas se encontrará preenchido caso se conclua estar (a) adequadamente comprovada a situação de grave carência económica do requerente e caso (b) seja de prever que o prolongamento dessa situação possa acarretar consequências graves e dificilmente reparáveis.
(9) De acordo com as regras gerais do ónus da prova, é sobre o requerente, ora Recorrente, que recai a obrigação de convencer o tribunal quanto à verificação dos pressupostos de que depende o decretamento da providência requerida, devendo, para o efeito, articular, e consequentemente provar, factos concretos e relevantes para a sua pretensão, e não quedar-se por uma alegação conclusiva e de direito ou com utilização de expressões vagas e genéricas.
(10) Isto dito, vejamos, em primeiro lugar, o que se decidiu no arresto recorrido a propósito do periculum in mora, e que foi o seguinte:
A lei exige que a situação de carência económica seja grave e que as consequências delas resultantes sejam graves e dificilmente reparáveis.
Em primeiro lugar, no caso em apreço não ficou demonstrado que o Requerente, não recebendo o subsídio de doença a que se acha com direito, pelo menos provisoriamente, deixa de obter meios de subsistência, não se traduzindo assim numa situação de grave carência económica.
Em segundo lugar figura-se-nos, como não provável que, em função dos dados da matéria de facto indiciariamente provada, seja previsível que com o não pagamento da quantia referente ao subsídio de doença peticionada no presente meio cautelar, o Requerente venha a sofrer danos ainda mais graves e dificilmente reparáveis.
De facto cabendo ao requerente o ónus da prova dos factos susceptíveis de sustentar a existência da situação de grave carência económica, para que seja possível prever que a sua continuação trará consequências graves e irreparáveis, não o fez nesta providência."
(11) O Recorrente, no que concerne a este segmento da decisão recorrida, aduz que a mesma «fez tábua rasa do facto notório, que aliás já foi reconhecida anteriormente pela Administração/Recorrida, da situação de insuficiência económica do Recorrente quando lhe foi concedido o Apoio Judiciário em 02 de Abril de 2013»; que essa situação de insuficiência económica é grave e que se encontra a «todos os títulos e bem demonstrada pelo facto de o aqui Recorrente estar incapacitado para o trabalho e de o seu cônjuge auferir um diminuto salário mensal de €196,00 (cento e noventa e seis euros), inferior ao salário mínimo nacional, e que por vezes nem tão pouco alcança tal quantia»; que é facto notório e incontroverso que não carece de prova, que essa situação tem consequências danosas, graves e dificilmente reparáveis, contrariamente ao que decidiu a sentença recorrida; que o rendimento do agregado familiar resume-se apenas ao magro salário do cônjuge do Recorrente, sendo ele, para além de incerto, inferior ao salário mínimo nacional; que a grave situação de carência económica e financeira do Recorrente é e continua a ser actual, já que não mudaram as suas circunstâncias de vida atribulada com consequências gravosas e danosas da não concessão do subsídio de doença, actuais com iminência de se tornarem ainda mais desastrosas. Afirma que cumpriu à saciedade os ónus de alegação e de prova que lhe competiam, por isso nenhuma culpa lhe pode ser assacada e nem pode sofrer qualquer penalização apenas porque a Recorrida pugna pela justiça formal e não pela justiça material, esquece o Homem e só vê os números, o que é grave para quem tem na sua denominação “Segurança Social”, concluindo ter de se reconhecer que existe uma situação de carência económica, que é grave e que o seu prolongamento até à decisão final pode acarretar consequências graves e de difícil reparação.
(12) Considerando a matéria de facto dada como provada pela senhora juiz a quo, dela, efetivamente, não logramos extrair nenhuma factualidade que demonstre a situação de alegada grave carência económica do ora Recorrente, capaz de sustentar a previsão de que o prolongamento dessa situação possa acarretar consequências graves e dificilmente reparáveis. Aliás, é de frisar que na decisão recorrida a senhora juiz a quo, em sede de fundamentação da sua convicção, depois de afirmar que a mesma se louvou «no teor dos documentos …bem como nos depoimentos de todas as testemunhas inquiridas», acrescentou que «Não ficaram demonstrados, ainda que indiciariamente, os demais factos alegados pelas partes no presente processo e com interesse para a decisão da causa».
(13) O Recorrente afirma, nas suas conclusões de recurso, não entender a razão pela qual se olvidou na decisão recorrida o já referido documento junto com a ação, o qual reflete a situação económica do agregado familiar do aqui Recorrente.
(14) Ora, a esse respeito, verifica-se que a fls. 6 dos autos está junto um documento, denominado “ Extrato de Remunerações”, emitido pela I.S.S., I.P., referente às remunerações auferidas por EARM..., nos meses de janeiro a dezembro de 2012, do qual consta como montante de remuneração base, €193,60.
(15) O referido documento não foi impugnado pelo ora Recorrido, pelo que, essa matéria devia ter sido julgada assente pela decisão recorrida, razão pela qual ora se adita aos factos assentes, a seguinte matéria:
“I- No ano de 2012 a mulher do Requerente auferiu de remuneração base, a quantia mensal de €193,60”.
(16) Pretende o Recorrente, que a partir da consideração de que a sua esposa apenas aufere a referida importância de €193,60, bem como do facto de lhe ter sido concedido o benefício do apoio judiciário e ainda da circunstância de alegadamente se encontrar acamado, se devia ter dado como demonstrado que o mesmo está numa situação de grave carência económica e que as consequências daí resultantes são graves e dificilmente reparáveis.
(17) Sucede que, da matéria de facto assente, dela não decorre que o Recorrente se encontre acamado e incapacitado para o trabalho, nem nela se descortinam elementos de facto idóneos para atestar que o mesmo se encontra numa situação de grave carência económica e financeira, resultantes da não concessão do subsídio de doença e que o prolongamento dessa situação até à decisão final da ação principal lhe possa acarretar consequências graves e de difícil reparação.
(18) Nos termos o artigo 640.º do C.P.C. aplicável ex vi art.º 1.º do C.P.T.A., sob a epígrafe “Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa á matéria de facto”, dispõe-se o seguinte:
«1. Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a)Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b)Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c)A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2.No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b)Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3. O disposto nos n.ºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º2 do artigo 636.º».
(19) No recurso jurisdicional que interpôs da decisão sindicada, o Recorrente, com exceção da matéria referente à remuneração auferida pela sua mulher, não procedeu à impugnação da resposta dada pela senhora juiz a quo quanto aos factos considerados provados e não provados nos termos que se lhe impunham que tivesse feito, atento o disposto no citado art.º 640.º do C.P.C., pelo que o julgamento efetuado pelo tribunal a quo a tal respeito, se tem de aceitar como estabilizado.
(20) Acrescente-se, que pese embora o afirmado, ainda assim se procedeu à audição dos depoimentos prestados pelas testemunhas ouvidas pelo tribunal a quo, gravados em suporte informático, e da sua consideração não logramos obter fundamento probatório capaz de alicerçar um diferente julgamento daquele que foi efetuado pelo tribunal a quo, sobre a matéria de facto dada como provada e não provada.
(21) A esse respeito apenas se logrou apurar que a mulher do ora Recorrente auferiu uma retribuição base mensal de €196,00 ao longo do ano de 2012, nada mais se tendo apurado sobre a concreta situação em que o Recorrente se encontra, designadamente, se esteve ou não acamado e impossibilitado de trabalhar entre o momento em que lhe foi cessado o subsídio de doença -05.04.2012- e o momento em que instaurou a presente providência cautelar -30/05/2013-, e como foi concretamente a sua vida durante esse período de tempo, posto que, a esse respeito, nada de relevante alegou e, por isso, provou. (22) Impendia sobre o Recorrente o ónus de provar adequadamente a existência da situação de grave carência económica, para que fosse possível prever que a sua continuação comportaria consequências graves e dificilmente reparáveis, o que como vimos, não logrou demonstrar, sendo que a circunstância de lhe ter sido concedido o benefício de apoio judiciário, embora aponte no sentido da existência de “fracos recursos económicos” não prova uma situação de “grave insuficiência económica”, como a que é pressuposta para o decretamento da providência requerida.
(23) Isto dito, entendemos não se encontrarem demonstrados os requisitos previstos nas alíneas a) e b) do n.º2 do artigo 133.º do C.P.T.A.
DO FUMUS BONI IURIS
(24) O Recorrente insurge-se ainda contra o arresto recorrido, por considerar que o mesmo padece de erro de julgamento no que tange à ponderação do requisito do fumus boni iuris regulado na alínea c) do n.º2 do art.º 133.º do C.P.T.A., afirmando, para o efeito, ser provável que a pretensão que foi formulada no processo principal venha a ser julgada procedente, uma vez que, à data em que foi proferida a deliberação da comissão de Verificação de Incapacidade Temporária [05 de abril de 2012], o seu estado de saúde era grave e era o mesmo desde a altura em que lhe foi concedido o subsídio de doença que vinha a auferir desde novembro de 2011.
(25) O decretamento da providência regulada no artigo 133.º do C.P.T.A, impõe que se demonstre a verificação dos requisitos para o deferimento da providência, mencionados nas alíneas a, b) e c) do n.º 2 do art. 133.º do CPTA, assumindo aqui relevância a qualificação da providência cautelar requerida como antecipatória.
(26) É que para além da demonstração do requisito do periculum in mora, a concessão da providência cautelar requerida fica subordinada ao preenchimento do requisito constante da alínea c) do n.º 2 do artigo 133.º do CPTA [“Seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente”].
(27) Tratando-se de uma providência de natureza antecipatória, o legislador estabeleceu requisitos mais apertados no que respeita à aparência do bom direito, para a sua concessão, uma vez que está em causa, não a manutenção da situação jurídico - material existente, mas antecipar, a título provisório, uma situação jurídica nova, a qual se aspira obter a título definitivo, com a sentença a proferir no processo principal.
(28) Segundo Vieira de Andrade, “providências antecipatórias são as que visam prevenir um dano, obtendo adiantadamente a disponibilidade de um bem ou o gozo de um benefício a que o particular pretende ter direito, mas que lhe é negado (antecipam uma situação que não existia, quando haja um interesse substancial pretensivo)”.(cfr “A Justiça Administrativa (Lições)”, Almedina, 10.ª edição, pág. 347).
(29) Estando-se, pois, perante uma providência cautelar antecipatória, o seu decretamento, reafirma-se, depende da verificação do requisito constante da alínea c) do n.º 2 do artigo 133.º do C.P.T.A., competindo ao Recorrente fazer prova, ainda que sumária, de que lhe assiste o direito ao pagamento do subsídio de doença, o que, conforme decorre da matéria de facto dada como assente, desde já se adianta, o mesmo não logrou demonstrar.
(30) Quanto a este requisito entendeu a senhora juiz a quo que «No caso presente, não é possível afirmar, com a necessária certeza, e sem ultrapassar a análise perfunctória, própria de um processo cautelar, que o acto em apreço seja manifestamente ilegal, isto é, não é possível determinar se a Deliberação da Comissão de Verificação da Incapacidade Temporária de 05 de Abril de 2012, viola ou não preceitos legais, sendo que o Requerente não aponta expressamente qualquer violação de lei no seu articulado relativo ao Acto Administrativo que põe em causa», concluindo que «no caso em apreço não estão preenchidos, os pressupostos para a concessão da providência cautelar de Regulação Provisória do Pagamento de quantias».
Vejamos.
(31) O ora Recorrente entrou de baixa médica por motivo de doença natural no dia 21 de novembro de 2011, e até ao dia 31 de março de 2012 foram-lhe pagos mensalmente e sem interrupções as correspondentes prestações de subsídio de doença – cfr. alíneas A) e B) da matéria de facto assente.
(32) Sucede que no 05 de abril de 2012, a Comissão de Verificação de Incapacidade Temporária (doravante CVIT), após avaliação médico-pericial e exame objetivo efetuado ao Recorrente, deliberou a não subsistência da sua incapacidade temporária para o trabalho, a partir daquele dia – cfr. alínea C) da matéria de facto assente.
(33) Logo nesse mesmo dia, o ora Recorrente foi pessoalmente notificado da referida decisão da CVIT e de que a não subsistência da incapacidade para o trabalho leva à suspensão do subsídio de doença em curso, a qual cessará, nomeadamente, se não for requerida a intervenção da Comissão de Reavaliação (al. d) do n.º2 do art.º 24.º e al. d) do art.º 41.º do Decreto-Lei n.º 28/2004, de 04 de Fevereiro), tendo ainda sido informado de que a deliberação a que alude o ponto C é susceptível de reavaliação se se verificarem as seguintes condições: a) a manutenção da situação de incapacidade pelos serviços se saúde e b) ser requerida a reavaliação da deliberação, acompanhada de fundamentação médica atendível- cfr. aliena D) da matéria de facto assente.
(34) Na sequência da aludida deliberação, o Recorrente interpôs recurso da mesma, e após ter sido notificado, juntou, em 24 de abril de 2012 uma declaração médica emitida por médico da Extensão USF L... do Centro de Saúde de Ponte de Lima, onde é referido que aquele “ sofre de sinais/ sintomas da região lombar (lombalgia com irradiação aos membros inferiores com vários meses de evolução que o impedem de trabalhar).
Aguarda consulta de Ortopedia (…) “ – cfr. alíneas E) e F) da matéria de facto assente.
(35) Entretanto, a 27 de abril de 2012, a Assessora Técnica de Coordenação Médica, emitiu parecer no sentido do ora Recorrente não ser convocado para a comissão de reavaliação para avaliação da incapacidade temporária para o trabalho, com fundamento nas seguintes razões:
(i) os motivos apresentados pelo Recorrente para reavaliação pericial já foram alvo do exame na última sessão, não alegando o mesmo novos elementos;
(ii) por na data da revisão pericial, o exame físico ser negativo de acordo com os elementos clínicos apresentados;
(iii) por o facto de aguardar consulta de ortopedia só por si não justificar a manutenção da ITPT“ – cfr. alínea G) da matéria de facto assente.
(36) Finalmente, em 30 de abril de 2012, com base nos fundamentos constantes do parecer emitido e acima mencionado, o Chefe de Equipa de Verificação de Incapacidades emanou o seguinte Despacho: “Concordo. Notifique o interessado, nos termos do Parecer…”-Cfr. alínea H) da matéria de facto assente.
(37) Como se sabe, o sistema de verificação de incapacidades, no âmbito da segurança social, encontra-se regulado pelo Decreto-Lei n.º 360/97, de 17 de dezembro e tem por objeto, entre outros, «A confirmação da subsistência das condições de incapacidade temporária determinante do direito ao subsídio de doença», conforme resulta do preceituado no seu art.º 1.º, alínea a).
(38) De acordo com o artigo 2.º, n.º 1 deste diploma, a verificação das situações de incapacidade temporária consubstancia-se na avaliação da subsistência da incapacidade do beneficiário e em conformidade com o disposto o art.º 3.º, n.º1 do mesmo «O sistema de incapacidade é um instrumento especializado de peritagem, constituído por meios técnicos de verificação de incapacidades e meios técnicos de assessoria à respectiva coordenação».
(39) Por outro lado, está expressamente previsto no art.º 7.º, n.º1 do diploma em referência que “ Os médicos relatores, os peritos que integram as comissões de verificação, de reavaliação e de recurso, bem como os assessores técnicos de coordenação, actuam com a independência técnica exigida pela sua própria função, sem prejuízo do dever de cumprimento das disposições estabelecidas no presente diploma e demais normas em vigor”.
(40) As comissões de verificação de incapacidade temporária são constituídas por dois peritos médicos, designados pelo centro regional, um dos quais preside à comissão, competindo-lhes, face à situação clínica do beneficiário, deliberar sobre a subsistência da incapacidade temporária do beneficiário e emitir os pareceres médicos que lhe forem solicitados pelos centros regionais – cfr. art.º 11.º e 12.º do D.L.360/97, de 17/12.
(41) Outrossim, determina o artigo 33.º do D.L. n.º 360/97, de 17/12 que “ As deliberações das comissões de verificação que se pronunciem pela não subsistência da situação de incapacidade temporária para o trabalho determinam os efeitos previstos no regime jurídico de protecção na doença”, consignando-se no n.º 2 do art. 34.º do mesmo diploma que é enviada cópia da deliberação da comissão de verificação, se for caso disso, dentro das quarenta e oito horas subsequentes, à instituição de segurança social que abrange o beneficiário, para os efeitos previstos na lei, nomeadamente a cessação das prestações, quando às mesmas houver lugar.
(42) A este respeito, prescreve o artigo 24.º, n.º 1, al. a) do Decreto-Lei n.º 28/2004, de 04 de fevereiro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 146/2005, de 26 de agosto, que o direito ao subsídio de doença cessa quando “a) Tenha sido declarado pelos serviços competentes do Ministério da Saúde a não subsistência da incapacidade temporária para o trabalho;”
(43) Do exposto decorre que a decisão de insubsistência da situação de incapacidade temporária para o trabalho proferida pela CVIT tem como consequência, em relação ao beneficiário, a cessação do pagamento do subsídio de doença, a não ser que seja requerida a intervenção da comissão de reavaliação e a mesma se pronuncie no sentido da subsistência da situação de incapacidade temporária para o trabalho.
(44) É que, de acordo com o disposto no n.º 2 do art.º 37.º e alínea b) do art.º 14.º do D. Lei n.º 360/97, de 17/12 o beneficiário pode solicitar, no prazo de 10 dias a contar da data do conhecimento da deliberação da comissão de verificação de incapacidades que declare insubsistente a situação de incapacidade temporária para o trabalho, a intervenção da comissão de reavaliação «desde que junte ao requerimento fundamentação médica atendível da manutenção da incapacidade pelos serviços de saúde»;
(45) E conforme previsto no n.º3, do referido artigo 37.º do referido diploma “ Os centros regionais podem fazer depender o deferimento do requerimento do beneficiário previsto no número anterior de parecer favorável do assessor técnico de coordenação sobre a fundamentação apresentada”.
(46) Ora, na situação dos autos, conforme resulta apurado, o Recorrente solicitou a intervenção da CRIT, mas a assessora técnica de coordenação emitiu parecer desfavorável à intervenção da comissão de reavaliação, razão pela qual foi cessado o pagamento do subsídio de doença ao ora Recorrente.
(47) Entende, porém, o Recorrente que lhe assiste o direito a que lhe seja pago provisoriamente o subsídio de doença desde o dia 05 de abril de 2012, porquanto se encontra incapacitado para o exercício da sua atividade profissional conforme resulta dos certificados médicos emitidos pelo seu médico de família;
(48) E, embora o mesmo não nomeie o vício ou vícios que, na sua perspectiva, determinam a anulação do ato administrativo lesivo, alega que o mesmo será anulado em sede de ação principal, porquanto diferentemente do que nele se afirma, se encontra incapacitado para o trabalho, impondo-se, por conseguinte, concluir que com tal alegação o ora Recorrente assaca à decisão que lhe cessou o pagamento do subsídio de doença, vício de violação de lei decorrente de erro nos pressupostos de facto.
(49) A este respeito cumpre desde já referir, que o procedimento do reconhecimento de incapacidade temporária para o trabalho é o resultado dum conjunto de pronúncias relativas a matérias que contendem com conhecimentos da ciência médica.
(50) Por outro lado, quer a comprovação, quer a manutenção, proveniente dos serviços do Sistema Nacional de Saúde, relativa à situação da incapacidade temporária para o trabalho por doença através de certificação da incapacidade temporária (CIT), não vincula as decisões tomadas pelas comissões do sistema de verificação de incapacidades, dada a existência da independência técnica inerente á natureza da própria função.
(51) Isto dito frise-se que incumbe aos médicos que integram tais comissões proceder às apreciações dos dados relativos às condições físicas, motoras, orgânicas sensoriais e intelectuais dos beneficiários das quais hão de extrair a conclusão sobre a manutenção ou não da situação de incapacidade temporária do beneficiário para o trabalho.
(52) Estão em causa a formulação de juízos especializados de natureza médica, inserindo-se a decisão proferida na chamada discricionariedade técnica da Administração, pelo que, não se vislumbrando estar perante uma situação de erro manifesto ou grosseiro que autorize o controlo do tribunal sobre a validade do juízo pericial que considerou o Recorrente apto para o trabalho, não se nos depara como provável que a pretensão do ora Recorrente venha a ser julgada procedente em sede de ação principal.
(53)Neste domínio, como é sabido, o tribunal, que só lida com a técnica jurídica, não pode pronunciar-se sobre o acerto ou desacerto das opções técnicas subjacentes à opção administrativa em causa, salvo nos casos de erro manifesto ou grosseiro (cfr. André Gonçalves Pereira, “Erro e ilegalidade no Acto Administrativo”, Ed. Ática, p. 266; Freitas do Amaral, “Curso de Direito Amdinistrativo”, vol. II, 2001; Ac. STA de 23.5.2000, Rec. 40313; Ac. TCA de 21.02.02, Rec. 108761, in “Antologia de Acórdãos do STA e do TCA, Ano V, n.º 2, p. 248).” (Ac. TCA Sul de 06.06.2008, P. 03741/08).

(54) Não se ignorando que nos encontramos no âmbito de um processo cautelar, que atenta a sua natureza instrumental, provisória e sumária não é a sede própria para se conhecer da existência do direito invocado, ante a factualidade apurada e o enquadramento legal supra delineado à luz do qual a situação em análise se tem de subsumir, afigura-se-nos, pelas razões apontadas, não se verificar o requisito do fumus boni iuris exigido pela alínea c) do n.º2 do artigo 133.º do C.P.T.A, o mesmo é dizer, que seja provável que a pretensão formulada ou a formular no processo principal venha a ser julgada procedente (não vislumbramos que exista erro grosseiro ou manifesto na decisão administrativa proferida), impondo-se, concluir pela improcedência do recurso e pela manutenção da decisão recorrida, com a presente fundamentação.
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IV.DECISÃO
Nestes termos, decidem os Juízes deste Tribunal Central, em conferência:
I. Negar provimento ao recurso jurisdicional, e manter a sentença recorrida com a presente fundamentação;
II. Custas pelo Recorrente, em ambas as instâncias, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário concedido.
d.n.
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Porto, 29/05/2014
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Processado com recurso a meios informáticos, tendo sido revisto e rubricado pela relatora (cfr. artº 131º nº 5 do CPC “ex vi” artº 1º do CPTA).
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Ass.: Helena Ribeiro
Ass.: João Beato Sousa
Ass.: Maria do Céu Neves