Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00587/18.1BEVIS
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:07/14/2020
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:Paulo Ferreira de Magalhães
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL; REJEIÇÃO LIMINAR; CONVOLAÇÃO.
Sumário:1 - A rejeição liminar da Petição inicial da Oposição à execução fiscal [assim como de um outro qualquer articulado inicial], só pode ocorrer quando não possa suscitar-se qualquer dúvida quanto à questão que seja determinante para essa mesma rejeição liminar.

2 - A convolação do meio processual só é de ponderar caso ocorra erro na forma do processo, nulidade a aferir pelo ajustamento do meio processual ao pedido que se pretende fazer valer. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:L.
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Votação:Unanimidade
Decisão:Conceder parcial provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:


I - RELATÓRIO


L., inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, datada de 08 de abril de 2019, que julgou verificado o erro na forma de processo e consequente nulidade e impossibilidade de convolação da Oposição para Reclamação [por intempestividade desta], e que quanto ao demais, julgou que a Petição inicial entrou fora do prazo legal previsto o artigo 203.º, n.º 1, alínea a), 1.ª parte do CPPT, tendo neste domínio rejeitado liminarmente a Oposição deduzida ao abrigo do artigo 209.º, n.º 1, alínea a), também do CPPT.

No âmbito das Alegações por si apresentadas [Cfr. fls. 78-verso a 83-verso dos autos em suporte físico], elencou a final as conclusões que ora se reproduzem:

CONCLUSÕES:
1. Salvo devido respeito e melhor opinião de Vªs Exªs, a sentença ora recorrida, configura um grave erro jurídico, consubstanciando uma decisão errada e ilegal.
2. Entende assim o recorrente que a decisão recorrida enferma de ilegalidade, na medida em que o Tribunal considerou que a oposição foi extemporânea, e ainda que o expediente legal não foi o adequado.
3. Desde logo, a decisão recorrida é ilegal, na parte em que considerou que a oposição apresentada em extemporânea.
4. Ora, o oponente não pode aceitar a decisão proferida, porquanto a mesma declarou intempestiva a oposição apresentada, quando a mesma respeita os prazos previstos no art. 203.º do CPPT.
5. Sem prescindir que os valores que agora se penhoram dizem respeito a valores dos quais ainda não existe decisão definitiva, uma vez que o opoente obteve ganho de causa em primeira instância, tendo a AT recorrido para o TCAN e do qual ainda não foi proferida decisão, não existindo assim qualquer decisão transitada em julgado.
6. Quanto à tempestividade da oposição apresentada, estipula o art. 203.º do CPPT“1- A oposição deve ser deduzida no prazo de 30 dias a contar: a) Da citação pessoal ou, não a tendo havido, da primeira penhora; b) Da data em que tiver ocorrido o facto superveniente ou do seu conhecimento pelo executado.” (negrito nosso)
7. O opoente, apenas teve conhecimento da penhora dos seus saldos bancários, quando recebeu carta do seu banco, para a sua morada fiscal, em França, a informar de que à ordem do processo 2526200401000861 do Serviço de Finanças de (...) lhe tinham sido penhorados os seus saldos bancários.
8. O recorrente teve conhecimento da penhora dos seus saldos bancários por carta datada de 30/09/2018, Domingo, pelo que a referida carta nunca terá sido enviada antes de dia 1 de Outubro de 2018, e tendo sido expedida para o estrangeiro (França), nunca a mesma terá sido recebida antes do dia 4 de Outubro de 2018, senão mesmo depois.
9. Em 22 de Outubro de 2018, pediu apoio judiciário, tendo o mesmo apenas sido deferido em 13 de Novembro de 2018, data em que foi a aqui subscritora nomeada.
10. Com o pedido de apoio judiciário para o presente processo o prazo de oposição foi interrompido, tendo-se iniciado em 13 de Novembro de 2018, com o seu deferimento e consequente nomeação de patrono.
11. Tal tem sido o entendimento da jurisprudência, veja-se a título de exemplo o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 18/06/2013, no âmbito do processo 2/13.7TBOER-A-1 “Tendo sido requerido pelo executado o apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono fica interrompido o prazo que a lei lhe confere para deduzir oposição à execução começando a contar um novo prazo imediatamente após a efectiva designação do(a) novo(a) patrono(a).”
12. Logo, tendo a presente oposição dado entrada em 28 de Novembro de 2018, foi a mesma apresentada em prazo, pelo que foi a mesma apresentada dentro do prazo dos 30 dias estipulados por lei.
13. Pois, o prazo para apresentar oposição apenas terminava a 18 de Dezembro de 2018, já contabilizados os três dias com multa permitidos, pelo que a oposição é tempestiva e por isso deveria ter sido admitida e nessa sequência serem julgados todos os fundamentos ali apresentados.
14. Veio a AT alegar que o oponente tinha sido citado da execução em 2004, e que por esse motivo é a oposição extemporânea, uma vez que deveria nessa altura ter apresentado oposição.
15. Fundamentação seguida pelo Tribunal a quo e com a qual não podemos concordar por várias ordens de razão:
16. A primeira é que o aviso de receção junto aos autos não foi assinado pelo oponente, contudo e apesar disso é afirmado pela própria AT que o oponente deduziu impugnação em Março de 2004 relativamente às liquidações que tiveram por base a instauração do processo executivo, tendo nessa sequência sido penhorado um prédio urbano do oponente.
17. Em 31/10/2014 foi proferida sentença que julgou procedente a impugnação deduzida pelo oponente, tendo dessa decisão a AT recorrido para o TCAN e da qual ainda não foi proferida qualquer decisão.
18. Não obstante isso, a AT decidiu que a penhora do prédio urbano não era suficiente e como tal ordenou a penhora de outros valores, contudo tal nunca foi notificado ao oponente.
19. Pois, a verdade é que como a AT afirma e reconhece na contestação apresentada “15. … em 19-03-2018, foi emitida a notificação de penhora/citação pessoal, não tendo a mesma sido concretizada em virtude do oponente residir em França.”- Vide página 3 da contestação apresentada pela AT. (negrito nosso)
20. Ora a verdade é que o oponente nunca foi notificado da nova penhora, tendo apenas tido conhecimento quando recebeu missiva do banco a informar da penhora de saldos bancários.
21. Altura a partir da qual o mesmo, primeiro requereu apoio judiciário e após apresentou oposição, tendo respeitado todos os prazos legais como supra explanado. Pois, o oponente apenas após ser notificado, ou ter conhecimento da penhora é que poderia apresentar oposição, o que fez.
22. Razão pela qual não se concorda com a decisão proferida, pois o oponente apresentou a oposição logo que teve conhecimento da penhora, como previsto no art. 203.º n.º 1 a) do CPPT.
23. Mais, a missiva enviada pelo banco ao oponente foi por carta simples, não podendo o mesmo comprovar a data do seu envio, pois como se disse a data que lhe foi aposta é de 30 de Setembro de 2018, um domingo, dia em que tanto as entidades bancárias como os correios se encontram encerrados, pelo que nunca poderia a carta ter sido enviada na data que ali consta, nem tão pouco ter sido elaborada nesse dia – domingo.
24. Salvo o devido respeito não devemos confundir a citação de 2004 onde o oponente foi citado da execução, e da qual deduziu a competente impugnação, tendo nessa sequência, e para suspender a execução sido registada penhora de imóvel, com a falta de notificação da nova penhora, por a AT, apesar de ainda não haver decisão transitada em julgado, pois como se disse a AT recorreu da decisão de primeira instância, estando o processo ainda pendente, decidir que a penhora do imóvel já não era suficiente.
25. A verdade é que o oponente deveria ter sido notificado que era necessário reforçar a garantia, não o tendo sido, apenas teve conhecimento quando a entidade bancária o informou da penhora de saldos bancários, altura em que agiu de imediato ao requerer apoio judiciário, como consta dos autos.
26. Razão pela qual é a oposição apresentada tempestiva, devendo ser julgada na sua totalidade, e ter em conta todos os fundamentos ali invocados.
27. Não podemos assim concordar com a decisão proferida quando refere “…o Oponente teve conhecimento, durante o ano de 2004, da execução não podendo aceitar-se, como argumentou no artigo 2º da petição inicial, que dela só teve conhecimento com a penhora do saldo bancário que lhe foi comunicada pela Entidade Bancária, através de cartam datada de 30-09-2018.”, pois como se disse assim que foi notificado em 2004 deduziu oposição, que aliás foi julgada procedente, tendo a AT recorrido para o TCAN, onde ainda não foi proferida decisão.
28. Tendo após a nova penhora de saldos bancários, quando da mesma teve conhecimento, em Outubro de 2018 apresentado nova oposição.
29. É a própria AT que confirma que por o oponente ter residência fiscal em França não o notificou da penhora. (Vide ponto 15, pág. 3 da contestação apresentada pela AT).
30. Assim, e salvo o devido respeito, mal andou o Tribunal a quo, ao após ser confirmado pela AT que não notificou o oponente da penhora, ter decidido pela intempestividade da oposição, quando bem sabe que o que prevê o art. 203.º do CPPT,“1- A oposição deve ser deduzida no prazo de 30 dias a contar: a) Da citação pessoal ou, não a tendo havido, da primeira penhora; b) Da data em que tiver ocorrido o facto superveniente ou do seu conhecimento pelo executado.”
31. Logo após a penhora, ou data em que tiver ocorrido facto superveniente, tem o executado 30 dias para deduzir oposição, prazo esse, que foi respeitado, tendo a oposição sido apresentada antes do término do prazo para o efeito.
32. Motivo pelo qual é tempestiva a oposição, devendo prosseguir os seus termos.
33. Quanto ao expediente legal, e salvo o devido respeito, não podemos concordar que a oposição não seria o meio adequado, e que o oponente deveria ter apresentado reclamação nos termos do art. 276.º do CPPT.
34. E isto porque como consta dos autos, o aqui recorrente nunca foi notificado de qualquer decisão, e este expediente legal é aplicável para reclamar de “…decisões proferidas pelo órgão da execução fiscal…”, o que não é o caso dos autos. Pelo que nunca poderia ser o meio legal de agir.
35. Assim agiu o recorrente de forma correta atentos os factos e falta de notificação de qualquer decisão, uma vez que apenas teve conhecimento com missiva do banco a informar da penhora dos saldos bancários, motivo pelo qual a forma para agir sempre seria a da oposição nos termos previstos nos arts. 203.º e seguintes do CPPT. Tendo a sua oposição tido por base os fundamentos das alíneas a), c), h) e i) do art. 204.º do CPPT.
36. Pelo que também por esta razão entendemos ser errada e ilegal a decisão proferida, por errada interpretação das normas dos arts. 203.º e seguintes e 276.º e seguintes do CPPT.
37. E assim, pretende o recorrente ver decidido por Vªs Exªs que mal andou o Tribunal a quo ao rejeitar a oposição por extemporânea, uma vez que a mesma foi apresentada tempestivamente, violando assim entre outros dos arts. 203.º, 204.º e seguintes, 276.º e seguintes todos do CPPT.

Nestes termos, decidindo-se como se requer, devem Vªs Exªs decidir pela revogação da Decisão recorrida, substituindo-a por outra que julgando procedente a oposição por tempestiva e legal, e consequentemente determine o prosseguimento dos autos, e, assim,
FARÃO VªS EXªS, A DEVIDA JUSTIÇA.“
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O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso, com manutenção na ordem jurídica da decisão recorrida.
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Com dispensa dos vistos legais, tendo para o efeito, nos termos do artigo 657.º, n.º 4 do CPC, sido obtida a concordância dos Meritíssimos Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre apreciar e decidir.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, cujo objecto do recurso está delimitado pelas conclusões das respectivas alegações - Cfr. artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.ºs 4 e 5, todos do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigo 2.º, alínea e) e artigo 281.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) –, e que se centram em saber, em suma, se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, de facto e de direito, e mais concretamente, se a Petição inicial apresentada pelo Oponente, ora Recorrente, o foi de forma tempestiva, e se a forma de reagir à actuação da AT era por via da Reclamação da decisão do acto do OEF.
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III - FUNDAMENTOS
IIIi - DE FACTO

Tendo proferido decisão de rejeição liminar da Petição inicial, o Tribunal a quo não fixou qualquer matéria de facto provada ou não provada.
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IIIii - DE DIREITO

Está em causa a decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, datada de 08 de abril de 2019, que tendo julgado verificado o erro na forma de processo e consequente nulidade e impossibilidade de convolação da Oposição para Reclamação [por intempestividade desta], e quanto ao demais, julgado ainda que a Petição inicial entrou fora do prazo legal previsto no artigo 203.º, n.º 1, alínea a), 1.ª parte do CPPT, veio a rejeitar liminarmente a Oposição deduzida ao abrigo do artigo 209.º, n.º 1, alínea a), também do CPPT, atinente à execução fiscal n.º 25262004010000861, instaurada por dívidas de IRS dos anos de 1999, 2000 e 2001, todas com data limite de pagamento de 10 de dezembro de 2003.

Conforme assim foi enunciado pelo Tribunal recorrido em torno da Apreciação liminar por si prosseguida, a mesma foi levada a cabo em face do teor da informação remetida ao Tribunal a quo pelo OEF com a Oposição, onde aí vinha sustentada a intempestividade da actuação do Oponente, ora Recorrente.

Por ter interesse para a decisão a proferir por este TCAN, para aqui se extrai parte da fundamentação expendida pelo Tribunal recorrido, como segue:

“[…]
No despacho proferido em 2019-01-07 ordenou-se a notificação do Oponente para se pronunciar sobre a informação que instruiu o despacho do Órgão de execução fiscal que ordenou a remessa desta Oposição a este Tribunal, informação onde se defendeu a intempestividade da atuação do Oponente:
“Informação prestada nos termos do artigo 208º do Código de Procedimento e de Processo Tributário; despacho da Direção de Finanças a ordenar a remessa dos autos a este Tribunal e a/r de alegada citação verificada em 09/03/2004:
Ainda antes da admissão liminar dê conhecimento dos referidos elementos ao Exmo. Oponente para querendo, sobre eles se pronunciar pois, face aos mesmos, pode até perspetivar-se uma apreciação liminar, por exemplo a decorrente da invocada intempestividade.”
Respondeu o Oponente defendendo a tempestividade atenta o conhecimento da penhora do saldo bancário e consequente pedido de apoio judiciário. Sobre a citação mencionada na informação referida no transcrito despacho diz que não foi por si assinada referindo “que apresentou impugnação quanto à execução em causa…; prestou garantia…”. Concluiu dizendo: “… nunca se pode considerar a presente oposição extemporânea já que consubstanciando a referida penhora um ato ilegal é este o expediente que o executado tem ao seu dispor para atacar a referida decisão da AT.”.
No dia 18-02-2019 foi proferido o seguinte despacho:
A AT na informação prestada aludiu e documentou a citação ocorrida em 09-03-200 (quis dizer-se 2004), cfr. cópia de a/r que juntou.
Sobre esta o Oponente nada disse mas, para que melhor se compreenda aquela e o seu teor solicite à Entidade Exequente que remeta o ofício de citação e o demais que a documente.”
A resposta foi obtida em 07-03-2019, vide expediente que antecede este despacho.
Dele resulta, para além das cópias das certidões de dívida que constituem a dívida exequenda, despacho e mandado de citação, datados de 21 e 26, ambos de janeiro do ano de 2004, sendo que para cumprimento do último foi remetida ao Oponente carta registada, datada de 28-01-2004 e, por último, mandado e auto de penhora, ambos datados de 08-03-2004 e a já anteriormente mencionada citação VIA POSTAL” que foi recebida em 09-03-2004.
Relativamente ao despacho vindo de transcrever, na 2ª parte, há alguma incorreção pois o Oponente disse não ter sido ele a assinar. Sobre o demais que referiu nos artigos 8º e segs. da pronúncia motivada pelo primeiro despacho, o inicialmente transcrito, há referência à impugnação que instaurou, a 405/04.8B, à garantia que prestou, etc. A petição da Impugnação foi apresentada no mesmo dia constante da assinatura da citação, ou seja 09-03-2004 e também com esta data foi registada a penhora sobre imóvel, penhora que veio a ser aceite como garantia suficiente para suspender os autos de execução.
Indubitavelmente o Oponente teve conhecimento, durante o ano de 2004, da execução não podendo aceitar-se, como argumentou no artigo 2º da petição inicial, que dela só teve conhecimento com a penhora do saldo bancário que lhe foi comunicada pela Entidade Bancária, através de carta, datada de 30-09-2018. Só nesta última situação é que poderia a respetiva data ser aferidora de eventual tempestividade da Oposição.
E, mesmo assim, a referida carta, cuja cópia constitui o doc. n.º 1 que instruiu a PI, é o próprio Oponente que refere “nunca a mesma terá sido recebida antes do dia 4 de outubro de 2018”, cfr. artigo 3º da pronúncia originada pelo primeiro despacho. Nesta, no artigo 4º, diz ter pedido o apoio judiciário em 22 de outubro de 2018.
As duas datas vindas de referir, são pertinentes para o seguinte:
Ao contrário do referido pelo Oponente:
“… nunca se pode considerar a presente oposição extemporânea já que consubstanciando a referida penhora um ato ilegal é este o expediente que o executado tem ao seu dispor para atacar a referida decisão da AT.” a oposição não é o “o expediente que o executado tem ao seu dispor para atacar a referida decisão da AT”.
O “expediente” ao dispor deveria ter sido o previsto no artigo 276º do Código de Procedimento e de Processo Tributário mas, atentando às datas supra aludidas não se vislumbra possível a convolação por a mesma ser impedida por intempestividade:
Determina o art.º 98º n.º 4 do CPPT que, no caso de erro na forma de processo, compete ao tribunal ordenar a convolação para a forma de processo adequada.
Não obstante, os autos não podem ser aproveitados para prosseguirem como reclamação de atos do Chefe (RAC). É que, na hipótese de se ordenar o prosseguimento dos autos como RAC impor-se-ia desde logo a rejeição liminar dela, por manifesta extemporaneidade, dado que se mostraria ultrapassado o prazo de 10 dias contados desde o conhecimento da penhora do saldo bancário.
Por ter sido proferido em situação que, na questão em análise, se afigura similar à dos presentes autos louvo-me, com a devida vénia no Ac. do STA, 0172/07, 11-04-2007, LÚCIO BARBOSA, REVERSÃO. OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL. IMPUGNAÇÃO.
II – Tendo o revertido reagido através do processo de impugnação é possível a convolação para o processo de oposição, se tempestiva.
Pelo exposto, na parte em que se reage contra a penhora dos saldos bancários, julgo como verificado o erro na forma de processo e consequente nulidade e impossibilidade de convolação para Reclamação por intempestividade desta.
No demais impõe-se concluir que a petição inicial (PI) entrou fora do prazo legal previsto no artigo 203º, n.º 1 alínea a), 1ª parte do código de Procedimento e de Processo Tributário, pelo que rejeito liminarmente esta oposição (cfr. artigo 209, n.º 1, alínea a) do Código de Procedimento e de Processo Tributário).
[…]”

Ora, da decisão proferida, ora sob sindicância, extraem-se essencialmente dois fundamentos de base. Em primeiro lugar, o facto de o Tribunal recorrido ter julgado que, na medida em que o Oponente, ora Recorrente reagia contra a penhora dos seus saldos bancários, que a forma de processo a utilizar era a da Reclamação [a que se reporta o artigo 276.º e seguintes do CPPT] e não a da Oposição, e que por julgar ocorrer erro na forma de processo, que era impossível a sua convolação, dada a julgada intempestividade do articulado apresentado; e em 2.º lugar, em torno do facto de o Tribunal recorrido sempre ter julgado que a Petição inicial atinente à Oposição deduzida, também era intempestiva, por ter entrado fora do prazo a que se reporta o artigo 203.º, n.º 1, alínea a) , 1.ª parte, do CPPT, ou seja, no prazo de 30 dias a contar da sua citação pessoal e para tanto, que em 28 de janeiro de 2004 haviam sido enviadas cartas ao Oponente, ora Recorrente, pela AT, contendo entre o mais, despacho e mandado de citação, datados 21 e 26 de janeiro de 2004, assim como mandado e auto de penhora datados de 08 de março de 2004 e nota da citação por via postal, que tudo o mesmo recebeu em 09 de março de 2004.

Fundamental ainda, foi a convicção formada pelo Tribunal a quo de que o Oponente, ora Recorrente, teve conhecimento, “indubitavelmente”, de que o mesmo [Oponente] teve conhecimento da execução contra si movida durante o ano de 2004, e não apenas e só, como assim sustentava o Oponente, com a penhora do saldo bancário que lhe foi transmitida pela entidade bancária por carta datada de 30 de setembro de 2018.

Não tendo o Tribunal recorrido fixado matéria assente [por ter decidido pela rejeição liminar], é possível de todo o modo, identificar dois factos essenciais que estiveram na base desse seu julgamento: que o ora Oponente foi citado para os termos do PEF, pessoalmente e por via postal, em 09 de março de 2004, e por outro lado, que mesmo que o Oponente tivesse apenas tomado conhecimento da carta da entidade bancária pela qual lhe foi dado conhecimento de que foi penhorado saldo bancário, datada de 30 de setembro de 2018, em data não anterior a 04 de outubro de 2018, e considerando que o Oponente alegou que veio a pedir a concessão de apoio judiciário em 22 de outubro de 2018, que de todo o modo a Oposição à execução fiscal apenas veio a ser remetida ao Serviço de finanças em 28 de novembro de 2018.

Por sua vez, nas conclusões das Alegações de recurso, o Recorrente alegou em suma, que a decisão recorrida é ilegal, na parte em que considerou que a oposição apresentada era extemporânea, porque no seu entender, a mesma respeita os prazos previstos no artigo 203.º do CPPT, por apenas ter conhecimento da penhora dos seus saldos bancários, quando recebeu carta do seu banco, para a sua morada fiscal, em França, a informar de que à ordem do processo 2526200401000861 do Serviço de Finanças de (...) lhe tinham sido penhorados os seus saldos bancários, mais concretamente, que teve conhecimento da penhora dos seus saldos bancários por carta datada de 30 de setembro de 2018, Domingo, e que a referida carta nunca terá sido enviada antes de dia 1 de Outubro de 2018, e tendo sido expedida para o estrangeiro (França), nunca a mesma terá sido recebida antes do dia 4 de Outubro de 2018, senão mesmo depois, e que tendo em 22 de Outubro de 2018 pedido apoio judiciário o que foi deferido em 13 de Novembro de 2018, data em que lhe foi nomeada a sua Advogada oficiosa, que por força do pedido de apoio judiciário para o presente processo o prazo de oposição foi interrompido [que se iniciou em 13 de Novembro de 2018 com o seu deferimento e consequente nomeação de patrono], e que tendo a Oposição dado entrada em 28 de Novembro de 2018, que foi a mesma apresentada em prazo, dentro dos 30 dias estipulados por lei, pois o prazo para apresentar oposição apenas terminava a 18 de Dezembro de 2018, já contabilizados os três dias com multa permitidos.

Referiu ainda que o aviso de recepção junto aos autos [com data aposta de 09 de março de 2004] não foi assinado por si [ora Recorrente], e que a AT ordenou a penhora de um seu prédio urbano, e com fundamento em que não era suficiente veio anos mais tarde a ordenar a penhora de outros valores, do que nunca foi notificado, por residir em França e aí ter a sua residência fiscal [como assim referiu a AT], para o que tinha [a AT] emitido notificação em 19 de março de 2018, e que também nunca foi notificado para reforçar a garantia, e que só após ter conhecimento da carta do banco a informar da penhora de saldos bancários é que poderia deduzir Oposição.

Mais referiu que a Oposição é o meio adequado, e que não lhe era devido que apresentasse Reclamação nos termos do artigo 276.º do CPPT, porque nunca foi notificado de qualquer decisão, e que este expediente legal é aplicável para reclamar de decisões proferidas pelo órgão da execução fiscal, o que sustenta não ser o caso dos autos, e que agiu de forma correta atentos os factos e falta de notificação de qualquer decisão, uma vez que apenas teve conhecimento pela missiva do banco a informar da penhora dos saldos bancários, motivo pelo qual a forma para agir sempre seria a da Oposição.


Neste patamar.

Como deflui da decisão recorrida, estamos perante uma decisão proferida ao abrigo do disposto no artigo 209.º, n.º 1, alínea a) do CPPT, no sentido de que depois de recebido o processo, o juiz rejeitará logo a oposição se a mesma tiver sido deduzida fora do prazo.

Ora, para que o Julgador possa decidir pela rejeição liminar de um articulado inicial, é fundamental, desde logo, que se lhe não suscite qualquer dúvida em torno das questões que sejam determinantes dessa rejeição.

Como assim foi decidido na decisão recorrida, depois de apreciar alguns factos, designadamente quanto ao ter o Oponente [ora Recorrido] deduzido Impugnação judicial, em 09 de março de 2004, visando a sindicância da liquidação de IRS dos anos de 1999, 2000 e 2001, e de que também naquela data foi registada a penhora a favor da AT de um imóvel sua propriedade, penhora essa que veio a ser aceite [pela AT] como garantia suficiente para suspender os autos de execução, o Tribunal recorrido veio a fundamentar que “Indubitavelmente o Oponente teve conhecimento, durante o ano de 2004, da execução não podendo aceitar-se, como argumentou no artigo 2º da petição inicial, que dela só teve conhecimento com a penhora do saldo bancário que lhe foi comunicada pela Entidade Bancária, através de carta, datada de 30-09-2018. Só nesta última situação é que poderia a respetiva data ser aferidora de eventual tempestividade da Oposição.
E, mesmo assim, a referida carta, cuja cópia constitui o doc. n.º 1 que instruiu a PI, é o próprio Oponente que refere “nunca a mesma terá sido recebida antes do dia 4 de outubro de 2018”, cfr. artigo 3º da pronúncia originada pelo primeiro despacho. Nesta, no artigo 4º, diz ter pedido o apoio judiciário em 22 de outubro de 2018.
[…]”

Ora, em torno da citação do Executado [Oponente, ora Recorrente], efectivamente, até em face do que está patenteado nas conclusões 14, 16 e 24 das Alegações de recurso, o mesmo teve de ter conhecimento de que corria contra si a execução para pagamento da quantia exequenda. Desde logo, a mera alegação por parte do ora Recorrente, de que o aviso de recepção junto aos autos não foi por si assinado [em 09 de março de 2004], não é fundamento bastante para efeitos da invocação da falta de citação ou da sua eventual nulidade, até porque a notificação foi enviada pera o seu domicílio, e foi recepcionada por pessoa que consigo habitava, como se extrai do teor da assinatura do respectivo aviso de recepção.

De modo que, por aqui, julgamos que a pretensão recursiva do Recorrente não pode proceder, no quanto é atinente ao julgamento tirado pelo Tribunal a quo no sentido de que a Oposição foi extemporaneamente deduzida, por ter sido ultrapassado [considerando o ano de 2004] o prazo de 30 dias a que se reporta o artigo 203.º, n.º 1 do CPPT, pois que este prazo começa a contar desde a data em que se verifique qualquer um de dois eventos; ou a citação para a execução, ou a realização da primeira penhora.

Ou seja, por decorrência do que assim apreciou o Tribunal recorrido, a Oposição foi intempestivamente apresentada, por o ter sido muito para além dos 30 dias subsequentes à citação, ocorrida em 2004. Resta agora ver se pode operar-se a convolação para outra forma de processo, no caso a Reclamação de decisões do OEF, porquanto, sendo patente que existem decisões proferidas [pelo OEF], mas não notificadas, e aparentemente, sem que tenham sido conhecidas pelo sujeito passivo em prazo ultrapassando em 10 dias, antecedente ao pedido de apoio judiciário que formulou em 22 de outubro de 2018, a convolação da petição apresentada para petição de Reclamação mostrar-se-á processualmente adequada.

O ora Recorrente referiu que apenas teve conhecimento da penhora de saldos bancários [sendo ele residente em França], com uma carta expedida por uma entidade bancária, e tendo essa carta data de emissão num domingo [em 30 de setembro de 2018], sem que o próprio Recorrente tenha explicitado a concreta data em que a recebeu [referiu apenas, nunca antes do dia 04 de 2018 – Cfr. conclusão 8 das Alegações de recurso], e que foi nessa sequência que veio a requerer apoio judiciário, em 22 de outubro de 2018, o qual lhe foi deferido em 13 de novembro de 2018 [e resultando de fls. 5 dos autos em suporte físico que a Petição inicial foi enviada à AT por via postal datada de 28 de novembro de 2018], e onde é alegado que a penhora dos saldos bancários “… é baseada em inverdades enfermando de ilegalidade e nulidade, devendo por isso ser declarado e nessa medida ordena-se a devolução dos valores penhorados […] determinando-se em consequência a extinção da execução [Cfr. pontos 2.º, 3.º, 30.º e 31.º da Petição inicial], tendo juntado a documentação comprovativa do assim alegado.

Como se extrai do Douto Acórdão do STA, datado de 03 de abril de 2013, proferido no Processo n.º 01308/12, disponível em www.itij.pt,

“[...]
Recorde-se que o despacho de rejeição liminar só é admissível quando a improcedência da pretensão do autor for tão evidente e, razoavelmente, indiscutível, que torne dispensável assegurar o contraditório (art. 3.º, n.º 3, do CPC) e inútil qualquer instrução e discussão posterior [sublinhado da nossa autoria], isto é, «quando o seguimento do processo não tenha razão alguma de ser, seja desperdício manifesto de actividade judicial» (Cfr. ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil anotado, Coimbra Editora, 3.ª edição – reimpressão, vol. II, pág. 373.). Daí que a jurisprudência tenha vindo a afirmar que o despacho de indeferimento liminar, dada a sua natureza “radical”, na medida em que coarcta à partida toda e qualquer expectativa de o autor ver a sua pretensão apreciada e julgada, encontrando a sua justificação em motivos de economia processual, deve ser cautelosamente decretado - sublinhado da nossa autoria.
[...]“

Cremos, porém, que em face da documentação junta aos autos, não podia o Tribunal a quo decidir-se pela rejeição liminar da acção, por inverificação de termos que lhe permitam formular um juízo seguro, sobre o decurso do prazo de Reclamação [Cfr. artigo 277.º, n.º 1 do CPPT], com fundamento em erro na forma de processo e consequente nulidade, e na impossibilidade de convolação da peça processual para Reclamação de decisão do OEF, por força da sua extemporaneidade, por tal gorar à partida, a possibilidade de o Oponente/Reclamante ver a sua pretensão apreciada e julgada, em ordem a assegurar o acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva.

E neste conspecto, como decorre dos autos – Cfr. pontos 9, 10 e 15 da informação da AT, a fls. 38 dos autos em suporte físico -, tendo a AT informado o Tribunal que o Executado [Oponente, ora Recorrente] foi notificado para efeitos de reforçar a garantia adveniente da penhora que a AT efectuou ao seu imóvel [no que até contendia com a suspensão do processo de execução, e para o que serviu, no período de 2004 a 2014], com explicitação de concretas notificações expedidas [em 02 e 03 de julho de 2014], mas que não constam dos autos, assim como, tendo ainda a AT referido naquela sua informação, que a notificação ao Executado [Oponente, ora Recorrente] da realização de penhoras aos seus saldos bancários não se concretizou, por residir o mesmo em França, essas decisões do OEF, seja no sentido de ordenar o reforço da garantia, seja da realização de novas penhoras, sendo passíveis de Reclamação [Cfr. artigo 276.º do CPPT], é sobre a AT que recai o ónus de prova de que tal sucedeu e no tempo em que tenha efectivado.

Tendo a AT referido na informação constante dos autos – Cfr. ponto 17 a fls. 39 dos autos em suporte físico - que foi por carta datada de 30 de setembro de 2018 que o Executado [Oponente ora Recorrente] foi informado pela Caixa Geral de Depósitos da penhora do saldo bancário no âmbito do PEF, e não tendo feito [a AT] a devida prova em torno da data em que o mesmo recebeu essa carta, atento o processado nos autos, não se pode considerar que o pedido de apoio judiciário tenha sido formulado para além do prazo de 10 dias a que se reporta o artigo 277.º, n.º 1 do CPPT, pelo que, por força do disposto no artigo 33.º, n.ºs 1 e 4 da Lei de apoio judiciário [Lei n.º 34/2004, de 29 de julho], deve a Petição inicial ser considerada apresentada na data em que o foi o pedido de nomeação de Patrono, ou seja, em 22 de outubro de 2018.



Efectivamente, não tendo a AT junto aos autos qualquer documento que permita concluir que o Executado, ora Recorrente, foi notificado da penhora dos saldos bancários em causa antes de 12 de outubro de 2018, nada nos permite concluir pela intempestividade da Petição inicial para efeitos de convolação para Reclamação de decisão do OEF, nos termos do artigo 276.º do CPPT, e assim sendo, deve ser revogada a decisão e determinada a convolação da Petição inicial em Reclamação de decisão do OEF, e, consequentemente, ordenada a baixa dos autos à 1.ª Instância para ali serem prosseguidos os ulteriores termos que forem processualmente devidos, se a tanto nada mais obstar.

De maneira que, face ao que deixamos expendido supra, a pretensão recursiva do Recorrente merece provimento, ainda que parcial, pelo que julgamos pela revogação da decisão recorrida, na parte em que o Tribunal decidiu pela rejeição liminar da acção por os autos não reunirem os elementos documentais necessários/suficientes que lhe pudessem permitir formular um juízo seguro sobre o decurso do prazo de Reclamação [Cfr. artigo 277.º, n.º1 do CCPT], com fundamento em erro na forma de processo e consequente nulidade, e na impossibilidade de convolação da peça processual para Reclamação de acto de OEF, pois que, salientamos, faltam nos autos elementos de prova bastantes para concluir dessa intempestividade.

Em suma, atento o acima exposto, julgamos que a decisão de rejeição liminar da Petição inicial enferma de vício de violação de lei e não pode manter-se, devendo por isso ser revogada, e determinada a convolação do articulado em Reclamação de decisão do OEF.
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E assim formulamos as seguintes CONCLUSÕES/SUMÁRIO:

Descritores: Oposição à execução fiscal; Rejeição liminar; Convolação.



1 - A rejeição liminar da Petição inicial da Oposição à execução fiscal [assim como de um outro qualquer articulado inicial], só pode ocorrer quando não possa suscitar-se qualquer dúvida quanto à questão que seja determinante para essa mesma rejeição liminar.

2 - A convolação do meio processual só é de ponderar caso ocorra erro na forma do processo, nulidade a aferir pelo ajustamento do meio processual ao pedido que se pretende fazer valer.
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IV - DECISÃO

Nestes termos, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202.º da Constituição da República Portuguesa, os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, Acordam em conferência em conceder provimento parcial ao recurso, revogando a decisão recorrida na parte em que julgou não ser possível a convolação, e determinando a convolação da Petição inicial em Reclamação de decisão do OEF, e ordenar que os autos baixem à 1.ª instância para aí prosseguirem termos, se a tal nada mais obstar.
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Sem custas.
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Notifique.
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Porto, 14 de julho de 2020.


Paulo Ferreira de Magalhães
Maria do Rosário Pais
António Patcokczy