Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01739/16.4BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:01/13/2017
Tribunal:TAF do Porto
Relator:João Beato Oliveira Sousa
Descritores:SUSPENSÃO DE EFICÁCIA; SEF
Sumário:Não se antevendo como provável que a pretensão a formular na acção principal venha a ser julgada procedente pela via do proclamado vício da falta de audiência prévia, é de confirmar o entendimento do TAF no sentido de que “não está demonstrada a aparência de bom direito (fumus boni iuris)”.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:ADR
Recorrido 1:Ministério da Administração Interna
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Procedimento Cautelar Suspensão Eficácia (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os juízes da 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Norte:

RELATÓRIO

ADR veio interpor recurso da sentença pela qual o TAF do PORTO julgou improcedente a presente providência cautelar contra o Ministério da Administração Interna (MAI) pedindo a suspensão de eficácia do ato administrativo (decisão de expulsão) e designadamente, os seus efeitos imediatos de afastamento coercivo de território nacional da Requerente, bem como a não colocação, ou sua eliminação caso já o tenha feito, na lista nacional de pessoas não admissíveis da medida de interdição de entrada em Portugal por um período de 4 (quatro) anos e não colocação no S.I.S. da interdição de entrada no Espaço Schengen por um período de 3 (três) anos, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 120º, n.ºs 1 e 2 do CPTA.

*
Em alegações a RECORRENTE formulou as seguintes CONCLUSÕES:

A - O Tribunal recorrido considerou como facto provado que a Recorrente regressou a Portugal no dia 06/06/2016, tendo sido autorizada a sua entrada (…) nos termos do artº 12 da Lei 23/07 de 04/07 (Sob o item 17).

B – O Tribunal recorrido sustenta a sua douta decisão no facto da Recorrente ter entrado em Portugal sem estar autorizada para o efeito e em situação de permanência irregular, não fundamentando juridicamente a legalidade da sua permanência em território nacional.

C – A Recorrente foi autorizada pelo SEF a entrar em solo nacional.

D – O carimbo de entrada aposto no seu documento de viagem prova a sua entrada legal e, consequentemente, a possibilidade de permanecer de forma regular no país até 90 dias.

E – A Recorrente sempre estaria em situação regular no país até que a sua regularidade fosse comprometida pela notificação para abandono do país ou, esgotado este prazo e não cumprida voluntariamente a saída, pelo afastamento coercivo.

F – O SEF não recusou a entrada da Recorrente em solo nacional nos termos do artº 32º da Lei 23/07 de 04/07.

G – Não incumbe à Recorrente provar a sua legalidade em solo nacional, porquanto a mesma advém das circunstâncias de facto inerentes à sua entrada legal interpretadas à luz da lei vigente.

H – Há uma clara e notória contradição entre a matéria de facto provada e a fundamentação da douta de sentença de fls__.

I – A douta sentença de fls__ padece de vício insanável de contradição da fundamentação.

J – É nula e deverá ser revogada.

SEM PREJUÍZO:

K – O Tribunal recorrido fez uma incorrecta interpretação dos factos trazidos a juízo e, consequentemente, decidiu mal.

Ao contrário do que sustenta,

L – O juízo sobre a entrada legal no país é exclusivamente efectuado pelo SEF – na fronteira – aquando do momento da entrada.

M – O juízo sobre se e entrada foi feita ou não para o fim inerente à mesma tem de ser avaliado no momento da entrada e não após, porquanto, posteriormente, muitos outros factos podem implicar alteração do propósito inicial subjacente à entrada.

N – “Os 90 dias de isenção de visto” contam-se desde a última entrada, e não desde a primeira, segunda, terceira, etc., etc.

O – O SEF autorizou a entrada da Recorrente em solo nacional e, nessa medida, após o ingresso no país, a sua permanência tornou-se regular.

P - A legalidade da permanência da Recorrente em solo nacional advém da aposição por parte do SEF de carimbo de entrada no seu documento de viagem – equivalente a visto de curta duração válido até 90 dias e, bem assim, daquilo que está legalmente previsto.

R – Não incumbe à Recorrente fundamentar aquilo que advém directamente dos factos provados nos autos e da Lei. e,

S – É claro resultar do relatório subjacente à douta decisão de expulsão que o SEF optou pela figura da dispensa de audiência de interessados, nos termos do artº 121 e seguintes do CPA;

T – O SEF considerou posteriormente que não ouve audiência de interessados mas, face às declarações da recorrente de 06/06/2016, estas devem valer para efeitos de audiência.

U – O Tribunal recorrido, por outro lado, considera (mal) que ouve audiência de interessados.

V – Todavia,

• O relatório que está subjacente à douta decisão de expulsão, e para o qual esta remete, datado de 06/06/2016 refere claramente, como mencionado, ter ocorrida dispensa de audiência de interessados;

• O referido relatório foi elaborado e concluído antes da Recorrente ter sido ouvida no aeroporto no mesmo dia;

• Não resulta do relatório qualquer menção ao referido auto de declarações, nem neste, nem no P.A.C.;

• Não resulta do relatório, nem do P.A.C. qualquer decisão expressa e fundamentada, de facto e direito, que sustente a dispensa de audiência de interessados;

• A Recorrente foi ouvida no aeroporto única e exclusivamente no âmbito de um processo estranho ao P.A.C., concretamente, no âmbito do processo (autónomo) de admissão / recusa de entrada no país nos termos do artº 32º da Lei 23/07 de 04/07;

X – A douta decisão de expulsão do SEF é inválida, porquanto a dispensa de audiência de interessados não tem enquadramento legal e, por outro lado, não consta de decisão expressa devidamente fundamentada de facto e direito.

Y - O Tribunal “a quo” interpretou erroneamente os factos e incorreu em erro de julgamento.

W – O Tribunal recorrido, a fim de evitar o erro de julgamento, deveria ter ordenado as respectivas diligências de prova nos termos do artº 118º, nº 3 do C.P.T.A..

Z – O Tribunal “a quo”, violou o disposto no artº 148º da Lei 23/07 de 04/07 e os artºs 101º e 102º do CPA (anterior regime), ao decidir que ocorreu audiência de interessados no procedimento.

TERMOS EM QUE DEVERÁ O PRESENTE RECURSO JULGADO PROCEDENTE E, CONSEQUENTEMENTE, SER REVOGADA A DOUTA SENTENÇA PROFERIDA PELO MERITISSIMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO E FISCAL DO PORTO.

*
Em contra alegação o RECORRIDO (MAI) formulou as seguintes CONCLUSÕES:

A. A autoridade recorrida concorda na íntegra com os termos da Sentença, datada de 9 de Setembro de 2016, proferida pelo Meritíssimo Juiz de Direito do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que entendeu:

a) Julgamos que …não foi alegada nem está demonstrada qualquer situação que consubstancie o “periculum” in mora já que não é minimamente credível que a Requerente - que em 6 de junto de 2016 afirmou o constante em 18) – viva em união de facto como cidadão português APT, ou que com o mesmo pretenda contrair um casamento que não de conveniência.

b) Não se verificando os dois pressupostos basilares de que depende a tutela cautelar, impõe-se a improcedência do peticionado.

c) No caso sub judice o Requerido não deduziu oposição cuja falta de fundamento não devesse ignorar, não alterou nem omitiu factos relevantes, não praticou nenhuma omissão grave do dever de cooperação, nem fez do processo um uso manifestamente reprovável, com vista a obter um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a acção da justiça ou protelar sem fundamento o trânsito em julgado da decisão, sendo certo que a interpretação dos factos e do regime jurídico aplicável por mais minoritária ou pouco consistente que se apresente, não fundamenta, segundo cremos a litigância de má-fé

B. Contrariamente ao que vem alegado pela recorrente, a Sentença recorrida fundou-se em argumentos válidos, e não padece de vício insanável de contradição da fundamentação. Se não vejamos,

C. É inquestionável que a ora recorrente permaneceu irregularmente em território nacional, constituindo a permanência irregular fundamento bastante para a instauração do processo de afastamento coercivo e para a decisão proferida no final daquele (v. al. a) do nº 1 do art.º 134º do diploma supra).

D. Em face da verificação da permanência irregular da ora Requerente, a Administração encontrava-se vinculada a retirar as devidas consequências e a emitir, salvaguardadas as garantias de defesa do expulsando, um juízo negativo formalizado na decisão que determinou o seu afastamento coercivo.

E. Nos termos do artº 181.º da lei 23/2007, de 4 de Julho, “considera-se ilegal a entrada de estrangeiros no território português em violação do disposto nos art.s 6º, 9º, 10º e nºs 1 e 2 do art.º 32º (…) bem como a permanência quando esta não tenha sido autorizada de harmonia com o disposto na presente lei, pelo que o cidadão estrangeiro que pretenda entrar e permanecer em território nacional dever-se-á munir de visto válido e adequado à finalidade da deslocação.

F. De acordo com o consignado no art. 7º do Tratado de Amizade, Cooperação e Consulta entre a República Portuguesa e a República Federativa do Brasil, “os cidadãos brasileiros que desejem entrar no território da outra Parte Contratante para fins culturais, empresariais, jornalísticos ou turísticos, por período de até 90 dias, são isentos de visto”.

G. Contudo a ora Recorrente não demonstrou ter entrado em Portugal para qualquer dos fins previstos no art.º 7º daquele Tratado e, ainda que assim fosse, o facto é que à data da abertura do processo de afastamento coercivo já havia ultrapassado largamente o período de 90 dias permitido a quem entra com o propósito de missão cultural, negócios, cobertura jornalística ou turismo, objectivos que a ora requerente não demonstrou prosseguir.

H. Nesta medida tendo sido claramente o objectivo da sua vinda, desde 2009, fixar-se no território nacional deveria ter-se munido previamente do competente visto de residência, nos termos da Lei de Estrangeiros, o que não fez.

I. Os cidadãos estrangeiros que se encontrem a trabalhar em território nacional sem estarem autorizados para o efeito, encontram-se em situação irregular e consequentemente sujeitos a ser expulsos do país nos termos da alínea a) do nº 1 do art.º 134º da Lei nº 23/2007 de 4 de Julho, na redacção que lhe foi dada pela Lei nº 29/2012 de 9 de Agosto, ainda que, por virtude da sua nacionalidade beneficiem do referido regime de isenção de vistos.

J. A ora requerente em 22 de Agosto de 2010 apresentou manifestação de interesse nos termos do art.º 88º nº 2 da Lei 23/2007 de 04 de Julho, a qual mereceu parecer negativo.

K. De acordo com o ponto 10 do Relatório constante a fls. 100 e ss. do processo administrativo “Não consta das bases de dados ao dispor deste OPC a entrada de qualquer pedido de reapreciação do parecer negativo que recaiu sobre a manifestação de Interesse”, pelo que se considerou que a ora Recorrente continuava em situação de permanência irregular.

L. Na sequência da não-aceitação da manifestação de interesse foi a ora Recorrente notificada para abandonar voluntariamente o território nacional nos termos do art.º 138º da Lei 23/2007 de 4 de Julho, não tendo a mesma cumprido com a notificação.

M. De facto, a Recorrente foi detida, por permanência irregular em Portugal, em 25 de Janeiro de 2013, por elementos da PSP - 1ª Divisão Policial – Porto, na sequência de uma acção de fiscalização ao estabelecimento de diversão nocturna conotado com a prática de alterne “Presidente Bar”.

N. Aquando da sua detenção, a Recorrente não possuía qualquer documento de identificação válido que comprovasse a situação regular em Território Nacional.

O. Em 25 de Janeiro de 2013, foi presente ao 1º Juízo do Tribunal de Pequena Instância Criminal do Porto, nos termos e para os efeitos do art.º 146 da Lei de Estrangeiros, onde declarou ter entrado em Portugal em Abril de 2009, sendo que na altura, tinha cá dois irmãos a residir e veio para conhecer o país, pretendendo continuar em Portugal e aqui legalizar-se.

P. Nesta sede judicial julgou o Mmo. Juiz, válida a detenção, nos termos propostos pelo Ministério Público considerando que “Indiciam os autos que a arguida se encontra ilegalmente em território nacional”, tendo mantido a medida de coacção de TIR.

Q. Ou seja, era manifesta a situação de permanência irregular da Recorrente.

R. Apesar de diversas vezes regularmente notificada para prestar declarações no âmbito do processo de Expulsão Administrativa, a Recorrente nunca compareceu nas instalações do SEF para o efeito, cfr. consta do processo administrativo.

S. Inclusivamente em 24 de Janeiro de 2014, tendo em conta a dificuldade de notificar a ora Recorrente para prestar declarações no âmbito do procedimento de expulsão administrativa, foi inserido um Pedido de Localização de paradeiro para que, sendo a ora Recorrente detectada, fosse a mesma notificada nos termos da lei.

T. Em 05 de Dezembro de 2014, cfr. auto de juntada constante do processo administrativo a fls. 45 a 49, foi a ora Recorrente detectada no PF001 – Aeroporto Internacional da Portela – Lisboa, a viajar para Belo Horizonte – Brasil, tendo sido nessa altura novamente notificada para prestar declarações no dia 26 de Fevereiro de 2016, no âmbito do processo de expulsão.

U. Mais uma vez, a ora Recorrente, não compareceu ao acto para o qual foi notificada, nem apresentou justificação para a referida falta.

V. Em 6 de Junho de 2016, foi a requerente novamente interceptada no Aeroporto Internacional da Portela, desta vez proveniente do Rio de Janeiro – Brasil, acompanhada da sua filha menor MEDS.

W. A referida intercepção resultou do accionamento do código 15, respeitante ao cumprimento de medida cautelar inserida no sistema informático do SEF no qual se encontrava inscrito um pedido de paradeiro para expulsão/audição, confr. consta da ficha de intercepção E – 251, anexa ao Relatório de Ocorrências. Vide fls. 67 e ss. do processo administrativo.

X. Naquela data, 6 de Junho de 2016, foi a requerente ouvida em Auto de Declarações, no qual afirmou sucintamente que:

• Em 2009 entrou como turista pelo Aeroporto do Porto, tendo começado a trabalhar numa casa particular como empregada doméstica, auferindo cerca de 485,00€ mensais, e depois em várias casas em regime de part-time.

• No final do ano de 2015 regressou ao Brasil

• Teve conhecimento do processo de expulsão instaurado em Janeiro de 2013 quando se apresentou no Aeroporto Internacional da Portela para viajar para o Brasil.

• Viajava acompanhada da sua filha menor de 16 anos, para passar 10 dias de férias em casa de um amigo da sua família, o cidadão nacional APT, residente na Rua ….

• No Brasil trabalha como vendedora numa empresa de alarmes, onde aufere 70 reais.

• Na europa não tem quaisquer familiares e tem um relacionamento com um cidadão brasileiro no Brasil, que segundo declarações suas não a acompanhou por se encontrar a trabalhar e também porque tem a mãe doente.

Y. Findo o Auto de declarações que a Recorrente leu, entendeu e assinou, entrou em território nacional juntamente com a sua filha menor, em virtude de naquela data não ter sido possível exarar a decisão de expulsão e, bem assim, atento o facto de o cidadão nacional APT ter assinado um termo de responsabilidade em conformidade com o legalmente estipulado na Lei de Estrangeiros.

Z. Ainda em 6 de Junho de 2016, e após ter sido ouvida em Auto de Declarações foi a Recorrente notificada para comparecer no dia 9 de Junho de 2016, pelas 10H30, na Delegação Regional do Norte do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, sita na Rua …, a fim de ser notificada do despacho da Exma. Senhora Directora Nacional do SEF, relativo ao processo de afastamento coercivo que correu termos naquela Direcção Regional.

AA. No entanto apenas em 16 de Junho de 2016 logrou o Recorrido, notificar a ora Recorrente da decisão de afastamento coercivo do território nacional nos termos do artigo 146º e ss. da Lei de Estrangeiros em virtude de se encontrar em situação irregular cfr. al. a) do nº 1 do art.º 134º da mesma Lei.

BB. Da leitura e análise do processo administrativo temos que a ora requerente nunca colaborou com o SEF no sentido de serem tomadas declarações no âmbito do procedimento de expulsão administrativa, tendo apenas a entidade demandada logrado obter contacto com a mesma nos momentos em que se apresentou no Aeroporto Internacional de Lisboa, para entrar ou sair do território nacional.

CC. Portanto, infere-se do que aqui foi dito que é falso que o Relatório que sustentou a decisão de afastamento coercivo foi elaborado anteriormente à decisão proferida pela Directora nacional do SEF, porquanto aquele data de 6 de Junho de 2016 e esta data de 8 de Junho de 2016.

DD. Quanto ao grande busílis que é o facto de a Recorrente alegar que a decisão do Tribunal “A quo” padece de vício insanável de contradição da fundamentação, motivado no facto de considerar provado que a Recorrente regressou a Portugal no dia 06/06/2016 tendo sido autorizada a sua entrada (…) nos termos do art.º 12º da Lei 23/2007 de 04/07.

EE. Ora o que sucedeu no caso da ora Recorrente foi tão simples quanto isto:

FF. Sobre a ora Recorrente impendia um processo de afastamento coercivo por permanência irregular em território nacional, no período que mediou Abril de 2009, se se considerar que a sua entrada foi ilegal uma vez que não obedeceu aos requisitos do art.º 7º do Tratado de cooperação e amizade entre Portugal e Brasil, ou se assim não se entender a partir da data em que perfez 90 dias de permanência em território nacional após a entrada.

GG. Assim, ainda que se considere que a entrada foi legal em Abril de 2009, o que não nos parece ser de acordo com a Lei, o facto é que a partir dos 90 dias posteriores a sua permanência tornou-se irregular e cfr. consta do processo administrativo não foi regularizada por via do mecanismo excepcional veiculado pelo nº 2 do art.º 88º da Lei de Estrangeiros, ou seja a recorrente encontrava-se em situação irregular à data da abertura do processo de afastamento coercivo, em 6 de Fevereiro de 2013.

HH. Ora é a essa data que o Tribunal faz referência e é sobre o período da sua permanência irregular em território nacional que incidiu a decisão de afastamento coercivo.

II. Completamente diferente é a situação da última entrada da recorrente em território nacional, a qual obviamente foi autorizada pelo SEF.

JJ. Aliás a única forma de o recorrido encerrar o procedimento de afastamento coercivo que impendia sobre a Recorrente era permitir a sua entrada por forma a dar continuidade a um processo que se arrastava desde 2013 sem que a Administração tivesse logrado notificar a recorrente para efeitos de se pronunciar no procedimento nos termos do art.º 148º nº da Lei de Estrangeiros.

KK. Efectivamente a recorrente foi interceptada por via do accionamento do código 15, respeitante ao cumprimento de medida cautelar inserida no sistema informático do SEF no qual se encontrava inscrito um pedido de paradeiro para expulsão/audição, conf. consta da ficha de intercepção E – 251, anexa ao Relatório de Ocorrências. Vide fls. 67 e ss. do processo administrativo.

LL. Ora, não se pode inferir da factualidade supra que por ter entrado de forma autorizada pelo SEF, todo o tempo de permanência irregular sobre o qual incidiu o processo de expulsão tenha sido apagado.

MM. Deste modo afigura-se ao recorrido que os argumentos da recorrente roçam os limites do cinismo, uma vez que é óbvio que o que está em causa é todo o período de permanência irregular que mediou entre o ano de 2009 até à data de 6 de Junho de 2016 quando foi interceptada no Aeroporto de Lisboa.

NN. Mais um a vez se reitera que a entrada autorizada em 6 de junho de 2016, foi um imperativo legal e administrativo, uma vez que para dar continuidade e concluir o processo de afastamento coercivo a recorrente teria que estar em território nacional e obviamente a entrada em território nacional depende da autorização de quem de direito nos termos da Lei Geral de Estrangeiros.

OO. Quanto à questão da audiência prévia, também aqui não assiste razão à recorrente, na medida em que as declarações proferidas em 6 de junho de 2016 valeram sim como audiência de interessados nos termos do art.º 148º nº 2 da Lei de Estrangeiros.

PP. Aliás a recorrente tal como declarou em auto teve conhecimento do processo de afastamento coercivo quando se dirigia para o Brasil no Aeroporto de Lisboa, apesar de terem sido várias as tentativas de notificação por parte das autoridades portuguesas.

QQ. Mais, durante o Auto, a recorrente pronunciou-se sobre o processo de afastamento coercivo e os fundamentos que lhe deram origem, estando assim devidamente ciente do processo que impendia e tendo tido a oportunidade para se pronunciar sobre o mesmo, remetendo-se a argumentação desta matéria para o vertido em sede de contestação, dando-se aqui por integralmente reproduzida.

RR. Em bom rigor, afigura-se à entidade demandada que foram respeitados todos os trâmites legais, nomeadamente a audição da requerente antes de ser exarada a decisão de expulsão.

SS. Em rigor, a Acção Cautelar não poderia ter outro tipo de Sentença, pois nos termos conjugados do art.º 120º, nº e 2 do CPTA as providência cautelares deverão ser decretadas quando, cumulativamente:

a) Seja provável que a pretensão formulada ou a formular no processo principal venha a ser julgada procedente (fumus boni iuris);

b) Haja fundado receio de constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurara no processo principal (periculum in mora);

TT. Assim ainda que se verifiquem tais requisitos, a providência será recusada quando, devidamente ponderados os interesses públicos e privados em presença, os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adopção de outras providências (princípio da proporcionalidade)

UU. O preenchimento do fumus boni iuris exige que seja “provável que a pretensão formulada no processo principal venha a ser julgada procedente (…)”. Sobre o Requerente impende, portanto “o encargo de fazer prova sumária do bem fundado da pretensão deduzida no processo principal (…) sendo, pois, no essencial, aplicáveis, neste caso, os critérios que, ao longo do tempo foram elaborados pela jurisprudência e pela doutrina do processo civil sobre apreciação perfunctória da aparência do bom direito a que o juiz deve proceder no âmbito dos procedimentos cautelares” (cfr. ALMEIDA, Mário Aroso; CADILHE, Carlos Alberto Fernandes; in Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 3ª ed. Revista, 2010, pags. 808 e 809)

VV. Ora tendo a recorrente, conforme consta dos autos do processo administrativo bem como de matéria assente pelo tribunal a quo, permanecido ilegalmente em Portugal cerca de seis anos, sem qualquer título que a tanto autorizasse; não tendo abandonado voluntariamente o território nacional; não tendo comparecido no SEF quando determinado e mantendo-se em paradeiro incerto; e bem assim sendo a alegada promessa de casamento com cidadão nacional irrelevante para efeito de legalização da sua situação em território nacional (ao contrario de uma situação de efectivo casamento ou comprovada união de facto), parece evidente que não se encontram reunidos os pressupostos que levariam à suspensão da eficácia da decisão de afastamento coercivo, ou mesmo da anulação do acto.

WW. A recorrente não demonstrou ser detentora de um direito digno de protecção em território nacional, e muito menos que os prejuízos que advieram da sua expulsão são superiores ao interesse publico aqui protegido que se consubstancia no respeito e viabilização das normas de direito interno e mesmo internacional visadas pela legislação que regula a entrada, permanência e afastamento dos cidadãos estrangeiros do território nacional.

XX. Com todo o respeito, não antevê a administração que sobre a esfera jurídica da requerente exista um direito que invalide a decisão administrativa ora em crise.

YY. Com efeito a requerente é uma cidadã estrangeira, que à data da abertura do processo de expulsão se encontrava irregular no território nacional, mantendo-se a situação de irregularidade inalterada.

ZZ. Pelo que, não procedem, de todo, os argumentos aduzidos pelo requerente.

AAA. O interesse público relaciona-se com o princípio da legalidade (cfr. Art.º 3º do CPA), nos termos do qual a Administração está vinculada pelas normas que reconhecem direitos e tutelam interesses particulares e pelas que fixam o interesse público a prosseguir e as condutas a observar tendo em vista aquele objectivo – Art.º 266º nº 1 e 2 da CRP.

BBB. Aliás, “ Os princípios da imparcialidade, proporcionalidade, justiça e igualdade, só assumem relevância no domínio da actuação discricionária da Administração, encontrando-se, no exercício da actividade vinculada, tutelada a prossecução de tais princípios pelo princípio da legalidade. “ (Ac. Do STA de 16.6.1994 – Rec. Nº 31 319; sublinhado nosso).

CCC. Todo o exposto demonstra, também, a obrigatoriedade da Administração em assumir o comportamento adoptado e a evidência indiscutível da respectiva legalidade e, bem assim, a manifesta improcedência da pretensão principal do requerente, que, a ser viabilizada, violaria o comando imperativo ínsito na alínea a) do nº 1 do Art.º 134º da Lei 29/2012 de 9 de Agosto.

DDD. É de concluir por todo o exposto que a recorrente não é detentora de qualquer interesse legalmente protegido ou direito que possa ser beliscado com a manutenção da decisão de expulsão.

EEE. Assim tal como refere a Sentença recorrida, o receio do recorrente parece ser o de que o SEF não observe a lei, mas a ser este, pois não concretiza outro, limitando-se a pretender a nulidade por violação de um suposto direito a não ser afastado do filho, tal observância não constitui receio fundado nos termos do artº 120 nº b) do CPTA atenta a falta de fundamento da pretensão formulada ou a formular.

FFF. A Sentença ora impugnada foi correcta e legalmente proferida e o procedimento administrativo que lhe está subjacente não padece de qualquer vício que o invalide, pelo que não procedem in totum as alegações aduzidas pelo recorrente.

GGG. Uma vez determinados os contornos e o conteúdo específico do interesse público que está em causa denota-se que este encontra completa e legítima identificação no procedimento prosseguido, e que a eventual concessão da providência, porque a pretensão material do recorrente é infundada e viola a Lei, é fortemente lesiva do interesse público, em termos tais que impossibilita qualquer comparação com os danos que o recorrente possa vir a sofrer, decorrentes da sua conduta ilegal.

HHH. A decretação da providência seria fortemente lesiva do interesse público, provocando danos atinentes à própria prossecução daquele, expressos na violação de normas legais imperativas atinentes à entrada e permanência dos cidadãos estrangeiros em território nacional constantes da Lei nº 23/2007 de 4 de Julho, alterada pela Lei nº 29/2012 de 9 de Agosto (Cfr. art.º 120º nº 2 do CPTA)

Termos em que deve esse Venerando Tribunal manter a Sentença ora recorrida.

*
O Ministério Público emitiu douto parecer no sentido de que deverá ser negado provimento ao recurso.
*
QUESTÕES A RESOLVER

Nulidade da sentença por “vício insanável de contradição da fundamentação”; Erro de julgamento, nos termos da alegação da Recorrente e nos limites racionais das respectivas conclusões.

*
FACTOS

Consta da sentença:

«Com interesse para a decisão da causa, consideram-se sumariamente demonstrados os seguintes factos:
1) A Requerente é cidadã nacional da República Federativa do Brasil, nascida a 7 de julho de 1982 e titular do passaporte n.º Y…(fls. 94 do p.a.).

2) A Requerente efetuou pedido de autorização de residência nos termos do art.º 88º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 23/2007 de 4 de julho, pedido esse que foi recusado em 5 de abril de 2012 (fl. 54 do p.a.).

3) No dia 25 de janeiro de 2013 a Requerente foi detida e constituída arguida (NUIPC 56/13.6PFPRT - fls. 9 e 10 do p.a.).

4) Nessa mesma data a arguida foi presente ao juiz do Tribunal de Pequena Instância Criminal do Porto tendo declarado que entrou em Portugal em abril de 2009 (fl. 26 e 27 do p.a.).

5) Foi decidido sujeitar a arguida à medida de coação de termo de identidade e residência, tendo sido aquela notificada para comparecer no SEF no prazo máximo de oito dias, nos termos do art.º 146º, n.º 4 da Lei n.º 23/2007 de 4 de julho (fl. 28 do p.a.).

6) No dia 6 de fevereiro de 2013 o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras instaurou à Requerente um processo de afastamento coercivo ao qual foi atribuído o n.º 11/2013-100 (fls. 1 e 2 do p.a.).

7) A Requerente não compareceu no SEF conforme determinado em 5).

8) No dia 22 de maio de 2013, a Requerente foi notificada para comparecer no SEF no dia 4 de junho de 2013 a fim de ser ouvida (fl. 52 do p.a.).

9) A Requerente não compareceu no SEF conforme determinado em 8) (fl. 52 do p.a.).

10) Foi remetida à Requerente, para a morada constante do TIR, oficio tendo em vista a sua nova notificação para comparecer no SEF, para prestar declarações, no dia 9 de janeiro de 2014, podendo então pronunciar-se sobre as questões que determinaram a instauração do respetivo processo bem como requerer diligências complementares e juntar documentos, carta essa que não foi reclamada (fls. 32 e 33 do p.a.).

11) Em 24 de janeiro de 2014 foi inserido no sistema um pedido de localização de paradeiro da Requerente (fl. 34).

12) A Requerente apenas foi detetada em 5 de dezembro de 2015 no posto de fronteira do aeroporto de Lisboa (fl. 41 e 47 do p.a.).

13) Nessa data, a Requerente viajou para o Brasil, tendo sido notificada para prestar declarações no dia 26 de fevereiro de 2016, por ter indicado que então seria possível que se encontrasse novamente em Portugal (fl. 41 do p.a.).

14) Mais foi informada que, naquela data, poderia pronunciar-se sobre as questões que determinaram a instauração do processo de afastamento coercivo bem como requerer diligências complementares e juntar documentos (fl. 42 do p.a.).

15) Na data designada a Requerente não compareceu no local designado para prestar declarações.

16) A Requerente não tem qualquer visto ou documento válido que a habilite a permanecer, residir ou trabalhar em Portugal.

17) A Requerente regressou a Portugal no dia 6 de junho de 2016 tendo sido autorizada a sua entrada mediante a subscrição de um termo de responsabilidade por parte do cidadão APT, nos termos do art.º 12º do Decreto-Lei n.º 23/2007 de 4 de julho (fl. 66 e 84 do p.a.).

18) Nesse dia a Requerente prestou declarações tendo referido, nomeadamente, que entrou, como turista, em Portugal, em 2009 e que “viaja juntamente com a sua filha menor de 16 anos, de nome MEDS para passar 10 dias de férias, em casa de um amigo da sua família, cidadão nacional APT (…) No Brasil trabalha como vendedora numa empresa de alarmes e a sua filha estuda, encontra-se de férias por um período de 15 dias (…) Na Europa não tem quaisquer familiares e tem um relacionamento com um cidadão brasileiro no Brasil. Questionada o porque do seu namorado não a acompanhar nas suas férias a mesma respondeu que encontra-se a trabalhar e tem a mãe doente”(fl. 68 a 70 do p.a.).

19) Nesse dia foi a Requerente notificada para comparecer na Direção Regional do Norte do SEF no dia 9 de junho de 2016 pelas 10h30m a fim de tomar conhecimento do despacho da Diretora Nacional do SEF relativo ao seu processo de afastamento coercivo (fl. 69 e 86 do p.a.).

20) No dia 8 de junho de 2016 a Diretora Nacional do SEF proferiu decisão nos termos da qual, aderindo aos fundamentos constantes do relatório de fls. 57 a 60 do p.a. que aqui se considera reproduzido, considerou que a Requerente se encontra em situação irregular em território nacional (nos termos do art.º 134º, n.º 1, a) “ex vi” do art.º 181º, ambos da Lei 23/07 de 4 de julho e consequentemente determinou: a) o afastamento da Requerente de território nacional; b) a sua interdição na lista nacional por um período de quatro anos; c) a sua interdição na lista nacional de pessoas não admissíveis pelo período da referida interdição de entrada; d) a sua inscrição no Sistema de Informação Schengen (S.I.S) para efeitos de não admissão por um período de três (3) anos, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 96º, apreciável nos termos do art.º 112º, ambos da Convenção de Aplicação do Acordo de Schengen; e)o custeio pelo Estado Português das despesas da medida imposta, caso se comprove que a cidadã expulsanda não possui meios económicos que lhe permitam custear as despesas de retorno. (fl. 91 do p.a.).

21) A Requerente foi notificada da decisão referida em 20) no dia 16 de junho de 2016 (fl. 93 do p.a.).

22) No dia 21 de junho de 2016 a Requerente e o cidadão português APT assinaram um acordo escrito que intitularam “contrato promessa casamento” que consta de fls. 25 do suporte físico do processo, que aqui se considera reproduzido.


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Inexistem factos não provados com relevância para a decisão da presente decisão cautelar.
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Todos os factos que supra se consideraram indiciariamente demonstrados resultam da análise do processo administrativo (concretamente das folhas do mesmo que foram sendo referidas) à exceção do facto 22) que resulta da análise do documento de fls. 25 do suporte físico do processo.
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DIREITO

Arguição de nulidade da sentença

Embora a Recorrente não enquadre normativamente a arguida nulidade da sentença, as razões que aponta nas suas conclusões A a J só poderiam configurar a causa de nulidade prevista no artigo 615º/1/c) do CPC.

No entanto, em concreto tal causa de nulidade não ocorre porque não se verifica ambiguidade ou obscuridade da fundamentação da sentença, nem contradição desta com a decisão.

Existiria porventura a situação anómala invocada pela Recorrente se o item 17) da matéria de facto fosse de considerar isoladamente. Mas não é, pois para tanto teriam que ser obliterados os demais factos provados, mormente os constantes em 12) a 16), o que não seria de todo aceitável, uma vez que só a conjunção de todos esses factos fornece sentido útil à fundamentação delineada pelo TAF.

Na verdade foi a consideração global de toda essa factualidade, assim como toda a evolução do processo de afastamento da Requerente desde 2009 (e não apenas desde a data da sua episódica entrada em Portugal, em 06-06-2016, aludida no item 17 da matéria de facto) que permitiu ao TAF concluir que “a requerente se encontrará em território nacional sem estar autorizada para o efeito, ou seja em situação irregular e consequentemente sujeita a se expulsa do país”.

Com efeito, segundo a sentença:

«A Requerente, cidadã brasileira, não demonstrou ter entrado em Portugal para qualquer um dos fins previstos no citado art.º 7º.. Ainda que assim não se entendesse, há muito se esgotou o prazo de 90 dias de isenção de visto já que a mesma entrou em Portugal em 2009.
Assim sendo, afigura-se-nos que a Requerente se encontrará em território nacional sem estar autorizada para o efeito, ou seja em situação irregular e consequentemente sujeita a ser expulsa do país nos termos da alínea a) do nº 1 do art.º 134º da lei nº 23/2007 de 4 de Julho nos termos do qual “sem prejuízo das disposições constantes de convenções internacionais de que Portugal seja Parte ou a que se vincule, é afastado coercivamente ou expulso judicialmente do território português, o cidadão estrangeiro que entre ou permaneça ilegalmente no território português”.
A Requerente permaneceu ilegalmente em Portugal cerca de seis anos, em qualquer título que a tanto a autorizasse, não tendo abandonado voluntariamente o território nacional, não tendo comparecido no SEF quando determinado e mantendo-se em paradeiro incerto.»
Em síntese, o TAF considerou que a permanência ilegal da Recorrente em território nacional relevante para a ordem de expulsão já se havia consumado anteriormente à sua intercepção pelo SEF no aeroporto de Lisboa em 6 de Junho de 2016 e, portanto, é apodíctico não ser possível reduzir a fundamentação relevante da decisão judicial impugnada à questão da legalidade ou ilegalidade da sua entrada em 2016 no nosso país.

Assim improcede a arguição de nulidade em análise.

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O julgamento (fumus boni juris)

O TAF considerou que não está demonstrada a aparência de bom direito.

No Relatório da sentença as questões decidendas são caracterizadas, segundo o invocado pela Requerente, nestes termos:

«Alega, em suma, que é cidadã brasileira e que, em janeiro de 2013, foi detida nos termos do art.º 146º da Lei n.º 23/2007 de 4 de julho tendo o SEF determinado a abertura de um processo de afastamento coercivo. Em 8 junho de 2016 foi proferida decisão de expulsão com a qual não se conforma porque, segundo entende, violou o seu direito de audiência prévia plasmado no art.º 148º da lei n.º 23/2007 de 4 de julho e art.ºs 101º e 102º do CPA. No que concerne ao periculum in mora alega que pretende contrair matrimónio com um cidadão português com quem vive sendo que, por via do casamento, passará a ter o direito de residir em Portugal, direito que é incompatível com a sua expulsão. Acresce que o seu afastamento de Portugal prejudicará a sua relação com o cidadão português com quem pretende casar.»
E realmente o referido vício formal/procedimental é o único que surge invocado no requerimento cautelar sob a epígrafe “ii – Fumus boni iuris”.

E, não obstante a Requerente formular várias críticas avulsas e incidentais à actuação e decisão do SEF, em diversos passos dessa peça instauradora do presente processo cautelar, o certo é que não as organiza de forma a substanciarem vícios do acto suspendendo susceptíveis de conduzir à sua anulação na acção principal.

De resto, a própria Requerente confirma no item 85 do requerimento cautelar que a invocação da aparência de bom direito repousa exclusivamente no aludido vício formal. Transcreve-se:

«85 - A pretensão da Requerente na acção principal é a obtenção de decisão que julgue verificado o referido vício no procedimento e declare inválida a decisão de expulsão…»

Foi em conformidade com esta posição da Recorrente que na sentença se anunciou, como razão do inconformismo dela com a decisão de expulsão e portanto, razão substanciadora do fumus boni iuris invocado, a violação do seu direito de audiência prévia plasmado no art.º 148º da lei n.º 23/2007 de 4 de julho e art.ºs 101º e 102º do CPA.

Assim, quando o TAF, após escassas considerações incidentais em que refere designadamente “que a Requerente se encontrará em território nacional sem estar autorizada para o efeito, ou seja em situação irregular e consequentemente sujeita a ser expulsa do país nos termos da alínea a) do nº1 do art. 134º da Lei nº 23/2007, de 4 de Julho”, conclui “Pelo que se nos afigura que a decisão impugnada não padecerá de qualquer vício de natureza substancial”, fá-lo também incidentalmente e sem alijar a sua convicção no sentido de a preterição da audiência prévia ter sido o único vício substanciado e relevantemente invocado no Requerimento Inicial, a título de aparência de bom direito.
E a sentença prossegue então deste modo:

«Quanto ao vício formal invocado – a preterição de audiência prévia – afigura-se-nos que a Requerente foi ouvida, audição essa que, nos termos do art.º 148º, n.º 2 da Lei n.º 23/2007 equivale à audiência de interessado.
Sendo ainda certo que, ainda que assim não se venha a entender, a decisão em causa, em face da irregularidade da permanência da Requerente em Portugal (que não alega a existência de qualquer título que a habilite a permanecer em Portugal e que, cerca de 15 dias após a sua (re)entrada em território nacional pretende casar-se com cidadão português, o que demonstra que não re(entrou) com qualquer fim cultural, artístico, jornalístico ou turístico) não poderia ter outro conteúdo pelo que sempre será de proceder ao seu aproveitamento, julgando inoperante o vício em causa.
Concluímos, portanto, que não está demonstrada a aparência de bom direito (fumus boni iuris).»
Esta conclusão do TAF é acertada.
Dispõe o referido Artigo 148º da Lei 23/2007:
«Processo
1 - Durante a instrução do processo é assegurada a audição da pessoa contra a qual o mesmo foi instaurado, que goza de todas as garantias de defesa.
2 - A audição referida no número anterior vale, para todos os efeitos, como audiência do interessado.
…»
Tem-se por seguro que a audição da Requerente em 06-06-2016, mencionada em 18) da matéria de facto, configura sem qualquer dificuldade a audição a que se referem as normas supra transcritas, valendo portanto como audiência do interessado.

Lê-se no documento mencionado em 18 da matéria de facto, que contém o Relatório e Proposta do Instrutor do processo de expulsão da Requerente e cujo conteúdo integral se dá por reproduzido (doc. a fls 57-60 do PA):

“Foram efectuadas várias tentativas de notificação para a ora arguida prestar declarações no âmbito da instrução dos presentes autos (vide pontos 5, 6 e 8), sendo que a mesma, apesar de devidamente notificada, nunca compareceu nesta DRN, nem apresentou justificação para tal ausência, dispensando assim essa mesma audiência nos termos do art. 121º e seguintes do Código do Procedimento Administrativo”.

A “dispensa” em causa é assim referida como um facto passado, numa resenha histórica da evolução do processo de expulsão da Requerente desde o seu início e, portanto, sem qualquer prejuízo da audição que efectivamente só foi possível concretizar em 2016, aquando da última entrada da Requerente em Portugal, referida no trecho supra transcrito da sentença.

Em resumo, não se antevendo como provável que a pretensão a formular na acção principal venha a ser julgada procedente pela via do proclamado vício da falta de audiência prévia, é de confirmar o entendimento do TAF no sentido de que “não está demonstrada a aparência de bom direito (fumus boni iuris)”.

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O julgamento (periculum in mora)
Lê-se na sentença:

«Julgamos ainda que não foi alegada nem está demonstrada qualquer situação que consubstancie o periculum in mora já que não é minimamente credível que a Requerente - que em 6 de junho de 2016 afirmou o constante em 18) - viva em união de facto com o cidadão português APT, ou que com o mesmo pretenda contrair um casamento que não de conveniência.»
Sucede que a Recorrente não leva a conclusões qualquer censura relevante a este passo da sentença, sendo assim de confirmar a inexistência no caso do critério de decisão cautelar previsto no artigo 120º/1 CPTA, ou seja, que “haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal”.

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O indeferimento do requerimento probatório
Finalmente, perante o modo como foram solucionadas as questões antecedentes, torna-se clara a inexistência de factos alegados controvertidos e relevantes, pelo que não havia necessidade de mais instrução, como decidido nos termos do artigo 118º CPTA, improcedendo a conclusão w) da Recorrente.
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DECISÃO

Pelo exposto acordam em negar provimento ao recurso.

Porto, 13 de Janeiro de 2017
Ass.: João Beato
Ass.: Hélder Vieira
Ass.: Joaquim Cruzeiro