Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01173/09.2BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:12/21/2017
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Pedro Vergueiro
Descritores:ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL
JULGAMENTO DA MATÉRIA DE FACTO
INUTILIDADE SUPERVENIENTE DA LIDE
CUSTAS
Sumário:I) Ao TCA assiste o poder de alterar a decisão de facto fixada pelo tribunal “a quo” desde que ocorram os pressupostos vertidos no art. 712.º, n.º 1 do CPC (actual art. 662º), incumbindo-lhe, nessa medida, reapreciar as provas em que assentou a decisão impugnada objecto de controvérsia, bem como apreciar oficiosamente outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre aqueles pontos da factualidade controvertidos.
II) Nos termos do artigo 527º do C. Proc. Civil, aplicável por força do disposto na alínea e) do artigo 2º do CPPT e de acordo com o estabelecido no artigo 5º da Lei nº 41/2013, de 26 de Junho, suporta as custas a parte que deu causa ao processo, isto é, a parte cuja pretensão não foi atendida, referindo o artigo 536º nº 3 do C. Proc. Civil que perante a extinção da instância por impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide, a responsabilidade pelas custas fica a cargo do autor ou requerente, salvo se tal impossibilidade ou inutilidade for imputável ao réu ou requerido, dispondo o nº 4 que é imputável ao réu ou requerido a inutilidade superveniente da lide quando esta decorra da satisfação voluntária, por parte deste, da pretensão do autor ou requerente.
III) O A. reagiu contra um despacho de cessação de benefício fiscal para efeito de IMI, pretendendo naturalmente evitar uma posterior emissão de liquidação de IMI, situação susceptível de afectar a sua esfera jurídica, o que significa que a revogação do despacho na decorrência de deferimento de recurso hierárquico interposto é, manifestamente, o tal facto ocorrido na pendência da instância, em função do qual o litígio deixa de ter interesse e utilidade, conduzindo, por isso, à extinção da instância, na medida em que, a pretensão do autor não poderá, então, manter-se, por virtude do desaparecimento do objecto do processo.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Autoridade Tributária e Aduaneira
Recorrido 1:J...
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
1. RELATÓRIO
A Excelentíssima Representante da Autoridade Tributária e Aduaneira, devidamente identificada nos autos, inconformada veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 02-01-2017, que julgou extinta, por inutilidade superveniente da lide, a presente ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL interposta por J..., com vista a obter a anulação do despacho que determinou a cessação do benefício fiscal decorrente do disposto no artigo 14.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF) referente à liquidação de IMI do ano de 2007.

Formulou nas respectivas alegações (cfr. fls. 90-93), as seguintes conclusões que se reproduzem:
“ (…)
A. A Entidade recorrente não pode concordar com a Sentença a quo visada no presente recurso, por entender que incorreu em erro ao fixar a matéria de facto, porque insuficiente e bem assim, em errada interpretação da matéria de facto, com a consequente errada interpretação e aplicação dos artigos 277º, 576º n.º3 e 527º do Código Processo Civil à situação dos autos;
B. Tais erros conduziram a uma errada fundamentação da decisão, tendo sido declarada extinta a instância por impossibilidade superveniente da lide e condenando a Entidade demandada em custas, pelo que deve ser substituída por outra, que declare procedente a excepção peremptória de impossibilidade da lide por falta de objecto da acção e absolva a Entidade demandada do pedido e determine que as custas ficam a cargo do Autor.
C. Nesse sentido a Entidade ora Recorrente pugna pelo aditamento de três pontos à matéria de facto, porque relevantes para o apuramento da verdade e que cuja redacção se requer nos seguintes termos:
1-A) O Autor foi casado com Maria…, e na constância do casamento adquiriram um imóvel, sito na Rua…, freguesia da Foz do Douro, concelho do Porto, inscrito na matriz com o n.º 2…, que sendo a casa de morada de família, obteve isenção de IMI, nos termos da lei.
1.B) Em 16 de Junho de 2005 celebraram escritura de partilhas na sequência de decretamento de divórcio, e na qual a casa de morada de família ficou adjudicada à ex-esposa Maria…. (cf pag 32 do PA).
1-C) Em 5 de Março de 2009 a Proprietária do imóvel veio juntar escritura de partilhas e solicitar que fosse “mantida a continuidade da isenção”, por ter sido notificada para pagar IMI relativo aos anos de 2005, 2006 e 2007. (doc a fls 31 do PA).
D. Os factos cujo aditamento agora se requer e que se encontram provados por documento, comprovam que a AT notificou o ora Autor da cessação de benefícios fiscais, pois nessa data, ainda constava como comproprietário do Imóvel, o que justifica a notificação do ora Autor da cessação dos benefícios fiscais.
E. É que, para efeitos de IMI e Benefícios fiscais, a informação de que havia sido celebrada escritura de partilhas foi comunicada apenas em 5 de Março de 2009, conforme admite a requerente e proprietária do imóvel, no requerimento a fls 31 do PA.
F. Na verdade, o Autor, agora recorrido, quando intentou a acção, não era já parte legítima para reagir contra a cessação da isenção porque não era proprietário do imóvel, como se referiu apenas teria que invocar a sua ilegitimidade perante a AT.
G. Por tudo o supra exposto, se pode concluir que o acto visado na presente acção não produziu, nem poderia produzir efeitos na esfera jurídica do Autor, razão pela qual a acção que intentou carecia totalmente de objecto.
H. Assim, contrariamente ao decidido na sentença recorrida, a decisão proferida no recurso hierárquico apresentado por Maria… e constante dos factos em 2) e 3) não é susceptível de fundamentar a decisão de extinção da instância, porque o Autor já não era proprietário do imóvel.
I. Conforme ficou comprovado, foram invocados factos que impedem o efeito jurídico dos factos articulados pelo Autor, pelo que se verificou a excepção peremptória prevista no n.º3 do artigo 576º do CPC, o que importa a absolvição total do pedido.
J. Ao não ter decidido assim, a sentença recorrida errou na fixação dos factos relevantes para a boa decisão da causa, incorreu em erro na interpretação dos factos provados, e errou na não aplicação à situação dos autos da excepção peremptória de impossibilidade da lide por falta de objecto.
K. Incorreu ainda a sentença recorrida em erro, ao condenar a Entidade ora recorrida em custas, por não ter sido esta que deu causa à acção, como dispõe o artigo 527º do CPC.
L. Conforme os factos cujo aditamento se requereu, o ora Recorrido, apenas foi notificado da cessação do benefício fiscal, porque só em 5 de Março de 2009 a AT tomou conhecimento de que já não era proprietário do imóvel.
M. Donde, tendo-se verificado a excepção peremptória da impossibilidade da lide por falta de objecto, ou seja, por o acto visado pelo Autor não produzir efeitos em relação a ele (quer por não ter legitimidade nem ser proprietário do imóvel, e não o ter comunicado à AT como era sua obrigação), é sobre si que têm de recair as consequências do incumprimento desse seu ónus e da indevida interposição da acção. E não sobre a Administração.
N. Não podendo, face ao supra referido e salvo melhor opinião, ser acolhido entendimento vertido na sentença recorrida de condenar a Administração Tributária em custas porque se encontra em dissonância com o estabelecido pelo artigo 527º do CPC.
O. De tudo o supra exposto, se pugna pela revogação da sentença recorrida por ter incorrido em erro na fixação da matéria de facto, e na interpretação e aplicação dos artigos 277º, 576º e 527º do Código Processo Civil, razão pela qual deve ser revogada e substituída por outra, em conformidade com a interpretação defendida pela Entidade ora recorrente é, também, aquela que melhor de coaduna com o texto das normas interpretandas.
Termos pelos quais e, com o douto suprimento de V. Exas., deve ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional e, em consequência, ser revogada a sentença recorrida com as legais consequências.”

Não houve contra-alegações.

O Ministério Público junto deste Tribunal não emitiu parecer.

Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.


2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que as questões suscitadas resumem-se, em suma, em apreciar o invocado erro de julgamento de facto e ainda indagar da bondade da decisão recorrida que julgou extinta a instância por inutilidade superveniente da lide, condenando a Recorrente no pagamento das custas.


3. FUNDAMENTOS
3.1 DE FACTO
Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:
“…
Com relevância para aferir da excepção invocada, consideram-se assentes os seguintes factos:
1) O Serviço de Finanças do Porto 2 remeteu em 29.01.2009 a J... o ofício n.º 000119699 com o seguinte teor: “(…) Fica notificado, nos termos do artigo 36º do Código do Procedimento e Processo Tributário (CPPT), de que, não tendo sido conhecido até ao momento, o exercício do direito de audição prévia, se mantém o sentido e alcance da proposta de cessação dos benefícios fiscais (…) referente à liquidação de IMI relativa ao ano/período de 2007 (…) A presente decisão determinará a liquidação que se mostrar devida, acrescida dos respectivos juros compensatórios (…)”– cfr. fls. 8 dos autos.
2) Maria… deduziu em 27.04.2009 recurso hierárquico do despacho que indeferiu o pedido de manutenção da isenção de Imposto Municipal sobre Imóveis relativo ao prédio urbano inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 2…, fracção E – cfr. fls. 10 e 11 do processo administrativo (PA) junto aos autos.
3) Sob o recurso hierárquico a que se alude em 2) recaiu em 22.03.2010 despacho de deferimento nos seguintes termos: “(…) Concordo. Nos termos e com os fundamentos dispostos na presente informação, defiro o recurso hierárquico.
Assim, revogo o despacho recorrido, com todas as consequências legais, devendo proceder-se conforme é referido a final (…)” – cfr. fls. 52 do PA junto aos autos.”
3.2 DE DIREITO
Nas suas conclusões de recurso, a Recorrente questiona a sentença recorrida quanto à decisão sobre a matéria de facto, sendo que constituindo tal erro de julgamento não só o primeiro aduzido mas, em especial, aquele de cuja decisão estaria dependente o que este Tribunal de recurso viesse a decidir quanto ao erro de julgamento de direito, impõe-se, naturalmente, que à sua apreciação venha a ser dada primazia.
Vejamos.
A Recorrente pugna pelo aditamento de três pontos à matéria de facto, porque relevantes para o apuramento da verdade e que cuja redacção se requer nos seguintes termos:
1-A) O Autor foi casado com Maria…, e na constância do casamento adquiriram um imóvel, sito na Rua…, freguesia da Foz do Douro, concelho do Porto, inscrito na matriz com o n.º 2…, que sendo a casa de morada de família, obteve isenção de IMI, nos termos da lei.
1-B) Em 16 de Junho de 2005 celebraram escritura de partilhas na sequência de decretamento de divórcio, e na qual a casa de morada de família ficou adjudicada à ex-esposa Maria…. (cf pag 32 do PA).
1-C) Em 5 de Março de 2009 a Proprietária do imóvel veio juntar escritura de partilhas e solicitar que fosse “mantida a continuidade da isenção”, por ter sido notificada para pagar IMI relativo aos anos de 2005, 2006 e 2007. (doc. a fls. 31 do PA).
Os factos cujo aditamento agora se requer e que se encontram provados por documento, comprovam que a AT notificou o ora Autor da cessação de benefícios fiscais, pois nessa data, ainda constava como comproprietário do Imóvel, o que justifica a notificação do ora Autor da cessação dos benefícios fiscais, pois que, para efeitos de IMI e Benefícios fiscais, a informação de que havia sido celebrada escritura de partilhas foi comunicada apenas em 5 de Março de 2009, conforme admite a requerente e proprietária do imóvel, no requerimento a fls 31 do PA e na verdade, o Autor, agora recorrido, quando intentou a acção, não era já parte legítima para reagir contra a cessação da isenção porque não era proprietário do imóvel, como se referiu apenas teria que invocar a sua ilegitimidade perante a AT.

Tendo presente as soluções plausíveis em direito e considerando que os factos descritos não merecem contestação até porque existe prova documental para o efeito, nos termos do art. 712º nº 1 do C. Proc. Civil, adita-se ao probatório o seguinte:
4 - O Autor foi casado com Maria…, e na constância do casamento adquiriram um imóvel, sito na Rua…, freguesia da Foz do Douro, concelho do Porto, inscrito na matriz com o n.º 2…, que sendo a casa de morada de família, obteve isenção de IMI, nos termos da lei.
5 - Em 16 de Junho de 2005 celebraram escritura de partilhas na sequência de decretamento de divórcio, e na qual a casa de morada de família ficou adjudicada à ex-esposa Maria…. (cfr. pág. 32 do PA).
6 - Em 5 de Março de 2009 a Proprietária do imóvel veio juntar escritura de partilhas e solicitar que fosse “mantida a continuidade da isenção”, por ter sido notificada para pagar IMI relativo aos anos de 2005, 2006 e 2007. (doc a fls 31 do PA).

Assente a factualidade apurada cumpre, então, entrar na análise da realidade em equação nos autos, sendo que a este Tribunal está cometida a tarefa de indagar da bondade da decisão recorrida que julgou extinta a instância por inutilidade superveniente da lide.
Para o efeito, ponderou que:
“…
Conforme decorre da petição inicial apresentada, o Autor veio apresentar acção administrativa especial contra o despacho de cessação de benefício fiscal respeitante à isenção de IMI do imóvel inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 2…, fracção E.
Não obstante e conforme coligido no acervo probatório, ponto 3), em sede de recurso hierárquico e por despacho de 22.03.2010 foi deferido o pedido de manutenção do benefício fiscal em questão nos presentes autos e revogado o despacho impugnado.
Ora, parafraseando José Lebre de Freitas in Código de Processo Civil Anotado, volume 1 a pág. 512 “A impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide dá-se quando, ocorrido na pendência da instância, a pretensão do autor não se pode manter, por virtude do desaparecimento dos sujeitos ou do objecto do processo, ou encontra satisfação fora do esquema da providência pretendida. Num e noutro caso, a solução do litígio deixa de interessar – além, por impossibilidade de atingir o resultado visado; aqui, por ele já ter sido atingido por outro meio”.
In casu, a revogação do despacho de cessação do beneficio fiscal importou que o interessado não possa manter a pretensão formulada nestes autos, porquanto os mesmos ficaram sem objecto, determinando a extinção da instância por impossibilidade superveniente da lide, nos termos do que dispõe o artigo 277.º alínea e) do Código de Processo Civil, ex vi artigo 2.º alínea e) do Código de Procedimento e de Processo Tributário. …”.

Que dizer?
Como é sabido, a impossibilidade ou a inutilidade superveniente da lide (al. e) do art. 277º do CPC verificam-se quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a resolução do litígio se torna impossível ou deixa de ter interesse e utilidade, conduzindo, por isso, à extinção da instância, pois que a pretensão do autor não poderá, então, manter-se, por virtude do desaparecimento dos sujeitos ou do objecto do processo, ou por se encontrar fora do esquema da providência pretendida. Num e noutro caso, a solução do litígio deixa de interessar - além, por impossibilidade de atingir o resultado visado; aqui, por ele já ter sido atingido por outro meio.

Nas suas alegações, a Recorrente ensaia uma nova abordagem da matéria, referindo que, contrariamente ao decidido na sentença recorrida, a decisão proferida no recurso hierárquico apresentado por Maria… e constante dos factos em 2) e 3) não é susceptível de fundamentar a decisão de extinção da instância, porque o Autor já não era proprietário do imóvel, pois que, foram invocados factos que impedem o efeito jurídico dos factos articulados pelo Autor, pelo que se verificou a excepção peremptória prevista no n.º3 do artigo 576º do CPC, o que importa a absolvição total do pedido e ao não ter decidido assim, a sentença recorrida errou na fixação dos factos relevantes para a boa decisão da causa, incorreu em erro na interpretação dos factos provados, e errou na não aplicação à situação dos autos da excepção peremptória de impossibilidade da lide por falta de objecto, do mesmo que incorreu ainda a sentença recorrida em erro, ao condenar a Entidade ora recorrida em custas, por não ter sido esta que deu causa à acção, como dispõe o artigo 527º do CPC, na medida em que, conforme os factos cujo aditamento se requereu, o ora Recorrido, apenas foi notificado da cessação do benefício fiscal, porque só em 5 de Março de 2009 a AT tomou conhecimento de que já não era proprietário do imóvel.
Donde, tendo-se verificado a excepção peremptória da impossibilidade da lide por falta de objecto, ou seja, por o acto visado pelo Autor não produzir efeitos em relação a ele (quer por não ter legitimidade nem ser proprietário do imóvel, e não o ter comunicado à AT como era sua obrigação), é sobre si que têm de recair as consequências do incumprimento desse seu ónus e da indevida interposição da acção. E não sobre a Administração, não podendo, face ao supra referido e salvo melhor opinião, ser acolhido entendimento vertido na sentença recorrida de condenar a Administração Tributária em custas porque se encontra em dissonância com o estabelecido pelo artigo 527º do CPC.

Pois bem, a tese esgrimida pela AT não pode, de maneira nenhuma, ser acolhida por este Tribunal.
É que o Autor veio apresentar acção administrativa especial contra o despacho de cessação de benefício fiscal respeitante à isenção de IMI do imóvel inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 2…, fracção E, depois de o Serviço de Finanças do Porto 2 ter remetido em 29.01.2009 a J... o ofício n.º 000119699 com o seguinte teor: “(…) Fica notificado, nos termos do artigo 36º do Código do Procedimento e Processo Tributário (CPPT), de que, não tendo sido conhecido até ao momento, o exercício do direito de audição prévia, se mantém o sentido e alcance da proposta de cessação dos benefícios fiscais (…) referente à liquidação de IMI relativa ao ano/período de 2007 (…) A presente decisão determinará a liquidação que se mostrar devida, acrescida dos respectivos juros compensatórios (…)”– cfr. fls. 8 dos autos.

Naturalmente, e perante uma notificação como a descrita, o Autor exerceu os direitos que a lei lhe confere, sendo que o motivo do seu procedimento radica na aludida notificação da iniciativa da AT, pelo que carece de sentido, sendo mesmo um total despropósito, a alegação de existe uma impossibilidade por carência de objecto, quando a AT sabe que procedeu à aludida notificação, pelo que tal alusão revela-se deslocada e sem sentido a partir do momento em que existe uma notificação dirigida ao agora Recorrido que, naturalmente, e de forma avisada, não deixou de reagir nos termos da lei, sendo irrecusável que o meio utilizado era idóneo para se defender contra o acto praticado pela AT.

No entanto, esta última lamenta-se agora de tal iniciativa (notificação) que imputa ao próprio Autor que não terá diligenciado no sentido de actualizar a situação em termos de permitir à AT outro tipo de actuação.
Ora, para além de a AT, se calhar, com mais diligência, também se poderia ter apercebido da situação, e independentemente dos procedimentos que o A. poderia ter desenvolvido no que diz respeito à actualização da situação (sendo sabido que normalmente é o comprador que toma a iniciativa de realizar as diligências inerentes à aquisição efectuada) permanece sempre o “pecado original”, ou seja, é a definição da situação da AT e a notificação dirigida ao aqui Recorrido que está na origem deste processo e não as tais diligências que agora se referem como omitidas.

Assim sendo, os factos que a Recorrente viu aditados ao probatório não comportam qualquer elemento susceptível de colocar em crise a apreciação feita pelo Tribunal “a quo” quando concluiu que “… a revogação do despacho de cessação do beneficio fiscal importou que o interessado não possa manter a pretensão formulada nestes autos, porquanto os mesmos ficaram sem objecto, determinando a extinção da instância por impossibilidade superveniente da lide, nos termos do que dispõe o artigo 277.º alínea e) do Código de Processo Civil, ex vi artigo 2.º alínea e) do Código de Procedimento e de Processo Tributário. …”.

Diga-se ainda que, nos termos do que estatui o artigo 527º do C. Proc. Civil, aplicável por força do disposto na alínea e) do artigo 2º do CPPT e ainda do estabelecido pelo artigo 5º da Lei nº 41/2013, de 26 de Junho, suporta as custas a parte que deu causa ao processo, isto é, a parte cuja pretensão não foi atendida.

Por outro lado, o artigo 536º nº 3 do C. Proc. Civil estabelece que perante a extinção da instância por impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide, a responsabilidade pelas custas fica a cargo do autor ou requerente, salvo se tal impossibilidade ou inutilidade for imputável ao réu ou requerido, dispondo o nº 4 que é imputável ao réu ou requerido a inutilidade superveniente da lide quando esta decorra da satisfação voluntária, por parte deste, da pretensão do autor ou requerente.

Como já vimos, o A. reagiu contra um despacho de cessação de benefício fiscal para efeito de IMI, pretendendo naturalmente evitar uma posterior emissão de liquidação de IMI, situação susceptível de afectar a sua esfera jurídica.

Com este pano de fundo, a revogação do despacho na decorrência de deferimento de recurso hierárquico interposto é, manifestamente, o tal facto ocorrido na pendência da instância, em função do qual o litígio deixa de ter interesse e utilidade, conduzindo, por isso, à extinção da instância, na medida em que, a pretensão do autor não poderá, então, manter-se, por virtude do desaparecimento do objecto do processo.

Como quer que seja, e independentemente do facto de o A. não ser, naquela data, proprietário do imóvel a que se alude nos autos, tinha toda a legitimidade para reagir contra um acto administrativo que lhe foi notificado e que a não ser impugnado poderia acarretar a emissão de liquidação de IMI.

Além disso, e como bem refere o Tribunal “a quo”, retirando qualquer virtualidade ao exposto pela Recorrente, mesmo a dar-se como certo que a AT somente teve conhecimento da escritura de partilhas em 05-03-2009, sempre teve até 04-05-2009 (data da interposição da presente acção) para proceder a correcção da situação, pelo que, como se disse, bem avisada foi a posição do A. ao desenvolver os mecanismos legais destinados a afastar da ordem jurídica uma decisão que afectava a sua esfera jurídica, não podendo proceder o exposto pela Recorrente que tenta, em vão, deslocar a questão para um domínio que não se coloca nos autos, o que tem um verdadeiro de efeito de implosão sobre a sua pretensão.
Daí que na improcedência das conclusões da alegação da recorrente, se impõe, nos termos acima expostos, confirmar a decisão aqui sindicada, com todas as legais consequências.
Improcede, por conseguinte, o presente recurso jurisdicional.
4. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente, mantendo-se a decisão judicial recorrida.
Custas pela Recorrente.
Notifique-se. D.N..
Porto, 21 de Dezembro de 2017
Ass. Pedro Vergueiro
Ass. Ana Patrocínio
Ass. Ana Paula Santos