Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02404/17.0BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:05/10/2018
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Mário Rebelo
Descritores:ACRÉSCIMO PATRIMONIAL NÃO JUSTIFICADO
Sumário:1. Caso os bens de maior valor que constituem o acréscimo patrimonial pertençam à categoria imóveis, e a sua “aquisição” seja de valor superior a € 250.000,00, mas os restantes acréscimos não incidiram sobre bens imóveis a tributação deverá ser efetuada com base na alínea f) do n.º 1 do art. 87 LGT.
2. O eventual preenchimento da previsão da norma contida no artigo 87, n.º 1, alínea d), não afasta a aplicação da norma contida na alínea f), do mesmo artigo, desde que fique demonstrado o preenchimento dos requisitos nela previstos.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:F... e S...
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

RECORRENTES: F... e S...
RECORRIDO: Autoridade Tributária e Aduaneira.
OBJECTO DO RECURSO: Sentença proferida pelo MMº juiz do TAF do Porto que julgou improcedente o recurso da decisão proferida pela Exma. Diretora de Finanças Adjunta que determinou a correção do rendimento coletável com recurso à avaliação indireta, nos termos previstos na alínea f) do n.º 2 do art.º 87 e n.ºs 3 e 5 do art.º 89-A da LGT
CONCLUSÕES DAS ALEGAÇÕES:
ALTERAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
a) A Recorrente pretende que o Tribunal Central Administrativo Norte proceda À ALTERAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO (usando os poderes conferidos pelo art. 662º, nº1 do CPC) já que considera incorretamente julgada a seguinte parte da factualidade dada como não assente:
b) Devendo declarar-se provado:
A - Que os montantes de €132.000,00 e €128.000,00 levantados em numerário
por J... em 05.06.2013 e 07.06.2013 se destinaram a dar de empréstimo ao Recorrente F...;

B - Que os montantes de €132.000,00 e €128.000,00 levantados em
c) Porquanto, está assente e provado (Ponto 1 do factos provados) que J..., irmão do Recorrente, é titular da conta nº 073.10.002768-6 junto do banco M..., na qual, durante o ano de 2013, foram efetuados, entre outros, os seguintes movimentos a crédito e a débito: nomeadamente, os seguintes movimentos:
A crédito (transferência de F...)
€ 236.130,00 em 04.06.2013
A débito (levantamentos em numerário):
€ 100.000,00 em 04.06.2013 (valor referente a empréstimo de J... aos recorrentes que está incluído e aceite pela AT na confissão nº 2, constituindo facto assente nos presentes autos)
€ 132.000,00 em 05.06.2013
A crédito (transferência de F...)
€ 129.000,00 em 07.06.2013
A débito (levantamentos em numerário):
€ 128.000,00 em 07.06.2013
d) Está provado (Ponto 5 elos factos provados) em 05.06.2013, o Banco M... debitou na conta 073.10.007364-9 titulada pelo Recorrente a quantia de €100,00 referente a Caução Cofre - cfr. documento a fls. 315 dos autos;
e) Como já se evidenciou mais se diz na douta sentença que “... testemunha arrolada, J... depôs com convicção acerca dos factos relacionados com os movimentos monetários ocorridos entre si e o Recorrente, em particular sobre a circunstância de os levantamentos em numerário que realizou nos dias 05.06.2013 e 07.06.2013 terem como propósito o seu empréstimo ao Recorrente, bem como sobre a veracidade do documento Confissão de dívida nº 4”.
f) Por outro lado a Douta sentença realça que: “a testemunha é irmão do Recorrente F... e diretamente envolvido nos movimentos financeiros em causa.”, estando então demonstrado e provado que existiram movimentos financeiros entre os recorrentes e J....
g) Mais se diz na douta sentença: “Ficou patente que entre ambos terá sido firmado um acordo para resolução de um problema patrimonial de J......”, pelo que está demonstrado e provado que o que esteve na génese destas aquisições de bens (acréscimo patrimonial dos requerentes) resultou de um problema patrimonial do seu irmão J....
h) Assim, para salvaguardar do seu património, perante o problema em que se viu envolvido, numa Farmácia de Bragança de que era Director Técnico (tudo como consta do seu depoimento em sede de inquirição), solicitou que o seu irmão lhe adquirisse o seu património.
i) Razão assim pela qual vendeu todo o seu património ao irmão (que o adquiriu de favor).
j) Não foram assim, só os seus imóveis. Foi a sua quota social. Foi ainda o seu quinhão hereditário. Todo o seu património material.

k) Atentos os factos atrás descritos é mister reconhecer que terá que ocorrer a alteração da matéria de facto nos termos defendidos pelos recorrentes.
l) Os recorrentes, fundamentam este pedido de alteração sobre a matéria de facto,
nos seguintes elementos de prova:

Documentos 1, 2, 3, 4, 5 e 9 juntos com a p.i, fls. 382 dos autos (Anexo 10 do
Relatório de Inspecção Tributária), fls. 296 dos autos (Anexo A do Projecto de
Relatório de Inspeção Tributária) e o depoimento da testemunha J...

VIOLAÇÃO DO DIREITO PROBATÓRIO MATERIAL
m) A douta sentença, finalmente considerou que tudo quanto deu como provado “não é suficiente para convencer o tribunal de que tal acordo incluiu o empréstimo das importâncias de €132.000,00 e €128.000,00 por parte da testemunha ao Recorrente, em 05.06,2013 e 07.06.2013, respetivamente.”
n) Afirmando-se que o envolvimento pessoal e familiar da testemunha retira credibilidade ao seu testemunho.
o) Ora o Tribunal não pode exigir das partes a prova verdadeiramente diabólica de indicação de testemunhas que nada sabem sobre os factos.
p) A testemunha que foi ouvida era a única que tinha conhecimento dos factos.
q) Como é doutrina comum, sempre que a parte sobre quem recaí o ónus da prova fica impossibilitada de fazer essa prova, há lugar a inversão do ónus da prova.
r) De facto, ninguém pode ser obrigado a cumprir aquilo que não pode.
s) A recorrente só pode fazer prova dos factos que alegou com a testemunha que indicou e não com outras.
t) Deste modo, a livre convicção do Tribunal só se pode formar com as provas que foram produzidas e não contra essas provas, sob pena, de não ser necessário as partes apresentarem testemunhas se o Tribunal se bastasse com aquilo que entende ser as regras de experiência comum da vida.
u) A testemunha foi desvalorizada por não oferecer credibilidade Meritíssima Juiz (isto apesar de ter deposto com convicção).
v) É da experiência comum dos Tribunais Tributários que as testemunhas que normalmente se apresentam são pessoas ligadas às partes (ou por via profissional ou por via pessoal).
w) Não podia ser de outra forma, pois só quem tem ligações às partes pode ter sido testemunha de algum facto, negociação, acordo.
x) Assim a sentença recorrida enferma, de um grave erro de julgamento sobre a matéria de provas, já que prova livre não é sinónimo de prova arbitrária.
y) O Tribunal só está autorizado a julgar segundo as provas (secundum aligata et probata partium)
z) Interpretar o artº 607, nº 5 do CPC em termos de esta norma permitir ao tribunal julgar contra as provas equivale a dar-lhe uma interpretação normativa inconstitucional, por violação do princípio da confiança legítima, ínsito no princípio do Estado de Direito, previsto no artº 2 da Constituição da República.
Do erro nos pressupostos do acto recorrido por se encontrar justificada a proveniência dos recursos financeiros utilizados nos acréscimos patrimoniais:
aa) Entendem os recorrentes que mal andou o Tribunal “a quo”, após ter percebido “o todo”, ter procurado justificações materiais absolutas quando a vida se faz de relatividades concretas.
bb) Razão pela qual a decisão do presente recurso resulta arbitrária, pois o tribunal, achando-se sem a prova inequívoca da realidade invocada pelos recorrentes e com a qual finalmente se conformou [veja-se que na douta sentença se diz: Foi firmado um acordo (entre recorrentes e J...) para resolução de um problema patrimonial de J...) e aceita (parcialmente) a justificação da origem dos acréscimos patrimoniais no valor de € 180.000,00) (mútuos de J... aos recorrentes)), vem negar a evidência do que efectivamente se passou.
cc) Perante estas evidências documentais e perante o testemunho não se alcançam as dúvidas apontadas na douta Sentença:
o Estamos perante um mútuo (confessado) de € 260.000,00, - DOC 9 junto com a p.i.,
o sustentado documentalmente em dois levantamentos em numerário de J... de € 132.000,00 (em 05.06.2013) e € 128.000,00 (em 07.06.2013) - DOC 2 junto com a p.i.,

o valores que os recorrentes depositaram em cofre alugado a 05.06.2013 no M... , agência de Costa Cabral (Ponto 5 dos factos provados)
o Tudo confirmado pela testemunha arrolada.
dd) O Tribunal “a quo” ciente da motivação das aquisições (a título de favor) e deu como provado que J... emprestou € 180.000,0() em numerário aos recorrentes, também terá que dar como provado que J... emprestou os € 260.000,00 os recorrentes, pois tudo se passou de igual forma.
ee) Não colhendo a tese argumentativa constante na douta sentença para não aceitar a justificação do acréscimo patrimonial dos recorrentes: “...não podem pretender os Recorrentes justificar o pagamento de valores com empréstimos alegadamente obtidos em datas posteriores, estaria, quando muito, justificado o pagamento parcelar de €129.000,00 ocorrido em 07.06.2013, e nunca o montante de €260.000,00.”
ff) Isto porque os recorrentes receberam na sua conta no dia 04.06.2013, (para além dos € 100.000,00 - valor referente a empréstimo de J... aos recorrentes que está incluído e aceite pela AT na Confissão nº 2, constituindo facto assente nos presentes autos), o valor de € 462.750,00 a título de reembolso de suprimentos, conforme está assente no Relatório de Inspecção Tributária (fls. 382 dos autos - Anexo 10 do Relatório de Inspecção Tributária e fls. 296 dos autos - Anexo A do Projecto de Relatório de Inspecção Tributária)
gg) Este valor recebido permitiu aos recorrentes “adiantar” o dinheiro (que lhes ia ser emprestado) para os pagamentos efectuados nesta data de 04.06.2013,
hh) Pelo que as entregas em numerário de J... aos recorrentes em 05.06.2013 (€132.000,00) e em 07.06.2013 (€128.000,00) a título de empréstimo, não abalam minimamente o que os recorrentes defendem.
ii) Os recorrentes adiantaram o valor (que lhes ia ser emprestado), porque sabiam que J..., procederia à sua devolução de imediato (a título de empréstimo).
ii) Termos em que ficou ilidida de forma inequívoca a presunção de evasão fiscal relativamente aos rendimentos declarados no ano de 2013.
kk) Assim, sendo, a sentença ao decidir como decidiu enferma de vício de violação de lei por erro sobre os pressupostos de facto (erro de julgamento em matéria de facto).
ll) Violando a douta sentença o princípio da capacidade contributiva (artigo 104º, nº 1, da Constituição da República Portuguesa e artigos 4º, nº 1 e 6º, nº 1, da Lei Geral Tributária) e de acordo com o seu rendimento real (artigo 83º, nº 1, da Lei Geral Tributária),
Do vício de violação de lei por errónea aplicação do regime previsto no artigo 87º, nº 1, alínea f), da Lei Geral Tributária:
mm) Mesmo que se aceitássemos para meros efeitos de dialéctica que existiriam acréscimos patrimoniais (aquisição de imóveis) cujos recursos financeiros se encontrassem por justificar no valor de € 313.303,65 como se defende no relatório (ponto IV.3 - pág 14)
nn) A verdade é que nem assim haveria lugar ao recurso aos métodos indirectos.
oo) A natureza e a proveniência desse acréscimo patrimonial, resultou da compra de imóveis, sendo que lei prevê um regime especial - o da alínea d) do artigo 87º da LGT conjugado com os nº.s 1 e 4 do artº 89.º-A da LGT -, derrogatório do geral, sendo que os pressupostos do regime especial não estão, in casu, preenchidos,
pp) ...pois sendo o valor de aquisição dos imóveis (e quinhão hereditário constituído por imóveis) em causa de €465.804,77,... a verdade é que aplicando as regras do
1 e nº 4 do artº 89º-A da LGT (aos valores apontados pela AT com os quais os requerentes não concordam) verificamos que o rendimento dos requerentes é manifestamente superior ao rendimento padrão:

Valor por justificar: € 313.303,65
Rendimento padrão: € 62.660,73
Rendimento declarado: € 95.517,91
qq) Pelo que não há lugar à aplicação de métodos indiretos.
rr) Não se aplicando, como defende a douta sentença a alínea f) do nº 1 do artº 87º da LGT.
ss) Esta alínea visou aumentar as situações de facto que legitimam a Administração Tributária a realizar avaliação indirecta do rendimento tributável, inserindo-se assim na intenção do legislador de uma luta cada vez maior contra a fraude e evasão fiscal, pois que a alínea d) só é aplicável desde que, para além dos restantes requisitas, o valor de aquisição seja superior a determinado montante.

tt) Sendo assim, poderiam ficar de fora muitas situações de fuga ao fisco relevantes e relativamente às quais a Administração Tributária nada poderia fazer.
uu) Daí que, para outros acréscimos patrimoniais e consumos não justificados, em face das declarações apresentadas pelos contribuintes, e não previstos na alínea d), o legislador tenha vindo a estabelecer a possibilidade de avaliação indirecta.
vv) Não fazendo a norma qualquer distinção entre bens móveis e imóveis ou direitos, a alínea f) tem de aplicar-se a todas as situações nele previstas e não enquadráveis na alínea d).
ww) Não caso não se aplica a alínea d) do nº 1 do artº 87º da LGT por não se verificarem os pressupostos (rendimento declarado superior ao rendimento padrão), sendo não cabe aplicação subsidiária (porque não está previsto na lei) da alínea f) nº 1 do artº 87º da LGT.
xx) Isto é, a lei não diz que no caso de não estarem preenchidos os pressupostos da alínea d) do artº 87º da LGT, então socorra-se a AT da alínea f) do n. 1 artº 87º da LGT!
SEM CONCEDER
yy) O que a lei diz (nº 2 do artº 87º da LGT) e é diferente é que no caso do fundamento da avaliação indirecta se encontrar simultaneamente na alínea d) e na alínea f) do art.º 87º, aplica-se, em regra, o nº 5 do artº 89º-A da LGT.
zz) Mas como vimos, não estão verificados os pressupostos de aplicação da alínea d) do nº 1 da artº 87º da LGT logo a regra do nº 2 do artº 87º da LGT tão POUCO se aplica!
SEM PRESCINDIR
aaa) E no caso nunca se aplicaria (mesmo que se verificasse que o fundamento da avaliação indirecta se encontrava simultaneamente na alínea d) e na alínea f) do nº 1 do artº 87º), pois quando se trata de imóveis, aplica-se sempre o nº 4 do artº 89º-A da LGT
bbb) que os pressupostos da alínea d) do nº 1 do artº 87º da LGT, quanto a imóveis só estão preenchidos, quando estes ultrapassam € 250.000,00, ou seja, o valor de base já é superior ao valor de € 100.000,00 (que baliza o perímetro da alínea f) do nº 1 do art.º 87º).
ccc) Se aceitássemos, nestes casos, a prevalência da avaliação indireta pela alínea f), tal significaria que, em caso algum, quanto aos imóveis, se aplicaria o rendimento padrão.

ddd) Ou seja, o nº 4 do artº 89º-A seria letra completamente morta, no que se refere a aquisição de imóveis.
eee) Pelo que importa atentar à unidade do sistema jurídico que não permite que se deixe de aplicar uma norma.
fff) A douta sentença, ao decidir como decidiu padece de vício de violação de lei por errónea aplicação do art. 87º, nº 1 alínea f) e nº 2 e art. 89º-A nºs 3 e 5, todos da LGT.
Normas violadas:
• artº 607º, nº 5 do CPC e artº 2 da Constituição da República Portuguesa.
• Artº 104º, nº 1, da Constituição da República Portuguesa e artigos 4, nº 1 e 6, nº 1, da Lei Geral Tributária e ainda artº 83º, nº 1, da Lei Geral Tributária.
• artº 87º, nº 1 alínea f) e nº 2 e artº 89º-A nºs 3 e 5, todos da Lei Geral Tributária
Termos em que, no provimento do recurso, deve revogar-se a sentença recorrida, com os legais efeitos daí advenientes,
Determinando-se consequentemente, a anulação da decisão proferida pela Directora Adjunta de Finanças do Porto Dra. Maria… que entendeu proceder à fixação do rendimento coletável de IRS de 2013 por métodos indirectos.

ASSIM SE REQUER A VEXAS.


CONTRA ALEGAÇÕES.
O recorrido contra alegou e concluiu:
a) O presente recurso vem intentado contra a sentença de 23/02/2018 que julgou o recurso totalmente improcedente, mantendo na ordem jurídica a decisão proferida pelo Director de Finanças do Porto, por despacho de 4/10/2017, que fixou rendimento colectável aos ora Recorrentes, por métodos indirectos, ao abrigo do art. 87º e art. 89º-A da LGT, com referencia a IRS de 2013.

b) Os Recorrentes invocam erro de julgamento da sentença sob recurso quanto aos factos e quanto ao direito.

c) A AT pugna pela manutenção do acto na ordem jurídica da sentença sob recurso por entender que a mesma configura uma correcta aplicação do direito aos factos.

d) Relativamente à matéria de facto fixada no probatório e que serviu de fundamento à sentença sob recurso, o Tribunal explica detalhadamente a motivação subjacente à convicção formada quanto aos factos não provados.

e) Quanto à prova pretendida pelos Recorrentes, conforme fixado a fls. 50 da sentença, “os Recorrentes assentam o invocado erro nos pressupostos de facto do acto recorrido na incorrecta desconsideração de dois empréstimos que alegam ter realizado junto de J..., no montante total de € 260.000,00, como justificação da proveniência dos recursos utilizados nos pagamentos realizados pela aquisição de património ao próprio J...”.

f) Delimitada a prova que os Recorrentes pretendem realizar, o Tribunal formou a sua convicção a partir da documentação junta aos autos e da prova testemunhal produzida, considerando, por um lado, a coerência entre ambas e, por outro lado, o ónus probatório que impende sobre os Recorrentes, o qual não se satisfaz com o mero suscitar de dúvidas, antes impondo que da prova carreada resulta evidenciada a origem ou proveniência das disponibilidades financeiras controvertidas.

g) Concretizando, e cfm. fls. 58 da sentença, não podem os Recorrentes lograr alcançar o ónus probatório do nº 3 do art. 89º-A da LGT quando não cuidam de comprovar “a específica afectação de um determinado montante obtido de empréstimo ao concreto pagamento efectuados”.

h) “Dito de outro modo, mesmo que ficasse provada a realização dos dois empréstimos invocados pelos Recorrentes, para que cada um dos montantes de € 132.000,00 e € 128.000,00 fossem aceites como justificativos do acréscimo patrimonial evidenciado teria que ficar demonstrada a sua específica afectação aos pagamentos efectuados”, cfm. fls. 58 da sentença.

i) Entendem os Recorrentes, nas suas Alegações de recurso, que a prova efectuada é suficiente para comprovar a matéria de facto que o Tribunal considerou não provada, mais entendendo que não lhes pode ser exigida uma prova diabólica ou impossível quanto à factualidade pertinente à boa decisão da causa.

j) A AT considera, todavia, que os Recorrentes não têm razão, não sendo possível concluir, a partir da prova efectuada nos autos, que o Tribunal incorreu em qualquer erro de julgamento, ou seja, da análise à prova efectuada não resulta que a convicção do Tribunal quanto aos factos não provados tivesse de ser outra.

k) Assim sendo, não existe erro de julgamento quanto aos factos.

l) Relativamente ao erro de direito que os Recorrentes invocam, considerou a sentença sob recurso que a AT cumpriu o ónus probatório que lhe competia, para efeitos da primeira parte da al. f) do nº 1 do art. 87º da LGT, estando em causa, por conseguinte, a justificação pelos Recorrentes dos recursos utilizados no acréscimo de património verificado.

m) O Tribunal “a quo” conclui que a decisão de avaliação indirecta controvertiad não enferma de errónea aplicação do regime previsto na alínea f) do nº 1 do art. 87º da LGT,

n) Mais considerando que de acordo com o disposto no art. 87º, nº 2 da LGT, no caso de verificação simultânea dos pressupostos de aplicação da alínea d) e da alínea f) do nº 1 daquele preceito legal, a avaliação indirecta deve ser efectuada nos termos do nº 3 e nº 5 do art. 89º-A da LGT,

o) Tese que merece a inteira adesão da entidade Recorrida.

p) Assim sendo, e relativamente ao erro de julgamento quanto ao direito que os Recorrentes invocam, entende-se que o mesmo carece de base legal.

q) Nos termos supra expostos, deverá o recurso ser julgado totalmente improcedente, mantendo-se a sentença recorrida na ordem jurídica.

Nos termos supra expostos, e nos demais de direito que V. Exa. doutamente suprirá, deve o presente recurso ser considerado improcedente.

PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO.
O Exmo. Procurador-Geral Adjunto neste TCA emitiu esclarecido parecer concluindo pela improcedência do recurso e confirmação da sentença recorrida.


II QUESTÕES A APRECIAR.
O objecto do presente recurso, delimitado pelas conclusões formuladas (artigos 635º/3-4 e 639º/1-3, ambos do Código de Processo Civil, «ex vi» do artº 281º CPPT), salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 608º/ 2, in fine), consiste em saber se a sentença errou no julgamento da matéria de facto e de direito ao não julgar justificado o acréscimo patrimonial e na aplicação da alínea f) do n.º 1 do art. 87º da LGT.

Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.


III FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.
A sentença fixou os seguintes factos provados e respetiva motivação:
1) J..., irmão do Recorrente, é titular da conta n.º 073.10.002768-6 junto do banco M..., na qual, durante o ano de 2013, foram efetuados, entre outros, os seguintes movimentos a crédito e a débito:
Data Operação Crédito Débito Documento a fls.
20.05.2013 Transferência de F... 2.500,00 343
31.05.2013 Levantamento ao balcão 42.500,00 350
01.06.2013 Transferência de F... 1.200,00 346
04.06.2013 Levantamento ao balcão 18.250,00353
04.06.2013 Transferência de F... 236.130,00 341
04.06.2013 Levantamento ao balcão 100.000,00356
04.06.2013 Transferência de F... 18.000,00 344
05.06.2013 Levantamento ao balcão 132.000,00375
07.06.2013 Transferência de F... 129.000,00 345
07.06.2013 Levantamento ao balcão 128.000,00376
20.06.2013 Transferência de F... 20.174,77348
20.06.2013 Levantamento ao balcão 20.200,00360
2) Em 13.05.2013, foi ainda efetuado o seguinte movimento a crédito na conta n.º 0018 0003 24975021020, titulada por “Farmácia Central - J...” por transferência de F..., no montante de €60.683,90 – cfr. documento a fls. 342 dos autos;
3) As transferências identificadas nos dois pontos anteriores destinaram-se a pagamento do preço das aquisições que F... fez a J... de, pelo menos, os bens seguintes:
a) Em 01.06.2013, uma quota social, pelo valor de €1.200,00;
b) Em 01.06.2013, dois imóveis inscritos sob os artigos 1… e 4…, da freguesia de Paranhos, concelho do Porto, pelo valor de €298.630,00;
c) Em 05.06.2013, um imóvel inscrito sob o artigo 1…, da União das Freguesias de Cedofeita, Santo Ildefonso, Sé, Miragaia, S. Nicolau e Vitória, concelho do Porto, pelo valor de €147.000,00;
d) Em 14.06.2013, um quinhão hereditário, pelo valor de €20.174,77.
– cfr. pontos IV.2.3 e IV.2.1 do relatório da inspeção;
4) O Recorrente F... é titular das contas nºs 073.10.007358-1, 073.10.007364-9 e 073.10.002533-4, domiciliadas no Banco M... , nas quais, entre outros, foram efetuadas os depósitos em numerário seguintes:

Data Conta n.º Crédito Documento a fls.
31.05.2013 073.10.007358-1 40.000,00 351
04.06.2013 073.10.007358-1 18.250,00 354
04.06.2013 073.10.007364-9 84.000,00 357
04.06.2013 073.10.007364-9 111.000,00 377
04.06.2013 073.10.007364-9 10.000,00 379
04.06.2013 073.10.002533-4 15.000,00 358
05.06.2013 073.10.007364-9 2.325,00 49
11.06.2013 073.10.007364-9 2.260,00 49
11.06.2013 073.10.007364-9 1.000,00 369
18.06.2013 073.10.007364-92.225,00 369
20.06.2013 073.10.007364-9 21.000,00 361
01.07.2013 073.10.007358-1 9.450,00 317
09.07.2013 073.10.007364-9 3.000,00 370
17.07.2013 073.10.007364-9 9.500,00 378
19.07.2013 073.10.007364-9 9.000,00 52
22.07.2013 073.10.007364-9 12.470,00 370
24.07.2013 073.10.007364-9 12.000,00 380
25.07.2013 073.10.007358-1 11.500,00 316
25.07.2013 073.10.007364-9 12.500,00 370
25.07.2013 073.10.002533-4 12.200,00 319
29.07.2013 073.10.007364-9 20.000,00 371
17.12.2013 073.10.002533-4 12.000,00 318

5) Em 05.06.2013, o Banco M... debitou na conta 073.10.007364-9 titulada pelo Recorrente a quantia de €100,00 referente a Caução Cofre – cfr. documento a fls. 315 dos autos;
6) Durante o ano de 2013, em nome do Recorrente, foram declaradas as seguintes operações relativas a operações de valores mobiliários:
Data da OperaçãoNatureza da Operação Código do Valor MobiliárioDesignação N.º de TítulosValor da Operação
2013-01-30 11 - Resgate/reembolso PTY MGA LMO 001 04 - Unidades de participação 426 -40000,00
2013-02-18 07 - Aquisiçãofsubscrição PTY MGA LMO 001 04 - Unidades de participação 1216 114000,00
2013-04-03 11 - Resgatefreembolso PTY MGA LMO 001 04 - Unidades de participação 2872 -269500,00
2013-04-10 07 - Aquisição/subscrição PTe 3Mt/11 JMO 007 09 - Outros valores mobiliários 350 350000,00
2013-06-14 07 - Aquisição/subscrição ESO 127797019 02 -Ações 310 1 171,80
2013-06-14 07 - Aquisição/subscrição PTF NV1 AMO 002 02 -Ações 150 750,00
2013-06-14 07 - Aquisição/subscrição PTR ELO AMO 008 02-AçOes 320 704,00

– cfr. documento relativo à consulta dos dados da Modelo 13 - Valores mobiliários, warrants autónomos e instrumentos financeiros derivados, a fls. 338 dos autos;
7) O Recorrente F... é sócio da entidade Academia de Música…, Lda., em relação à qual, durante o ano de 2013, se verificou um saldo líquido de devolução de suprimentos no valor de €66.660,70 – cfr. pontos II.2 e II.3.2.C do relatório da inspeção;
8) Em 02.04.2013, relativamente às operações de valores mobiliários elencados no ponto anterior, ocorreu ainda o reembolso a favor do Recorrente, no montante de €70.000,00 – cfr. documento a fls. 381 dos autos;
9) Os Recorrentes apresentaram, em conjunto, a declaração de IRS referente aos rendimentos obtidos em 2013, da qual resultaram os dados seguintes:
a) Rendimentos de trabalho do sujeito passivo A = €60.169,28;
b) Dedução específica da categoria A = €6.335,70;
c) Rendimentos profissionais, comerciais e industriais do sujeito passivo A = €8.560,00;
d) Rendimentos prediais do sujeito passivo A = €20.621,70;
e) Rendimentos de trabalho do sujeito passivo B = €9.852,90;
f) Dedução específica da categoria A = €4.105,00;
g) Abatimentos e deduções do agregado no valor total de €5.176,88
– cfr. pontos II.3.1 e IV.1. do relatório da inspeção;
10) Em 23.03.2015, foi emitida a ordem de serviço n.º OI201500746, que autorizou o início de um procedimento de inspeção externa ao Recorrente F..., relativo ao IRS do exercício de 2013, de âmbito parcial – cfr. documento a fls. 107 dos autos;
11) Por despacho de 23.06.2016, foi decida a inclusão na ordem de serviço identificada no ponto 1 da Recorrente S... – cfr. documentos a fls. 111/112 dos autos;
12) Em data não apurada, a Inspeção Tributária solicitou aos Recorrentes que comprovassem a origem do dinheiro utilizado para pagamento das aquisições que efetuaram durante o ano de 2013 a J…– cfr. ponto II.3.2.C do relatório da inspeção;
13) Na sequência da solicitação referida no ponto anterior, os Requerentes apresentaram três documentos denominados Confissão de dívida, com o teor seguinte:
a)
CONFISSÃO DE DÍVIDA
F... […], declara para os devidos efeitos que é devedor a J…, […] da quantia de €40.000,00 (quarenta mil euros) que recebeu nesta data em numerário.
Face ao supra-exposto, o abaixo-assinado compromete-se a pagar a referida divida num prazo máximo de cinco anos.
Por ser verdade, vai esta declaração, feita em duplicado e ficando o original na posse do credor e a cópia em poder do devedor, datadas e assinadas por mim, prescindindo o credor do reconhecimento presencial da assinatura do devedor.
Porto, 31 de Maio de 2013 […] – cfr. documento a fls. 352 dos autos;
b)
CONFISSÃO DE DÍVIDA Nº 2
F..., […] declara para os devidos efeitos que é devedor a J…, […] da quantia de €120.000,00 (Cento e vinte mil euros) que recebeu nesta data em numerário.
Face ao supra-exposto, o abaixo-assinado compromete-se a pagar a referida dívida num prazo máximo de cinco anos.
Por ser verdade, vai esta declaração, feita em duplicado e ficando o original na posse do credor e a cópia em poder do devedor, datadas e assinadas por mim, prescindindo o credor do reconhecimento presencial da assinatura do devedor.
Porto, 04 de Junho de 2013 […] – cfr. documento a fls. 359 dos autos
c)
CONFISSÃO DE DÍVIDA Nº 3
F..., […] declara para os devidos efeitos que é devedor a J…, […] da quantia de €20.000,00 (Vinte mil euros) que recebeu nesta data em numerário.
Face ao supra-exposto, o abaixo-assinado compromete-se a pagar a referida dívida num prazo máximo de cinco anos.
Por ser verdade, vai esta declaração, feita em duplicado e ficando o original na posse do credor e a cópia em poder do devedor, datadas e assinadas por mim, prescindindo o credor do reconhecimento presencial da assinatura do devedor.
Porto, 20 de Junho de 2013[…] – cfr. documento a fls. 362 dos autos;
14) Mediante cartas registadas em 05.07.2016, foram remetidas ao mandatário do Recorrente e à Recorrente comunicações com idêntico teor, das quais constava, entre o mais, o seguinte:
[…] Assunto: Notificação: alínea f) do n.º 1 do artigo 87.° e alínea c) do n.º 1 do artigo 63.°-B da Lei Geral Tributária (LGT) – OI201500745 e OI201500746
Com base em elementos recolhidos, nomeadamente através do sistema informático da AT, detetaram-se as seguintes despesas/consumos do agregado familiar […] dos sujeitos passivos F..., NIF 1…e S..., NIF 2…: […]
b) Durante o ano de 2013 adquiriu três imóveis pelo valor total de € 445630 (artigo 1…, da União freguesias de Cedofeita, Santo Ildefonso, Sé, Miragaia, S. Nicolau e Vitória e artigos 4… e 1… da freguesia de Paranhos, todos do concelho do Porto), um quinhão hereditário pelo valor de € 20174,77 e quotas no valor de € 1200,00.
c) De acordo com as informações constantes das declarações Modelo 13 – Valores mobiliários, warrants autónomos e instrumentos financeiros derivados (previstas no artigo 124.° do Código do IRS) […] os investimentos líquidos em valores mobiliários perfizeram […] € 157125,80 […].
c) Os Abatimentos e Deduções contempladas no anexo H [Benefícios fiscais e Deduções) da declaração Modelo 3 […] declarados pelo agregado, perfizeram o valor de […] € 5176,88 em 2013.
d) Entradas de suprimentos efetuados pelo sócio F... na sociedade Academia de Música …, Lda., NIPC 5…, no valor de […] € 519360,10 no ano de 2013.
2 – Existindo uma divergência entre o acréscimo de património evidenciado […] e os rendimentos líquidos declarados em sede de IRS […], encontram-se reunidas as condições legais para se proceder à fixação do rendimento tributável nos termos da alínea f) n.º 1 do artigo 87.° e n.º 5 do artigo 89.º-A da LGT, o qual, em conformidade com a alínea d) do n.º 1 do artigo 9.° do Código do IRS será considerado rendimento da categoria G.
Nos termos do n.º 3 do artigo 89.0-A da LGT, para obstar ao procedimento de fixação de matéria coletável, deve, no prazo de dez dias, fazer prova de que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte do acréscimo de património ou da despesa efetuada.
Deverá também apresentar, no prazo de dez dias, prova documental do(s) montante(s) aplicados na(s) Instituições Financeiras, que originaram os rendimentos derivados de juros de depósitos à ordem ou prazo […].
3 –Mais se informa que de acordo com o disposto no n.º 11 do referido artigo 89.º-A da LGT, o procedimento inclui a investigação das contas bancárias pelo que se solicita autorização de acesso às mesmas através de assinatura do impresso anexo. A falta de envio de autorização, no prazo de 10 dias, terá como consequência o acesso à informação bancária via administrativa, conforme dispõe a alínea c) do n.º 1 do artigo 63.°-B da LGT.[…] – cfr. documentos a fls. 117 a 119 e 122 a 124 dos autos;
15) Em 18.07.2016, em resposta às comunicações referidas no ponto anterior, os Recorrentes apresentou exposição, da qual constava, entre o mais, o seguinte: […] Investimentos em Valores Mobiliários […]
Suprimentos na Sociedade Academia de Música…. Lda […]
6. Os investimentos em valores mobiliários e os suprimentos efectuados […] têm que ser analisados conjuntamente, porque existiram transferências entre aplicações financeiras e financiamentos à sociedade, afectações e desafectações que nos levam a estar na presença, em grande parte de movimentos com o "mesmo dinheiro".
O contribuinte enviou oportunamente mapas onde demonstra esta realidade e apura correctamente os valores (que aproveita para reenviar).
[…]
9. […] verificamos que os suprimentos e aplicações financeiras, não caem no âmbito do art.º 87, n.º 1 alínea f) pois em nenhum momento do ano (somando suprimentos e aplicações financeiras e subtraindo as justificações apresentadas), somam mais de € 100.000,00, pelo que não será de tirar qualquer ilação, nem deverá ocorrer a avaliação indirecta.
[…]
10. Relativamente aos imóveis, porque ultrapassam € 250.000,00 caem, em simultâneo, na previsão das alíneas d) e f) do n.º 1 do art.º 87 da LGT, pelo que se aplica o n.º 4 do art.º 89-A da LGT, aplicando-se assim, o rendimento padrão (20%) […].
11. Sendo que analisando o mapa oportunamente enviado pelo contribuinte chegamos à seguinte conclusão:
€ 467.000,00 - € 172.000,00 = € 294.000,00 x 20% = € 58.000,00
12. Logo a presente situação não cai na previsão do art.º 89-A, n.º l da LGT, porque os rendimentos líquidos declarados do ano comportam largamente este valor. […] – cfr. documentos a fls. 134 a 138 dos autos;
16) Em 07.10.2016, por despacho da Diretora–Geral da autoridade tributária e aduaneira, foi autorizado o acesso direto às contas e documentos bancários dos Recorrentes – cfr. documento a fls. 159 dos autos;
17) Em 25.10.2016, os Requerentes apresentaram, através do seu mandatário um documento denominado Confissão de dívida com o teor seguinte:
CONFISSÃO DE DÍVIDA Nº 4
F..., […] declara para os devidos efeitos que É devedor a J…, […] da quantia de €260.000,00 (duzentos e sessenta mil euros) respeitante a €132.000,00 (centro e trinta e dois mil euros) e €128.000,00 (cento e vinte e oito mil euros) recebidos em numerário em 05/06/2013 e 07/06/2013, respectivamente.
Face ao supra-exposto, o abaixo-assinado compromete-se a pagar a referida dívida num prazo máximo de cinco anos.
Por ser verdade, vai esta declaração, feita em duplicado e ficando o original na posso do credor o a cópia em poder do devedor, datadas e assinadas por mim, prescindindo o credor do reconhecimento presencial da assinatura do devedor.
Porto, 21 de Junho de 2013 […] – cfr. documento a fls. 374 dos autos;
18) Por Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte foi julgado improcedente o recurso interposto pela autoridade tributária e aduaneira da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que decidiu anular a decisão identificada no ponto 16 – cfr. documento a fls. 268 a 276 dos autos;
19) Em 16.08.2017, foi elaborado pela Divisão de Inspeção Tributária III da Direção de Finanças do Porto Projeto de Relatório de Inspeção Tributária referente aos Recorrentes, propondo correções à matéria coletável de IRS do ano de 2013, com recurso a métodos indiretos, no montante de €217.785,74 – cfr. documento a fls. 281 a 296 dos autos;
20) Mediante carta registada em 21.08.2017, foi remetido ao mandatários dos Recorrentes o ofício com o assunto Projecto Relatório da Inspeção Tributária […], nos termos do qual se fixou o prazo de 20 dias para exercerem, querendo, o direito de audição sobre aquele projecto – cfr. documentos a fls. 298 a 300 dos autos;
21) Em 18.09.2017, os Recorrentes apresentaram exposição com o teor seguinte: […] F... […] e S... […], notificados que foram […] para exercer o direito de audição sobre projeto de decisão de aplicação de métodos indirectos para a determinação do rendimento sujeito a IRS, vêm dizer o seguinte:
1. Entendem os requerentes que já demonstraram à saciedade a origem dos valores que permitiram os acréscimos patrimoniais.
2. Acréscimos patrimoniais que se resumem quase exclusivamente à aquisição de imóveis.
3. Porquanto, analisado o valor do reembolso de suprimentos e o saldo líquido das aplicações financeiras, temos uma diferença diminuta (€ 10.455,10).
4. Sendo certo que os requerentes não aceitam o valor do reembolso de suprimentos no ano de 2013 apurado no quadro de fls 14 do projecto de relatório:
O reembolso de suprimentos foi de € 76.670,70 (e não € 66.660,70), conforme pode ser constatado no extracto da conta 25322 de 01.01.2013 a 31.12.2013 da contabilidade da AMCC exibida em sede de inspecção.

AQUISIÇÃO DE IMÓVEIS
5. O foco são as aquisições de imóveis (e quinhão hereditário) no ano de 2013 ao seu irmão J… no valor global de:

€ 445.630,00 – Imóveis
€ 20.174,77 – quinhão hereditário constituído por imóveis
6. Sendo do conhecimento da AT que o requerente é proprietário “de favor” dos referidos imóveis.
7. Aliás, o requerente não exerce qualquer actividade imobiliária que justificasse estas aquisições que não fosse a pedido e no interesse do seu irmão.
8. Pelo que sendo proprietário "de favor" não se esperaria que o requerente dispusesse de fundos próprios para as solicitadas aquisições.
9. Situação “de facto” que a AT reconheceu como verdadeira.
10. Daí os referidos mútuos (que a AT aceita, mas tão só parcialmente).
11. Assim a AT aceita diversos mútuos que perfazem € 180.000,00.
12. Mas já não aceita os mútuos entretanto justificados pelos requerentes que ascendem ao valor € 260.000,00.
13. Os requerentes entendem estar justificados esses mútuos de € 180.000,00 + € 260.000,00, sem prescindir de defender que os mútuos ascenderam ao valor total pago ao J…, ou seja, € 467.000,00!
14. Considerando que a prova dos mútuos (de 05.06.2013 no valor de € 132.000,00 e de 07.06.2013 no valor de € 128.000,00) totalizando € 260.000,00 se encontra feita.
15. Assim exibiram:
a) extracto da conta bancária n.º 073-10.002768-6 – Banco M...– de J… onde se constatam os levantamentos desses valores (de 05.06.2013 no valor de € 132.000,00 e de 07.06.2013 no valor € 128.000,00) em numerário
b) Confissão de dívida
c) Vários depósitos em numerário na conta bancária do requerente, cabendo aqui uma ressalva para reconhecer que por lapso se mencionaram dois depósitos na conta do requerente – de € 111. 000,00 e de 10.000,00 – que não tem origem no mútuo em referência, mas nos suprimentos levantados nesta data – situação que não condiciona ou coloca em causa a realidade dos factos.

16. Conforme também foi referido em sede de inspecção, o gerente da conta do requerente, aconselhou este a realizar depósitos de menor valor nas suas contas, razão pela qual não existe coincidência (nem quanto ao valor nem quanto à data) entre os levantamentos em numerário de J… e os depósitos em numerário do requerente nas suas contas.
17. Sendo que perante os elevados valores em numerário que foram entregues ao requerente por J..., aquele alugou um cofre no M... logo no dia 05.06.2013 – conforme documento que aqui se anexa.
18. Após esta data, o requerente, tendo os valores em numerário no seu cofre, foi depositando diversos montantes, em dias diferentes dias, em mais do que uma conta sua.
19. Oportunamente os requerentes exibiram documentos que provam os seguintes depósitos (seja por exibição do talão de depósito seja por exibição do extracto da conta – sendo que os requerentes ficam à disposição para exibirem os talões de depósito em falta caso não se considerem pertinentes o extracto bancário)
depósitos em numerário por FF conta n.º 073 10.007364-9
05.06.2013 - € 2.325,00
11.06.2013 - € 2.260,00
11.06.2013 - € 1.000,00
18.06.2013 - € 2.225,00
20.06.2013 - € 21.000,00
09.07.2013 - € 3.000,00
12.07.2013 - € 2.500,00
17.07.2013 - € 9.500,00
19.07.2013 - € 9.000,00
22.07.2013 - € 12.470,00
24.07.2013 - € 12,000,00
25.07.2013 - € 12,500,00
29.07.2013 - € 20.000,00
TOTAL € 109.780,00
20. Não tendo os requerentes exibido, por manifesto lapso, os seguintes depósitos em numerário em outras contas suas (cujos documentos de suporte se anexam):
depósitos em numerário por FF conta n.º 073 10.002533-4
25.07.2013 - € 12.200,00
17.12.2013 - € 12.000,00 TOTAL € 24.000,00
depósitos em numerário por FF conta n.º 073 10.007358-1
01.07.2013 - € 9.450,00
25.07.2013 - € 11.500,00
TOTAL € 20.950,00
21. Com base na documentação já exibida e na aqui presente, verificamos que foi depositada a verba de € 154.730,00 em numerário, nas diversas contas dos requerentes.
22. Existirão mais depósitos em numerário nas contas dos requerentes, mas essa evidência não é sequer a única evidência à qual podem socorrer os requerentes.
23. Na verdade, um mútuo em numerário não se concretiza com o depósito desse valor numa conta bancária, mas no recebimento do valor em numerário que a confissão da dívida atesta.
24. Para mais quando constatamos que os requerentes alugaram um cofre exatamente no momento em que J... levantou os valores em numerário da sua conta.
25. (i) Os levantamentos em numerário por parte de J..., (ii) a confissão de dívida e (iii) o aluguer do cofre provam claramente a forma e o tempo do mútuo (a origem do acréscimo patrimonial).
26. Foram exibidas provas em sede de fiscalização que permitem à AT constatar o "circuito financeiro" entre os irmãos...
27. E que os requerentes receberam de J... a título de mútuo, € 467.000,00.
28. Termos em que ficou ilidida de forma inequívoca a presunção de evasão fiscal relativamente aos rendimentos declarados no ano de 2013.
Nestes termos não se verificam os pressupostos para o recurso a métodos indirectos para determinação do IRS de 2013. […]– cfr. documento a fls. 309 a 314 dos autos;
22) Em 26.09.2017, foi elaborado pelos Serviços de Inspeção Tributária “Relatório de inspeção tributária” do qual consta, entre o mais, o seguinte:
[…]
I - CONCLUSÕES DA AÇÃO INSPETIVA
Em resultado da ação inspetiva externa efetuada aos sujeitos passivos F... […] e S... […], propõe-se a correção por métodos indiretos, nos termos da alínea f) do artigo 87.º da Lei Geral Tributária (LGT), conforme descrito nos pontos IV e V do presente relatório:
IRS – Incrementos Patrimoniais – Correções por Avaliação Indireta:
Rendimento Tributável Cat. G: € 217 785,74
[…]
II.3. Outras situações
11.3.1. Caraterização e situação fiscal do sujeito passivo
[…]
Pela consulta ao sistema do património, verificou-se que, atualmente, o sujeito passivo A consta como proprietário de cinco imóveis, três dos quais adquiridos em 2013. Em dezembro de 2016, este sujeito passivo alienou cinco frações de um imóvel adquirido no ano de 2013.
O sujeito passivo B consta como proprietário de três imóveis, todos adquiridos em 2015.
[…]
Os abatimentos e deduções, contempladas no anexo H [Benefícios fiscais e Deduções] da declaração Modelo 3 do ano de 2013 declarados pelo agregado, perfizeram o valor de € 5176,88.
11.3.2. Diligências efetuadas 1I.3.2.A. Modelo 13
Pela consulta das declarações Modelo 13 - Valores mobiliários, warrants autónomos e instrumentos financeiros derivados (previstas no artigo 124.º do Código do IRS) no ano de 2013 os investimentos líquidos em valores mobiliários perfizeram € 157125,80 (Anexo 1).
Data da OperaçãoNatureza da Operação Código do Valor MobiliárioDesignação N.º de TítulosValor da Operação
2013-01-30 11 - Resgate/reembolso PTY MGA LMO 001 04 - Unidades de participação 426 -40000,00
2013-02-18 07 - Aquisição/subscrição PTY MGA LMO 001 04· Unidades de participação 1 216 114000,00
2013-04-03 11 - Resgate/reembolso PTY MGA LMO 001 04 - Unidades de participação 2872 -269500,00
2013-04-10 07 - Aquisição/subscrição PTC 3MW JMO 007 09 - Outros valores mobiliários 350 350000,00
2013-06-14 07 - Aquisição/subscrição ESO 127 797 019 02 -Ações 310 1171,80
2013-06-14 07 - Aquisição/subscrição PTF NV1 AMO 002 02 - Ações 150 750,00
2013-06-14 07 - Aquisição/subscrição PTR ELO AMO 008 02 -Ações 320 704,00

II.3.2.B. Património
Efetuada consulta ao "Atos Por Outorgante", verificou-se que no ano de 2013 constam vários registos para o sujeito passivo A:
• Aquisição de quotas, pelo valor de € 1200,00, em 2013-06-01, a J... (irmão);
• Aquisição de quinhão hereditário, em 2013-06-14, a J..., pelo valor de € 20174,77;
• Aquisição pelo valor de € 298630,00, em 2013-06-01, dos imóveis com os artigos 1… e 4…, da freguesia 131210, a J...;
• Aquisição pelo valor de € 147000,00, em 2013-06-05, do imóvel com o artigo 1…, da freguesia 1…, a J....
O sujeito passivo exibiu comprovativos dos movimentos financeiros realizados para pagamento de todas estas aquisições, no valor total de € 467004,77 (Anexo 2).
Data dos pagamentosValor dos pagamentos
14-05-2013 60683,90
20-05-2013 2500,00
01-06-2013 1200,00
04-06-2013 236130,00
04-06-2013 18000,00
07-06-2013 129000,00
20-06-2013 20147,77
Total 467661,67

II.3.2.C. Justificações apresentadas pelo sujeito passivo
Face ao valor destas aquisições efetuadas no ano de 2013 e considerando os rendimentos declarados pelo sujeito passivo neste ano, podendo tratar-se de uma situação enquadrável na alínea f) do n.º 1 do artigo 87.º da Lei Geral Tributária (LGT), solicitou-se ao sujeito passivo que comprovasse a origem do dinheiro utilizado para pagamento das aquisições efetuadas a J....
F... exibiu um quadro intitulado “Justificação de Movimentos Bancários com Suprimentos 2013” (Anexo 3), no qual justifica a origem do dinheiro utilizado para pagamento destas aquisições:
• Resgate de aplicação financeira;
• Reembolso de suprimentos da Academia de Música…, Lda.;
• Empréstimos do irmão, J..., documentados com comprovativos dos levantamentos em numerário e dos depósitos em numerário no mesmo dia;
• Fundo de maneio da conta à ordem pessoal, fruto de rendimentos auferidos de salários e rendas.
Para justificar os empréstimos do irmão, J..., o SP A anexou ao quadro intitulado “Justificação de Movimentos Bancários com Suprimentos 2013” os seguintes documentos (Anexo 4):
Talões de levantamento ao balcão de uma conta do irmão:

- € 42 500,00 em 2013-05-31;
- € 18 250,00 em 2013-06-04;
- € 100000,00 em 2013-06-04;
- € 20 200,00 em 2013-06-20;
Depósitos em numerário nos mesmos dias em contas suas, na mesma instituição bancária:
- € 40000,00 em 2013-05-31;
- € 18250,00 em 2013-06-04;
- € 25000,00 em 2013-06-04;
- € 84 000,00 em 2013-06-04;
- € 15 000,00 em 2013-06-04;
- € 25000,00 em 2013-06-04;
- € 21 000,00 em 2013-06-20;
Três confissões de dívida ao irmão que totalizam € 180 000,00:

- Confissão de divida (sem n.º), da quantia de € 40000,00, datada de 2013-05-31;
- Confissão de dívida n.º 2, da quantia de € 120000,00, datada de 2013-06-04;
- Confissão de dívida n.º 3, da quantia de € 20000,00, datada de 2013-06-20.
Analisadas as justificações apresentadas pelo sujeito passivo para a origem dos valores aplicados em acréscimos de património durante o ano de 2013, verifica-se o seguinte:
Relativamente ao Resgate de uma aplicação financeira (no valor de € 40 000,00), apurou-se que durante o ano de 2013 as aplicações em valores mobiliários / fundos de investimento foram superiores aos resgates (ponto II.3.2.A).

Relativamente ao reembolso de suprimentos da Academia de Música…, Lda. verifica-se que durante o ano de 2013, o valor dos suprimentos efetuados pelo SP A é inferior ao montante dos suprimentos devolvidos pela AM…, pelo que se aceita que o saldo (€ 66 660,70) possa servir de justificação da origem de parte dos valores aplicados em acréscimos de património / despesas efetuada durante o ano de 2013.

Relativamente aos empréstimos do irmão do SP A (J...), documentados com comprovativos dos levantamentos em numerário e dos depósitos em numerário e com as três confissões de divida, face à coincidência temporal e de valores entre os levantamentos e os depósitos, considera-se como justificação da origem dos valores monetários o valor de € 180000,00.
Relativamente aos valores justificados como tendo origem em “Fundo de maneio da conta à ordem pessoal, fruto de rendimentos auferidos de salários e rendas”, esta justificação não pode ser tida em consideração, na medida em que não é demonstrada documentalmente qualquer relação entre a movimentação de tais rendimentos e os acréscimos de património / despesa efetuada durante o ano de 2013.

II.3.2.D. Notificação - n.º 3 do artigo 89.º-A da LGT
Depois do sujeito passivo A ter constituído mandatário, os contactos passaram a ser estabelecidos exclusivamente com o mandatário (reuniões, contactos telefónicos, e-mails).
Não tendo sido possível obter prova da origem da totalidade dos recursos financeiro utilizados no acréscimo de património / despesa efetuada durante o ano de 2013, em 2016-07-05, foram notificados os sujeitos passivos, para no prazo de dez dias, nos termos do n.º 3 do artigo 89.º-A da LGT, fazer prova de que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte do acréscimo de património ou da despesa efetuada.
Foi enviado um ofício de notificação para o mandatário do sujeito passivo A (oficio n.o 20165000099215, com Registo RF 0734 0264 5 PT) e outro para o sujeito passivo B (oficio n." 20165000099635, com Registo RF 0709 5575 5 PT). No mesmo dia foi enviado um ofício para o sujeito passivo A, dando conhecimento da notificação efetuada via postal na pessoa do mandatário (ofício n.º 20165000099224, com Registo RF 0734 02637 PT).
Em 2016-07-18, foi recebido um e-mail do mandatário, através do qual os sujeitos passivos respondem à notificação. Relativamente ao ano de 2013, não apresenta qualquer justificação nova para a origem dos fundos, limitando-se a argumentar que as situações em análise não caem na norma de incidência prevista na alínea f) do n.º 1 do artigo 87.º da LGT.
[…]
II.3.2.F. Documentos enviados pelos sujeitos passivos após 2016-07-29
O mandatário dos sujeitos passivos exibiu cópia de duas folhas da caderneta de J… (irmão do SP A) do M..., no qual evidencia três levantamentos em numerário: € 132000,00 em 2013-06-05, € 128000,00 em 2013-06-07 e € 20200,00 em 2013-06-20 (Anexo 5).
Em 2016-09-17, é recebido um e-mail, em que o mandatário lista entradas em numerário de uma das contas do SP A no M... (073.10.007364-9) - Anexo 6. Destaca-se um dep6sito de € 111000,00 em 2013-06-04. O valor dos outros 14 depósitos, efetuados entre 2013-06-04 e 2013-07-29, varia entre € 1000,00 e € 21000,00. Estes 15 depósitos perfazem o valor de € 230780,00. De acordo com o mandatário, com a exibição dos extratos ficava demonstrado que € 230780,00 tinham sido efetivamente depositados nesta conta bancária.
Juntou no e-mail cópia de cinco folhas de uma caderneta da conta n.º 073 10.007364-9, com movimentos de 2013-05-30 a 2013-12-09, onde destaca os 15 depósitos em numerário listados no e-mail.
De referir que o depósito de € 21000,00 já tinha sido exibido antes pelo SP A e considerado no quadro elaborado pelo mandatário (confissão de dívida n.º 3, de € 20 000,00 de J...).
Da análise aos elementos enviados neste e-mail, fica apenas provado que foram efetuados nesta conta bancária depósitos em numerário que perfazem € 230780,00 mas não é demonstrada a relação existente entre estes depósitos em numerário e os levantamentos efetuados na conta do irmão, ou seja, não é demonstrada a origem desses recursos financeiros.
Em 2016-10-25, depois de notificado da decisão de derrogação do sigilo bancário, o mandatário dos sujeitos passivos envia um e-mail. afirmando que o valor de € 260000,00 mutuado pelo irmão do SP A foi depositado “em várias tranches, num curto espaço de tempo, mormente na sua conta bancaria n.º 073 10.007364-9” (Anexo 7). De acordo com o mandatário, “existem por um lado, pagamentos de FF a JF por conta das aquisições dos imóveis e quinhão hereditário. Imediatamente JF levanta esses valores em numerário e mutua a FF (conforme confissões de divida). FF deposita os valores recebidos nas suas contas bancárias”.
O mandatário dos sujeitos passivos anexa ao e-mail:
Comprovativos dos levantamentos de € 132000,00 em 2013-06-05 e € 128000,00 em 2013-06-07, efetuados na conta de J... (estes dois levantamentos já constavam das duas folhas de caderneta exibidas, conforme é referido no inicio deste ponto).

Confissão de dívida do SP A a J..., no valor de € 260000,00, datada de 2013-06-21.

Seis comprovativos de depósitos em numerário na conta n.º 073 10.007364-9, de que o SP A é titular:

- € 111000,00 depositados em 2013-06-04;
- € 10000,00 depositados em 2013-06-04;
- € 21000,00 depositados em 2013-06-20;
- € 9500,00 depositados em 2013-07-17;
- € 9000,00 depositados em 2013-07-19;
- € 12000,00 depositados em 2013-07-24.
Relativamente à confissão de dividida datada de 2013-06-21, é de salientar que, ao contrário das outras confissões de dívida (sem n.º e n.º 2 e 3) que foram exibidos pelo SP A logo no início do procedimento inspetivo (ponto II.3.3.C.), esta confissão de divida, apenas foi exibida diversos meses depois.
Os sujeitos passivos propõem-se justificar dois depósitos em numerário, um no valor de € 111000,00 e outro de € 10000,00, efetuados em 2013-06-04, com levantamentos em numerário efetuados da conta do irmão do SPA A em 2013-06-05 e 2013-06-07, ou seja, os levantamentos têm data posterior aos depósitos, pelo que não colhe a explicação dada pelo mandatário de que os valores são levantados pelo irmão e imediatamente são depositados na conta do SP A. Estes dois depósitos em numerário efetuados em 2013-06-04, que perfazem € 121000,00, não podem ter origem nos levantamentos de numerário da conta do irmão do SP A.
Ao contrário do que acontece com as primeiras confissões de dívida exibidas (que perfazem € 180000,00), em que no próprio dia, no mesmo balcão, são levantados da conta de J... e depositados na conta do SP A montantes idênticos, relativamente aos levantamentos e depósitos enviados no e-mail de 2016-10-25 não é possível estabelecer qualquer relação entre os mesmo, nem de valores, nem temporal.
Face ao exposto, conclui-se que com os elementos enviados neste e-mail não são apresentadas justificações adicionais para a origem dos recursos financeiros.
[…]
IV - MOTIVO E EXPOSIÇÃO DOS FACTOS QUE IMPLICAM O RECURSO A MÉTODOS INDIRETOS
IV.1. Rendimentos declarados pelos SP no ano de 2013
Com base na declaração de rendimentos modelo 3 do IRS processada na base de dados da AT enviada pelos sujeitos passivos em análise, verificou-se que estes declararam ter auferido, no ano de 2013, os seguintes rendimentos:
• Sujeito passivo A:
- Rendimentos de trabalho: € 60 169,28 (dedução especifica: € 6335,70);
- Rendimentos profissionais, comerciais e industriais: € 8560,00;
- Rendimentos prediais: € 20621,60 (não englobados);
• Sujeito passivo B:
- Rendimentos de trabalho: € 9852,90 (dedução especifica: € 4104,00).
Pela consulta às declarações modelo 39 processadas na base de dados da AT enviadas pelas instituições financeiras, verificou-se que, no ano de 2013, o SP A, obteve rendimentos de capitais no valor de € 7444,33 (retenção na fonte de € 2084,42) e o SP B no montante de € 3184,83 (retenção na fonte de € 628,22). Os sujeitos passivos não optaram pelo englobamento destes rendimentos.
No ano de 2013, os rendimentos líquidos das diferentes categorias de rendimentos dos sujeitos passivos totalizaram € 95517,91.
Rendimento Líquido
Rendimentos de trabalho: SP A 53833,58
Rendimentos de trabalho; SP B 5748,90
Rendimentos profissionais 8560,00
Rendimentos de capitais: SP A 5359,91
Rendimentos de capitais: SP B 2556,61
Rendimentos prediais 19458,91
Total 95517,91

IV.2. Acréscimo de património ou despesa efetuada
IV.2.1. Aquisição de imóveis
No ano de 2013, o sujeito passivo adquiriu os seguintes imóveis:
• artigos 1… e 4…, da freguesia de Paranhos, concelho do Porto, pelo valor de € 298630,00, em 2013-06-01 ;
• artigo 1…, da União das Freguesias de Cedofeita, Santo Ildefonso, Sé, Miragaia, S. Nicolau e Vitória, concelho do Porto, pelo valor de € 147000,00, em 2013-06-05.
Todos os imóveis foram adquiridos a J..., irmão do SP A.
O sujeito passivo exibiu comprovativos dos movimentos financeiros realizados para pagamento destas aquisições:
Data dos pagamentos Valor dos pagamentos
14-05-2013 60683,90
20-05-2013 2500,00
04-06-2013 236130,00
04-06-2013 18000,00
07-06-2013 129000,00

IV.2.2. Valores mobiliários
Pela consulta das declarações Modelo 13 - Valores mobiliários, warrants autónomos e instrumentos financeiros derivados (previstas no artigo 124.° do Código do IRS) do ano de 2013 foram detetadas as seguintes transações de valores mobiliários efetuadas pelo SP A:


Data da OperaçãoNatureza da Operação Código do Valor MobiliárioDesignação N.º de TítulosValor da Operação
2013-01-30 11 - Resgate/reembolso PTY MGA LMO 001 04 - Unidades de participação 426 -40000,00
2013-02-18 07 – Aquisição/subscrição PTY MGA LMO 001 04 - Unidades de participação 1216 114000,00
2013-04-03 11 - Resgatefreembolso PTY MGA LMO 001 04 - Unidades de participação 2872 -269500,00
2013-04-10 07 - Aquisição/subscrição PTe 3Mt/11 JMO 007 09 - Outros valores mobiliários 350 350000,00
2013-06-14 07 - Aquisição/subscrição ESO 127797019 02 -Ações 310 1 171,80
2013-06-14 07 - Aquisição/subscrição PTF NV1 AMO 002 02 -Ações 150 750,00
2013-06-14 07 - Aquisição/subscrição PTR ELO AMO 008 02-AçOes 320 704,00

Em 2016-06-08, o mandatário do sujeito passivo exibiu comprovativo do reembolso de uma aplicação de € 70000,00 (anexo 8), que não constava da modelo 13, pelo que os investimentos líquidos em valores mobiliários no ano de 2013 foram de € 87125,80.
IV.2.3. Outros acréscimos de património ou despesa efetuada
Efetuada consulta ao “Atos Por Outorgante” do sistema da AT, verificou-se que no ano de, 2013 constam outras duas aquisições efetuadas pelo SP A:
• Aquisição de quotas, pelo valor de € 1200,00, em 2013-06-01, a J... (irmão);
• Aquisição de quinhão hereditário, em 2013-06-14, a J..., pelo valor de € 20174,77.
O sujeito passivo exibiu comprovativos dos movimentos financeiros realizados para pagamento destas duas aquisições:
Data dos pagamentosValor dos pagamentos
01-06-2013 1200,00
20-06-2013 20147,77

Com base na declaração de rendimentos modelo 3 do IRS processada na base de dados da AT enviada pelos sujeitos passivos em análise, verificou-se que os abatimentos e deduções, contempladas no anexo H [Beneficias fiscais e Deduções] declarados pelo agregado, perfizeram o valor de € 5176,88.
IV.2.4. Resumo da Capacidade Financeira Evidenciada pelos Sujeitos Passivos
Tendo presente os factos relatados nos pontos IV.2.1 a IV.2.3. que precedem, procedeu-se à sua esquematização para uma melhor sistematização:
Aquisição de Imóveis a J... € 445630,00
Investimentos líquidos em valores mobiliários € 87125,80
Aquisição de quotas € 1200,00
Aquisição de quinhão hereditário € 20174,77
Abatimentos e deduções - modelo 3 €5176,88
Total
[…]
Tal como é referido nos pontos 11.3.2.C. e 11.3.2.F. deste relat6rio, foram efetuadas diligências junto dos sujeitos passivos para que estes comprovassem que correspondiam à realidade os rendimentos declarados e de que era outra a fonte do acréscimo de património ou da despesa efetuada, nomeadamente através de notificação (ponto 11.3.2.D.).
Da análise de todos os factos alegados pelos sujeitos passivos e das diligências efetuadas no decurso da ação (pontos II.3.2.C. e II.3.2.F, onde estão descritos todos os documentos apresentados pelos sujeitos passivos para justificar a origem dos recursos financeiros, bem como as razões consideradas para a não aceitação dos mesmos), perante a obrigatoriedade legal dos sujeitos passivos fazerem prova da origem dos rendimentos e da sua efetiva aplicação nos acréscimos de património e despesa efetuada referidos no ponto IV.2, conclui-se que do valor de € 559307,45 (ponto IV.2.) se encontra por justificar a proveniência de recursos financeiros no valor de € 313303,65:

Origem dos recursos financeirosAcréscimo Património / Despesa
Pagam. a J… € 467.661,67
Saldo Líquido de Aplicações Financeiras € 87.125,80
Abatimentos e deduções (mod. 3) € 5.176,88
Reembolso de Suprimentos - Suprimentos efetuados na AMCC€ 66.660,70
Empréstimos de J… (irmão do SP A) € 180.000,00
Diferença € 313.303,65

No quadro do anexo 9, descreve-se de uma forma mais detalhada o resumo que consta do quadro anterior.
[…]
V. CRITÉRIOS DE CÁLCULOS DOS VALORES CORRIGIDOS COM RECURSO A MÉTODOS INDIRETOS
Nos termos da alínea a) do n.º 5 do artigo 89.º da LGT, para efeitos da alínea f) do n.º 1 do artigo 87.°, “Considera-se como rendimento tributável em sede de IRS, a enquadrar na categoria G, quando não existam indícios fundados, de acordo com os critérios previstos no artigo 90.º, que permitam à administração tributária fixar rendimento superior, a diferença entre o acréscimo de património ou a despesa efectuada, e os rendimentos declarados pelo sujeito passivo no mesmo período de tributação". De acordo com a alínea d) do mesmo artigo, “Consideram-se como rendimentos declarados os rendimentos líquidos das diferentes categorias de rendimentos”.
Conforme dispõe a alínea d) do n.º 1 do artigo 9.º do Código do IRS, constituem incrementos patrimoniais, os “Acréscimos patrimoniais não justificados, determinados nos termos dos artigos 87.º, 88.º ou 89.º-A da Lei Geral Tributária”.
Nos termos do n.º 11 do artigo 72.° do Código do IRS, os acréscimos patrimoniais injustificados são tributados à taxa especial de 60%.
Assim, não tendo os sujeitos passivos logrado provar a proveniência da totalidade dos recursos financeiros que lhe permitiram o acréscimo de património / despesa efetuada referida no ponto IV.2., os mesmos terão de ser tributados pelas regras da categoria G do IRS, previstas na alínea d) do n.º 1 do artigo 9.º do Código do IRS, sendo a avaliação indireta efetuada nos termos da alínea f) do n.º 1 do artigo 87.º da LGT.
Acréscimo de Património/Despesa não justificada: € 313 303,65
Rendimentos ilíquidos das diferentes categorias de rendimentos: € 95 517,91 Rendimento da categoria G = € 217 785,74
Os acréscimos patrimoniais injustificados a serem tributados à taxa prevista no n.º 11 do artigo 72.º do Código do IRS totalizam € 217 785,74.
[…]
IX - DIREITO DE AUDIÇÃO
[…]
Em 2017-09-18, o mandatário dos sujeitos passivos enviou um e-mail através do qual exerce o direito de audição.
O mandatário dos sujeitos passivos começa por afirmar (pontos 1 a 4) que os requerentes entendem já ter demonstrado à saciedade a origem dos valores que permitiram os acréscimos patrimoniais. Defende que os acréscimos patrimoniais se resumem quase exclusivamente à aquisição de imóveis, porquanto a diferença entre o valor do reembolso de suprimentos e o saldo líquido das aplicações financeiras é diminuta (€ 10455,10). Os sujeitos passivos não aceitam o valor do reembolso de suprimentos apurado no quadro do Projeto de Relatório, considerando que o “reembolso de suprimentos foi de € 76670,70 (e não de € 66660,70), conforme pode ser constatado no extrato da conta 25322 de 01.01.2013 a 31.12.2013 da contabilidade da AMCC exibida em sede de inspeção."
Nos pontos 5 a 14, os sujeitos passivos afirmam que o requerente é proprietário “de favor” dos imóveis adquiridos ao irmão durante o ano de 2013, não exercendo qualquer atividade imobiliária que justificasse estas aquisições que não fosse a pedido e no interesse do seu irmão. Pelo que, sendo proprietário “de favor”, não se esperaria que o requerente dispusesse de fundos próprios para as solicitadas aquisições. Situação "de facto" que a AT reconheceu como verdadeira. Consideram estar justificados mútuos de € 180000,00 (aceites pela AT) e de € 260000,00, sem prescindir de defender que os mútuos ascenderam ao valor total pago a J... (€ 467000,00).
No ponto 15 enumera os elementos apresentados para documentar o mútuo de € 260000,00, reconhecendo ter existido um lapso ao terem sido mencionados dois depósitos (de € 111000,00 e € 10000,00) que não tem origem neste mútuo mas nos suprimentos levantados nesta data.
Nos pontos 16 a 18, justifica a não existência de coincidência entre levantamentos em numerário de J... e os depósitos em numerário nas contas do SP A, pela alteração de procedimento após alerta do gerente da conta e aluguer de um cofre em 2016-06-05 (anexa documento do M... de 2013-06-05, relativo à caução do cofre). Após esta data, tendo os valores em numerário no seu cofre, o requerente foi depositando diversos montantes, em dias diferentes, em mais do que uma conta sua.
No ponto 19 indica os depósitos na conta n.º 073 10.007364-9 (já referidos no e-mail do mandatário de 2016-09-17, ponto II.3.2.F deste Relatório) e no ponto 20 do direito de audição indica mais quatro depósitos (e anexa cópia dos respetivos Talões de Entrega no M...):
- contas n.º 073 10.002533-4: € 12200,00 em 2013-07-25 e € 12000,00 em 2013-12-17;
- conta n.º 073 10.007358-1: € 9450,00 em 2013-07-01 e € 11500,00 em 2013-07-25.
Conclui o mandatário (pontos 21 a 23) que foi depositada a verba de € 154730,00 nas diversas contas do requerente. Existirão mais depósitos em numerário “mas essa evidência não é sequer a única evidência à qual se podem socorrer os requerentes”. De acordo com o mandatário, “um mútuo em numerário não se concretiza com o depósito desse valor numa conta bancária, mas no recebimento do valor em numerário que a confissão de dívida atesta”.
Nos pontos 24 a 28, o mandatário termina alegando que os levantamentos em numerário por parte de J..., a confissão de divida e o aluguer do cofre provam claramente a forma e o tempo do mútuo, considerando terem sido exibidas em sede de fiscalização provas que permitem à AT constatar o “circuito financeiro” entre os irmãos e que os requerentes receberam de J..., a título de mútuo € 467000,00. Considera ter ficado ilidida de forma inequívoca a presunção de evasão fiscal relativamente aos rendimentos declarados no ano de 2013.
Face à exposição feita pelo mandatário dos sujeitos passivos no exercício de direito de audição, temos a dizer o seguinte:
- A diferença entre o valor do reembolso de suprimentos e o saldo líquido das aplicações financeiras é de € 20465,10 e não de € 10455,10, como alega o sujeito passivo (pontos 1 a 4). O valor do reembolso de suprimentos foi efetivamente de € 66660,70 e não de € 76670,70, conforme se pode constatar pela análise da conta 25322 “Accionistas (Sócios) / Participantes de Capital / Outros Participantes - suprimentos e outros mútuos / F…” da contabilidade da Academia de Música…, Lda. do ano de 2013 (Anexo 9).
- Nos pontos 5 a 14, não é apresentado qualquer facto novo.
- Relativamente ao ponto 15, o mandatário vem agora indicar que os depósitos de € 111000,00 e € 10000,00 têm origem em suprimentos levantados na mesma data e não em levantamentos em numerário da conta de J..., no entanto, não apresenta qualquer documento comprovativo deste facto. De referir que nesta data foi efetuado um reembolso de suprimentos no valor total de € 462750,00, como consta do extrato da conta 25322 da contabilidade de Academia de Música…, Lda. Este reembolso concretizou-se em três transferências bancárias, duas para a conta n.º 073-10.004791-6 (€ 42 750,00 e € 395 000,00) e uma para a conta n.º 073-10.007358-1 (€ 25000,00), ou seja, nenhuma das transferências se realizou para a conta do SP A em que foram efetuados estes dois depósitos em numerário.
Mesmo que tivesse ficado inequivocamente comprovado que estes dois depósitos tinham origem no reembolso de suprimentos, em nada são alteradas as conclusões a que se chegou no Projeto de Relatório, dado que o valor liquido do reembolso dos suprimentos foi considerado como justificação de parte do Acréscimo de Património / Despesas, conforme consta do quadro do ponto IV.2. deste Relatório.
- Nos pontos 16 a 18, também não são apresentados quaisquer factos novos.
- Relativamente aos depósitos identificados no ponto 19, tal como acontece com os depósitos enviados no e-mail do mandatário de 2016-10-25 (ponto II.3.2.F. deste Relatório) não é possível estabelecer qualquer relação entre os levantamentos em numerário e estes depósitos, nem de valores, nem temporal.
- No ponto 23, o mandatário alega que o mútuo se concretiza no recebimento do valor em numerário que a confissão de divida atesta e não no depósito desse valor numa conta bancária, no entanto, não apresenta comprovativo do recebimento do valor em numerário. De referir que de acordo com o artigo 1143.º do Código Civil, “o contrato de mútuo de valor superior a € 25000 só é válido se for celebrado por escritura pública ou por documento particular autenticado” e os documentos exibidos foram meras confissões de dívida apenas assinadas pelo devedor e sem reconhecimento notarial.
- Relativamente aos pontos 24 a 28, comecemos pelo aluguer do cofre. Os sujeitos passivos provam a existência de um cofre mas não logram provar que os valores levantados em numerário da conta de J... foram aí colocados, nem que os depósitos posteriores tiveram origem em dinheiro que ai estivesse guardado.
Relativamente à utilização de cofres, é de referir o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte proferido no Processo 02541/15.6BEPRT, de 2017-01-24, em que, numa situação em que os Requerentes pretendiam justificar a origem da manifestação de fortuna em valores guardados em cofre particular, afirma o seguinte: «a não utilização do sistema bancário foi, uma opção dos Recorrentes, terão eles também de arcar com as dificuldades de prova quanto aos contornos da realização das transacções em numerário.»
Ao contrário do que é afirmado pelo mandatário, os levantamentos em numerário por parte de J..., a confissão de divida e o aluguer do cofre não provam claramente a forma e o tempo do mútuo.
De acordo com o n.º 3 do artigo 89.° A da LGT, “cabe ao sujeito passivo a comprovação de que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna ou do acréscimo de património ou da despesa efectuada”, ou seja, quando o sujeito passivo se propõe demonstrar que correspondem à realidade os rendimentos declarados provando que tinha outros meios financeiros para efetuar a aquisição ou realizar a despesa, deve fazê-lo demonstrando também inequivocamente que mobilizou esses proventos para a realização da operação em causa.
Tal como se conclui no Projeto de Relatório não é justificada a proveniência de recursos financeiros no valor de € 313303,65. […]. – cfr. documento a fls. 320 a 337 dos autos;
23) Em 04.10.2017, foi proferido, pela Diretora de Finanças Adjunta, despacho de concordância sobre o Relatório de Inspeção Tributária identificado no ponto anterior – cfr. fls. 320 dos autos;
24) Em 04.10.2017 foi proferida a decisão com o teor seguinte:
[…]
ACTO DE FIXAÇÃO OU DE ALTERAÇÃO
De acordo com a fundamentação abaixo mencionada:
[…]
No uso da competência prevista no n.º 6 do artigo 89.º-A da Lei Geral Tributária, fixo o conjunto dos rendimentos líquidos no montante de € 283.788,22 (duzentos e oitenta e três mil setecentos oitenta e oito euros e vinte dois cêntimos).
Fundamentação:
Nos termos da alínea f) do n.º 1 do artigo 87.º e da alínea a) do n.º 5 do artigo 89.º-A, ambos da Lei Geral Tributária e conforme Relatório de Inspeção Tributária de 2017-09-26, foi determinado o rendimento tributável de IRS, resultante do incremento patrimonial enquadrável na categoria G do IRS, conforme alínea d) do n.º 1 do artigo 9.º do Código do IRS, no montante de € 217.785,74.
Da aplicação da taxa especial de 60%, prevista no n.º 11 do artigo 72.° do Código do IRS, ao acréscimo patrimonial não justificado apurado de € 217.785,74 (al. f) do n.º 1 do artigo 87.º da Lei Geral Tributária), apura-se o imposto referente a tributação autónoma de € 130.671,44.
Notifique-se o sujeito passivo.
[…]
O Decisor,
José… […] – cfr. documento a fls. 383/384 dos autos;
25) Mediante carta registada com aviso de receção assinado em 13.10.2017, foi dado conhecimento ao mandatário dos Recorrentes do ofício com o teor seguinte: […]
Fica(m) por este meio notificado(s), […] do Relatório de lnspeção Tributária, que se anexa como parte integrante da presente notificação […].
Da fixação do rendimento coletável de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) por métodos indiretos, nos termos dos artigos 87.º a 90.º da Lei Geral Tributária (LGT), por remissão do artigo 39.º do código do IRS, nos seguintes anos:
ANO(S) RENDIMENTO FIXADO
2013 € 283 788,22
[…]
A decisão de avaliação indireta tem por base os factos, motivos e fundamentos constantes do Relatório de Inspeção, tendo os valores sido fixados de acordo com os critérios e cálculos mencionados no referido Relatório.
[…]
No caso de ter havido aplicação do regime previsto no artigo 89.º-A da LGT – manifestações de fortuna e outros acréscimos patrimoniais não justificados –poderá(ão) apresentar recurso para o tribunal tributário, no prazo de 10 dias, nos termos dos n.ºs 7 e 8 do referido artigo […].
[…]
Anexo: Relatório com 48 folhas e Nota de Fixação com 1 folha […] – cfr. documentos a fls. 387/388 dos autos;
26) Em 23.10.2017, deu entrada neste Tribunal a petição inicial que deu origem aos presentes autos – cfr. comunicação eletrónica a fls. 1 dos autos.
*
Não se provaram quaisquer outros factos, designadamente os seguintes:
A) Que os montantes de €132.000,00 e €128.000,00 levantados em numerário por J... em 05.06.2013 e 07.06.2013 se destinaram a dar de empréstimo ao Recorrente F...;
B) Que os montantes de €132.000,00 e €128.000,00 levantados em numerário por J... em 05.06.2013 e 07.06.2013 foram utilizados pelo Recorrente F... para pagamentos ao próprio J... durante o ano de 2013;

*
MOTIVAÇÃO.
A decisão quanto aos factos provados assentou no acordo das partes e na análise dos documentos constantes dos autos, nomeadamente os relativos ao procedimento de inspeção tributária, os quais não foram impugnados, e mereceram credibilidade, conforme discriminado nos vários pontos do probatório.
Na tabela apresentada no ponto 1) são indicados os movimentos, com relevância para a decisão da causa, ocorridos na conta bancária titulada por J..., tendo por base os documentos bancários juntos pelas partes e que constam nas folhas dos autos identificadas na última coluna da tabela.
De modo idêntico, na tabela apresentada no ponto 4) são indicados os depósitos em numerário, com relevância para a decisão da causa, ocorridos nas contas bancárias tituladas por F..., tendo por base os documentos bancários juntos pelas partes e que constam nas folhas dos autos identificadas na última coluna da tabela.
Os factos dados como provados no ponto 3) resultam de acordo, atendendo à posição assumida pelas partes.
Os factos dados como provados nos pontos 7), 9), 12) e 18) resultam de vários segmentos do relatório da inspeção – tal como especificado em cada um destes pontos –, cujo teor não foi impugnado e merece credibilidade.
Os factos dados como provados nos pontos 13) e 17), na parte relativa ao momento em que foram apresentados os respetivos documentos, decorrem do teor do relatório da inspeção e do teor das comunicações eletrónicas trocadas entre as partes, que constam em anexo ao relatório da inspeção. Quanto à prova do teor dos documentos, decorre da sua junção aos autos, tal como especificado nestes dois pontos do probatório.
Os restantes factos foram considerados provados com base nos documentos juntos aos autos, tal como especificado em cada ponto do probatório.
Quanto aos factos não provados, a convicção do Tribunal teve por base a posição assumida pelos Recorrentes, quer durante o procedimento inspetivo quer na petição inicial, bem como os documentos trazidos aos autos.
Os Recorrentes não produziram prova documental suficiente sobre o alegado facto de os montantes levantados em numerário por J... em 05.06.2013 e 07.06.2013 terem sido entregues ao Recorrente F... a título de empréstimo, nem sobre a alegação de que estas verbas foram utilizadas pelo Recorrente para pagamento das aquisições que realizou ao próprio J....
Os documentos bancários que os Recorrentes juntaram aos autos não evidenciam que os referidos valores em numerário tenham sido depositadas em contas bancárias tituladas pelo Recorrente, e a partir das quais este efetuou as transferências bancárias para pagamento do preço dos bens que adquiriu a J....
Os Recorrentes pretendem, essencialmente, que os movimentos financeiros que a autoridade tributária e aduaneira aceitou como justificativos de parte dos recursos financeiros utilizados pelo Recorrente nas aquisições, sirvam de indicativo de que mantiveram idêntica atuação no que respeita aos restantes valores não aceites por aquela entidade. Ou seja, pretendem demonstrar que, relativamente aos montantes de €132.000,00 e €128.000,00 também seguiram o procedimento de levantamento em numerário por parte de J... com entrega do dinheiro a F... e posterior depósito em numerário em contas tituladas por este último, com a única diferença de que, durante um certo período de tempo, o dinheiro ficaria depositado num cofre alugado para o efeito pelo Recorrente e que só depois seria por este depositado em valores parciais nas suas contas.
No entanto, os documentos bancários trazidos aos autos pelos Recorrentes não evidenciam que tenha sido exatamente este o procedimento seguido, pois, por um lado, o somatório dos depósitos em numerário ocorridos após as datas dos levantamentos não perfazem, sequer em termos aproximados, os montantes levantados por J..., e, por outro, as datas em que os depósitos foram efetuados não são condicentes com a hipótese aventada pelos Recorrentes de terem tais verbas sido utilizados para pagamento do preços dos bens adquiridos.
Ficou também por esclarecer o motivo pelo qual a alegada alteração de procedimento quanto aos depósitos em numerário não foi seguida nas movimentações ocorridas em 20.06.2013, que culminaram com um depósito em numerário de €21.000,00 na conta do Recorrente, importância significativamente superior aos restantes depósitos que o Recorrente vinha fazendo desde o dia 05.06.2013, data em que terá alterado o referido procedimento de depósito. Neste caso, foi precisamente por existir uma correspondência entre datas e montantes levantados e depositados que a autoridade tributária e aduaneira aceitou a importância como sendo relativa a um empréstimo. Ora, tal correspondência não existe no que respeita aos levantamentos de €132.000,00 e €128.000,00 realizados em 05.06.2013 e 07.06.2013, respetivamente.
Quanto ao documento Confissão de dívida n.º 4, note-se que foi apresentado à inspeção tributária apenas em 25.10.2016, enquanto as restantes – que foram aceites por aquela entidade como justificativo da proveniência de parte dos recursos utilizados nas aquisições de património – o foram em data não determinada mas sempre anterior a 05.07.2016, não tendo os Recorrentes apresentada justificação para tal demora na sua apresentação.
Por outro lado, esta confissão de dívida indica como dívida dois valores que correspondem de modo exato aos dois levantamentos em numerário que serviram de suporte ao alegado empréstimo, enquanto as restantes, anteriormente apresentadas, apenas correspondiam de modo aproximado aos montantes dos levantamentos ocorridos naquelas datas.
Por fim, trata-se de um documento particular unicamente assinado pelo Recorrente F... e sem reconhecimento dessa assinatura, ou seja, é um documento sem confirmação oficial sob qualquer forma.
Por estes motivos, subsiste a dúvida sobre a data em que este documento foi realmente elaborado, razão pela qual entende o tribunal que não é um documento com a virtualidade de provar a existência de empréstimo no montante nele referido.
Contribui ainda para a convicção do tribunal quanto aos factos não provados a circunstância de os Recorrentes terem afirmado inicialmente, no procedimento de inspeção, que os depósitos em numerário dos montantes de €111.000,00 e €10.000,00, realizados em 04.06.2013, corresponderiam a depósitos parciais do montante de €132.000,00 levantado em numerário por J.... Ora, quando confrontados pela inspeção tributária com a evidência de que tais depósitos não poderiam corresponder ao levantamento efetuado por J..., por serem anteriores a este, vieram os Recorrentes esclarecer que, na realidade de tratava de depósitos de suprimentos provenientes da Academia de Música…, Lda.
Daqui decorre, por um lado, que os próprios Recorrentes não têm a memória exata da proveniência dos depósitos em numerário que realizaram nas suas contas bancárias, e, por outro, que os Recorrentes tinham como prática efetuar diversos depósitos em numerário, independentemente da sua proveniência, circunstância que abala a hipótese dos restantes depósitos corresponderem todos eles a empréstimos obtidos junto de J....
Quanto à inquirição da única testemunha arrolada, J... depôs com convicção acerca dos factos relacionados com os movimentos monetários ocorridos entre si e o Recorrente, em particular sobre a circunstância de os levantamentos em numerário que realizou nos dias 05.06.2013 e 07.06.2013 terem como propósito o seu empréstimo ao Recorrente, bem como sobre a veracidade do documento Confissão de dívida n.º 4.
No entanto, há a realçar que a testemunha é irmão do Recorrente F... e diretamente envolvido nos movimentos financeiros em causa. Ficou patente que entre ambos terá sido firmado um acordo para resolução de um problema patrimonial de J..., mas tal não é suficiente para convencer o tribunal de que tal acordo incluiu o empréstimo das importâncias de €132.000,00 e €128.000,00 por parte da testemunha ao Recorrente, em 05.06.2013 e 07.06.2013, respetivamente. Pelo contrário, o envolvimento pessoal e familiar da testemunha retira credibilidade ao seu testemunho.
Sublinhe-se, a este propósito, que, no decurso da inquirição, foi pedido à testemunha que confirmasse a veracidade dos documentos intitulados Confissões de dívida constantes dos autos, tendo esta, relativamente aos três primeiros documentos apresentados pelos Recorrentes no procedimento de inspeção, confirmado a sua veracidade ainda antes de estes lhe serem exibidos e, relativamente ao documento Confissão de Dívida n.º 4, confirmado prontamente a sua veracidade, sem necessidade de verificar com algum pormenor o teor do documento em causa.
Em suma, tendo presente que a credibilidade do depoimento depende de muitos fatores, que o tribunal aprecia livremente (cfr. artigos 396, do Código Civil e 607, n.º 5, do Código de Processo Civil), sendo a sua consonância com a documentação um dos critérios que pode atestar tal credibilidade, e atendendo a que, no caso dos autos, os documentos bancários carreados pelos Recorrentes são contraditórios com o depoimento da testemunha, entende este tribunal que este depoimento é insuficiente para se dar como demonstrada a origem dos recursos financeiros mobilizados pelos Recorrentes nas suas aquisições patrimoniais.
Por conseguinte, a apreciação conjugada do depoimento da testemunha e do documento particular de confissão de dívida, sem qualquer registo notarial – e, como tal, também este sujeito à livre convicção do julgador –, com a ausência de demonstração dos fluxos financeiros que lhe estão associados, obsta a que se dê como provado que o alegado empréstimo existiu e constituiu a proveniência dos recursos financeiros utilizados para os acréscimos patrimoniais e despesa realizados pelos Recorrentes em 2013.

IV FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.
Os Recorrentes foram notificados de que por despacho proferido pela Exma. Diretora de Finanças Adjunta foi determinada a correção do rendimento coletável com recurso à avaliação indireta, nos termos previstos na alínea f) do n.º 2 do art.º 87 e n.ºs 3 e 5 do art.º 89-A da LGT.
Inconformados, recorreram para o TAF do Porto alegando, em síntese, a incompetência do autor do acto, e por outro lado, a demonstração da origem dos valores que permitiram os acréscimos patrimoniais. Sustentam que os imóveis, quinhão hereditário e quota social adquiridos pelo valor global de € 467.004,77 eram pertença de J..., irmão do Recorrente F..., que por razões do foro privado daquele pediu ao Recorrente que adquirisse os seus bens, o que o Recorrente aceitou desde que J... financiasse a aquisição “uma vez que os Recorrentes não tinham disponibilidade financeira para efetuar este investimento....”. Existia um circuito financeiro no qual J... recebia o preço dos imóveis na sua conta bancária, levantava esse dinheiro em numerário e entregava ao irmão ora Recorrente, que por sua vez depositava, total ou parcialmente, em numerário nas suas contas.
A AT entendeu o contexto “especial” em que ocorreram as aquisições dos imóveis e viu o circuito financeiro mas só aceita parcialmente a justificação da origem dos valores monetários. Aceita três dos mútuos confessados pelo Recorrente no montante global de € 180.000,00 mas já não aceita o mútuo confessado de € 260.000,00 =(132.000,00+128.000,00), não fazendo qualquer sentido a posição da AT.
Efectuada a produção de prova, a MMª juiz julgou improcedente o recurso, analisando todas as questões que lhe foram colocadas na petição inicial.

Os Recorrentes discordam do decidido e pugnam pela revogação da sentença e a consequente anulação da decisão proferida pela Diretora de Finanças Adjunta do Porto, invocando erro no julgamento da matéria de facto e errónea aplicação do art. 87º n.º 1 alínea f) da LGT.

Iniciando a apreciação do recurso pelo alegado erro de julgamento de facto, os Recorrentes consideram incorretamente julgada a matéria de facto dada como não assente pugnando pela sua integração no probatório, ao abrigo do disposto no art.º 662º n.º 1 do CPC, com fundamento nos documentos 1, 2, 3, 4, 5 e 9 juntos com a pi, fls. 382 dos autos (Anexo 10 do relatório da Inspeção Tributária) e o depoimento da testemunha J....

Os factos cujo aditamento requer estariam provados por documentos e prova testemunhal.

A alteração da matéria de facto pressupõe o erro no seu julgamento. O que ocorre quando se conclua, da confrontação entre os meios de prova produzidos e os factos dados por provados ou não provados, que o juízo feito está em desconformidade com a prova produzida, independentemente da convicção pessoal do juiz acerca de cada facto Ac. deste TCAN n.º 00390/05.9BEBRG de 30-10-2014 Relator: Cristina Flora..

Com efeito, ao consagrar o princípio da livre apreciação da prova a lei elege como princípio norteador (art. 655º do CPC correspondente ao actual art. 607º/5 do NCPC) que o julgador não se encontra sujeito às regras rígidas da prova tarifada.

Isso não quer dizer, evidentemente, que a actividade de valoração da prova seja arbitrária, mas antes vinculada à busca da verdade e limitada pelas regras da experiência comum e pelas restrições legais.

No entanto, tal princípio concede ao julgador uma margem de discricionariedade na formação do seu juízo de valoração, que terá - e deverá - encontrar fundamento na fundamentação lógica e racional, e por isso, escrutinável pelas partes e pelo tribunal «ad quem».

Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas (cfr. artº. 607º/5, do CPC, na redação da Lei 41/2013, de 26/6), tudo devidamente fundamentado com a análise crítica das provas.

Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g. força probatória plena dos documentos autênticos - cfr. artº. 371, do CC) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação Cfr. Ac. do TCAS 05555/12 de 14-11-2013 Relator: JOAQUIM CONDESSO..

Como é natural, a tarefa de apreciação da prova, vinculada ao princípio da descoberta da verdade material, configura-se de diferente graduação e intensidade entre a 1.ª instância e o tribunal de recurso, dado o beneficio que aquela dispõe da imediação e da oralidade e por estar, este, limitado à prova documental e ao registo de declarações e depoimentos. Enquanto o tribunal «a quo» aprecia a prova em ambiente de «imediação», o tribunal «ad quem» fá-lo em contexto «mediato».

Por isso se entende que o princípio da livre apreciação da prova e o princípio da imediação de algum modo limitam o reexame da matéria de facto fixada no tribunal “a quo, pelo que a sua alteração apenas pode ocorrer em caso de erro manifesto ou grosseiro ou se os elementos documentais apontarem inequivocamente em sentido diverso (Ac. do TCAN n.º 00390/05.9BEBRG de 30-10-2014 - Relator: Cristina Flora)

Tal erro deve ser demonstrado pelo recorrente através do exercício de um duplo ónus: delimitar o âmbito do recurso indicando claramente os segmentos da decisão que considera padecerem desse erro; e fundamentar as razões da sua discordância, concretizando e apreciando criticamente os meios probatórios constantes dos autos ou da gravação que, no seu entender, impliquem uma decisão diversa.

É o que resulta do art.º 640º do CPC, (correspondente ao anterior art.º 685-B), com alterações):
“1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
(…)

Como refere António Abrantes Geraldes (in Recursos em Processo Civil – Novo Regime. Almedina, 2008, pp. 147 e segs. estas exigências «..devem ser apreciadas à luz de um critério de rigor, próprio de um instrumento processual que visa pôr em causa o julgamento da matéria de facto efectuado por outro tribunal em circunstâncias que não podem ser inteiramente reproduzidas na 2.ª instância»

O incumprimento destas regras implica, como expressamente diz a lei, a rejeição do recurso (na parte afetada), sem que haja lugar a despacho de aperfeiçoamento relativamente ao recurso da decisão da matéria de facto.

Ora, tendo em conta o exposto, o recurso não pode deixar de improceder na parte em que discorda da decisão da matéria de facto por manifesta falta de cumprimento do ónus previsto na alíneas b) do n.º 1 do art. 685º-B do CPC.

O recorrente limita-se a referir os factos que devem ser provados e os documentos de onde extrai a demonstração correspondente, bem como o depoimento da testemunha inquirida.

O julgamento da matéria de facto quer em primeira instância quer a sua reapreciação em recurso deverá ser efetuada de forma global e articulada. Quando são vários os meios probatórios levados à apreciação do julgador, não se pode eleger um único meio excluindo os demais (salvo prova tarifada). A prova deverá ser sempre analisada de forma integrada e articulada entre si. Cfr. ac. do TRE n.º 515/13.0GDPTM.E1 de 25-03-2014 Relator: RENATO BARROSO
Sumário: I - A prova não pode ser analisada de forma compartimentada, segmentada, atomizada. O julgador tem de apreciar e valorar a prova na sua globalidade, estabelecendo conexões, conjugando os diferentes meios de prova e não desprezando as presunções simples, naturais ou hominis, que são meios lógicos de apreciação das provas e de formação da convicção.



Em relação ao depoimento da testemunha não indica com exatidão as passagens da gravação em que se funda o recurso, nem procede à transcrição dos excertos que considera relevantes. (alínea a) do n.º 2 do art. 640º do CPC), o que implica a imediata rejeição do recurso, nesta parte, improcedendo as conclusões a) a l).

Defendem ainda que a MMª juiz violou as regras do direito probatório material na medida em que retirou credibilidade ao depoimento da (única) testemunha devido ao seu envolvimento pessoal e familiar. Alegam, no entanto, que a testemunha ouvida era a única que tinha conhecimento dos factos, e o tribunal não pode exigir a prova verdadeiramente diabólica de indicação de testemunhas que nada sabem sobre factos. É doutrina que sempre que a parte obre quem recai o ónus da prova fica impossibilitada de fazer essa prova, há lugar a inversão do ónus da prova.
A sentença enferma de um grave erro de julgamento sobre a matéria das provas, já que a prova livre não é sinónimo de prova arbitrária. O Tribunal só está autorizado a julgar segundo as provas.
Interpretar o artº 607, nº 5 do CPC em termos de esta norma permitir ao tribunal julgar contra as provas equivale a dar-lhe uma interpretação normativa inconstitucional, por violação do princípio da confiança legítima, ínsito no princípio do Estado de Direito, previsto no artº 2 da Constituição da República. (Conclusões m) a z).

Afigura-se-nos que os Recorrentes não têm razão.
A questão relativa ao factos não provados Que, recordemos, são os seguintes:
A) Que os montantes de €132.000,00 e €128.000,00 levantados em numerário por J... em 05.06.2013 e 07.06.2013 se destinaram a dar de empréstimo ao Recorrente F...;
B) Que os montantes de €132.000,00 e €128.000,00 levantados em numerário por J... em 05.06.2013 e 07.06.2013 foram utilizados pelo Recorrente F... para pagamentos ao próprio J... durante o ano de 2013 mereceu da parte da MMª juiz uma exaustiva fundamentação e não se baseou, de modo nenhum apenas, no depoimento da testemunha Sr. J..., irmão do Recorrente marido.

Reflectiu sobre a prova documental dizendo que “os documentos bancários trazidos aos autos pelos Recorrentes não evidenciam que tenha sido exatamente este o procedimento seguido, pois, por um lado, o somatório dos depósitos em numerário ocorridos após as datas dos levantamentos não perfazem, sequer em termos aproximados, os montantes levantados por J..., e, por outro, as datas em que os depósitos foram efetuados não são condicentes com a hipótese aventada pelos Recorrentes de terem tais verbas sido utilizados para pagamento do preços dos bens adquiridos.
Ficou também por esclarecer o motivo pelo qual a alegada alteração de procedimento quanto aos depósitos em numerário não foi seguida nas movimentações ocorridas em 20.06.2013, que culminaram com um depósito em numerário de €21.000,00 na conta do Recorrente, importância significativamente superior aos restantes depósitos que o Recorrente vinha fazendo desde o dia 05.06.2013, data em que terá alterado o referido procedimento de depósito. Neste caso, foi precisamente por existir uma correspondência entre datas e montantes levantados e depositados que a autoridade tributária e aduaneira aceitou a importância como sendo relativa a um empréstimo. Ora, tal correspondência não existe no que respeita aos levantamentos de €132.000,00 e €128.000,00 realizados em 05.06.2013 e 07.06.2013, respetivamente.
Quanto ao documento Confissão de dívida n.º 4, note-se que foi apresentado à inspeção tributária apenas em 25.10.2016, enquanto as restantes – que foram aceites por aquela entidade como justificativo da proveniência de parte dos recursos utilizados nas aquisições de património – o foram em data não determinada mas sempre anterior a 05.07.2016, não tendo os Recorrentes apresentada justificação para tal demora na sua apresentação....”
(...)
“Contribui ainda para a convicção do tribunal quanto aos factos não provados a circunstância de os Recorrentes terem afirmado inicialmente, no procedimento de inspeção, que os depósitos em numerário dos montantes de €111.000,00 e €10.000,00, realizados em 04.06.2013, corresponderiam a depósitos parciais do montante de €132.000,00 levantado em numerário por J.... Ora, quando confrontados pela inspeção tributária com a evidência de que tais depósitos não poderiam corresponder ao levantamento efetuado por J..., por serem anteriores a este, vieram os Recorrentes esclarecer que, na realidade de tratava de depósitos de suprimentos provenientes da Academia de Música…, Lda.”

Como vemos, os factos não provados têm suporte na falta de credibilidade dos documentos, mas não só. Também em relação ao depoimento da testemunha a MMª juiz fundamentou de forma clara e exaustiva a razão pela qual o seu depoimento não mereceu credibilidade, referindo-se não só ao “envolvimento pessoal e familiar” da testemunha, bem como ao seu comportamento em audiência, mas também à articulação com o conteúdo da prova testemunhal como podemos ver da reflexão empreendida pela MMª juiz:
“...no decurso da inquirição, foi pedido à testemunha que confirmasse a veracidade dos documentos intitulados Confissões de dívida constantes dos autos, tendo esta, relativamente aos três primeiros documentos apresentados pelos Recorrentes no procedimento de inspeção, confirmado a sua veracidade ainda antes de estes lhe serem exibidos e, relativamente ao documento Confissão de Dívida n.º 4, confirmado prontamente a sua veracidade, sem necessidade de verificar com algum pormenor o teor do documento em causa.
Em suma, tendo presente que a credibilidade do depoimento depende de muitos fatores, que o tribunal aprecia livremente (cfr. artigos 396, do Código Civil e 607, n.º 5, do Código de Processo Civil), sendo a sua consonância com a documentação um dos critérios que pode atestar tal credibilidade, e atendendo a que, no caso dos autos, os documentos bancários carreados pelos Recorrentes são contraditórios com o depoimento da testemunha, entende este tribunal que este depoimento é insuficiente para se dar como demonstrada a origem dos recursos financeiros mobilizados pelos Recorrentes nas suas aquisições patrimoniais.
Por conseguinte, a apreciação conjugada do depoimento da testemunha e do documento particular de confissão de dívida, sem qualquer registo notarial – e, como tal, também este sujeito à livre convicção do julgador –, com a ausência de demonstração dos fluxos financeiros que lhe estão associados, obsta a que se dê como provado que o alegado empréstimo existiu e constituiu a proveniência dos recursos financeiros utilizados para os acréscimos patrimoniais e despesa realizados pelos Recorrentes em 2013.”

Tendo em conta o esforço de fundamentação desenvolvido pela MMª juiz, é completamente redutor dizer-se que a sentença retirou credibilidade ao depoimento da testemunha devido ao seu “envolvimento pessoal e familiar”.
Assim como não se vislumbra qualquer indício de que o tribunal tenha julgado “contra as provas” produzidas (bem pelo contrário).

Falece também por completo o argumento de que quando a parte onerada com a prova de um facto “fica impossibilitada de fazer essa prova, há lugar a inversão do ónus da prova” (Conclusão q).

Isso acontece quando, nos termos do art. 344º/2 do Código Civil, a parte contrária tiver culposamente tornado impossível a prova ao onerado, o que de modo nenhum está alegado nem resulta dos autos.

Ponderando o exposto, resulta evidente que os Recorrentes não têm razão na argumentação expendida nas alíneas m) a z) das doutas Conclusões.

Noutro ângulo de impugnação da liquidação, alegam que a AT não aceita o mutuo confessado de € 260.000,00 não obstante ter sustentação factual em dois levantamentos em numerário de J... de € 132.000,00 (em 5/06/2013) e € 128.000,00 (em 07/06/2013) não fazendo qualquer sentido a posição da AT perante situações em tudo idênticas. (i) Os levantamentos em numerário por parte de J..., (ii) a confissão de dívida e (iii) o aluguer do cofre provam claramente a forma e o tempo do mútuo (a origem do acréscimo patrimonial).

A MMª juiz julgou improcedente esta justificação com a seguinte fundamentação:
“Assim sendo, a questão que a este tribunal cabe solucionar é se parte dos recursos utilizados pelos Recorrentes provêm dos referidos empréstimos e, consequentemente, se a inspeção tributária terá desconsiderado indevidamente a justificação apresentada pelos Recorrentes quanto à proveniência dos recursos, no montante de €260.000,00, utilizados na aquisição de património no decurso do ano de 2013.”
(...)
“Defendem os Recorrentes que, tal como foi aceite pela autoridade tributária que, para pagamento de parte desse preço, foi utilizado dinheiro proveniente de empréstimos no montante total de €180.000,00, também o restante preço foi pago com recurso a dois empréstimos obtidos junto do próprio J..., no montante total de €260.000,00.
Concretizam que J... procedeu ao levantamento em numerário das importâncias parcelares de €132.000,00 e €128.000,00 para, precisamente, as dar imediatamente de empréstimo aos Recorrentes.
Sucede que tais levantamentos ocorreram em 05.06.2013 e 07.06.2013, respectivamente, sendo que, após essas datas, os Recorrentes apenas procederam aos pagamentos parciais de €129.000,00, em 07.06.2013, e €20.174,77, em 20.06.2013 – cfr. ponto 1 do probatório. Acresce ainda que a inspeção tributária aceitou que o pagamento parcial no montante de €20.174,77 foi efetuado com recurso ao empréstimo obtido em 20.06.2013 – cfr. ponto 22 do probatório.
Assim sendo, e porque não podem pretender os Recorrentes justificar o pagamento de valores com empréstimos alegadamente obtidos em datas posteriores, estaria, quando muito, justificado o pagamento parcelar de €129.000,00 ocorrido em 07.06.2013, e nunca o montante de €260.000,00.
No entanto, mesmo relativamente a esses €129.000,00, a posição dos Recorrentes falha por ausência de evidência no que respeita aos fluxos bancários entre o momento do levantamento em numerário da conta do alegado mutuante, o momento do depósito desse numerário na conta do mutuário, e o posterior pagamento por parte deste ao primeiro.
Recorde-se que só poderá estar em causa o pagamento realizado pelo Recorrente em 07.06.2013 – pois os restantes pagamentos são anteriores e o ocorrido em 20.06.2013, no montante de €20.174,77 está justificado por empréstimo que a autoridade tributária aceitou ter ocorrido nesse mesmo dia – para o qual, em termos temporais, poderia ter sido utilizado qualquer dos valores levantados em numerário por J... – €132.000,00 levantados em 05.06.2013, ou €128.000,00, levantados no próprio dia 07.06.2013. No entanto, atendendo a que esse pagamento, tal como todos os restantes, foi efetuado por transferência bancária, seria necessário que ficasse demonstrado que esse mesmo valor foi depositado em conta bancária do Recorrente, da qual se operou a transferência.
Ora, ficou provada a realização de um único depósito em numerário entre os dias 05.06.2013 e 07.06.2013, no montante de €2.325, donde se conclui que mesmo o montante de €129.000,00 não pode ter sido pago com recurso a empréstimo dos valores levantados em numerário por J... em 05.06.2013 ou 07.06.2013.
Os Recorrentes não lograram, portanto, demonstrar a existência de correspondência entre as datas do levantamento efetuado pelo alegado mutuante e os depósitos efetuados pelo mutuário, nem sequer a correspondência entre o montante alegadamente mutuado e o somatório dos depósitos efetuados nas contas do Recorrente.”

No recurso, justificam a entrega deste dinheiro com o facto de terem recebido € 462.759,00 a título de reembolso de suprimentos, valor que lhes permitiu “adiantar” o dinheiro que lhes ia ser emprestado para os pagamentos efetuados nesta data de 04.06.2013 (...) pelo que as entregas em numerário de J... aos recorrentes em 05.06.2013 (€ 132.000,00) e em 07.06.2013 (€ 128.000,00) a título de empréstimo, não abalam minimamente o que os recorrentes defendem.
“Os recorrentes adiantaram o valor (que lhes ia ser emprestado) porque sabiam que J..., procederia à sua devolução de imediato (a título de empréstimo)”

Contudo, em parte alguma da petição inicial os Requerentes alegam ter “adiantado” a J... a quantia de € 260.000,00 = (€ 132.000,00 + € 128.000,00) com recurso ao valor do reembolso dos suprimentos alegadamente recebidos na sua conta em 4/6/2013.
Por isso, a sentença não se debruçou sobre tal matéria.

Esta alegação constitui assim, matéria nova. Contudo, visando o recurso a reapreciação da decisão de tribunal de grau hierárquico inferior, apenas pode ter por objecto questões decididas pelo tribunal recorrido, não podendo conhecer-se de questões novas suscitadas nas alegações, salvo se forem de conhecimento oficioso, o que ora não sucede.

Os recursos são específicos meios de impugnação de decisões judiciais, que visam modificar as decisões recorridas, e não criar decisões sobre matéria nova. Por isso, e em princípio, não se pode neles tratar de questões que não tenham sido apreciadas pela decisão impugnada, salvo questões novas de conhecimento oficioso e não decididas com trânsito em julgado – cf. Acórdão do STA de 13/11/2013, proferido no rec. nº 01460/13.

Assim, configurando-se a questão do “adiantamento” do dinheiro pelos ora Recorrentes a J... com base em reembolso de suprimentos recebidos como questão nova, suscitada apenas no âmbito do presente recurso, está vedado a este Tribunal a sua apreciação.

Defendem ainda os Recorrentes não haver lugar à avaliação indireta pois o rendimento dos requerentes é manifestamente superior ao do rendimento padrão, assim:
Valor por justificar: € 313.303,65.
Rendimento padrão: € 62.660,73.
Rendimento declarado: € 95.517,91,
Pelo que não há lugar a aplicação dos métodos indiretos.

E também não se aplica a alínea f) do n.º 1 do art.º 87 da LGT, pois esta apenas se aplica a todas as situações nele previstas e não enquadráveis na alínea d).
“Não caso não se aplica a alínea d) do nº 1 do artº 87º da LGT por não se verificarem os pressupostos (rendimento declarado superior ao rendimento padrão), sendo que não cabe aplicação subsidiária (porque não está previsto na lei) da alínea f) nº 1 do artº 87º da LGT.

Isto é, a lei não diz que no caso de não estarem preenchidos os pressupostos da alínea d) do artº 87º da LGT, então socorra-se a AT da alínea f) do n. 1 artº 87º da LGT” (Conclusões ww e xx).

A MMª juiz decidiu assim a questão:
“Acerca desta invocada causa de ilegalidade do acto recorrido, importa distinguir os dois tipos abstratos de situações que a lei reconduz à figura de manifestações de fortuna.
Por um lado, a que resulta do disposto no artigo 87, n.º 1 al. d), da Lei Geral Tributária, que estatui a possibilidade de avaliação indireta quando os rendimentos declarados em sede de IRS se afastarem significativamente, para menos, sem razão justificada, dos padrões de rendimento que razoavelmente possam permitir as manifestações de fortuna evidenciadas pelo sujeito passivo, nos termos do artigo 89-A, da Lei Geral Tributária.
Por outro lado, aquela que resulta do artigo 87, n.º 1, al. f), da Lei Geral Tributária, segundo a qual é possível recorrer à avaliação indireta, quando haja um acréscimo de património ou despesa efetuada, incluindo liberalidades, de valor superior a €100.000,00, verificados simultaneamente com a falta de declaração de rendimentos ou com a existência, no mesmo período de tributação, de uma divergência não justificada com os rendimentos declarados.
Atentando nas alíneas d) e f) supracitadas, verifica-se que estão previstas duas situações de recurso à avaliação indireta quando se verifique que a capacidade declarada difere da capacidade manifestada, sendo que qualquer uma delas encontra desenvolvimento no artigo 89-A, da Lei Geral Tributária, que define com detalhe os seus requisitos e pressupostos, para além das próprias garantias dos contribuintes.
A situação prevista no artigo 87, n.º 1, alínea f) abrange uma realidade enquadrável num conceito amplo de manifestações de fortuna e designada por acréscimo ou incremento patrimonial não justificado, definido em concreto por comparação com o rendimento declarado, sendo precisamente esta a situação dos autos.
Acresce que, de acordo com o disposto no art.º 87, n.º 2, da Lei Geral Tributária, no caso de verificação simultânea dos pressupostos de aplicação da alínea d) e da alínea f) do n.º 1 do citado preceito, a avaliação indireta deve ser efetuada nos termos dos ns 3 e 5, do artigo 89-A, da Lei Geral Tributária.
Assim sendo, mediante a constatação de um acréscimo de património ou despesa efetuada de valor superior a €100 000,00, verificados simultaneamente com a existência, no mesmo período de tributação, de uma divergência não justificada com os rendimentos declarados, nada obstava a que a avaliação indireta fosse efetuada, como foi, sob a égide da referida alínea f).
Neste sentido, veja-se o acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 26.03.2015, proferido no processo n.º 00955/13.5BEAVR,
(...)
Conclui-se, assim, que o eventual preenchimento da previsão da norma contida no artigo 87, n.º 1, alínea d), não afasta a aplicação da norma contida na alínea f), do mesmo artigo, desde que, como foi o caso dos actos, fique demonstrado o preenchimento dos requisitos nele previstos e, como também foi o caso, sejam respeitadas as disposições relevantes contidas no artigo 89-A, da Lei Geral Tributária.
Pelo exposto, também neste segmento, o presente recurso terá de improceder”.

A MMª juiz decidiu bem. A tese dos Recorrentes desvia a questão para a convocação de uma norma (alínea d) do n.º 1 art. 87º LGT) que não foi aplicada na tributação. Nem tinha que ser.

De acordo com a mencionada alínea d), a avaliação indireta pode efetuar-se em caso de os rendimentos em sede de IRS se afastarem significativamente para menos, sem razão justificada, dos padrões de rendimento que razoavelmente possam permitir as manifestações de fortuna evidenciadas pelo sujeito passivo nos termos do art.º 89º-A, remetendo assim, para a tabela incluída no n.º 4 onde consta como manifestação de fortuna, entre outros, “Imóveis de valor de aquisição igual ou superior a € 250.000,00” e o rendimento padrão correspondente a 20% do valor de aquisição.

Todavia, embora os bens de maior valor que constituem o acréscimo patrimonial pertençam à categoria imóveis, e a sua “aquisição” seja de valor superior a € 250.000,00, a verdade é que os restantes acréscimos não incidiram sobre bens imóveis. E o que é objecto de tributação é o acréscimo patrimonial, ou despesa, superior aos limites legais, com uma divergência não justificada com os rendimentos declarados.

Como o valor do acréscimo patrimonial considerado não engloba só bens imóveis, a tributação deverá ser efetuada com base na alínea f) do n.º 1 do art. 87 LGT, como foi.

Todavia, como bem decidiu a MMª juiz, “...o eventual preenchimento da previsão da norma contida no artigo 87, n.º 1, alínea d), não afasta a aplicação da norma contida na alínea f), do mesmo artigo, desde que, como foi o caso dos actos, fique demonstrado o preenchimento dos requisitos nele previstos e, como também foi o caso, sejam respeitadas as disposições relevantes contidas no artigo 89-A, da Lei Geral Tributária.”


Finalmente, a questão defendida pelos Recorrentes nos termos da qual
aaa) No caso nunca se aplicaria (mesmo que se verificasse que o fundamento
da avaliação indirecta se encontrava simultaneamente na alínea d) e na alínea f)
do nº 1 do artº 87º), pois quando se trata de imóveis, aplica-se sempre o nº 4
do artº 89º-A da LGT

bbb) que os pressupostos da alínea d) do nº 1 do artº 87º da LGT, quanto a imóveis só estão preenchidos, quando estes ultrapassam € 250.000,00, ou seja, o valor de base já é superior ao valor de € 100.000,00 (que baliza o perímetro da alínea f) do nº 1 do art.º 87º).
ccc) Se aceitássemos, nestes casos, a prevalência da avaliação indireta pela alínea f), tal significaria que, em caso algum, quanto aos imóveis, se aplicaria o rendimento padrão.
ddd) Ou seja, o nº 4 do artº 89º-A seria letra completamente morta, no que se refere a aquisição de imóveis.

A tese defendida pelos Recorrentes não tem, neste caso particular, qualquer pertinência. A tributação foi efetuada com base na alínea f) do n.º 1 do art. 87º LGT e não com base na alínea d) do n.º 1 do mesmo preceito. A questão colocar-se-ia se o acréscimo patrimonial fosse constituído apenas por bens imóveis, mas não sendo esse o caso, a discussão é meramente académica e sem qualquer relevo para os presentes autos Em todo o caso, a discussão não é nova e foi já decidida várias vezes pelo STA, e até pelo Pleno da CT no Ac. n.º 0872/14 12-11-2014 Relator: CASIMIRO GONÇALVES com esclarecedor voto de vencido do Sr. Conselheiro Francisco Rothes.
Fazendo eco das dúvidas suscitadas pelos Recorrentes, cfr. a anotação de José Maria Fernandes e outros, in "Lei Geral Tributária" anotada, Almedina, 2015, pp. 906.

Assim, improcedendo todas as conclusões, a sentença deverá ser integralmente confirmada.

V DECISÃO.

Termos em que acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso Tributário deste TCAN em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas pelos Recorrentes.
Porto, 10 de maio de 2018.
Ass. Mário Rebelo
Ass. Cristina da Nova
Ass. Bárbara Tavares Teles