Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00612/13.2BECBR
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:03/27/2014
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:Pedro Nuno Pinto Vergueiro
Descritores:INCOMPETÊNCIA EM RAZÃO DA HIERARQUIA. RECLAMAÇÃO DE DECISÃO DO OEF.
PRESCRIÇÃO. SUSPENSÃO DE PRAZO.
Sumário:I) Nos termos do art. 280º nº 1 do C.P.P.T., das decisões dos Tribunais Tributários de 1.ª Instância cabe recurso a interpor, em primeira linha, para os Tribunais Centrais Administrativos, salvo quando a matéria for exclusivamente de direito, caso em que tal recurso tem de ser interposto para a Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, sendo que, no caso presente, as conclusões 2ª, 3ª, 4ª, 9ª e 10ª envolvem a consideração de elementos de facto que obstam à conclusão de que a apreciação e decisão do recurso passa, em exclusivo, pelo tratamento de conceitos jurídicos, de matéria jurídica ou de direito.
II) Das normas contidas nos artigos 169º nº 1 do CPPT e 49º nº 3 da LGT decorre que a execução fica suspensa até à decisão do pleito em caso de impugnação judicial que tenha por objecto a legalidade da dívida exequenda “desde que tenha sido constituída garantia nos termos do artigo 195.º ou prestada nos termos do artigo 199.º ou a penhora garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido” e que o “prazo de prescrição legal suspende-se por motivo de paragem do processo de execução fiscal em virtude de (…) impugnação ou recurso”.
III) Além disso, a suspensão da execução nos termos do artigo 169.º, nº 1 do CPPT opera-se, ope legis, por força da prestação de garantia ou efectivação da penhora que garante a totalidade da quantia exequenda e acrescido, desde que sejam utilizados os meios processuais de discussão da legalidade da dívida exequenda ali elencados.
IV) Tal significa que, uma vez constituída ou prestada garantia ou realizada penhora de bens suficientes para garantia do pagamento da dívida e acrescido, aliada à pendência de processo de impugnação judicial, fica legalmente suspensa a execução fiscal até à decisão do pleito, e esta suspensão determina, por sua vez, a suspensão do próprio prazo de prescrição que esteja em curso ou daquele que houvesse de reiniciar-se por virtude da cessação de algum efeito interruptivo da prescrição.
V) A redacção dada ao art. 49.º da LGT pela Lei n.º Lei 53-A/2006, de 29 de Dezembro, ao estabelecer no novo n.º 4 que “o prazo de prescrição legal suspende-se em virtude de pagamento de prestações legalmente autorizadas, ou enquanto não houver decisão definitiva ou passada em julgado, que puser termo ao processo, nos casos de reclamação, impugnação, recurso ou oposição, quando determinem a suspensão da cobrança da dívida, apenas é inovador na parte em que atribui efeito de suspensão da prescrição à pendência de qualquer oposição, mesmo que não tenha por objecto a legalidade da liquidação da dívida exequenda.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:A..., Lda.
Recorrido 1:Fazenda Pública
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
1. RELATÓRIO
A..., Lda., N.I.F. 5…, com sede na Avenida…, 3080-008 Cabo Mondego, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, datada de 09-12-2013, que julgou improcedente a pretensão pela mesma deduzida na presente instância de RECLAMAÇÃO relacionada com o despacho proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças da Figueira da Foz - 2 que não reconheceu a prescrição dos tributos de IVA do ano de 2001, por si invocada

Formulou nas respectivas alegações (cfr. fls. 217-222), as seguintes conclusões que se reproduzem:
“ (…)
1º - A senhora juiz “a quo” não conheceu da prescrição do direito á cobrança do tributo de IVA do ano de 2001, pela AT.
2° - A douta decisão conclui que tinha decorrido apenas o tempo de cerca de 4 anos e alguns meses.
3° - Para o ano de 2001 do IVA considerou a senhora o juiz “a quo’ que logo que cessou o efeito interruptivo derivado da impugnação judicial - 10.02.2006, o prazo prescricional ficou suspenso até ao trânsito em julgado da tal processo, que correu em 27.10.2011, não se verificando o decurso do prazo legal de prescrição.
4° - Salvo o respeito por melhor opinião, parece, não assistir razão á senhora juiz, porquanto o artigo 169° do CPPT suspende a execução fiscal, não o prazo prescricional, sendo factos jurídicos distintos.
5° - O artigo 91° da Lei 53-A/2006 que determinou que “a revogação do n°2 do artigo 49° da LGT aplica-se a todos os prazos de prescrição em curso, objecto de interrupção, em que ainda não tenha decorrido o período superior a um ano de paragem do processo não imputável ao sujeito passivo”
6° - Para o senhor juiz “a quo” o processo de impugnação ao ser autuado no TAF, por entrada, parece ser uma causa interruptiva e ao realizar-se a penhora no âmbito da execução, opera-se a suspensão.
7° - A partir do ano da entrada em vigor da lei 53-A/2006, que revogou o numero 2 do art° 49° da LGT, e deu nova redacção aquele normativo, os tributos não prescrevam pelo soma de prazo decorrido anteriormente á interrupção e se mantenham suspensos enquanto não houver decisão judicial com transito
8° - Mas, em relação aos processos em curso com a entrada em vigor desta lei esta só se aplicaria se não tiver decorrido o período superior a um ano de paragem do processo por facto não imputável ao sujeito passivo, sendo que a nova redacção, designadamente o numero 4 do artigo 49° da LGT é inaplicável aos processos em anteriores á entrada em vigor da Lei que alterou este normativo, Lei 53-A/2006 de 29/12.
9º - Os autos de impugnação entraram em juízo a 07/02/2005 e a lei 53-A data de 29/12/2006
10° - Dos factos provados da referida decisão resulta na (pág. 4, ponto 7) que o processo de impugnação identificado na alínea antecedente (95/05.0BECBR) esteve parado entre 10.02.2005 e 30.05.2006,
11º - Nos termos do artigo 49°/2 da LGT a paragem do processo por um período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar o efeito previsto no número anterior, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até á data da autuação.
12° - O tempo decorrido desde 2001 (o Iva é um tributo que deve ser pago no mês seguinte ao da retenção) já ultrapassou os 8 anos prazo prescricional nos termos do artigo 48/1 da LGT ex vi do artigo 49°/2 da LGT (redacção anterior a 2006)
13° - Isto porque a nova redacção do artigo 49° da LGT, designadamente o numero 4 é inaplicável in casu.
Termos em que, nos melhores de direito e com o sempre muito douto suprimento de Vossas Excelências, deve ser concedido provimento, revogando-se a decisão recorrida devendo ser substituída por outra que conheça da prescrição dos direitos á cobrança dois tributos de IVA do ano de 2001.”

A recorrida Fazenda Pública não apresentou contra-alegações.

O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu o parecer de fls. 248 a 253 dos autos, suscitando a questão da incompetência em razão da hierarquia deste Tribunal para conhecer do recurso [ou, caso assim não seja entendido, deverá ser negado provimento ao presente recurso].

Notificadas as partes para se pronunciarem, nada disseram.

Sem vistos, por se tratar de processo classificado de urgente, vem o processo à Conferência para julgamento.


2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que a questão suscitada resume-se, em suma, em saber se a dívida relacionada com liquidações de IVA de 2001 se encontra ou não prescrita, sendo que previamente à matéria apontada importa apreciar da excepção suscitada nos autos a fls. 248-253.
3. FUNDAMENTOS
3.1. DE FACTO
Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:
“…
1. Em 16.03.2004 a ora Reclamante, A..., Lda., deduziu reclamação graciosa contra a liquidação adicional de IVA n.º 03361268, no valor de €25.498,88, referente ao período de 2001, e liquidações de Juros Compensatórios referentes aos meses de Janeiro a Novembro de 2001, no valor total de €3.566,83 (valor global de €29.065,71), ora em cobrança coerciva no processo de execução fiscal n.º 3824200401009222:
[Cfr. Procedimento de Reclamação Graciosa n.º 3824-04/400021.8, ora em apenso]
2. O referido processo de reclamação graciosa esteve parado entre 08.04.2004 e 04.05.2006, por razões não imputáveis à ora Reclamante;
[Cfr. Procedimento de Reclamação Graciosa n.º 3824-04/400021.8, ora em apenso]
3. Em 13.05.2004 foi instaurada contra a ora Reclamante, no Serviço de Finanças da Figueira da Foz-2, a presente execução fiscal n.º 3824200401009222, para cobrança coerciva de dívida de I.V.A. do ano de 2001 e respectivos juros compensatórios, respeitantes a todos os meses do ano de 2001, no valor global de €32.902,41;
[Cfr. fls. 1 a 15 e 86-88 dos autos – capa do referido processo de execução, certidões de dívida n.º 2004/82878, 2004/82879, 2004/82880, 2004/82881, 2004/82882, 2004/82883, 2004/82884, 2004/82885, 2004/82886, 2004/82887, 2004/82888, 2004/82889, 2004/82890 e 2004/82891, citação com identificação da dívida em cobrança coerciva]
4. Em 20.05.2004 a ora Reclamante procedeu ao pagamento das dívidas de IVA de 2001 e Juros referentes às certidões de dívida n.º 2004/82890 e 2004/82891, mantendo-se em divida os valores respeitantes às liquidações identificadas no ponto 1.;
[Cfr. fls. 14/15 e 103 dos autos]
5. Em 25.05.2004 a ora Reclamante foi citada por correio registado com aviso de recepção no processo executivo referido no n.º anterior;
[Cfr. AR a fls. 16 dos autos]
6. Em 07.02.2005 a ora Reclamante deduziu impugnação judicial dos actos de liquidação referidos no ponto 1., a qual foi autuado no presente Tribunal sob o n.º 95/05.0BECBR;
[Cfr. Fls. 2/3 do Processo de Impugnação n.º 95/05.0BECBR, ora em apenso]
7. A Impugnação Judicial referida no ponto anterior apenas esteve parada por período superior a um ano, por razões não imputáveis à ora Reclamante, entre 10.02.2005 e 30.05.2006 e entre 18.09.2009 e 28.01.2011;
[Cfr. Processo de Impugnação n.º 95/05.0BECBR, ora em apenso]
8. A decisão final proferida na visada Impugnação Judicial transitou em 27.10.2011;
[Cfr. fls. 147 do Processo de Impugnação n.º 95/05.0BECBR, ora em apenso]
9. Em 06.07.2005 foi emitido mandado de penhora e em 28.09.2005 foi penhorado no presente processo de Execução Fiscal o estabelecimento comercial da ora Reclamante, ao qual foi atribuído o valor global de €900.000,00;
[Cfr. fls. 17-22 dos presentes autos]
10. Entre 25.05.2004, data da citação da ora Reclamante no presente PEF e 06.07.2005, data em que foi aí emitido mandado de penhora, estiveram os autos executivos parados, por razões não imputáveis à Reclamante;
[Cfr. fls. 16-17 dos presentes autos]
11. Em 16.01.2007 foi o processo de execução fiscal suspenso por associação de garantia;
[Cfr. fls. 105 dos presentes autos]
12. Em 08.01.2013 a ora Reclamante arguiu junto do órgão de execução fiscal a prescrição da dívida exequenda;
[Cfr. fls. 130 dos presentes autos]
13. Em 05.07.2013 o Chefe do Serviço de Finanças da Figueira da Foz-2 proferiu despacho considerando não verificada a invocada prescrição;
[Cfr. fls. 133/134 dos autos]
14. Em 09.07.2013 foi recebido pelo mandatário da ora Reclamante ofício do Serviço de Finanças da Figueira da Foz-2, dando-lhe conhecimento do despacho referido no n.º anterior;
[Cfr. data e assinatura apostas no aviso de recepção a fls. 147 e ofício n.º 1825 a fls. 146 dos autos]
15. A presente reclamação foi enviada para o Serviço de Finanças de Lisboa-8, por correio electrónico, em 04.092013.
[Cfr. fls. 150 e ss. dos autos]
*
A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame do processo executivo em que a presente reclamação foi deduzida, bem como por consulta ao processo de impugnação n.º 95/05.0BEBCR que correu termos no presente Tribunal, ora em apenso, e ao procedimento de reclamação graciosa n.º 3824-04/400021.8, também em apenso, tudo conforme o que se deixou plasmado a propósito de cada um dos factos assentes.

Factos não provados:
Não há factos alegados que devam considerar-se como não provados e a considerar com interesse para a decisão do recurso.
«»
3.2. DE DIREITO
Assente a factualidade apurada cumpre, então, antes de mais, entrar na análise da excepção suscitada.
A competência dos tribunais administrativos, em qualquer das suas espécies, é de ordem pública e o seu conhecimento precede o de outra matéria - art. 13º do C. P. T.A., aplicável “ex vi” art. 2º, al. c), do C. P. P. Tributário.
Significa isto que é um pressuposto de conhecimento oficioso, quer se trate de incompetência absoluta (em razão da matéria ou da categoria do tribunal) quer se trate de incompetência relativa (em razão do território) e que o seu conhecimento tem prioridade sobre qualquer outro assunto.
A incompetência em razão da hierarquia determina a incompetência absoluta do tribunal, a qual é do conhecimento oficioso e pode ser arguida até ao trânsito em julgado da decisão final ( cfr. art. 16º do C.P.P. Tributário ).
Ora, nos termos do art. 280º nº 1 do C.P.P.T., das decisões dos Tribunais Tributários de 1.ª Instância cabe recurso a interpor, em primeira linha, para os Tribunais Centrais Administrativos, salvo quando a matéria for exclusivamente de direito, caso em que tal recurso tem de ser interposto para a Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo.
Deste modo, para aferir da competência, em razão da hierarquia, do STA, há que olhar para as conclusões da alegação do recurso e verificar se, perante elas, as questões controvertidas se resolvem mediante uma exclusiva actividade de aplicação e interpretação de normas jurídicas, ou se, pelo contrário, implicam a necessidade de dirimir questões de facto - seja porque o recorrente defende que os factos levados ao probatório não estão provados, seja porque diverge das ilações de facto que deles se devam retirar, seja porque invoca factos que não vêm dados como provados e que não são, em abstracto, indiferentes para o julgamento da causa.
Confrontando a matéria tratada na decisão recorrida com a matéria vertida nas conclusões, as conclusões 2ª, 3ª, 4ª, 9ª e 10ª envolve a consideração de elementos de facto que obstam à conclusão de que a apreciação e decisão do recurso passa, em exclusivo, pelo tratamento de conceitos jurídicos, de matéria jurídica ou de direito, de modo que, é manifesto que não procede a matéria de excepção invocada pelo Exmo. Magistrado do Ministério Público.
Pelo que somos levados a concluir, sempre com o devido respeito por contrária opinião, que o presente recurso não tem por exclusivo fundamento matéria de direito, mas, também, matéria de facto, sendo, por isso, competente para o seu conhecimento esta Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte.

A partir daqui, cumpre, então, entrar na análise da realidade em equação nos autos e que se prende com apreciação da bondade da decisão recorrida que confirmou a posição assumida pelo órgão da execução fiscal no sentido de não reconhecer a invocada prescrição no que diz respeito à dívida exequenda relativa a IVA do ano de 2001.

Para o efeito, ponderou-se na decisão posta em crise o seguinte:
“…
Apreciando.
Aplicando os citados normativos aos factos, a primeira conclusão a que chegamos é que o prazo de prescrição da divida exequenda é de oito anos (cfr. art.º 48.º, n.º1 da LGT).
A segunda conclusão é que tal prazo se iniciou em 01.01.2002, de acordo com o previsto no artigo 48.º, n.º1 da LGT, na redacção introduzida pela Lei n.º 55-B/2004, de 30.12. …
Como decorre do disposto no artigo 326.º, n.º1 do Código Civil a “interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do acto interruptivo”. É o chamado efeito instantâneo do facto interruptivo.
Mas atendendo ao disposto no artigo 49.º, n.º3 da LGT, igualmente na redacção anterior à Lei n.º 53-A/2006, de 29.12, há que ter ainda em conta o chamado efeito duradouro – o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto o processo de execução fiscal estiver parado “em virtude de pagamento de prestações legalmente autorizadas, ou de reclamação, impugnação ou recurso.”. Mas tal efeito pode deixar de se verificar se o processo estiver parado por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo, caso em que se soma o tempo que decorrer após esse período de um ano ao que tiver decorrido até à data da autuação – é o que dispunha o n.º 2 do artigo 49.º da LGT.
Vejamos mais concretamente.
Quanto às causas de interrupção do prazo de prescrição, verifica-se em primeiro lugar a interrupção decorrente da apresentação de reclamação graciosa, quando tinham decorrido já 2 anos, 2 meses e 15 dias desde o seu início (01.01.2002 a 16.03.2004 – cfr. facto provado sob o ponto 1.).
No entanto, em 25.05.2004, quando tinham decorridos 70 dias desde o inicio da nova contagem do prazo de prescrição (contados desde o momento da apresentação da reclamação graciosa), ocorreu a citação da ora Reclamante no processo executivo (cfr. facto provado sob o ponto n.º 5).
Tal facto tem a virtualidade de interromper novamente o prazo de prescrição.
E em 09.02.2005 deu-se nova causa interruptiva daquele prazo, com a dedução de impugnação judicial, quando tinham agora decorrido 8 meses e 15 dias desde que o prazo de prescrição se havia reiniciado novamente (cfr. facto provado sob o ponto 6.).
De facto, até 01.01.2007, data em que entrou em vigor a Lei n.º 53-A/2006, de 29.12, «qualquer das causas de interrupção da prescrição tinha, por si própria, os efeitos de eliminar todo o tempo anteriormente decorrido e obstar ao decurso da prescrição enquanto estivesse pendente o processo em que ela se tinha produzido.
Por isso, mesmo que, quando ocorreu a segunda causa de interrupção da prescrição, o período anterior à primeira estivesse eliminado e não tivesse decorrido qualquer período para a prescrição, por o processo que determinou a primeira interrupção estar pendente e não ter parado por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte, a segunda causa de interrupção mantém a sua própria potencialidade para produzir os mesmos efeitos em relação ao período anterior (eliminação) e durante o seu próprio processo (obstando ao decurso do prazo).»2.
Ora, sucede que todos os factos/processos que interromperam o prazo de prescrição vieram a parar por um período superior a um ano, por razões não imputáveis à ora Reclamante, em datas anteriores a 01.01.2007:
- A Reclamação Graciosa esteve parada entre 08.04.2004 e 04.05.2006 (cfr. facto provado sob o ponto 2.);
- O processo executivo esteve parado entre 25.05.2004, data da citação da ora Reclamante, e 06.07.2005, data em que foi emitido mandado de penhora (cfr. facto provado sob o ponto 10.) e,
- A Impugnação Judicial esteve parada entre 10.02.2005 e 30.05.2006 (cfr. facto provado sob o ponto 7.).
Assim, como bem refere a Reclamante, não é possível aplicar a nova redacção do artigo 49.º da LGT, decorrente da Lei n.º 53-A/2006, porquanto havia(m) já decorrido o(s) período(s) superior(es) a um ano de paragem de processo, à data da entrada em vigor daquela Lei.
Nestes casos, «…o período de prescrição é calculado tomando como ponto de partida o momento inicial do prazo de prescrição e subtraindo os dois [neste caso três] períodos em que os processos tiveram efeito suspensivo, dando relevância apenas a um dos factos, na parte em que os efeitos suspensivos se sobrepuserem.»3.
Assim, o prazo de prescrição iniciou-se em 01.01.2002 e conta-se até dia 16.03.2004 (data da apresentação da reclamação graciosa, conforme facto provado sob o ponto 1.), somando-se o decorrido depois a partir de dia 10.02.2006 (o decorrido após um ano de paragem do processo de Impugnação, que ocorreu mais tarde).
Tanto bastaria dizer para que a presente Reclamação fosse julgada procedente.
Simplesmente, há um facto que tudo altera: a penhora efectuada no processo executivo fiscal, em valor suficiente para garantir o pagamento da dívida exequenda e acrescido (cfr. factos provados sob os pontos 3. e 9.). …
Ou seja, pese embora o órgão de execução fiscal apenas tenha suspendido formalmente o processo de execução fiscal em 16.01.2007, por associação de garantia, decorrente da penhora efectivada cerca de 18 meses antes (cfr. facto provado sob o ponto 11.), tal efeito decorre ope legis.
Assim, logo que cessou o efeito interruptivo derivado da impugnação judicial - 10.02.2006 (considerando que esteve parada entre 10.02.2005 e 30.05.2006, por facto não imputável à Executada - cfr. facto provado sob o ponto 7.), o prazo de prescrição ficou suspenso até ao trânsito em julgado de tal processo, que ocorreu em 27.10.2011 (cfr. facto provado sob o ponto 8.), pelo que é evidente que não se verificou o decurso do prazo legal de prescrição (somando-se 2 anos, 2 meses e 15 dias decorridos até à primeira causa interruptiva, aos pouco mais de 2 anos decorridos desde o dia 27.10.2011 até aos dias de hoje).
Assim sendo, nenhuma ilegalidade se descortina no despacho reclamando, o que determina a improcedência da presente reclamação. …”.

Nas suas alegações, a Recorrente aponta que para o ano de 2001 do IVA considerou a senhora o juiz “a quo’ que logo que cessou o efeito interruptivo derivado da impugnação judicial - 10.02.2006, o prazo prescricional ficou suspenso até ao trânsito em julgado da tal processo, que correu em 27.10.2011, não se verificando o decurso do prazo legal de prescrição, quando o artigo 169° do CPPT suspende a execução fiscal, não o prazo prescricional, sendo factos jurídicos distintos, sendo que o artigo 91° da Lei 53-A/2006 que determinou que “a revogação do n°2 do artigo 49° da LGT aplica-se a todos os prazos de prescrição em curso, objecto de interrupção, em que ainda não tenha decorrido o período superior a um ano de paragem do processo não imputável ao sujeito passivo”
Para o senhor juiz “a quo” o processo de impugnação ao ser autuado no TAF, por entrada, parece ser uma causa interruptiva e ao realizar-se a penhora no âmbito da execução, opera-se a suspensão, verificando-se que a partir do ano da entrada em vigor da lei 53-A/2006, que revogou o numero 2 do art. 49° da LGT, e deu nova redacção aquele normativo, os tributos não prescrevam pelo soma de prazo decorrido anteriormente á interrupção e se mantenham suspensos enquanto não houver decisão judicial com transito, mas, em relação aos processos em curso com a entrada em vigor desta lei esta só se aplicaria se não tiver decorrido o período superior a um ano de paragem do processo por facto não imputável ao sujeito passivo, sendo que a nova redacção, designadamente o numero 4 do artigo 49° da LGT é inaplicável aos processos em anteriores á entrada em vigor da Lei que alterou este normativo, Lei 53-A/2006 de 29/12.
Ora, os autos de impugnação entraram em juízo a 07/02/2005 e a lei 53-A data de 29/12/2006 e dos factos provados da referida decisão resulta na (pág. 4, ponto 7) que o processo de impugnação identificado na alínea antecedente (95/05.0BECBR) esteve parado entre 10.02.2005 e 30.05.2006.
Nos termos do artigo 49°/2 da LGT a paragem do processo por um período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar o efeito previsto no número anterior, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até á data da autuação, de modo que, o tempo decorrido desde 2001 (o Iva é um tributo que deve ser pago no mês seguinte ao da retenção) já ultrapassou os 8 anos prazo prescricional nos termos do artigo 48/1 da LGT ex vi do artigo 49°/2 da LGT (redacção anterior a 2006) e isto porque a nova redacção do artigo 49° da LGT, designadamente o numero 4 é inaplicável in casu.

Que dizer?
Desde logo, é sabido que com a entrada em vigor da Lei Geral Tributária (LGT), em 1 de Janeiro de 1999, a matéria da prescrição passou a estar regulada na LGT, sofrendo um encurtamento para oito anos (art. 48.º).
No caso presente, estando em causa IVA de 2001, nenhuma dificuldade se coloca na afirmação de que o prazo de prescrição da divida exequenda é de oito anos (cfr. art.º 48.º, n.º1 da LGT) e ainda que tal prazo se iniciou em 01.01.2002, de acordo com o previsto no artigo 48.º, n.º1 da LGT, na redacção introduzida pela Lei n.º 55-B/2004, de 30.12.
Antes de avançar, importa notar que as causas de interrupção ou suspensão da prescrição atendíveis para o cômputo em concreto do prazo de prescrição são as previstas na lei vigente à data da respectiva ocorrência, em conformidade com o disposto no nº 2 do artigo 12º do Código Civil, e não, as previstas na lei cujo prazo for aplicável, independentemente do momento em que tais factos se tenham efectivamente verificado.
Neste domínio, a decisão recorrida ponderou depois que a apresentação da aludida reclamação graciosa em 16-03-2004 produziu a interrupção do prazo de prescrição, sendo que a citação da ora Reclamante no âmbito do processo de execução fiscal ocorrida em 25-05-2004 (embora constitua uma nova causa de interrupção), não tem qualquer relevo nesta sede, uma vez que o prazo em apreço estava já interrompido.
Do mesmo modo, a apresentação da impugnação judicial em 09.02.2005 emerge como nova causa interruptiva daquele prazo, mas em momento em que o prazo em causa estava já interrompido.
Ora, como refere a decisão recorrida, todos os processos descritos vieram a parar por um período superior a um ano, por razões não imputáveis à ora Reclamante, em datas anteriores a 01.01.2007:
- A Reclamação Graciosa esteve parada entre 08.04.2004 e 04.05.2006 (cfr. facto provado sob o ponto 2.);
- O processo executivo esteve parado entre 25.05.2004, data da citação da ora Reclamante, e 06.07.2005, data em que foi emitido mandado de penhora (cfr. facto provado sob o ponto 10.) e,
- A Impugnação Judicial esteve parada entre 10.02.2005 e 30.05.2006 (cfr. facto provado sob o ponto 7.).

Pois bem, é sabido que as causas de interrupção da prescrição que ocorreram antes da alteração ao nº 3 do art. 49º da LGT, introduzida pela Lei 53-A/2006, ou seja, antes de 01.01.2007, produzem os efeitos que a lei vigente no momento em que elas ocorreram associava à sua ocorrência: eliminam o período de tempo anterior à sua ocorrência e obstam ao decurso do prazo de prescrição, enquanto o respectivo processo estiver pendente ou não estiver parado por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte, sendo que ocorrendo sucessivas causas de interrupção da prescrição, antes da entrada em vigor da referida redacção do nº 3 do art. 49º da LGT, devem todos elas se consideradas autonomamente, para efeitos de contagem do respectivo prazo, desde que susceptíveis de influir no seu decurso (neste sentido, Ac. S.T.A. de 05-06-2013, Proc. nº 0903/13, www.dgsi.pt).
Nestas condições, tem plena pertinência a afirmação da sentença recorrida de que o prazo de prescrição iniciou-se em 01.01.2002 e conta-se até dia 16.03.2004 (data da apresentação da reclamação graciosa, conforme facto provado sob o ponto 1.), somando-se o decorrido depois a partir de dia 10.02.2006 (o decorrido após um ano de paragem do processo de Impugnação, que ocorreu mais tarde).
No entanto, e aqui é que reside a grande questão suscitada nos autos, a decisão recorrida ponderou depois a penhora efectuada no processo executivo fiscal, em valor suficiente para garantir o pagamento da dívida exequenda e acrescido (cfr. factos provados sob os pontos 3. e 9.).

Neste domínio, cumpre notar que das normas contidas nos artigos 169º nº 1 do CPPT e 49º nº 3 da LGT decorre que a execução fica suspensa até à decisão do pleito em caso de impugnação judicial que tenha por objecto a legalidade da dívida exequenda “desde que tenha sido constituída garantia nos termos do artigo 195.º ou prestada nos termos do artigo 199.º ou a penhora garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido” e que o “prazo de prescrição legal suspende-se por motivo de paragem do processo de execução fiscal em virtude de (…) impugnação ou recurso”.
Além disso, tal como refere a decisão recorrida, a suspensão da execução nos termos do artigo 169.º, nº 1 do CPPT opera-se, ope legis, por força da prestação de garantia ou efectivação da penhora que garante a totalidade da quantia exequenda e acrescido, desde que sejam utilizados os meios processuais de discussão da legalidade da dívida exequenda ali elencados (neste sentido, Ac. do S.T.A. de 19-12-2012, Proc. nº 01372/12, www.dgsi.pt).
Trata-se, pois, de acto predominantemente processual em que o órgão de execução fiscal actua no âmbito do processo executivo, vinculado a um quadro normativo que regula o legal andamento do processo, e sujeito a estritas regras e princípios processuais.

Tal significa que, uma vez constituída ou prestada garantia ou realizada penhora de bens suficientes para garantia do pagamento da dívida e acrescido, aliada à pendência de processo de impugnação judicial, fica legalmente suspensa a execução fiscal até à decisão do pleito, e esta suspensão determina, por sua vez, a suspensão do próprio prazo de prescrição que esteja em curso ou daquele que houvesse de reiniciar-se por virtude da cessação de algum efeito interruptivo da prescrição ( neste sentido, Acs. do S.T.A. de 04-03-2009, Proc. nº 0160/09, 26-01-2011, Proc. nº 01/11 e de 25-05-2011, Proc. nº 0465/11, todos disponíveis em www.dgsi.pt), não tendo qualquer sentido o exposto pela Recorrente quando refere que o artigo 169º do CPPT suspende a execução fiscal, não o prazo prescricional.
Pois bem, como se deixou sumariado nos Acórdãos do S.T.A. de 05-05-2010, Proc. nº 0140/10 e de 07-12-2010, Proc. nº 0490/10, igualmente disponíveis em www.dgsi.pt, “A impugnação judicial interrompe a prescrição, mas a paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo, faz cessar tal efeito, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação (nºs 1 e 2 do artigo 49.º da LGT). Porém, se a execução se encontrar suspensa em virtude de prestação de garantia ou de penhora de bens que garantam a totalidade da dívida e do acrescido, ao abrigo do artº 169º do CPPT, a paragem do processo não releva para efeitos de prescrição, uma vez que, em face do disposto no nº 3 do artº 49º da LGT, a prescrição se suspende também com a paragem da execução”.

Ora, é ponto assente que, no caso concreto, na pendência da aludida impugnação judicial (intentada em 09-02-2005), em 28.09.2005 foi penhorado no presente processo de Execução Fiscal o estabelecimento comercial da ora Reclamante, ao qual foi atribuído o valor global de €900.000,00.

A partir daqui, logo que cessou o efeito interruptivo, em 10-02-2006, o prazo de prescrição ficou suspenso, e esta suspensão do prazo vai durar até haver decisão que ponha termo ao aludido processo, o que sucedeu em 27-10-2011, situação que tem um verdadeiro efeito de implosão no que concerne à pretensão da Recorrente, pois que o recurso interposto tem como pano de fundo a recusa da produção do aludido efeito suspensivo.
Como última nota, a questão da aplicação do nº 4 do art. 49º da LGT é uma falsa questão, pois que a matéria em apreço foi ponderada em função do então nº 3 do art. 49º da LGT, sendo que, como refere o Cons. Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, 6ª edição, 2011, vol. III, pág. 262, “… a redacção dada ao art. 49.º da LGT pela Lei n.º Lei 53-A/2006, de 29 de Dezembro, ao estabelecer no novo n.º 4 que «o prazo de prescrição legal suspende-se em virtude de pagamento de prestações legalmente autorizadas, ou enquanto não houver decisão definitiva ou passada em julgado, que puser termo ao processo, nos casos de reclamação, impugnação, recurso ou oposição, quando determinem a suspensão da cobrança da dívida, apenas é inovador na parte em que atribui efeito de suspensão da prescrição à pendência de qualquer oposição, mesmo que não tenha por objecto a legalidade da liquidação da dívida exequenda, …”.

Deste modo, na situação em apreço, com referência ao prazo de prescrição, apenas cabe somar o período decorrido entre 01-01-2002 e o momento em que foi apresentada a Reclamação Graciosa, ou seja, 2 anos 2 meses e 15 dias e o tempo decorrido após 27-10-2011 até ao presente (2 anos e 5 meses), é manifesto que a dívida em apreço não se encontra prescrita, razão pela qual a sentença recorrida não merece qualquer censura, sendo de manter, devendo, nesta sequência, improceder totalmente o presente recurso jurisdicional.
4. DECISÃO
Nestes termos, na improcedência da questão prévia suscitada pelo Ministério Público, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente, mantendo-se a decisão judicial recorrida.
Custas pela Recorrente.
Notifique-se. D.N..


Porto, 27 de Março de 2014
Ass. Pedro Vergueiro
Ass. Pedro Marques
Ass. Fernanda Esteves