Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00070/06.8BEVIS
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:12/21/2016
Tribunal:TAF de Aveiro
Relator:Ana Patrocínio
Descritores:FACTURAS FALSAS
NULIDADE DA SENTENÇA
DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO
ÓNUS DA PROVA
IRC
Sumário:I - A nulidade da sentença, por omissão de pronúncia, tem lugar apenas quando se verifica uma violação dos deveres de pronúncia do Tribunal sobre questões que deveria conhecer, o que significa que o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.
II - A falta de especificação, pela Recorrente, dos concretos pontos de facto que na sentença foram dados como provados ou não provados e que considera incorrectamente julgados, bem como dos concretos meios probatórios, constantes de registo fonográfico, que impunham decisão sobre pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida, impede o Tribunal “ad quem” de reapreciar a decisão proferida sobre a matéria de facto. Pretendendo a Recorrente impugnar o julgamento sobre a matéria de facto efectuado pelo tribunal de 1ª instância, tem de cumprir esse ónus decorrente do disposto no artigo 685.º-B, n.º 1, alíneas a) e b) do CPC ex vi artigo 281.º do CPPT.
III - A presunção legal de que as declarações apresentadas pelos contribuintes à administração tributária são verdadeiras cessa, nomeadamente, se essas declarações ou os respectivos dados de suporte apresentarem omissões, erros ou inexactidões ou forem recolhidos indícios fundados de que não reflectem ou impedem o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo (artigo 75.º da LGT).
IV - Quando a liquidação de IRC tem por fundamento a não aceitação de custos declarados pelo contribuinte, por considerar que as facturas em que este os pretende suportar não correspondem a operações realmente efectuadas, compete à administração tributária fazer a prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação.
V - Feita essa prova, cabe ao contribuinte o ónus da prova dos factos que alegou como fundamento do seu direito a fazer reflectir negativamente os custos declarados na determinação da respectiva matéria tributável.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:T..., Lda.
Recorrido 1:Fazenda Pública
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Relatório

T…, Lda., contribuinte n.º 5…, com sede na Rua…, 3800-778, Eixo, interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, proferida em 02/07/2009, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação de IRC, do ano de 2001, da qual resulta um imposto a pagar de €20.444,20.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as conclusões que se reproduzem de seguida:
“1) A douta sentença recorrida julgou improcedente a impugnação, por considerar que as facturas emitidas pelo F..., não correspondem a transacções comerciais que se tenham efectivamente realizado.
2) O argumento fulcral para o Mm° Juiz justificar que as facturas são falsas assenta na suposição de “ser impossível que o emitente tenha facturado nos anos de 2001 a 2004, valor superior a € 5.000.000, não tenha instalações, nem sequer um escritório, ficheiro dos funcionários que colocava, com as suas identificações e formas de contacto, que não tenha uma frota automóvel, para assegurar o transporte dos funcionários que colocava nas obras, nem tenha assegurado todos os funcionários necessários à realização de todas as obras levadas a cabo pela impugnante”.
3) Na decisão recorrida o Mm° Juiz a quo equacionou e apreciou a questão da legalidade das liquidações impugnadas não na óptica da análise do caso concreto e da prova produzida nos autos pela impugnante, mas na óptica da teoria de que se o emitente emitiu facturas falsas para outros fornecedores, também emitiu para a impugnante.
4) A recorrente pôs em causa a suficiência e a relevância dos indícios apontados pela Administração Fiscal para suportar o seu juízo sobre a “falsidade das correspondentes facturas”, e consequentemente a ilegalidade da actuação da administração fiscal, conforme o alegado nos art°s 6° a 36° da p.i.
5) A douta decisão sob recurso, omitiu qualquer pronúncia sobre os aludidos factos, e reduziu as questões levantadas a uma só a de indagar se as operações entre a impugnante e o emitente de facturas F... eram reais, o que constitui a nulidade prevista na alínea d) do n° 1 do art° 668º do CPC.
6) Na douta sentença recorrida profere-se a seguinte informação “Assim, competia à impugnante a prova de que essas operações se haviam, de facto, realizado, que tiveram concretização o que, de todo, logrou conseguir com a prova produzida nos autos, prova esta que acabou por se confinar à demonstração da realização das obras a qual não estava a ser posta em causa”.
7) A douta sentença recorrida, ao ter reconhecido, que as obras a que se referem as facturas postas em causa existem, e foram feitas, aceita e reconhece os custos com os trabalhos de construção civil nelas incorporados.
8) Daí que seja contraditório e incongruente excluir dos custos registados pela impugnante, os custos facturados pelo F... na quantia de 10.065.000$00/€ 50.204.01.
9) O Tribunal a quo, não analisou correctamente a prova, nomeadamente se tivesse conjugado, o conteúdo das facturas de aquisição de serviços e os recibos de pagamento (Doc°s. 4 a 12), com as fotografias das obras (Doc°s. 91 a 97), com as guias de remessa dos materiais aplicados nas obras (Doc°s. 33 a 90), e as facturas de vendas que lhe estão subjacentes a tais obras (Doc.°s 15 a 32) seria levado a concluir ao contrário do que foi decidido, que da prova documental junta resulta que a impugnante logrou provar que as facturas encontradas na contabilidade para suportar documentalmente os custos deduzidos correspondem a efectivas operações.
10) Mas de todo o modo, a douta sentença recorrida não tem razão quando afirma que não foi feita prova de que as obras levadas a cabo pela impugnante tenham ficado a dever-se à contratação de trabalhadores de nacionalidade ucraniana angariados pelo subempreiteiro F....
11) Essa prova foi feita para além da prova documental através do depoimento das testemunhas.
12) Através do depoimento das testemunhas o tribunal pode constatar que os donos das obras e os trabalhadores que lá andaram ao serem confrontados com as fotografias das obras, identificaram-nas, confirmaram a respectiva execução pela impugnante, e confirmaram que andavam lá trabalhadores estrangeiros (ucranianos) que trabalhavam para o subempreiteiro.
13) Os trabalhadores portugueses que andaram nas obras em causa, identificaram também as mesmas pelas fotografias juntas ao processo, e confirmaram que o subempreiteiro, colocou estrangeiros nas obras.
14) O motivo pelo qual não se aceita tais depoimentos baseia-se, segundo o Mm° Juiz do processo, no carácter vago dos depoimentos das testemunhas, e nas relações mantidas com a impugnante.
15) A recorrente contesta veemente tal argumento pois quem pode provar o facto é quem teve conhecimento dele directo e pessoal, e é evidente que a melhor prova são os donos das obras em causa e os trabalhadores que aí trabalharam - estavam nas obras, viram os trabalhadores, viram as obras a ser realizadas e os trabalhadores a executá-las. Porquê duvidar do seu depoimento?
16) Acresce que a impugnante não sabe a que é que o Meritíssimo Juiz do tribunal a quo se está a reportar quando rejeita o depoimento das referidas testemunhas “pelas relações mantidas com a impugnante” pois que não fundamenta que relações eram essas e em que é que contribuíram para não dizerem a verdade.
17) Não compreende porque é que se considera que o depoimento das testemunhas é vago, pois estas não tiveram qualquer dúvida em identificar as obras quando confrontados com as fotografias das mesmas, esclareceram onde é que elas se localizaram e quando ocorreram, confirmaram a existência dos trabalhadores estrangeiros (ucranianos) que trabalhavam para o subempreiteiro nessas obras.
18) E nem se diga como defende o Tribunal a quo que estas testemunhas deveriam saber identificar os trabalhadores de nacionalidade Ucraniana pelos seus nomes, moradas, e informar se ainda se mantêm em Portugal ou se já regressaram ao seu país de origem, e saber quanto é que estes recebiam, se as suas regalias sociais estavam asseguradas bem como os seus compromissos fiscais, pois não é obrigação das testemunhas saber se os trabalhadores da obra estão conformes com a lei (laboral, da segurança social ou fiscal)
19) Quanto ao depoimento do subempreiteiro o F..., reconhece-se na douta sentença que este veio a corroborar na íntegra a versão alegada e sustentada pela impugnante, de que todas as facturas emitidas correspondiam a transacções de facto.
20) A recorrente contesta veemente, a tese defendida na sentença recorrida, de que o referido subempreiteiro, não tem estrutura empresarial para fazer os fornecimentos aqui postos em causa, isto é que tenha assegurado todos os funcionários necessários à realização de todas as obras levadas a cabo pela impugnante.
21) As facturas postas em causa emitidas à impugnante rondam os € 50.000.00, e para facturar este valor não é necessário uma estrutura empresarial especial.
22) Importa referir que embora o tribunal a quo se reporte a um volume de negócios de um valor exorbitante para a sua dimensão (cerca de cinco milhões de euros), esses negócios não são com a impugnante, mas com outros contribuintes.
23) Sendo que as irregularidades que este fornecedor possa ter na sua contabilidade ou na sua actuação relativamente à Administração Fiscal, não podem recair sobre a impugnante.
24) É irreal defender a estrutura empresarial traçado pelo Mm° Juiz a quo, para este contribuinte, pois conforme o próprio Tribunal a quo pode constatar ao ouvir o seu depoimento é um operador económico que ganhou a vida a angariar muitas vezes nas obras trabalhadores nem sempre legais, trabalhadores esses que se deslocavam para as obras em questão pelos seus próprios meios que por limitações intelectuais tinha dificuldades em preencher as facturas, e foi incapaz de prestar por escrito declarações quando tal lhe foi pedido pelo inspector tributário, limitando-se a assinar o que aquele lhe redigiu.
25) O subempreiteiro corroborou em Tribunal que recebeu o valor dos serviços prestados, e justificou que eram os próprios trabalhadores que lhe pediam que os pagamentos fossem em dinheiro.
26) Na douta sentença recorrida foi omitida matéria de facto relevante e essencial para a decisão, uma vez que não foi consignado no probatório que o inspector tributário nunca foi verificar se as obras efectuadas pela impugnante existiram ou não, nunca as foi verificar no terreno, nunca falou com os donos das mesmas.
27) E até nem era difícil, porque o senhor inspector é de Aveiro e as obras foram efectuadas quase todas num raio de 20 Km de Aveiro.
28) Não pode a sentença sob recurso aceitar que perante a questão de saber se as facturas referentes a trabalhos de construção civil em obras aí mencionadas ocorreram, não se tenha procurado averiguar se a obra foi ou não executada.
29) A douta decisão recorrida fez uma errada apreciação da prova e violou os artigos 668° n° 1 d) do CPC e 23° do CIRC.
TERMOS EM QUE, deve ser dado provimento ao recurso e revogar-se a decisão de que se recorre e em consequência seja considerada procedente a presente impugnação.”
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Não houve contra-alegações.
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O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa decidir se a sentença recorrida enferma nulidade, por omissão de pronúncia, relativamente à suficiência dos indícios de facturação falsa, e se incorreu em erro de julgamento sobre a decisão da matéria de facto, por errada apreciação da prova, e, consequentemente, em erro de direito.

III. Fundamentação

1. Matéria de facto
Da sentença prolatada em primeira instância, consta decisão da matéria de facto com o seguinte teor:
Com pertinência para a decisão, consideram-se provados os seguintes factos:
- A empresa Impugnante, T…, Lda.” iniciou a sua actividade em 14.09.1998, tem o capital social de €5 000, dividido em duas quotas e dedica-se à comercialização e aplicação de materiais de isolamento térmico e acústico;
- Para efeitos de IRC este sujeito passivo encontra-se enquadrado no regime geral de tributação – contabilidade organizada;
- Em 28.06.2005 foi determinada a realização de uma acção inspectiva externa, abrangendo o ano de 2001;
- No âmbito da acção de fiscalização o Impugnante foi devidamente notificado para exercer o direito de audição sobre o projecto de relatório de inspecção, contudo este nada disse;
- As facturas registadas na contabilidade do Impugnante, emitidas por F…, não correspondem a transacções comerciais que se tenham efectivamente realizado;
- Estas facturas diziam respeito ao pagamento de mão-de-obra angariada pelo emitente para trabalhar nas obras levadas a cabo pelo Impugnante, contudo às mesmas não corresponde tal prestação de serviços e consequente pagamento;
- Consequentemente foi emitida liquidação de IRC com o n.º 2005 8310116839, relativa ao exercício de 2001, no valor total de €20 444, 20 (onde se incluem €2 772, 40 a título de juros compensatórios).
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FACTOS NÃO PROVADOS:
- Que as obras levadas a cabo pelo Impugnante tenham ficado a dever-se à contratação de trabalhadores de nacionalidade ucraniana angariados pelo emitente de facturas F…;
- Que o pagamento dos trabalhadores que realizaram as obras levadas a cabo pelo Impugnante tenham sido pagos através daquele emitente de facturas;
As demais asserções insertas na douta petição constituem meras considerações pessoais e conclusões de facto e/ou direito, pelo que não incumbe pronúncia nesta sede.
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Na sua decisão o Tribunal estribou-se nas conclusões da acção inspectiva realizada pela Direcção Geral de Contribuições e Impostos à impugnante, espelhados em todos os documentos que compõem o Processo Administrativo junto aos autos.
Foram inquiridas as testemunhas J…, A…, Ar…, L…, José…, F... e P….
As testemunhas J…, A…, Am… e José…, para além de terem confirmado a concretização por parte da T… Lda. de trabalhos de isolamento em algumas obras, designadamente na F… Lda., Pastelaria P…; E… em Aguada de Cima, Águeda, na M… e V… em Ílhavo e ainda de um armazém na Palhaça, para a empresa Alto…, nada souberam esclarecer quanto aos trabalhadores que a Impugnante usou para realizar tais trabalhos. Dizem desconhecer a identidade das pessoas que andaram a trabalhar nestas obras, referindo com toda a certeza que seriam trabalhadores de nacionalidade Ucraniana, apesar de não terem entabulado qualquer conversa ou relação com estes, afirmam serem Ucranianos mas não sabem nomes ou moradas, nem se se mantêm em Portugal ou se, entretanto, regressaram ao país de origem.
Esta informação, com este carácter vago, revela-se bastante oportuna no sentido de impedir que sejam identificados os trabalhadores que realmente ali trabalharam, quantos, quanto recebiam, se as suas regalias sociais estavam asseguradas bem como os seus compromissos fiscais.
Assim, estes depoimentos, pelo carácter vago que assumiram, pelas relações mantidas com a Impugnante bem como com o seu representante legal, não assumem grande relevância no apuramento de factos demonstrando, em nosso entender, a incapacidade do Impugnante demonstrar cabalmente a existência daquela actividade de angariação de mão-de-obra por parte de F….
Quanto à testemunha L…, amigo pessoal do sócio-gerente da Impugnante, que diz ter assistido a um pagamento, a uma entrega de dinheiro por parte deste a F..., entende-se que nada vem esclarecer quanto ao facto deste poder ter efectivamente posto funcionários seus a trabalhar nas obras da T…. Se por um lado viu uma entrega de dinheiro, a qual terá ocorrido em data que não recorda, num sítio que também já não sabe referenciar, não sabe de que quantia se tratava e nem a que título era devida, se a título de pagamento de serviços prestados por funcionários seus, se por qualquer outro serviço, designadamente como contrapartida das facturas emitidas e que viriam, mais tarde, a ser utilizadas na sua contabilidade.
Por fim a testemunha F..., sujeito passivo emitente de facturas cuja falsidade foi detectada pelos Serviços de Inspecção Tributária, relativamente a quem correm os processos de Inquérito necessários ao apuramento dos factos cuja prática lhe é imputada com as legais consequências que deles advêm, veio aos autos corroborar na íntegra a versão alegada e sustentada pelo Impugnante, de que todas as facturas emitidas correspondiam a transacções de facto.
De forma espontânea, assumiu ter assinado facturas em branco, tendo depois tentado contornar esta afirmação dizendo que era para o funcionário, pessoa da sua confiança, depois as preencher, o que fazia na sua presença, neste sistema diz ter assinado cerca de 850 facturas.
Que outro comportamento seria de esperar?!
Naturalmente este indivíduo terá todo o interesse em fazer vingar tal tese, a qual o ilibará de qualquer outro tipo de responsabilidade, designadamente criminal, pela evidente prática do crime de fraude fiscal consubstanciado na emissão de facturas às quais não corresponde um substrato factual. Sem esquecer que este mantém o desempenho das suas funções de operário da construção civil, como armador de ferro, e que continua a viver num bairro de habitação social, situação esta que seria certamente bem diversa caso efectivamente tivesse uma actividade profissional daquela dimensão.
Assim, todo o seu depoimento terá necessariamente de ser considerado dele se retirando todas as consequências, desde logo a emissão de facturas sem qualquer tipo de rigor bem como a inexistência de qualquer actividade de angariação de pessoal para trabalhar em obras, fossem estas do Impugnante ou de qualquer outra pessoa.
Inquirido o Inspector das Finanças, subscritor do relatório que consta dos autos, Patrick Batista Gomes, o seu depoimento versou sobretudo sobre questões de método usado em sede de inspecção tributária, foi prestado de forma clara e isenta, dele não retirando, nem mais nem menos, do que aquilo que já constava dos relatórios juntos e considerados em sede de prova documental.
Contribuindo para a formação da nossa convicção, no que respeita à falta de credibilidade das declarações prestadas, as quais se especificaram discriminadamente, temos a prova documental que serve de suporte às afirmações da administração fiscal no relatório oportunamente elaborado onde constam informações sobre as conclusões obtidas também em sede de inspecção ao emitente de facturas em causa nos presentes autos F....
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Pela sua pertinência e para melhor compreensão, adita-se à decisão da matéria de facto os fundamentos para as correcções que constam do relatório de inspecção tributária elaborado pelos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Aveiro, ínsito no processo administrativo apenso aos autos, que, em resumo, se transcrevem:
“(…) O sujeito passivo em apreço dedica-se à comercialização e aplicação e materiais de isolamento térmico e acústico com destaque para uma tela de alvéolos plásticos e dupla película de alumínio da marca “B...”, que é adquirida ao fornecedor “B... Isolamentos Térmicos, Lda”.(…) Relativamente aos exercícios em apreço foram analisados, por amostragem, alguns dos documentos de suporte do IVA dedutível e dos custos registados na contabilidade, não se detectando anomalias neste âmbito, com excepção das descritas no ponto III do presente relatório. (…)
III.1 AQUISIÇOES A F…, (…) Analisados os elementos remetidos pelo sujeito passivo, conclui-se que este contabilizou as seguintes facturas de fornecimento de serviços emitidas por F... (…) O valor total dos custos contabilizados com base nas facturas supra identificadas, ascendeu no exercício de 2001 ao montante de 10.065.000$00 (€50.204,01), tendo o sujeito passivo nas declarações periódicas de IVA respectivas, deduzido imposto no montante de 1.711.050$00(€8.534,68).Conforme o referido anteriormente, em todas estas facturas é liquidado IVA à taxa normal, o qual ascendeu ao total de € 8.534,68, no entanto, com base no sistema informático da DGCI, F... encontra-se enquadrado no regime de isenção, (…) não tendo porquanto procedido ao envio de qualquer declaração periódica de IVA nos exercícios em apreço. (…) o IVA liquidado nas facturas emitidas por F... à T…, Lda, não foi entregue nos cofres do Estado, (…) No que respeita à declaração de rendimentos, modelo 3, do IRS, (…)o valor das prestações de serviços constante nessa declaração de rendimentos ascende ao total de € 8.130,41, quando os valores que resultam das facturas que constam da contabilidade da “T…, Lda.”, ascendem a € 50.204,01, de serviços prestados. (…) Tendo-se diligenciado junto da Segurança Social se F... apresentou neste período qualquer desconto (…) como entidade empregadora, foi-nos informado que “F..., (…) apresenta o último desconto em Junho de 1983 e nunca descontou na qualidade de entidade empregadora”. (…) Das diligências efectuadas e atendendo às declarações que nos foram sido prestadas por pessoas que conhecem a actividade de F..., conclui-se que este exerce a actividade de operário de construção civil, ao nível da armação de ferro, sem que possua empregados a seu cargo. (…) Com efeito desconhecem-se ferramentas, estaleiros ou viaturas que F... possua para o exercício da sua actividade ou que pudesse colocar à disposição de empregados para a realização de prestações de serviços. (…) Relativamente à actividade que exerce, F... declarou em 22 de Novembro de 2004 (…) “Relativamente à minha empresa em nome individual, (…) declaro que efectuo trabalhos de construção civil, designadamente na fase de pedreiro e armação de ferro. (…) Até Maio de 2002 os trabalhos que efectuava era sozinho. (…)” (…) A respeito da actividade que exerce e da sua capacidade produtiva, acrescentou: “Nunca efectuei subcontratações de qualquer tipo de serviços ou fornecimentos nos anos de 2001 a 2004 e mesmo actualmente. (…) Também nunca tive máquinas nem viaturas, nem betoneiras, nem qualquer outra ferramenta ou máquina normalmente utilizadas na construção, isto porque sempre fui um trabalhador do dia a dia de muito reduzidas dimensões, sem capacidade para realizar grandes trabalhos,” (…) A respeito das facturas e recibos que a sociedade “T…, Lda” possui contabilizados e cujas fotocópias se apresentaram a F..., este declarou: “também reconheço as facturas que me foram exibidas e que constam da lista anexa. Igualmente refiro que a assinatura é minha, que não as passei, que as facturas são facturas minhas, que desconheço em absoluto os serviços ou bens que (contam) constam das mesmas, pois não os prestei, nem forneci quaisquer bens” (…) Daqui resulta que F... refuta por completo a execução dos trabalhos mencionados nas facturas em apreço. (…) Analisadas as facturas de F... que se encontram contabilizadas na “T…, Lda”, estas possuem descrições vagas dos serviços a que se referem, como seja “Serviços prestados” (…) Os documentos em apreço não fazem indicação nem as quantidades dos bens e serviços a que se referem e como tal, não possuem a formalidade exigida pelo artº 35º do CIVA, (…) Análise aos meios de pagamento (…) De acordo com a contabilidade do sujeito passivo e atendendo ainda às declarações dos responsáveis da empresa as facturas de F... (…) terão sido quitadas através de numerário, o qual ascenderia ao total de 11.776.050$00. (…) A este respeito referiu mesmo J… (…) «O pagamento das facturas supra foi efectuado com recurso a numerário entregue pessoalmente ao Sr. F..., sendo que a dada altura os funcionários que se encontravam a prestar serviços em obras da “T…, Lda.”, disseram que o Sr. F... não lhes pagava o ordenado, comecei eu a pagar-lhes directamente também em numerário.» (…) Não obstante este facto declarou que relativamente a esses trabalhadores “desconheço a identificação e morada em concreto…”
(…) Conclusões (…) Podemos concluir que os serviços constantes das facturas contabilizadas pela “T…, Lda.” no exercício de 2001 representam operações simuladas quer quanto ao valor, quer quanto às pessoas, pelo que, tanto o IVA deduzido por conta das mesmas, como os custos contabilizados, não são aceites fiscalmente, (…)”.

Por outro lado, o tribunal recorrido não elencou na decisão da matéria de facto factos simples, mas antes, em alguns casos, juízos de valor, conclusões de facto e de direito que condicionam irremediavelmente a subsunção ao direito e o desfecho da acção. Por estes motivos, os seguintes pontos da decisão da matéria de facto têm-se como não escritos, nos termos do disposto no artigo 646.º, n.º 4 do Código de Processo Civil, na redacção aplicável à data:
“- As facturas registadas na contabilidade do Impugnante, emitidas por F…, não correspondem a transacções comerciais que se tenham efectivamente realizado;
- Estas facturas diziam respeito ao pagamento de mão-de-obra angariada pelo emitente para trabalhar nas obras levadas a cabo pelo Impugnante, contudo às mesmas não corresponde tal prestação de serviços e consequente pagamento;”

2. O Direito

Cumpre entrar na análise da realidade em equação nos autos, sendo que a este Tribunal está cometida a tarefa de indagar do apontado motivo de nulidade da sentença, por omissão de pronúncia.
Sustenta a recorrente que pôs em causa a suficiência e a relevância dos indícios apontados pela Administração Fiscal para suportar o seu juízo sobre a “falsidade das correspondentes facturas”, e, consequentemente, a ilegalidade da actuação da administração fiscal, conforme o alegado nos artigos 6.° a 36.° da petição inicial. Defendendo que a sentença sob recurso omitiu qualquer pronúncia sobre os aludidos factos e reduziu as questões levantadas a uma só: a de indagar se as operações entre a impugnante e o emitente de facturas F... eram reais, o que constitui a nulidade prevista na alínea d) do n.º 1 do artigo 668.º do Código de Processo Civil (CPC).
A sentença/decisão pode padecer de vícios de duas ordens:
Por um lado, pode ter errado no julgamento dos factos e do direito e, então, a consequência é a sua revogação;
Por outro lado, como acto jurisdicional, pode ter atentado contra as regras próprias da sua elaboração ou contra o conteúdo e limites do poder à sombra da qual é decretada e, então, torna-se passível de nulidade, nos termos do artigo 615.º, do CPC, na redacção da Lei n.º 41/2013, de 26/6, correspondente ao anterior artigo 668.º do CPC.
No processo judicial tributário o vício de omissão de pronúncia ou a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artigo 125.º, n.º 1, do CPPT, no penúltimo segmento da norma.
A nulidade por omissão/excesso de pronúncia traduz-se no incumprimento, por parte do julgador, do poder/dever prescrito no artigo 660.º, n.º 2 do CPC (actual artigo 608.º, n.º 2), que impõe ao juiz o dever de conhecer de todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; e, por outro lado, de só conhecer de questões que tenham sido suscitadas pelas partes, salvo aquelas de que a lei lhe permite conhecer oficiosamente.
Lembramos que ocorre nulidade da sentença, por omissão de pronúncia, quando se verifica uma violação dos deveres de pronúncia do tribunal sobre questões a que esteja obrigado a pronunciar-se.
Nesta matéria, a jurisprudência tem reiteradamente afirmado que “só pode ocorrer omissão de pronúncia quando o juiz não toma posição sobre questão colocada pelas partes, não emite decisão no sentido de não poder dela tomar conhecimento nem indica razões para justificar essa abstenção de conhecimento, e da sentença também não resulta, de forma expressa ou implícita, que esse conhecimento tenha ficado prejudicado em face da solução dada ao litígio” (cfr. Acórdão do STA, de 19/09/2012, processo n.º 0862/12).
Por conseguinte, só há omissão de pronúncia “quando o tribunal deixa, em absoluto, de apreciar e decidir as questões que lhe são colocadas, e não quando deixa de apreciar argumentos, considerações, raciocínios, ou razões invocados pela parte em sustentação do seu ponto de vista quanto à apreciação e decisão dessas questões” (cfr. Acórdão do STA, de 28/05/2014, processo n.º 0514/14).
Não residem dúvidas que a Recorrente pretendeu colocar em causa o ónus que impendia sobre a Administração Tributária de ter recolhido indícios bastantes de que as facturas em apreço não correspondiam a operações reais.
A este propósito, na sentença recorrida refere-se o seguinte: “(…) Como se viu, resultava dos elementos recolhidos pela administração fiscal que as operações comerciais subjacentes às facturas emitidas por F..., e posteriormente lançadas na contabilidade do Impugnante, não correspondiam à realidade, ou seja, que tais operações eram fictícias, simuladas.
Esses elementos da administração fiscal são elementos probatórios objectivos, porque resultantes das análises à contabilidade da Impugnante bem como às condições de trabalho do emitente em causa, a toda a verificação da sua efectiva actividade. (…)”
Nesta conformidade, o tribunal recorrido tomou posição acerca da alegação sobre os elementos recolhidos pela Administração Fiscal, tendo-os considerado elementos probatórios objectivos.
Reiteramos que a apontada nulidade por omissão de pronúncia só ocorre nos casos em que o Tribunal “pura e simplesmente, não tome posição sobre qualquer questão sobre a qual devesse tomar posição, inclusivamente não decidindo explicitamente que não pode dela tomar conhecimento. No entanto, mesmo que entenda não dever conhecer de determinada questão, o tribunal deve indicar as razões por que não conhece dela, pois, tratando-se de uma questão suscitada, haverá omissão de pronúncia se nada disser sobre ela” - Vide Jorge Lopes de Sousa, CPPT, anotado e comentado, volume II, 6ª edição, 2011, Áreas Editora, pág. 363. Neste sentido, entre muitos outros, podem ver-se os acórdãos do STA de 13/07/11 e de 20/09/11, proferidos nos recursos n.º 0574/11 e n.º 0268/11, respectivamente.
Ora, manifestamente, não se verifica a invocada nulidade, dado que a sentença recorrida, ainda que sumariamente, pronunciou-se acerca do “trabalho” efectuado pela Administração Fiscal, tendo concluindo que os elementos indiciários recolhidos eram objectivos, justificando serem resultantes das análises à contabilidade da Impugnante bem como às condições de trabalho do emitente em causa, a toda a verificação da sua efectiva actividade, fundando a suficiência dos indícios de facturação falsa.
Nesta conformidade, resta, tão-só, decidir se, afinal, o julgador errou no seu julgamento, dado que inexiste a invocada nulidade da sentença por omissão de pronúncia.

A Administração Fiscal não aceitou as facturas constantes da contabilidade da Recorrente, emitidas por F..., por não corresponderem a verdadeiras aquisições de serviços realizadas por aquele emitente, ou seja, por não corresponderem a aquisição de serviços efectivamente fornecidos.
A questão de saber se a Administração Tributária reuniu os indícios suficientes que a levaram a esta conclusão já foi objecto de acórdão proferido neste TCAN, em 07/12/2016, proferido no âmbito do Processo n.º 306/06.5BEAVR, que tratou idêntica situação, com a mesma impugnante e baseado no mesmo relatório da fiscalização, nos seguintes termos:
“(…) Dispõe o n.º 1, do art.º 74.° da LGT, que o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque.
Sobre a administração recai o ónus de provar a ocorrência de factos de que deriva o direito à liquidação (…) e o sujeito passivo terá o ónus de demonstrar os factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito que se arroga a Administração. (…)
Com efeito, é à Administração que cabe o ónus da prova da verificação dos pressupostos legais da sua atuação, e, em contrapartida, cabe ao administrado apresentar prova bastante da ilegitimidade do ato, quando se mostrem verificados esses pressupostos.
Não obstante vigorar o princípio da veracidade da contabilidade, nos termos do art.º 75.º da LGT, tal presunção cessa, quando “...embora a escrita ou contabilidade esteja organizada de acordo com a lei, enferme de erros ou inexactidões, ou haja, indícios fundados de que apesar da sua correcta organização, não reflecte a matéria tributável efectiva” – acórdão do STA - Pleno da Secção do CT, Recurso nº 01026/02, de 07-05-2003.
(…) Prossegue o mesmo acórdão dizendo que: “…. é aquele que correntemente se vem chamando de “facturas falsas”, isto é, a contabilidade considera (e trata de forma contabilisticamente correcta) documentos emitidos na forma legal, mas que não correspondem a qualquer realidade, porque as operações que era suposto reflectirem, na verdade, não tiveram lugar.
E, aqui, a lei não exige senão “indícios fundados”, ou seja, não impõe à Administração a “prova provada” de que por detrás dos documentos não está a realidade que normalmente reflectem e comprovam, basta-se com indícios fundados para fazer cessar a presunção a favor do contribuinte. E a este, desprovido do escudo protector da presunção, não resta senão demonstrar a veracidade dos seus elementos contabilísticos, e respectivos suportes, destarte posta em crise, face àqueles “fundados indícios”. (…).
No caso em apreço a sentença recorrida considerou que atendendo aos elementos apurados em sede de inspeção entre si conjugados, que a Administração Fiscal fez prova dos pressupostos legais que legitimam a correção e subsequente liquidação impugnada.
Importa verificar se a sentença recorrida faz correta apreciação dos indícios recolhidos pela Administração vertidos no relatório e se são suficientes para não aceitar as deduções de IVA efetuada pela Impugnante /Recorrente relativamente ao emitente F....
Relativamente aos indícios recolhidos junto do emitente das faturas a Administração apurou que F... emitiu 5 faturas nos exercícios de 2001, no valor de 10 065 00$00 (50 204,01 €) tendo sido deduzido IVA no valor de 1 711 050$00 (8 534,68 €).
Após várias diligências e em síntese conclusiva a Administração Fiscal apresenta os seguintes indícios: (…)
a) F... refuta a realização dos serviços constantes das faturas, em apreço contabilizados no exercício de 2001, na sociedade “T…, L.da,” e que ascende ao valor total de € 50.204.01 mais IVA no montante de € 8 534,68;
b) A totalidade das faturas em apreço, segundo o sócio da “T…, L.da”, terá sido pago em numerário não conseguindo assim este efetuar qualquer prova do efetivo recebimento dos montantes em apreço por parte de F..., acrescendo ainda das declarações de J… que, pelo menos uma parte, terá sido paga diretamente aos trabalhadores que lhe prestaram efectivamente serviços e não a F...;
c) nestes termos não consegue a “T…, L.da,” provar o efetivo pagamentos dos serviços a que dizem respeito as faturas em apreço;
d) F... refuta a realização dos trabalhos constantes nas facturas em apreço bem como a recepção de quaisquer valores imputados ao mesmo título de quitação dessas faturas, indicando mesmo desconhecer em absoluto a firma em apreço;
e) Verifica-se igualmente a falta de formalidade legal exigida nessas faturas como decorre do artº 35º do CIVA;
f) Para mais, da análise efetuada à atividade de F..., designadamente da constatação da inexistência de quaisquer funcionários ou empresas subcontratadas, máquinas, ferramentas ou viaturas e bem assim, dos vários contactos efetuados junto das pessoas que acompanham a atividade do mesmo (colegas de trabalho e vizinhos, etc) e da constatação in loco do trabalho que este executa (armação de ferro) conclui-se claramente que este operador não possui a adequada estrutura empresarial necessária à realização dos trabalhos constantes das faturas em apreço.
g) Em acréscimo, a inexistência de quaisquer funcionários inscritos na Segurança Social como empregados de F..., a precária situação económica em que vive (habita num Bairro Social) e a inexistência de valores por estes declarados compatíveis com os valores das facturas em apreço;
h) A própria declaração dos sócios da “T…, Lda.” induz no sentido que os trabalhos terão sido efetuados por uma equipa de trabalhadores que exerceram a sua actividade sobre a direção dos responsáveis da “T…, Lda”, cabendo ao F... a mera emissão das facturas que descrevem os trabalhos efetuados;
i) A intervenção do F... na realização das operações simuladas noutra sociedade, na qual os respectivos responsáveis admitiram que os trabalhos constantes das facturas por este emitidas e contabilizadas nessa sociedade, não foram efectivamente realizadas, tendo porquanto sido simulados nesses documentos, valores e trabalhos;
j) Acresce ainda que os dados apurados nos anexos recapitulativos de fornecedores constantes do sistema informático DGCI resulta um volume de negócios de cerca de € 4 000.6362.43 (803.658.647$00) imputável a F..., nos exercícios de 2001 a 2004, valor este que incluiu as faturas contabilizadas na T…, Lda, e que claramente ultrapassa a capacidade produtiva e a estrutura empresarial de F..., que mais não é que um simples operário de construção civil que trabalha em armação de ferro.
Em síntese, no relatório concluiu-se que os serviços constantes das facturas contabilizadas pela “T…, Lda” no exercício de 2001 representam operações simuladas quer quanto ao valor, quer quanto às pessoas, pelo que, tanto o IVA deduzido por conta das mesmas, como os custos contabilizados, não são aceites fiscalmente.
Decorre, assim, do relatório de inspeção tributária a realização de várias diligências junto (…) do emitente das faturas e da Recorrente, das quais resultaram: (i) negação pelo próprio da realização dos trabalhos contabilizados, o desconhecimento da empresa T…, Lda. e ainda do recebimento das quantias em causa. (ii) E inexistências de funcionários ou empresas subcontratadas, máquinas, ferramentas ou viaturas não possuindo a adequada estrutura empresarial necessária à realização dos trabalhos constantes das faturas em apreço. (iii) A impossibilidade da Recorrente provar os pagamentos dos serviços, e na mesma admissão de pagamentos diretos aos trabalhadores do F.... (iv) a existência de dados apurados através dos anexos recapitulativos de fornecedores constantes do sistema informático DGCI dos quais resultam um volume de negócios de cerca de € 4 000.6362.43 (803.658.647$00) imputável a F..., nos exercícios de 2001 a 2004.
Destarte, os indícios recolhidos são credíveis e suficientes para indiciarem que as prestações de serviços tituladas pelas faturas não correspondem a serviços efetivamente prestados e cessarem a presunção a favor da Recorrente.
Nesta conformidade, improcedem as conclusões da Recorrente, uma vez que a Administração Fiscal, cumprindo o artigo 74.º da Lei Geral Tributária, prova os pressupostos legais que legitimam a sua atuação, ou seja, de que existem indícios sérios de que a operação constante da fatura não corresponde à realidade. (…)”

A questão que é colocada de seguida é a de saber se o tribunal recorrido errou na apreciação da matéria de facto.
Antes de mais, importa salientar que, almejando a Recorrente colocar em causa a decisão sobre a matéria de facto, impunha-se que, se dela discordava e pretendia impugná-la, além dos concretos pontos de facto que considerava incorrectamente julgados, tivesse indicado os meios probatórios constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham uma decisão diversa daquela que consta da sentença, em observância do disposto no artigo 685º-B do CPC (actual 640º), na redacção aplicável in casu.
Com efeito, de acordo com o regime ínsito no artigo 685º-B do CPC, aqui aplicável por força do disposto no artigo 281º do CPPT, quando impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, o Recorrente deve especificar, sob pena de rejeição: (i) os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; (ii) os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
Sobre a razão desta exigência já se pronunciou este TCAN no Acórdão de 06/01/2011, lavrado in rec. n.º 813/09.8BECBR, que parcialmente se transcreve: “ (…) bem se compreendem estas exigências da lei pois ao tribunal ad quem que tenha competência em matéria de facto não compete reapreciar toda a prova de forma a efectuar um novo julgamento da matéria de facto, como se este não tivesse alguma vez sido efectuado. Quanto ao âmbito do segundo grau de jurisdição em matéria de facto é elucidativo o teor do relatório do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 39/95, de 15 de Fevereiro, diploma que introduziu a redacção ao art. 690.º-A que acima deixámos referida. Aí se diz: «A garantia do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto nunca poderá envolver, pela própria natureza das coisas, a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida em audiência – visando apenas a detecção e correcção de pontuais, concretos e seguramente excepcionais erros de julgamento, incidindo sobre pontos determinados da matéria de facto, que o recorrente sempre terá o ónus de apontar claramente e fundamentar na sua minuta de recurso. Não poderá, deste modo, em nenhuma circunstância, admitir-se como sendo lícito ao recorrente que este se limitasse a atacar, de forma genérica e global, a decisão de facto, pedindo, pura e simplesmente, a reapreciação de toda a prova produzida em 1.ª instância, manifestando genérica discordância com o decidido. A consagração desta nova garantia das partes no processo civil implica, naturalmente, a criação de um específico ónus de alegação do recorrente, no que respeita à delimitação do objecto do recurso e à respectiva fundamentação”.
Como resulta da análise das alegações e conclusões de recurso, no caso vertente, tal ónus não foi cumprido pela Recorrente, uma vez que esta não concretiza minimamente quais os factos alegados na petição inicial que deveriam ter sido dados como provados (e não foram), ou seja, não indica os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, nem indica os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou de gravação da prova que impunham decisão diversa, limitando-se a remeter de uma forma genérica para os documentos juntos e para os depoimentos prestados, mais alegando ser de todo alheia ao incumprimento dos deveres fiscais pelos seus fornecedores, bem como ao respectivo modus operandi.
A alegação da Recorrente é manifestamente insuficiente e conclusiva: O Tribunal a quo, não analisou correctamente a prova, nomeadamente se tivesse conjugado, o conteúdo das facturas de aquisição de serviços e os recibos de pagamento (Doc°s. 4 a 12), com as fotografias das obras (Doc°s. 91 a 97), com as guias de remessa dos materiais aplicados nas obras (Doc°s. 33 a 90), e as facturas de vendas que lhe estão subjacentes a tais obras (Doc.°s 15 a 32) seria levado a concluir ao contrário do que foi decidido, que da prova documental junta resulta que a impugnante logrou provar que as facturas encontradas na contabilidade para suportar documentalmente os custos deduzidos correspondem a efectivas operações.
E que a sentença recorrida não tem razão quando não aceita que não foi feita prova de que as obras levadas a cabo pela impugnante tenham ficado a dever-se à contratação de trabalhadores de nacionalidade ucraniana angariados pelo subempreiteiro F....
Que através do depoimento das testemunhas o tribunal pode constatar que os donos das obras e os trabalhadores que lá andaram ao serem confrontados com as fotografias das obras, identificaram-nas, confirmaram a respectiva execução pela impugnante, e confirmaram que andavam lá trabalhadores estrangeiros (ucranianos) que trabalhavam para o subempreiteiro.
Que o motivo pelo qual não se aceita tais depoimentos baseia-se, segundo a MM.ª juíza do processo no carácter vago dos depoimentos das testemunhas, e nas relações mantidas com a impugnante.
Não compreende porque é que se considera que o depoimento das testemunhas é vago, pois estas não tiveram qualquer dúvida em identificar as obras quando confrontados com as fotografias das mesmas, esclareceram onde é que elas se localizaram e quando ocorreram, confirmaram a existência dos trabalhadores estrangeiros (ucranianos) que trabalhavam para o subempreiteiro nessas obras.
Quanto ao depoimento do subempreiteiro o F..., reconhece-se na sentença que este veio a corroborar na íntegra a versão alegada e sustentada pela impugnante, de que todas as facturas emitidas correspondiam a transacções de facto.
Que as irregularidades apontadas ao F..., os problemas que este fornecedor possa ter na sua contabilidade ou na sua actuação relativamente à Administração Fiscal, não podem recair sobre a impugnante.
O F... é um operador económico que ganhou a vida a angariar muitas vezes nas obras trabalhadores nem sempre legais, trabalhadores esses que se deslocavam para as obras em questão pelos seu próprios meios que por limitações intelectuais tinha dificuldades em preencher as facturas, e foi incapaz de prestar por escrito declarações quando tal lhe foi pedido pelo inspector tributário, limitando-se a assinar o que aquele lhe redigiu.
O subempreiteiro corroborou em Tribunal que recebeu o valor dos serviços prestados, e justificou que eram os próprios trabalhadores que lhe pediam que os pagamentos fossem em dinheiro.
Na douta sentença recorrida foi omitida matéria de facto relevante e essencial para a decisão, uma vez que não foi consignado no probatório que o inspector tributário nunca foi verificar se as obras efectuadas pela impugnante existiram ou não, nunca as foi verificar no terreno, nunca falou com os donos das mesmas.
Compete ao TCA reapreciar, não apenas se a convicção expressa pelo tribunal a quo tem suporte razoável na prova indicada e os restantes elementos constantes dos autos revelam, mas, também, avaliar e valorar (de acordo com o princípio da livre convicção) toda a prova produzida nos autos em termos de formar a sua própria convicção, como refere António Santos Abrantes Geraldes in Recurso no Novo Código do Processo Civil, pág. 232, um “juízo autónomo”, relativamente aos concretos pontos da matéria de facto objecto de impugnação.
E, consequentemente, modificar a decisão de facto se, relativamente aos mesmos, tiver formado uma convicção segura da existência de erro de julgamento da matéria de facto.
Assim, para que o TCA possa proceder a alteração da matéria de facto, devem ser indicados os pontos de facto considerados incorrectamente julgados, indicados os concretos meios de prova constantes do processo ou de gravação realizada, que imponham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
O tribunal superior fica legitimado se esses meios de prova conduzirem e impuserem uma decisão diversa da proferida podendo concluir-se ter incorrido, a 1ª instância, em erro de apreciação das provas.
No entanto, a garantia do duplo grau de jurisdição não subverte o princípio da livre apreciação das provas.
Por força do referido princípio, as provas são apreciadas livremente, de acordo com a convicção que geram no julgador acerca da existência de cada facto, ficando afastadas as situações de prova legal que se verifiquem, por força do disposto nos artigos 350.º, nº 1, 358.º, 371.º e 376.º, todos do Código Civil, nomeadamente, da prova por confissão, por documentos autênticos, por certos documentos particulares quanto à materialidade das suas declarações e por presunções legais.
A alteração da matéria de facto pelo Tribunal ad quem tem lugar necessariamente nos casos de manifesta desconformidade entre as provas produzidas e a decisão proferida, traduzida num erro evidente na apreciação das provas, que implica uma decisão diversa.
A modificabilidade da matéria de facto pressupõe uma clara distinção entre erro na apreciação da matéria de facto e a discordância do sentido em que se formou a convicção do julgador.
A tarefa de reexame da matéria de facto pelo tribunal de recurso está limitada aos casos em que ocorre erro manifesto ou grosseiro ou em que os elementos documentais fornecem uma resposta inequívoca em sentido diferente daquele que foi considerado no tribunal a quo.
A Recorrente no presente recurso limita-se a impugnar genericamente o julgamento da matéria de facto e não identifica os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados.
Quantos aos meios de prova não especifica os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
Limita-se a referir que o Tribunal a quo não analisou correctamente a prova, e que se tivesse conjugado, o conteúdo das facturas de aquisição de serviços e os recibos, com as fotografias das obras, com as guias de remessa dos materiais aplicados nas obras e as facturas de vendas que lhe estão subjacentes a tais obras seria levado a concluir ao contrário do que foi decidido.
No que concerne ao depoimento das testemunhas refere que o tribunal pode constatar que os donos das obras e os trabalhadores que lá andaram ao serem confrontados com as fotografias das obras, identificaram-nas, confirmaram a respectiva execução pela impugnante, e confirmaram que andavam lá trabalhadores estrangeiros (ucranianos) que trabalhavam para o subempreiteiro.
No que se refere a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre questões de facto impugnadas, a Recorrente nada avançou.
A Recorrente, portanto, limita-se a uma impugnação genérica da decisão da matéria de facto. Assim, não tendo a Recorrente dado integral cumprimento ao ónus que sobre si recaía, decorrente do regime ínsito no artigo 685º- B, do CPC, na redacção vigente à data, impõe-se rejeitar o recurso nesta parte.
De todo o modo, não podemos deixar de frisar o seguinte:
O ponto de partida são os factos apurados pela Administração Tributária, que, como vimos, se nos apresentam pertinentes, pois, ainda que apreciados isoladamente cada um dos elementos reunidos pelos Serviços Inspectivos, estes não lograssem traduzir, por si só, indícios da falta de materialidade das transacções tituladas pelas facturas em apreço, contudo, conjugados entre si e “lidos” à luz das regras da experiência comum, representam indícios sérios e credíveis da simulação aventada pela Administração Tributária, revelando-se fulcrais as diligências encetadas por esta, quer junto da Impugnante, quer junto do emitente das facturas.
Atentos os factos apurados pela Administração Tributária, os quais revelam indícios sólidos da falta de materialidade subjacente às facturas emitidas, impendia agora sobre a Impugnante a prova do contrário, isto é, de que efectivamente e, não obstante esses factos-índice, as transacções/operações foram realmente concretizadas, nos termos constantes nos documentos que as titulam, ou seja que os fornecimentos de bens foram concretizados e reais, cabendo-lhe, pois, o ónus de demonstrar a existência dos factos que invoca, como esteio do seu direito, o que a Recorrente efectivamente não logrou, porquanto, não lhe bastava criar a dúvida relativamente à actuação da Administração Tributária, impunha-se-lhe um rigoroso esforço probatório no sentido de demonstrar que as transacções que subjazem aos documentos que contabilizou efectivamente se realizaram. Impunha-se, pois, à impetrante uma pormenorizada e detalhada comprovação/descrição das transacções em causa (descrição dos bens ou serviços fornecidos, quantidades, local de entrega/prestação, regularidade dos fornecimentos, número e datas em que ocorreram, recursos materiais e humanos utilizados, etc.).
Sobre esta questão, pode ler-se no acórdão deste TCA Norte de 11.03.2010, proferido no recurso n.º 02794/04 o seguinte: “(…), como é manifesto, se não há limitações quanto à admissibilidade de qualquer meio de prova (cf. art. 115.º, n.º 1, do CPPT, que corresponde ao art. 134.º do CPT), deve exigir-se grande rigor na prova da materialidade e/ou da dimensão das operações referidas em facturas relativamente às quais a AT recolheu indícios sérios e credíveis de que não lhe correspondem operações reais ou de que a dimensão das operações aí referidas (com repercussão no respectivo valor) não corresponde à realidade.”
Destarte, considerando que os indícios recolhidos pela Administração Tributária configuram elementos probatórios objectivos, tendo esta cumprido o ónus probatório que sobre si impendia no sentido da fundamentação substancial do acto impugnado que a lei exige para legitimar as correcções da matéria tributável declarada, urgia que a Impetrante, para fazer vingar a sua tese, apresentasse em juízo prova capaz de atestar a veracidade das transacções desconsideradas, ou seja, oferecesse prova bastante da realidade das operações tituladas pelas facturas em apreço.
Como se refere na sentença recorrida, a Administração Tributária não questionou que a T… tivesse realizado as obras mencionadas na sua petição inicial e que se reiteram nestas alegações de recurso, por referência a toda a prova documental apresentada. Assim, desde logo, mostra-se despiciendo integrar na decisão da matéria de facto o elenco exaustivo dessas obras, como é propósito da Recorrente ao referir-se a matéria de facto omitida relevante para a decisão. Não obstante a prova documental carreada para os autos, incluindo as fotografias das obras, a mesma não releva, somente porque a inspecção tributária nunca negou a sua existência e realização.
Efectivamente, os indícios recolhidos apontam para que não tenha sido o emitente das facturas a fornecer os serviços ou a mão-de-obra necessária à realização das tais obras efectuadas pela impugnante. Isto porque o seu próprio sócio-gerente, J…, admitiu ter feito pagamentos directamente aos trabalhadores que lhe prestaram alguns serviços e não propriamente ao emitente dos documentos que contabilizou na sua escrita.
Na verdade, o que se impunha era demonstrar que foi o referido emitente F... que efectuou os serviços descritos nas facturas, pelos valores concretamente aí mencionados, o que pressupõe saber a quantidade, a regularidade dos fornecimentos/prestações, as datas em que ocorreram, os recursos materiais e humanos utilizados.
Ora, a impugnante nem sequer invocou na petição inicial factualidade com este pormenor, limitando-se a fórmulas conclusivas (cfr. toda a parte final da petição inicial respeitante ao ónus que impende sobre a impugnante), daí ser natural que não tenha convencido a Meritíssima Juíza a quo e que esta não tenha podido elencar na decisão da matéria de facto factos simples invocados. Apesar da rejeição do recurso na parte relativa à decisão da matéria de facto, não podemos deixar de dizer que a motivação do tribunal recorrido não se nos apresenta com as contradições e incongruências alegadas (cfr. pontos 7 e 8 das conclusões), nem, à primeira vista, com erros ostensivos ou palmares.
Assim, verifica-se que a Impugnante não logrou fazer a referida prova, conservando-se intactos os indícios de simulação apurados pela Administração Tributária.
E, tal como já referido supra, não colhem os argumentos avançados pela Recorrente de que as liquidações impugnadas se basearam nas informações da Administração Tributária quanto ao fornecedor/emitente, porquanto resulta do Relatório de Inspecção Tributária (RIT) que a administração recolheu indícios também junto da Impugnante/Recorrente, nomeadamente ao nível dos meios de pagamento, constatando que a totalidade das facturas em apreço terá sido paga em numerário, sendo, por isso, muito difícil a impugnante provar o efectivo recebimento dos montantes inscritos nas mesmas por parte de F....
Aliás, perante os indicadores recolhidos, a Administração Tributária efectivamente tentou obter esclarecimentos junto da Impugnante que, se fornecidos, poderiam eventualmente anular ou afastar a suspeita de falsidade que recaía sobre a facturação permitida por aqueles elementos referentes ao emitente, tendo até as suas afirmações induzido, como vimos, no sentido de que os trabalhos terão sido efectuados por uma equipa de trabalhadores que exercem a sua actividade sobre a direcção dos responsáveis da T…, cabendo a F... a mera emissão das facturas que descrevem os trabalhos efectuados.
Assim, perante o quadro indiciário que suporta a conclusão da Administração Tributária de que as facturas em causa não se reportam a prestações efectivas (cumprindo, assim, o ónus da prova que, neste ponto, lhe competia) e não tendo a Recorrente logrado fazer a prova de que adquiriu os serviços e que os mesmos lhe foram prestados pelo emitente das facturas, e não tendo esse julgamento sobre a matéria de facto sido questionado, pelo menos eficazmente, pela Recorrente, que não cumpriu o ónus estabelecido no artigo 685º-B, do CPC, a apreciação do mérito do recurso terá de ser efectuada de acordo com a factualidade dada como provada e não provada pelo tribunal recorrido, com as alterações nesta instância efectuadas.
Destarte, atentos os indícios de falsidade das transacções recolhidos pela Administração Tributária e não tendo a Impugnante cumprido o ónus probatório que sobre si impendia no sentido de demonstrar que as facturas em causa titulam efectivas transacções de serviços, bem andou a sentença recorrida ao decidir manter inalteradas as liquidações impugnadas.
O exposto é suficiente para concluir pela desconsideração dos “gastos fiscais” e, consequentemente, que não se verifica o alegado erro de julgamento assacado à sentença recorrida, não merecendo a mesma censura.

Conclusões/Sumário

I - A nulidade da sentença, por omissão de pronúncia, tem lugar apenas quando se verifica uma violação dos deveres de pronúncia do Tribunal sobre questões que deveria conhecer, o que significa que o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.
II - A falta de especificação, pela Recorrente, dos concretos pontos de facto que na sentença foram dados como provados ou não provados e que considera incorrectamente julgados, bem como dos concretos meios probatórios, constantes de registo fonográfico, que impunham decisão sobre pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida, impede o Tribunal “ad quem” de reapreciar a decisão proferida sobre a matéria de facto. Pretendendo a Recorrente impugnar o julgamento sobre a matéria de facto efectuado pelo tribunal de 1ª instância, tem de cumprir esse ónus decorrente do disposto no artigo 685.º-B, n.º 1, alíneas a) e b) do CPC ex vi artigo 281.º do CPPT.
III - A presunção legal de que as declarações apresentadas pelos contribuintes à administração tributária são verdadeiras cessa, nomeadamente, se essas declarações ou os respectivos dados de suporte apresentarem omissões, erros ou inexactidões ou forem recolhidos indícios fundados de que não reflectem ou impedem o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo (artigo 75.º da LGT).
IV - Quando a liquidação de IRC tem por fundamento a não aceitação de custos declarados pelo contribuinte, por considerar que as facturas em que este os pretende suportar não correspondem a operações realmente efectuadas, compete à administração tributária fazer a prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação.
V - Feita essa prova, cabe ao contribuinte o ónus da prova dos factos que alegou como fundamento do seu direito a fazer reflectir negativamente os custos declarados na determinação da respectiva matéria tributável.

IV. Decisão

Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso.
Custas a cargo da recorrente, nos termos da tabela I-B – cfr. artigos 6.º, n.º 2, 7.º, n.º 2 e 12.º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais.
Porto, 21 de Dezembro de 2016.
Ass. Ana Patrocínio
Ass. Paula Moura Teixeira
Ass. Fernanda Esteves