Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00907/11.0BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:09/30/2021
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Paulo Moura
Descritores:PESSOA COLETIVA DE UTILIDADE PÚBLICA; ISENÇÃO DE IMI; RECONHECIMENTO OFICIOSO; ARTIGO 44.º DO EBF; ARTIGO 12.º DO EBF.
Sumário:I – As pessoas coletivas dotadas de mera utilidade pública estão isentas de IMI em relação aos prédios destinados diretamente à realização dos seus fins, nos termos da alínea e) do n.º 1 do artigo 44.º do EBF.

II – A referida isenção é reconhecida oficiosamente, desde que se verifique a inscrição na matriz em nome do beneficiário (n.º 4 do artigo 44.º do EBF) e deve reportar-se à data da verificação dos respetivos pressupostos substanciais, tal como refere o artigo 12.º do EBF.
Recorrente:Autoridade Tributária e Aduaneira
Recorrido 1:Sport Clube (...)
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de o conhecimento do recurso ser deferido ao Supremo Tribunal Administrativo.
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Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
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O Chefe do Serviço de Finanças da (...), interpõe recurso do Acórdão proferido pelo TAF do Porto que julgou procedente a Ação Administrativa Especial, intentada pelo Sport Clube (...), na qual era peticionada a isenção de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI).

Formula nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem:

I) Vem o presente recurso interposto da sentença proferida em 28/02/2014 e que julgou procedente a acção, tendo em consequência, anulado o acto impugnado, e reconhecido o direito ao Autor à isenção de IMI nos termos em que foi requerida.
II) A sentença recorrida, salvo o devido respeito, incorreu no erro de julgamento, quer por errada apreciação e fixação da matéria de facto relevante, quer por errada interpretação do direito, nomeadamente por violação do artigo art.º 44 n.ºs 4, 7 e 8 do EBF, pelo que se pugna pela sua revogação.
III) Nos presentes autos, o Autor pedia a anulação do despacho do Chefe do Serviço de Finanças de (...) de 27 de Dezembro de 2010, proferido no Processo de isenção de IMI n02229392, o qual revogou o anterior despacho de 20/12/2010 e reconheceu a isenção a partir do ano de 2011.
IV) Ora, de acordo com os documentos constantes dos autos, a sentença recorrida não deu como provados factos relevantes e que influenciaram erradamente a decisão da causa.
V) Nomeadamente, o facto de o Autor ter apresentado uma declaração Mod 1 para inscrição na Matriz do imóvel em causa em 02/06/2010, o qual constava anteriormente como prédio rústico sob o artigo 739.
VI) Esse facto é relevante e consta na informação do Serviço de Finanças, que é parte integrante do PA a fls. 13, e como tal foi invocado pela entidade recorrida na sua contestação no articulado nº 7, pois é desse facto que começa a correr o prazo para apresentar o pedido de isenção de IMI.
VII) Sucede que, este facto origina que o Imóvel passe a ter nova inscrição, que o classifica como "Outros", em vez de "Rústico". Logo, passa a ter novo artigo na matriz, e é dai que começa correr um prazo para ser requerida a isenção de imposto, nos termos do artigo 44° n.º 8 do EBF.
VIII) Como a atribuição da isenção depende do facto de ser requerida em tempo cfr n.º 9 do artº 44 do EBF, como tal não sucedeu, que a isenção foi concedida a partir do ano imediato, inclusive ao da apresentação do requerimento.
IX) Também não consta da matéria de facto provada, a notificação do Projecto de decisão de indeferimento do pedido de isenção, feita por ofício 007206115 de 14/12/2010, nos termos do artigo 60° da LGT, para exercer o direito de audição, e que consta a fls. 9 do PA.
X) É com fundamento nessa notificação que o Autor, ora recorrido para fazer prova de que tinha a situação contributiva regularizada, vem juntar as certidões constantes dos factos C e D do probatório.
XI) Assim, entende a ER que a douta sentença recorrida errou na fixação da matéria de facto que deu como provada, e que para uma correcta decisão da causa, devem ao probatório ser aditados os seguintes factos: "O Autor entregou em 02/06/2010 uma declaração Modelo 1, referente a um Estádio desportivo que estava indevidamente inscrito na matriz predial Rústica sob o artigo 739 da freguesia a concelho da (...).";
XII) O outro facto a ser aditado deverá consignar o seguinte: «O Autor foi notificado do Projecto de decisão de indeferimento do pedido de isenção constante no ponto A, através de ofício 007206115 de 14/12/2010, para exercer o direito de audição nos termos do artigo 60° da LGT, e para fazer prova de que tinha a situação contributiva regularizada.».
XIII) No que se refere à apreciação das questões de direito, salvo o devido respeito, a Entidade Recorrido entende que a sentença recorrida faz uma errada apreciação dos normativos aplicáveis.
XIV) A sentença recorrida defende que, ao caso não são aplicáveis o n.º 8 e o n.º 9 do artigo 44º do EBF, pois, no seu entender o reconhecimento do benefício faz-se oficiosamente, nos termos do n.º 4 desse artigo.
XV) Mas, salvo o devido respeito, a sentença recorrida não faz uma correcta interpretação desses normativos, desde logo, porque o momento que releva para a atribuição deste benefício e que vai desencadear todo este procedimento é a apresentação do Modelo 1 de IMI e o pedido de isenção que foi formalizado posteriormente.
XVI) De facto, a apresentação da modelo 1 de IMI pelo ora recorrido em 02/06/2010, veio desencadear uma nova inscrição na matriz predial urbana, o que para efeitos de IMI, originou a Liquidação adicional desse imposto até ao ano de 2006 nos termos do artigo 113° n.º 3 e 116º do CIMI.
XVII) Ora, perante a criação de um novo artigo urbano e a consequente liquidação adicional de imposto sobre imóveis, cumpria à AT aplicar o n.º 8 e 9 do artigo 44° do EBF.
XVIII) Conforme se vem sustentando, o momento em que é requerida a isenção de Imposto é por isso, determinante, tal como estabelece o artigo 44º n.º 8 do EBF.
XIX) Ali se determina, que o pedido de isenção deve ser apresentado no prazo de 60 dias, contado da verificação do facto determinante da isenção e o pedido foi apresentado indiscutivelmente, muito para além desse prazo.
XX) Por essa razão, e tal como prevê o código do IMI no n.º 3 do artigo 113°, o imposto tem que ser liquidado desde 2006, de acordo com o prazo de caducidade (art° 116° CIMI).
XXI) Deste modo, a AT, com fundamento nessa disposição legal, e no facto de o anterior despacho não ter sido proferido em conformidade com o n.º 9 do artigo 44° do EBF, determinou a sua revogação.
XXII) Assim, tal como dispõe o n.º 9 do artigo 44° do EBF, a isenção requerida só podia ser concedida a partir do ano de 2011, ou seja o ano seguinte ao da apresentação do pedido, razão pela qual, o despacho agora visado foi praticado em cumprimento das disposições legais aplicáveis.
XXIII) Pelo supra exposto, a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, quer por errada apreciação e fixação da matéria de facto relevante, quer por errada interpretação do direito, nomeadamente por incorrer em violação do artigo art.º 44 n.ºs 4,7 e 8 do EBF, pelo que se pugna pela sua revogação.

Termos pelos quais e, com o douto suprimento de V. Exas., deve ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional e, em consequência, ser revogada a sentença recorrida, com as legais consequências.

Não foram apresentadas contra-alegações.

O Ministério Público emitiu parecer no sentido de o conhecimento do recurso ser deferido ao Supremo Tribunal Administrativo, por estar em causa apenas matéria de direito.

O Chefe do Serviço de Finanças responde, dizendo que o recurso não visa apenas matéria de direito, mas também pretende que seja alterada a matéria de facto, por isso é competente o Tribunal Central Administrativo Norte.

Foram dispensados os vistos legais, nos termos do n.º 4 do artigo 657.º do Código de Processo Civil, com a concordância das Exmas. Desembargadoras Adjuntas, atenta a disponibilidade do processo na plataforma SITAF (Sistema de Informação dos Tribunais Administrativos e Fiscais).
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Delimitação do Objeto do Recurso – Questões a Decidir.

As questões suscitadas pela Recorrente, delimitada pelas alegações de recurso e respetivas conclusões [vide artigos 635.º, n.º 4 e 639.º CPC, ex vi alínea e) do artigo 2.º, e artigo 281.º do CPPT] são as de saber se o imóvel em apreço nos autos beneficia de isenção de IMI, nos termos pretendidos, sem prejuízo de antes ser apreciada a competência em razão da hierarquia deste tribunal.
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Relativamente à matéria de facto, o tribunal, deu por assente o seguinte:

Factos provados:
A. A 07 de Dezembro de 2010, a autora deu entrada no Serviço de Finanças da (...) requerimento a solicitar a isenção de IMI referente ao prédio urbano inscrito sob o artigo 10342 da freguesia de (...), o qual se considera aqui integralmente reproduzido - cfr. fls. 2 do P.A.;
B. A autora é uma pessoa colectiva, a qual foi declarada de utilidade pública a 27 de Outubro de 1980 - cfr. certidão de fls. 3 a 7 do PA;
C. A 20 de Dezembro de 2010 foi emitida certidão pelo Serviço de Finanças de (...), a qual se considera aqui integralmente reproduzida e na qual consta que a autora “( ... ) tem a sua situação tributária regularizada, visto que, não obstante ser devedora à Fazenda Nacional, está a proceder ao pagamento da dívidas nas condições e termos autorizados.”) ._- cfr. certidão de fls. 8 do P.A,;
D. A 17 de Dezembro de 2010 a Segurança Social emitiu declaração, a qual se considera aqui integralmente reproduzida e na qual consta "declara-se que a entidade contribuinte acima identificada tem a sua situação contributiva regularizada perante a Segurança Social." - cfr. certidão de fls. 10;
E. A 20 de Dezembro de 2010 foi proferido despacho a deferir o requerimento referido em A) - cfr. fls. 13;
F. A 27 de Dezembro de 2010 é proferido despacho, o qual se considera aqui integralmente reproduzido, no qual é revogado o despacho referido em E), mas concedendo a isenção de IMI com efeitos a partir do ano de 2011 - cfr. fls. 13 a 14 do P.A.;
G. A oponente foi notificada do despacho referido em F) mediante carta registada com aviso de recepção assinado a 30 de Dezembro de 2010 - cfr. fls. 16-v;
H. Os presentes autos deram entrada a 23 de Março de 2011 - cfr. fls. 2;

Factos não provados
Para a decisão da causa, sem prejuízo das conclusões ou alegações de matéria de direito produzidas, de relevante, nada mais se provou.

Fundamentação da matéria de facto
A decisão da matéria de facto, consonante ao que acima ficou exposto, efectuou-se exclusivamente com base nos documentos e informações constantes do processo, nomeadamente, do documento junto com a petição inicial.
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Apreciação jurídica do recurso.

Em primeiro lugar compete apreciar a eventual incompetência em razão da hierarquia deste Tribunal, conforme suscitado pelo Ministério Público.

Convém, desde já, esclarecer que o presente processo corresponde a uma ação administrativa especial, regulada integralmente pelo Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), conforme a redação inicial desde diploma.

Daqui resulta, que ao caso não é aplicável o Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT), pelo que não é possível empregar o regime estabelecido no seu do artigo 280.º, n.º 1.

O regime a aplicar é o que se encontra estabelecido no artigo 140.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, que refere o seguinte:
Artigo 140.º (Regime aplicável)
Os recursos ordinários das decisões jurisdicionais proferidas pelos tribunais administrativos regem- -se pelo disposto na lei processual civil, com as necessárias adaptações, e são processados como os recursos de agravo, sem prejuízo do estabelecido na presente lei e no Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais.
O CPTA, não estabelece as competências em razão da hierarquia, uma vez que as mesmas se encontram definidas no Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF), da seguinte forma:
Artigo 38.º (Competência da Secção de Contencioso Tributário)
Compete à Secção de Contencioso Tributário de cada tribunal central administrativo conhecer:
a) Dos recursos de decisões dos tribunais tributários, salvo o disposto na alínea b) do artigo 26.º;

Artigo 26.º (Competência da Secção de Contencioso Tributário)
Compete à Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo conhecer:
a) Dos recursos dos acórdãos da Secção de Contencioso Tributário dos tribunais centrais administrativos, proferidos em 1.º grau de jurisdição;
b) Dos recursos interpostos de decisões dos tribunais tributários com exclusivo fundamento em matéria de direito;

Ora, conforme se deteta pelo teor das conclusões de recurso XI e XII (acima transcritas), o Recorrente pretende que sejam aditados dois factos ao probatório, pelo que o recurso não tem exclusivamente como fundamento a matéria de direito.

Considerando que o Supremo Tribunal Administrativo, apenas conhece os recursos interpostos com fundamento em a matéria de direito, conforme dispõe a alínea b) do artigo 26.º do ETAF e, neste caso concreto a Recorrente pretende alteração da matéria de facto, conclui-se que não pode ser hierarquicamente competente o STA para este recurso.

Significa isto, que, nos termos da alínea a) do artigo 38.º do ETAF, compete ao Tribunal Central Administrativo conhecer o recurso.

Termos em que se declara o Tribunal Central Administrativo Norte hierarquicamente competente para conhecer o presente recuso.
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Compete agora apreciar o recurso na vertente em que é pedida a ampliação da matéria de facto.
Entende a Recorrente que faz toda a diferença, o facto de o imóvel ter estado anteriormente inscrito na matriz como prédio rústico, sendo que o Autor apenas alterou a sua inscrição quando entregou a declaração modelo 1 do IMI, em 06/06/2010, indicando tratar-se de um estádio desportivo.
Ora, compulsados os autos e analisado o Processo Administrativo, não consta em nenhum deles o modelo 1 do IMI, a que o Recorrente alude. Assim, não é possível dar como assente o que consta diretamente dessa declaração modelo 1 do IMI.
Desta forma, torna-se inviável aditar o pretendido facto ao probatório.
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Pretende, igualmente, o Recorrente que seja aditada a notificação realizada ao Autor através do ofício n.º 007206115, de 14/12/2010, que consubstanciava o projeto de indeferimento do pedido de isenção, assim como para o exercício do direito de audição prévia e para fazer prova de que tinha a situação contributiva regularizada. Mais refere que só após essa notificação, é que o Autor veio fazer prova dos factos C) e D) do probatório (certidões de que não tinha dívidas ao fisco e à Segurança Social).
O referido ofício encontra-se a fls. 9 do processo administrativo, sendo que poderá ser eventualmente pertinente para a análise da causa, pelo que se adita o seu conteúdo á matéria de facto.
Face ao exposto, passa-se a transcrever o ofício em referência.
I)
«N.º Ofício 007206115 N.º processo 002229392 Identificação Fiscal …
Assunto: Imposto Municipal sobre imóveis – Notificação Art.º 60.º da LGT
Proc. isenção n.º 2229392 – Art.º 44 EBF, al. E) – P. Colect. Util. Pub Administr. E de Util. Pública
Notifica-se V. Exª para que, no prazo de 15 dias exerça, querendo o direito de audição, por escrito ou oralmente, sobre o projecto de decisão infra, do pedido de isenção do Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) à margem referenciado, nos termos previstos no artigo 60.º da Lei Geral Tributária.
Optando pela primeira hipótese, a petição escrita deverá ser enviada para este Serviço fazendo referência ao ofício e processo acima indicados.
No caso de pretender pronunciar-se oralmente deverá comparecer, dentro do mesmo prazo, neste Serviço e fim de ser lavrado o termo de declarações.
Projecto de decisão: indeferimento.
Fundamentos:
Contribuinte com dívidas no sistema de execução fiscal (fisco e/ou segurança social).
Deverá fazer a prova de que tem a situação contributiva regularizada perante a Segurança Social e o Fisco.».
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Continuando a análise do recurso, refira-se que o despacho impugnado, que foi dado como reproduzido na alínea F) da matéria de facto, vai de seguida ser transcrito na íntegra para sua melhor apreensão e por se afigurar pertinente para explicitar melhor os contornos da causa.
O despacho em causa contém o seguinte teor:
«DESPACHO
O sujeito passivo acima identificado, doravante designado de "V.", solicitou em 2010/12/07 a isenção de IMI, para o prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de (...), sob o artigo 10342, com o fundamento de destinar o prédio directamente à realização dos fins prosseguidos pelo Clube.
A isenção foi requerida ao abrigo da alínea e) do nº 1 do art.º 44° do EBF.
Por despacho proferido em 2010/12/20 foi o pedido deferido, com efeitos reportados ao ano de 2006.
Os Factos
O V. apresentou em 02 de Junho de 2010 uma declaração modelo 1 de IMI, com vista à inscrição na matriz de um estádio desportivo; depois de concluído o procedimento de avaliação o prédio foi inscrito na matriz predial urbana da freguesia de (...), sob o artigo 10342.
Anteriormente estava indevidamente inscrito sob o artigo 739 rústico.
Aquela declaração modelo 1 produziu efeitos, em sede de liquidação de IMI, ao ano de 2006, tendo em conta o prazo de caducidade previsto no art° 45° da LGT.
O Direito
Dispõe o art.º 44° do Estatuto dos Benefícios fiscais, no que ao presente caso diz respeito:
Artigo 44.º
Isenções
1 - Estão isentos de imposto municipal sobre imóveis:
e) As pessoas colectivas de utilidade pública administrativa e as de mera utilidade pública, quanto aos prédios ou parte de prédios destinados directamente à realização dos seus fins;
2 - As isenções a que se refere o número anterior iniciam-se:
b) Relativamente às situações previstas nas alíneas e) e f), a partir do ano, inclusive, em que se constitua o direito de propriedade;
8 - Nos restantes casos previstos neste artigo, a isenção é reconhecida pelo chefe do serviço de finanças da área da situação do prédio, em requerimento devidamente documentado, que deve ser apresentado pelos sujeitos passivos no serviço de finanças da área da situação do prédio, no prazo de 60 dias contados da verificação do facto determinante da isenção. (Redacção dada pela Lei n.º 3-B/2010-28/04)
9 - Nas situações abrangidas nos n.os 7 e 8, se o pedido for apresentado para além do prazo aí referido, a isenção inicia-se a partir do ano imediato, inclusive, ao da sua apresentação. (redacção dada pela Lei n.º 3-B/2010-28/04)”
Considerações, tendo presente matéria factual e de direito
O V. é titular do direito de propriedade de um terreno afecto à prática desportiva. Este terreno encontrava-se inscrito na matriz como prédio rústico inscrito sob o artigo 739. Não se tratando de prédio rústico, por não se subsumir na previsão do art.º 3° do CIMI, foi o V. convidado oralmente a regularizar a situação.
Fê-lo através da declaração modelo 1 de IMI em 2010/06/02.
Quando se tornou definitivo o procedimento de avaliação, foi o prédio inscrito na matriz, como urbano, na classificação "Outros", de conformidade com o art.º 6° n.º 1 alínea a) e n.º 4 do CIMI.
Por se tratar de uma actualização/omissão, porque aquela parcela de terreno já se destinava à prática desportiva, há vários anos, foram efectuadas liquidações adicionais (art Q 113°/3 do GIMI), desde o ano de 2006, atento ao prazo de caducidade estipulado no art.º 116° do CIMI.
O prédio foi participado, através de declaração modelo 1 de IMI em 2010/06/02 e o pedido de isenção em 2010/12/20.
O V. reúne os requisitos para que lhe seja reconhecida a isenção, para o prédio em questão, ao abrigo da alínea e) do n.º 1 do art.º 44° do EBF.
Nos termos da alínea b) n.º 2 do mesmo art.º 44º, esta isenção conta-se a partir do ano, inclusive, em que se constitua o direito de propriedade.
Porém, informa o n.º 8º ainda do mesmo art.º 44º que o pedido de isenção deve ser apresentado, no prazo de 60 dias, contados da verificação do facto determinante da isenção e o n.º 9 fixa a sanção quando o pedido é apresentado para além daquele prazo.
Como já se referiu, o facto determinante da isenção, ocorre com a afectação do prédio à realização dos fins do V., o que terá acontecido há já vários anos.
O pedido ao ser apresentado em 2010/12/20 é muito para além do prazo de 60 dias, estabelecido na já citada norma.
Acontece também que o prédio rústico que dá origem ao actual urbano, classificado de outros, também não vinha beneficiando de qualquer isenção, nem tal poderia acontecer, dado tratar-se de um rústico e como tal não poderia fazer parte do objecto do V..
Tendo presente o exposto, a isenção concedida por despacho proferido em 2010/12/20, viola o disposto no n.º 9 do art.º 44° do EBF (Redacção dada pela Lei n.º 3-B/2010-28/04), porquanto os efeitos do pedido não poderia retroagir a anos anteriores.
Como o acto administrativo que concedeu a isenção com efeitos reportados a anos anteriores, viola normas juridicamente aplicáveis ao caso concreto, é um acto anulável e como tal pode ser revogado (art.º 135° e 136° do CPA).
A revogabilidade do acto está em tempo, por não ter decorrido o prazo para interpor o recurso contencioso (art.º 141º/1 do CPA).
Assim, revogo o meu despacho proferido em 20 de Dezembro último e em sua substituição, mantenho o deferimento do pedido, concedendo a isenção de IMI, para o prédio acima identificado, mas com efeitos a partir do ano de 2011, inclusive, ano seguinte ao da apresentação do pedido.
Contra a decisão poderá recorrer hierarquicamente ou contenciosamente.
Aos 2010/12/27
O Chefe de Finança Adjunto,
(por delegação)».
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Passemos agora a apreciar o mérito do recurso.

Segundo o ato impugnado, o Autor somente beneficia da isenção de IMI a partir do ano de 2011, uma vez que tendo efetuado em 2010 a inscrição na matriz do imóvel destinado à prática desportiva, não pode beneficiar de isenção em data anterior àquela inscrição, assim como apenas pode usufruir dessa isenção a partir do ano seguinte ao do respetivo pedido.
Se bem interpretado o despacho impugnado, o prédio não pode beneficiar retroativamente da isenção de IMI, como imóvel destinado à prática desportiva, mas já pode ser tributado retroativamente, uma vez que já era destinado há vários anos à prática desportiva.
Para este entendimento o despacho impugnado socorreu-se do regime previsto nos nos. 8 e 9 do artigo 44.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, conforme se pode ler pelo que acima fica transcrito.
Por sua vez, a sentença considerou que o n.º 9 do artigo 44.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, não é aplicável ao caso, para o efeito tendo dito o seguinte:
Na verdade, resulta expressamente da letra da lei que o reconhecimento da isenção é oficioso desde que na matriz predial respectiva conste como proprietário a pessoa colectiva de utilidade pública.
Concluindo-se, assim, que o reconhecimento de isenção não depende de reconhecimento algum por parte do Chefe de Finanças - mediante documento devidamente documentado - pois se assim fosse, nenhum sentido faria existir o supra referido nº 4 do artigo 44, pois recairiam todas as situações na previsão legal do nº 8 do sempre mencionado artigo.
Por conseguinte, à presente situação não é aplicável o n° 9 do referido artigo 44° do EBF (ao contrário do que consta do despacho), o qual só é aplicável às situações referidas nos nºs 7 e 8 - e que serviu de fundamentação no despacho em análise para que fosse liquidado IMI dos anos de 2006 a 2010.
Assim sendo, conclui este colectivo que assiste razão à Autora e, por conseguinte, a presente acção tem que ser, forçosamente, considerada procedente.

Para melhor apreensão da questão em apreço, passamos a transcrever o artigo 44.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF), na redação aplicável à data dos factos, que era a dada pela Lei n.º 3-B/2010, de 28 de abril.

CAPÍTULO VII
Benefícios fiscais relativos a bens imóveis
Artigo 44.º (Isenções)
1 - Estão isentos de imposto municipal sobre imóveis:
a) Os Estados estrangeiros, quanto aos prédios destinados às respectivas representações diplomáticas ou consulares, quando haja reciprocidade;
b) As instituições de segurança social e de previdência, a que se referem artigos 115.º e 126.º da Lei n.º 32/2002, de 20 de Dezembro, quanto aos prédios ou partes de prédios destinados directamente à realização dos seus fins;
c) As associações ou organizações de qualquer religião ou culto às quais seja reconhecida personalidade jurídica, quanto aos templos ou edifícios exclusivamente destinados ao culto ou à realização de fins não económicos com este directamente relacionados;
d) As associações sindicais e as associações de agricultores, de comerciantes, de industriais e de profissionais independentes, quanto aos prédios ou parte de prédios destinados directamente à realização dos seus fins;
e) As pessoas colectivas de utilidade pública administrativa e as de mera utilidade pública, quanto aos prédios ou parte de prédios destinados directamente à realização dos seus fins;
f) As instituições particulares de solidariedade social e as pessoas colectivas a elas legalmente equiparadas, quanto aos prédios ou parte de prédios destinados directamente à realização dos seus fins, salvo no que respeita às misericórdias, caso em que o benefício abrange quaisquer imóveis de que sejam proprietárias;
g) As entidades licenciadas ou que venham a ser licenciadas para operar no âmbito institucional da Zona Franca da Madeira e da Zona Franca da ilha de Santa Maria, quanto aos prédios ou parte de prédios destinados directamente à realização dos seus fins;
h) Os estabelecimentos de ensino particular integrados no sistema educativo, quanto aos prédios ou parte de prédios destinados directamente à realização dos seus fins;
i) As associações desportivas e as associações juvenis legalmente constituídas, quanto aos prédios ou parte de prédios destinados directamente à realização dos seus fins;
j) Os prédios ou parte de prédios cedidos gratuitamente pelos respectivos proprietários, usufrutuários ou superficiários a entidades públicas isentas de imposto municipal sobre imóveis enumeradas no artigo 11.º do respectivo Código, ou a entidades referidas nas alíneas anteriores, para o prosseguimento directo dos respectivos fins;
l) As sociedades de capitais exclusivamente públicos, quanto aos prédios cedidos a qualquer título ao Estado ou a outras entidades públicas, no exercício de uma actividade de interesse público;
m) As colectividades de cultura e recreio, as organizações não governamentais e outro tipo de associações não lucrativas, a quem tenha sido reconhecida utilidade pública, relativamente aos prédios utilizados como sedes destas entidades, e mediante deliberação da assembleia municipal da autarquia onde os mesmos se situem, nos termos previstos pelo n.º 2 do artigo 12.º da Lei n.º 2/2007, de 15 de Janeiro;
n) Os prédios classificados como monumentos nacionais e os prédios individualmente classificados como de interesse público ou de interesse municipal, nos termos da legislação aplicável.
2 - As isenções a que se refere o número anterior iniciam-se:
a) Relativamente às situações previstas nas alíneas a) a d), g) a i) e m), no ano, inclusive, em que o prédio ou parte de prédio for destinado aos fins nelas referidos;
b) Relativamente às situações previstas nas alíneas e) e f), a partir do ano, inclusive, em que se constitua o direito de propriedade;
c) Nos casos previstos nas alíneas j) e l), no ano, inclusive, em que se verifique a cedência;
d) Relativamente às situações previstas na alínea n), no ano, inclusive, em que ocorra a classificação.
3 - A isenção a que se refere a alínea a) do n.º 1 é reconhecida por despacho do Ministro das Finanças, a requerimento das entidades interessadas.
4 - As isenções a que se refere a alínea b) do n.º 2 são reconhecidas oficiosamente, desde que se verifique a inscrição na matriz em nome das entidades beneficiárias, que os prédios se destinem directamente à realização dos seus fins e que seja feita prova da respectiva natureza jurídica.
5 - A isenção a que se refere a alínea n) do n.º 1 é de carácter automático, operando mediante comunicação da classificação como monumentos nacionais ou da classificação individualizada como imóveis de interesse público ou de interesse municipal, a efectuar pelo Instituto de Gestão do Património Arquitectónico e Arqueológico, I. P., ou pelas câmaras municipais, vigorando enquanto os prédios estiverem classificados, mesmo que estes venham a ser transmitidos. (Redação da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril)
6 - Para os efeitos previstos no número anterior, os serviços do Instituto de Gestão do Património Arquitectónico e Arqueológico, I. P., e as câmaras municipais procedem à referida comunicação, relativamente aos imóveis já classificados à data da entrada em vigor da presente lei: (Redação da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril)
a) Oficiosamente, no prazo de 60 dias; ou (Redação da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril)
b) A requerimento dos proprietários dos imóveis, no prazo de 30 dias a contar da data de entrada do requerimento nos respectivos serviços. (Redação da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril)
7 - A isenção a que se refere a alínea g) do n.º 1 é reconhecida pelo director-geral dos Impostos, em requerimento devidamente documentado, que deve ser apresentado pelos sujeitos passivos no serviço de finanças da área da situação do prédio, no prazo de 60 dias contados da verificação do facto determinante da isenção. (Redação da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril)
8 - Nos restantes casos previstos neste artigo, a isenção é reconhecida pelo chefe do serviço de finanças da área da situação do prédio, em requerimento devidamente documentado, que deve ser apresentado pelos sujeitos passivos no serviço de finanças da área da situação do prédio, no prazo de 60 dias contados da verificação do facto determinante da isenção. (Redação da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril)
9 - Nas situações abrangidas nos n.os 7 e 8, se o pedido for apresentado para além do prazo aí referido, a isenção inicia-se a partir do ano imediato, inclusive, ao da sua apresentação. (Redação da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril)
10 - Os benefícios constantes das alíneas b) a m) do n.º 1 cessam logo que deixem de verificar-se os pressupostos que os determinaram, devendo os proprietários, usufrutuários ou superficiários dar cumprimento ao disposto na alínea g) do n.º 1 do artigo 13.º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis, e os constantes da alínea n) cessam no ano, inclusive, em que os prédios venham a ser desclassificados. (Anterior 8 - Redação da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril)
11 - As isenções resultantes de acordo entre o Estado e quaisquer pessoas, de direito público ou privado, são mantidas na forma da respectiva lei. (Anterior 9 - Redação da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril)

Ora, a decisão impugnada aceita a inscrição na matriz de prédio destinado à atividade do clube (que no caso, é a atividade desportiva) para a tributar retroativamente, mas já não aceita a mesma inscrição na matriz para a isentar retroativamente, para o efeito referindo que apenas pode haver isenção no ano seguinte ao do pedido, uma vez que esse pedido não foi realizado no prazo de 60 dias contados do destino do prédio para a prática da atividade desportiva.

Se bem lido o preceito (n.º 4 do artigo 44.º EBF), o mesmo apenas se refere à inscrição na matriz para que a isenção seja reconhecida oficiosamente, não que apenas possa ter efeitos após essa inscrição na matriz. Bem se compreende que assim seja, pois que somente após a inscrição na matriz de um prédio com o destino que possibilita uma isenção de IMI, é que passa a ser oficiosamente conhecido com esse fim. Portanto, o regime da inscrição na matriz, é apenas um pressuposto formal para a isenção de IMI, não um pressuposto substancial.
Aliás, segundo refere o despacho impugnado acima transcrito, foi na sequência do pedido verbal do Serviço de Finanças, que o Autor foi inscrever o prédio na matriz como urbano destinado à prática desportiva, uma vez que anteriormente se encontrava inscrito como rústico. Mais um motivo para que o reconhecimento oficioso pudesse ser realizado.
Convém recordar que este n.º 4 do artigo 44.º, refere que são reconhecidas oficiosamente as isenções mencionadas na alínea b) do n.º 2, sendo que esta alínea refere-se às alíneas e) e f) do n.º 1, no caso tendo aplicação a alínea e), ou seja, os prédios das pessoas coletivas de utilidade pública destinados à realização dos seus fins.
Cumpre ainda analisar a sistemática do artigo 44.º do EBF, que depois de elencar no n.º 1 as situações passíveis de benefícios fiscais, em treze alíneas – a) a m), passa a partir do n.º 2, a descrever a forma como são reconhecidas as isenções, sendo uma pelo Ministro das Finanças, outras oficiosamente, outras de carácter automático, outras pelo Diretor-Geral dos Impostos e as demais pelo Chefe do Serviço de Finanças.
Ora, se o n.º 4 estabelece que a isenção das pessoas coletivas com utilidade pública é automática, após a inscrição na matriz, pelo que não pode ser aplicado o n.º 8, sob pena de contradição legal, pois que este n.º 8 faz depender a isenção de um requerimento devidamente documentado, apresentado no prazo de 60 dias contados da verificação do facto determinante da isenção.
Esta previsão valeria para a situação em apreço, caso o prédio já estivesse inscrito como destinado a fins desportivos e o clube não tivesse utilidade pública nessa ocasião, ou seja, apenas adquiriria o estatuto de utilidade pública após o prédio estar inscrito na matriz como destinado a fins desportivos.

Na situação dos autos não foi isso que sucedeu, uma vez que o clube já era detentor de utilidade pública [desde 27/10/1980 – conforme dado por assente na alínea B) da matéria de facto] antes do prédio estar inscrito na matriz como destinado a fins desportivos. Assim, a lei dizer que é de conhecimento oficiosa e ao mesmo tempo dizer que é o sujeito passivo que deve requerer a isenção, é uma contradição, pois que se é oficioso, não precisa de ser requerido.
Portanto, se o n.º 4 do artigo 44.º do EBF refere que a isenção é reconhecida oficiosamente, assim que inscrito o prédio na matriz, não pode ao mesmo tempo dizer que afinal não é oficiosa, mas depende de requerimento do interessado e só pode ter efeitos para futuro, se o pedido não foi efetuado no prazo de sessenta dias contados da verificação do facto determinante da isenção.

No sentido de que este tipo de reconhecimento é oficioso já se pronunciou o Supremo Tribunal Administrativo no Acórdão proferido em 03/10/2018, no processo n.º 0734/13.0BEPNF, assim como no Acórdão proferido em 22/02/2017, no processo n.º 01658/15 (ambos em www.dgsi.pt), cujo sumário se transcreve:
I - A isenção a que alude o artigo 44º, n.º 1, al. e) do EBF, apenas respeita aos prédios que estão directamente afectos aos fins estatutários da pessoa colectiva de utilidade pública, v.g., os necessários à instalação da sua sede, delegações e serviços indispensáveis aos fins estatutários, sendo o seu reconhecimento oficioso nos termos do disposto no artigo 44º, n.º 4 do mesmo EBF.
II - A isenção prevista no artigo 1º, al. d) da Lei n.º 151/99 mantém-se presentemente em vigor e abrange apenas os prédios urbanos que pertençam às pessoas colectivas de utilidade pública, que se encontrem destinados à realização dos fins estatutários e carece de reconhecimento por parte do órgão competente, dependente de pedido expressamente formulado nesse sentido pela interessada.

Analisando o regime de isenção de IMI em apreço, conclui-se ser necessária a verificação de pressupostos substanciais e formais, conforme a seguir indicados.
Os pressupostos substanciais são três, a saber:

1.º - O clube deter utilidade pública – alínea e) do n.º 1 do artigo 44.º;
2.º - O prédio seja diretamente destinado à realização dos fins do clube - alínea e) do n.º 1 do artigo 44.º;
3.º - O prédio seja propriedade do clube – alínea b) do n.º 2 do artigo 44.º.

Por outro lado, os pressupostos formais, são dois:
A) a inscrição do prédio na matriz com o destino da prática desportiva (n.º 4 do artigo 44.º EBF), e
B) a regularidade da situação fiscal do clube (artigo 13.º do EBF).

Em face do exposto, somos do entendimento que o benefício fiscal de isenção de IMI, neste caso concreto, deve reportar-se à data da verificação dos respetivos pressupostos substanciais, tal como refere o artigo 12.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, que estabelece:
Artigo 12.º (Constituição do direito aos benefícios fiscais)
O direito aos benefícios fiscais deve reportar-se à data da verificação dos respectivos pressupostos, ainda que esteja dependente de reconhecimento declarativo pela administração fiscal ou de acordo entre esta e a pessoa beneficiada, salvo quando a lei dispuser de outro modo.

Neste sentido veja-se a dissertação de Mestrado de Joana Bessa, dezembro de 2015, Uma nova abordagem na interpretação dos requisitos dos benefícios fiscais – análise jurisprudencial, a qual a págs. 16 refere o seguinte:
O artigo 12.º do EBF prescreve que o direito aos benefícios fiscais deve reportar-se à data da verificação dos respetivos pressupostos, mesmo que esteja dependente de reconhecimento, pelo que se entende que os seus efeitos se poderão produzir retroativamente.
https://repositorio.ucp.pt/bitstream/10400.14/20446/1/UMA%20NOVA%20ABORDAGEM%20NA%20INTERPRETA%C3%87%C3%83O%20DOS%20REQUISITIOS%20DOS%20BENEF%C3%8DCIOS%20FISCAIS%20-%20AN%C3%81LISE%20JURISPRUDENCIAL.pdf

Veja-se, ainda, o que refere o Prof. Doutor Casalta Nabais, nas lições de Direito Fiscal (6.º, ed., 2010, Almedina), a págs. 434 a 439:
«No respeitante ao conceito de benefícios fiscais, são de acrescentar mais duas notas. (…)
Outra nota prende-se com a distinção que há a fazer em sede dos benefícios fiscais, separando os benefícios fiscais estáticos ou benefícios fiscais stricto sensu, dos benefícios fiscais dinâmicos ou incentivos ou estímulos fiscais. Os primeiros dirigem-se, em termos estáticos, a situações que, ou porque já se verificaram (encontrando-se portanto esgotadas), ou porque, ainda que não se tenham verificado ou verificado totalmente, não visam, ao menos directamente, incentivar ou estimular, mas tão-só beneficiar por superiores razões de política geral, de defesa, externa, económica, social, cultural, religiosa, etc.
(…)
Quanto às espécies de benefícios fiscais, é de esclarecer que há as mais variadas classificações. Todavia, vamos ficar-nos aqui por uma delas: a que tem em conta os modos operativos da eficácia dos benefícios fiscais, ou seja, a necessidade ou não de um acto administrativo de reconhecimento ou concessão.
Pois bem, com base num tal critério e de acordo com os arts. 5.º, n.º 2 e 12.º do EBF, os benefícios fiscais podem ser: 1) automáticos, quando o direito ao benefício resulta directa e imediatamente da lei, operando, portanto ope legis, pela simples verificação do respectivo pressuposto de facto, não carecendo de qualquer acto posterior da administração tributária; ou 2) dependentes de reconhecimento, se pressupõem um ou mais actos posteriores de reconhecimento da administração tributária, actos estes que podem ser actos administrativos, caso em que temos benefícios fiscais dependentes de reconhecimento unilateral, ou mesmo contratos, caso em que temos benefícios fiscais dependentes de reconhecimento contratual ou benefícios fiscais contratuais.
(…)
43.1. A constituição dos benefícios fiscais
Quanto à constituição, prescreve o art.º 12.º do EBF que o direito aos benefícios fiscais deve reportar-se à data dos respectivos pressupostos, ainda que esteja dependente de reconhecimento declarativo pela administração ou de acordo entre esta e a pessoa beneficiada, salvo quando a lei dispuser o contrário. O que significa que, por via de regra, o direito aos benefícios fiscais se constitui com a verificação dos respectivos pressupostos.
E isto quer se trate de benefícios fiscais automáticos, quer de benefícios fiscais dependentes de reconhecimento administrativo, seja este reconhecimento oficioso, seja dependente de requerimento do interessado, já que, nestes casos, o acto ou acordo, através do qual o reconhecimento se concretiza, tem uma eficácia meramente declarativa, reportando os seus efeitos, por isso, à data da verificação dos pressupostos dos benefícios.
Só não será assim nos casos em que a lei disponha em contrário, atribuindo eficácia constitutiva ao acto de reconhecimento do benefício fiscal, seja esta atribuição feita de uma maneira expressa ou de uma maneira meramente implícita. Será de uma maneira implícita quando a lei atribui à administração uma margem de livre decisão para a concessão como acontece com alguma frequência em sede dos estímulos ou incentivos fiscais.».

Tendo em conta o regime legal acima já explanado, como seja o disposto no artigo 12.º e no n.º 4 do artigo 44.º do EBF, coadjuvado por este enquadramento doutrinal, conclui-se que o benefício fiscal em causa é estático, de reconhecimento oficioso, com eficácia meramente declarativa. O que significa que o benefício fiscal deve reportar-se à data dos respectivos pressupostos (entendendo-se estes como os pressupostos substanciais), ainda que esteja dependente de reconhecimento declarativo pela administração.
Ora, os pressupostos (substanciais) para a isenção do IMI já se verificavam em data anterior à da inscrição do prédio na matriz como urbano destinado a fins desportivos, conforme refere o despacho impugnado, quando diz que o clube já realizava há vários anos atividade desportiva naquele prédio e que já era detentor de utilidade pública.

Para além disso, o facto determinante da isenção não é a afetação do prédio a fins desportivos, mas antes a concessão de utilidade pública, pois sem esta é que não existe de todo isenção de IMI – vide alínea e) do n.º 1 do artigo 44.º do EBF.
Isto porque, podia estar o prédio inscrito como urbano para fins desportivos (portanto, «outros») e se o clube não detivesse utilidade pública, o facto determinante não seria a utilização do prédio para aquela atividade.

Ora, a decisão recorrida aceita a inscrição na matriz como prédio urbano «outros» para tributar retroativamente, mas já não aceita para isentar retroativamente. O raciocínio é contraditório, pois que se não pode beneficiar retroativamente da isenção por não estar inscrito como urbano, não se compreende que possa assim ser tributado se estava inscrito na matriz como rústico.

No que concerne ao facto de o Autor somente após ter sido notificado para provar a sua regularização fiscal, e de imediato efetuado essa demonstração, não altera os dados da questão, uma vez que se trata de cumprir um formalismo inerente à concessão de um benefício fiscal. Ou seja, não obstante a oficiosidade da isenção do IMI, é necessário que haja sempre um procedimento para verificar todos os pressupostos legais relativos à isenção de IMI, uma vez que não se trata de um benefício automático que resulte diretamente da lei – vide artigo 5.º do EBF. Não sendo o benefício automático, é necessária a tramitação de um procedimento (nos. 2 e 3 do artigo 5.º do EBF), onde podem ser tomadas as iniciativas que o Chefe do Serviço de Finanças entenda por convenientes para apurar a realidade dos factos, não para que apenas possa considerar a isenção com efeitos posteriores à demonstração da regularidade fiscal do Autor. Até porque, essa demonstração também pode ser efetuada em relação a períodos anteriores, como facilmente se compreende, pois estará documentada nas bases de dados do fisco e da segurança social.

Em face do exposto, entende-se que a sentença decidiu bem o dissídio, pelo que deve ser mantida.
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Nos termos do n.º 7 do artigo 663.º do Código de Processo Civil, elabora-se o seguinte sumário:

I – As pessoas coletivas dotadas de mera utilidade pública estão isentas de IMI em relação aos prédios destinados diretamente à realização dos seus fins, nos termos da alínea e) do n.º 1 do artigo 44.º do EBF.

II – A referida isenção é reconhecida oficiosamente, desde que se verifique a inscrição na matriz em nome do beneficiário (n.º 4 do artigo 44.º do EBF) e deve reportar-se à data da verificação dos respetivos pressupostos substanciais, tal como refere o artigo 12.º do EBF.
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Decisão

Termos em que, acordam em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
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Custas a cargo da Recorrente.
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Porto, 30 de setembro de 2021.

Paulo Moura
Irene Isabel das Neves
Ana Paula Santos