Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02691/18.7BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:05/13/2021
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Paula Moura Teixeira
Descritores:NULIDADE, OMISSÃO DE PRONÚNCIA, ERRO DE JULGAMENTO DE FACTO, FATURAS FALSAS; ISENÇÃO DE IVA NA EXPORTAÇÕES;
FATURAÇÃO FALSA; ÓNUS DA PROVA
Sumário:I. Nos termos do disposto no n.º 8 do artigo 29.º do Código do IVA, os sujeitos passivos de IVA, sem prejuízo de disposições especiais, nas transmissões de bens e as prestações de serviços, isentas do IVA ao abrigo, da alínea a) do n.º 1 do artigo 14.º do mesmo Código, devem ser comprovadas através dos documentos alfandegários apropriados ou, não havendo obrigação legal de intervenção dos serviços aduaneiros, de declaração emitidas pelo adquirente dos bens ou utilizador dos serviços, indicando o destino que lhes irá ser dado.

II. Preceitua a alínea a) do n.º 1 do artigo 14.º do CIVA que estão isentas de imposto as transmissões de bens expedidos ou transportados para fora da Comunidade pelo vendedor ou por um terceiro por conta deste.

III. Vem a jurisprudência entendendo de modo uniforme que, quando estão em questão correções de liquidações quer de IVA, as quais foram consideradas falsas pela administração tributária, as regras de repartição do ónus da prova a ter em conta são as seguintes:
Em primeira linha compete à administração tributária fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua atuação, ou seja, terá que demonstrar a existência de indícios sérios de que a operação referida na fatura foi simulada.
Em segunda linha, e após feita essa prova, compete ao sujeito passivo o ónus da prova dos factos que alegou como fundamento do seu direito deduzir os custos declarados na determinação da respetiva matéria tributável nos termos que decorrem do artigo 19.º n.º 3 do CIVA, não lhe bastando criar dúvida sobre a sua veracidade.*
* Sumário elaborado pela relatora
Recorrente:M., Lda e AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA e M., LDA
Votação:Unanimidade
Decisão:Conceder provimento ao recurso da Autoridade Tributária e Aduaneira, e negar provimento ao recurso, da M., LDA
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de o recurso não merecer provimento.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
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1. RELATÓRIO

Os Recorrentes, AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA e M., LDA, melhor identificados nos autos, interpuseram recursos da sentença prolatada, pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou impugnação parcialmente procedente e, por via disso anulou (a) a liquidação n.º 2017020050307, IVA 122014, de 22/06/2017, na parte em que excede € 31.027,00; (b) anulou o despacho de indeferimento da reclamação graciosa na parte em que não tomou conhecimento do mérito da questão suscitada pela Impugnante da regularização do IVA nos termos do art.º 78.º, n.º 4 do CIVA (nota de crédito n.º 1500/000002, de 01/12/2015) e dos elementos novos trazidos pela mesma; (c) e no demais, improcedeu a Impugnação.

A impugnação judicial visa anulação das liquidações adicionais de IVA e respetivos juros compensatórios referentes aos períodos de 09/2014, 11/2014, 12/2014, 09/2015, 10/2015, 11/2015, 12/2015 e 01/2016, no valor total de € 294.219,35, que resultaram de correções aritméticas efetuadas à matéria tributável, em virtude de ação inspetiva a que foi sujeita.

A. DO RECURSO DA AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA

A Recorrente não se conformou com a decisão tendo interposto o presente recurso formulou nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem:

A. .(…)” A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida por M., Lda., NIPC (...) contra a liquidação adicional de IVA e de juros compensatórios respeitantes ao período de 12/2014, num total de € 132 823,19.

B. Nos autos em referência, a douta sentença recorrida, além do mais, julgou a impugnação parcialmente procedente, determinando a anulação da liquidação n.º 2017020050307, IVA 122014, de 22/06/2017, na parte em que excede € 31.027,00, por haver considerado que: “Ora, tendo a Impugnante apresentado declaração periódica de IVA declarando duas facturas de vendas de mercadorias, sem liquidação de IVA, dado se referirem a exportações (operações isentas nos termos do art.º 14.º do CIVA), entende-se que o procedimento da AT de anular a declaração periódica apresentada, na íntegra, e reliquidar na totalidade padece de ilegalidade, pois a liquidação n.º 2017020050307, IVA 122014, de 22/06/2017, no valor de € 132.823,19 funda-se nas correções do relatório de inspeção tributária de 13/06/2017 que conclui por uma correção de €31.027,00, pelo que não podia a AT efetuar uma liquidação adicional de valor superior, mais concretamente, de € 132.823,19. Deste modo, impunha-se que a AT tivesse procedido à liquidação adicional apenas do valor de € 31.027,00, sendo ilegal (pois destituída de fundamentação) na parte em que excede este valor (o que pressupõe a manutenção da autoliquidação efetuada pela Impugnante aquando da apresentação da declaração periódica - liquidação n.º 20157011191578, no valor de € 101.796,19 resultante da DP apresentada voluntariamente pelo contribuinte).”

C. Ressalvado o sempre devido respeito, com o desta forma decidido, não se conforma a Fazenda Pública, porquanto considera que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento consubstanciado não só na incorreta apreciação e valoração da matéria factual, mas igualmente ao não cuidar de apurar a verdade material dos factos, designadamente os alegados pela impugnante, ora recorrida.

D. A factualidade relevante dada como provada e sobre a qual a Mma. Juíza estriba o aliás ilustre decisório é a que assenta nos factos “D”, “J”, “K” e “L”.

E. A douta sentença não põe em causa a validade e justeza da correcção efectuada pelos Serviços de Inspecção, no valor de € 31 027,00, por ser legal, nem coloca em causa a validade da liquidação que resultou da declaração periódica voluntariamente entregue pelo contribuinte, no valor de € 101 796,19, donde só pode resultar que a impugnante, ora recorrida, é reconhecidamente devedora destas duas quantias.

F. Contudo, a douta sentença não considerou, nem valorou, embora o refira (e a impugnante o reconheça), o facto levado ao probatório no ponto “L” de que “o sistema liquidador de IVA da AT procedeu à anulação total da liquidação” que resultou da própria declaração do contribuinte e emitiu nova liquidação contendo esse valor (€ 101 796,19), acrescido da correcção, considerada legal pelo Tribunal a quo, no valor de € 31 027,00, deixando passar a ideia que a AT reliquidou o valor declarado pelo contribuinte e manteve a autoliquidação efectuada pela impugnante, duplicando o valor em cobrança.

G. Além de que, atento o facto levado ao probatório, no ponto “K”, segundo o qual, por falta de pagamento do montante de € 101 796,19 a AT instaurou um processo de execução fiscal, no âmbito do qual a impugnante fez pagamentos, a sentença não cuidou de, em obediência ao princípio do inquisitório, recolher elementos de prova que se mostram agora pertinentes para a descoberta da verdade material.

H. Diligências que deviam acrescer ao probatório o facto de que, em consequência da anulação da liquidação com origem na Declaração Periódica do contribuinte, no valor de € 101 796,19, o processo de execução fiscal n.º 1821201501109928, instaurado para cobrança coerciva desse montante, foi anulado, e as quantias já pagas pela impugnante integralmente restituídas.

I. Assim sendo, “o sistema liquidador de IVA da AT”, através da emissão da liquidação n.º 2017020050307, de que resultou imposto a pagar no valor de € 132 823,19, mais não fez do que reunir na mesma liquidação o imposto anteriormente em dívida (€ 101 796,19), calculado pelo sujeito passivo, acrescido da correcção agora efectuada (€ 31 027,00), reputada como legal pelo Tribunal a quo.

J. Atente-se no facto provado “D”, onde se verifica que os juros compensatórios apenas incidiram sobre a correcção e tomaram como referência o “valor € 31.027,00 período 11/02/2015 a 06/06/2017 taxa 4,000, total € 2.879,98”, (sublinhado nosso).

K. Nestes termos, o montante de € 101 796,19 é devido pela impugnante, uma vez que essa liquidação resulta da Declaração Periódica de IVA voluntariamente entregue sem o respectivo meio de pagamento, apesar de esta ter sido informaticamente anulada por via de emissão de nova liquidação para o mesmo período de imposto.

L. Sendo que, não pode deixar de se considerar como legal a liquidação n.º 2017020050307, IVA 122014, de 22/06/2017, no valor de € 132 823,19, tanto na parte da correcção efectuada pela AT de € 31 027,00, como na parte em que excede esse montante - € 101 796,19.

M. O procedimento seguido pela AT sempre obedeceu aos critérios determinados por lei e àquilo que a próprio impugnante defende quanto à anulação da instância executiva, ao anular a liquidação, ao anular o processo de execução fiscal e ao restituir todos os valores já pagos, não se conhecendo por parte da impugnante, ora recorrida, qualquer reacção ou reclamação contra estes actos de anulação e restituição dos pagamentos efectuados.

N. Decidindo como decidiu, é nossa convicção que a sentença incorreu em erro de julgamento consubstanciado não só na incorreta apreciação e valoração da matéria factual, designadamente por violação do princípio do inquisitório patente no artigo 411.º do CPC e dos artigos 27.º, 28.º, 29.º, 35.º e 41.º do CIVA.

O. Pelo que a sentença se encontra viciada de erro de julgamento da matéria de facto, não podendo manter-se na ordem jurídica.

Nestes termos, deve ser dado provimento ao presente recurso, com as legais consequências, assim se fazendo JUSTIÇA. (…)”


1.2. A Recorrida apresentou contra-alegações tendo formulado as seguintes conclusões:
”(…)
I - Apresenta a Fazenda Pública recurso e respetivas alegações invocando erro no julgamento da matéria de facto.
II – A propósito do erro de julgamento da matéria de facto artigo 281.º do CPPT refere que a interposição, processamento e julgamento dos recursos das decisões proferidas pelos tribunais tributários, ainda que interlocutórias, regem-se pelo disposto no Código de Processo Civil.
III – Assim e porque neste ponto, caberia à Recorrente atacar a decisão recorrida ou por via da devida impugnação da matéria de facto ou, maxime, suscitando a existência de omissão de pronúncia pelo Tribunal a quo relativamente aos concretos factos por si alegados na contestação e que não mereceram pronúncia judicial adequada.
IV – Não é permitido a Recorrente, extrair factualidade provada “a contrario”, de modo a acomodar a prova de factos que afirma resultarem do RIT, pois tal é algo que as regras adjetivas não permitem.
V – Da análise das alegações e conclusões de recurso entendidas no sentido de que a Recorrente pretendia, efetivamente, impugnar a matéria de facto em causa fixada, certo é que o ónus especial de alegação consagrado no art.º640 do CPC , aplicável ex vi do artigo 281º do CPPT não foi cumprido.
VI - Na verdade, a Recorrente não dá cumprimento aos normativos legais aplicáveis, não indicando os concretos meios probatórios constantes do processo que impunham decisão diversa da recorrida, está vedado ao tribunal de recurso conhecer do eventual erro de julgamento da matéria de facto nesta parte.
VII - Com efeito, não basta afirmar-se de modo genérico que se verifica um erro de julgamento, impunha-se sim que os “factos” e que os “documentos” fossem identificados, o que não foi feito.
VIII - Razão pela qual não merece qualquer censura a Douta Sentença proferida pelo Tribunal a quo no que respeita ao julgamento da matéria de facto, relativo à temática do recurso, nos termos em que são expostos pela Fazenda Pública.
IX - Contrariamente ao que vem alegado nas Alegações de Recurso apresentado pela Fazenda Pública o que a Douta Sentença recorrida considerou ilegal e que levou à anulação parcial da liquidação em causa foi o ato pela mesma levado a cabo de anulação da declaração apresentada pelo contribuinte aqui impugnante, que corria os seus termos e do qual resultou prejuízo severo para este, e emitiu indevidamente nova liquidação pela totalidade do valor.
X - O que foi posto em causa e considerado ilegal foi a forma de atuação da autoridade Tributária, que ao invés de liquidar adicionalmente o valor resultante da correção resultante do RIT (indevida na perspetiva da impugnante), liquidou, em grave e sério prejuízo da impugnante, o valor total do período, ou seja em 2017, liquidou o valor total referente ao período 122014, que já havia sido parcial e voluntariamente declarado nesse mesmo período pelo sujeito passivo, anulando a respetiva liquidação e ignorando todo o processo que havia sido instaurado e estava em curso, nomeadamente o plano de pagamentos que se encontrava em curso, subscrito ao abrigo do PERES.
XI – Este ato encontra-se ferido de ilegalidade, tornando também ilegal a liquidação a que deu origem.
XII - Pelo que nesta parte andou bem a Douta Sentença Recorrida.
XIII - Também a Douta Sentença recorrida não viola o princípio do inquisitório nos termos clamados no recurso interposto pela Fazenda Púbica.
XIV – De facto para que o tribunal a quo tivesse violado o princípio do inquisitório e da obtenção da verdade material que vigora no processo judicial tributário e encontra assento no disposto no artigo 13º, nº 1 do CPPT, o qual estipula que “Aos juízes dos tribunais tributários incumbe a direção e julgamento dos processos da sua jurisdição, devendo realizar ou ordenar todas as diligências que considerem úteis ao apuramento da verdade relativamente aos factos que lhes seja lícito conhecer”.
XV - Também o artigo 99°, n° 1 da LGT determina que “O tribunal deve realizar ou ordenar oficiosamente todas as diligências que se lhe afigurem úteis para conhecer a verdade relativamente aos factos alegados ou de que oficiosamente pode conhecer”.
XVI – No entanto, este princípio não desonera, as partes das suas obrigações processuais, nomeadamente da alegação da factualidade em que assenta a sua pretensão e de indicar eventuais elementos de prova de que disponha ou que entenda mais apropriados à demonstração da sua versão dos factos.
XVII - No caso dos autos, a Fazenda Pública, a propósito desta matéria, nunca na sua contestação, ou até posteriormente, ou anteriormente, referiu que a execução em causa tinha sido extinta, o que, a ser verdade, nunca à impugnante foi notificado, que os valores pagos foram restituídos, etc... , até porque nem é esse facto que está em causa, mas sim a incorreta e ilegal anulação da liquidação originada pela declaração periódica apresentada pela Impugnante.
XVIII - Por outro lado, dos elementos constantes dos autos, nomeadamente dos que instruíram o procedimento de reclamação graciosa ou de impugnação, também nada é alegado acerca dessa matéria.
XIX - E se a Fazenda Pública tinha conhecimento da existência de outros elementos relevantes para a demonstração desses factos, devia ter disso dado conhecimento ao tribunal por forma a que, com base nessa informação, este tivesse procedido às diligencias necessárias e adequadas ao apuramento da verdade e não o tendo feito (como dos autos resulta que não fez), sibi imputat.
XX – Destarte, com os Doutos fundamentos constantes da Douta Sentença Recorrida e com aqueles que aqui se aduzem, sempre e em qualquer caso deve ser mantida a decisão Recorrida, nesta matéria, e tão só no que respeita à anulação parcial da liquidação nº 2017020050307, uma vez que nesta parte, a Douta Sentença donde promana não merece censura , contrariamente ao que alega a Fazenda Pública, pois não enferma, no que à temática exposta se refere, de qualquer erro de julgamento da matéria de facto.

Termos em que e nos mais de direito que Vª. Exª mui doutamente suprirá, negando provimento ao recurso interposto pela Fazenda Pública, e mantendo a Douta Sentença recorrida que deverá por Vªs. Exªs. ser confirmada, na parte correspondente, farão como sempre a habitual, SÃ, SERENA E OBJETIVA JUSTIÇA. (…)”

H. DO RECURSO DA M., LDA
A Recorrente não se conformou com a decisão tendo interposto o presente recurso formulou nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem:
.(…)”
I – Vem o presente recurso interposto da Douta Sentença que julgou parcialmente improcedente a impugnação Judicial deduzida por M., Lda, contra as liquidações:
- 2017020050291, relativa ao IVA 092014,
- 2017020050304- IVA112014,
- 2017020050307- IVA 122014,
- 2017020050352 – IVA092015,
- 2017020050366 - IVA 102015,
- 2017020050367 – IVA 112015,
- 2017020050369 – IVA 122015,
- 2017020050718 – IVA 012016
e parcialmente a liquidação nº 2017020050307 – IVA 122014, na parte não anulada, respeitante à correção efetuada no valor de Euros: 31. 027, 00 e correspondentes liquidações de juros compensatórios.

II - Foram nos autos admitidas as declarações de parte do Gerente da Impugnante, aqui recorrente, J., no entanto a Douta Sentença Recorrida é completamente omissa no que a estas diz respeitos, não fazendo qualquer menção à sua produção.

III - Ao não se pronunciar ou sequer referenciar as declarações de parte, que no parco entendimento da ora recorrente, levariam decisiva e forçosamente outra decisão diversa da tomada na Douta Sentença recorrida (cf. artigo 662.º do CPC), incorreu o tribunal “ a quo” numa verdadeira nulidade da sentença, uma vez que estamos perante uma verdadeira omissão de pronúncia subsumível ao nº 1, alínea d) do artigo 615 nº 1 do CPC.

IV - Isto porque, se tivessem sido valoradas as suas declarações, atenta a espontaneidade, simplicidade, sinceridade e coerência com que foram prestadas, certamente que a matéria de facto que foi considerada não provada na Douta Sentença Recorrida, certamente teria decisão diversa.

V - Pelo que se requer que sejam as mesmas apreciadas e valoradas, nomeadamente para infirmar a resposta à matéria de facto dada como não provada, nomeadamente a resposta dada aos factos 1), 2), 3), 4), 6), 7), 8) 9), 10), 11), 12), 13), 14), 15), 16), 17) e 18, que deveria ter sido dada como provada.

VI - Por referência aos factos dados como não provados sob a numeração 1 a 18, constantes da Douta Sentença recorrida uma vez feita a reapreciação da prova testemunhal gravada através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal, quando conjugada com a prova testemunhal junta aos autos, facilmente se concluirá que os referidos factos deveriam ter sido dados como provados.

VII – Impõe-se por conseguinte a reapreciação do depoimento das testemunhas P., J., P., M., L., H., gravados nos sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática deste tribunal, para que se altere a matéria de facto não provada, passando a mesma a considerar-se como provada.

VIII – Relativamente a esta matéria, considera a Recorrente que o Tribunal “a quo” incorreu em erro de julgamento no que respeita à incorreta apreciação e valoração da matéria de facto dada como não provada tendo em atenção a prova produzida, uma vez que a mesma deveria ter sido considerada provada.

IX – Também dos depoimentos das testemunhas supra referidas resultou claramente provado que a impugnante desconhecia qualquer vicissitude, nomeadamente a falsidade dos DUA´S respeitantes ao envio das mercadorias referentes às transações relativas às Fatura/ recibo O1-I/10-00097 de 04/09/2014, no valor de Euros: 184.600,00 e fatura / recibo O1-I/10-000163 de Euros: 134 900,00, pelo que tal facto deverá ser aditado à matéria de facto dada como provada.

X - Por sua vez, no que concerne aos concretos factos dados como não provados na Douta Sentença Recorrida sob o nºs 4 a 18, a Douta Sentença Recorrida encontra-se viciada de erro de julgamento da matéria de facto, impondo-se nesta sede a reapreciação da prova gravada mormente no que respeita aos depoimentos da testemunha M. e P. e P..

XI - O teor dos depoimentos a que supra se alude, bem como as declarações de parte prestadas pelo gerente da Impugnante, relativamente às quais a Douta Sentença Recorrida é completamente omissa, incorrendo numa verdadeira omissão de pronúncia, e os documentos juntos aos autos, nomeadamente o documento 1 junto à Petição Inicial impugnação – Reclamação graciosa – nomeadamente os documentos nesta última numerados como documentos 44, - email’s trocados com o fornecedor “V.”, doc. 46 que configura o extrato de conta de conferência do fornecedor “A.”, documentos 48 a 53 e 79 a 90, que configuram as transferências efetuadas à A. para pagamento das mercadorias em causa nos presentes Autos, documentos esses que não foram impugnados pela Fazenda Púbica, imporiam necessariamente que se dessem como provados os factos que constam da Douta Sentença Recorrida como não provados, nomeadamente os pontos 4 a 18.

XII - Deverá ainda aditar-se aos factos dados como provados que aquando da inspeção e perante a Sra. Inspetora foram pela Impugnante identificadas as UP’S nas quais foram incorporadas parte do material comprado à A., tendo a mesma inspecionado um exemplar de cada placa antes da incorporação e depois da incorporação nas ditas UPS.

XIII - E ainda, que a Impugnante comprou à empresa A. as mercadorias constantes das faturas inspecionadas, que lhe foram faturadas e entregues e que a Impugnante pagou.

XIV - Face ao exposto, e decidindo como decidiu, é convicção da Impugnante que a Douta Sentença Recorrida incorreu em verdadeiro erro de julgamento, consubstanciado não só na incorreta valoração da matéria de facto face à prova produzida, mas também no valor probatório atribuído aos meios de prova de que se socorreu para formar a convicção do tribunal.

XV - Na formação da convicção do Tribunal, refere a Douta Sentença Recorrida que o relatório de inspeção tributária é um documento autentico, nos termos do artigo 371º, nº 1 do CC, uma vez que é exarado por funcionário da administração tributária no exercício das respetivas funções, o mesmo tem força probatória plena relativamente aos factos afirmados como sendo praticados pela administração tributária ou com base na perceção dos seus órgãos e que apenas pode ser elidida nos termos da lei.

XVI - Ora entende a ora recorrente que não assiste razão ao tribunal “ a quo no que a esta temática respeita, uma vez que no seu parco entendimento, o valor probatório do relatório de inspeção está condicionado pela aplicação do principio do contraditório sob pena de direta violação do artigo 20º nº 4 da CRP, que postula um processo judicial tributário equitativo e subordinado a critérios de legalidade, o que requer plena igualdade de armas entre as partes, como de resto é reconhecido pelo artigo 98 da LGT. Assim o valor probatório do relatório de inspeção tributária só poderá ter força probatória se as asserções que do mesmo constam não forem impugnadas.

XVII – Ora, in casu, logo quando notificada para exercício do direito de audição, posteriormente na reclamação graciosa, e em sede de impugnação judicial, a ora recorrente pôs em causa o relatório de inspeção, contraditando o mesmo nas suas asserções.

XVIII - Tal como defende Jorge Lopes de Sousa “… para abalar a força probatória das informações oficiais, basta ao interessado gerar dúvidas fundadas sobre tais matérias para obter uma decisão favorável, não tendo que se provar o contrário” in “Código de Procedimento e de Processo Tributário”, vol. II, pp.259.

XIX - E de facto a Impugnante fê-lo ao exibir à Sra. Inspetora parte do material comprado à A., ao explicar e demonstrar onde tinha sido o mesmo incorporado, ao exibir-lhe os comprovativos do pagamento das mercadorias, ao facultar-lhe a documentação comprovativa da existência das transações, ao justificar as divergências.

XX - Pelo que a Sentença se encontra viciada de erro de julgamento da matéria de facto, não podendo manter-se na ordem jurídica.

XXI - Também e consequentemente andou mal a Douta Sentença recorrida no que respeita ao julgamento da matéria de direito, incorrendo também em verdadeiro erro de julgamento de direito.

XXII – No que se refere às liquidações referentes ao Ano de 2014 andou mal a Douta Sentença Recorrida quando refere que tendo em conta o carater formalista do IVA, que tem em vista, designadamente, evitar a evasão fiscal, a necessidade do documento alfandegário reveste formalidade ad substantiam e não ad probationem insuscetível de substituição por qualquer outro meio.

XXIII - Na verdade, o entendimento que vem sendo perfilhado pelos tribunais superiores em sede de IVA, vai precisamente no sentido oposto, no sentido de privilegiar a verificação dos requisitos materiais, de fundo, do direito à isenção do IVA, na aceção do artigo 146º da diretiva Comunitária.

XXIV - Na verdade, na falta desses documentos de acompanhamento/ certificados, nos termos do artigo 115º do CPPT, são admitidos os meios gerais de prova.

XXV - Nessa medida os documentos apresentados pela recorrente, bem como o facto de ter sido dado como provado que a mercadoria foi entregue ao destinatário, seriam suficientes para comprovar as operações efetuadas e a verificação dos pressupostos para aplicação da isenção prevista.

XXVI - Nos termos do exposto, é entendimento da Recorrente, que também nesta sede, o tribunal a quo decidiu mal, contra os factos apurados e contrariamente ao que se impunha, errando no julgamento da matéria de direito.

XXVII - Na verdade, a ausência de documentos oficiais emitidos pelas autoridades aduaneiras, só por si, não é fundamento para rejeitar a prova alternativa apresentada, constituindo uma exigência forma que, por si só, não põe em causa o direito do fornecedor à isenção do IVA.

XXVIII – Ainda mais que, os documentos apresentados pela recorrente, seriam suficientes para comprovar as operações efetuadas e a verificação dos pressupostos para a aplicação da isenção prevista.

XXIV - Assim o dita o princípio da neutralidade fiscal que exige que a isenção do IVA deve ser concedida se as condições materiais estiverem preenchidas, mesmo que o contribuinte não tenha cumprido certas formalidades.

XXV - Relativamente ao decidido na Douta recorrida relativamente ao invocado erro nos pressupostos de facto e de direito relativamente às liquidações do Exercício de 2015 (violação do artigo 19. nº 3 do IVA) concluindo que a Recorrente não logrou demonstrar que as faturas em causa titulam operações reais, motivo pelo qual não mereceu censura a atuação da AT em desconsiderar as faturas emitidas pela “A. ” mantendo as correções e as liquidações correspondentes na ordem jurídica cumpre referir que também nesta matéria andou mal o Tribunal a quo quando decidiu nesta conformidade.

XXVI – Relativamente a esta matéria a Recorrente logrou demonstrar a realidade das operações consubstanciadas nas faturas, e, a existência e a quantificação dos factos tributários.

XXVII – Dos elementos probatórios juntos aos autos e, designadamente, dos depoimentos prestados em sede de instrução, provou a recorrente os factos que alegou ou que, pelo menos, existem fundadas dúvidas sobre a existência e a quantificação dos atos tributários, sendo certo que a AT nessa matéria, e que é acompanhado pelo Tribunal a quo, não se mostra devidamente confirmado por factos concretos.

XXVIII – Assim sendo, atenta a regra da repartição do ónus da prova, não deveria haver lugar às correções efetuadas pela AT uma vez que se não verifica a exclusão constante do nº 3 do artigo 19 do CIVA.

XXIX - Comprovou a Recorrente que o imposto suportado e, posteriormente deduzido pela Impugnante reporta-se a operações económicas efetivamente realizadas, as faturas constantes da contabilidade da IMPUGNANTE representam transações comerciais reais, operações em que houve a efetiva entrega da mercadoria e pagamento do preço indicado nas faturas.

XXX- Pelo que os atos de liquidação adicional de Imposto sobre o Valor Acrescentado e de Juros Compensatórios impugnados, na medida em que assentam em correções que não têm em si cabimento legal, são também eles ilegais, pelo que deveriam ter sido anulados em consequência.

XXXI - Nos termos supra expostos, é entendimento da Recorrente que o Tribunal a quo decidiu mal, contra os factos apurados e contrariamente ao que se impunha face aos elementos que ressaltam dos autos, - errando no julgamento da matéria de facto – e de onde resultou concomitantemente, erro de julgamento da matéria de direito.

Nestes termos e nos mais de direito que Vª. Exª. mui Doutamente suprirá deve ser dado provimento ao presente recurso revogando-se consequentemente a Douta decisão recorrida, assim se fazendo SÃ, SERENA E OBJETIVA JUSTIÇA (…)”

1.2. A Recorrida não apresentou contra-alegações.

O Exmo. Procurador-Geral Adjunto junto deste tribunal emitiu parecer remetendo para o parecer do Ministério Público proferido na 1.ª instância que se mantém válido, concluindo que o recurso não merece provimento.

Atendendo a que o processo se encontra disponível em suporte informático, no SITAF e atendendo à situação atual de pandemia, com o seu consentimento, dispensa-se os vistos do Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, submetendo-se à Conferência para julgamento.

2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelos Recorrentes, as quais são delimitadas pelas conclusões das respetivas alegações, sendo a de saber:

A) No recurso da Autoridade Tributária e Aduaneira se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao anular a liquidação n.º 2017020050307, IVA 122014, de 22/06/2017, na parte em que excede € 31.027,00;

B) No recurso da M., Lda., se a sentença recorrida incorreu (i) em nulidade por omissão de pronúncia (ii) erro de julgamento de facto, (iii) erro de julgamento direito ao não considerar que a faturas constantes da sua contabilidade representam transações comerciais reais, operações em que houve a efetiva entrega da mercadoria e pagamento do preço indicado nas faturas.

3. JULGAMENTO DE FACTO

Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:
“(…) Com relevância para a decisão da causa, consideram-se provados os seguintes factos:
A) No cumprimento das Ordens de Serviço n.º OI201600261 E OI201600262, os Serviços da Inspecção Tributária (SIT) da Direcção de Finanças do Porto (DFP) desencadearam um procedimento inspectivo à aqui Impugnante, relativa aos anos de 2014 e 2015 – Cf. fls. 100 e ss do PA apenso aos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

B) No âmbito do procedimento inspectivo a que se alude na alínea antecedente foi elaborado Relatório de Inspeção Tributária, em 13/06/2017, no qual se concluiu sob a epígrafe “descrição dos factos e fundamentos das correcções meramente aritméticas” o seguinte:

[imagem que aqui se dá por reproduzida]

- Cf. fls. 338 do sitaf, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

- Por ofício datado de 16/06/2017 foi a Impugnante notificada do relatório a que se alude na alínea antecedente - Cf. fls. 97 e ss do processo físico, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

- Na sequência das correções referidas em B), a AT emitiu as liquidações adicionais de IVA, relativa aos exercícios de 2014 e 2015, no valor total de € 281.078,6, a seguir discriminadas:
- 2017020050291, IVA 092014, de 22/06/2017, no valor de € 29.268,22 (da qual consta um quadro designado “fundamentação” no qual foi exarado que a liquidação efetuada tem por base a correção efetuada pelos Serviços de Inspeção Tributária) e respetivos juros compensatórios no valor de € 3.011,82 (da qual se extrai “juros calculados nos termos do art.º 96.º do CIVA e arts. 35.º e 44.º da LGT por ter sido retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto ou por se ter verificado atraso na insuficiência do pagamento por facto imputável ao contribuinte – valor € 29.268,22 período 11/11/2014 a 06/06/2017 taxa 4,000, total € 3.011,82) - Cf. fls. 67 e 68 dos autos;
- 2017020050304, IVA 112014, de 22/06/2017, no valor de € 13.189,78 (da qual consta um quadro designado “fundamentação” no qual foi exarado que a liquidação efetuada tem por base a correção efetuada pelos Serviços de Inspeção Tributária) e respetivos juros compensatórios no valor de € 1.185,27 (da qual se extrai “juros calculados nos termos do art.º 96.º do CIVA e arts. 35.º e 44.º da LGT por ter sido retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto ou por se ter verificado atraso na insuficiência do pagamento por facto imputável ao contribuinte – valor € 13.189,78 período 13/01/2015 a 11/04/2017 taxa 4,000, total € 1.185,27) - Cf. fls. 69 e 70 dos autos;
- 2017020050307, IVA 122014, de 22/06/2017, no valor de € 132.823,19 (da qual consta um quadro designado “fundamentação” no qual foi exarado que a liquidação efetuada tem por base a correção efetuada pelos Serviços de Inspeção Tributária) e respetivos juros compensatórios no valor de € 2.879,98 (da qual se extrai “juros calculados nos termos do art.º 96.º do CIVA e arts. 35.º e 44.º da LGT por ter sido retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto ou por se ter verificado atraso na insuficiência do pagamento por facto imputável ao contribuinte – valor € 31.027,00 período 11/02/2015 a 06/06/2017 taxa 4,000, total € 2.879,98) - Cf. fls. 71 e 72 dos autos;
- 2017020050352, IVA 092015, de 22/06/2017, no valor de € 6.104,14 (da qual consta um quadro designado “fundamentação” no qual foi exarado que a liquidação efetuada tem por base a correção efetuada pelos Serviços de Inspeção Tributária) e respetivos juros compensatórios no valor de € 383,97 (da qual se extrai “juros calculados nos termos do art.º 96.º do CIVA e arts. 35.º e 44.º da LGT por ter sido retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto ou por se ter verificado atraso na insuficiência do pagamento por facto imputável ao contribuinte – valor € 6.104,14 período 11/11/2015 a 06/06/2017 taxa 4,000, total € 383,97) - Cf. fls. 73 e 74 dos autos;
- 2017020050366, IVA 102015, de 22/06/2017, no valor de € 24.372,46 (da qual consta um quadro designado “fundamentação” no qual foi exarado que a liquidação efetuada tem por base a correção efetuada pelos Serviços de Inspeção Tributária) e respetivos juros compensatórios no valor de € 1.452,99 (da qual se extrai “juros calculados nos termos do art.º 96.º do CIVA e arts. 35.º e 44.º da LGT por ter sido retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto ou por se ter verificado atraso na insuficiência do pagamento por facto imputável ao contribuinte – valor € 24.372,46 período 11/12/2015 a 06/06/2017 taxa 4,000, total € 1.452,99) - Cf. fls. 75 e 76 dos autos;
- 2017020050367, IVA 112015, de 22/06/2017, no valor de € 33.615,58 (da qual consta um quadro designado “fundamentação” no qual foi exarado que a liquidação efetuada tem por base a correção efetuada pelos Serviços de Inspeção Tributária) e respetivos juros compensatórios no valor de € 1.866,15 (da qual se extrai “juros calculados nos termos do art.º 96.º do CIVA e arts. 35.º e 44.º da LGT por ter sido retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto ou por se ter verificado atraso na insuficiência do pagamento por facto imputável ao contribuinte – valor € 33.615,58 período 12/01/2016 a 06/06/2017 taxa 4,000, total € 1.866,15) - Cf. fls. 77 e 78 dos autos;
- 2017020050369, IVA 122015, de 22/06/2017, no valor de € 41.670,26 (da qual consta um quadro designado “fundamentação” no qual foi exarado que a liquidação efetuada tem por base a correção efetuada pelos Serviços de Inspeção Tributária) e respetivos juros compensatórios no valor de € 2.201,10 (da qual se extrai “juros calculados nos termos do art.º 96.º do CIVA e arts. 35.º e 44.º da LGT por ter sido retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto ou por se ter verificado atraso na insuficiência do pagamento por facto imputável ao contribuinte – valor € 41.670,26 período 11/02/2016 a 06/06/2017 taxa 4,000, total € 2.201,10) - Cf. fls. 79 e 80 dos autos;
- 2017020050718, IVA 012016, de 23/06/2017, no valor de € 34,97 (da qual consta um quadro designado “fundamentação” no qual foi exarado que liquidação efetuada nos termos do art.º 87.º do CIVA em resultado do processamento da declaração corretiva enviada para um período de imposto para o qual já tinha sido enviada a declaração periódica) - Cf. fls. 81 dos autos;

E) Em 27/12/2017, a Impugnante reclamou graciosamente das liquidações mencionadas na alínea antecedente - Cf. fls. 43 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

F) Por despacho de 27/04/2016 foi proferido projeto de despacho de indeferimento, nos seguintes termos, no que ao caso releva:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]
[…]

Cf. fls. 195 e ss dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

G) Por despacho de 10/07/2018, a Diretora Adjunta da DF do Porto proferiu despacho de indeferimento da reclamação graciosa apresentada, nos seguintes termos:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

Cf. fls. 189 e ss dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

H) A Impugnante foi notificada do despacho a que se alude na alínea antecedente em 16/07/2018 - Cf. fls. 188 e ss dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

I) A presente Impugnação deu entrada em 16/10/2018 - Cf. fls. 3 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

J) Da Declaração Periódica de IVA do período de 201412 apresentada pela Impugnante resultou imposto a pagar no valor de € 101.796,19 – Cf. fls. 338 do sitaf, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

K) Por falta de pagamento do valor mencionado na alínea antecedente, a AT instaurou à Impugnante o processo de execução fiscal n.º 1821201501109928 no âmbito do qual fez pagamentos- Cf. fls. 338 do sitaf, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

L) Na sequência das correções constantes do RIT a que se alude na alínea b) do probatório, o sistema liquidador de IVA da AT procedeu à anulação total da liquidação mencionada na alínea j) do probatório dando origem à liquidação n.º 2017 020050307 que incluiu o valor de € 101.796,19 mencionado na alínea j) do probatório e o valor proposto no RIT de € 31.027,00 – Cf. despacho de indeferimento da reclamação graciosa, fls. 71 e 72 do processo físico.

M) Dos documentos de suporte aos registos contabilísticos da Impugnante, no decurso do procedimento inspetivo, os SIT verificaram a existência da nota de crédito n.º 1500/000002, de 01/12/2015, no valor de € 44.280,00 (IVA incluído), referente a 1500 placas principal controladora UPS P3, emitida pela “A.” para a M., Lda que não foi por esta contabilizada – cf. fls. 11, terceiro parágrafo do RIT em causa nos presentes autos, cf. fls. 105 e 172 do processo físico cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

N) Da nota de crédito n.º 1500/000002 de 01/12/2015 emitida pela “A. Unip Lda” no valor de € 44.280,00 extrai-se o seguinte:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

cf. fls. 172 do processo físico cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

O) Da fatura n.º 1500/0000048, de 01/12/2015 emitida pela “A. Unip Lda” no valor de € 70.110,00 extrai-se o seguinte:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

cf. fls. 168 do processo físico cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

P) Da declaração periódica de IVA do período de 12/2016 (n.º 112159495832) enviada pela Impugnante¸ do anexo das Regularizações do Campo 41 – Regularizações de Imposto a Favor do Estado consta o montante de € 39.000,00 a título de base de incidência da regularização e o montante de € 8.970, 00, a título de IVA Regularizado – cf. fls. 21, segundo parágrafo do RIT em causa nos presentes autos, cf. fls. 110 do processo físico cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

Q) No período de 201612, a Reclamante contabilizou a nota de crédito n.º 1500/000002, emitida em 01/12/2015, pela sociedade “A.” por referência a 1500 unidades de “Placa Principal de Control UPS P3”, ao preço unitário de € 24,00, tendo regularizado o IV nela contido a favor do Estado - cf. fls. 192 do processo físico (6.º parágrafo do despacho de indeferimento da reclamação graciosa) cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.

R) A nota de crédito n.º 1500/000002 de 2015 foi rececionada pela Impugnante em 2016 e foi refletida na respetiva contabilidade em dezembro de 2016.

S) As mercadorias a que se reportam a fatura/recibo n.º O1-I/14-00097 de 04/09/2014, no valor de € 184.600,00 e fatura/recibo n.º 01-I/14-00163, no valor de € 134.900,00 emitidas para o cliente “S., SARL”, no total de € 319.500,00 foram rececionadas pelo destinatário dos bens.

Factos não provados

1) As mercadorias a que se reportam a fatura/recibo n.º O1-I/14-00097 de 04/09/2014, no valor de € 184.600,00 e fatura/recibo n.º 01-I/14-00163, no valor de € 134.900,00 emitidas para o cliente “S., SARL”, no total de € 319.500,00 foram pagas pelo destinatário dos bens.
2) As operações referidas em 1) foram efetuadas por intermédio do G., SA, sedeado em Espanha, tal como a esta foi solicitado que tratasse da documentação para exportação das sobreditas mercadorias, mormente o despacho da Alfândega (DUA).
3) O G., SA, por não ter competência para tanto, contratou os serviços de um transitário em Espanha, a “M., SL”, para tratar da respetiva documentação.
4) A Impugnante declarou comprar à empresa “A.” as mercadorias a que se reportam as 22 faturas identificadas no quadro de fls. 6 do RIT que aqui se reproduz integralmente, que lhe foram entregues, faturadas e pagas.
5) O departamento de compras (que labora desde Espanha) teve conhecimento da sociedade “A.” através de email, como tem de muitas outras sociedades, pois é esta a prática corrente.
6) A Impugnante certificou-se da existência fiscal sociedade “A.”, da sua inscrição no Registo Nacional de Pessoas Coletivas, após o que lhe adquiriu as mercadorias.
7) A pessoa com a qual eram estabelecidos os contactos, identificava-se como I. e dispunha de um telefone para contacto com o número +351934479090, bem como o email A.-@hotmail.com.
8) Aquando da emissão das faturas 23, 25, 29, 30, 33, 34 e 36 ocorreu um erro por parte do fornecedor “A.” no que respeita às referências PWM, bem como nas quantidades e preços unitários, erro esse que foi corrigido, tendo sido substituídas as ditas faturas, daí que tenham ficado arquivadas ambas no arquivo da contabilidade.
9) As faturas que lhe foram entregues pelo fornecedor “A.” foram as que se encontram refletidas na respetiva contabilidade, não lhe tendo sido dadas a conhecer quaisquer outras.
10) Relativamente à divergência entre as quantidades comunicadas no inventário a 31/12/2015 e as da contagem física de 22/09/2016, o erro está ou na fatura 1500/000002 ou na fatura 1500/000006, e não nas duas.
11) A Impugnante veio a apurar que o erro foi referente à fatura n.º 1500/000006 de 600 unidades, pelo que o stock deveria ser de 4.575.
12) Da contagem efetuada em 22/09/2016, que, diga-se, não foi feita peça a peça, mas pela soma das quantidades escritas na parte exterior de cada caixa, o total ascendia a 4.655 unidades, daí que a divergência verificada é alcançada pela diferença entre o stock real (4.575) e a contagem efetuada 4.655, é positiva em 80 unidades e não 480 como refere o projeto de decisão.
13) Os produtos que foram incorporados nas UPS que vieram com defeito do fornecedor nas placas controladoras e tiveram que ser substituídas são as seguintes:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

14) Por que se tratava do fornecedor “V.” que é de nacionalidade chinesa junto do qual reclamou os referidos defeitos, e por aquele foi autorizada a efetuar a reparação das UP’s comprometendo-se a mesma a descontar nos posteriores fornecimentos o preço que a Impugnante pagassem nos termos do ajustado entre ambos, com a aquisição das placas.
15) Atento os custos que a recolha defeituoso comportaria, já que se tratava de um fornecedor de nacionalidade chinesa, optaram as partes intervenientes no negócio em ajustar a reparação nos termos que constam dos emails.
16) Como a Impugnante não possui contabilidade de custos, os consumos internos são refletidos no inventário.
17) O referido material destinou-se a substituir componentes de material adquirido que veio com defeito e que por acordo das partes intervenientes na transação, a reparação seria feita pela Impugnante e que posteriormente os bens seriam vendidos pela mesma.
18) Não se destinou a incorporar qualquer bem destinado ao consumo interno da Impugnante.
*
Não existem quaisquer outros factos provados ou não provados relevantes para a boa decisão da causa.

Motivação
A convicção do Tribunal na consideração dos factos provados alicerçou-se no teor dos documentos juntos aos autos que não foram impugnados. O relatório de inspecção tributária é um documento autêntico, nos termos do art.º 371.º, n.º 1 do CC, uma vez que é exarado por funcionário da administração tributária, no âmbito e exercício das respectivas funções, o mesmo tem força probatória plena relativamente aos factos afirmados como sendo praticados pela administração tributária ou com base na percepção dos seus órgãos e que apenas pode ser ilidida nos termos da lei (art.s 363.º e ss do CC e 546.º e ss do CPC). Os factos contidos no RIT respeitam a factos decorrentes da percepção do inspector no âmbito do procedimento inspectivo e os que não forem impugnados devem ser valorados em conjugação com os restantes elementos de prova segundo as regras da experiência comum.

Motivação

Factos provados:
Alínea r): A convicção do Tribunal resultou da consideração do depoimento de P., contabilista da Impugnante há cerca de vinte anos, que demonstrou conhecimento desta factualidade em virtude das funções que desempenha e que demonstrou esta factualidade.
Alínea s): A convicção do Tribunal resultou do documento de fls. 813 do sitaf emitido pela “S., SARL”, destinatário dos bens, que comprovou a receção das referidas mercadorias, nas suas instalações, em Tanger, documento não impugnado pela RFP.

Factos não provados:
Pontos 1) a 3): A convicção do Tribunal resultou da falta de prova desta factualidade, porquanto as testemunhas inquiridas não lograram convencer o Tribunal sobre a mesma. Com efeito, M., Administrativa, funcionária da Impugnante desde 2001, não demonstrou conhecimento das negociações subjacentes às faturas em causa, não conseguiu identificar a mercadoria em causa e confirmar os pagamentos.
P., contabilista da Impugnante há cerca de vinte anos, não demonstrou conhecimento das negociações subjacentes às faturas em causa, não conseguiu identificar a mercadoria em causa e confirmar os pagamentos.
P., sócio da Impugnante, afirmou que a “S., SARL” é cliente da Impugnante e que forneceram àquela sociedade mercadoria em diversas ocasiões. Sobre estas faturas, declarou que se tratou de uma operação bastante grande, mas sobre a forma como se processou o envio da mercadoria declarou ter um conhecimento genérico desse pedido. Declarou que os fornecedores enviavam o material para Zamora e os camiões saíam, mas os camiões podiam seguir com mais material para além do material da Impugnante. Aludiu ao procedimento genérico de envio de mercadoria, mas sobre o envio, receção e pagamentos desta mercadoria em concreto não demonstrou conhecimento. Demonstrou desconhecimento sobre a empresa que tratou do despacho alfandegário, declarando que não sabia, que não era a sua área. Sobre o envio e receção da mercadoria por parte da “S.” declarou apenas que a mercadoria saiu (sem concretizar as razões para afirmar que a mercadoria saiu, foi enviada e rececionada pelo cliente) e que o cliente está satisfeito (sem demonstrar um conhecimento preciso sobre o conteúdo das faturas em causa nos presentes autos -artigos, valores, quantidades e pagamentos- e que este material foi aquele que foi efetivamente enviado e rececionado pela “S.”). A testemunha declarou que ter-se-á deslocado a Marrocos para conferir a instalação de material, mas sobre a data em que o fez demonstrou incoerência e imprecisão que abalam o depoimento, pois afirmou que se as faturas foram emitidas em 2014, então ter-se-á deslocado em 2015 ou se as faturas são de 2015, ter-se-á deslocado em 2016, ou seja, a testemunha demonstrou, assim, desconhecimento sobre as faturas em causa nos presentes autos e afirmou que houve mais fornecimentos, pelo que o Tribunal não ficou convencido sobre se o material que a testemunha diz ter visto instalado em Marrocos é o correspondente às faturas que estão a ser discutidas nos autos.
J., que entre 2004 e 2016 trabalhou no armazém do “G.”, empresa transportadora, em Zamora, aludiu a transportes de mercadorias da Impugnante juntamente com mercadoria do G., para Marrocos, mas este depoimento revelou-se genérico e insuficiente, não conseguindo a testemunha concretizar minimamente as concretas operações comerciais em causa nos presentes autos, datas e quantidades para convencer o Tribunal do efetivo envio e receção da mercadoria a que se reportam as faturas em causa nos presentes autos (note-se que a testemunha referiu que não conferia a mercadoria que estava dentro das caixas e que enviavam frequentemente mercadoria para Marrocos), pelo que o Tribunal não ficou convencido sobre se o material a que a testemunha alude é o correspondente às faturas que estão a ser discutidas nos autos.
L., trabalhou no departamento financeiro do Grupo “I.” (declarou que esta e a Impugnante funcionam como um grupo informal) que tinha relações comerciais com a Impugnante e afirmou que tratou de uma mercadoria em 2014/2015 que ia para uma empresa em Marrocos. Foi confrontado com fls. 216 e 217 do processo físico declarando que este documento demonstra o pagamento da mercadoria em causa nos presentes autos, mas não conseguiu convencer o Tribunal deste facto, pois afirmou desconhecer a mercadoria em causa, o ano da mesma e que não conhecia o conteúdo das faturas em causa nos presentes autos, pelo que a testemunha não conseguiu concretizar com algum grau de certeza que estamos a falar de pagamentos respeitantes às faturas dos autos.
H., empresário, afirmou ter duas empresas, a “M. KFT e a “E. Sociedade Limitada” que teve relações comerciais com a Impugnante e que tratou de uma operação com a Sociedade G., a partir de Zamora. Sobre o envio e receção da mercadoria em causa nos presentes autos, declarou que esta sociedade comprou muito material e que a mercadoria em causa nos presentes autos fará parte de uma operação muito maior, mas não soube concretizar os fornecimentos, valores e quantidades. Afirmou que enviaram muita mercadoria para Marrocos em camiões, desconhecendo o despachante e respetivo despacho alfandegário, pelo que o Tribunal não ficou convencido sobre se o material a que a testemunha alude é o correspondente às faturas que estão a ser discutidas nos autos.
Deste modo, o documento particular subscrito pelo Administrador do G. P. de fls. 112 do processo físico, os CMR’s de fls. 115 e 118, os emails de fls. 119 a 121 do processo físico e fls. 813 (declaração emitida pelo destinatário), email’s de fls. 119 a 121 do processo físico e contas correntes de fls. 214 a 219 do processo físico, desacompanhados de outras provas, como vimos, não demonstram que as mercadorias a que se reportam a fatura/recibo n.º O1-I/14-00097 de 04/09/2014, no valor de € 184.600,00 e fatura/recibo n.º 01-I/14-00163, no valor de € 134.900,00 emitidas para o cliente “S., SARL”, no total de € 319.500,00 foram enviadas e pagas pelo destinatário dos bens.

Ponto 4): A convicção do Tribunal resultou da falta de prova desta factualidade, porquanto as testemunhas inquiridas não lograram convencer o Tribunal da mesma. Com efeito, M., Administrativa, funcionária da Impugnante desde 2001, demonstrou total desconhecimento sobre as negociações subjacentes às faturas em causa, nem efetuou correspondência entre as operações de fls. 145, 146, 148, 149, 150, 174, 184, 186, 187 do processo físico e as transações em causa nos presentes autos.
P., contabilista da Impugnante há cerca de vinte anos, não demonstrou conhecimento das negociações subjacentes às faturas em causa, nem efetuou correspondência entre as operações de fls. 145, 146, 148, 149, 150, 174, 184, 186, 187 do processo físico e as transações em causa nos presentes autos.
P., sócio da Impugnante, sobre esta matéria declarou apenas que a “A.” ajudou a Impugnante a solucionar um problema com umas UPS´s. Estas teriam problemas e a Impugnante terá optado por proceder à reparação das mesmas e que a “A.” terá fornecido o material para proceder a essa reparação. Contudo, trata-se de um depoimento genérico e insuficiente, não conseguindo a testemunha concretizar minimamente as concretas operações comerciais em causa nos presentes autos, datas, quantidades, preços e pagamentos para convencer o Tribunal do efetivo fornecimento e pagamento dos bens (não efetuou correspondência entre as operações de fls. 145, 146, 148, 149, 150, 174, 184, 186, 187 do processo físico e as transações em causa nos presentes autos) a que se reportam as faturas desconsideradas pela AT.

Pontos 5) a 7): A convicção do Tribunal resultou da falta de prova desta factualidade, porquanto M., Administrativa, funcionária da Impugnante desde 2001, demonstrou total desconhecimento sobre este fornecedor e as negociações subjacentes às faturas em causa, aludindo apenas ao procedimento genérico.
P., sócio da Impugnante, sobre esta matéria demonstrou desconhecimento deste fornecedor, aludindo apenas a procedimentos genéricos.

Pontos 8) a 12): A convicção do Tribunal resultou da falta de prova desta factualidade, porquanto M., Administrativa, funcionária da Impugnante desde 2001, demonstrou total desconhecimento desta factualidade.
P., contabilista da Impugnante não demonstrou conhecimento sobre as negociações subjacentes às faturas em causa.
P., sócio da Impugnante, sobre esta matéria não demonstrou conhecimento direto, desconhecendo os concretos erros incorridos na emissão das faturas (omisso quanto às quantidades e preços unitários em que se traduziu o erro), aludindo apenas a que a “A.” teria enviado faturas retificadas e não retificativas, pelo que as duas faturas ficaram agrafadas. Contudo, trata-se de depoimento genérico que não serve o propósito de demonstrar o erro incorrido na emissão das faturas, não tendo convencido o Tribunal sobre qual das faturas titula as operações reais. Note-se que sobre os negócios subjacentes às faturas, a testemunha limitou-se a afirmar que a “A.” terá fornecido material para reparar UPS’s, mas sobre as quantidades e preços do material fornecido, a testemunha foi omissa dizendo apenas que tinham um armazém caótico, que nem sequer anotavam as peças usadas na reparação e não conseguiu concretizar qualquer erro de contagem. Quanto ao facto de a contagem não ter sido feita peça a peça, era crucial que a testemunha tivesse conseguido concretizar qual a contagem correta, o que não sucedeu. Ante o exposto, a testemunha não conseguiu demonstrar a factualidade vertida no quesito.

Pontos 13) a 18): P., sócio da Impugnante, sobre esta matéria não demonstrou conhecimento direto, sendo um depoimento genérico e impreciso, pois sobre os negócios subjacentes às faturas, a testemunha limitou-se a afirmar que a “A.” terá fornecido material para reparar UPS’s, mas sobre as quantidades e preços do material fornecido, a testemunha foi omissa dizendo apenas que tinham um armazém caótico, que nem sequer anotavam as peças usadas na reparação e não conseguiu concretizar qualquer erro de contagem. Quanto ao facto de a contagem não ter sido feita peça a peça, era crucial que a testemunha tivesse conseguido concretizar qual a contagem correta, o que não sucedeu. Ante o exposto, a testemunha não conseguiu demonstrar a factualidade vertida nos quesitos. (…)”

4. JULGAMENTO DE DIREITO

A. No Recurso da Autoridade Tributária e Aduaneira

4.1. A questão que cumpre decidir é a de saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento consubstanciado não só na incorreta apreciação e valoração da matéria factual, designadamente por violação do princípio do inquisitório patente no artigo 411.º do CPC e dos artigos 27.º, 28.º, 29.º, 35.º e 41.º do CIVA.

Vejamos:
A questão a decidir prende-se com a liquidação adicional n.º 2017020050307, de IVA e de juros compensatórios respeitantes ao período de 12/2014, num total de € 132 823,19.

A sentença recorrida anulou a liquidação n.º 2017020050307, IVA 12/2014, de 22/06/2017, na parte em que excede € 31.027,00, por considerar que: “Ora, tendo a Impugnante apresentado declaração periódica de IVA declarando duas facturas de vendas de mercadorias, sem liquidação de IVA, dado se referirem a exportações (operações isentas nos termos do art.º 14.º do CIVA), entende-se que o procedimento da AT de anular a declaração periódica apresentada, na íntegra, e reliquidar na totalidade padece de ilegalidade, pois a liquidação n.º 2017020050307, IVA 122014, de 22/06/2017, no valor de € 132.823,19 funda-se nas correções do relatório de inspeção tributária de 13/06/2017 que conclui por uma correção de €31.027,00, pelo que não podia a AT efetuar uma liquidação adicional de valor superior, mais concretamente, de € 132.823,19. Deste modo, impunha-se que a AT tivesse procedido à liquidação adicional apenas do valor de € 31.027,00, sendo ilegal (pois destituída de fundamentação) na parte em que excede este valor (o que pressupõe a manutenção da autoliquidação efetuada pela Impugnante aquando da apresentação da declaração periódica - liquidação n.º 20157011191578, no valor de € 101.796,19 resultante da DP apresentada voluntariamente pelo contribuinte).

A Recorrente alega que a factualidade relevante dada como provada e sobre a qual assenta são os factos constantes das alíneas D), J), K), e L) e que no seu entender incorreu a sentença recorrida em erro de julgamento de facto e de direito, consubstanciado em incorreta apreciação e valoração da matéria factual.

Consta das alíneas D), J), K), e L) o seguinte:
“D) Na sequência das correções referidas em B), a AT emitiu as liquidações adicionais de IVA, relativa aos exercícios de 2014 e 2015, no valor total de € 281.078,6, a seguir discriminadas:
- (…)
- 2017020050307, IVA 122014, de 22/06/2017, no valor de € 132.823,19 (da qual consta um quadro designado “fundamentação” no qual foi exarado que a liquidação efetuada tem por base a correção efetuada pelos Serviços de Inspeção Tributária) e respetivos juros compensatórios no valor de € 2.879,98 (da qual se extrai “juros calculados nos termos do art.º 96.º do CIVA e arts. 35.º e 44.º da LGT por ter sido retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto ou por se ter verificado atraso na insuficiência do pagamento por facto imputável ao contribuinte – valor € 31.027,00 período 11/02/2015 a 06/06/2017 taxa 4,000, total € 2.879,98).
J) Da Declaração Periódica de IVA do período de 201412 apresentada pela Impugnante resultou imposto a pagar no valor de € 101.796,19.
K) Por falta de pagamento do valor mencionado na alínea antecedente, a AT instaurou à Impugnante o processo de execução fiscal n.º 1821201501109928 no âmbito do qual fez pagamentos.
L) Na sequência das correções constantes do RIT a que se alude na alínea b) do probatório, o sistema liquidador de IVA da AT procedeu à anulação total da liquidação mencionada na alínea j) do probatório dando origem à liquidação n.º 2017 020050307 que incluiu o valor de € 101.796,19 mencionado na alínea j) do probatório e o valor proposto no RIT de € 31.027,00.

Analisada a petição inicial – pontos n.ºs 91.º a 104.º - é patente que a Recorrida insurge-se conta a metodologia tida pela AT, por entender que deveria proceder a uma liquidação adicional, apenas do valor das correções efetuadas constantes do relatório, e que liquidou o IVA total relativo ao período incluindo o da liquidação n.º 20157011191578 no valor de 101 796,19 €, resultante da DP por si apresentada voluntariamente e refere que foi anulada.

Alega que a DP apresentada deveria ser mantida, uma vez que existia um processo executivo em curso n.º 1821201501086359, onde estava incluído o 1821201501109928 para cobrança de IVA de 12/2014, com pagamentos efetuados ao abrigo do PERES.

Entende que deveria ser praticado um novo ato que titulasse o excedente ou a diferença, ou seja, € 31.027,00.
Como decorre do teor do relatório de inspeção, constante da matéria de facto provada em B) relativamente ao periodo de 12/2014 fora efetuadas correções à materia tributável corrigidas pelo Inspeção através de DP/DC. Com efeito, a Recorrida apresentou o DP voluntariamente da qual resultou IVA a pagar no valor de 101 796,19 €.

Face aos resultados apurados em sede de inspeção, ocorreu uma correção no valor de € 31.027,00 na qual estava descriminado juros por ter sido retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto no período compreendido entre 11/02/2015 a 06/06/2017 (data da inspeção) à taxa 4,000, total € 2.879,98.

Nesta conformidade, e como resulta da matéria de facto provada na alínea L) que a AT procedeu à anulação total da liquidação mencionada na alínea J) do probatório dando origem à liquidação n.º 2017 020050307 que incluiu o valor de € 101.796,19 (autoliquidado) e o valor proposto no RIT de € 31.027,00.

Assim sendo a sentença incorre em erro de julgamento, na medida em que julga procedente a impugnação na parte em que excede este valor de € 31.027,00.

No procedimento efetuado pela AT não se verifica qualquer ilegalidade pois procede às correções efetuadas com base no relatório de inspeção no qual foram apuradas as referidas quantias, procedendo à liquidação integral da mesma, acrescidas dos respetivos juros e determinando consequentemente anulação da autoliquidação.

Se bem entendemos a sentença recorrida anulou a liquidação adicional por se encontrar destituída de fundamentação, com o que não se pode concordar pois esta ter-se-á procurar no relatório de inspeção como consta expressamente da liquidação efetuada.

Refira-se ainda que, pese embora, existisse o processo executivo em curso n.º 1821201501086359, onde estava incluído o 1821201501109928 para cobrança de IVA de 12/2014, com pagamentos efetuados ou não, não é motivo de ilegalidade nem mesmo ocorre a duplicação da coleta, pois com a anulação da liquidação a consequência normal é a extinção da execução fiscal que tem por suporte a referida liquidação com as respetivas consequências.
Porém esta questão não pode obnubilar a legalidade da liquidação adicional de IVA de 12/2014, pois terá de ser analisada eventualmente em sede de execução fiscal, o que foi expressamente referido pela AT, na decisão da reclamação graciosa.

Destarte, procede o recurso, revogando-se a sentença recorrida no segmento em que anulou a liquidação n.º 2017020050307, IVA 122014, de 22/06/2017, na parte em que excede € 31.027,00, mantendo-se a liquidação integralmente.

Face ao supra decidido dá-se por prejudicado, as demais questões equacionadas no recurso da Autoridade Tributária e Aduaneira.

B. No Recurso da M., LDA.

4.2 A Recorrente nas conclusões - II e III - alega que nos autos foram admitidas as declarações de parte de J., gerente da Impugnante/Recorrente, no entanto a sentença recorrida é completamente omissa no que a esta diz respeito, não fazendo qualquer menção à sua produção.
Entende que ao não se pronunciar ou sequer referenciar as declarações de parte, levariam decisiva e forçosamente outra decisão diversa da tomada na sentença recorrida pelo que incorreu o tribunal “ a quo” em nulidade da sentença, uma vez que estamos perante uma verdadeira omissão de pronúncia subsumível ao nº 1, alínea d) do artigo 615 nº 1 do CPC.

Vejamos:
Nos termos do nº 1 do artigo 125.º do CPPT, constituem causas de nulidade da sentença a falta de assinatura do juiz, a não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, a oposição dos fundamentos com a decisão, a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer.

Por sua vez, a alínea d), do artigo art.º 615.º do CPC aplicável ao contencioso tributário por força da alínea e) do art.º 2 do CPPT, prevê a nulidade da sentença quando o juiz conheça ou não de questões de que não podia tomar conhecimento.

Quer a omissão quer o excesso de pronúncia estão relacionados com o dever que é imposto ao juiz, pelo n.º 2 do artigo 608. º do CPC, de resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, ressalvando aquelas que forem prejudicadas pela solução dada a outra não podendo ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.

A nulidade da sentença, por omissão de pronúncia verifica-se quando existe uma omissão dos deveres de cognição do tribunal, o que sucederá quando o juiz não tenha resolvido todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação e cuja decisão não esteja prejudicada pela solução dada a outras.

É entendimento pacífico e reiterado da jurisprudência que a omissão de pronúncia existe quando o tribunal deixa, em absoluto, de apreciar e decidir as questões que lhe são colocadas, e não quando deixa de apreciar argumentos, considerações, raciocínios, ou razões invocados pela parte em sustentação do seu ponto de vista quanto à apreciação e decisão dessas questões.

Portanto, a nulidade só ocorre nos casos em que o tribunal não tome posição sobre qualquer questão sobre a qual devesse tomar posição, inclusivamente não decidindo explicitamente que não pode dela tomar conhecimento. (Cfr. acórdãos do STA n.ºs 574/11 de 13.07.2011 e 01200/12 de 12.02.2015 e do TCAN nos acórdãos n.ºs 01903/12.5 BEBRG de 26.09.2013, 1481/08.0BEBRG de 10.10.2013 e 02206/10.5BEBRG de 16.10.2014).

Com efeito a sentença recorrida na apreciação da prova não faz menção às declarações de parte do gerente, no entanto, tal situação não configura uma nulidade por omissão de pronúncia, mas quando muito poderá configurar erro de julgamento da matéria de facto que como infra melhor se analisará.

Destarte, improcede a alegada nulidade de sentença.

4.3. Nas conclusões IV a XX a Recorrente impugna a matéria de facto dada como não provada requerendo que seja apreciada e valorada, a prova testemunhal e documental, produzida, para infirmar resposta positiva à matéria de facto dada como não provada, nas alíneas 1) a 18), que no seu entender deveria ter sido dada como provada.

Vejamos:
Pese embora nas conclusões não se dê cumprimento pleno ao artigo 640.º do CPC, no entanto, a indicação dos meios de prova e respetiva localização nas gravações encontra-se identificadas nas motivações das alegações, pelo que se considera cumprido minimamente, o ónus que sobre a Recorrente recai face aquele normativo.

Prevê o art.º 607.º, n.º 5 do CPC que o juiz em primeira instância, na decisão sobre a matéria de facto, aprecia livremente as provas e decide segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto.

A apreciação e valoração da prova, está sujeita ao princípio da livre apreciação da prova a qual se sustenta em critérios racionais e objetivos, em juízos de deduções e conclusões razoáveis, mas sempre de mera probabilidade conduzindo a um juízo positivo da prova quando, se afigure aceitável à luz de um cidadão medianamente informado e esclarecido, que a realidade por eles indiciada se possa ter como efetivamente ter acontecido.

E pelo princípio da sua imediação, que consiste no contacto direto entre o juiz que decide a ação e as testemunhas que fornecem os elementos de prova que interessam à decisão.

O contacto direto, entre o juiz e a testemunha, permite àquele captar uma série relevante de elementos, quer através do que pode perguntar, observar e depreender do depoimento e das reações do inquirido sobre a realidade dos factos.

É jurisprudência pacífica que mesmo com o registo magnético não se conseguem apreender determinadas realidades que só a imediação entre o juiz e a testemunha permite, quando o juiz profere a decisão de acordo com a sua livre convicção, essa convicção foi formada não só com o que lhe foi dito, mas também como foi dito. (Cfr. Acórdãos do STA n.ºs 01188/02 de 18.06.2006 e 109/10 de 12.05.2011).

É, pois, pela fundamentação da sentença que se afere a correção do juízo crítico sobre as provas produzidas.

Assentando a decisão da matéria de facto, no presente caso, na convicção criada no espírito do juiz e baseada na livre apreciação da prova (documental e testemunhal) que foi produzida, a sindicância de tal decisão não pode deixar de respeitar a liberdade da 1ª instância, na respetiva apreciação.

A garantia do duplo grau de jurisdição não subverte o princípio da livre apreciação das provas.
Sobre este entendimento do duplo grau de jurisdição, o Tribunal Constitucional de 13.10.2011, pronunciou-se referindo que (...): “A garantia do duplo grau de jurisdição não subverte, nem pode subverter, o princípio da livre apreciação das provas e não se pode perder de vista que na formação da convicção do julgador entram, necessariamente, elementos que em caso algum podem ser importados para a gravação da prova e factores que não são racionalmente demonstráveis”, de tal modo que a função do Tribunal da 2.ª instância deverá circunscrever-se a “apurar a razoabilidade da convicção probatória do 1.° grau dessa mesma jurisdição face aos elementos que agora lhe são apresentados nos autos(destacado nosso) in Acórdãos do T. C. Vol. 51°, Pág. 206 e ss..

Em suma, apenas haverá erro de julgamento de facto quando se conclua, da confrontação entre os meios de prova produzidos e os factos dados por provados ou não provados, que o juízo feito está em desconformidade com a prova produzida, independentemente da convicção pessoal do juiz acerca de cada facto.

Baixando ao caso dos autos pretende a Recorrente que se dê como provada, os factos das alíneas 1) a 18), dada na sentença recorrida como não provados. E que deve ser aditado aos factos dados como provados que aquando da inspeção e perante a Sra. Inspetora foram pela Impugnante identificadas as UP’S nas quais foram incorporadas parte do material comprado à A., tendo a mesma inspecionado um exemplar de cada placa antes da incorporação e depois da incorporação nas ditas UPS.

E que a Impugnante comprou à empresa A. as mercadorias constantes das faturas inspecionadas, que lhe foram faturadas e entregues e que a Impugnante pagou.

No que concerne às declarações de parte do gerente da Recorrente, J., é indiscutível que é um meio de prova, admissível, por força do art.º 115.º do CPPT e 466.º n.º 1.º do CPC, não tendo a sentença recorrida feito a sua apreciação e valoração incorreu em erro, o qual poderá ou não, afetar a decisão final como infra melhor se decidirá.

Ouvidas e apreciadas as declarações prestadas pelo gerente da Recorrente, J., é nossa convicção que o mesmo prestou um depoimento vago e genérico, sendo que à maior parte das questões que lhe foram equacionadas responde evasivamente, ou referindo que desconhece, dando a entender que se trata de situações normais.

No que concerne ao recrutamento do fornecedor “A.” disse que tiveram conhecimento, através da recomendação da V. que lhe indicou várias empresas na Europa para resolver as avarias que a UPS, placas eletrónicas, que esta lhe forneceu, apresentaram.
E que os negócios com tal empresa, deveu-se ao facto, da V. - fornecedor de nacionalidade chinesa- lhe ter fornecido equipamentos eletrónicos, que estavam avariados que tiveram de ser reparados e após fizeram um encontro de contas. Contrataram a “A.” através de email, como tem sido com muitas outras sociedades, pois é esta a prática corrente e que a contratação com esse fornecedor nada tem de anormal, pois fizeram a certificação da existência fiscal, o que fazem normalmente.

Refere que são situações que ocorrem nas relações comerciais e que são normais.
No que concerne às irregularidades das DUA`S refere que só teve conhecimento aquando da inspeção, desconhecendo a razões pelas quais os documentos não correspondiam.

Com efeito o depoimento, como refere a Recorrente mostra-se “desapegado da realidade”, mostrando desconhecer certas situações, remetendo para a normalidades dos negócios comerciais, não concretizando nem demonstrando que as mercadorias tituladas pelas faturas correspondem a transações efetivamente ocorridas.
Ouvido e apreciado o depoimento, desde já se diga que o mesmo não é suscetível de infirmar resposta positiva à matéria de facto dada como não provada, nas alíneas 1), 2), 3), 4), 6), 7), 8) 9), 10), 11), 12), 13), 14), 15), 16), 17) e 18), na sentença recorrida.

No que concerne aos factos não provados de 1) a 3), ouvidos e reapreciados os depoimentos prestados pelas testemunhas M., P., sendo a primeira administrativa e o segundo contabilista da empresa, não demonstram conhecimento das negociações subjacentes às faturas em causa.
A testemunha, P., sócio da Impugnante refere que forneceram à “S., SARL” com sede em Marrocos, as mercadorias tituladas pelas faturas em causa, que foi uma operação bastante grande desconhecendo como se processou o envio da mercadoria descrevendo um procedimento genérico de envio de mercadoria. Nada concretizando relativamente ao envio, receção e pagamentos da mercadoria em causa. Questionado sobre a empresa que tratou do despacho alfandegário, disse não sabia, que não era a sua área. Sobre o envio e receção da mercadoria pela S., SARL., declarou que a mercadoria saiu e aquela empresa estava satisfeito com material. Disse ainda que se deslocou a Marrocos para conferir a instalação de material, mas sobre a data em tal ocorreu é impreciso não concretizando datas não dando credibilidade ao depoimento para se estabelecer uma correspondência entre o material que disse ter visto e instalado em Marrocos e as faturas em causa nos autos.
A testemunha, J., trabalhou no armazém do G., empresa transportadora, em Zamora, mencionou transportes de mercadorias da Impugnante juntamente com mercadoria do G., para Marrocos, sendo genérico, não concretizando minimamente as operações comerciais em causa nos presentes autos, datas e quantidades.
Quanto ao depoimento de L., trabalhador no departamento financeiro do Grupo “I.” (tinha relações comerciais com a Impugnante funcionando como que grupo informal), refere que tratou de uma mercadoria em 2014/2015 enviada para Marrocos. Confrontado com os documentos de pagamento da mercadoria em causa, disse respeitar ao pagamento da referida mercadoria, mas desconhece conteúdo das faturas e a mercadoria em causa, bem como o ano da mesma.
Relativamente ao depoimento de H., empresário, afirmou ter duas empresas, que teve relações comerciais com a Impugnante e que tratou de uma operação com a Sociedade G., a partir de Zamora. Sobre o envio e receção da mercadoria, não soube concretizar os fornecimentos, valores e quantidades. Refere que enviaram muita mercadoria para Marrocos em camiões, desconhecendo o despachante e respetivo despacho alfandegário.
Ora os depoimentos prestados não nos permitem como pretende a Recorrente dar como provado os factos 1) a 3) nem mesmo conjugado com o depoimento de J. o qual se limitou vagamente a afirmar que relativamente às irregularidades dos DUA`S só teve conhecimento na data da inspeção, manifestando desconhecimento da situação.
Nem mesmo, conjugados com os documentos que foram devidamente apreciados, nomeadamente o documento particular subscrito pelo Administrador do G. P. de fls. 112 do processo físico, os CMR’s de fls. 115 e 118, os emails de fls. 119 a 121 do processo físico e declaração emitida pelo destinatário, email’s de fls. 119 a 121 do processo físico e contas correntes de fls. 214 a 219 do processo físico, não são suscetíveis de dar como provados os factos não provados nas alíneas 1) a 3) do probatório.

No que concerne aos factos das alíneas 4) a 18) ouvidos os depoimentos das testemunhas reapreciada a prova gravada mormente no que respeita aos depoimentos das testemunhas, M. e P. e P., desde já se diga que a sentença recorrida não incorreu em erro de julgamento de facto bem como entendeu corretamente os depoimentos prestados pelas mesmas, na maioria em língua espanhola.

Dos depoimentos não resulta conhecimento direto, desconhecendo os concretos erros incorridos na emissão das faturas (omisso quanto às quantidades e preços unitários em que se traduziu o erro), mencionando apenas a que a “A.” teria enviado faturas retificadas e não retificativas, pelo que as duas faturas ficaram agrafadas na contabilidade.

Os depoimentos são genéricos não demonstraram ter ocorrido erro na emissão das faturas, nem que as faturas titulam as operações reais. Decorre do depoimento - P. -- que sobre os negócios subjacentes às faturas, limitou-se a afirmar que a “A.” terá fornecido material para reparar UPS’s, mas sobre as quantidades e preços do material fornecido, nada foi concretizado.
Reapreciando, nesta vertente o depoimento de parte do gerente da Recorrente, J., limita-se a afirmar que a “A.” terá fornecido material para reparar UPS’s, mas sobre as quantidades e preços do material fornecido também nada concretiza.
Analisados os documentos verifica-se que o documento 44, referente a correspondência (email’s) trocados com V..com.tw., constantes de fls. 131 a 140 do processo em suporte físico, que a Recorrente refere ser o fornecedor V., cujo objeto da comunicação reporta-se a mercadoria fornecidas com defeito, deles não resulta qualquer identificação dos equipamentos nem encomendas.
O doc. 46, constante de fls. 142/143, trata-se de documento particular extraído da contabilidade e tem como título “Extrato de conta de conferência” relativo ao cliente A. Unipessoal, Lda.
Os documentos 48 a 53 referem-se a faturas emitidas por aquela sociedade e os documentos n.ºs 79 a 90, constantes de fls. 176 a 187 são relativos as transferências efetuadas à A. para pagamento das supostas mercadorias.
Nesta conformidade, reapreciada em conjunto, a prova testemunhal, a prova documental, produzida bem como as declarações de parte do gerente, não se pode dar como provados os factos não provados nas alíneas 4) a 18) pelo a sentença recorrida não incorreu em erro de julgamento de facto.

Alega a Recorrente que deve ser aditado à matéria de facto dada como provada os seguintes factos: (i) Que aquando da inspeção e perante a Srª Inspetora foram pela Impugnante identificadas as UP’S nas quais foram incorporadas parte do material comprado à A., tendo a mesma inspecionado um exemplar de cada placa antes da incorporação e depois da incorporação nas ditas UPS.
(ii) E que a Impugnante comprou à empresa A. as mercadorias constantes das faturas inspecionadas, que lhe foram faturadas e entregues e que a Impugnante pagou.
Relativamente ao ponto (i), dos depoimentos supra referidos, nomeadamente do depoimento da testemunha P., e das declarações de parte do gerente, não resulta provado e tal aditamento mostra-se irrelevante para a decisão da causa, pois daí nunca se poderia retirar que as UPS, foram compradas à A..
No que concerne ao ponto (iI) para além de tratar de um juízo conclusivo, que a lei proíbe, dos factos dados como provados e factos não provados não conduzem a tal raciocínio bem pelo contrário.
Destarte, improcede o erro de julgamento da matéria de facto.


4.4. Nas conclusões XXI a XXIV alega que a sentença recorrida, no que alude às liquidações referentes ao ano de 2014, incorreu em erro de julgamento quando refere que tendo em conta o carater formalista do IVA, a necessidade do documento alfandegário reveste formalidade ad substantiam e não ad probationem insuscetível de substituição por qualquer outro meio. Sendo certo que o entendimento que vem sendo perfilhado pelos tribunais superiores vai no sentido oposto, ou seja, de privilegiar a verificação dos requisitos materiais, de fundo, do direito à isenção do IVA, na aceção do artigo 146.º da diretiva Comunitária.
E que na falta desses documentos de acompanhamento/certificados, nos termos do artigo 115.º do CPPT, são admitidos os meios gerais de prova.
Entende que os documentos por si apresentados bem como o facto de ter sido dado como provado que a mercadoria foi entregue ao destinatário, seriam suficientes para comprovar as operações efetuadas e a verificação dos pressupostos para aplicação da isenção prevista.
Alega que, a ausência de documentos oficiais emitidos pelas autoridades aduaneiras, só por si, não é fundamento para rejeitar a prova alternativa apresentada, constituindo uma exigência forma que, por si só, não põe em causa o direito do fornecedor à isenção do IVA, e que os documentos por si apresentados, seriam suficientes para comprovar as operações efetuadas e a verificação dos pressupostos para a aplicação da isenção prevista.
E que tal, dita o princípio da neutralidade fiscal que exige que a isenção do IVA deve ser concedida se as condições materiais estiverem preenchidas, mesmo que o contribuinte não tenha cumprido certas formalidades.

Vejamos:
Do Relatório de inspeção que está na génese das liquidações impugnadas extrai-se que no exercício de 2014 a Impugnante contabilizou duas faturas de venda de mercadorias, sem liquidação de IVA, dado se referirem a exportações (operações isentas nos termos do art.º 14.º do CIVA), por si emitidas, para o cliente “S., SARL”, com sede em Marrocos, no total de € 319.500,00 (fatura/recibo n.º O1-I/14-00097 de 04/09/2014, no valor de € 184.600,00 e fatura/recibo n.º 01-I/14-00163, no valor de € 134.900,00).
Para efeitos de comprovação de isenção de IVA, nos termos do n.º 8 do art.º 29.º do CIVA, os SIT solicitaram à Recorrente a apresentação dos documentos aduaneiros comprovativos da saída das mercadorias do território aduaneiro da União Europeia que se materializa no documento intitulado “certificação de saída para o expedidor/exportador” e o contribuinte informou que o despacho aduaneiro tinha sido efetuado pela empresa espanhola “G.”, com o NIF (…), na estância aduaneira de Algeciras, tendo apresentado os certificados: n.º 14 ES 001131 10724870 – associado à fatura n.º 01-I/14-00097 e n.º 15 ES 001131 10006530, associado à fatura 01-I/14-00163.
Atendendo a que a estância aduaneira não se localizava no território nacional, os SIT efetuaram um pedido de assistência mútua a Espanha, a fim de confirmar a veracidade dos despachos aduaneiros de exportação apresentados pela Recorrente, tendo sido informado que o documento de exportação n.º 14 ES 001131 10724870 não existia nas sua bases – associado à fatura n.º 01-I/14-00097 - e n.º 15 ES 001131 10006530, associado à fatura 01-I/14-00163 – não corresponde ao seu conteúdo com o que se encontra nas sua bases de dados tratando de documentos completamente falsos.
Relativamente às liquidações referentes ao ano de 2014, a sentença recorrida após um preciso e detalhado estudo da legislação aplicável [Código do IVA, Diretiva do IVA, Código Aduaneiro Comunitário (CAC) e Disposições de Aplicação do Código Aduaneiro Comunitário (DACAC)] entendeu que “ (…) Deste modo, o CIVA concedeu a isenção nas exportações, desde que o transmitente dos bens apresente prova adequada, a saber documentos alfandegários adequados, ou seja, o exemplar n.º 3 do documento administrativo único certificado pelos serviços alfandegários do Estado membro de saída da UE (o DAU). Ou seja, em sintonia com o disposto no art.º 273.º da DIVA, o CIVA previu como forma de assegurar o correto funcionamento da isenção evitando, dessa forma, a fraude e evasão fiscais sujeitando tal isenção à apresentação dos documentos alfandegários apropriados.
Ora, dispondo a norma que a prova se faz através da apresentação dos documentos alfandegários apropriados, está a remeter-nos para as regras previstas no Código Aduaneiro Comunitário (CAC) e nas Disposições de Aplicação do Código Aduaneiro Comunitário (DACAC), incumbindo ao transmitente provar a transmissão de bens expedidos ou transportados para fora do território fiscal da União Europeia, pelo que existindo obrigação legal de intervenção dos serviços aduaneiros, a prova idónea e obrigatória tem que ser baseada nos documentos alfandegários que o legislador aduaneiro considerou adequados para a exportação, sendo certo que estamos no domínio de normas harmonizadas da UE.
Deste modo, não se acompanha a argumentação da Impugnante segundo a qual os documentos alfandegários se devem reputar como apropriados à finalidade em causa, que o juízo de propriedade em causa se deverá colocar no plano do tributo e não no plano aduaneiro e que não estará em causa verificar a regularidade do documento para permitir o transporte do bem em causa para um território extracomunitários, mas a idoneidade do mesmo para evidenciar que os bens objeto de determinada transação foram expedidos ou transportados para fora da Comunidade pelo vendedor ou por um terceiro por conta deste. Com efeito, a Impugnante confunde exportação com transmissões intracomunitárias de bens que são realidade distintas, pois naquelas intervêm as Alfandegas, pelo que a legislação harmonizada sobre a matéria ao nível do Direito da UE deve ser respeitada, sendo que a entrada e a saída dos bens do território aduaneiro da UE são devidamente controladas através dos documentos apropriados que atestam a sua saída e entrada no território aduaneiro, daí que não se acompanhe a argumentação da Impugnante. (…)”.

Com efeito, e nos termos do disposto no n.º 8 do artigo 29.º do Código do IVA, os sujeitos passivos de IVA, sem prejuízo de disposições especiais, nas transmissões de bens e as prestações de serviços, isentas do IVA ao abrigo, da alínea a) do n.º 1 do artigo 14.º do mesmo Código, devem ser comprovadas através dos documentos alfandegários apropriados ou, não havendo obrigação legal de intervenção dos serviços aduaneiros, de declaração emitidas pelo adquirente dos bens ou utilizador dos serviços, indicando o destino que lhes irá ser dado.

Preceitua a alínea a) do n.º 1 do artigo 14.º do CIVA que estão isentas de imposto as transmissões de bens expedidos ou transportados para fora da Comunidade pelo vendedor ou por um terceiro por conta deste.
É de salientar, tal como o fez a sentença recorrida, que o CIVA ao exigir “documentos alfandegários apropriados”, para comprovar a isenção do IVA, remete-nos para legislação especial, nomeadamente, para as regras previstas no Código Aduaneiro Comunitário (CAC) e nas Disposições de Aplicação do Código Aduaneiro Comunitário (DACAC).

Assim, as operações isentas de IVA que imponham o cumprimento das formalidades previstas na regulamentação aduaneira devem ser comprovadas com os documentos emitidos nos termos dessa mesma regulamentação.

Estando no caso em apreço, em causa a transmissão de mercadoria tituladas pelas faturas, para Marrocos, terá de existir documentos aduaneiros comprovativos da saída das mercadorias do território aduaneiro da União Europeia que se materializa no documento intitulado “certificação de saída para o expedidor/exportador”.
A falta de documentos alfandegários apropriados determina a obrigação para o transmitente dos bens ou prestador dos serviços de liquidar o imposto correspondente, por força do n.º 9 do artigo 29.º do Código do IVA.

No caso em apreço tal como conclui a sentença, tendo sido expedidos ou transportados para fora da União Europeia, mercadorias pelo vendedor ou por um terceiro por conta deste, deveria ser comprovada através dos documentos alfandegários, ou seja, exemplar n.º 3 do documento administrativo único certificado pelos serviços alfandegários do Estado membro de saída da UE (o DAU).

Alega a Recorrente que na falta desses documentos de acompanhamento/ certificados, nos termos do artigo 115º do CPPT, são admitidos os meios gerais de prova.
Como refere a sentença recorrida “ (…) Deste modo, as provas alternativas só são admissíveis quando seja apresentada a declaração aduaneira de exportação e não exista coincidência entre estância aduaneira de exportação e estância aduaneira de saída, e não tenha sido devidamente devolvido o exemplar 3 dessa declaração com a certificação da saída das mercadorias do território aduaneiro da UE ou essa certificação não tenha sido comunicada pela estância aduaneira de saída à estância aduaneira de exportação através de sistemas informatizados, o que não é o caso dos autos. Com efeito, a Impugnante não provou estar perante situação enquadrável no artigo 796.º-DA das DACAC, pois o procedimento neste previsto aplica-se quando tenha havido autorização de saída das mercadorias para exportação, o que não é o caso dos autos. Com efeito, no caso dos autos, estamos perante documento que as autoridades espanholas atestaram que eram falsos, pelo que não há que aplicar o regime vertido no art.º 796.º-DA das DACAC, não sendo admissível prova alternativa.
Com efeito, tendo em conta o carácter formalista do IVA que tem em vista, designadamente, evitar a evasão fiscal, estas formalidades revestem a natureza ad substanciam e não ad probationem, insuscetível de substituição por um qualquer outro meio de prova. (…)”. Destacado nosso).

A Recorrente concluiu que os documentos por si apresentados, bem como o facto de ter sido dado como provado que a mercadoria foi entregue ao destinatário, seriam suficientes para comprovar as operações efetuadas e a verificação dos pressupostos para aplicação da isenção prevista.

No entanto, mostra-se equivocada na medida em que a sentença recorrida não deu por provado que a mercadoria foi entregue ao destinatário, muito menos na alínea f) que a Recorrente refere nas motivações das alegações (pontos 24 e 25).

Alega ainda, que o entendimento que vem sendo perfilhado pelos tribunais superiores em sede de IVA, vai no sentido de privilegiar a verificação dos requisitos materiais, de fundo, do direito à isenção do IVA, na aceção do artigo 146º da diretiva Comunitária.

Porém não assiste razão à Recorrente pois o Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), no proc C-563/12, (Caso BDV Hungary Trading) de 19.12.2013 quando questionado, se é compatível com os princípios da neutralidade fiscal, da segurança jurídica e da proporcionalidade, o facto de a legislação de um Estado membro prever requisitos adicionais aos estabelecidos nas Diretivas e fazer depender de requisitos objetivos e cumulativos que delas não constam a qualificação de uma exportação como isenta, tendo em vista a prevenção da evasão, do abuso e da fraude fiscais, tendo em vista a uma correta liquidação e cobrança do imposto, podendo a Administração Fiscal alterar a qualificação de uma exportação isenta e exigir o pagamento do imposto ao sujeito passivo.
E salienta que “… como resulta do artigo 131.º da Diretiva 2006/112, as isenções previstas nos capítulos 2 a 9 do título IX desta diretiva, de que o artigo 146.º faz parte, aplicam-se nas condições fixadas pelos Estados-Membros a fim de assegurar a aplicação correta e simples das referidas isenções e de evitar qualquer possível fraude, evasão ou abuso.
Face ao exposto, a sentença recorrida não incorreu em erro de julgamento pelo que improcede a pretensão da Recorrente.

4.5. Nas conclusões XXV a XXXI alega que a sentença recorrida, relativamente às liquidações de 2015 ao concluir que a Recorrente não logrou demonstrar que as faturas em causa titulam operações reais, motivo pelo qual não mereceu censura a atuação da AT em desconsiderar as faturas emitidas pela “A. ” mantendo as correções e as liquidações o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento.

Alega que a Recorrente logrou demonstrar a realidade das operações consubstanciadas nas faturas, e, a existência e a quantificação dos factos tributários.
Pelo que dos elementos probatórios juntos aos autos e, designadamente, dos depoimentos prestados em sede de instrução, provou a Recorrente os factos que alegou ou que, pelo menos, existem fundadas dúvidas sobre a existência e a quantificação dos atos tributários, sendo certo que a AT nessa matéria, e que é acompanhado pelo Tribunal a quo, não se mostra devidamente confirmado por factos concretos.
E que atenta a regra da repartição do ónus da prova, não deveria haver lugar às correções efetuadas pela AT uma vez que se não verifica a exclusão constante do nº 3 do artigo 19.º do CIVA.

Alega que o imposto suportado e, posteriormente por si deduzido reporta-se a operações económicas efetivamente realizadas, as faturas constantes da sua contabilidade representam transações comerciais reais, operações em que houve a efetiva entrega da mercadoria e pagamento do preço indicado nas faturas.

Entende que o Tribunal a quo decidiu mal, contra os factos apurados e contrariamente ao que se impunha face aos elementos que ressaltam dos autos, errando no julgamento da matéria de facto e de onde resultou, erro de julgamento da matéria de direito.

Vejamos:
No caso em apreço como supra se referiu estão em discussão as liquidações de IVA, e respetivos juros compensatórios do ano de 2015, no qual a Administração Fiscal não aceitou a dedução do IVA, em 22 faturas, emitidas pelo fornecedor A., Lda., no montante de € 550 972,35.
O art.º 20º, n.º 1, do CIVA preceitua que “Só poderá deduzir-se o imposto que tenha incidido sobre bens ou serviços adquiridos (…) pelo sujeito passivo (…)
A Administração Tributária fundou a sua atuação no n.º 3 do art.º 19º CIVA não aceitando a dedução do IVA.

Dispõe, no entanto, o artigo 19.º, n.º 3 do Código do IVA (CIVA) que “[não] poderá deduzir-se imposto que resulte de operação simulada ou em que esteja simulado o preço constante da fatura ou documento equivalente.”

Resulta do disposto no artigo 82.º do CIVA (numeração e redação à data dos factos), que a Administração Tributária poderá retificar as declarações dos sujeitos passivos e proceder à correspondente liquidação adicional quando fundamentadamente considere que nelas figura um imposto inferior ou uma dedução superior aos devidos.

Como é sabido quando a Administração Tributária desconsidera as faturas que reputa de falsas, aplicam-se as regras do ónus da prova do artigo 74.º da Lei Geral Tributária (LGT), competindo-lhe, fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua atuação, ou seja, de que existem indícios sérios de que a operação constante da fatura não corresponde à realidade.

Vem a jurisprudência entendendo de modo uniforme que, quando estão em questão correções de liquidações quer de IVA, as quais foram consideradas falsas pela administração tributária, as regras de repartição do ónus da prova a ter em conta são as seguintes:
Em primeira linha compete à administração tributária fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua atuação, ou seja, terá que demonstrar a existência de indícios sérios de que a operação referida na fatura foi simulada.
Em segunda linha, e após feita essa prova, compete ao sujeito passivo o ónus da prova dos factos que alegou como fundamento do seu direito deduzir os custos declarados na determinação da respetiva matéria tributável nos termos que decorrem do artigo 19.º n.º 3 do CIVA, não lhe bastando criar dúvida sobre a sua veracidade.

Neste sentido, vide jurisprudência acórdãos do STA n.º 01483/02 de 20.11.2002, 1026/02 de 07.05.2003 e 0241/03 de 30.04.2003 400/15 de 16.03 e 600/15 de 16.11.2016 bem como a jurisprudência do Tribunal Central Administrativo do Norte n.º 01834/04 Viseu, de 24.01.2008, 04871/04 – Viseu de 28.01.2010, 1026/02 de 24.01.2008, 2887/04 Viseu de 24.01.2008 in www.dgsi.pt.

É aplicável ao caso em apreço a jurisprudência do acórdão do STA - Pleno da Secção do CT, Recurso nº 01026/02, de 07.05.2003, que refere: Tendo a Administração Fiscal, por considerar não se terem efectivamente realizado as operações consubstanciadas em determinadas facturas, existentes na escrita do contribuinte, obstado à dedução do IVA que daquelas facturas consta, ao abrigo do disposto no artigo 19º nº 3 do CIVA, cabe ao contribuinte, no processo em que impugne a actuação da Administração, a prova dos pressupostos de que depende o seu direito àquela dedução.”

Prossegue o mesmo acórdão dizendo que: “…. é aquele que correntemente se vem chamando de “facturas falsas”, isto é, a contabilidade considera (e trata de forma contabilisticamente correcta) documentos emitidos na forma legal, mas que não correspondem a qualquer realidade, porque as operações que era suposto reflectirem, na verdade, não tiveram lugar.
E, aqui, a lei não exige senão “indícios fundados”, ou seja, não impõe à Administração a “prova provada” de que por detrás dos documentos não está a realidade que normalmente reflectem e comprovam, basta-se com indícios fundados para fazer cessar a presunção a favor do contribuinte. E a este, desprovido do escudo protector da presunção, não resta senão demonstrar a veracidade dos seus elementos contabilísticos, e respectivos suportes, destarte posta em crise, face àqueles “fundados indícios”. (destacado nosso).

Tendo a Administração Tributária feito a prova que lhe competia da verificação de indícios sérios, objetivos e consistentes que permitam concluir que as faturas contabilizadas pela Recorrente/Impugnante eram faturas que não tinham subjacentes aquisições de placas eletrónicas, o que não vem impugnado pelo Recorrente.

Relativamente a esta questão a sentença recorrida entendeu que a Administração Fiscal cumpriu o ónus que sobre si recaia.
Em síntese a AT, recolheu indícios junto fornecedor A., Lda. concluindo que no sistema informático, consta como único gerente I., de nacionalidade romena, e que esta empresa não existe como organização (elemento organizacional), uma vez que não existindo elemento material e humano, também não existe ligação entre os mesmos, a sociedade, para além da sua denominação social, não existe; não detém instalações físicas apropriadas ao exercício de uma atividade comercial e/ou industrial, não detém quaisquer colaboradores ao seu serviço.

Relativamente ao utilizador das faturas, aqui Recorrente, apuraram incongruências na análise dos documentos e existências de elementos da veracidade da relevação contabilística do destino dado aos produtos alegadamente comprados (consumo/inventário). Controlaram as quantidades e verificaram a existência em alguns casos, de duas faturas, com o mesmo número, data e valor, mas com conteúdos diferentes, duplicando as quantidades dos produtos e os preços unitários passam para metade; identificaram divergências nas datas das emissões de faturas com os n.º 1500/000002, 1500/000005 e 1500/000006, com datas de 15.09.01, 03.09.2015 e 04.09.2015, contabilizadas pela Recorrente e na contabilidade do emissor “A.” tem as datas de 01.10.2015, 02.10.2015 e 02.10.2015, respetivamente ainda divergências no inventário de mercadorias em 31.12.2015.

Tendo a Administração Tributária desconsiderado faturas que reputou de falsas e demonstrado que existiam indícios sérios e credíveis de que as operações constantes das faturas não correspondiam à realidade recai sobre a Impugnante / Recorrente o ónus de provar que, apesar dos indícios recolhidos quanto à simulação das operações, as faturas titulavam efetivamente reais operações.
Como consta dos pontos 4.2 e 4.3. deste acórdão a Recorrente impugnou a matéria de facto constante nas alínea 4) a 18) da matéria de facto não provada não obtendo sucesso na sua impugnação, como supra se decidiu.
Destarte, recaindo o ónus da prova sobre a Recorrente, competia-lhe demonstrar a materialidade das operações económicas subjacentes às faturas, nomeadamente, que os fornecimentos equipamentos eletrónicos (PWA) descritos das 22 faturas foram fornecidos pela sociedade emitente.

As faturas em crise bem como os registos contabilísticos e financeiros não conseguem, só por si, comprovar a realidade que se pretende demonstrar, nem mesmos outros elementos documentais constantes da contabilidade dos quais resultam incongruências, juntos ao processo, bem como a prova testemunhal e documental produzida.

Resulta assim que a Recorrente não logrou demonstrar os equipamentos/componentes eletrónicos que constam das faturas que foram fornecidas pela A. não tendo feito tal prova a impugnação teria de improceder, pelo que bem decidiu a sentença recorrida.

Destarte, improcedem as conclusões de recurso.

Nas conclusões XV a XIX alega que, na formação da convicção do Tribunal, que a sentença recorrida refere que o relatório de inspeção tributária é um documento autêntico, nos termos do artigo 371º, nº 1 do CC, uma vez que é exarado por funcionário da administração tributária no exercício das respetivas funções, o mesmo tem força probatória plena relativamente aos factos afirmados como sendo praticados pela administração tributária ou com base na perceção dos seus órgãos e que apenas pode ser elidida nos termos da lei.

Ora entende a ora Recorrente que não assiste razão ao tribunal pois o valor probatório do relatório de inspeção está condicionado pela aplicação do principio do contraditório sob pena de direta violação do artigo 20.º nº 4 da CRP, que postula um processo judicial tributário equitativo e subordinado a critérios de legalidade, o que requer plena igualdade de armas entre as partes, como de resto é reconhecido pelo artigo 98.º da LGT. Assim o valor probatório do relatório de inspeção tributária só poderá ter força probatória se as asserções que do mesmo constam não forem impugnadas. E que in casu, logo quando notificada para exercício do direito de audição, posteriormente na reclamação graciosa, e em sede de impugnação judicial, pôs em causa o relatório de inspeção, contraditando o mesmo nas suas asserções.

Esclareça-se que, o Relatório de inspeção tributária, quando devidamente fundamentado e desde que baseado em critérios objetivos, faz fé pública relativamente aos factos que integra nos termos do artigo 76.º, n.º 1, da LGT.

Ademais, trata-se de um tipo de documento autêntico (cfr. artigo 363.º, n.º 2, do CC), com força probatória plena, apenas ilidível nos termos da lei, no que concerne aos factos que referem como praticados pela autoridade ou oficial público respetivo, assim como dos factos que neles são atestados com base nas perceções da entidade documentadora, tal como refere a sentença recorrida.

Porém o contribuinte, não fica impedido de demonstrar a falsidade parcial ou total do relatório ou de demonstrar que os factos que dele constam não conduzem ao resultado (fiscal) visado pela AT. (cfr. acórdão do TCAN n.º 0383/08.4BEBRG de 28.02.2013).

Mas, no caso sub judice a prova produzida pelo Recorrente, como supra se decidiu, não logrou atingir tal objetivo.

Por fim na conclusão XXVII a Recorrente alega que, provou os factos que alegou ou que, pelo menos, existem fundadas dúvidas sobre a existência e a quantificação dos atos tributários, sendo certo que a AT nessa matéria, e que é acompanhado pelo Tribunal a quo, não se mostra devidamente confirmado por factos concretos.

Tal conclusão remete-nos para a violação do art.º 100.º do CPPT, o qual dispõe que “sempre que da prova produzida resulte a fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário, deverá o ato impugnado ser anulado”.
Como refere Jorge Lopes de Sousa, in CPPT, anotado e comentado, Vol. II, 6ª edição, 2011, Áreas Editora, pág. 133. “(…) o n.º 1 do art. 100.º, n.° 1, do CPP consubstancia uma norma de caracter geral de que resulta recair sobre a administração tributária o ónus da prova dos factos que relevam para a quantificação da matéria tributável. (…)

No caso em análise, já vimos, que era à Administração Tributária, que cabia o ónus da prova dos factos que alegou como fundamento de excluir a dedução do imposto, nos termos do n.º 3 do art.º 19º do CIVA, respetivamente.

O n.º 1 do artigo 100.º do CPPT não deixa de ser a aplicação ao processo judicial tributária da regra geral sobre o ónus da prova no procedimento tributário, constante do artigo 74.º, n.º1 da LGT, (prevista também no n.º 1 do artigo 342.º do CC), nos termos da qual o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração e dos contribuintes recai sobre quem os invoque.
Aplicando aquela regra respeitante ao ónus da prova, no processo judicial, dever-se-á concluir “que, nos casos em que se verificar uma destas situações em que no procedimento tributário é atribuído o ónus da prova ao contribuinte, as dúvidas que no processo judicial subsistam sobre a matéria de facto, não podem considerar-se dúvidas fundadas para efeitos de, nos termos daquele n º1, justificarem a anulação do acto”. (cfr. acórdão do TCAN n.º 0383/08.4BEBRG de 28.02.2013).

Compete, pois, ao contribuinte o ónus da prova dos factos que alegou como fundamento do seu direito de dedução do imposto nos termos do artigo 19.º do CIVA, não lhe bastando criar dúvida sobre a sua veracidade, ainda que fundada, pois neste caso o artigo 100.º do CPPT não tem aplicação.

De todo o exposto improcede o presente recurso, mantendo-se as liquidações do IVA e dos respetivos juros.

4.6. E assim formulamos as seguintes conclusões/Sumário.

I. Nos termos do disposto no n.º 8 do artigo 29.º do Código do IVA, os sujeitos passivos de IVA, sem prejuízo de disposições especiais, nas transmissões de bens e as prestações de serviços, isentas do IVA ao abrigo, da alínea a) do n.º 1 do artigo 14.º do mesmo Código, devem ser comprovadas através dos documentos alfandegários apropriados ou, não havendo obrigação legal de intervenção dos serviços aduaneiros, de declaração emitidas pelo adquirente dos bens ou utilizador dos serviços, indicando o destino que lhes irá ser dado.

II. Preceitua a alínea a) do n.º 1 do artigo 14.º do CIVA que estão isentas de imposto as transmissões de bens expedidos ou transportados para fora da Comunidade pelo vendedor ou por um terceiro por conta deste.

III. Vem a jurisprudência entendendo de modo uniforme que, quando estão em questão correções de liquidações quer de IVA, as quais foram consideradas falsas pela administração tributária, as regras de repartição do ónus da prova a ter em conta são as seguintes:
Em primeira linha compete à administração tributária fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua atuação, ou seja, terá que demonstrar a existência de indícios sérios de que a operação referida na fatura foi simulada.
Em segunda linha, e após feita essa prova, compete ao sujeito passivo o ónus da prova dos factos que alegou como fundamento do seu direito deduzir os custos declarados na determinação da respetiva matéria tributável nos termos que decorrem do artigo 19.º n.º 3 do CIVA, não lhe bastando criar dúvida sobre a sua veracidade.

5. DECISÃO

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, em:

A) Conceder provimento ao recurso da Autoridade Tributária e Aduaneira revogando-se a sentença recorrida na parte que anulou a liquidação n.º 2017020050307, IVA 122014, de 22/06/2017, na parte em que excede € 31.027,00, mantendo-se a liquidação integralmente.
B) negar provimento ao recurso, da M., LDA., mantendo-se sentença recorrida.
*
Após trânsito em julgado do presente acórdão dê-se conhecimento ao processo n.º 732/17.4IDPRT pendente no tribunal Judicial da Comarca do Porto - Juízo de Instrução Criminal de Matosinhos- Juiz 4 do presente acórdão.
*
Custas pela Recorrente, M., Lda., em ambas as instâncias, nos termos dos artigos 527.º, n.ºs 1 e 2 do CPC.
*
Porto, 13 de maio de 2021

Paula Maria Dias de Moura Teixeira
Maria da Conceição Soares
Paulo Moura