Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00309/13.3BECBR
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:02/12/2015
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:Ana Patrocínio
Descritores:OPOSIÇÃO
FALTA CITAÇÃO VS NULIDADE CITAÇÃO
FORMALIDADE ESSENCIAL
Sumário:I. De acordo com o artigo 165.º, n.º 1, alínea a) do CPPT, a falta de citação quando possa prejudicar a defesa do interessado, constitui uma nulidade insanável do processo de execução fiscal.
II. Importa distinguir, das situações de falta de citação, as situações de nulidade da citação [que não consubstanciam uma nulidade insanável, enquadrável no referido artigo 165.º, n.º 1, alínea a) do CPPT], que ocorrem quando a citação tenha sido efectuada, mas sem que tenham sido observadas as formalidades previstas na lei (cfr. artigo 198.º, n.º 1 do CPC, actual artigo 191.º).
III. A expedição da carta registada a que se reporta o artigo 241.º do CPC (actual artigo 233.º) não é considerada pela lei uma formalidade essencial (na medida em que a omissão dessa diligência não é susceptível de afectar ou prejudicar a defesa do interessado, nos termos contemplados no artigo 165.º, n.º 1, a) do CPPT), mas antes uma formalidade necessária que cumpre um dever de informação e garantia, pelo que a sua omissão cabe na previsão do artigo 198.º do CPC (actual artigo 191.º).
IV. A nulidade da citação por preterição da formalidade legal prevista no artigo 241.º do CPC não é de conhecimento oficioso (cfr. artigo 196.º do actual CPC).
V. De acordo com o disposto no artigo 190.º, n.º 6 do CPPT, e em sintonia com o referido no artigo 195.º, alínea e) do CPC (actual artigo 188.º, n.º 1, alínea e)), para que ocorra falta de citação é necessário que o respectivo destinatário alegue e demonstre que não chegou a ter conhecimento do acto por motivo que não lhe foi imputável.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Fazenda Pública
Recorrido 1:E...
Decisão:Concedido provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Relatório

A Excelentíssima Representante da Fazenda Pública, devidamente identificada nos autos, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra proferida em 25/11/2013, que julgou procedente a Oposição deduzida por E..., contribuinte fiscal n.º 2…e com os demais sinais dos autos, à execução fiscal n.º 0710200801008935, contra ele revertida para cobrança coerciva da quantia global de 4.505,65€.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
1 – A presente oposição foi interposta no âmbito do processo de execução fiscal n.º 0710200801008935 a correr termos no Serviço de Finanças de Cantanhede, por apenso ao processo de execução fiscal principal n.º 0710200801004212.
2 - Por douta sentença de 15/11/2013, proferida pela Meritíssima Juíza do tribunal “a quo”, a referida Oposição foi julgada procedente, decisão com a qual não pode a Fazenda Pública concordar.
3 - Com efeito, entendeu o Tribunal “ a quo” que a citação pessoal do oponente não tinha ocorrido, nem devia ser presumida e consequentemente, considerou a presente oposição tempestiva, ao abrigo do disposto no artº203.º, nº1, al. a), do CPPT.
4 - Com todo o respeito pela douta decisão “a quo” e reconhecendo a análise efetuada pela Mmª Juíza, entende a Recorrente que existiu erro de julgamento na apreciação da tempestividade da oposição e consequente decisão sobre o mérito da questão.
5 – Ora, o ato de citação constitui um ato processual, praticado no âmbito de um processo judicial, perante o órgão de execução fiscal.
6 – E portanto, a alegada falta de citação é uma realidade processual que deve ser requerida perante o órgão de execução fiscal, só podendo haver intervenção do Tribunal no caso de reclamação da decisão que sobre ele tomada por aquele órgão, conforme artº151.º, nº1 e 276.º e seg., ambos do CPPT.
7 - A jurisprudência tem vindo a entender que as nulidades do processo de execução fiscal decorrentes, quer da irregular citação, quer da falta de requisitos do título executivo, não estão previstas no artº204.º do CPPT, designadamente na alínea i) do seu nº 1, a este propósito, realça-se o acórdão do STA, de 21 de Maio de 2008, proferido no processo n.º 0220/08, no qual se sintetizou o seguinte: “Sendo a citação um acto de processo de execução fiscal, a sua validade não serve de fundamento à respectiva oposição, sendo naquele processo que devem ser apreciadas as questões relativas à sua validade”.
8 - Com a ressalva do devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o doutamente decidido, porquanto considera que a douta sentença enferma de erro de julgamento, porque colhe a sua motivação na falta de citação do executado/Recorrido para a execução.
9 - Como refere o Acórdão do Pleno da Secção do STA, proferido em 28.02.2007, Proc. 0803/04, "...a nulidade da citação consubstancia uma nulidade do processo executivo e as nulidades devem ser invocadas no processo em que ocorreram, tendo em vista a sua sanação e o prosseguimento do processo. Ao passo que a oposição à execução persegue a extinção do processo...".
10 - Ora sendo a falta de citação equiparada à nulidade, tal matéria constitui nulidade do processo executivo que nele deve ser arguida, cf. al. a) do n. 1 do art. 165° do CPPT.
11 - E assim, a douta sentença padece de erro de julgamento, por ter violado o disposto nos artºs. 165.º n.º 1 a) e 204.º, ambos do CPPT.
12 - E quanto ao facto da Mmª Juíza justificar a apreciação de tal questão nos presentes autos, dizendo que “ Embora se aceite que o processo de oposição não é o meio processual adequado para conhecer da falta ou nulidade da citação, afigura-se que os princípios da economia e celeridade processual permitem que, a titulo de questão prejudicial, tal matéria possa ser apreciada neste tipo de processo”, sempre diremos que tal entendimento seria admissível se o Executado/Recorrido tivesse antecipadamente suscitado a questão perante o Órgão de execução fiscal e, caso não lhe tivesse sido dada razão, então poderia interpor os presentes autos de Oposição, com os fundamentos indicados na petição inicial, ao abrigo dos tais princípios indicados na douta sentença, mas dentro dos prazos estabelecidos no Código de Procedimento e de Processo Tributário (artº276.º e 203.º n.º 1 al. a) e b), ambos do CPPT).
13 - Ou seja, e com todo o respeito que é devido, a Mmª Juíza do Tribunal “a quo” ignorou todos os prazos legais a que o executado/Recorrido estaria sujeito, justificando/escudando a sua intervenção ao abrigo de princípios como a da celeridade processual e economia, o que, no nosso entendimento, existe errado julgamento porque tais princípios não podem sobrepor-se ao princípio da legalidade.
14 - Neste sentido, também o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proc. 0671/08, de 03/12/2008, em que é referido sumariamente: “ A eventual nulidade de citação do executado deve ser conhecida no processo de execução fiscal e não no processo de oposição à execução” e também é mencionado no douto acórdão que “O interessado pode e deve arguir essa alegada nulidade no processo executivo, com eventual reclamação, se for caso, disso, para o Tribunal.”
15 - E sendo assim e tendo em conta que a citação do executado, ora Recorrido, foi feita em 24-12-2009, manifestamente que a presente oposição é intempestiva, face aos prazos estabelecidos na al. a) do n.º 1 do artº203.º do CPPT.
16 - E a extemporaneidade da oposição determina desde logo a não pronúncia do Tribunal no tocante às questões de mérito suscitadas na respetiva petição, ainda, que de conhecimento oficioso – conforme Acórdão do STA, proc. 0196/09, de 25-03-2009.
17 - Por outro lado, e paralelamente ao facto de a Mmª Juíza ter decidido apreciar a alegada nulidade de citação (ao abrigo dos princípios da celeridade e economia processual) situação ao qual manifestamente não concordamos face às razões de facto e de direito acima expostos) também discordamos de todo com a solução dada a esta matéria quando a Mmª Juíza decidiu que “ a citação pessoal do oponente não ocorreu nem deve ser presumida, esta oposição é tempestiva”.
18 - Isto porque, a citação foi recebida pela mãe do ora Oponente/Recorrido, tal como é referido por este na petição inicial, e que consta da assinatura no aviso de receção da citação, como sendo “ L...” e tal citação foi enviada para o domicílio fiscal deste, ora Oponente. – Vide Documento de fls. 81 dos autos.
19 - Domicílio este que ainda se mantém como sendo o atual domicílio do Oponente, tal como está identificado no início da petição inicial, onde está referido que o Oponente/Recorrido reside na “Rua…, 3770-017Bustos”.
20 – Entendemos, também, e com o devido respeito, que douta sentença, na matéria de facto dada como provada omite que “L...” é mãe do Oponente, tal como este declara na própria petição inicial, bem como suprime que aquela carta citação, que consta a fls. 81 dos autos, foi enviada para o domicílio fiscal do ora Oponente.
21 - Bem como o Tribunal “a quo” ignora que o aviso de receção que acompanhou a carta destinada a citar o oponente e que foi assinado por “L...” consta a informação que aquela signatária comprometeu-se, expressamente, no próprio aviso de receção, a entregar prontamente a citação ao destinatário, como se vê pelo aviso de receção de fls. 81 dos autos.
22 – A douta sentença, sob recurso, fez uma inadequada apreciação/valoração da prova documental que veio a ser produzida e, assim e nesta parte, deixou de fazer, também aqui, devida aplicação do disposto sob o art. 236.ºdo anterior CPC (atual 228.º do C.P.C), violando o normativo legal aqui inserto.
23 – Isto é, no caso vertente, a citação pessoal do executado pelo correio mostra-se regularmente efetuada, já que foi observado o disposto no artº236.º do anterior C.P.C. (atual 228.º do CPC), tendo o funcionário do serviço postal procedido à identificação da pessoa que assinou o A/R através dos elementos constantes do respetivo bilhete de identidade, bem como a assinatura está legível e consta a informação da advertência que o aviso de receção foi assinado por pessoa “ a quem foi entregue a carta e que se comprometeu após a devida advertência a entregá-la prontamente ao destinatário”.
24 - Por outro lado, o Oponente não invocou a falta de preterição de formalidade legal, por incumprimento do disposto no artº241.ºdo anterior C.P.C. (atual 233.º do C.P.C.), restava provar ao executado que a alegada falta de citação, pela demonstração de que a citação postal nunca lhe foi entregue pela pessoa que a recebeu (artºs 195.º al. e) e 238.º do anterior C.P.C. – atual 188.º e 230.º).
25 - Pelo que, também nesta parte, consideramos que o douto tribunal incorreu em excesso de pronúncia porque o tribunal só dela podia conhecer caso tivesse sido arguida pelo executado, sabido que a falta de arguição, no prazo legal, de uma nulidade secundária conduz à sua sanação. – neste sentido o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, proc. 01655/07, de 28-03-2007.
26 - Por outro lado, o artº238.º do anterior C.P.C. (atual 230.º do CPC) dispunha que a citação por via postal se considera feita no dia em que se mostrar assinado o aviso de receção e que se tem efetuada na própria pessoa do citando, mesmo quando o aviso de receção haja sido assinado por terceiro, presumindo-se, salvo demonstração em contrário, que a carta foi oportunamente entregue ao destinatário.
27 - Do exposto resulta que a citação por via postal, operando-se por carta registada com A/R terá o valor de citação pessoal, tem que ser obrigatoriamente entregue na morada do destinatário, sendo indiferente a qualidade da pessoa que ali a recebe e assina o aviso de receção, pois que a lei presume que ela a entrega ao destinatário.
28 - No caso vertente, a citação pessoal do executado pelo correio mostra-se regularmente efetuada, porque foi observado o artº236.º do anterior C.P.C.(atual 228.º), havendo prova documental da advertência do serviço postal à mãe do Oponente, conforme consta a menção no aviso de receção a fls. 65 dos autos.
29 - Também não consta da petição inicial qualquer razão por o executado não ter tido conhecimento do ato, ou seja, não aponta qualquer circunstancialismo para a sua mãe alegadamente não lhe ter entregue a citação, sendo certo que na petição inicial consta que “Efectivamente a citação dirigida para o domicilio do ora oponente terá sido recebida pela sua mãe L... – ao menos tanto consta do processo de execução fiscal - ...”.
30 - O que demonstra que o Oponente/Recorrido teve conhecimento da citação.
31 - Ora, a inexistência de factos na petição inicial torna-se impossível de ilidir a presunção a que o executado/recorrido estava sujeito (presunção tantum iuris, artº350.º, nº2 do C.Civil e artº233.º nº4 do anterior C.P.C. – atual 225.º) de que a entrega da citação não ocorreu e que, por isso, o citando não teve conhecimento da citação por facto que não lhe era imputável.
32 – Assim, não tendo o Oponente/Recorrido invocado qualquer explicação para o facto da sua mãe não ter cumprido a obrigação a que estava incumbida, de que era entregar a citação a ele, não tendo sequer alegado qualquer circunstancia impeditiva da oportuna comunicação do teor dessa carta citação, não afastou a presunção a que estava sujeito, conforme o previsto no nº4 do artº233.º do anterior C.P.C. (atual 225.º do C.P.C.).
33 - Neste sentido, os Acórdãos do Tribunal Central Administrativo do Sul, proc.06846/02, de 24/06/2003, e proc. 01655/07, de 28-03-2007.
34 - E sendo assim, e tendo em conta que a citação do executado, ora Recorrido, foi feita em 24-12-2009 manifestamente que a presente Oposição é intempestiva, face aos prazos estabelecidos na al. a) do nº1 do artº203.º do CPPT.
35 - A Mmª Juíza do Tribunal a “quo” incorreu, assim, em erro de julgamento, por ter desconsiderado prova documental constante nos autos e concluído pela nulidade da citação e consequente decisão da tempestividade da oposição, violando as normas legais supra mencionadas.
36 - E conforme é mencionado no douto Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul, no proc. 06235/12, de 15-01-2013, “O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida.”
37 – Por último, apenas com intuito de esclarecer, e ao contrário do que é referido na douta sentença, onde é citado o parecer da Exma. Procuradora da Republica, a Recorrente recorreu da decisão proferida no processo de Oposição n.º 321/12.2BECBR.
38 - Face ao exposto, deve ser dado provimento ao presente recurso, reconhecendo a intempestividade da Oposição e, consequentemente revogada a sentença recorrida.
Pelo exposto e com mui douto suprimento de V. Exas., deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, revogada a sentença recorrida como é de inteira JUSTIÇA.
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O Recorrido apresentou contra-alegações, tendo concluído da seguinte forma:
1. O que está em causa nos presentes autos é que o oponente não foi sequer citado da reversão da execução fiscal, que contra si foi injusta e ilegalmente decidida, sendo que a Administração Tributária (AT) apenas de si própria se pode queixar, já que não cumpriu o disposto na lei.
2. Sendo por demais impressivo, digamo-lo sem rebuço, que a digna Recorrente não tenha sequer esboçado um qualquer ataque recursivo ao facto de, substancialmente, não estarem reunidos, como não estão, os pressupostos legais da reversão (porque, de facto e desde logo, o desgraçado do recorrido jamais exerceu qualquer gerência de facto na devedora originária – o que se encontra aliás provado nos autos e é do conhecimento da AT, posto que, como se refere na sentença, isso mesmo resulta da própria informação dos serviços de fiscalização da AT, constante dos autos a fls. 43 a 44, sendo certo que “inexiste nos autos qualquer rasto de um ato de gerência/administração, um só apenas, praticado pelo oponente.”.
3. Liminarmente, temos que a Recorrente não alega – e teria de o fazer para que pudesse pôr em causa o doutamente decidido pelo Tribunal recorrido – a razão pela qual entende que estava vedado ao tribunal a quo conhecer incidentalmente ou até mesmo oficiosamente da questão da citação, como questão prévia à do conhecimento da ilegitimidade do executado, demonstrando que, apesar do disposto no artigo 92.º do Código de Processo Civil, o Tribunal recorrido não podia conhecer oficiosamente da questão da citação quando esta se verifique em processo de execução fiscal ou que tal questão não se configura como questão prévia à do conhecimento da ilegitimidade do oponente, a justificar o seu conhecimento a título incidental, o que não fez.
4. Assim, porque, nesta medida, a Recorrente não ataca os fundamentos da decisão recorrida – contrariando o conhecimento da citação a título incidental efectuado pela sentença recorrida, nem contrariando o conhecimento da citação a título oficioso como parece pretender configurar a Recorrente, nas conclusões números 24 e ss. das suas doutas alegações, nem dizendo porque não constituiria tal matéria questão prévia ou causa prejudicial – o recurso deve necessariamente, e sem mais, improceder – neste sentido.
5. Neste preciso sentido, cite-se apenas a título de exemplo a mais recente jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, de 17/04/2013, no proc. n.º 01160/12, citada supra na presente peça.
6. A Recorrente começa por alegar que a sentença teria incorrido em “erro de julgamento na apreciação da tempestividade da oposição e consequente decisão sobre o mérito da questão”, concluindo que as nulidades (como por exemplo derivadas da citação) não estão previstas na al. i), do n.º 1, do art. 204.º do CPPT.
7. A douta sentença não merece efectivamente censura por ter conhecido incidentalmente a questão da citação, como devia, posto que, de acordo com os princípios da suficiência e da economia processuais impunha-se tal conhecimento, permitido, aliás, pelo art. 92.º do CPC aplicável ex vi do art. 2.º do CPPT.
8. Por um lado e decisivamente, o entendimento de que a questão da citação não é fundamento da oposição (que a própria sentença também considerou expressamente) não releva nem jamais poderia relevar no presente caso, na medida em que o Tribunal a quo entendeu conhecer da questão enquanto questão ou causa prejudicial – fundamento que, como vimos, jamais foi contrariado no recurso em análise.
9. Por outro lado e também determinantemente, temos que o nosso Supremo Tribunal tem, desde há muito tempo, admitido pacificamente o conhecimento incidental e mesmo oficioso da questão da validade da citação, no âmbito do processo de oposição à execução, se tal conhecimento é necessário para apreciar qualquer questão que deva ser apreciada na oposição, como sucede in casu, relativamente à quaestio da ilegitimidade do oponente (aliás, patente e que não foi sequer objecto de ataque recursivo).
10. Neste sentido, podem citar-se os Acórdãos do STA, de 11/12/1996, rec. 20488, in Apêndices ao DR, de 28/12/98, p. 3769 e o Aresto de 17/08/1999, no proc. 022528, ainda durante a vigência do CPT; e, já na vigência do CPPT, os Acórdãos do STA, de 17/04/2013, no proc. n.º 01160/12 e de 7/12/2011, tirado no proc. 0172/11: “III - Pode conhecer-se da falta ou nulidade da citação no processo de oposição à execução fiscal se tal conhecimento for necessário para apreciar qualquer questão que deva ser apreciada na oposição, isto é, será possível o conhecimento incidental da nulidade quando a questão da sua existência seja uma questão prévia relativamente a qualquer questão incluída no âmbito da oposição.”.
11. Sendo que também este TCA Norte tem seguido este douto e pacífico entendimento, citando-se a título de exemplo, o Aresto de 22/10/2009, tirado no proc. 00574/07.5BEBRG.
12. E igualmente o Conselheiro Lopes de Sousa, na última versão da sua obra de referência em Portugal, defende este mesmíssimo entendimento, como aliás dá conta o Aresto do STA de 17/08/1999, no proc. 022528, que citámos supra – cfr. A. cit., Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, Vol. III, 6.ª ed., 2011, anotação 8 b) ao art. 190º, pp. 369/370.
13. Sem prescindir do que vimos de referir, refira-se no entanto apenas a latere que, ainda que a tort assim não se entendesse, acresce ainda que o próprio STA já desde o CPT que defende decisivamente que “I – Provando-se a nulidade da citação apenas por documento, não envolvendo apreciação do acto de liquidação, nem tendo a ver com qualquer interferência no exercício da função fiscal do serviço que extraiu o título, constitui fundamento de oposição à execução fiscal, nos termos da alínea h) do CPT” – cfr. Acórdão do STA. de 24-3-99, no recurso n.º 22882, apud Cons. Lopes de Sousa, CPPT Anotado e Comentado, 2007, pág. 387. Pelo que soçobra a tese da Recorrente.
14. Em suma, e ao contrário do que advoga a Recorrente, a sentença não merece censura ao ter conhecido a questão da citação como causa prejudicial, o que além de não ter sido atacado pelo recurso, é pacificamente admitido pela jurisprudência superior e pela melhor doutrina, não tendo sido ignorados quaisquer “prazos legais a que o executado/recorrido estaria sujeito” – o que sucedeu foi que a AT não cumpriu as formalidades legais, isso sim, e apenas de si própria se pode queixar – devendo, consequentemente, a sentença ser integralmente confirmada por este Colendo Tribunal.
15. Acrescidamente, refira-se que a sentença não merece qualquer repúdio ou censura porque aplicou doutamente os princípios da economia, celeridade e suficiência processual, como devia.
16. Salvo o merecido respeito, não faria qualquer sentido, antes constituiria uma perfeita aberração, obrigar o já injustamente executado a invocar a nulidade da citação perante a Administração Tributária (AT) – AT esta que não citou legalmente o recorrido e, aliás, concretamente sabendo que o recorrido jamais tinha exercido qualquer gerência, ainda assim reverteu a execução contra si –, para que este aguardasse um mais do que certo indeferimento da sua pretensão, ou pior, para que aguardasse um indeferimento que, como é habitual, demoraria a ser decidido pela AT, e para depois quando recorresse ao Tribunal, vir a mesma AT invocar a intempestividade da oposição, tudo e sempre em manifesto prejuízo do contribuinte e do seu direito fundamental ao acesso ao direito e à justiça e à tutela jurisdicional efectiva (que têm consagração no art. 18.º, 20.º e 268.º, n.º 4, todos da CRP) e dos princípios da confiança (art. 2.º da CRP) e da boa fé (arts. 6.º-A do CPA e 59.º nº 2 da LGT).
17. Ou seja, estar-se-ia a obrigar o injusto executado (que, aliás, na primeira intervenção no processo alegou a questão da citação) e mesmo a própria Administração a praticar um conjunto de actos desnecessários, quando, em última instância, é sempre o Tribunal que, no âmbito dos seus amplos poderes, tem sempre a última palavra e, neste caso, o Tribunal já a disse (poupando todos os operadores judiciários a mais custos, a actos desnecessários, dispêndio de meios, etc...), pelo que não merece a sentença qualquer censura.
18. Sem prescindir do que vimos de referir, e ainda que a tort assim não se entendesse – e cremos que o argumentação do douto recurso soçobra assim definitivamente –, não faz o mínimo sentido sustentar que o (injusta e ilegitimamente) executado deveria ter apresentado esta questão à AT, quando é o próprio legislador que – para já não falar das competências genéricas da AT – atribuiu, no âmbito da oposição, competência à AT para no prazo em que deve remeter a oposição ao Tribunal de 1.ª instância competente, pronunciar-se sobre todas as questões, nomeadamente sobre o fundo ou mérito da questão e mesmo revogar o acto que lhe tenha dado fundamento (cfr. art. 208.º, n.º 2 do CPPT), podendo naturalmente conhecer também das questões prejudiciais e da citação, o que a AT não fez in casu não podendo agora aproveitar-se dessa situação.
19. Na verdade e sempre ressalvado o devido respeito, este rebuscado entendimento advogado pela Recorrente, apenas e tão-somente serviria para permitir, a outrance, uma reversão manifestamente ilegal, dado que o princípio da legalidade, que a Recorrente invoca, foi – isso sim – completamente afastado pela AT, que não procedeu, nos termos da lei, à citação do Recorrente (nomeadamente não cumpriu o art. 233.º do CPC) e, mais grave ainda, de fundo, não cumpriu os requisitos imperativos previstos nos arts. 23.º e 24.º, ambos da LGT, para fazer operar a reversão.
20. Por conseguinte, a sentença não merece qualquer censura, posto que deu cumprimento aos princípios da celeridade, da economia e da suficiência processuais, aliás, na senda da jurisprudência superior e da melhor doutrina, não havendo qualquer sobreposição “ao princípio da legalidade”, como advoga a Recorrente (princípio que foi violado, isso sim, pela AT).
21. Sendo assim, como é, a citação não se pode considerar efectuada nem presumir-se efectuada em 24/12/2009, na medida em que – e sobre esta matéria nem uma palavra o recurso dedicou – nem sequer foi cumprido o disposto no actual art. 233.º do CPC (anterior art. 241.º), pelo que, como doutamente referiu o Tribunal recorrido, não há pois “condições objectivas para, com razoável segurança se admitir que o citando tomou conhecimento do ato em causa e, assim, acionar a mencionada presunção”.
22. Como é patente, a AT não cumpriu a legalidade, a vários passos, e por isso apenas de si se pode queixar, sendo assim a oposição perfeitamente tempestiva, não se conseguindo assim o tão almejado evitamento do conhecimento do fundo ou do mérito, que, aliás, colocaria irrefragavelmente em crise o direito fundamental do revertido ao acesso ao direito e à justiça e à tutela jurisdicional efectiva (que têm consagração no art. 18.º, 20.º e 268.º, n.º 4, todos da CRP) e dos princípios da confiança (art. 2.º da CRP) e da boa fé (arts. 6.º-A e 59.º, n.º 2 da LGT).
23. Relativamente às alegações acerca da matéria de facto, temos que a digna Recorrente, tentando obliterar que a AT não cumpriu a legalidade e tentando tudo confundir, esquece que não está em causa o cumprimento do art. 236º do antigo CPC (art. 228.º do actual CPC), mas sim o crasso incumprimento do art. 241.º do CPC (actual art. 233.º do CPC), como aliás, se bem percebemos, parece reconhecer-se e confessar-se no próprio recurso.
24. Sendo que, por outro lado, e como já vimos, a questão da “preterição de formalidade legal” (para utilizar as palavras do douto recurso) pode ser conhecida pelo Tribunal Tributário, no âmbito dos seus amplos poderes (cfr. entre o mais, art. 13.º do CPPT), mesmo que oficiosamente – aliás, a este propósito já citámos supra diversa jurisprudência do STA e doutrina, para a qual novamente se remete e aqui se considera integralmente reproduzida.
25. Pelo que inexiste qualquer excesso de pronúncia da decisão recorrida, que não merece censura e deve ser integralmente confirmada.
26. Do mesmo modo e ao invés do que advoga a Recorrente, nada na petição inicial demonstra que o Oponente “teve conhecimento da citação”, não havendo qualquer presunção de citação, quando a AT não cumpriu todas as formalidades para essa pesada e onerosa presunção se poder formar, pelo que não pode agora, como que num passe de mágica, pretender-se inverter as circunstâncias e passar a responsabilidade pela ilisão de uma inexistente presunção para o revertido, presunção essa que ademais apenas aproveita à AT.
27. Na verdade, acerca da impugnação da matéria de facto, dispõe o artigo 685.º-B do CPC, aplicável ex vi do art. 2.º do CPPT, sendo que a Recorrente não refere, no entanto, como era seu ónus, qual a importância, na economia dos presentes e concretos autos, de tal matéria factual (mormente quando é patente que a AT não cumpriu aquelas formalidades referidas), pelo que deve o recurso ser rejeitado.
28. Por último e sendo assim, a oposição não é intempestiva, nem a sentença incorreu em qualquer erro de julgamento, mormente por alegadamente ter desconsiderado prova documental constante nos autos, devendo a decisão ser integralmente confirmada.
Termos em que, roga mui respeitosamente que o recurso interposto seja considerado totalmente improcedente, apenas deste modo se fazendo a necessária JUSTIÇA!
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O Ministério Público junto deste Tribunal pronunciou-se a fls. 256/262 dos autos, no sentido da improcedência do recurso.
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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.
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Objecto do recurso - Questões a apreciar e decidir:
As questões suscitadas pela Recorrente delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões são as seguintes: (i) saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao conhecer da falta de citação do Oponente para a execução fiscal e se errou ao concluir pela falta de citação e pela tempestividade da oposição; (ii) saber se a sentença recorrida errou no julgamento quanto à ilegitimidade do Oponente na execução.

II. Fundamentação

1. Matéria de facto

Na sentença prolatada em primeira instância, com relevância para a decisão da causa, foram considerados provados os seguintes factos:
A) Com base nas certidões de fls. 35, foi instaurada contra Laboratórios … - Produtos Químicos, S.A. a execução fiscal n.º 0710200801008935, para cobrança da dívida proveniente de IVA do período de 2008/01 - fls. 34.
B) Por despacho de fls. 75 a 76, que se dá por integralmente reproduzido, a execução foi revertida contra a ora oponente.
C) O aviso de receção que acompanhou a carta destinada a citar o oponente foi assinado por L… - fls. 80/81.
D) Por deliberação dos acionistas da sociedade devedora principal datada de 24/09/2002, foram nomeados seus administradores para o quadriénio de 2003/2006 N… e o ora oponente - fls. 38 a 42.
E) Para obrigar a sociedade devedora principal sempre foi necessária apenas a assinatura de um administrador - fls. 38 a 42.
F) A sociedade devedora principal foi alvo de uma ação de inspeção tributária, no âmbito da qual foi produzido o relatório que consta parcialmente dos autos, de fls. 43 a 44, que também se dá por integralmente reproduzido e do qual resulta que a sociedade devedora originária se apresentava perante terceiros e era administrada por N… e seu pai M….
Com interesse para a decisão não se provaram outros factos.
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A convicção do Tribunal baseou-se nos documentos referidos em cada uma das alíneas antecedente.

2. O Direito

A primeira questão que vem suscitada no recurso é a de saber se o tribunal recorrido errou ao apreciar e decidir a questão da falta da citação do Oponente para a execução.
Sustenta a Recorrente que ao tribunal recorrido estava vedado o conhecimento dessa questão, no essencial, por a mesma não constituir fundamento de oposição.
Não lhe assiste, porém, razão.
Não obstante a falta de citação só seja qualificada como nulidade insanável quando possa prejudicar a defesa do interessado, o tribunal pode conhecer oficiosamente dessa nulidade ou na sequência de arguição, até ao trânsito em julgado da decisão [cf. artigo 165º, nº 4 do CPPT].
Por outro lado, e embora não constitua fundamento de oposição (artigo 204.º do CPPT), nada obsta a que se possa conhecer da falta ou da nulidade da citação no processo de oposição à execução fiscal se tal conhecimento for necessário para apreciar qualquer questão que deva ser apreciada na oposição, isto é, será possível o conhecimento incidental da nulidade quando a questão da sua existência seja uma questão prévia relativamente a qualquer questão incluída no âmbito da oposição - cfr. acórdãos do STA, de 7/12/2011, Processo n.º 0172/11 e do TCAN, de 22/10/2009, processo n.º 00574/07.
Por conseguinte, é de concluir não existir qualquer obstáculo ao conhecimento da falta da citação para saber se é (ou não) tempestiva a oposição à execução deduzida pelo Oponente – cfr. Acórdão deste TCAN, de 29/01/2015, proferido no âmbito do processo n.º 307/13.7BECBR.
Invoca, ainda, a Recorrente que a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao concluir pela falta de citação do Oponente para a execução e, consequentemente, pela tempestividade da oposição apresentada em 23/4/2013.
A este propósito, na sentença recorrida concluiu-se pela falta de citação do Oponente, com a seguinte argumentação: “Na situação vertente, não obstante o oponente alegar facto subsumível na referida alínea e) do Art. 195.º do CPC, afigura-se desnecessária a prova da verificação daquele facto, por não poder subsistir a presunção da ocorrência da presunção de citação. (…)
Decorre do n.º 3 do Art. 191.º do CPPT que a citação é pessoal em caso de efetivação de responsabilidade subsidiária, sendo efetuada nos termos do código de processo civil e, de acordo com este (Art. 225.º) a citação pessoal é feita mediante [alínea b), do nº 2] entrega ao citando de carta registada com aviso de receção, seu depósito nos termos do nº 5 do Art. 229º., ou certificação de recusa de recebimento, nos termos do n.° 3 do mesmo artigo. Se a citação é realizada em pessoa distinta do citando, ela já não é pessoal mas, antes, “quase pessoal”, usando aqui a terminologia de José Lebre de Freitas e outros.
Dispõe o n.º 4 do mesmo artigo 225.º do CPC que «nos casos previstos na lei, é equiparada à citação pessoal a efetuada em pessoa diversa do citando, encarregada de lhe transmitir o conteúdo do ato, presumindo-se, salvo prova em contrário, que o citando dela teve oportuno conhecimento». Acresce que o Art. 233.° do CPC (anterior Art. 241.º) determina que «sempre que a citação se mostre efetuada em pessoa diversa do citando, em consequência do disposto no n.º 2 do artigo 228º. e na alínea b) do n.º 2 do artigo 228.°, (…), sendo ainda enviada, pelo agente de execução ou pela secretaria, no prazo de dois dias úteis, carta registada ao citando, comunicando-lhe:
(…)».
Portanto, nas circunstâncias em que a carta registada com aviso de receção destinada à citação é recebida por terceira pessoa, para além do mais, exige-se que, in casu, o órgão da execução fiscal remeta, no prazo de dois dias úteis, carta registada dirigida ao citando, dando-lhe conhecimento, nomeadamente, da data e modo pelo qual o ato de citação se considera realizado na pessoa de terceiro, que deve ser identificado. Só cumprida esta formalidade se assegura, na medida do razoavelmente possível, que o citando toma conhecimento do ato de citação sendo, portanto, este o caso «expressamente previsto na lei» (cf. Art. 225.º n. 4 do CPC) em que é acionada a presunção, ilidível, de que o citado teve conhecimento do ato de citação realizado em terceira pessoa. (…)
Na situação vertente, perscrutados todos os elementos documentais dos autos, constata-se que não foi observado o disposto no Art. 233.º, anterior Art. 241.º, do CPC pelo que, em conformidade com o supra exposto, não pode presumir-se que o oponente tomou conhecimento do ato de citação donde que, logicamente, não seja necessário ilidir uma presunção inexistente. (…)”
Esta questão já foi apreciada por este tribunal no âmbito do acórdão prolatado em 29/01/2015, em processo em tudo idêntico ao presente (processo n.º 307/13.7BECBR), existindo, inclusivamente, identidade das partes. Por inexistirem razões para, em tão curto lapso de tempo, nos afastarmos do decidido, passamos a transcrever a jurisprudência ínsita neste acórdão mencionado; salientando-se que o probatório pertinente nos presentes autos consubstancia a factualidade constante da alínea C):
“(…) De acordo com o artigo 165.º, n.º 1, alínea a) do CPPT, a falta de citação quando possa prejudicar a defesa do interessado, constitui uma nulidade insanável do processo de execução fiscal.
A falta de citação ocorre, além dos casos em que ela é omitida, também nas situações previstas no artigo 195.º do CPC, na redacção aqui aplicável, ex vi artigo 2.º, alínea e) do CPPT, a saber: “a) quando o acto tenha sido completamente omitido; b) quando tenha havido erro de identidade do citado; c) quando se tenha empregado indevidamente a citação edital; d) quando se mostre que foi efectuada depois do falecimento do citando ou da extinção deste, tratando-se de pessoa colectiva ou sociedade; e) quando se demonstre que o destinatário da citação pessoal não chegou a ter conhecimento do acto, por facto que não lhe seja imputável.”
Todavia, por força do disposto no artigo 190.º, n.º 6 do CPPT, em qualquer das situações referidas, no processo de execução fiscal só ocorre falta de citação quando o respectivo destinatário alegue e demonstre que não chegou a ter conhecimento do acto, por motivo que não lhe foi imputável.
Como é entendimento pacífico e reiterado da doutrina e da jurisprudência, distintas das situações de falta de citação, são as situações de nulidade da citação [que não consubstanciam uma nulidade insanável, enquadrável no referido artigo 165.º, n.º 1, alínea a) do CPPT], que ocorrem quando a citação tenha sido efectuada, mas sem que tenham sido observadas as formalidades previstas na lei (cf. artigo 198.º, n.º 1 do CPC).
No caso dos autos, o Oponente, na qualidade de responsável subsidiário e enquanto executado por reversão, tinha de ser citado pessoalmente para a execução (cf. artigo 191.º, n.º 3 do CPPT).
Como consta do probatório, para chamar o Oponente à execução fiscal, o Serviço de Finanças de Cantanhede remeteu carta registada com aviso de recepção para o domicílio fiscal daquele (o que não foi posto em causa nos autos), mostrando-se o aviso de recepção que acompanhava a correspondência assinado por uma terceira pessoa, que não o executado [cf. alínea H) do probatório].
O tribunal recorrido entendeu que o Serviço de Finanças não deu cumprimento ao disposto no artigo 241.º do CPC, na redacção aqui aplicável, o qual prevê uma diligência posterior sempre que a citação se mostre efectuada em pessoa diversa do citando: o envio de carta registada comunicando à citada, nomeadamente, a identidade da pessoa em que a citação foi realizada.
Porém, a expedição da carta registada a que se reporta o artigo 241.º do CPC (actual artigo 233.º) não é considerada pela lei uma formalidade essencial (na medida em que a omissão dessa diligência não é susceptível de afectar ou prejudicar a defesa do interessado, nos termos contemplados no artigo 165.º, n.º 1, a) do CPPT), mas antes uma formalidade necessária que cumpre um dever de informação e garantia, pelo que a sua omissão cabe na previsão do artigo 198.º do CPC.
Ora, a eventual nulidade da citação por preterição da formalidade legal prevista no artigo 241.º do CPC não é do conhecimento oficioso, pelo que o tribunal só podia dela ter conhecido caso tivesse sido arguida pelo Oponente (artigo 198.º do CPC), o que manifestamente não se verificou.
Deste modo, não tendo tal nulidade sido arguida pelo Oponente, não podia dela ter conhecido (como fez) o tribunal recorrido, incorrendo, pois, em erro de julgamento.
No entanto, de acordo com o disposto no artigo 190.º, n.º 6 do CPPT, e em sintonia com o referido no artigo 195.º, alínea e) do CPC, para que ocorra falta de citação é necessário que o respectivo destinatário alegue e demonstre que não chegou a ter conhecimento do acto por motivo que não lhe foi imputável.
Ora, foi isso precisamente que o Oponente alegou na petição inicial (artigos 5.º a 7.º), invocando que não teve conhecimento da citação recebida pela pessoa que assinou o aviso de recepção, por motivo que não lhe é imputável e arrolando várias testemunhas, incluindo a pessoa que assinou o respectivo aviso de recepção da citação.
Admitindo-se que a presunção legal de que teve conhecimento da citação é ilidível, e cabendo tal prova ao interessado [artigos 233.º (actual 225.º), n.º 4 e 238.º (actual 230.º), n.º 1 do CPC], impõe-se a produção da prova por ele oferecida na petição inicial, para, após, ser apurado se o invocado desconhecimento da citação ocorreu por facto que não lhe é imputável.
E assim sendo, é de concluir que a decisão que julgou verificada a falta de citação do Oponente sem a produção da prova por ele oferecida, não pode manter-se [ficando consequentemente prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas no presente recurso].”
Nesta conformidade, merece provimento o presente recurso, mostrando-se prejudicada a apreciação das restantes questões, nos termos do disposto no artigo 608.º, n.º 2 ex vi artigo 663.º, n.º 2, ambos do CPC.

Conclusões/Sumário

I. De acordo com o artigo 165.º, n.º 1, alínea a) do CPPT, a falta de citação quando possa prejudicar a defesa do interessado, constitui uma nulidade insanável do processo de execução fiscal.
II. Importa distinguir, das situações de falta de citação, as situações de nulidade da citação [que não consubstanciam uma nulidade insanável, enquadrável no referido artigo 165.º, n.º 1, alínea a) do CPPT], que ocorrem quando a citação tenha sido efectuada, mas sem que tenham sido observadas as formalidades previstas na lei (cfr. artigo 198.º, n.º 1 do CPC, actual artigo 191.º).
III. A expedição da carta registada a que se reporta o artigo 241.º do CPC (actual artigo 233.º) não é considerada pela lei uma formalidade essencial (na medida em que a omissão dessa diligência não é susceptível de afectar ou prejudicar a defesa do interessado, nos termos contemplados no artigo 165.º, n.º 1, a) do CPPT), mas antes uma formalidade necessária que cumpre um dever de informação e garantia, pelo que a sua omissão cabe na previsão do artigo 198.º do CPC (actual artigo 191.º).
IV. A nulidade da citação por preterição da formalidade legal prevista no artigo 241.º do CPC não é de conhecimento oficioso (cfr. artigo 196.º do actual CPC).
V. De acordo com o disposto no artigo 190.º, n.º 6 do CPPT, e em sintonia com o referido no artigo 195.º, alínea e) do CPC (actual artigo 188.º, n.º 1, alínea e)), para que ocorra falta de citação é necessário que o respectivo destinatário alegue e demonstre que não chegou a ter conhecimento do acto por motivo que não lhe foi imputável.



III. Decisão

Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em revogar a sentença recorrida, determinando a baixa dos autos ao tribunal de 1ª instância para, após produção da prova oferecida pelo Oponente, ser proferida nova decisão.

Sem custas.

D.N.

Porto, 12 de Fevereiro de 2015.
Ass. Ana Patrocínio
Ass. Ana Paula Santos
Ass. Fernanda Esteves