Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01645/09.9BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:04/15/2021
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Ana Patrocínio
Descritores:IVA, REQUISITOS FORMAIS DAS FACTURAS
Sumário:I - Nos termos do disposto no artigo 19.º, n.º 2 do Código do imposto sobre o valor acrescentado (CIVA) só confere direito à dedução do imposto sobre o valor acrescentado o imposto mencionado em facturas e documentos que observem a forma legal.

II - O artigo 36.º do CIVA estabelece determinados requisitos na emissão de facturas ou documentos equivalentes que são condição para a dedução do imposto por parte do sujeito passivo adquirente nos termos do artigo 19.º, n.º 2 do mesmo Código.

III - A exigência da observância desses requisitos nos referidos documentos facturas tem como escopo permitir à Administração Tributária o controlo da situação tributária, e não apenas obter prova dos factos a controlar, motivo por que as facturas, emitidas de acordo com os termos da lei, constituem formalidade “ad substantiam”, insusceptível de substituição por um qualquer outro meio de prova.

IV - Se os vícios formais contidos na factura ou documento equivalente não permitirem a exacta cobrança e respectiva fiscalização do imposto, o direito à dedução do IVA não pode ser exercido.

V – No caso em análise, as facturas em causa, nos termos em que se apresentam, não revelam a quantificação/extensão das prestações de serviços, o que, pelas razões explicadas no acórdão, compromete definitivamente a possibilidade de a Administração Tributária controlar a base tributável e o apuramento do imposto.

VI - No âmbito do contrato de prestação de serviços as partes usarão do rigor que lhes aprouver, no que à medição dos serviços prestados diz respeito, mas para obterem a dedução do imposto sobre o valor acrescentado facturado as facturas hão-de permitir reconstituir que serviço foi prestado e qual o seu custo, impedindo que haja duplicação de facturação, com a criação de um imposto sobre o valor acrescentado que não foi pago mas se pretende ver deduzido.

VII - Deste modo, não obedecem aos requisitos legais, não conferindo, por isso, direito à dedução do IVA, facturas em que apenas se menciona, relativamente a serviços prestados, uma expressão como: “serviços prestados de apoio a vendas de gás”.

VIII - Por estas razões, o IVA liquidado nas facturas em causa não pode ser deduzido, sendo claro que não se mostram preenchidos todos os requisitos formais que as facturas, nos termos legais, devem conter – cfr. artigo 19.º, n.º 2 do CIVA.*
* Sumário elaborado pela relatora
Recorrente:N., Lda
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
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Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
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I. Relatório

N., Lda., NIPC (…), com sede em (…), interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, proferida em 15/09/2011, que julgou improcedente a Impugnação Judicial por si deduzida contra o acto tributário de liquidação adicional de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), referente aos anos de 2005 e 2006, na importância global de €7.440,00.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:

“1.º - Nos termos do disposto no artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa, Portugal é um Estado de direito democrático, e como corolário desta norma constitucional, tudo o que a lei expressamente não proíbe é porque a Lei, implícita ou expressamente, permite; dispõe o n.º 3 do artigo 18.º da CRP que, as leis restritivas de direitos, liberdades e garantias têm de revestir carácter geral e abstracto e não podem ter efeito retroactivo, nem diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos constitucionais; estabelece o n.º 1 do artigo 266.º da CRP que a Administração Pública visa a prossecução do interesse público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos; e determina o n.º 2 do artigo 266.º da CRP que os órgãos e agentes administrativos estão subordinados à Constituição e à lei e devem actuar, no exercício das suas funções, com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa-fé.
2.º - O Tribunal a quo considerou provado que:
a) A impugnante tem por objecto social a venda de gás e implementação novas energias renováveis (painéis solares e electrónicos e outros) e a emitente de facturas vende gás que compra à impugnante;
b) Ainda que implicitamente, o Recorrente é sujeito passivo de IVA com direito a deduzir ao IVA que liquidou e liquida nas transmissões de gás e outros bens correlacionados, o IVA que lhe era e é liquidado pelos seus fornecedores de bens e serviços;
c) A emitente das facturas prestava serviços à Impugnante através do Dr. P., o qual desenvolveu trabalho na organização da contabilidade, gestão informática, controlo de custas, avaliação de desempenho dos trabalhadores e negócios e investimentos;
d) As facturas destinavam-se a transferir os custos para a Impugnante, relativo ao encargo do salário do Dr. P., uma vez que este prestava serviço em ambas as empresas, que eram entidades distintas e estavam sediadas em locais distintos.
Em face de tal prova, realça-se o carácter imaterial e intangível e, por isso, insusceptível de quantificação para efeitos do disposto na alínea b) do n.º 5 do artigo 36.º do CIVA, daqueles serviços que o Tribunal a quo considerou provados.
3.º - Em face do concluído na 2.ª conclusão, o IVA deduzido pela Recorrente que lhe havia sido liquidado pela sociedade A., Lda., não resultou de operações simuladas, pelo que, não se lhe aplica o disposto no n.º 3 do artigo 19.º do CIVA.
4.º - O Tribunal a quo considerou também provado:
a) Ainda que implicitamente, que o IVA em causa nos autos que a Recorrente deduziu, foi entregue nos cofres do Estado pela prestadora dos serviços em causa nos autos, a sociedade A., Lda.;
b) Ainda que implicitamente, que quando deduziu o IVA em causa nos autos, a Recorrente tinha e devia ter conhecimento de que a prestadora de serviços dispõe de adequada estrutura empresarial susceptível de exercer a actividade declarada.
Pelo que, ao caso concreto dos autos, também se lhe não aplica o disposto no n.º 4 do artigo 19.º do CIVA.
5.º - O Tribunal a quo considerou também provado que:
a) A Recorrente é sujeito passivo de IVA com direito à dedução;
b) A Recorrente e a sociedade prestadora dos serviços têm sócios comuns e interesses comuns.
Assim, em face de tal prova, a Recorrente salienta que em parte alguma a Lei proíbe ou impede que sociedades com sócios ou interesses comuns não possam prestar serviços ou transmitir bens umas às outras; o que a lei impede às sociedades com sócios ou interesses comuns é que estabeleçam entre si relações comerciais de transmissão de bens e de prestação de serviços cujos preços aplicados em tais transmissões não correspondam ao preço de mercado.
6.º - O n.º 1 do artigo 63.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas estabelece que, nas operações comerciais, incluindo, designadamente, operações ou séries de operações sobre bens, direitos ou serviços, bem como nas operações financeiras, efectuadas entre um sujeito passivo e qualquer outra entidade, sujeita ou não a IRC, com a qual esteja em situação de relações especiais, devem ser contratados, aceites e praticados termos ou condições substancialmente idênticos aos que normalmente seriam contratados, aceites e praticados entre entidades independentes em operações comparáveis;
Foi precisamente para dar cumprimento a esta norma do n.º 1 do artigo 63.º do CIRC que a sociedade A., Lda. emitiu as facturas em causa nos autos, tal como resultou provado pelo Tribunal a quo.
7.º - A questão que constitui o objecto do presente recurso consiste em saber se as facturas emitidas pela impugnante preenchem ou não os requisitos previstos no actual artigo 36.º, n.º 5, alínea b) do CIVA.
8.º- O IVA é um imposto geral sobre o consumo que incide sobre as transmissões de bens, as prestações de serviços, as importações e as operações intracomunitárias efectuadas no território nacional - artigo 12.º do CIVA.
9.º - Estabelece o artigo 19.º do CIVA:
a) Na alínea a) do seu n.º 1 que, para apuramento do imposto devido, os sujeitos passivos deduzem, ao imposto incidente sobre as operações tributáveis que efectuaram, o imposto devido ou pago anteriormente, nomeadamente, na aquisição de bens e serviços a outros sujeitos passivos;
b) No seu n.º 2 que, só confere direito à dedução o imposto mencionado em facturas e documentos equivalentes passados em forma legal, bem como no recibo de pagamento de IVA que faz parte das declarações de importação, em nome e na posse do sujeito passivo;
c) E acrescenta o seu n.º 6 que, para efeitos do exercício do direito à dedução, consideram-se passados em forma legal as facturas ou documentos equivalentes que contenham os elementos previstos no artigo 36.º
10.º - O Supremo Tribunal Administrativo decidiu no seu acórdão proferido em 31/1/08, in rec. n.º 902/07 que “para evitar a fraude fiscal, o legislador determinou que só seria dedutível o imposto mencionado em facturas, documentos a estas equivalentes passados em forma legal ou no recibo de pagamento de IVA que faz parte das declarações de importação, e desde que tais documentos estivessem em nome e na posse do sujeito passivo.”
E, atento aquele objectivo, o legislador foi especialmente exigente, ao estabelecer no n.º 6 do artigo 19.º que, “para efeitos da exercício do direito à dedução, consideram-se passados em forma legal as facturas ou documentos equivalentes que contenham os elementos previstos no artigo 36.º.”
11.º- É reconhecido o carácter formalista do IVA em ordem, nomeadamente, a evitar, o mais possível, a evasão fiscal, pelo que, as respectivas formalidades o são “ad substantiam, que não meramente ad probationem”; porém, o entendimento de que as formalidades das facturas e documentos equivalentes o são ad substantiam, tem vindo a sofrer algumas excepções pelo Supremo Tribunal Administrativo.
12.º - A distinção doutrinária entre formalidades ad substantiam e formalidades ad probationem radica no facto de as primeiras serem insubstituíveis por outro meio de prova, cuja inobservância gera a nulidade, enquanto que as segundas a sua falta pode ser suprida por outros meios de prova mais difíceis - Acórdão da Relação de Coimbra proferido em 31/01/2006 no proc. 3965/05, in www.dgsi.pt.
13.º - Apesar de do n.º 4 do artigo 36.º do CIVA dispor que, os documentos referidos nos números anteriores devem ser processados em duplicado, destinando-se o original ao cliente e a cópia ao arquivo do fornecedor, a verdade é que, a 2.ª Secção do STA decidiu no Acórdão que proferiu em 20/10/2004 no Processo n.º 0724/04 que, a reprodução, em 2.ª via, de factura em que conste IVA basta à finalidade legal da sua reforma (que é a da identificação abrangente do documento reformado) e proporciona ao órgão fiscalizador meio satisfatório para o controlo da situação tributária; e mais recentemente, com a introdução dos n.ºs 10 e 11 do artigo 36.º do CIVA, o próprio legislador veio reconhecer que, afinal, as facturas ou documentos equivalentes até podem ser desmaterializados ou emitidos pelos próprios adquirentes dos bens ou das prestações de serviços que não põe em causa o superior interesse da fiscalização nem com isso aumenta a fraude fiscal.
14.º - A formalidade ad substantiam das facturas e documentos equivalentes têm ao longo do tempo, vindo a evoluir doutrinária e legalmente, no sentido de as transformar em determinados casos, em formalidades ad probationem.
15.º - O interesse do Estado Português de evitar o mais possível a evasão fiscal, não pode violar o direito do Recorrente exercer o contraditório provando, como provou, a existência das prestações de serviços de apoio às vendas do gás, constantes dos autos.
16.º - Tendo em conta a formalidade ad substantiam das facturas e documentos equivalentes e o carácter altamente subjectivo que a descrição das prestações de serviços pode assumir, nomeadamente, daquelas de carácter intelectual e, por isso, imateriais e impossíveis de quantificar e muito difíceis de discriminar, sabiamente, o legislador retirou à administração pública o poder discricionário de exigir dos sujeitos passivos uma discriminação concreta e exaustiva das prestações de serviços, quiçá passíveis até de revelarem factos sujeitos a sigilo profissional como seria o caso de se exigir ao médico que discriminasse no recibo de honorários (documento equivalente à factura) o diagnóstico de um cancro ao cliente.
17.º - Por isso, sabiamente, na alínea b) do n.º 5 do artigo 36.º do CIVA, o legislador exige apenas que a discriminação contenha a denominação usual dos bens transmitidos ou dos serviços prestados, com especificação dos elementos necessários à determinação da taxa aplicável.
18.º - Analisando sintáctica e morfologicamente a expressão “serviços prestados de apoio às vendas de gás” constante das facturas em causa nos autos, conclui-se com margem de segurança que não existe qualquer ambiguidade, como erradamente entendeu o Tribunal a quo; por outro lado, a expressão “transmissão de bens e prestação de serviços” constitui o género, enquanto que a expressão “prestação de serviços” constitui uma espécie de transmissões sujeitas a IVA;
Por isso, contrariamente ao entendimento do tribunal a quo, a discriminação efectuada nas facturas em causa não é genérica, mas antes específica, que a transmissão em causa sujeita a IVA é apenas uma prestação de serviços.
19.º - A discriminação efectuada nas facturas dos autos vai mais longe, já que a descrição concretiza (embora de uma forma muito ampla, mas sem ambiguidades) qual o tipo de serviços prestados, e que são os de apoio às vendas do gás; embora descritos de forma ampla, tal descrição não se revela ambígua e dá cabal cumprimento ao disposto na alínea b) do n.º 5 do artigo 36.º do CIVA; não se podem confundir, serviços de apoio às vendas do gás com, por exemplo, serviços de venda de gás, ou qualquer outro serviço prestado.
20.º - O artigo 36.º do CIVA (onde constam as formalidades ad substantiam), não exige qualquer concretização dos serviços prestados mas tão só a denominação usual dos bens transmitidos ou dos serviços prestados, com especificação dos elementos necessários à determinação da taxa aplicável.
21.º - A expressão SERVIÇOS PRESTADOS DE VENDAS DE GÁS constitui, sem dúvida, a denominação usual deste tipo de serviços prestados, não se verificando qualquer ambiguidade na sua identificação e concretização e, a verdade é que, tais serviços podem incluir não só a recepção da encomenda do cliente, como também a entrega e recebimento do gás vendido tão amplo é aquele conceito; porém, se quiser ir-se mais além, tais serviços podem consubstanciar-se na operação pelo prestador do serviço de um sistema informático de emissão da nota de encomenda, da guia de remessa, da factura e do recibo, bem como conduzir um veículo para a entrega do gás ou até dar de comer ao burro que puxa a carroça, porventura, ainda utilizada nas entregas do gás em algumas das aldeias mais recônditas do país; no entanto, a este nível de concretização da natureza dos serviços prestados já não constituem nem se enquadram nas formalidades ad substantiam da alínea b) do n.º 5 do artigo 36.º do CIVA, pois quis o legislador pretendeu, sabiamente, que fossem antes formalidades ad probationem.
22.º - Assim sendo, a nosso ver andou mal o tribunal a quo quando não entendeu que a expressão SERVIÇOS PRESTADOS DE APOIO ÀS VENDAS DE GÁS constitui a denominação usual deste tipo de serviços prestados (já que apenas acrescenta à expressão referida, a palavra apoio), e especifica os elementos necessários à determinação da taxa do IVA aplicável.
23.º - A expressão “apoio” permite incluir nos serviços prestados às vendas de gás todos os serviços (e até muitos outros) que o Tribunal a quo considerou provados, os quais constituem apenas e tão só formalidades ad probationem; ao contrário das formalidades ad probationem que admitem prova testemunhal, a formalidade ad substantiam não admite tal tipo de prova; o legislador, ao redigir como redigiu a alínea b) do n.º 5 do artigo 36.º do CIVA, pretendeu, sabiamente, restringir de forma muito ampla, mas sem ambiguidade, o requisito ad substantiam constante daquela alínea b) do n.º 5 do artigo 36.º do CIVA, limitando tal requisito apenas à denominação usual dos bens transmitidos ou dos serviços prestados, com especificação dos elementos necessários à determinação da taxa aplicável.
24.º - Andou mal o Tribunal a quo ao concluir que as facturas quando não indicam a natureza, a quantidade, o critério, a duração, custos do serviço prestado não cumprem as exigências legais prescritas pelo artigo 36.º, n.º 5, al. b) do CIVA; de facto, a alínea b) do n.º 5 do artigo 36.º do CIVA, não exige que se indique o critério, a duração e o custo dos serviços prestados, mas tão somente, voltamos a insistir, a denominação usual dos bens transmitidos ou dos serviços prestados, com especificação dos elementos necessários à determinação da taxa aplicável.
25.º - A eventual necessidade da administração fiscal pretender uma maior concretização e identificação dos serviços prestados constitui uma formalidade ad probationem que não se pode confundir com a formalidade ad substantiam do artigo 36.º, n.º 5, alínea b) do CIVA, residindo aqui toda a questão e a importância da verdadeira decisão nestes autos.
26.º - As facturas constantes dos autos satisfazem integralmente as formalidades ad substantiam já que os serviços prestados delas constantes além da denominação usual dos bens transmitidos ou dos serviços prestados, especificam os elementos necessários à determinação da taxa aplicável pois não se confundem com nenhum dos serviços constantes das verbas 2.7, 2.11, 2.14, 2.15, 2.16, 2.17, 2.18, 2.19, 2.20, 2.21, 2.22, 2.23, 2.24, 2.25, 2.26, 2.27, 2.28, 2.29, 2.30 e 4.1 da LISTA ANEXA I ao CIVA, nem da verba 3.1 da LISTA ANEXA II ao CIVA; a própria lei recorre a expressões amplas para identificar e para denominar os serviços prestados como é o caso, por exemplo, dos serviços constantes da verba 2.22 da LISTA ANEXA I ao CIVA (Prestações de serviços relacionadas com a limpeza das vias públicas, bem coma a recolha, armazenamento, transporte, valorização e eliminação de resíduos).
27.º - Para cumprimento das formalidades ad substantiam constantes da alínea b) do n.º 5 do artigo 36.º do CIVA, a lei apenas exige uma denominação usual que é, como se viu no caso transcrito supra, extremamente ampla, sendo certo que, a “prestação de serviços de apoio às vendas de gás”, consubstanciam a “prestação de serviços relacionados com as vendas de gás”.
28.º - Os serviços que o Tribunal a quo considerou provados são imateriais ou intangíveis e, por isso, insusceptíveis de quantificação, pelo que, também não pode ser exigido que a Recorrente indique a quantidade, como exige a alínea b) do n.º 5 do artigo 36.º do CIVA; a qual deve, por isso, ser entendida, no sentido estrito, e para efeitos da prova ad substantiam, de que a formalidade da quantidade se exige apenas para os bens e prestações de serviços materiais.
29.º - Quando os serviços prestados são imateriais ou intangíveis, como é o caso dos autos, é impossível dar cumprimento às formalidades ad substantiam da indicação da quantidade e do preço unitário (facto que aliás lançou a confusão no inspector tributário que elaborou o Relatório juntos aos autos), os quais não podem, por isso, ser exigidos; no caso dos autos, o facto tributário é o direito à dedução do IVA contido nas facturas pelas quais a sociedade A., Lda., liquidou os serviços prestados de apoio às vendas de gás da Recorrente, pelo que, os documentos relevantes para efeito de tal direito à dedução do IVA em causa são as referidas facturas.
30.º - Para efeitos do CIVA, designadamente, para o cumprimento do requisito constante da alínea b) do n.º 5 do artigo 36.º a lei não fixa nem exige ad substantiam que nas facturas se indique a duração e os custos dos serviços prestados de forma concreta e ao mais ínfimo pormenor como na decisão recorrida o Tribunal a quo entendeu, a nosso ver mal, ao ter concluído que as facturas, porque não indicam a natureza a quantidade, o critério, a duração, custos do serviço prestado, não cumprem as exigências legais prescritas pelo artigo 36.º, n.º 5, al. b) do CIVA.
31.º - No caso em apreço, tal só seria possível se o Dr. P. exercesse funções que pudessem em determinado momento ser imputadas de forma directa e inequívoca a um determinado resultado material; a natureza das funções que o Dr. P. exercia em ambas as sociedades eram na sua grande maioria imateriais e, por isso, só possíveis de serem imputadas e consequentemente facturados à Recorrente utilizando formas e critérios indirectos de determinação dos valores a facturar.
32.º - Daí que, tendo em conta a impossibilidade prática de separar e individualizar os trabalhos e tarefas, imateriais e intangíveis do foro intelectual, que o Dr. P. prestava para uma e para outra sociedades, e o tempo aproximado que ele afectava a uma ou a outra das sociedades era muito variável e inconstante, quer durante o dia, a semana ou o mês, sucedeu que as gerências daquelas sociedades, por comum acordo, acordaram no critério da repartição dos custos directos e indirectos com os ordenados e salários do Dr. P. pelo valor de uma avença anual de 18.000,00 euros acrescido de IVA, sem concretizarem o momento exacto para emissão das facturas, tanto mais que entre aquelas sociedades existia uma conta corrente para relevar contabilisticamente as transmissões de bens e serviços que se efectuavam de uma para a outra sociedade e vice-versa.
33.º - O CIVA acolhe no regime de pro-rata como critério de imputação do IVA dedutível às actividades isentas e às actividades não isentas, critérios indirectos; os custos directos são aqueles que podem ser imputados directamente a determinado bem produzido ou serviço prestado e os custos indirectos são aqueles que, sendo gerais, ou seja, comuns a vários produtos ou serviços, só a eles podem ser imputados por via indirecta através de chaves ou critérios de repartição; ora, esses critérios ou chaves de repartição, são por vezes complexos ou até inviáveis, designadamente, quando a maior parte dos serviços prestados são imateriais, ou seja, não são passíveis de serem corporizados directamente na produção de um bem ou na prestação de um serviço com substância, mas contribuem, no entanto, para a formação dos rendimentos e ganhos das empresas como foi o caso dos autos, em que as vendas da Recorrente cresceram significativamente após o Dr. P. ter iniciado a prestação de serviços em causa nos autos.
34.º - Apesar de todas as dificuldades, a verdade é que o tribunal a quo deu como provado a existência dos serviços prestados à Recorrente pelo Dr. P., enquanto funcionário da sociedade A., Lda., sendo certo que, tal prova é para efeitos de exercer o direito à dedução do IVA não uma prova ad susbtantiam, que a lei (artigo 36.º, n.º 5 alínea a) do CIVA) não exige, mas antes uma prova ad probationem suficiente para provar a existência dos serviços prestados sobre as quais incidiu o IVA deduzido pela Recorrente.
35.º - Em consequência da existência de uma conta corrente entre ambas as empresas é justificativo também, ad probationem, para a alegada inexistência do pagamento das facturas em causa nos autos, já que a liquidação dos débitos de uma era (como é) efectuada por encontro de contas entre ambas as empresas, o que a lei permite, tal como decorre do preceituado no artigo 344.º do Código Comercial.
36.º - O Tribunal a quo não permitiu o exercício do seu direito ao contraditório relativamente às afirmações escritas que o inspector tributário produziu no relatório junto aos autos, o qual, por isso, não pode ser utilizado como prova documental, e mal andou, também aqui; por isso, como se alcança da sentença recorrida, o Tribunal a quo fundou de forma impressiva a sua decisão na prova documental constituída apenas pelo relatório do inspector tributário, a qual, não poderia ter sido considerada como o foi, não só mas também em virtude de a Recorrente não ter exercido o direito ao contraditório em sede de audiência de discussão e julgamento, questionando o autor do relatório.
37.º - A Recorrente não deixa de referir também que, nenhuma das considerações efectuadas no relatório são susceptíveis de contrariar a força probatória da escrita comercial da Recorrente — artigo 44.º do Código Comercial — nem tampouco susceptíveis de contrariar as declarações da Recorrente, designadamente, as que esta produziu no modelo A do CIVA.
38.º - A sentença recorrida não distingue entre formalidades ad probationem, que a Recorrente produziu em sede de audiência de julgamento, e formalidades ad substantiam exigidas pela alínea a) do n.º 5 do artigo 36.º por força do n.º 2 do artigo 19.º ambos do CIVA, constantes das facturas em causa nos autos tendo em conta a imaterialidade e a intangibilidade dos serviços prestados constantes daquelas facturas insusceptíveis de quantificação e a denominação usual dos bens transmitidos ou dos serviços prestados, com especificação dos elementos necessários à determinação da taxa aplicável; por isso, a correcta decisão da causa impõe uma distinção entre formalidades ad probationem e formalidades ad substantiam e a verificação se as facturas em causa nos autos dão cumprimento a estas últimas tendo em conta tudo quanto foi alegado e provado sobre as prestações de serviço de apoio às vendas de gás em causa.
39.º - A sentença recorrida violou as seguintes disposições legais:
- Artigos 19.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2; 36.º, n.º 5, alínea b); e 87.º, n.º 1 do CIVA;
- Artigos 55.º, 72.º, 75.º e 77.º, n.º 1 e 2 da LGT;
- Artigo 125.º, n.º 2 do CPA por força do disposto no artigo 2.º, alínea d) do CPPT;
- Artigo 2.º, alínea d) e 75.º do CPPT;
- Artigos 44.º e 344.º do Código Comercial.
- Artigos 2.º, 18.º n.º 3, 266.º n.º 1 e 2 da Constituição da República.
Termos em que, e nos mais de Direito doutamente supridos por Vs. Exas., deve o recurso merecer provimento, revogando-se a sentença recorrida, com as legais consequências.”
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A Recorrida não contra-alegou.
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O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
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Com dispensa dos vistos legais, tendo-se obtido a concordância dos Meritíssimos Juízes-adjuntos, nos termos do artigo 657.º, n.º 4 do CPC; cumpre apreciar e decidir.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa analisar se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao decidir manter o acto de liquidação de IVA na ordem jurídica, por não ser possível aceitar a dedução do IVA indicado nas facturas em apreço, na medida em que estas não cumprem as exigências legais prescritas no artigo 36.º, n.º 5, alínea b) do Código do IVA.

III. Fundamentação
1. Matéria de facto

Na sentença prolatada em primeira instância foi proferida decisão da matéria de facto com o seguinte teor:

“Pelos documentos juntos aos autos com relevância para o caso, bem como do depoimento das testemunhas inquiridas, considero provados os seguintes factos:
1. Na sequência da acção inspectiva (d)a Administração Fiscal, foram efectuadas as seguintes liquidações adicionais de I.V.A. conforme fls. 14 a 18 dos autos, a saber:
Nº liquidaçãoValorPeríodoData da liquidação
091353161.140,00€0506T (2º trimestre)01/09/2009
091353181.890,00€0509T (3º trimestre)01/09/2009
09135320630,00€0512T (4º trimestre)01/09/2009
09135322945,00€0606T (2º trimestre)01/09/2009
091353242.835,00€0612T (4º trimestre)01/09/2009
2. Em 15 de Fevereiro de 2006, a impugnante fez um pedido de reembolso de I.V.A. relativo ao período de 2005 12T [cfr. Relatório de fls. 41 a 66 dos Processo administrativo (PA) apenso];
3. Na sequência daquele pedido, foi iniciado processo de inspecção tributária externa à impugnante, relativa ao ano de 2005, em 28 de Abril de 2009, com o nº OI200900159, o qual terminou em 9 de Julho de 2009 12T [cfr. Relatório de fls. 41 a 66 dos Processo administrativo (PA) apenso];
4. E, em 15 de Julho de 2009, foi iniciado processo de inspecção tributária externa à impugnante, relativa ao ano de 2006,com o nº OI200900272, o qual terminou em 9 de Julho de 2009 12T [cfr. Relatório de fls. 41 a 66 dos Processo administrativo (PA) apenso];
5. Foi elaborado o Relatório Final do procedimento inspectivo, com o teor constante de fls. 41 a 66 do P.A., que se têm por integralmente reproduzidas;
6. No âmbito destes procedimentos de inspecção, constatou-se que as seguintes facturas, emitidas pela Sociedade A., Ldª, não continham todos os requisitos legais, pelo que não haveria lugar a reembolso:
Ano 2005
Nº facturaDataValorI.V.A. dedutível
2005074230/04/20053.000,00€570,00€
2005105427/06/20053.000,00€570,00€
2005131130/07/20053.000,00€630,00€
2005148331/08/20053.000,00€630,00€
2005159826/09/20053.000,00€630,00€
2005179225/10/20053.000,00€630,00€
Ano 2006
Nº facturaDataValorI.V.A. dedutível
PT06089231/05/20062.250,00€472,50€
PT06102830/06/20062.250,00€472,50€
PT06217129/12/200613.500,00€2.835,00€

7. As facturas contêm no campo “designação” a expressão: “serviços prestado apoio a vendas de gás”(fls.69 a 89 do PA);
8. As facturas emitidas destinavam-se a transferir custos para a impugnante, relativamente ao salário do Dr. P., que trabalhava na A., Lda., e que desenvolvia trabalhos para a impugnante (prova testemunhal);
9. A impugnante e A., Lda., têm alguns sócios comuns e tem por actividade a venda de gás que compra à impugnante (prova testemunhal);
10. Em 15 de Julho de 2009, a impugnante foi notificada para exercer direito de audiência prévia, através do Ofício nº 11005 ( fls. 41 a 66 do PA);
11. A impugnante exerceu direito de audição por escrito, em 27 de Julho de 2009 (fls. 101 a 109 do PA);
12. Do capítulo IX do relatório de inspecção, documento que se dá por integralmente reproduzido, – relativo às inspecções nºs OI200900159 e OI200900272 – consta resposta ao direito de audição;
13. A impugnação judicial das liquidações de I.V.A. indicadas supra deu entrada em juízo em 13 de Novembro de 2009.
2.1. MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO.
Alicerçou-se a convicção do Tribunal na consideração dos factos provados e não provados na prova documental e testemunhal.
A prova documental teve por base a constante do Relatório da Inspecção Tributária e respectivos anexos e documentos juntos aos autos pelo impugnante.
A Impugnante, apresentou prova testemunhal, no entanto os depoimentos prestados não foram suficientes para lograrem provar quais a serviços descriminados nas facturas emitidas.
A testemunha C., A. e P., explicaram o contexto da relação comercial entre a sociedade impugnante e a sociedade “A., Lda., sendo certo que está sociedade tem sócios comuns e interesses comuns.
A impugnante tem por objecto social a venda de gás e implementação novas energias renováveis (painéis solares e electrónicos e outros) e a emitente de facturas vende gás que compra à impugnante.
Referiram ainda que a emitente das facturas, prestava serviços à impugnante, através do Dr. P., qual desenvolveu trabalho na organização da contabilidade, gestão informática, controlo de custos, avaliação de desempenho dos trabalhadores e negócios e investimentos.
E que as facturas, destinavam-se a transferir os custos para a impugnante, relativo ao encargo do salário do Dr. P., uma vez, que este prestava serviço em ambas as empresas, que eram entidades destintas e estavam sediadas em locais destintos.
Não resultam provados ou não provados quaisquer outros factos com interesse para a decisão.”

2. O Direito

Na sequência de pedido de reembolso do IVA, referente ao período de 2005 12T, a Administração Tributária (AT) determinou uma fiscalização externa, tendo em vista o controlo da actividade exercida pela Impugnante, concluindo, além do mais, que esta tinha registado na sua contabilidade diversas facturas que não se encontravam emitidas de acordo com o artigo 36.º do CIVA.

Assim, e mediante a invocação do artigo 19.º, n.º 2, do CIVA, a AT não aceitou que a Impugnante deduzisse o IVA constante daquelas facturas, motivo por que lhe liquidou adicionalmente o imposto deduzido.

A questão que constitui o objecto do presente recurso, como consta das respectivas alegações, consiste em saber se as facturas emitidas pela impugnante preenchem ou não os requisitos previstos no artigo 36.º, n.º 5, alínea b) do CIVA.

Sustenta a Recorrente que a eventual necessidade de a AT pretender uma maior concretização e identificação dos serviços prestados constitui uma formalidade ad probationem que não se pode confundir com a formalidade ad substantiam do artigo 36.º, n.º 5, alínea b) do CIVA; concluindo que as facturas em crise satisfazem integralmente as formalidades ad substantiam, já que os serviços prestados delas constantes, além da denominação usual dos serviços prestados, especificam os elementos necessários à determinação da taxa aplicável, pois não se confundem com nenhum dos serviços constantes das verbas 2.7, 2.11, 2.14, 2.15, 2.16, 2.17, 2.18, 2.19, 2.20, 2.21, 2.22, 2.23, 2.24, 2.25, 2.26, 2.27, 2.28, 2.29, 2.30 e 4.1 da LISTA ANEXA I ao CIVA, nem da verba 3.1 da LISTA ANEXA II ao CIVA.

Defende, ainda, a Recorrente que, para efeitos do CIVA, designadamente, para o cumprimento do requisito constante da alínea b) do n.º 5 do artigo 36.º, a lei não fixa nem exige ad substantiam que nas facturas se indique a duração e os custos dos serviços prestados de forma concreta e ao mais ínfimo pormenor, como na decisão recorrida o Tribunal a quo entendeu, ao ter concluído que as facturas, porque não indicam a natureza, a quantidade, o critério, a duração, custos do serviço prestado, não cumprem as exigências legais prescritas pelo artigo 36.º, n.º 5, alínea b) do CIVA.

Para fundar tal discordância, a Recorrente alertou para o caso concreto: tendo em conta a impossibilidade prática de separar e individualizar os trabalhos e tarefas, imateriais e intangíveis do foro intelectual, que o Dr. P. prestava para uma e para outra sociedades, e o tempo aproximado que ele afectava a uma ou a outra das sociedades era muito variável e inconstante, quer durante o dia, a semana ou o mês, sucedeu que as gerências daquelas sociedades, por comum acordo, acordaram no critério da repartição dos custos directos e indirectos com os ordenados e salários do Dr. P. pelo valor de uma avença anual de 18.000,00 euros acrescido de IVA, sem concretizarem o momento exacto para emissão das facturas.
Com efeito, na sentença recorrida decidiu-se pelo incumprimento das exigências legais previstas no artigo 36.º do CIVA porquanto «(…) No que concerne à primeira questão o artigo 36º, nº 5, al. b) C.I.V.A. estipula que: “as facturas ou documentos equivalentes devem ser datados, numerados sequencialmente e conter os seguintes elementos: (…) a quantidade e denominação usual dos bens transmitidos ou dos serviços prestados, com especificação dos elementos necessários à determinação da taxa aplicável.”.
Sustendo-nos na jurisprudência proferida no acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul, de 26/10/2010, proferido no âmbito do processo 04170/10, (disponível em http://www.dgsi.pt/) as exigências legais relativas a facturas derivam da necessidade de evitar a fuga e evasão fiscais, fazendo com que se imponha ao sujeito passivo maior rigor e exactidão se aquele pretender beneficiar do reembolso do I.V.A.
Deve atender-se a que “III- No IVA e na medida em que a factura ou documento equivalente constitui como que um cheque sobre o Estado o legislador adoptou medidas apertadas para evitar a fraude fiscal nelas se filiando o artigo 35.° n.° 5 do CIVA que exige determinados formalismos (formalidades "ad substantiam" cujo incumprimento acarreta a invalidade destes documentos).”
A definição ambígua do serviço prestado tem implicações quanto à taxa de imposto a aplicar, o que não é, de todo, admissível.
Para a Administração fiscal, não releva só a aplicação da correcta taxa de imposto mas, também, o controlo da situação tributária do sujeito passivo, sendo, por isso, imprescindível que a designação do serviço seja perceptível e inequívoca.
Do probatório resultou que nas facturas subjacentes a todo este litígio consta a expressão: “serviços prestado apoio a vendas de gás”.
Face ao que vem sendo dito, e seguindo-se, nesta sede, o parecer do digno magistrado do Ministério Público, forçoso se torna concluir que “a descrição constante das ditas facturas corresponde a uma fórmula genérica e abstracta, sem especificar concretamente quais os serviços que foram prestados, qual a unidade de medida que serviu de base à sua quantificação e quais as operações específicas que foram realizadas.”
Constata-se que, aquelas facturas, face aos elementos que delas constam, não permitem apreender de que se trata quando se refere a “serviços prestado apoio a vendas de gás”, não indiciando a natureza, quantidade, critério, duração, custos do serviço prestado. De tal forma, que não pode sequer saber-se se, efectivamente, houve serviços prestados ou não.
Compulsado o processo de inspecção, constata-se que, em momento algum, são apresentados comprovativos do pagamento dos serviços alegadamente efectuados, nem tampouco, em sede de inquirição de testemunhas, se logrou provar que serviços foram prestados e que correspondia àquelas facturas.
Deste modo, conclui-se que as facturas não indicando a natureza, a quantidade, o critério, a duração, custos do serviço prestado não cumprem as exigências legais prescritas pelo artigo 36º, nº 5, al. b) do C.I.V.A. (…)»

Entrando, agora, no conhecimento da questão referente à repartição do ónus probatório, quanto a esta matéria, dispõe com interesse o artigo 74.º, n.º 1, da LGT que o ónus de prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque.

Assim, e tomando como modelo o procedimento de liquidação da iniciativa da AT, esta terá o ónus de demonstrar a ocorrência dos factos de que deriva o direito à liquidação (os factos-pressupostos da existência, qualificação e quantificação do facto tributário). E o sujeito passivo terá o ónus de demonstrar os factos impeditivos, modificativos ou extintivos desse direito.

No que respeita ao IVA é jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Administrativo que recai sobre o sujeito passivo o ónus da prova da existência dos factos tributários que alegou como pressuposto do direito à dedução do imposto sobre o valor acrescentado. (Neste sentido, entre muitos outros: acórdãos nºs 0871/02, 001483/02, 001480/03, 0241/03, proferidos respectivamente em 09.10.2002; 20.11.2002; 14.01.2004 e 30.04.2003).
E, é assim, porque é o sujeito passivo que se arroga ao direito à dedução e a administração fiscal põe em causa tal facto tributário. No entanto, esta regra só funciona após a AT ter demonstrado os factos por si invocados.

Em anexo ao relatório de inspecção tributária encontram-se fotocópias de todos os documentos emitidos pelo prestador de serviços A., Lda. e cuja dedução do IVA a AT considerou indevida. Infere-se, em sintonia com a motivação vertida no relatório inspectivo, que se trata de facturas emitidas sem especificação dos trabalhos efectuados e/ou quantificação/extensão dos mesmos.

Vejamos, em concreto, se se verificam os pressupostos reais da actuação da AT.

Em todas as facturas em causa encontra-se escrito no local destinado à designação/descrição “serviços prestados de apoio a vendas de gás” – cfr. fls. 69 a 76 e 84 a 89 do processo administrativo apenso.

Repristinando a fundamentação do acto, incluindo a motivação em sede de análise do exercício do direito de audição, no caso dos autos, cabe aferir se as facturas em causa se encontram ou não emitidas em conformidade com o n.º 5 do artigo 36.º do Código do IVA, na redacção aplicável à data, segundo o qual, além do mais, «as facturas ou documentos equivalentes devem ser datados, numerados sequencialmente e conter os seguintes elementos: (…) b) A quantidade e denominação usual dos bens transmitidos ou dos serviços prestados, com especificação dos elementos necessários à determinação da taxa aplicável; as embalagens não efectivamente transaccionadas devem ser objecto de indicação separada e com menção expressa de que foi acordada a sua devolução; (…)».

Não há que aceitar um cumprimento desses requisitos de forma aligeirada quando estão em causa prestações de serviços que se suportam num contrato de prestação de serviços. Os requisitos legais das facturas têm que ser observados por forma a permitirem um controle sobre que exacto serviço foi prestado, quando, onde, em que quantidade/extensão, e a quem, também para aferir do cumprimento do contrato de prestação de serviços, por serem as mesmas susceptíveis de gerar o direito à dedução do imposto sobre o valor acrescentado, não podendo haver duplicação de deduções de IVA. No âmbito do contrato de prestação de serviços as partes usarão do rigor que lhes aprouver, no que à medição dos serviços prestados diz respeito, mas para obterem a dedução do imposto sobre o valor acrescentado facturado as facturas hão-de permitir reconstituir que serviço foi prestado e qual o seu custo – cfr. Acórdão do STA, de 04/10/2017, proferido no âmbito do processo n.º 01141/16.

Na situação sub judice só remotamente se pode dizer que os serviços prestados foram facturados, dado que os documentos – facturas não permitem concluir que exacto serviço foi prestado o que possibilita que haja duplicação de facturação, com a criação de um imposto sobre o valor acrescentado que não foi pago mas se pretende ver deduzido.

Efectivamente, as facturas em causa não cumprem o disposto no artigo 36.º, n.º 5 do Código do IVA, nomeadamente, a sua alínea b), pois a designação dos serviços prestados apresenta-se sob a forma de uma menção genérica e não fazem nenhuma referência à quantidade/extensão dos mesmos.

Na verdade, é reconhecido o carácter formalista do IVA, em ordem, nomeadamente, a evitar, o mais possível, a evasão fiscal, pelo que as respectivas formalidades o são ad substanciam, que não meramente ad probationem.

É que a exigência desses requisitos nos referidos documentos facturas “tem como escopo permitir à Administração Tributária o controlo da situação tributária, e não apenas obter prova dos factos a controlar, motivo por que as facturas, emitidas de acordo com os termos da lei, constituem formalidade “ad substantiam”, insusceptível de substituição por um qualquer outro meio de prova” – cfr. Acórdão do TCA Norte, de 19/01/06, proferido no âmbito do processo n.º 00027/00 - Viseu.

Tem sido, pois, reconhecido o carácter formalista do IVA, destacando-se o papel central desempenhado pela factura e pela necessidade de a mesma ser passada segundo a forma legal – ou seja, preenchendo-se todos os requisitos do artigo 36.º, n.º 5 do Código do IVA – como pressuposto da dedução do imposto suportado (e isto, aliás, independentemente da materialidade da operação a que uma concreta factura respeita).

Percorrendo a jurisprudência dos Tribunais Superiores, resulta evidenciada a relevância da factura, na medida em que permite ao adquirente justificar o exercício do direito à dedução mas, também, como elemento imprescindível à Administração Tributária, por ser demonstrativo da operação sobre a qual o IVA incide e permitir o controlo do imposto/base tributável.

Na verdade, facturas com designações genéricas, como “serviços prestados de apoio a vendas de gás”, não permitem concluir que exacto serviço foi prestado, o que possibilita que haja duplicação de facturação, susceptível de gerar o direito à dedução do imposto sobre o valor acrescentado, não podendo haver duplicação de deduções de IVA.

Não temos dúvidas quanto à falta de preenchimento da exigência formal de identificação da natureza do apoio. Estarão em causa serviços prestados de apoio, mas será apoio jurídico? Apoio informático? Apoio administrativo? Apoio comercial? Apoio logístico? Poderíamos continuar a questionar-nos, atenta a infinidade de hipóteses. Todavia, naturalmente, o enquadramento fiscal poderá não ser o mesmo.

Em tese e uma vez que não está especificado que trabalho foi realizado, as facturas poderiam referir-se sempre à mesma extensão e qualidade de prestação de serviços, ou seja, uma multiplicação de facturação do mesmo serviço prestado. A falta deste elemento identificador coloca, in casu, em risco o mecanismo concebido com o objectivo de arrecadar o imposto.

Nestes termos, bem andou a AT ao considerar que as facturas em apreço não foram emitidas na sua forma legal, uma vez que o prestador dos serviços não discriminou os serviços prestados, nem a extensão dos mesmos.

É, pois, natural que o legislador tenha entendido que, para que o sistema do IVA possa funcionar, para facilitar o controlo das operações sujeitas e isentas, e para obstar à evasão fiscal, se tornava necessária, não apenas a emissão de facturas ou documentos equivalentes, na forma que entendesse cada um dos intervenientes, mas a sua emissão com um conteúdo e rigor definidos pela lei. Daí a exigência de uma forma legal.

O certo é que a norma do artigo 19.º do CIVA não nos esclarece sobre qual é a "forma legal" que exige. Mas o diploma diz-nos, adiante, nas várias alíneas do n.º 5 do artigo 36.º, que as facturas ou documentos equivalentes devem ser datados, numerados sequencialmente e conter os nomes, firmas ou denominações sociais e a sede ou domicílio do fornecedor de bens ou prestador de serviços e do destinatário ou adquirente, bem como os correspondentes números de identificação fiscal dos sujeitos passivos de imposto; conter a quantidade/extensão e denominação usual dos bens transmitidos ou dos serviços prestados, com especificação dos elementos necessários à determinação da taxa aplicável; conter o preço, líquido de imposto, e os outros elementos incluídos no valor tributável; e conter as taxas aplicáveis e o montante de imposto devido.

Daqui resulta, pois, que, para o Código do IVA, uma factura passada em forma legal é a que respeite o estatuído no seu artigo 36.º, ou seja, que para tal efeito, a factura que não respeite todas estas exigências não é uma factura passada em forma legal.

Neste conspecto, nem pode dizer-se que este artigo 36.º permite distinguir entre falta de forma legal e falta de elementos meramente acessórios, não essenciais, que só podem levar ao suprimento da falta.
É que o legislador estabeleceu, no artigo 19.º, n.º 2 do Código do IVA, duas condições para a dedução do imposto: que ele esteja mencionado em factura ou documento equivalente e que essa factura ou documento equivalente esteja "em forma legal".

Ora, a forma legal, já se viu, é a do artigo 36.º, n.º 5 do Código do IVA.
«Não se vêem elementos que permitam ao intérprete separar, de entre as exigências da norma, as essenciais das acessórias. A "forma legal" é a que satisfaça todas as imposições da norma legal que as indica» - cfr. Acórdão do TCA Sul, de 21/01/2006, proferido no processo n.º 1438/06.

Assim sendo, a factura ou documento equivalente que não respeite integralmente o artigo 36.º, n.º 5 do Código do IVA não está passada "em forma legal" e, consequentemente, não permite deduzir o respectivo imposto, como acontece com as facturas emitidas pelo prestador em apreço.

A expressão «quantidade e denominação usual dos bens transmitidos ou dos serviços prestados, com especificação dos bens necessários à determinação da taxa aplicável» tem como finalidade permitir quer ao cliente quer à AT controlarem se a taxa incidente sobre o valor tributável é a correcta – cfr., neste sentido, entre muitos outros, Acórdão do TCA Sul, de 19/05/2009, proferido no processo n.º 26/09.

Vejamos melhor as facturas emitidas.
Há que reconhecer que a generalidade das facturas em causa não contém os elementos referentes à quantidade/extensão dos serviços prestados, além de se desconhecerem quaisquer elementos que permitiram quantificar os serviços em causa, concretamente os valores envolvidos na relação horas/trabalhador, o que impossibilita aferir do acerto dos valores envolvidos/base tributável.

É verdade que a factura n.º FT062171, emitida em 29/12/2006 (cfr. fls. 89 do processo administrativo) tem uma indicação acrescida em relação às restantes facturas, pois identifica na quantidade o número 6,00 un e tudo aponta para estarmos perante um preço de €2.250,00 por mês, dado que o valor base de tributação soma €13.500,00, e na descrição consta “serviços prestados de apoio a vendas gás de Julho a Dezembro”. Todavia, atenta a designação “serviços prestados de apoio a vendas gás”, inserta em outras duas facturas emitidas no mesmo ano, em 31/05/2006 e 30/06/2006, permite ficar a dúvida se estas facturas não serão uma duplicação, ainda que parcial, de outras com a mesma designação, pois, afinal, parece não respeitarem a todos os meses do ano (em 2006 somente foram emitidas três facturas – cfr. ponto 6 do probatório). Acresce que, na fundamentação do acto, quanto à factura n.º FT062171, de 29/12/2006, se acrescenta que, para além de não cumprir o disposto na alínea b) do n.º 5 do artigo 36.º do CIVA, não cumpre também os requisitos definidos no n.º 2 desse artigo e consequentemente não confere veracidade à expressão utilizada na factura para cumprimento da alínea f) do n.º 5 do artigo em questão. E, quanto a este fundamento, a Recorrente nada argumenta ou contra-alega.

A verdade é que a omissão da quantificação/extensão da generalidade das prestações de serviços não permite efectuar o controlo do acerto da base tributável e se ocorreu duplicação de facturação, colocando, in casu, em risco o mecanismo concebido com o objectivo de arrecadar o imposto. Acrescendo que não se extraem das facturas elementos que permitam saber a razão pela qual as facturas se apresentam com os valores de €3.000,00, no ano de 2005, e de €2.250,00, no ano de 2006, e não outro qualquer valor (podendo estar sempre em causa a prestação do mesmo trabalho, dado que todas as facturas indicam na descrição “serviços prestados de apoio a vendas de gás”).

De facto, apesar de na petição de impugnação e no presente recurso se aludir a um contrato de avença anual de prestação de serviços de apoio a vendas de gás, totalizando, para o ano de 2005, o valor de €18.000,00, acrescido de €3.660,00 de IVA à taxa legal, e, para o ano de 2006, também o valor de €18.000,00, acrescido de €3.780,00 de IVA à taxa legal; em sede inspectiva, o administrador da empresa ora Recorrente, em declarações, cujo termo consta lavrado a fls. 29 a 32 do processo administrativo, declarou não existir qualquer contrato de prestação de serviços subjacente às facturas em apreço, aludindo a um acordo verbal com a empresa A., Lda. Com efeito, no artigo 34.º da petição inicial, também se afirma que o contrato foi verbal.

A este propósito, importa dizer que não se desconhece a jurisprudência do Tribunal de Justiça que apela à consideração de elementos adicionais perante a incompletude de uma factura, concretamente em situações de reverse charge, ou por apelo expresso à rectificação da factura. Tão-pouco se desconhece o sentido do acórdão do Tribunal de Justiça, de 15/09/16, proferido no processo nº C-518/16 (Acórdão Barlis), nos termos do qual se refere a consideração/relevância de documentos que contenham uma apresentação mais detalhada dos serviços em causa no processo e que possam ser equiparados a uma factura, na qualidade de documentos que alteram a factura inicial e a ela façam referência específica e inequívoca – cfr. Acórdão do TCA Sul, de 11/01/2018, proferido no âmbito do processo n.º 08611/15.

De resto, tem sido entendido pelo Tribunal de Justiça que: «[o] princípio fundamental da neutralidade do IVA exige que a dedução do imposto pago a montante seja concedida se os requisitos substanciais estiverem cumpridos, mesmo que os sujeitos passivos tenham negligenciado certos requisitos formais. Uma vez que a Administração Fiscal dispõe dos dados necessários para determinar que o sujeito passivo, enquanto destinatário das transacções em causa, é devedor do IVA, não pode impor, no que diz respeito ao seu direito a dedução, requisitos adicionais que possam ter por efeito a inviabilização absoluta do exercício desse direito.» - Acórdão de 1 de Março de 2012, Kopalnia Odkrywkowa Polski, C-280/10 e Acórdão do TCA Sul, de 15/12/2016, proferido no âmbito do processo n.º 1356/10.2BELRA.

Ora, independentemente da referência ao contrato de avença na petição inicial, reiterada neste recurso, inexistem quaisquer elementos adicionais que espelhem tal contrato, que, aliás, nunca foram disponibilizados à AT, nem poderiam ter sido carreados para os presentes autos, dado que, aparentemente, somente existiria um acordo verbal entre as duas empresas.

A verdade é que a alegação não aponta para a existência de informação adicional às facturas, que as pudesse completar. Tão-pouco as próprias facturas remetem para quaisquer documentos complementares, mostrando-se, portanto, inviabilizado colmatar a incompletude das facturas.

Por outro lado, na decisão da matéria de facto, ressalta motivação que aponta para a inexistência de prova de quais os serviços que estão discriminados nas facturas emitidas. Apesar de ter sido produzida prova testemunhal, os depoimentos prestados não terão sido suficientes para lograrem provar a natureza dos serviços indicados nas facturas, não ficando demonstrado, portanto, o aludido contrato de avença. Salientamos que a Recorrente não impugnou, neste recurso, a decisão da matéria de facto, pelo que a mesma se mostra estabilizada.

Tudo isto para concluir que não se encontra comprovada a invocada existência do contrato de avença. Além do mais, pressupõe-se que a própria factura remeta expressamente para outro documento complementar (ou vice versa) e que o mesmo se apresente densificador da designação da prestação de serviços e esclarecedor quanto à extensão da mesma. In casu, nem as facturas remetem expressamente para um documento anexo ou complementar, nem ficou demonstrada a existência efectiva do contrato supostamente relacionado com as facturas e que poderia, eventualmente, clarificar a extensão da prestação de serviços.

Em suma, quanto às facturas em análise, nenhuns elementos adicionais se encontram juntos aos autos, nem a impugnante, ora Recorrente, os identificou, pelo que, reitera-se, inviabiliza qualquer sindicância acrescida da extensão das prestações de serviços vertidas nas facturas, comprometendo definitivamente a possibilidade de a AT controlar a base tributável e o apuramento do imposto.
Ora, sendo assim, não pode afirmar-se, globalmente, que nas facturas emitidas tenha sido, pelas razões já ditadas, plenamente atingida a ratio legis inerente ao citado artigo 36.º do Código do IVA, ou seja, possibilitar à AT uma forma segura de verificar da adequação da base tributável e evitar a eventual dupla dedução do IVA.

Acresce que da jurisprudência do TJUE, acerca da aceitação de documentos que não cumprem os requisitos legais de uma factura para efeitos de dedutibilidade do IVA, resulta claro que, sendo verdade que o direito à dedução é uma das pedras angulares do IVA, não é menos verdade que a existência de instrumentos efectivos de controlo por parte das Administrações Fiscais, como instrumento de combate à fraude e à evasão fiscal, assume igual relevância para a boa administração do imposto.

Conclui-se, em face de tudo quanto vem dito, que, como os serviços inspectivos apontaram, os termos utilizados nas facturas em causa são omissos, não preenchendo, assim, os requisitos legais a que se refere a alínea b) do n.º 5 do artigo 36.º do Código do IVA.

É, pois, por estas razões que o IVA liquidado nas facturas em apreço não pode ser deduzido, sendo claro que não se mostram preenchidos todos os requisitos formais que as facturas, nos termos legais, devem conter – cfr. artigo 19.º, n.º 2 do Código do IVA.

Estes são verdadeiramente os normativos que estão em causa, pois foram os utilizados pela AT para fundamentar de direito o acto impugnado, pelo que a abordagem que realizámos se torna suficiente para confirmar a sentença recorrida.

Efectivamente, não está em discussão nos presentes autos o disposto no artigo 19.º, n.º 3 e n.º 4 do Código do IVA, nem o artigo 63.º do Código de IRC – cfr. conclusões 3.ª, 4.ª e 6.ª das alegações do recurso. Como se acentua na conclusão 7.ª, a questão que constitui o objecto do presente recurso consiste em saber se as facturas emitidas pela impugnante preenchem ou não os requisitos previstos no actual artigo 36.º, n.º 5, alínea b) do CIVA. Já deixámos claro que não cumprem esses requisitos e as suas consequências. Acrescentamos ser manifesto não estarmos perante os exemplos indicados, nomeadamente, na conclusão 16.ª das alegações do recurso. Por outro lado, o facto de os serviços prestados poderem ter sido imateriais ou intangíveis, não afasta a necessidade, pelos motivos expostos supra, de concretização da natureza do apoio prestado às vendas de gás e da sua extensão. Neste contexto, apresenta-se totalmente irrelevante a menção às disposições que a Recorrente aponta terem sido violadas pela sentença recorrida – artigos 55.º, 72.º e 77.º da LGT, artigo 125.º do CPA, artigo 75.º do CPPT, artigos 44.º e 344.º do Código Comercial e artigos 2.º, 18.º, n.º 3, 266.º, n.º 1 e n.º 2 da Constituição da República Portuguesa – já que, e acima de tudo, tal elenco não está devidamente concretizado e assente em factos, por forma a permitir a sua sindicância por este tribunal a quem.

Nesta conformidade, resta negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida na ordem jurídica.

Conclusões/Sumário

I - Nos termos do disposto no artigo 19.º, n.º 2 do Código do imposto sobre o valor acrescentado (CIVA) só confere direito à dedução do imposto sobre o valor acrescentado o imposto mencionado em facturas e documentos que observem a forma legal.

II - O artigo 36.º do CIVA estabelece determinados requisitos na emissão de facturas ou documentos equivalentes que são condição para a dedução do imposto por parte do sujeito passivo adquirente nos termos do artigo 19.º, n.º 2 do mesmo Código.

III - A exigência da observância desses requisitos nos referidos documentos facturas tem como escopo permitir à Administração Tributária o controlo da situação tributária, e não apenas obter prova dos factos a controlar, motivo por que as facturas, emitidas de acordo com os termos da lei, constituem formalidade “ad substantiam”, insusceptível de substituição por um qualquer outro meio de prova.

IV - Se os vícios formais contidos na factura ou documento equivalente não permitirem a exacta cobrança e respectiva fiscalização do imposto, o direito à dedução do IVA não pode ser exercido.

V – No caso em análise, as facturas em causa, nos termos em que se apresentam, não revelam a quantificação/extensão das prestações de serviços, o que, pelas razões explicadas no acórdão, compromete definitivamente a possibilidade de a Administração Tributária controlar a base tributável e o apuramento do imposto.

VI - No âmbito do contrato de prestação de serviços as partes usarão do rigor que lhes aprouver, no que à medição dos serviços prestados diz respeito, mas para obterem a dedução do imposto sobre o valor acrescentado facturado as facturas hão-de permitir reconstituir que serviço foi prestado e qual o seu custo, impedindo que haja duplicação de facturação, com a criação de um imposto sobre o valor acrescentado que não foi pago mas se pretende ver deduzido.

VII - Deste modo, não obedecem aos requisitos legais, não conferindo, por isso, direito à dedução do IVA, facturas em que apenas se menciona, relativamente a serviços prestados, uma expressão como: “serviços prestados de apoio a vendas de gás”.

VIII - Por estas razões, o IVA liquidado nas facturas em causa não pode ser deduzido, sendo claro que não se mostram preenchidos todos os requisitos formais que as facturas, nos termos legais, devem conter – cfr. artigo 19.º, n.º 2 do CIVA.




IV. Decisão

Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso.
Custas a cargo da Recorrente, nos termos da tabela I-B – cfr. artigos 6.º, n.º 2, 7.º, n.º 2 e 12.º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais.
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Porto, 15 de Abril de 2021

Ana Patrocínio
Cristina Travassos Bento
Celeste Oliveira