Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01324/15.6BEVIS
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:07/07/2016
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:Ana Patrocínio
Descritores:MÉTODOS INDIRECTOS
FIXAÇÃO DA MATÉRIA TRIBUTÁVEL
ÓNUS DA PROVA
FUNDAMENTAÇÃO
Sumário:I - Em caso de determinação da matéria tributável por métodos indirectos, compete à administração tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação (artigo 74.º, n.º 3 da LGT).
II -No domínio de utilização de métodos indirectos, a actuação da Administração Tributária não se limita à demonstração da ocorrência dos respectivos pressupostos, antes se lhe impõe que fundamente, ainda e também, os critérios de que venha a lançar mão na quantificação da matéria tributável.Contudo, do ponto de vista do erro na quantificação, as insuficiências no método são sempre substanciais, isto é, devem evidenciar um excesso de quantificação.
III - O “método presuntivo eleito” mostra-se racional e fundamentado em factos concretamente apurados, não estando a Administração Tributária impedida de a ele recorrer, pois que nada impede que a Administração conjugue vários dos “elementos” que o n.º 1 do artigo 90.º da LGT indica que “poderá ter em conta” na avaliação indirecta, pois que lhe cabe, dentro dos limites da lei, eleger o critério que repute mais adequado à determinação da matéria tributável, cabendo ao Tribunal verificar a sua correcta interpretação e aplicação em caso de litígio entre a Administração Tributária e o sujeito passivo.
IV - O n.º 4 do artigo 77.º da LGT determina que a decisão da tributação pelos métodos indirectos especificará os motivos da impossibilidade da comprovação e quantificação directas e exacta da matéria tributável e bem assim indicará os critérios utilizados na avaliação da matéria tributável, exigências estas satisfatoriamente cumpridas no relatório de inspecção, sendo claro e esclarecedor o motivo do recurso a tais métodos e bem assim o critério eleito para a avaliação indirecta e a forma como se determinaram os valores corrigidos.
V - Estando definitivamente decidido que, no caso, a Administração Tributária demonstrou a ocorrência dos necessários pressupostos legais à utilização de métodos indirectos, por um lado e, por outro, apresentando-se adequadamente fundamentados os critérios de que a Administração Tributária se serviu na tarefa de quantificação, era à impugnante que se impunha demonstrar que a utilização de tais critérios conduziu, sem margem para dúvidas fundamentadas, a um resultado final sem qualquer aderência à realidade, demonstração essa que não logrou fazer, sem olvidar que, mesmo a subsistir qualquer dúvida, o que se postula por comodidade de raciocínio, ela sempre teria de desfavorecer a recorrente.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:C..., Lda.
Recorrido 1:Fazenda Pública
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Relatório

C…, LDA., com o NIPC 5…, e melhor identificada nestes autos, interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, proferida em 21/05/2013, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação adicional de IRC dos anos de 2001 e 2002, no valor de €20.846,64.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as conclusões que se reproduzem de seguida:
“I. A taxa aplicada de RFV de 5% resultou de mera arbitrariedade, desarticulado da realidade económica e contabilística da recorrente, não constando do Relatório Final do PA quaisquer factos objectivos e concretos que justificassem a fixação daquele coeficiente,
II. Donde resulta a falta de fundamentação da liquidação e da aplicação da referida taxa de rentabilidade fiscal de 5%.
III. A recorrente viu o seu IRC dos anos de 2001 e 2002 corrigido com recurso a métodos indirectos, determinando-se a aplicação da taxa de RFV de 5%, "apurando-se, deste modo, um lucro tributável que entendemos razoável e aceitável para a actividade e de forma indirecta os custos inerentes a mesma, para os anos de 2001 e 2002", por aqui se ficando a fundamentação, no que briga com a escolha do indicado coeficiente.
IV. A fundamentação dos actos que afectem direitos ou interesses legalmente protegidos é um dever constitucional imposto a administração pelo n.° 3, do art. 268.° da CRP, devendo revelar as razões que estiveram na base da decisão administrativa, e a indicação dos pressupostos de facto e de direito que levaram a decisão.
V. O dever de fundamentação procedimental tributário consta ainda nos arts. 77.° e 84.°, n.° 3, da LGT, 63.° RCPI e nos arts. 124.° e 125.° do CPA.
VII. A decisão de tributação por métodos indirectos é legítima apenas nos casos e com os fundamentos previstos nos arts. 87.° a 90.° da LGT, devendo especificar-se os motivos da impossibilidade da comprovação e da quantificação directas da matéria tributável, indicando os critérios utilizados na avaliação da matéria tributável (n.° 4, do art. 77.°, da LGT).
VII. Decidindo-se pela aplicação de métodos indirectos, que deve ser fundamentada, a Administração Tributária (AT) deverá de seguida decidir relativamente aos critérios de quantificação escolhidos indicando-os e justificando-os, na fundamentação, em termos que permitam aferir a sua adequação e racionalidade, conforme resulta do n.° 3, do art. 84.° da LGT.
VIII. Só assim se cumprirá o principal desígnio da fundamentação que é, primacialmente, o de permitir aos interessados o conhecimento das razões que levaram a autoridade administrativa a agir, possibilitando-lhes a opção consciente e informada entre a aceitação do acto tal como foi praticado e a sua impugnação.
IX. A AT, depois de ter indicado as razões pelas quais justificou o recurso a métodos indirectos de avaliação, sustentou que “para determinarmos o resultado tributável iremos trabalhar com uma Taxa de RFV de 5%, apurando-se, deste modo, um Lucro Tributável que entendemos razoável e aceitável para a actividade", sem fornecer quaisquer outras explicações ou critérios acerca da referida taxa de 5%, não constando dos autos a exposição dos motivos que justificam a aplicação dessa taxa, no concreto caso da empresa da Impugnante, ora recorrente, ou por que razão não seria mais adequada uma taxa inferior ou superior a essa,
X. Daí que se sustenta que este critério consubstancia mera arbitrariedade, constituindo um mero número percentual, completamente desarticulado da realidade económica e contabilística da sociedade, não tendo podido sequer a impugnante infirmar um juízo que não encontrou em lugar algum, tendo justamente faltado, por isso, a fundamentação.
XI. A tributação das empresas incide fundamentalmente sobre o seu rendimento real (n.° 2, do art. 104.°, da CRP), devendo evitar-se a tributação excessiva (art. 100.º, do CPPT), bem como tributar por defeito, por força do princípio da indisponibilidade dos créditos fiscais (art. 30.°, n.° 2, do LGT).
XII. A AT decidiu aplicar uma taxa de 5% por "entender" que conduzia a uma tributação "razoável e aceitável", não indicando nenhum critério que levasse a entender dessa maneira, o que nos faz concluir pela falta de fundamentação, ou, quando muito, pela insuficiência da mesma.
XIII. Desta feita, acha-se verificado o invocado vício de falta de fundamentação, o que implica a anulação do acto (ver, no mesmo sentido, Acórdão de 29-6-2004, proferido no processo n.° 0463/04, disponível em www.dgsi.pt, onde se diz, designadamente, o seguinte: "II - Essa fundamentação, se basta para que se entenda a razão por que não foi mantida a margem de lucro considerada pela Administração, não é suficiente para que se perceba por que foi adoptada a de 9%, e não qualquer outra, abaixo de 15%"),
XIV. Tendo o Tribunal a quo, decidindo como decidiu, violado o disposto no arts. 266.° da CRP, 77º, n.ºs 3 e 4 e 84.°, da LGT, 63.° RCPI, e 124.° e 125.° do CPA, disposições legais que estipulam o dever de fundamentação procedimental tributária, que inclui a obrigatoriedade de indicação dos critérios utilizados na avaliação da matéria tributável (cfr. art. 77.°, n.° 4, da LGT), só assim sendo passível aferir da sua adequação e racionalidade (cfr. art. 84.°, n.° 3, da LGT).
XV. Neste seguimento, deve a decisão sob recurso ser substituída por douto acórdão que reconheça o invocado vício, anulando consequentemente o acto impugnado.
TERMOS EM QUE O PRESENTE RECURSO DEVE SER JULGADO INTEGRALMENTE PROCEDENTE, POR PROVADO, DANDO-SE POR VERIFICADO O INVOCADO VÍCIO DE FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO E DETERMINANDO-SE A ANULAÇÃO DO ACTO TRIBUTÁRIO EM CRISE.”
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Não houve contra-alegações.
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O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa decidir se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento no concernente ao dever de fundamentação dos critérios utilizados na avaliação indirecta da matéria tributável.

III. Fundamentação

1. Matéria de facto

Da sentença prolatada em primeira instância, consta decisão da matéria de facto com o seguinte teor:
“Para apreciar as questões suscitadas, importa assentar a seguinte matéria de facto:
1 – A impugnante foi objeto de uma fiscalização por parte dos Serviços de Inspeção Tributária de Aveiro, respeitante aos exercícios económicos dos anos de 2001 e 2002, conforme relatório constante do PA de fls. 4 a 14 do PA e que aqui se dão por integralmente reproduzidas.
2 – A impugnante tem por objeto social a “indústria transformadora da cortiça”.
3 – No seguimento da ação inspetiva identificada em 1), foram efetuadas correções em sede de IRC para os anos 2001 e 2002 e ora impugnadas.
4 – Os fundamentos para as correções em causa, encontram-se exarados no relatório identificado em 1), cujos extratos a seguir se transcrevem na parte relevante para apreciar a questão suscitada pela impugnante “(…)Constatamos que a sociedade “C…” nos exercícios de 2000, 2001 e 2002 declarou ter realizado transacções com fornecedores constantes da aludida notificação a saber: (…) E…, Lda., (…) Cork…, Lda. (…)Junta-se informação elaborada na sequência dos procedimentos de inspecção levados a efeito às sociedades Cork… e E…, empresas dos mesmos sócios, onde se prova que estas sociedades estão indiciadas no crime de fraude fiscal pela utilização e emissão de “Facturas Falsas”(…) e cujos pontos mais significativas passamos a descrever: (…)Prática continuada de crimes fiscais perpetrados pelos gerentes das sociedades acima identificadas; (…)As compras registadas pelas sociedades E... e Cork... nos anos de 1999 a 2002 são, na sua quase totalidade, suportadas por facturas falsas; (…)Confrontado o gerente, com o facto da quase totalidade das compras registadas estarem suportadas por facturas timbradas em nome de “pseudo-fornecedores”, o mesmo respondeu que tem a noção de que foi enganado, o que não acreditamos, pelo facto de todos eles serem já bem conhecidos no meio há bastantes anos; (…)Todas as compras suportadas por este tipo de facturas eram pagas sempre em dinheiro, apesar dos elevadíssimos montantes envolvidos; (…)Após o início do procedimento de inspecção a estas empresas, o qual durou quase um ano, não mais se registaram movimentos de entradas e/ou saídas de carros carregados com cortiça ou produtos derivados, o que evidencia bem o tipo de actividade que estas empresas desenvolviam efectiavmente.(…)Como atrás já foi referido a C… contabilizou nos exercícios de 2001 e 2002, diversas facturas das sociedades “E... e Cork...”, a saber: (…)Analisadas em pormenor as compras efectuadas pela “C...” às empresas E... e Cork..., salientamos que as mesmas são essencialmente rolhas de qualidade Extra, Superior e 1º/3º e cortiça de boa qualidade.(…)Nas conclusões dos procedimentos de inspecção levados a efeito aquelas sociedades,(…)e segundo declarações de um funcionário(…)”nestas instalações – da Cork... e E... – basicamente entram rolhas das qualidades 5ºs e 6ºs, trazidas pelos clientes das firmas, destinadas a serem colmatadas nestas instalações.
Há mais de 10 anos que não dão entrada nestas instalações nem se produzem rolhas extras, superiores, 1, 2º ou 3º, Mais disse, que há muitos anos, que não entram nas instalações destas firmas, fardos de cortiça ou cortiça a granel, excepto para alguns fardos de cortiça que terão entrado por inícios de 2004, mas de qualidade 4ª a 6ª.(…)Aquando da notificação à sociedade “C...”, em 9 de Maio de 2003, na pessoa do seu gerente, no sentido desta nos remeter fotocópias das Facturas, Guias de Remessa, Guias de Transporte, Talões de Pesagem, Extractos de Conta Corrente e comprovativo dos meios de pagamento, relativos aos fornecedores identificados nessa mesma notificação,(…)verificamos essencialmente os seguintes aspectos:(…)Em nenhuma das variadíssimos situações de pagamento, os cheques foram depositados em contas ligadas à E... e Cork...,(…)Os mesmos eram sistematicamente levantados ao balcão das instituições bancárias em causa, por um sócios destas empresas, Américo Amorim Conceição; E estamos a falar não só neste contribuinte como em todos os outros que mantiveram este tipo de relações com estas duas empresas. (…)APLICAÇÃO DE MÉTODOS INDIRECTOS(…)o contribuinte considerou incorrectamente como custo fiscal da sua actividade para os exercícios de 2001 e 2002 as importâncias de 345.599,06€ e 700.872,80€, respectivamente, tendo por base facturas que não correspondem a efectivas transacções comerciais, conforme o descrito(…)Em resumo temos que a sociedade “C...”: Viciou a contabilidade com a introdução de facturas falsas, isto é, que não correspondem a efectivas transações comerciais; (…)Os rácios de rentabilidade fiscal das vendas que se obteriam após correcções meramente aritméticas à componente Compras, afastar-se-iam por excesso dos valores normais de rentabilidade para o sector:(…)Deste modo, dada a impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável, em virtude da contabilidade se encontrar viciada com a introdução de “facturas falsas”, descredibilizando a mesma como um todo, v.g. no que respeita ao valor real das compras, custo das existências vendidas e consumidas e stocks,(…)Desta forma, para determinarmos o resultado tributável iremos trabalhar com uma taxa de RFV de 5%, apurando-se, deste modo, um Lucro Tributável que entendemos ser razoável e aceitável para a actividade e de forma indirecta os custos inerentes à mesma, para os anos de 2001 e 2002(…)” RFV = Lucro Tributável Declarado/Vendas + Prestação de Serviços.
5 – A impugnante apresentou pedido de revisão nos termos do artº 91º da LGT.
6 – O pedido de revisão foi improcedente, conforme fls. 15 a 24 do PA e que aqui se dão por reproduzidas.
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Alicerçou-se a convicção do Tribunal na consideração da matéria dada como assente, nos factos alegados e não impugnados e no teor dos documentos identificados e não impugnados e no depoimento das testemunhas.

FACTOS NÃO PROVADOS:
Com relevância para a presente decisão, não se provou, que as mercadorias mencionadas nas faturas emitidas por E..., Lda. e Cork..., Lda., correspondam efetivamente a transações comerciais realizadas por estes e que a taxa de RFV de 5% se encontre desarticulado da realidade económica da sociedade, porquanto a prova produzida apresentada pela impugnante, foi claramente insuficiente para abalar as conclusões explanadas no relatório dos serviços de inspeção tributária.
Com efeito, as duas testemunhas, arroladas pela impugnante, embora com um conhecimento direto dos factos, prestaram um depoimento muito vago, limitando-se a referir que conheciam as duas empresas, que viam a mercadoria a chegar e as guias de remessa. A primeira testemunha referiu ainda que as empresas em causa forneciam rolhas de “classes boas”. No que se refere à questão da taxa de RFV de 5%, nada disseram. Ou seja, no que concerne a questões essenciais, não souberam prestar um depoimento objetivo e informador, designadamente não identificaram os responsáveis das empresas emitentes, quem efetuava o transporte das mercadorias, como eram efetuado os pagamentos e outros.”
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2. O Direito

O recurso dirige-se unicamente ao seguinte julgamento realizado pelo tribunal recorrido: “(…) as razões da não consideração dos valores constantes das faturas em discussão para efeitos de IRC, encontram-se explanadas no dito relatório de uma forma bem pormenorizada, objetiva e informadora, e que permitiu à ora impugnante apreender perfeitamente a razão da não aceitação dos valores em causa para efeitos de custos, bem como a aplicação da taxa de rentabilidade fiscal de 5%. (…) No que se refere à taxa de rentabilidade fiscal de 5% apurada pela administração fiscal, que a impugnante alega ser desarticulada da realidade económica, a mesma não apontou qualquer outro critério nem provou que a mesma não tinha qualquer enquadramento económico e contabilístico (…)”.
Nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 85.º da LGT a avaliação indirecta é uma forma subsidiária da avaliação directa de determinação do lucro tributário dos contribuintes, apenas podendo ser aplicada aquela primeira forma de avaliação nos casos expressamente previstos na lei e quando estejam reunidos os pressupostos legalmente estabelecidos para o efeito (cfr. artigo 81.º, n.º 1 da LGT).
O recurso a métodos indirectos de determinação da matéria colectável é uma última ratio, apenas podendo ser aplicado quando não seja possível que esta avaliação seja feita por via da avaliação directa, em conformidade com o princípio constitucional segundo o qual a tributação das empresas recai fundamentalmente sobre o seu rendimento real (cfr. artigo 104.º, n.º 2 da CRP).
Dito de outra forma, tendo a avaliação indirecta carácter subsidiário em relação à avaliação directa (cfr. artigo 85.º, n.º 1, da LGT) e excepcional (cfr. artigo 81º da LGT, n.º1 da LGT), cabe à Administração Tributária (AT) a demonstração da verificação dos pressupostos do recurso à avaliação indirecta da matéria tributável, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação (cfr. artigo 74.º, n.º 3, da LGT) – vide, entre outros, o Acórdão do STA, de 17/03/2010, processo n.º 01211/09.
A recorrente parece aceitar o veredicto do tribunal “a quo” quanto à verificação dos pressupostos do recurso a métodos indirectos, embora não se conforme com o método de avaliação indirecta da matéria tributável utilizado, por o considerar arbitrário e ininteligível, por não se mostrar fundamentado.
Assim, a essa fase dita qualitativa sucede uma outra fase, a de quantificação, designada deste modo por se reportar à escolha de um método de quantificação da matéria colectável, bem como à demonstração dos resultados correspondentes.
Nesta sede de avaliação indirecta, o ónus da AT não se consome na necessidade do elencar, e provar, das razões que lhe subjazem, enquanto conduta vinculada que lhe está imposta. Na realidade, o ónus que impende sobre a AT, em tais casos, para além do da demonstração dos necessários e legais pressupostos do recurso à avaliação indirecta, exige, ainda e também, que, simultânea e complementarmente, fundamente adequada e criteriosamente as circunstâncias em que faça suportar a matéria tributável que, no uso daqueles, vier a quantificar.
Efectivamente, sendo embora, em tais casos, opção do legislador abdicar de um grau de certeza na tributação, por falta de colaboração do contribuinte, como única solução de evitar a evasão fiscal e de fazer repartir, na medida do possível, a carga fiscal entre todos que revistam, casuisticamente, a qualidade de sujeitos passivos, não deixa, a actuação da AT, neste domínio, no entanto, de ter como baliza o princípio de que a metodologia em causa há-de permitir alcançar, na medida do possível, a tributação daquele pelo seu lucro real/efectivo.
Apelando, à jurisprudência do TCA Sul, nomeadamente, do acórdão de 18/06/2002, proferido no âmbito do recurso n.º 6.388/02 -ainda que por reporte ao artigo 81.º do CPT, mas com aplicabilidade ao preceituado no artigo 84.º/3 da LGT - “(...) cabendo à AF o ónus de provar os pressupostos da tributação por métodos indiciários, é a ela que cumpre demonstrar que a liquidação não pode assentar nos elementos fornecidos pelo contribuinte e que o recurso àquele método se tornou a única forma de calcular o imposto, competindo-lhe, por isso, especificar os motivos da impossibilidade da comprovação e quantificação directa e exacta da matéria colectável e indicar os critérios utilizados na sua determinação, fazendo assentar o volume da matéria colectável presumida em dados objectivos, racionais e fundamentados, aptos a inferir os factos tributários [...].
Na verdade, tendo a determinação da matéria tributável por métodos indiciários de ser feita por aproximação à realidade que se procura apurar, é necessário que se demonstre que teve por suporte elementos de facto possíveis e prováveis, extraídos de parâmetros gerais e comuns, adequados à situação. E, por isso, a AF tem de utilizar elementos de facto conhecidos que, segundo as regras da experiência, pautadas por critérios de razoabilidade e de normalidade e tendo em linha de conta as especificidades próprias da actividade do contribuinte, conduzam à extrapolação dos factos conhecidos ou à aproximação da realidade que se procura alcançar.
A AF tem, assim, de indicar e justificar os critérios que utiliza na determinação da matéria tributável por métodos indiciários, por forma a que o contribuinte deles fique ciente e apto a discutir a valorimetria aplicada, isto é, para que possa provar que os critérios utilizados são desadequados e/ou inadmissíveis para a sua actividade, que houve erro ou manifesto excesso na matéria tributável quantificada. (…)” Permitindo, assim, extrapolar uma adequada ponderação da decisão.
Só, então, passará a caber ao contribuinte, e como acima referido, demonstrar a falta de aderência à realidade da matéria colectável que veio a ser fixada, e sendo caso disso, a medida em que tal sucedeu, sob pena de a dúvida sobre tal matéria se ter de revelar desfavorável à sua pretensão, já que, como é axiomático a sua existência não será, então, mais do que o resultado de uma conduta violadora do princípio da colaboração, que lhe está imposto, com transparência e verdade e que, nessa medida, a tornam infundada – cfr., no mesmo sentido, o acórdão do TCA Sul, de 15/07/2009, proferido no âmbito do processo n.º 02834/09, e o acórdão do TCA Norte, de 11/06/2013, no processo n.º 6122/12.
Reiterando esta ideia de fundamentação subjacente ao presente recurso, por facilidade, passamos a transcrever parcialmente o acórdão do TCA Sul, de 16/03/2010, proferido no âmbito do processo n.º 3543/09:
“(…) Isto porque, como acima se deixou dito, a actuação da AF não se pode ficar pela demonstração da ocorrência dos pressupostos legitimadores do recurso à metodologia indiciária, antes se lhe impõe, ainda e também, que, desde logo do ponto de vista substancial, fundamente os critérios de que venha a lançar mão naquela tarefa de quantificação se apresentem como os mais adequados ao alcançar da matéria tributável mais próxima da realidade, sem embargo de, o que se vem de dizer, não invalidar que, nesta matéria mas a jusante, ser sobre o contribuinte que recai um ónus de prova positivo de que a matéria tributável fixada pela AT não tem aderência à efectivamente verificada. (…)”
A avaliação indirecta propriamente dita integra a escolha de um dos métodos de quantificação enunciados no artigo 90.º, n.º 1, da LGT ou outro que, em concreto, se revele mais adequado a uma efectiva aproximação à verdadeira situação tributária do sujeito passivo. Entendemos, portanto, que os factores quantitativos propostos naquele normativo não têm carácter taxativo, pois ali se diz que a determinação da matéria tributável por métodos indirectos «poderá» ter em conta aqueles elementos, e não que «só poderá» ter em conta aqueles elementos. Por outro lado, a própria finalidade da tributação indirecta explica a não taxatividade dos critérios: se o objectivo é a maior aproximação possível à verdade fiscal daquele contribuinte e existe um método que se revele, em concreto, mais adequado a viabilizar essa aproximação, deverá ser esse o método a utilizar pela A.T., ainda que não conste do elenco do artigo 90.º da LGT.
O erro sobre a escolha do método de quantificação ou sobre a sua aplicação que conduza a um excesso de quantificação pode gerar, portanto, o vício de violação de lei, por erro na quantificação.
No entanto, e como tem sido entendido, de forma uniforme, pela jurisprudência dos nossos tribunais superiores, do ponto de vista do erro na quantificação, as insuficiências no método são sempre substanciais, isto é, devem evidenciar um excesso de quantificação. Dito de outro modo: não é pelo facto de no método de quantificação não se levar em conta este ou aquele item que fica demonstrado o erro na quantificação, a não ser que resulte daí ipso facto que os resultados apurados sejam excessivos.
Importa, por isso, que o sujeito passivo venha ao processo demonstrar a interferência sensível destes factores no resultado da quantificação.
Não bastará, assim, alegara arbitrariedade do método de quantificação adoptado ou que o mesmo é completamente desarticulado da realidade económica e contabilística da sociedade, ou seja, nem sequer chega a invocar uma qualquer divergência quantitativa ou a impropriedade do método de quantificação adoptado, importando que se demonstre que a AT podia ter ido mais longe e reduzido, por alguma forma, a margem de erro que estas formas de avaliação sempre comportam. Isto porque, sabendo-se as dificuldades objectivas que sempre são encontradas pela AT nesta quantificação, há necessidade, tão-só, de uma aproximação feita através de elementos possíveis e prováveis, ou seja, aceita-se um juízo de probabilidade em substituição do convencimento sobre a respectiva realidade.
No caso sub judice, como referimos, está em causa a fundamentação da decisão de tributação por métodos indirectos.
O artigo 268.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa dispõe que os actos administrativos carecem de fundamentação expressa e acessível quando afectem direitos ou interesses legalmente protegidos.
O artigo 77.º, n.º 1 da LGT determina que a fundamentação deve consistir, no mínimo, numa sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito que motivaram a decisão, ou numa declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas.
Por força do n.º 2 do mesmo artigo, a fundamentação dos actos tributários pode ser efectuada de forma sumária, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo.
O artigo 125.º, n.º 1 do CPA determina que a fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituirão, neste caso, parte integrante do respectivo acto, equivalendo à falta de fundamentação a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do acto.
Ora, é sabido que a consagração constitucional deste dever de fundamentação expressa, integrado nas chamadas garantias dos administrados, tem em vista assegurar a quem seja afectado nos seus direitos ou interesses, o direito de conhecer as razões que terão determinado a adopção da decisão administrativa que lhe diz respeito.
A jurisprudência e a doutrina têm consagrado o entendimento de que um acto se encontra suficientemente fundamentado quando dele é possível extrair qual o percurso cognoscitivo seguido pelo agente para a sua prática – cfr., entre muitos outros, o acórdão do STA, de 23/05/2012, proferido no âmbito do recurso n.º 0870/11.Ponto é, portanto, que a fundamentação responda, às necessidades de esclarecimento do contribuinte, informando-o do itinerário cognoscitivo e valorativo do acto de liquidação, permitindo-lhe conhecer as razões, de facto e de direito, que determinaram a sua prática.
Acresce transcrever o julgado no acórdão do STA, de 11/12/2007, no âmbito do recurso n.º 615/04, «(…) o grau de fundamentação há-de ser o adequado ao tipo concreto do acto e das circunstâncias em que o mesmo foi praticado, de molde a satisfazer a divergência existente entre a posição da Administração Fiscal e a do contribuinte».
E, o vício da falta de fundamentação dos actos administrativos, como vem sendo salientado pela doutrina e pela jurisprudência, é de natureza formal e não substancial, enfermando o acto de falta ou insuficiência de fundamentação quando não externa de modo claro, suficiente e congruente, as razões de facto e de direito que o determinaram e o seu sentido decisório.
Do que prescreve o artigo 77.º, n.º 1 da LGT decorre que a fundamentação do acto tributário pode basear-se em várias peças do processo administrativo; posto é que elas sejam expressamente identificadas.
No caso dos autos, fundamentam-se as liquidações de IRC no relatório de inspecção tributária e na decisão do pedido de revisão, referidos nos pontos 1, 4 e 6 do probatório, os quais, a nosso ver, preenchem as exigências legais de fundamentação, sendo perceptível para qualquer leitor do mesmo quais foram as razões das correcções efectuadas.
A sentença recorrida considerou justificado o recurso à avaliação indirecta (o que não vem questionado no presente recurso), remetendo para o relatório de inspecção tributária, referindo que as razões aí explanadas permitiram à ora recorrente apreender perfeitamente os motivos da não aceitação dos valores em causa para efeitos de custos (“facturação falsa”), bem como a aplicação da taxa de rentabilidade fiscal de 5%.
Por outro lado, mostra-se concretizado o modo de determinação da matéria colectável, identificando o critério utilizado, bem como as normas legais que o prevê, especificando e demonstrando a forma do respectivo cálculo (cfr. ponto V do relatório final de inspecção tributária).
Determina o n.º 4 do artigo 77.º da LGT, para o que aqui importa, que a decisão da tributação pelos métodos indirectos especificará os motivos da impossibilidade da comprovação e quantificação directas e exacta da matéria tributável e bem assim indicará os critérios utilizados na avaliação da matéria tributável, exigências estas satisfatoriamente cumpridas no relatório de inspecção, sendo claro e esclarecedor o motivo do recurso a tais métodos (cfr. os pontos III e IV do relatório inspectivo) e bem assim o critério eleito para a avaliação indirecta e a forma como se determinaram os valores corrigidos (cfr. o ponto V do referido relatório).
O critério eleito pela AT para proceder à avaliação indirecta da matéria tributável – descrito e concretizado no ponto V do relatório da inspecção e transcrito no ponto 4do probatório fixado – resulta da conjugação dos critérios insertos das alíneas a) e d) do artigo 90.º da LGT, e consistiu, quanto às vendas e prestações de serviços, isto é, ao nível dos proveitos, em considerar os declarados pelo contribuinte, aqueles que efectivamente obteve; quanto aos custos, por os valores declarados não merecerem credibilidade, uma vez que a rentabilidade fiscal declarada para o ano de 2001 foi negativa e a rentabilidade fiscal declarada para o exercício de 2002 foi de 1,24%, mencionando-se expressamente não se poderem aceitar esses valores como credíveis e aceitáveis para o sector de actividade em que se insere a aqui recorrente, escolheu-se uma taxa de RFV de 5%, apurando-se, desse modo, um lucro tributável que a AT entendeu razoável e aceitável para a actividade e de forma indirecta os custos inerentes à mesma, para os anos de 2001 e de 2002, nos termos em que se encontra previsto nas alíneas a) e d) do artigo 90.º da LGT.
Entendemos que o “método presuntivo eleito” se mostra racional e fundamentado em factos concretamente apurados, não estando a Administração Tributária impedida de a ele recorrer, pois que nada impede que a Administração conjugue vários dos “elementos” que a lei indica que “poderá ter em conta” na avaliação indirecta, pois que lhe cabe, dentro dos limites da lei, eleger o critério que repute mais adequado à determinação da matéria tributável, cabendo ao Tribunal verificar a sua correcta interpretação e aplicação em caso de litígio entre a Administração Tributária e o sujeito passivo (cfr. ANA PAULA DOURADO, «Manifestações de Fortuna», in Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal, Ano II, n.º 4 (Inverno), p. 278) – cfr. Acórdão do STA, de 05/12/2012, proferido no âmbito do processo n.º 0477/12.
Julgamos, pois, que o método adoptado pela AT para a determinação da matéria tributável por métodos indirectos não é arbitrário (o relatório inspectivo espelha cuidado com a situação concreta do contribuinte), nem se mostra, em abstracto, ostensivamente inadequado, não se tendo demonstrado, nem sendo alegado no recurso, que conduza a resultados excessivos. Aliás, mesmo na petição inicial, a impugnante limitou-se a uma alegação conclusiva, referindo que o critério escolhido é completamente desarticulado da realidade económica e contabilística da sociedade.
Embora a quantificação da taxa em 5% não apresente fundamentação substancial bastante, dado mostrar-se conclusiva a referência à ideia de razoabilidade e de pretensão de alcance de valor aceitável para o sector de actividade, constitui elemento nuclear o apuramento final do imposto. Toda a demonstração e cálculos se mostram efectuados nas páginas 17 e 17 verso do processo administrativo que integram o relatório inspectivo. Este circunstancialismo não impede o contribuinte de constatar eventual resultado excessivo. Antes pelo contrário, permite compreender por que motivo não foram aceites as rentabilidades fiscais declaradas e propicia infirmar a referência da RFV do sector de actividade ou contrapor a própria realidade contabilística da sociedade, uma vez que a aplicação da taxa de 5% deu origem ao resultado apurado.
Na medida em que a AT optou por este critério por o considerar claramente mais favorável ao contribuinte, uma vez que a mera desconsideração dos custos documentados por facturas falsas dava origem a um lucro tributável de IRC claramente excessivo(sempre por referência ao sector de actividade – a AT procurou ter em conta os dados relativos à actividade da contribuinte nos anos de 2001 e 2002 para determinação da taxa de RFV), cabia à recorrente alegar e provar que, mesmo assim, ocorre excesso na quantificação da matéria tributável; o que não foi efectuado.
Não ocorre, pois, vício de falta de fundamentação do acto.
Mesmo observando a decisão tomada na Comissão de Revisão (que confirmou e se apoiou no relatório inspectivo), enquanto acto final de fixação da matéria tributável, e que, nessa medida, se tem de mostrar formal e substancialmente fundamentado, se verifica a motivação do acto: “(…) conforme se encontra provado, foi a conduta efectiva do contribuinte que conduziu a Administração Tributária a convencer-se que a quantificação efectuada não foi excessiva e se ajusta à realidade detectada. E, em resumo e definitivamente, o que se encontra evidenciado é que o contribuinte nos actos a que deitou mão, referidos em D.4.18, na parte relativa ao “quantum”, não veio dar cumprimento ao determinado no Art.º 74.º, n.º 3 da LGT, transcrito em D.4.17. Daí que [a admitir-se, a título meramente académico, que o critério seguido pela Administração Fiscal tivesse sido prejudicial ao contribuinte], o excesso de quantificação da matéria tributável efectuada com recurso à aplicação de Métodos Indirectos, sempre se resolveria a favor da Administração Fiscal. (…) Afigura-se-nos, pois, que a metodologia perseguida pelo SIT para aportar aos valores assumidos e que estiveram em discussão foi aritmeticamente correcta, respeitou os parâmetros legais e se compagina com a realidade detectada neste contribuinte, face aos indicadores que o SIT conseguiu recolher em decorrência do labor do seu acto inspectivo. Uma vez que, de forma objectiva e concreta, o contribuinte não rebateu esses indicadores numérico-quantitativos, concordamos com a quantificação apurada pelo SIT, bem como com o recurso à aplicação de Métodos Indirectos. (…) Depois de amplo debate, em que cada uma das partes defendeu o seu ponto de vista, e de se ter concluído da impossibilidade de se chegar a acordo, o perito da administração tributária referiu ser seu entendimento que os valores propostos para fixação em sede de IRC se coadunam com a realidade do sector em que a empresa C... se encontra inserida, e tendo também em atenção que o perito nomeado pelo contribuinte não apresentou quaisquer factos concretos que pudessem comprovar o excesso de quantificação, conforme previsto no n.º 3 do art.º 74.º da Lei Geral Tributária, disse ser sua opinião que serão de manter os referidos valores inalterados, não se concedendo qualquer margem de razão à reclamante. (…)”
Reiteramos, pois, que mesmo que o critério eleito possa conduzir a um excesso na quantificação da matéria colectável apurada, o certo é que cabe ao contribuinte o ónus da prova do excesso da quantificação (cfr. a parte final do n.º 3 do artigo 74.º da LGT). A este respeito a decisão da matéria de facto, que não se mostra questionada no presente recurso, considerou não provado que a taxa de RFV de 5% se encontre desarticulada da realidade económica da sociedade, porquanto a prova produzida apresentada pela impugnante foi claramente insuficiente para abalar as conclusões explanadas no relatório dos serviços de inspecção tributária. Acrescentou, ainda, que as duas testemunhas inquiridas, no que se refere à questão da taxa de RFV de 5% nada disseram, ou seja, no que concerne a questões essenciais, não souberam prestar um depoimento objectivo e informador.
Ora, no que ao eventual excesso na quantificação da matéria tributável respeita, as alegações da recorrente são nulas e a invocação na petição inicial limita-se a ser genérica e inconclusiva (cfr. artigos 21.º e 23.º), não se alicerçando nem em factos nem em depoimentos inequívocos, pelo que nem terão contribuído para suscitar a dúvida sobre se haverá algum excesso, não sendo, de todo o modo, suficientes para criar a convicção de que o valor apurado para a matéria tributável é efectivamente excessivo.
De qualquer forma, nem sequer se afigura evidente para este Tribunal que o eventual excesso na quantificação resulte das regras da experiência comum ou seja manifesto, notório ou ostensivo em face dos factos alegados pela recorrente e constantes do probatório.
Na medida em que o presente recurso se resumiu, tão-só, à alegação de falta de fundamentação do critério utilizado na avaliação indirecta da matéria tributável e não tendo ficado demonstrado que tal impediu a recorrente de impugnar o acto ou que dificultou a sua defesa e prova do excesso na respectiva quantificação, forçoso é negar provimento ao recurso, mantendo-se a sentença recorrida.

Conclusões/Sumário

I - Em caso de determinação da matéria tributável por métodos indirectos, compete à administração tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação (artigo 74.º, n.º 3 da LGT).
II -No domínio de utilização de métodos indirectos, a actuação da Administração Tributária não se limita à demonstração da ocorrência dos respectivos pressupostos, antes se lhe impõe que fundamente, ainda e também, os critérios de que venha a lançar mão na quantificação da matéria tributável. Contudo, do ponto de vista do erro na quantificação, as insuficiências no método são sempre substanciais, isto é, devem evidenciar um excesso de quantificação.
III - O “método presuntivo eleito” mostra-se racional e fundamentado em factos concretamente apurados, não estando a Administração Tributária impedida de a ele recorrer, pois que nada impede que a Administração conjugue vários dos “elementos” que o n.º 1 do artigo 90.º da LGT indica que “poderá ter em conta” na avaliação indirecta, pois que lhe cabe, dentro dos limites da lei, eleger o critério que repute mais adequado à determinação da matéria tributável, cabendo ao Tribunal verificar a sua correcta interpretação e aplicação em caso de litígio entre a Administração Tributária e o sujeito passivo.
IV - O n.º 4 do artigo 77.º da LGT determina que a decisão da tributação pelos métodos indirectos especificará os motivos da impossibilidade da comprovação e quantificação directas e exacta da matéria tributável e bem assim indicará os critérios utilizados na avaliação da matéria tributável, exigências estas satisfatoriamente cumpridas no relatório de inspecção, sendo claro e esclarecedor o motivo do recurso a tais métodos e bem assim o critério eleito para a avaliação indirecta e a forma como se determinaram os valores corrigidos.
V - Estando definitivamente decidido que, no caso, a Administração Tributária demonstrou a ocorrência dos necessários pressupostos legais à utilização de métodos indirectos, por um lado e, por outro, apresentando-se adequadamente fundamentados os critérios de que a Administração Tributária se serviu na tarefa de quantificação, era à impugnante que se impunha demonstrar que a utilização de tais critérios conduziu, sem margem para dúvidas fundamentadas, a um resultado final sem qualquer aderência à realidade, demonstração essa que não logrou fazer, sem olvidar que, mesmo a subsistir qualquer dúvida, o que se postula por comodidade de raciocínio, ela sempre teria de desfavorecer a recorrente.

IV. Decisão

Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso.
Custas a cargo da recorrente, nos termos da tabela I-B – cfr. artigos 6.º, n.º 2, 7.º, n.º 2 e 12.º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais.
Porto, 07 de Julho de 2016
Ass. Ana Patrocínio
Ass. Ana Paula Santos
Ass. Fernanda Esteves