Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00220/07.7BEMDL
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:05/15/2014
Tribunal:TAF de Mirandela
Relator:Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos
Descritores:OPOSIÇÃO; ISBA; INTEMPESTIVIDADE; FALTA DE NOTIFICAÇÃO NO PRAZO DA CADUCIDADE
Sumário:1. Não é intempestiva a oposição deduzida dentro do prazo dos trinta dias a que alude o artigo 203.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, acrescidos da dilação a que alude o artigo 252.º-A do Código de Processo Civil, aplicável em processo tributário.
2. Não caducou o direito à liquidação efetuada e notificada dentro do prazo de execução do julgado a que alude o artigo 175.º, n.º 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (aplicável por força do artigo 146.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário) e no cumprimento do dever respetivo.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Fazenda Pública
Recorrido 1:A...
Decisão:Concedido provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. Relatório

1.1. A Fazenda Pública recorre da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela que julgou procedente a presente oposição à execução fiscal n.º 2461200401500848 que no Serviço de Finanças de Santa Marta de Penaguião corre termos para cobrança coerciva de dívida de imposto sobre as bebidas alcoólicas (ISBA) emergente de liquidação efetuada pela Alfândega de Braga com o n.º de registo 2004/9000705, de 2004-07-08, oposição esta que tinha sido interposta pelo ali executado A..., n.i.f. 1…, com domicílio indicado na Rua…, Porto.

Rematou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:

1. A Alfândega de Braga, através da Delegação Aduaneira de Peso da Régua, procedeu á liquidação nº 900012, de 25-3-1999, no valor de 11.616.030$00, relativa a ISBA de Dezembro de 1998, em nome de Caves…– Sociedade Produtora e Comercial de Vinhos, Lda., NIPC.5…, com sede em Quinta…– S. João de Lobrigos -5030 – Santa Marta de Penaguião.

2. A referida liquidação foi objecto de impugnação judicial no Tribunal Tributário de Vila Real, correndo posteriormente no TAF de Braga sob o nº 76/2000. Tendo a liquidação sido anulada por sentença de 22-03-2004, por violação do direito de audição.

3. Após, foi proferido novo acto, com os mesmos fundamentos, notificado à impugnante em 13-07-2004. Liquidação que foi impugnada no TAF de Braga sob o nº 1167/04.4BEBRG, julgada improcedente por sentença de 09-0-2007, por aplicação do disposto no artº 46º, nº 2, alínea a) da LGT, ou seja, que o prazo esteve suspenso pelo período da pendência da primeira impugnação judicial (Pº 76/2000).

4. Desta decisão, a impugnante interpôs Recurso para o STA, alegando que havia erro na aplicação do artº 46º, nº 2, alínea a) da LGT e que violava o artº 45º, nº1 da LGT, por não ter considerado a caducidade de 4 anos ali prevista.

5. Por Acórdão do STA de 10-10-2007, foi negado provimento ao Recurso, considerando que a regra sobre caducidade do direito à liquidação inserta no art. 45º da LGT, que fixa em 4 anos o respectivo prazo, não tem aplicação ao caso das dívidas aduaneiras, ressalvado como está, no seu n.º 1, outro prazo que a lei fixe, ou seja, o prazo estabelecido no artigo 99º da Reforma Aduaneira aprovada pelo Decreto-Lei n.º 46311, de 27 de Abril de 1965, com a redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 244/87, de 16 de Junho (8 anos).

6. A impugnante caves… apresentou Reclamação do referido Acórdão alegando a prática de nulidade (falta de contraditório), o que foi indeferido por Acórdão de 23-01-2008, pelo que foi definitivamente decidido que aquela liquidação é absolutamente legal por não se ter verificado a alegada caducidade.

7. A douta sentença proferida em 30-09-2008 pelo meritíssimo juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela está em contradição com a decisão do mesmo facto no Acórdão do venerado Supremo Tribunal Administrativo de 10-10-2007, pelo que deve ser anulada e substituída por outra que julgue a oposição improcedente por não se ter verificado a caducidade do direito á liquidação, violando o disposto do artº 99º da Reforma Aduaneira, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 46311, de 27-04-1965, com a redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 244/87, de 16 de Junho e artº, 46º. N.º 1, e 48.º, n.º 1, da LGT.

8. A Alfândega de Braga procedeu a nova liquidação nº 2004/9000705, de 2004-07-08, de ISBA de 1998 no montante de € 57.941,76, em nome da executada originária Caves…, que originou a instauração em 2004-10-11, do Processo de Execução Fiscal nº 2461200401500848 do Serviço de Finanças de santa Marta de Penaguião.

9. Em 2004-10-15, procedeu-se à citação da executada originária através de carta registada com AR.

10. Em 2005-01-11, foi efectuada a Escritura de Dissolução da Sociedade no Cartório Notarial de Resende, na qual foi declarado “Que, pela presente escritura, dissolve a referida sociedade, cujas contas foram encerradas e aprovadas nesta data, na qual não há bens a partilhar, tendo o activo sido absorvido pelo passivo.”.

11. Por falta de bens da executada originária foi efectuada a reversão da execução contra o sócio gerente A..., nos termos do nº 5 do artº 23º da LGT e artº 160º do CPPT.

12. Em 2007-05-02, data da assinatura do AR, foi o oponente citado como revertido para a execução fiscal nº 2461200401500848.

13. Em 2007-06-04, às 22 horas e 32 minutos, foi recebida via fax o Serviço de Finanças de santa Marta de Penaguião a petição inicial que foi registada sob a entrada nº 3214, de 5 do mesmo mês.

14. Em 2007-06-06, foi expedido em Vila Nova de Gaia sob o registo R0770941296PT a petição inicial de oposição, recebida no Serviço de Finanças de Santa Marta de Penaguião em 2007-06-08 e registada sob a entrada nº 3234.

15. O prazo de 30 dias para a entrega da petição inicial da oposição terminou em 01-06-2007, consequentemente a oposição é intempestiva.

16. A douta sentença proferida em 30-09-2008 pelo meritíssimo juiz do TAF de Mirandela considerou erradamente provada a tempestividade da oposição, violando o disposto no artº 203º do CPPT.

Termos em que deverá a douta sentença recorrida ser anulada e substituída por outra que reafirme a legitimidade do oponente na execução fiscal que contra si reverteu.


1.2. O Recorrido não apresentou contra-alegações.

A Exmª Senhora Procuradora-Geral Adjunta teve vista dos autos e pronunciou-se no sentido de ser negado provimento ao recurso, mantendo-se na ordem jurídica a sentença recorrida.

Colhidos os vistos legais e nada mais obstando, cumpre decidir.

2. Do Objeto do Recurso

São as seguintes as questões a decidir:

1.ª Saber se a sentença recorrida deve ser revogada ou anulada (a Recorrente defende a revogação nas alegações e a anulação nas conclusões) por se encontrar em contradição com a decisão do mesmo facto no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 2007-10-10 [conclusão “7”];

2.ª Saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de direito por ter concluído que o prazo de caducidade da liquidação era o de 4 anos do artigo 45.º n.º 1, da Lei Geral Tributária [conclusões “1” a “7”];

3.ª Saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento na aplicação do direito aos factos por ter julgado tempestiva ao oposição [conclusões “8” a “16”].

3. Do Julgamento de Facto

3.1. Para conhecer da caducidade do direito de deduzir oposição, o tribunal recorrido jugou provados os seguintes factos:

1. O Oponente foi citado, por reversão, da dívida exequenda em 2/5/2007 – Fls. 53 e 54;

2. Apresentou oposição em 4/6/2007 – FAX de fls. 4 e ss;

3. O Oponente reside na Rua Santos Pousada, 722, 1.º Centro Frente, Porto.

3.2. Para conhecer da falta de notificação da liquidação dentro do prazo de caducidade respetivo, o tribunal recorrido considerou provados os seguintes factos (que agora optamos por renumerar em sequência com os anteriores):

4. Em data que não se pôde apurar, mas após 8/7/2004, a sociedade “Caves… Soc Produtora e Comercial de Vinhos, Lda”, com sede na Quinta…, S João de Lobrigos, 5030 Lobrigos (aqui inicial executada) foi notificada da liquidação do Imposto sobre o Álcool e as Bebidas Alcoólicas, do ano de 1998, com o valor de 57.941,76 e acrescido – Cfr. fls. 27 e 19;

5. Aquela sociedade foi citada em 15/10/2004 – Fls. 28;

6. Em 25/9/2006 o Oponente foi notificado para exercer o direito de audição na qualidade de responsável subsidiário – fls. 39, 40 e 41 que dou aqui por reproduzida;

7. O Oponente foi citado, como responsável subsidiário da identificada sociedade, em 2/5/2007, conforme despacho de fls. 53 que o dou por reproduzido (Cfr. também, fls. 54);

8. Dou aqui por integralmente reproduzido o despacho do Sr. Chefe do Serviço de Finanças de Santa Marta de Penaguião de fls. 48, assim como os documentos nele referidos para os quais a citação (facto provado n.º 4) remete;

Dou estes factos como provados considerando os documentos juntos aos autos, principalmente os que se indicaram.

3.3. Por relevarem para a decisão a proferir, se encontrarem documentalmente provados poderem ser tomados em consideração nos termos do artigo 659.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, aplicável por força do artigo 713.º, n.º 2, do mesmo Código, aditam-se aos factos provados ainda os seguintes:

9. A liquidação a que a alude o ponto 6 supra teve origem no processo de cobrança a posteriori n.º SA/CF/CP-39/04 onde, em 2004.07.07, foi lavrada a seguinte informação:

«Relativamente ao assunto referenciado,

Informo

1. Por despacho de 25/03/99 da Chefe da Delegação Aduaneira de peso da Régua foi liquidada uma dívida (RL n.º 99/900012 de 25/053/99) no montante de € 57.940,51, ao depositário autorizado “Caves… -Sociedade Produtora e Comercial, Lda”, NIEC 1…, na sequência de por Despacho de 12/03/99, ter sido determinado o não apuramento do regime de suspensão relativamente ás operações de circulação realizadas com o depositário autorizado J…, titular do entreposto fiscal de armazenagem n.º 39949913, sustentadas por diversos DAA’s, em que foram movimentados um total de 122.274 litros de Vinho do Porto.

2. (…).

3. (…).

4. (…).

5. Por sentença datada de 22//03/04 do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, a impugnação do acto de liquidação apresentada pela empresa foi julgada procedente “por violação do direito de audição prévia, antes da liquidação e consequentemente anula-se o acto impugnado”.

6. Em cumprimento da sentença e por despacho de 18/05/04 do Chefe da Delegação Aduaneira de Peso da Régua, foi determinada a anulação do acto de liquidação em apreço.

7. Considerando o prazo de caducidade estabelecido no n.º 1 do art. 45º da LGT – Lei Geral Tributária, aprovada pelo DL 398/98, de 17/12, que se aplica aos factos tributários ocorridos a partir de 01 de Janeiro de 1998 (n.º 5 d de art. 5º do DL 398/98 de 17/12), bem como o disposto na alínea a) do n.º 2 do art. 46º da LGT, que estabelece que o prazo de caducidade se suspende “em caso de litígio judicial de cuja resolução dependa a liquidação do tributo, desde o seu início até ao trânsito em julgado da decisão”, foi o depositário autorizado devidamente notificado para exercer o seu direito de audição prévia, referente ao projecto de conclusões elaborado em 25/03/99 e referente ao não apuramento dos DAA’s em apreço, não tendo os argumentos apresentados sido considerados pertinentes para relevar o pagamento de IEC devido pelos 122.274 litros de vinho do Porto.

8. O imposto torna-se “exigível em território nacional no momento da introdução em consumo ou da constatação de perdas que devam ser tributadas…” conforme estatui o n.º 1 do art. 5º do DL 52/93 (actual n.º 1 do art. 7º do CIEC) conjugado com o n.º 3 do art. 1º do DL 104/93 de 05/04, pelo que há que proceder á sua liquidação, sendo a taxa a aplicar, “… a que estiver em vigor á data da exigibilidade”, em conformidade com o disposto no n.º 3 do art. 5.º do DL 52/93 8actual n.º 4 o art. 7º do CIEC).

9. O valor da dívida, em sede de IABA, ascende a € 57.940,51, discriminado da seguinte forma: (…)

Proponho

Que o valor em dívida, no montante de € 57.940,51, seja cobrado “a posteriori”, nos termos do art. 220º do Reg. (CEE) 2913/92 do Conselho de 12 de Outubro, em conjugação com o art. 488.º do Regulamento das Alfândegas, com a recacção dada pelo Dec. Regulamentar 1/88 de 15 de Janeiro, devendo, posteriormente, o processo correr os seus trâmites normais.

À consideração superior»

[Cópia certificada a fls. 20 a 23 dos autos]

10. Sobre a informação a que alude o número anterior foi lavrado o seguinte despacho: «Visto. Concordo. Proceda-se à liquidação da dívida, notificando-se o devedor. 2004-07-08 (assinatura)»

[Cópia certificada a fls. 20 dos autos, canto superior direito]

11. A liquidação foi efetuada com o n.º de registo 2004/9000705, de 2004/07/08 da Alfândega de Braga.

[Cópia certificada a fls. 24 dos autos]

12. Em 2004-10-21 a sociedade executada “Caves … -Sociedade Produtora e Comercial, Lda” deduziu impugnação do ato de liquidação a que alude o número anterior, nos termos e com os fundamentos constantes do documento de fls. 30 a fls. 32v. dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos e de onde, além do mais, consta o seguinte:


«21º

O que significa que o direito a praticá-la só foi validamente exercido e comunicado quando se achava já precludido pelo decurso do prazo de caducidade estabelecido no nº 1 do art. 45º da LGT, sem que tivesse, como já se viu, ocorrido causa de suspensão prevista na al. a) do nº 2 do art. 46º do mesmo diploma legal.

22º

O acto impugnado incorreu portanto em violação dessas disposições,

23º

O que constitui fundamento para a sua anulação.

Termos em que deve a liquidação impugnada ser anulada, com todas as consequências legais. (…)»

[Sobre a data em que a impugnação foi deduzida, cfr. fls. 29 dos autos]

13. Por douto acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 2007-10-10, lavrado de fls. 113 a fls. 116v. do processo de impugnação judicial a que alude o n.º anterior e que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos, já transitado em julgado, foi decidido negar provimento ao recurso da decisão que julgou improcedente essa impugnação por não ter ocorrido a caducidade ali invocada.

[Cfr. processo de impugnação judicial n.º 1167/04.4BEBRG em apenso]

4. Do Julgamento de Direito

4.1. Vem o presente recurso interposto pela Fazenda Pública da sentença que julgou procedente a oposição à execução fiscal que corre termos no Serviço de Finanças de Santa Marta de Penaguião para cobrança coerciva de dívida de imposto sobre bebidas alcoólicas do mês de Dezembro de 1998.

A Fazenda Pública não se conforma com a decisão recorrida porque, em seu entendimento, a oposição era intempestiva e, de qualquer modo, o direito à liquidação ainda não tinha caducado. Sendo que, nesta parte, tal decisão está em contradição com o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo proferido na impugnação dessa liquidação, deduzida pela devedora principal.

Tem precedência lógica o conhecimento da questão da intempestividade da oposição, visto que o tribunal só poderá apreciar as demais questões no pressuposto de que a oposição era tempestiva. Razão porque, ao abrigo do disposto no artigo 660.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, aplicável às decisões dos tribunais superiores ex vi do artigo 713.º, n.º 2, do mesmo Código (a aplicar, por sua vez, a coberto do artigo 281.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário), se decide conhecer desta questão em primeiro lugar.

Sobre esta matéria, consignou-se na douta sentença recorrida o seguinte: «O processo de execução fiscal tem natureza judicial, pelo que os prazos se contam nos termos do CPC – art.ºs 103 da LGT e 20 do CPPT. Como tal, o prazo de defesa do citando, aqui Oponente, acresce uma dilação de cinco dias porque foi Citado fora da área da Comarca sede do tribunal onde pende a acção, neste caso o TAF de Mirandela/DDF de Vila Real/SF de Santa Marta de Penaguião – art.ºs 252.º-A, n.º 1, al. a) do CPC e 151.º, n.º 1 do CPPT.».

Ora a Fazenda Pública contrapõe a este respeito que a dilação de cinco dias «não consta das normas do CPPT que regulam a oposição à execução fiscal, que o legislador pretendeu como um processo judicial com características próprias e de tramitação simples e célere e não sujeito a dilações».

Mas não tem razão. Porque, nos termos do disposto no artigo 192.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário, as citações pessoais são efetuadas nos termos do Código de Processo Civil.

Ou seja, o legislador entendeu que as razões de simplificação e de celeridade se nortearam as opções legislativas na regulação adjetiva do processo de execução fiscal não seriam obstáculo à aplicação do regime das citações vigente no ordenamento jurídico-processual civil, com as especificidades que resultam do especialmente regulado no Código de Procedimento e de Processo Tributário.

De salientar que a dilação tem como objetivo «conceder ao citado um período de tempo que, sem prejuízo do prazo para a contestação, lhe permita deslocar-se do lugar em que se encontra para o lugar em que a ação foi intentada» (ALBERTO DOS REIS, in «Comentário ao Código do Processo Civil», Vol. 2.º, pág. 683). Quer dizer, terá entendido o legislador que os direitos de defesa do citando ficariam diminuídos se, residindo fora da área da comarca, não lhe fosse dado um prazo para se inteirar localmente das razões do litígio e aí decidir se e em que termos vai deduzir a sua defesa. Por isso é que o prazo de dilação varia de acordo com a distância a percorrer.

Ora, não se entreveem razões de celeridade e de simplificação que justifiquem a contração dos direitos de defesa do executado na execução fiscal, sendo que os ganhos de celeridade seriam reduzidos e desproporcionados, e a atribuição de uma dilação na citação nada acrescenta em matéria de atos processuais a praticar ou da sua complexidade processual.

No sentido de que a dilação do artigo 252.º-A do Código de Processo Civil é aplicável em processo tributário podem ver-se, entre muitos outros, os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 2012-02-08 e de 2012-03-28 (Recursos n.ºs 01016/11, 0261/12, respetivamente, ambos disponíveis in www.dgsi.pt). Neste Tribunal Central Administrativo Norte, vd., por exemplo, o acórdão de 2013-03-21 (processo n.º 00459/12.3BEPNF). No Tribunal Central Administrativo Sul, vd. por exemplo, o acórdão de 2005-11-29 (processo n.º 00686/05). Na doutrina, JORGE LOPES DE SOUSA, «Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado», II volume, Áreas Editora 2007, pág. 277).

Assim, não estando em causa que o Recorrente foi, efetivamente, citado fora da área da comarca em que se situa o Serviço de Finanças de Santa Marta de Penaguião e não estando também em causa que, a considerar-se o período de dilação a que alude a alínea b) do n.º 1 do artigo 252.º-A do Código de Processo Civil, a oposição foi deduzida dentro dos trinta dias a que alude o artigo 203.º, n.º 1, alínea a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário, o recurso não pode merecer provimento por aqui.

4.2. Entre os fundamentos do recurso encontra-se também o facto de a decisão recorrida se encontrar em contradição com o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 2007-10-10, proferido no processo 0574/07 (a que corresponde o processo n.º 1167/04.4BEBRG).

A prolação do acórdão do Supremo Tribunal Administrativo nunca foi veiculada nos autos, a não ser em via de recurso. E nunca foi junta qualquer certidão do mesmo, que comprovasse o teor do mesmo transcrito nas doutas alegações de recurso.

A verdade, porém, é que à data em que foi proferida a sentença recorrida já o referido aresto tinha sido publicado no Apêndice do Diário da República de 2008.05.15 (pág. 1514). Estamos, por isso, perante um facto que goza de notoriedade oficial e pode, portanto, ser considerado independentemente da sua alegação, a coberto do artigo 514.º, n.º 2, do Código de Processo Civil. Por outro lado, o artigo 663.º do mesmo Código, manda atender aos factos supervenientes que interfiram com o direito arrogado nos autos. E o que não há dúvida é que o acórdão incidiu sobre a sentença proferida na impugnação a que alude o ponto 12 dos factos provados aditado no ponto 3.3. supra, como decorre do facto de estar em causa a mesma liquidação (que teve por base os documentos administrativos de acompanhamento IVP n.º 31323, de 98-12-14, IVP n.º 31324, de 98-12-14, IVP n.º 31374, de 98-12-14, IVP n.º 31375, de 98-12-14, IVP n.º 31376, de 98-12-19, IVP n.º 31377, de 98-12-28, IVP n.º 31378, de 98-12-25, IVP n.º 31379, de 98-12-30).

Tudo isso foi confirmado pela análise do processo respetivo, cuja apensação foi, entretanto, ordenada pelo relator.

Por outro lado, é inequívoca a contradição do sentido dos julgados: o julgado em última instância na impugnação judicial da liquidação que deu origem à emissão da certidão de dívida nestes autos foi no sentido de que o direito à liquidação respetivo não tinha caducado; o julgado em primeira instância nestes autos foi no sentido de que «o direito da FP a liquidar o tributo em causa caducou».

Existem, assim, decisões opostas sobre a mesma questão concreta. Mas que não são suscetíveis de violação do caso julgado.

Desde logo porque não há identidade de sujeitos nas duas ações: a impugnação judicial onde foi proferido o acórdão do Supremo foi interposta pela devedora principal na execução e a oposição que deu origem ao presente recurso foi interposta pelo devedor subsidiário na mesma execução. Ou seja, o aqui Recorrido é terceiro juridicamente interessado na invalidade da liquidação, pelo que a decisão desfavorável em ação deduzida pelo devedor principal não faz caso julgado em relação a ele. O que se compreende porque não teve oportunidade de defender os seus interesses no processo respetivo e a extensão do caso julgado em relação a ele, em tais circunstâncias, violaria o princípio da proibição da indefesa.

De outro lado, ainda, porque também não há identidade de objeto nas duas ações: na impugnação judicial o pedido é o de anulação da liquidação e na oposição que deu origem ao presente recurso o pedido é de extinção da execução onde é cobrada a dívida respetiva; na impugnação judicial o fundamento da anulação é a liquidação ter sido efetuada depois de ter decorrido o prazo de caducidade; na oposição o fundamento do pedido de extinção é o facto de a liquidação ter sido notificada depois de decorrido o prazo de caducidade.

No entanto, se a contradição de julgados não configura in casu uma violação do caso jugado, tal não significa que não fique demonstrada a ilegalidade da decisão recorrida. E deve entender-se que, estando invocada em via de recurso a contradição com o entendimento firmado no acórdão do Supremo, a Recorrente se pretendeu apropriar do respetivo entendimento jurisprudencial para evidenciar o erro de julgamento.

Ora, a este respeito consignou-se naquele recurso o seguinte:

«a pretensão da recorrente, de ver declarada a caducidade do direito à (segunda) liquidação, não pode proceder.

Essa pretensão assenta em que o prazo de que a Administração Aduaneira dispunha para proceder à liquidação é o de 4 anos prescrito no artigo 45º nº 1 da LGT.
De acordo com a factualidade apurada, os factos tributários datam de Dezembro de 1998, e o acto de liquidação foi notificado à recorrente em 13 de Julho de 2004, ou seja, quando estavam decorridos, aproximadamente, 5 anos e 6 meses.

O tributo em causa, imposto sobre o álcool e as bebidas alcoólicas, é uma imposição fiscal interna, cobrada pelas autoridades aduaneiras.

A regra sobre a caducidade do direito à liquidação inserta no artigo 45º da LGT, que fixa em 4 anos o respectivo prazo, não tem aplicação ao caso das dívidas aduaneiras, ressalvado como está, no seu nº 1, outro prazo que a lei fixe. Esta afirmação insere-se em orientação firme deste Tribunal, conforme, mais recentemente, se pode ver nos acórdãos proferidos nos processos nºs. 315/06 e 90/07, em 20 de Setembro de 2006 e 9 de Maio de 2007, além dos aí citados.

E esse outro prazo está estabelecido no artigo 99º da Reforma Aduaneira aprovada pelo decreto-lei nº 46311, de 27 de Abril de 1965, com a redacção dada pelo decreto-lei nº 244/87, de 16 de Junho.

Ali se dispõe que «sempre que as autoridades aduaneiras verificarem que (…) se encontra em dívida a totalidade das imposições fiscais internas, o prazo para a acção de cobrança é o previsto no artigo 27º do Código de Processo das Contribuições e Impostos (…)».

Ou seja, a Reforma Aduaneira optou por fixar o prazo de caducidade do direito à liquidação por referência ao de prescrição das dívidas tributárias previsto no diploma adjectivo.
Prazo que, no Código de Processo das Contribuições e Impostos, era de 20 anos.
Mas este diploma deixou de vigorar em 30 de Junho de 1991, quando iniciou vigência o Código de Processo Tributário (CPT), que se manteve até 31 de Dezembro de 1999 e, portanto, regia ao tempo dos factos tributários aqui em causa.

Nos termos do artigo 34º do CPT, o prazo de prescrição é de 10 anos. Tal prazo, se aplicável, estava longe de se ter esgotado à data da notificação da liquidação, 13 de Julho de 2004, considerando que estamos perante factos tributários de 1998.
Porém, entretanto, em 1 de Janeiro de 1999, entrara em vigor a LGT, que reduziu o dito prazo para 8 anos. De acordo com o nº 1 do artigo 297º do Código Civil, só não será este o prazo aplicável se, em 1 de Janeiro de 1999, faltar menos tempo para se completar o antigo.

Em 1 de Janeiro de 1999 faltavam, para se completar o prazo antigo, de 10 anos, aproximadamente, 9 anos – mais do que os 8 do prazo novo.

Aplica-se, consequentemente, este último, a contar de 1 de Janeiro de 1999, sendo certo se não esgotara ainda aquando da notificação do acto de liquidação, em 13 de Julho de 2004.

Deste modo, não caducou o direito à liquidação (…)».

Na verdade, e como referia o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 1997/06/25 (Recurso n.º 19.474, disponível em redação integral in http://www.dre.pt/pdfgratisac/1997/32220.pdf pág. 1922), «sempre se entendeu que as receitas tributárias aduaneiras se caracterizam por um critério orgânico, e não por um critério material: são aduaneiras as receitas liquidadas e cobradas pelas alfândegas e não as receitas materialmente aduaneiras». Cremos que este entendimento também levava em conta que o regime dos impostos especiais sobre o consumo recorre amiúde a figuras jurídicas e a institutos do direito aduaneiro, adotando uma técnica tributária que está muito mais próxima do direito aduaneiro comunitário do que do direito tributário interno. E que não existia, ao tempo, norma equivalente à do artigo 9.º, n.º 4, do Código dos Impostos Especiais sobre o Consumo.

Ora, nos termos do artigo 221.º, n.º 4, do Código Aduaneiro Comunitário, sempre que a dívida aduaneira resulte de um ato que era, no momento em que foi cometido, passível de procedimento judicial repressivo, a comunicação ao devedor deve ser efetuada, nas condições previstas nas disposições em vigor, após o termo do prazo de três anos previsto no n.º 3.

E como não há disposição comunitária que regule, de forma unitária as condições em que a comunicação ao devedor deve ser efetuada, as disposições em vigor teriam que ser as do direito interno – artigo 4.º, n.º 23, do Código Aduaneiro Comunitário.

No caso, as do artigo 99.º da Reforma Aduaneira, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 46311, de 27 de abril de 1965 (na redação introduzida pelo Decreto-Lei n.º 244/87, de 16 de Junho) e segundo o qual «sempre que as autoridades aduaneiras verificarem que não foi possível determinar o montante das imposições a cobrar em consequência de um ato fraudulento, bem como quando verificarem que se encontra em dívida a totalidade das imposições fiscais internas, o prazo para a acção de cobrança é o previsto no artigo 27.º do Código de Processo das Contribuições e Impostos, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 45005, de 27 de Abril de 1963».

Este artigo foi alterado, já depois da ocorrência do facto gerador do imposto em causa, pelo artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 472/99, de 8 de Novembro, passando a dispor que «quando não tiver sido determinado o montante de impostos a cobrar na sequência da prática de acto fraudulento, o direito de liquidar os impostos caduca no prazo de oito anos, contados da data em que ocorreu o facto tributário».

Seria este, então o prazo de caducidade a aplicar, contado da entrada em vigor da nova lei, atento o disposto no artigo 297.º do Código Civil.

Resta saber se, no caso, a dívida resultou de um ato passível de procedimento judicial repressivo. Sendo que, nesta matéria, se tem entendido que um ato é suscetível de procedimento judicial repressivo quando for um ato de natureza penal (e não um ato de natureza contraordenacional, porque que a decisão de aplicação de coima é uma decisão orgânico-materialmente administrativa – neste sentido NUNO ALEIXO, PEDRO ROCHA e RICARDO DE DEUS, in «Código Aduaneiro Comunitário Anotado e Comentado», 2007, pág. 935 e jurisprudência ali citada.

Mas é tarefa que, no caso, não se justifica. Porque a liquidação impugnada não resultou de um procedimento autónomo de liquidação a posteriori: resultou da anulação de liquidação anterior, efetuada em 1999 e decretada na impugnação judicial n.º 76/2000. É o que resulta direta e inequivocamente dos seus fundamentos (ponto 9 dos factos provados, aditado supra).

Ou seja, a liquidação a posteriori que deu origem à dívida exequenda resultou, não do poder/dever de liquidar tributos, mas do poder/dever de executar decisões anulatórias a que aludem os artigos 100.º da Lei Geral Tributária e 173.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

Ora, quando a administração tributária exerce o poder/dever de executar decisões anulatórias «não está condicionada pelas limitações temporais que a lei estabelece para exercício» do poder/dever de liquidar tributos, «mas sim pelos limites temporais próprios da execução de julgados. Isto significa que, na sequência de anulação contenciosa de um acto de liquidação, por vício de forma, a administração poderá e deverá praticar um novo acto de liquidação expurgado do vício que foi fundamento da anulação, dentro do prazo de execução espontânea, independentemente do decurso ou não do prazo de caducidade que valia para o exercício do primitivo poder autónomo de praticar o acto de liquidação» (JORGE LOPES DE SOUSA, «Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado», II volume, Áreas Editora 2011, pág. 523).

E é seguro que o novo ato foi praticado e notificado à devedora principal dentro do prazo de execução espontânea, que era de três meses (visto que a execução do julgado não consistia no pagamento de uma quantia pecuniária ao sujeito passivo mas na realização da formalidade preterida do procedimento de liquidação anulado), contados nos termos do artigo 72.º do Código do Procedimento Administrativo (visto que a execução de julgados é integralmente regulada pelo disposto nas normas sobre o processo nos tribunais administrativos – artigo 146.º, n.º 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos), ou seja, com suspensão aos sábados, domingos e feriados (neste sentido, JORGE LOPES DE SOUSA, ob. cit., pág. 531).

Com efeito, resulta dos factos dados como provados que a sentença que anulou a liquidação anterior data de 2004/03/22 e a nova liquidação foi efetuada em 2004/07/08 (sendo, por isso, manifesto que o prazo de três meses, contado nos termos do artigo 72.º do Código do Procedimento Administrativo, ainda não tinha decorrido aquando dessa liquidação, mesmo admitindo que a sentença anulatória tivesse transitado nos dezz dias imediatamente posteriores ao da sua prolação. E, embora a Mm.ª Juiz nada tenha dado como provado quanto à data em que essa liquidação foi notificada, é a própria devedora que, na impugnação judicial n.º 1167/04.4BEBRG em apenso declara que dela foi notificada em 2004/07/13. Também, por isso, dentro do referido prazo dos três meses.

Razão porque – ao contrário do que concluiu o Mm.º Juiz a quo na decisão recorrida – o prazo de caducidade não tinha decorrido. Nem à data da liquidação, nem à data em que a mesma foi notificada à devedora principal.

E, assim sendo, o recurso merece provimento por aqui e essa decisão deve ser revogada.

4.3. Nos termos do artigo 715.º, n.º 2, do Código de Processo Civil em vigor à data da interposição do presente recurso, se o tribunal recorrido tiver deixado de conhecer de certas questões, designadamente por as considerar prejudicadas pela solução dada ao litígio, a Relação, se entender que a apelação procede e nada obsta à apreciação daquelas, delas conhecerá no mesmo acórdão em que revogar a decisão recorrida, sempre que disponha dos elementos necessários.

Na petição inicial, o Opoente reagia contra a pretensão executiva com dois fundamentos: a ilegitimidade por não figurar no título e não ser responsável pelo pagamento da dívida e a falta de notificação do tributo no prazo de caducidade.

Na decisão recorrida, o Mm.º Juiz a quo julgou a oposição procedente com base no último fundamento e absteve-se, por isso, de conhecer do primeiro. Manifestamente por entender que o seu conhecimento tinha ficado prejudicado.

Revogada a decisão recorrida, importaria então conhecer do fundamento que ainda não foi apreciado.

Mas isso não é possível, porque os autos ainda não estão prontos para dele conhecer. É que, para sustentar a sua ilegitimidade como executado, o Oponente tinha invocado determinados factos que o Mm,º Juiz a quo nunca chegou a apreciar, dando-os como provados ou como não provados.

Sendo que, como resulta do artigo 712.º do Código de Processo Civil, os poderes do tribunal de recurso – no que ao julgamento de facto respeita – se reconduzem à modificação da decisão de facto proferida com base nos depoimentos prestados, de reapreciar o decidido em primeira instância, e não o de decidir ex novo sobre a factualidade correspondente.

Razão porque entendemos não estarem reunidos os pressupostos do julgamento em substituição do tribunal recorrido.

5. Conclusões

5.1. Não é intempestiva a oposição deduzida dentro do prazo dos trinta dias a que alude o artigo 203.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, acrescidos da dilação a que alude o artigo 252.º-A do Código de Processo Civil, aplicável em processo tributário.

5.2. Não caducou o direito à liquidação efetuada e notificada dentro do prazo de execução do julgado a que alude o artigo 175.º, n.º 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (aplicável por força do artigo 146.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário) e no cumprimento do dever respetivo.

6. Decisão

Por todo o exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em conceder provimento ao recurso e, em consequência, revogar a decisão recorrida e ordenar a devolução dos autos à primeira instância para a prolação de nova decisão, que conheça dos demais fundamentos da oposição, se nada a tal obstar.

Custas em primeira instância a fixar a final, na decisão que vier a ser proferida.

Custas do presente recurso pelo Recorrido.

Porto, 15 de Maio de 2014

Ass. Nuno Bastos

Ass. Fernanda Esteves

Ass. Pedro Vergueiro