Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01097/09.3BEVIS
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:11/05/2009
Relator:Francisco Rothes
Descritores:RECLAMAÇÃO DE DECISÃO DO ÓRGÃO DE EXECUÇÃO FISCAL –CADUCIDADE DO DIREITO DE RECLAMAR - NOVA NOTIFICAÇÃO
Sumário:I - O prazo para o executado reclamar ao abrigo do art. 276.º do CPPT das decisões do órgão da execução fiscal é de 10 dias a contar da data em que foi notificado da decisão que lhe seja desfavorável (art. 277,º, n.º 1, do CPPT).
II - Ainda que, na sequência de ulterior exposição do executado, o órgão da execução fiscal lhe remeta de novo cópia da decisão, tal facto não abre novo prazo para desta reclamar judicialmente.
III - Apresentada a petição de reclamação judicial para além do termo do prazo dito em I, impõe-se a respectiva rejeição liminar, sendo que a caducidade do direito de reclamar obsta à apreciação de qualquer questão de mérito, ainda que do conhecimento oficioso, designadamente a prescrição das dívidas exequendas.
IV - Tal não obsta a que a questão da prescrição seja novamente suscitada ao órgão da execução fiscal, com possibilidade de reclamação judicial ao abrigo do art. 275.º do CPPT de eventual decisão de indeferimento.
V - Na reclamação do art. 276.º do CPPT que haja de ser conhecida de imediato, nos termos do art. 278.º do mesmo código, o recurso jurisdicional interposto pelo reclamante tem sempre efeito suspensivo.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:1. RELATÓRIO
1.1 ANTÓNIO TOMÉ (adiante Executado, Reclamante ou Recorrente) reclamou judicialmente, nos termos do disposto nos arts. 276.º e segs. do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), da decisão do Chefe do Serviço de Finanças de Armamar, proferida no âmbito de uma execução fiscal, que lhe indeferiu o pedido de que fossem declaradas prescritas as dívidas exequendas.
Sustentando a ilegalidade dessa decisão, pediu ao Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu a anulação da mesma.

1.2 O Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu indeferiu liminarmente a reclamação com fundamento na caducidade do direito de reclamar.
Isto, em síntese, porque considerou que o despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Armamar foi comunicado ao Executado em 2 de Junho de 2009 e a petição inicial por que foi apresentada a reclamação foi apresentada em 30 de Julho de 2009, bem para além do termo do prazo de 10 dias fixado pelo art. 276.º do CPPT, mesmo que acrescido dos três dias úteis seguintes, nos termos do art. 145.º, n.º 5, do Código de Processo Civil (CPC) (() Embora na decisão recorrida se não indique o preceito legal, é manifesto que é ao art. 145.º do CPC que se alude.).

1.3 Inconformado com essa decisão, o Reclamante dela interpôs recurso para este Tribunal Central Administrativo Norte. Com o requerimento de interposição do recurso apresentou as respectivas alegações, que resumiu em conclusões do seguinte teor:
«
1. No dia 30-07-2009, o reclamante, ora recorrente, apresentou reclamação do despacho da administração tributária de 20-07-2009. Ora,
2. O prazo de 10 dias para apresentar reclamação, a que alude o art. 277.º do CPPT, começa a contar a partir da notificação da decisão do órgão da administração tributária ao executado. O que,
3. Aconteceu, efectivamente, no dia 22-07-2009. Pois,
4. O referido prazo de 10 dias para apresentar reclamação da decisão do órgão da administração tributária conta-se, necessariamente, a partir da última notificação dessa mesma administração ao executado. Aliás,
5. A partir do momento que o órgão da administração tributária profere uma decisão sobre um requerimento que lhe é dirigido pelo executado, está sempre, e sem excepção, a admitir que este último possa apresentar reclamação da sua decisão, nos termos dos artigos 276.º e 277.º do CPPT. Pois,
6. Se o órgão da administração tributária entendesse que não se deveria pronunciar, certamente, que não o teria feito. E,
7. Se optou por proferir uma decisão através de despacho de 20-07-2009, notificado ao executado a 22-07-2009,
8. Não pode agora ser negado, a esse mesmo executado, o direito consagrado no artigo 276.º do CPPT, e até na própria Constituição da República Portuguesa, nomeadamente no seu artigo 268º, de reclamar da decisão do órgão da administração tributária. Assim,
9. Tendo em conta que a última decisão do órgão da administração tributária foi notificada ao executado a 22-07-2009 e este apresentou recurso a 30-07-2009, tem de se concluir, obrigatoriamente, que,
10. O recurso é tempestivo, uma vez que foi interposto após 8 (oito) dias da notificação da última decisão órgão da administração tributária. Pelo que,
11. A douta decisão violou o preceituado na lei, nomeadamente, nos artigos 276.º e 277.º do CPPT.

Nestes termos, nos melhores de direito,
Deve o presente recurso ser julgado procedente por provado e, consequentemente, ser revogado o douto despacho e substituído por outro que admita a reclamação apresentada» (() As partes entre aspas e com um tipo de letra diferente, aqui como adiante, constituem transcrições.).

1.5 O recurso foi admitido, com subida imediata nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.

1.6 A Fazenda Pública não contra alegou.

1.7 O Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu manteve o despacho recorrido.

1.8 Recebidos neste Tribunal Central Administrativo Norte, os autos foram com vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que o recurso não merece provimento. Isto, em síntese, porque considerou que, tendo o despacho recorrido decidido no sentido da intempestividade da reclamação, não podia conhecer da questão da prescrição e, mesmo que assim não se entenda, os autos não fornecem os elementos imprescindíveis para apreciá-la.

1.9 A questão a apreciar e decidir no presente recurso é a de saber se o despacho recorrido fez errado julgamento ao considerar que a reclamação foi apresentada para além do termo do prazo legal para o efeito.

* * *
2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1 DE FACTO
2.1.1 O Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu rejeitou liminarmente a reclamação por intempestividade com base nos seguintes factos, que mencionou no despacho recorrido:

«A petição inicial que deu origem aos presentes autos foi apresentada em 30 de Julho de 2009, vide carimbo de fls. 3 […];

Petição originada no despacho proferido em 01-06-2009, comunicado à Reclamante e seu Mandatário em 02-06-2009, despacho que terminou com a indicação de que do mesmo podia reclamar nos termos do artigo 276º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, cfr. fls. 62 a 71;

[…] o referido despacho já fora antecedido de outro datado de 11-05-2009 comunicado por via postal expedido em 14 e 18 de Maio de 2009, e originado por requerimento do Reclamante apresentado em 29 de Abril de 2009, vide fls. 48 a 60;

O Reclamante […] novamente, em 20 de Julho de 2009 veio requerer fosse apreciada oficiosamente a prescrição, ao que a Entidade Requerida por despacho de 20-07-2009 e comunicado em 21-07-2009 respondeu:
Relativamente ao mesmo assunto, foi V. Exª notificado em 02 de Junho de 2009, do despacho proferido pelo Chefe deste Serviço de Finanças e que a título meramente informativo se remete.
Assim, e como não exerceu o direito que lhe confere o artigo 276º do CPPT, a tramitação dos autos de execução fiscal irá continuar por não haver motivo legal que leve à suspensão.”, cfr. fls. 73 a 81».

2.1.2 Com vista à melhor compreensão da situação de facto que ora importa considerar, entendemos dever atentar-se nos seguintes factos e circunstâncias respeitantes à tramitação processual:
a) Em 17 de Novembro de 1997, a então denominada Repartição de Finanças do concelho de Armamar instaurou contra António Tomé um processo de execução fiscal, a que atribuiu o n.º 2500-97/100987.7, para cobrança da quantia de Esc. 134.499$00 e acrescido (cf. fls. 1 da execução fiscal, fls. 22 dos presentes autos);
b) Essa execução fiscal foi instaurada com base em duas certidões de dívida subscritas pelo Director-Geral dos Impostos e das quais aquele consta como devedor de IVA dos 3.º e 4.º trimestres do ano de 1997 e respectivos juros compensatórios, no total acima referido (cf. as referidas certidões a fls. 2 e 3 do processo de execução fiscal, fls. 23 e 24 dos presentes autos);
c) A essa execução fiscal foi apensada uma outra, a que foi atribuído o n.º 2500-98/101178.2, instaurada em 10 de Julho de 1998 contra o mesmo António Tomé Rodrigues para cobrança coerciva da quantia de Esc. 159.490$00 (cf. fls. 1 da execução fiscal, fls. 82 dos presentes autos);
d) Esta última execução fiscal foi instaurada com base em duas certidões de dívida subscritas pelo Director-Geral dos Impostos e das quais António Tomé Rodrigues consta como devedor de IVA do ano de 1995 e de juros compensatórios de IVA do 2.º trimestre do ano de 1995, no total acima referido (cf. as referidas certidões a fls. 2 e 3 do processo de execução fiscal, fls. 83 e 84 dos presentes autos);
e) Mediante petição remetida por telecópia ao Serviço de Finanças de Armamar em 23 de Abril de 2009, o Executado pediu ao Chefe daquele Serviço que conhecesse da prescrição das dívidas exequendas (cf. a petição inicial a fls. 48 dos presentes autos e comprovativo da remessa por telecópia a fls. 49);
f) Essa petição foi apreciada por despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Armamar, datado de 13 de Maio de 2009, do seguinte teor:
«Vista a informação prestada na exposição apresentada por ANTÓNIO TOMÉ […] cumpre decidir:
É alegado na mesma que as dívidas a que se referem os autos de execução fiscal nrs 2500199701009877 e 2500199801011782 se encontram prescritas, dado que os respectivos processos estiveram parados mais de um ano por culpa não imputável ao executado, mas de facto assim não é, pois veja-mos […]:
1 - O processo 2500199701009877 foi instaurado em 17/11/1997, tendo sido citado por aviso simples em 18/11/1997:
2 - Em 20/07/1998, foi instaurado o processo 2500199801011782, cuja citação por aviso foi efectuada em 20/08/1998:
3 - Este foi apensado ao referido em 1, tendo sido feita citação pessoal em 26/02/1999:
4 - Foi apresentada impugnação judicial em 4/3/1999, cujo acórdão foi proferido em 30/10/2008, e devidamente notificado em 31/10/2008.
Assim não se vislumbra mérito no pedido pelo que deve a tramitação processual prosseguir com vista a cobrança da respectiva dívida»
(cf. o despacho fls. 52 dos presentes autos);
g) Para notificação desse despacho foi remetido pelo Serviço de Finanças de Armamar ao Executado e ao seu Mandatário judicial o ofício n.º 382, sendo àquele por carta registada com aviso de recepção, que foi devolvido assinado com data de 15 de Maio de 2009
(cf. cópias do ofício e dos respectivos talão de registo e aviso de recepção, de fls. 55 a 60 dos presentes autos);
h) Mediante petição entrada no Serviço de Finanças de Armamar em 27 de Maio de 2009, o Executado, fazendo referência ao ofício dito em g), manifestou a sua discordância com o despacho referido em f) – designadamente quanto ao efeito interruptivo da citação, que considerou não previsto na legislação aplicável, bem como há impossibilidade de interrupções sucessivas –, sustentou de novo a prescrição das dívidas exequendas e concluiu do seguinte modo:
«nestes termos
reitera-se o que já se requereu a V. Ex.ª no sentido do respeito da legalidade, designadamente no que concerne ao conhecimento da prescrição oficiosa, relativamente a todas as situações que digam respeito ao aqui requerente, de harmonia com a legislação que deixou exposta»
(cf. o requerimento a fls. 62 e 63 dos presentes autos);
i) Apreciando este requerimento, o Chefe do Serviço de Finanças de Armamar, proferiu despacho, datado de 1 de Junho de 2009, do seguinte teor:
«Em face da exposição/requerimento apresentado por António Tomé […], cumpre decidir:
- Efectivamente à data da instauração estava em vigor o CPT (Código de Processo Tributário);
- Efectivamente no seu artigo 34º, nº 3 são enumerados os factos que interrompem a prescrição “A reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação e a instauração da execução interrompem a prescrição, cessando, porém esse efeito se o processo estiver parado por facto não imputável ao contribuinte durante mais de um ano, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após este período ao que tiver decorrido até à data da instauração”;
- Ora no caso em apreço até à apresentação da Impugnação (4/03/1999) nunca houve paragem do processo, pelo que só nesta data o processo ficou suspenso até à decisão da mesma, cujo acórdão foi proferido em 30/10/2008;
- Assim desde 4/3/1999 até 30/10/2008, a prescrição foi interrompida, pelo que não se vislumbra que seja invocada a prescrição do mesmo:
- Notifique-se o requerente do presente despacho, dando-lhe conhecimento de que do mesmo pode reclamar nos termos do artigo 276º do CPPT»
(cf. o despacho a fls. 64);
j) Para notificar este despacho, o Serviço de Finanças remeteu ao Executado e ao seu Mandatário judicial o ofício n.º 451 por cartas registadas com avisos de recepção, que foram devolvidos assinados com data de 2 de Junho de 2009
(cf. cópias do ofício e dos respectivos talões de registo e avisos de recepção, de fls. 65 a 71 dos presentes autos);
k) Em 20 de Julho de 2009, o Executado fez dar entrada no Serviço de Finanças de Armamar um requerimento, argumentando no sentido da prescrição, em que concluiu do seguinte modo:
«nestes termos
Reitera-se o que já se requereu, mais do que uma vez, a V. Ex.ª, no sentido do respeito da legalidade, designadamente, no que concerne ao conhecimento da prescrição oficiosa, relativamente a todas as situações que digam respeito ao aqui requerente, de acordo com a legislação que deixou exposta»
(cf. o requerimento a fls. 73 a 75);
l) Com data de 20 de Julho de 2009, o Chefe do Serviço de Finanças de Armamar remeteu ao Mandatário judicial do Executado o ofício com o n.º 588, do seguinte teor:
«Assunto: EXPOSIÇÃO/REQUERIMENTO DE 2009/07/20
Relativamente ao mesmo assunto, foi V. Exª notificado em 2 de Junho de 2009, do despacho proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças, e que a título meramente informativo se remete.
Assim, e como não exerceu o direito que lhe confere o artigo 276º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, a tramitação dos autos de execução fiscal irá continuar, por não haver motivo legal que leve à suspensão»
(cf. o ofício a fls. 79);
m) Esse ofício foi remetido por via postal registada e com aviso de recepção, que foi devolvido assinado com data de 21 de Julho de 2009 (cf. talão de registo e aviso de recepção a fls. 80 e 81 dos presentes autos);
n) Em 30 de Julho de 2009, o Executado fez dar entrada no Serviço de Finanças de Armamar uma petição endereçada ao Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu em cujo intróito, depois de referir o ofício dito em l), disse: «[…] não se conformando com a decisão proferida por DESPACHO de 2009/06/01, do Chefe do Serviço de Finanças de Armamar, notificado através do ofício à margem indicado, perante V. Ex.ª vem deduzir RECLAMAÇÃO nos termos do artigo 276º do Código de Procedimento e de Processo Tributário»
(cf. a petição inicial de fls. 3 a 10, bem como o carimbo de entrada que lhe foi aposto).
o) Concluiu a petição formulando o seguinte pedido:
«nestes termos,
nos melhores de direito e com o mui douto suprimento de V. Ex.ª espera-se que a presente reclamação venha a obter provimento com a revogação do citado despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Armamar e o concomitante conhecimento da prescrição oficiosa»
(cf. a petição inicial de fls. 3 a 10).

*

2.2 DE DIREITO
2.2.1 A QUESTÃO A APRECIAR E DECIDIR
Inconformado com o despacho liminar que rejeitou a reclamação deduzida ao abrigo do art. 276.º do CPPT com fundamento em caducidade do direito de reclamar, veio o Executado interpor recurso do mesmo. Entende o Recorrente que no despacho recorrido se fez errado julgamento ao considerar que a reclamação foi apresentada para além do termo do prazo legal para o efeito e, por isso, ao ter-se rejeitado a reclamação in limine por caducidade do direito de reclamar. Se bem interpretamos as alegações de recurso e respectivas conclusões, o Recorrente, que indicou expressamente na petição inicial da reclamação o despacho reclamado como sendo o proferido pelo Chefe da Serviço de Finanças de Armamar em 1 de Junho de 2009 (cf. alínea n) do ponto 2.1.2), sustenta agora que o despacho reclamado é o de 20 de Julho de 2009, motivo por que a reclamação, tendo sido apresentada em 30 deste último mês e ano, o foi dentro do prazo de dez dias fixado pelo art. 277.º do CPPT. Na verdade, enquanto o despacho de 1 de Junho de 2009 foi notificado ao Executado em 2 de Junho de 2009, o de 20 de Julho de 2009 foi-o em 21 de Julho de 2009 (cf., respectivamente, as alíneas j) e m) do ponto 2.1.2).
Assim, a questão que ora cumpra apreciar e decidir é, como deixámos dito em 1.8, a de saber se o despacho do Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu que rejeitou liminarmente a reclamação com fundamento na caducidade do direito de reclamar fez ou não correcto julgamento, o que, como resulta do que vimos de dizer, passa desde logo por indagar qual a decisão do Chefe do Serviço de Finanças de Armamar reclamada e em que data a mesma foi ou pode considerar-se como tendo sido validamente notificada ao Executado.
Antes, porém, uma breve nota no sentido de verificar qual o efeito que deve ser atribuído ao recurso.

2.2.2 DO EFEITO DO RECURSO
Os recursos têm sempre efeito devolutivo e, alguns, também efeito suspensivo (() Dispõe o artigo 286.º, n.º 2, do CPPT: «Os recursos têm efeito meramente devolutivo, salvo se for prestada garantia nos termos do presente Código ou o efeito devolutivo afectar o efeito útil dos recursos».). O recurso tem efeito devolutivo ou meramente devolutivo quando a sua interposição não obsta à execução imediata da decisão recorrida, dele resultando apenas a atribuição, ao tribunal superior, da possibilidade de alterar ou anular a decisão anterior; e tem efeito suspensivo quando o recurso, para além daquele efeito, tem, ainda, o de impedir que se dê imediata execução à decisão recorrida (() Neste sentido, JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado, Áreas editora, 5.ª edição, II volume, anotação 10 ao art. 279.º, págs. 689/690.).
Nos autos está em causa uma reclamação de acto do órgão de execução fiscal, que subiu ao tribunal imediatamente (() Imediatamente significa, aqui, no prazo de oito dias fixado no n.º 4 do art. 278.º do CPPT e não apenas após a penhora e a venda, como é a regra geral do n.º 1 do mesmo artigo.) e nos próprios autos de execução fiscal (onde é tramitada a reclamação, nos termos do disposto nos arts. 97.º, n.º 1, alínea n) e 278.º, n.º 1, do CPPT). Essa subida imediata prevê-a a lei para as hipóteses consagradas no n.º 3 do art.278.º do CPPT e admite-a a jurisprudência para a generalidade das situações em que a subida diferida acarrete prejuízos irreparáveis ou determine a perda da utilidade da reclamação (() A este propósito, vide JORGE LOPES DE SOUSA, idem, anotações 5 e 6 ao art. 278.º, págs. 666 a 669.). Terá sido um destes motivos a justificar que a reclamação tenha subido de imediato ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu e que aí tenha sido tramitada como processo urgente. Note-se que nos processos urgentes, como é o caso (cf. art. 278.º, n.º 5, do CPPT), a tramitação da reclamação, com subida imediata e nos próprios autos, tem como um dos corolários igual urgência na tramitação do recurso jurisdicional (() Cf. JORGE LOPES DE SOUSA, ob. cit., anotação 8, i) ao art. 278.º, pág. 674.).
Será o mesmo motivo que determinou a subida imediata da reclamação a tribunal que justificará agora que ao presente recurso seja fixado o efeito suspensivo. Note-se que, nos termos do n.º 2 do art. 286.º do CPPT, embora o efeito regra dos recursos seja o meramente devolutivo, deverá ser fixado o efeito suspensivo nos casos em que esteja prestada garantia ou o efeito devolutivo afecte o efeito útil do recurso.
Assim, o presente recurso jurisdicional, que subiu imediatamente e nos próprios autos, deve ter efeito suspensivo, de harmonia com o disposto nos arts. 734.º, n.º 2, e 740.º, n.º 1, do CPC, e 286.º, n.º 2, in fine, do CPPT.
Aliás, o recurso já está a ser processado com efeito suspensivo, pois que, como se disse, teve subida imediata e nos próprios autos, estando, pois, já concretizado o efeito suspensivo. Por isso, nos dispensamos de ouvir as partes, antes da mudança do efeito que ora decretaremos.
Fixamos, pois, ao presente recurso jurisdicional o efeito suspensivo (() Neste sentido, vide, os seguintes acórdãos da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 16 de Agosto de 2006, proferido no processo com o n.º 689/06, publicado no Apêndice ao Diário da República de 20 de Abril de 2007, págs. 1249 a 1252, com texto integral disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/0f04d06b574e46eb802571e8003e246a?OpenDocument;
- de 8 de Novembro de 2006, proferido no processo com o n.º 938/06, publicado no Apêndice ao Diário da República de 16 de Novembro de 2007, págs. 1803 a 1809, com texto integral disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/27c6438d89f2e8038025722f003cb2c0?OpenDocument;
- de 28 de Fevereiro de 2007, proferido no processo com o n.º 62/07, publicado no Apêndice ao Diário da República de 14 de Fevereiro de 2008, págs. 435 a 442, com texto integral disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/11c9095bf084151880257299004fc59d?OpenDocument.).

2.2.3 DA CADUCIDADE DO DIREITO DE RECLAMAR
A questão da caducidade do direito de reclamar, tal como configurada nos autos, passa, antes do mais, por estabelecer qual o acto reclamado, isto é, qual a decisão proferida pelo órgão da execução fiscal cuja sindicância judicial foi pedida.
Depois, haverá que determinar em que data tal decisão deve ter-se como notificada ao Executado.
Quanto ao prazo para a reclamação, não há controvérsia alguma: no presente caso não é outro senão o prazo geral de 10 dias, que a lei consagra no n.º 1 do art. 277.º do CPPT.
Dito isto, podemos avançar na determinação do acto reclamado.
Na petição por que deduziu a reclamação judicial, o Executado identifica o despacho recorrido como sendo o que foi proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças de Armamar em 1 de Junho de 2009.
É certo que, já nas alegações do presente recurso, o Reclamante parece ensaiar uma versão diferente, ao dizer que «No dia 30-07-2009, o reclamante, ora recorrente, apresentou reclamação do despacho da administração tributária de 20-07-2009» (cf. item 1.º das alegações de recurso e n.º 1 das respectivas conclusões).
No entanto, a nosso ver, a decisão do órgão da execução fiscal reclamada é o despacho de 1 de Junho de 2009, como resulta inequivocamente da petição inicial. Para tanto, é decisiva a identificação que desse acto foi feita pelo Reclamante logo no intróito da petição inicial, onde ficou escrito: «[…] não se conformando com a decisão proferida por DESPACHO de 2009/06/01, do Chefe do Serviço de Finanças de Armamar, notificado através do ofício à margem indicado, perante V. Ex.ª vem deduzir RECLAMAÇÃO nos termos do artigo 276º do Código de Procedimento e de Processo Tributário» (cf. alínea n) do ponto 2.1.2). Se alguma dúvida subsistisse, a mesma seria dissipada através da leitura da petição inicial, maxime do seu art. 13.º, no qual é feita uma transcrição do referido despacho.
Ou seja, podemos dar como assente que a decisão do órgão da execução fiscal reclamada é o despacho que foi proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças de Armamar em 1 de Junho de 2009.
Aliás, é, no mínimo, duvidoso que em 20 de Julho de 2009 o Chefe do Serviço de Finanças de Armamar tenha proferido despacho algum na execução fiscal (() Note-se, contudo, que se o referido ofício consubstanciasse uma verdadeira decisão, não seria o facto de esta não ter sido proferida mediante despacho lavrado no processo que permitiria coarctar o direito de reclamação judicial que a lei consagra no art. 276.º do CPPT. A não ser assim, estaria encontrada a forma de subtrair aos interessados tal direito, bastando para o efeito que o órgão da execução fiscal se limitasse a comunicar as suas decisões, sem nunca as lavrar mediante despacho no processo.). Nessa data foi, isso sim, remetido um ofício ao Mandatário judicial do Executado, dando-lhe conta de que o Chefe do Serviço de Finanças já se pronunciara por despacho de 1 de Junho de 2009 sobre o assunto (prescrição das dívidas exequendas) suscitado no requerimento de 20 de Julho de 2009 e remetendo de novo cópia daquele despacho, bem como salientando que, não tendo oportunamente sido deduzida reclamação de tal despacho, a execução fiscal iria prosseguir (cf. alínea l) do ponto 2.1.2).
Determinado que ficou o acto reclamado, como sendo o despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Armamar proferido em 1 de Junho de 2009, a sorte do recurso joga-se em torno da resposta que for dada à questão de saber em que data o mesmo foi ou deve considerar-se como tendo sido notificado ao Executado. Isto, porque este refere ter sido notificado desse despacho pelo ofício n.º 588, de 20 de Julho de 2009, o que teria como consequência a tempestividade da reclamação apresentada ao abrigo do art. 276.º do CPPT no dia 30 do mesmo mês.
Ou seja, a divergência do Recorrente com o despacho recorrido refere-se ao início do prazo, ao dies a quo do prazo para reclamar. Vejamos:
O despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Armamar proferido em 1 de Junho de 2009 foi notificado ao Executado em 2 de Junho de 2009 (data em que foi assinado o aviso de recepção referente ao ofício remetido para notificação), sendo que nessa notificação lhe foi comunicado, como o impõe o art. 36.º, n.º 2, do CPPT, que dele podia reclamar no termos do art. 276.º do CPPT (cf. alíneas i) e j) do ponto 2.1.2).
Assim, o primeiro dia do prazo de dez dias para reclamar judicialmente dessa decisão foi 3 de Junho de 2009 e o último foi 12 de Junho de 2009. Tendo em conta a possibilidade de praticar o acto em qualquer um dos três dias úteis imediatamente seguintes, a reclamação poderia ter sido apresentada até 17 de Junho, ficando a validade do acto dependente do pagamento de multa (cf. art. 145.º, n.º 5, do CPC).
O Executado ao invés de apresentar a reclamação dentro desse prazo, optou por apresentar em 20 de Julho de 2009 um requerimento ao Chefe do Serviço de Finanças de Armamar, refutando a argumentação por este aduzida no despacho de 1 de Junho e reiterando o pedido de que as dívidas exequendas fossem declaradas prescritas (cf. alínea k) do ponto 2.1.2).
O Chefe do Serviço de Finanças de Armamar remeteu então ao Mandatário judicial do Executado um ofício, com o n.º 588 e datado de 20 de Julho de 2009, dando-lhe conta de que já se pronunciara por despacho de 1 de Junho de 2009 sobre o assunto (prescrição das dívidas exequendas), remetendo de novo cópia daquele despacho e salientando que, não tendo oportunamente sido deduzida reclamação de tal despacho, a execução fiscal iria prosseguir (cf. alínea l) do ponto 2.1.2).
Pretende o Recorrente que o prazo para reclamar do despacho de 1 de Junho de 2009 se conte da data em que recebeu este ofício n.º 588, ou seja, de 22 de Julho de 2009.
Manifestamente, não pode ser assim, como bem decidiu o Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu.
O referido despacho foi notificado em 2 de Junho de 2009 e é a partir dessa data que deve contar-se o prazo para dele reclamar judicialmente.
O facto de o Serviço de Finanças de Armamar ter remetido de novo ao Executado cópia desse despacho em Julho de 2009 não lhe abre novo prazo para o exercício do direito de reclamação que, nessa data, estava já precludido.
Assim, mesmo atendendo a que o indeferimento liminar (que alguma jurisprudência qualifica como “despacho radical”), que assenta em motivos de economia processual, deve ser cautelosamente decretado – ou seja, só se o procedimento é necessariamente inviável, não tem razão alguma de ser, constituindo, assim, desperdício manifesto de actividade judicial (() Neste sentido,
· na doutrina, ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil anotado, Coimbra Editora, 3.ª edição – reimpressão, vol. II, pág. 373;
· na jurisprudência, entre outros, os seguintes acórdãos da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 9 de Outubro de 2002, proferido no processo com o n.º 26482, publicado no Apêndice ao Diário da República de 12 de Março de 2004, págs. 2252 a 2255, com texto integral disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/b38d7c8b3ceaa30880256c55004c2e5c?OpenDocument;
- de 4 de Março de 2009, proferido no processo com o n.º 786/07, publicado no Apêndice ao Diário da República de 30 de Abril de 2009, págs. 344 a 348, com texto integral disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/dc17d39856877bcd80257576004b9488?OpenDocument.) –, a verdade é que na situação sub judice não é possível considerar-se como dies a quo do prazo para reclamar outro que não aquele em que o Executado foi notificado do despacho proferido em 1 de Junho de 2009, isto é, 2 de Junho de 2009.
Para terminar, note-se que a caducidade do direito de reclamar obsta a que se aprecie a questão da prescrição (() No sentido de que a caducidade do direito de reclamar obsta à apreciação das questões de mérito, ainda que do conhecimento oficioso, vide, entre outros, os seguintes acórdãos da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 21 de Maio de 2008, proferido no processo com o n.º 293/08, publicado no Apêndice ao Diário da República de 29 de Setembro de 2008, págs. 597 a 602 e disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/3c95e1b05c1326b180257459003ae2fc?OpenDocument;
- de 25 de Março de 2009, proferido no processo com o n.º 196/09, publicado no Apêndice ao Diário da República de 30 de Abril de 2009, págs. 459 a 462 e disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/1a94b9ccad30cb7e8025758b003bc086?OpenDocument.), sem prejuízo de a mesma sempre poder ser de novo suscitada na execução fiscal com possibilidade de reclamação judicial da decisão que a indefira.

2.2.4 CONCLUSÕES
Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:
I - O prazo para o executado reclamar ao abrigo do art. 276.º do CPPT das decisões do órgão da execução fiscal é de 10 dias a contar da data em que foi notificado da decisão que lhe seja desfavorável (art. 277,º, n.º 1, do CPPT).
II - Ainda que, na sequência de ulterior exposição do executado, o órgão da execução fiscal lhe remeta de novo cópia da decisão, tal facto não abre novo prazo para desta reclamar judicialmente.
III - Apresentada a petição de reclamação judicial para além do termo do prazo dito em I, impõe-se a respectiva rejeição liminar, sendo que a caducidade do direito de reclamar obsta à apreciação de qualquer questão de mérito, ainda que do conhecimento oficioso, designadamente a prescrição das dívidas exequendas.
IV - Tal não obsta a que a questão da prescrição seja novamente suscitada ao órgão da execução fiscal, com possibilidade de reclamação judicial ao abrigo do art. 275.º do CPPT de eventual decisão de indeferimento.
V - Na reclamação do art. 276.º do CPPT que haja de ser conhecida de imediato, nos termos do art. 278.º do mesmo código, o recurso jurisdicional interposto pelo reclamante tem sempre efeito suspensivo.
* * *
3. DECISÃO
Face ao exposto, os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte acordam, em conferência, negar provimento ao recurso.

Custas pelo Recorrente.


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Porto, 5 de Novembro de 2009


(Francisco Rothes)

(Fonseca Carvalho)
(Moisés Rodrigues)