Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00568/10.3BECBR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:02/24/2012
Tribunal:TCAN
Relator:Maria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Descritores:ACTO REVOGATÓRIO
ACTO TÁCITO
DEFERIMENTO TÁCITO
Sumário:É válido o indeferimento expresso de anterior acto tácito de deferimento desde que proferido nos termos do artº 141º, nº 1, do CPA, isto é, desde que proferido dentro do prazo de um ano com fundamento em ilegalidade.*
* Sumário elaborado pelo Relator
Data de Entrada:06/02/2011
Recorrente:Directora Regional do Centro do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras
Recorrido 1:Y. ...
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Concede provimento
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Negar provimento ao Recurso
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
RELATÓRIO
Y. …, cidadão de nacionalidade marroquina, residente na rua …, Figueira da Foz, intentou Acção Administrativa Especial contra a Directora Regional do centro do serviço de Estrangeiros e Fronteiras, que o Tribunal entendeu como tendo sido intentada contra o Ministério da Administração interna, pedindo que seja “anulado o acto de indeferimento da renovação de residência legal, e, consequentemente, ser concedida de pleno a renovação de residência ao autor.”
Por sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra foi julgada procedente a acção, anulado o acto impugnado e mantido em vigor o deferimento tácito da pretensão do Autor.
Desta decisão vem interposto recurso.
Em alegação o recorrente concluiu assim:
1º - Afigura-se-nos que a sentença padece de erro no enquadramento da situação fáctica, violando a lei substantiva Lei nº 23/2007, de 4/7, Decreto Regulamentar nº 84/2007, de 05/11 e a Portaria nº 1563/2007, de 11 de Dezembro, uma vez que considerou, ao arrepio daquelas, que o cidadão estrangeiro possuía meios de subsistência.
2º - Do cotejo dos artigos 2º nº 1 e 2, artº 7º nºs 1 e 5º nº1 da Portaria 1563/2007, de 11 de Dezembro e do Artigo 58º nº 2 da Lei 23/2007, de 4 de Julho, os quais definem objectivamente os critérios quantitativos para aferição do requisito legal relativo aos meios de subsistência, resulta claro a insuficiência dos mesmos pelo ora recorrido.
3º Sem prejuízo do cariz de regularidade exigido e que estava claramente omisso no caso sub Júdice, o ora recorrido não demonstrou auferir meios de subsistência de acordo com o critério previsto na Portaria (7 x RMMG líquido de quotizações para a Segurança Social).
Considerando o valor da RMMG em 2009 (Euros 450,00) e deduzindo 11% de quotizações obrigatórias para a Segurança Social, o ora recorrido teria de provar ter auferido em 2009 um rendimento global não inferior a Euros 2.803,50 (Dois mil oitocentos e três euros e cinquenta cêntimos).
4º Efectivamente, o ora recorrido não lograva auferir à data tal quantitativo, pois em 2008 não apresentou prova válida dos rendimentos (embora suficientes) e, relativamente a 2009, apresentou um contrato de trabalho celebrado no final do ano, cuja relação laboral não ficou devidamente comprovada.
5ºA sentença perfilha de igual erro quando pugna pela existência de condições de alojamento. Ao contrário do invocado na sentença, a ratio do requisito não se prende com o facto do cidadão “demonstrar que tem um local onde se aloje e que não constitua mais um sem abrigo”.
6º- A prova de que o requerente possui condições de alojamento configura um dos requisitos cumulativos para a renovação de autorização de residência nos termos do artº 78º nº 2 b) da Lei nº 23/2007.
7º- A Lei de Estrangeiros define o título de residência como o documento de identificação de cidadãos estrangeiros residentes legais, ou seja, certifica que o seu titular reside em Portugal e que se encontra em situação legal. (…) porque a autorização de residência reveste natureza de documento de identidade, o seu conteúdo deve ser verdadeiro e permanentemente actualizado.
8º- Acresce que compete ao SEF controlar e fiscalizar a permanência e actividade dos cidadãos estrangeiros em território nacional. Sendo imperioso dispor de elementos actualizados sobre os mesmos, sobretudo sobre os que detêm o estatuto de residente. - A ora recorrente não está legalmente vinculada ao teor do atestado de residência, sem que para isso tenha de invocar falsidade daquele, incidente que só faz sentido em sede judicial s.s. e não no âmbito do procedimento administrativo.
9ºEm sede de Regime Jurídico de Entrada, Permanência, Saída e Afastamento de Estrangeiros é obrigação do cidadão estrangeiro comunicar a morada, bem como alteração da mesma, só desta forma, o SEF pode ter um controlo da presença do cidadão estrangeiro em território nacional.
10ºToda a matéria factual dada como provada aponta para um enquadramento diverso de Direito do dado pela sentença ora recorrida, que é violador da Lei substantiva, nomeadamente, da Lei nº 23/2007, de 4 de Julho, Decreto Regulamentar nº 84/2007, de 05/11 e Portaria nº 1563/2007, de 11/12.
11ºCom efeito, afigura-se-nos evidente a legalidade do acto de indeferimento expresso (o pedido não cumpre os requisitos legais vinculativos), o que torna impossível a ocorrência de deferimento tácito. Nesta sede, tem de se entender que se, efectivamente decorreu tal prazo, o indeferimento expresso posterior, obsta à formação do referido acto, isto é, a decisão administrativa de indeferimento do pedido, consubstancia, ela própria, um acto administrativo de revogação do deferimento tácito anteriormente verificado. In Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Almedina 2005, pág.564.
12º -Urge concluir, ao arrepio da sentença que:
- O ora recorrido não preenche dois dos requisitos (meios de subsistência e condições de alojamento) previstos no nº 2 do artigo 78º nº2, da lei 23/2007, de 4 de Julho, conjugado com o artigo 63º do Decreto regulamentar nº 84/2007, de 4 de Julho e Portaria 1563/2007, de 11/12;
- O acto tácito que se verificou na sua esfera jurídica é um acto ilegal, por não preencher os pressupostos legais, que o ora recorrido teria de preencher à data nos termos do nº2 do artigo 78º da Lei 23/2007, de 4 de Julho, para poder ver deferido o seu pedido de renovação de Autorização de Residência;
- O acto de indeferimento expresso proferido pela ora recorrente, em 09 de Junho de 2010, revogou tacitamente o deferimento tácito produzido pois ao contrário do aduzido na sentença aquele é perfeitamente válido.
Nestes termos, deverá ser dado provimento ao Recurso, fazendo-se
JUSTIÇA
O recorrido contra-alegou e concluiu o seguinte:
58º- A sentença a quo faz uma correcta interpretação da Lei.
59º- O Réu faz uma interpretação absolutamente errónea da Lei.
60º- Como se refere in fls. 7 da sentença a quo in artº 82º, 2, da lei de estrangeiros ( lei 23/2007 de 04/07),o pedido de renovação deve ser decidido no prazo de 30 dias.
61º- Na falta de decisão no prazo previsto no número anterior, por causa não imputável ao Requerente, o pedido entende-se como deferido, sendo a emissão do título de residência imediata, nos termos do nº3,do artigo 82ºda citada lei de estrangeiros.
62º- Aliás, esta é a questão central.
63º- Entende e bem a sentença a quo que a pretensão do Autor tem de se considerar deferida tacitamente nos termos do nº 3, do artº 82º,e atento o prazo de 30 dias úteis (artº 72º do CPA) a pretensão daquele tem de considerar-se deferida tacitamente a 06 de Março de 2010, e como nada foi referido pelo Réu, isto é, pelo decurso do tempo.
64º- O Réu desrespeita as justas expectativas do Autor ao vir dizer que, o acto de indeferimento operado a 09/06/2010 acaba por revogar tacitamente, o próprio deferimento tácito entretanto operado.
65º- Para além de tremenda insegurança que gera na esfera jurídica do particular, frustrando e pondo em crise direitos anteriormente adquiridos; não pode a Administração Pública e com o constante argumento da revogabilidade do acto tácito ou sua ilicitude, vir dizer afinal que o Autor não tem razão.
66º- Seguindo o raciocínio do Réu seria válido ainda actualmente, revogar o acto tácito, pouco importando prazos legais previstos no números 2, 3, do artigo 82º.
67º- Não colhe obviamente tal teoria.
68º- Pois, o Réu tem o arrojo de vir à posteriori exigir requisitos legalmente inexistentes.
69º- Vindo a definir unilateralmente o que denomina critérios “ bastantes”; quanto aos meios de subsistência sem previsão legal.
70º- Somado ao facto de o Réu ser actualmente solteiro.
71º-O Réu tem o desplante de vir dizer em juízo que o Autor não trabalhou para a empresa, “ P. …” quando deveria e se tinha dúvidas de actuar criminalmente contra o Autor e Entidade Patronal.
72º- O deferimento tácito só pode ser revogado eventualmente se o acto tácito for manifestamente ilegal; e as causas de invalidade têm de se reportar à data da prática do acto tácito e não a factores supervenientes.
73º- O que não é seguramente o caso.
74º- O critério dos meios de subsistência foi correctamente avaliado pela sentença a quo; sendo certo que o Autor no ano de 2009 recebeu a remuneração mínima garantida.
75º- Comparativamente com a declaração de rendimentos do ano de 2008 não pode concluir-se que o Autor não disponha de um rendimento mínimo.
76º- A isto acresce o facto de no ano de 2010 se constatar que o Autor auferiu Rendimentos à volta do rendimento mínimo garantido ascendendo a 475.00 euro.
77º- È ainda falso que o Réu refira que o Autor não tenha trabalhado para a empresa, P. …, Lda, quando é feita prova junto aos autos e confirmado pela sentença a quo remunerações desde Dezembro de 2009 a Março de 2010.
78º- Encontra-se pois preenchido o requisito previsto na alínea a) do nº 2, do artº 78º da lei 23/2007 à data do deferimento tácito.
79º- Em matéria de alojamento; requisito previsto na alínea b); 2, do artº 78º da Lei 23/2007 o Autor também cumpre na íntegra este requisito.
80º- Pois, fez prova cabal nesse sentido.
81º- Com especial ênfase para o parecer do Ex.mo Sr. Magistrado do Ministério Público; e numa palavra correctíssimo.
82º- O caricato da situação é o Réu no seu portal na internet; e na distribuição de impressos nas delegações regionais mencionar expressamente; e para o público; atestados da Junta de Freguesia; recibos por exemplo
83º- Salvo o devido respeito é uma prova da antipatia inexplicável do Réu para com o Autor.
84º-Antipatia extensível ao Signatário; inexplicável; fazendo intencionalmente que este se deslocasse à DRFF (Delegação Regional da Figueira da Foz) em Julho de 2010 e quando o deveria ter feito dentro do prazo legal; e por carta; gerando perca de tempo e dinheiro àquele para uma simples notificação o que motivou por parte do Signatário reclamar com toda a justiça no livro amarelo.
85º- Acresce que, o Réu mais uma vez arroga-se no detentor da razão ao formular juízos ou convicções pessoais; acerca do conceito de alojamento e de espaço; os quais são; objectivamente; errados e desconformes com a lei.
86º- Pelo que também existe um interpretação absolutamente unilateral e errada da letra e espírito da lei.
87º- Concluí-se que o Autor preenche na íntegra os requisitos previstos no nº 2, nas alíneas a) e b) do artº 78º da lei 23/2007.
88º- Pelo que, o deferimento tácito operado a seis (6) de Março de 2010 é legal e produz eficácia jurídica na esfera jurídica do Réu devendo este emitir a residência de imediato.
89º- Um nota final, para a anotação de Mário Oliveira; Pedro Costa Gonçalves; e J.Pacheco Amorim, in CPA anotado, onde são irrevogáveis os actos que investem o seu titular numa posição jurídica estável.
90º- Pelo que, se deve manter de pleno como na sentença do tribunal de primeira instância.
TERMOS EM QUE SE DEVE MANTER DE PLENO COMO NA SENTENÇA DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA.
ASSIM SE FAZENDO JUSTIÇA!
O PGA junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido da manutenção da sentença recorrida.
Cumpre apreciar e decidir.
FUNDAMENTOS
DE FACTO
Na decisão posta em crise foi dada como provada a seguinte factualidade:
O A., cidadão Marroquino, solicitou, em 21 de Janeiro de 2010, renovação de autorização da sua residência temporária, como consta de fls. 1 e 1v do PA. Detinha título de residência emitida em 20-05-2008, com validade até 16-01-2010 (fls. 4 do PA);
Juntou, para os efeitos do referido em 1., entre outros documentos, fotocópia do seu passaporte, Título de residência e cartão do NIF, emitido em 18-04-2007 (fls. 4 do PA), fotocópia de Contrato de Trabalho a termo certo, datado de 1 de Dezembro de 2009 (fls. 5-6 do PA), um atestado da Junta de Freguesia de Brenha, duplicado de um recibo vencimento (fls. 8), extracto de remunerações de 2006/12 a 2009/11 emitido pela Segurança social (fls. 9-10 do PA), declaração de IRS referente ao ando de 2008 (fls. 11 do PA, com declaração de entrega a 16/04/2009- fls. 31 e com demonstração da liquidação a fls. 35);
O Autor entregou declaração emitida pela segurança social referente à empresa P. … de onde consta que recebeu em Março de 2010, € 450,00 (fls. 39 do PA);
Com data de 18 de Março de 2010 a entidade demandada solicitou ao Autor “ extracto de remunerações da segurança Social actualizado com os descontos efectuados pela empresa “P. …, Lda.”. Remeteu a notificação através de carta registada com aviso de recepção para a Rua …., Figueira da Foz (fls. 23-25 do PA);
O Autor foi notificado, com data de 7 de Abril de 2010, para efeitos de audiência prévia, sobre o seu pedido de renovação, para a Rua …, Figueira da Foz (fls. 29-32 do PA);
O Autor respondeu, nos termos de fls. 33-34 do PA, juntando cópia de um contrato de arrendamento de imóvel, datado de 1 de Abril de 2010 (fls. 35 do PA), cópia da declaração de Remunerações On-Line da empresa P. … Lda., retirada da Internet em 13 de Abril de 2010 (fls. 39);
Foi elaborado Relatório de fls. 51-52 do PA, que mereceu despacho de concordo da Directora regional, de 9 de Junho de 2010. Com base no relatório em causa foi indeferido o pedido do Autor que lhe foi notificado em 14 de Junho de 2010;
Com data de 27 de Junho de 2010 o representante do Autor remeteu FAX à Delegada regional da Figueira da Foz onde refere: “represento o cidadão Marroquino supra. Atento a posição dessa Delegação regional, a que não nos merece reparo, e por entendermos ser mais apropriado, estamos a diligenciar o pedido de residência por via do artigo 122º n.º 1 alínea j) da Lei 23/2007…” (fls. 54 do PA);
Com data de 2 de Julho de 2010 o mandatário do autor remeteu FAX à Delegada regional do SEF da Figueira da Foz, onde refere”…5. Daí, o requerente, ter tacitamente solicitado, o que confirma agora de forma expressa que, pretende efectuar residência ao abrigo do artigo 122º n.º 1, alínea j) da Lei n.º 23/2007, residência à qual tem direito…”;
O Autor foi notificado, com data de 20 de Julho de 2010, para abandonar o território nacional, pelo prazo de vinte dias, tendo-lhe sido indeferido concessão de autorização de residência temporária ao abrigo da alínea j), n.º 1, do artigo 122º da Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho (fls. 62- 65 do PA);
O autor reclamou da decisão referida em 9 (fls. 66 e sgs. do PA);
Foi emitido ao Autor pela segurança Social, extracto de remunerações, datado de 7 de Setembro de 2010, como consta a fls. 28-30.
Em sede de motivação o Tribunal consignou que considerou provada a matéria de facto, com relevância para a decisão, “Com base nos documentos junto aos autos e no processo administrativo”.
DE DIREITO
Vejamos.
Em 1º plano, como questão prévia, há que atentar na 1ª conclusão das contra-alegações, que vem assinalada sob o nº 57).
Invoca o recorrido que:

-O ora Recorrente não deu cumprimento aos estatuído nos arts 229º-A, 1, e artº 260º-A,1,3 todos do CPC, na redacção do DL 303/2007, de 24/08, sendo certo que o cumprimento do estatuído nesse normativo legal não é incompatível com o disposto no artº 145º nº1, do CPTA, o qual apenas diz que é oficiosa a notificação do recorrido ou recorridos para alegarem e não também o envio do requerimento de interposição de recurso e das respectivas alegações; no sentido da aplicação deste normativo aos licenciados em direito com funções de apoio jurídico a pessoas colectivas públicas, cf Ac. do Pleno do STA de 16.09.2009, proc. nº 0556/09.
Urge apreciar.
Decorre do sumário do ac. do Pleno da secção de CA do STA de 16/09/2009, proferido no âmbito do rec. nº 0556/09, que o próprio recorrido trouxe à colação, que:
I-De acordo com o preceituado nos n.ºs 1 e 2 do art.º 11 do CPTA, epigrafado de "Patrocínio judiciário e representação em juízo": "1. Nos processos da competência dos tribunais administrativos é obrigatória a constituição de advogado. 2. Sem prejuízo da representação do Estado pelo Ministério Público nos processos que tenham por objecto relações contratuais e de responsabilidade, as pessoas colectivas de direito público ou os ministérios podem ser representados em juízo por licenciado em Direito com funções de apoio jurídico, expressamente designado para o efeito, cuja actuação no âmbito do processo fica vinculada à observância dos mesmos deveres deontológicos, designadamente de sigilo, que obrigam o mandatário da outra parte."
II-O teor destes preceitos mostra claramente que é obrigatória a constituição de advogado nos tribunais administrativos e que é equiparado o patrocínio por advogado à representação "em juízo por licenciado em Direito com funções de apoio jurídico".
III-Se a lei faz equiparar o licenciado em Direito ao advogado constituído, ter-se-á de concluir que a posição no processo, com os consequentes direitos e obrigações processuais, é a mesma para todas as partes quer a autoridade seja patrocinada por advogado quer representada por licenciado nos referidos termos.
IV-Sendo assim, ter-se-á de concluir: a) Nos processos em que são nomeados licenciados em Direito com funções de apoio jurídico a pessoas colectivas públicas ou ministérios, nos termos do art.º 11, n.º 2, do CPTA, os mandatários das partes estão obrigados a dar cumprimento em relação a eles aos deveres de notificação previstos nos art.ºs 229-A e 260-A do CPC; b) Nos mesmos casos, os licenciados em Direito nomeados estão obrigados a dar cumprimento a esses deveres de notificação em relação aos mandatários das partes ou outros licenciados em Direito nomeados para representação processual de outras pessoas colectivas públicas ou ministérios.
X
Ora, não só não se vislumbra dos autos o incumprimento, por parte do recorrente, dos normativos em referência, como se constata que o recorrido não extrai qualquer ilação desta invocação vaga de incumprimento, razão pela qual se seguirá a análise do mérito do recurso.
Vejamos.
Resulta da sentença posta em causa o seguinte:

O Autor vem solicitar, através da presente acção, que lhe seja renovada a autorização de residência, invocando vários vícios invalidantes ao acto que lhe indeferiu essa sua pretensão.
Em primeiro lugar, é de referir que apenas está em causa no presente processo o acto de indeferimento da pretensão do Autor em ver renovada a sua autorização de residência e não a pretensão que manifestou nos termos da alínea j), n.º 1, do artigo 122º da Lei n.º 27/2007 de 4 de Julho (são deste normativo legal todos aos artigos referidos sem menção da Lei de origem). Na verdade, apesar do Autor fazer referência ao indeferimento dessa sua pretensão, não tira qualquer consequência desse indeferimento em termos de pedido para a presente acção.
Vejamos então.
O Autor, que é cidadão marroquino, dispunha de uma autorização de residência em território nacional, emitida em 20 de Maio de 2008, com validade até 16-01-2010. Em 21 de Janeiro de 2010 solicitou a renovação de autorização da sua residência temporária, ao abrigo do artigo 78º da Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho (n.º 1 do probatório).
Após solicitação de alguns documentos, em 18 de Março de 2010, a entidade demandada veio a indeferir o seu pedido, através de despacho de 9 de Junho de 2010, notificado ao A. a 14 do mesmo mês.
Como fundamentos para o indeferimento da sua pretensão, a entidade demandada sustenta que o A. não comprovou a morada que invocou, como sendo a sua residência efectiva, não tendo ainda provado que dispunha de meios de subsistência.
Refere o artigo 78.º, sob a epígrafe, “Renovação de autorização de residência temporária” que 1- A renovação de autorização de residência temporária deve ser solicitada pelos interessados até 30 dias antes de expirar a sua validade.
2 - Só é renovada a autorização de residência aos nacionais de Estados terceiros que:
a) Disponham de meios de subsistência tal como definidos pela portaria a que se refere a alínea d) do n.º 1 do artigo 52.º;
b) Disponham de alojamento;
c) Tenham cumprido as suas obrigações fiscais e perante a segurança social;
d) Não tenham sido condenados em pena ou penas, que, isolada ou cumulativamente, ultrapassem 1 ano de prisão.
Ou seja, para que um cidadão estrangeiro possa ver deferida uma pretensão de renovação de autorização de residência, torna-se necessário, entre outros pressupostos, que disponha de meios de subsistência e de alojamento.
No caso em apreço nos autos, como verificámos, o indeferimento da pretensão do Autor apenas teve como fundamento estes dois pressupostos considerando-se os outros como estando preenchidos.
Vem, no entanto, o Autor, em primeiro lugar referir que o seu pedido se encontrava deferido tacitamente, pelo que não poderia o mesmo ser revogado.
Na verdade, refere o artigo 82º que… “2 - O pedido de renovação de autorização de residência deve ser decidido no prazo de 30 dias.
3 - Na falta de decisão no prazo previsto no número anterior, por causa não imputável ao requerente, o pedido entende-se como deferido, sendo a emissão do título de residência imediata”.
O Autor solicitou, em 21 de Janeiro de 2010, a renovação da autorização da sua residência. Assim sendo, ultrapassado o prazo de trinta dias úteis (artigo 72º do CPA), a sua pretensão tem de ser considerada deferida tacitamente, nos termos do referido n.º 3 do artigo 82º. Ou seja, no dia 6 de Março de 2010, como nada foi referido, entretanto, pela entidade demandada, o Autor viu a sua pretensão ser deferida tacitamente.
Verifica-se, no entanto, da matéria de facto dada como provada, que em 14 de Junho de 2010, o autor foi notificado do indeferimento expresso da sua pretensão, levantando-se agora a questão de saber se a entidade demandada poderia ou não proceder à revogação do deferimento tácito.
No nosso ordenamento jurídico impera o princípio da livre revogabilidade dos actos administrativos, como consta do artigo 140º do CPA, no entanto, com as excepções aí referidas. Entre outras, refere a alínea b), n.º 1, do referido artigo 140º, que não são revogáveis os actos que forem constitutivos de direitos ou de interesses legalmente protegidos. No entanto, nos termos do artigo 141º do CPA, podem ser revogados os actos que sejam inválidos, com fundamento nessa invalidade e dentro do prazo do recurso contencioso (no caso dos autos), ou seja, dentro do prazo de um ano, um vez que é este o prazo (mais longo - n.º 2) para o Ministério Público poder impugnar os actos anuláveis.
Assim sendo, temos de verificar se o deferimento tácito que se verificou na esfera jurídica do Autor quanto ao pedido de renovação de autorização de residência, tem de se considerar como sendo um acto ilegal, ou seja, se procede a ausência de algum dos pressupostos que o Autor tem de preencher para que nos termos do artigo 78º, n.º 2, possa ver deferida a sua pretensão.
De notar, no entanto, que a nossa análise tem de se cingir à data da prática do deferimento tácito. Ou seja, como este acto só pode ser revogado se o mesmo for ilegal, as causas de invalidade têm que se reportar a esta data e não a factores de verificação superveniente, uma vez que vigora no nosso ordenamento jurídico o princípio tempus regit actum.
O primeiro pressuposto que a entidade demandada refere que não se encontrava cumprido, como já verificámos, prende-se com o facto de o Autor não fazer prova de que dispõe de meios de subsistência.
De acordo com o artigo 2º da Portaria n.º 1563/2007, de 11 de Dezembro, que fixa os meios de subsistência de que devem dispor os cidadãos estrangeiros para a entrada e permanência em território nacional, o critério para a determinação dos meios de subsistência é efectuado por referência à retribuição mínima mensal garantida.
O Autor, para prova deste pressuposto, juntou extracto de remunerações emitido pela segurança Social, de 2006/12 a 2009/11, onde se verifica que no ano de 2009 o Autor teve remunerações em vários meses.
Entregou ainda declaração de Rendimentos em sede de IRS, entregue nos serviços a 14/03/2009, referente ao ano de 2008, onde consta o rendimento ilíquidos de 5 051, 18 Euros.
De acordo como Decreto-Lei n.º 246/2008, de 18 de Dezembro, a retribuição mínima mensal garantida ascende a € 450,00.
Ora, analisando o extracto de remunerações da segurança social, verifica-se que no ano de 2009 o Autor recebeu, na maioria dos meses, a remuneração mínima garantida. Por seu lado cotejando esta informação com a declaração de rendimentos do ano de 2008 não se pode concluir que o Autor não disponha de um rendimento mínimo, verificando-se ainda que procede ao pagamento das suas contribuições. Por seu lado, posteriormente, veio a verificar-se que no ano de 2010 o Autor veio ainda a declarar rendimentos que andam à volta do rendimento mínimo garantido, que neste caso ascende a 475,00 Euros mensais (Decreto-Lei 5/2010, de 5 de Janeiro). Ou seja, não se pode concluir como concluiu a entidade demandada que o Autor não dispõe de meios de subsistência.
De notar que a entidade demandada ao indeferir a pretensão do Autor veio invocar, neste campo, a sua eventual prestação de trabalho com a empresa P. …, referindo que o requerente desde Novembro de 2009 não possui qualquer desconto efectuado àquela firma, nem qualquer outro desde Novembro de 2009. Por seu lado fez diligências no sentido de saber se o Autor ainda se encontrava a exercer funções naquela empresa, tendo pela mesma sido referido que o cidadão nunca compareceu no local. Refere ainda a entidade demandada que, quanto ao IRS de 2008, o A. não fez prova da sua entrega.
A entidade demandada para proceder a esta sua análise baseou-se apenas no extracto de remunerações até 2009/11 (n.º 1 do probatório). No entanto, como se vê da declaração junta pelo Autor referente à entrega das remunerações On-Line da empresa P. … Lda., e pelo extracto de remunerações emitido pela Segurança Social, junto aos autos, e de onde consta já o ano de 2010 (n.º 12 do probatório), verifica-se que tal informação não está correcta. Na verdade constam neste extracto remunerações referentes ao mês de Dezembro de 2009, Fevereiro e Março de 2010, bem como outros meses posteriores a Abril de 2010. Ou seja, não se pode concluir como concluiu a entidade demandada que o Autor não tenha descontos desde Novembro de 2009. Por seu lado quanto à empresa P. … Lda verifica-se que o Autor recebeu remunerações, no mínimo desde Dezembro de 2009 a Março de 2010, pelo que se tem de concluir que trabalhou para a empresa em questão. Por seu lado, verifica-se ainda que o Autor entregou a sua declaração de IRS referente ao ano de 2008 contrariamente ao referido pela entidade demandada (n.º 2 do probatório).
De todo o exposto se conclui que se encontra preenchido, à data do deferimento tácito da pretensão do autor, o pressuposto referente à alínea a), do n.º 2 do artigo 78º.
Refere a entidade demandada que não se comprovado que a morada fornecida pelo Autor seja a sua residência efectiva, até porque das diligências efectuadas se conclui que a casa em questão se encontrava arrendada, desde Janeiro de 2010, a um outro cidadão marroquino.
De acordo com a alínea b). n.º 2. do artigo 78º, é pressuposto para a renovação da autorização de residência que os candidatos disponham de alojamento. Nada mais é referido neste aspecto. Como muito bem refere o Digno magistrado do Ministério Público, no seu douto parecer, “o alojamento pode ser uma hospedagem em casa de familiar, ou de terceiro, ou em local cedido pela entidade empregadora, não sendo também necessário que haja uma permanência efectiva diária na morada apresentada, tendo até em conta a mobilidade do trabalhador. No fundo o que a lei pretende… é que a pessoa demonstre que tem um local onde se aloje e não constitua mais um “ sem abrigo”. Na verdade o artigo 78º, neste aspecto, vem exigir que os candidatos disponham de alojamento, ou seja, de um acolhimento, e não que disponham de um contrato de arrendamento, como parece concluir-se da posição da entidade demandada. Ora, o autor juntou um atestado da Junta de Freguesia de … onde se atesta que o mesmo reside no local referido. Não foi invocado qualquer reparo ao mesmo. Depois, verifica-se dos extractos da segurança Social, emitidos em nome do Autor, que a sua morada é na Rua …. De notar ainda que a entidade demandada remeteu ao Autor, para a morada indicada (Rua ….), através de carta registada com aviso de recepção, não só um pedido de actualização de dados (n.º 4 do probatório), como procedeu à audição do Autor para efeitos de audiência prévia (n.º 5 do probatório). Teve como boa esta morada.
O Autor apresenta ainda cópia de um contrato de arrendamento (n.º 6 do probatório).
Ou seja, de todo o exposto tem de se concluir que o Autor dispõe de alojamento. Pode não estar sempre presente no mesmo, mas é onde recebe a sua correspondência e sobre o qual procedeu à celebração de um contrato de arrendamento, pelo que também este pressuposto se encontra preenchido.
Estando preenchidos estes dois pressupostos, referentes aos meios de subsistência e ao alojamento, o deferimento tácito da pretensão do Autor não pode ser considerado ilegal, pelo que não podia a entidade demandada ter emitido acto de indeferimento expresso da sua pretensão. Assim sendo, e pelos fundamentos expostos tem de se anular o acto de indeferimento expresso da pretensão do Autor, notificado a 14 de Junho de 2010. Anulado este acto, mantém-se em vigor o deferimento tácito da sua pretensão, ficando assim satisfeita a sua pretensão referente à prática do acto devido.”
X
Na óptica do recorrente esta sentença viola a lei substantiva - a Lei nº 23/2007, de 4 de Julho e a Portaria nº 1563/2007, de 11 de Dezembro - já que procedeu a um incorrecto enquadramento dos factos, para além de padecer de erro de direito, na medida em que, contrariamente ao julgado, o recorrente logrou comprovar a susceptibilidade de prolação de acto de indeferimento expresso, uma vez que o deferimento tácito ocorreu em sede de um acto ilegal.
Vejamos.
Resulta do transcrito que o senhor juiz considerou preenchidos os pressupostos exigidos nas alíneas a) e b) do nº 2 do artº 78º da Lei n° 3/2007 de 4 de Julho Artigo 78º da Lei nº 23/2007, de 4 de Julho.
Renovação de autorização de residência temporária
1-A renovação de autorização de residência temporária deve ser solicitada pelos interessados até 30 dias antes de expirar a sua validade.
2-Só é renovada a autorização de residência aos nacionais de Estados terceiros que:
a) Disponham de meios de subsistência tal como definidos pela portaria a que se refere a alínea d) do nº 1
do artigo 52º;
b) Disponham de alojamento;
c)…., (e nos quais a entidade recorrente se fundamentou para o indeferimento da concessão de autorização de residência temporária do ora recorrido), pelo que, decidiu que a ocorrência do deferimento tácito da pretensão do requerente não foi ilegal.
Desta feita, a primeira questão a decidir é a de saber quais as consequências jurídicas de ter sido proferido um acto de indeferimento expresso, depois de ultrapassado o prazo a que se refere o artº 82º nº 2º da Lei nº 23/2007, de 4 de Julho Artº 82.º da Lei º 23/2007, de 4 de Julho.
Decisão e notificação
1- O pedido de concessão de autorização de residência deve ser decidido no prazo de 60 dias.
2- O pedido de renovação de autorização de residência deve ser decidido no prazo de 30 dias.
3- Na falta de decisão no prazo previsto no número anterior, por causa não imputável ao requerente, o pedido entende-se como deferido, sendo a emissão do título de residência imediata.
4- A decisão de indeferimento é notificada ao interessado, com indicação dos fundamentos, bem como do
direito de impugnação judicial e do respectivo prazo, sendo enviada cópia ao Conselho Consultivo.
Com efeito, formando-se o acto de deferimento tácito -nº 3 do artº 82º da lei citada-, a questão que se coloca é a da violação de um acto tácito constitutivo de direitos (formado por força do referido preceito legal), ou seja, apurar as consequências jurídicas de ter sido proferido um acto de indeferimento expresso, posteriormente à formação de um acto tácito de deferimento.
Diga-se já que a consequência de não ser cumprido o prazo de 30 dias úteis, previsto no artº 82º da Lei nº 23/2007, não é, sem mais e só por isso, geradora de invalidade de um posterior acto de indeferimento expresso.
Aliás os autos atestam que o recorrente não esteve parado mas sim a diligenciar no sentido da comprovação dos pressupostos invocados pelo ora recorrido. Logo, o acto em que importa atentar é o de indeferimento expresso proferido em 9 de Junho de 2010-ponto nº 7 do probatório.
Tendo em conta os factos referidos e tendo sido proferido um acto de indeferimento expresso impõe-se saber se este obedeceu às regras gerais da revogação dos actos constitutivos de direitos.
Como é sabido, nos termos do artº 141º, nº 1, do CPA os actos revogatórios de actos constitutivos de direitos são válidos, desde que proferidos dentro do prazo de um ano (n.º 2) com fundamento em ilegalidade. Deste modo para que o acto de indeferimento expresso fosse anulado o interessado tinha de atacar a respectiva invalidade, nomeadamente, por ter sido proferido para além do prazo de um ano, ou por não se verificar a ilegalidade imputada ao acto revogado.
Ora, o acto revogatório foi proferido menos de um ano depois da formação do acto tácito (-06/03/2010-, isto é a partir do requerimento formulado em 21/01/2010, já que foi proferido em 09/06/2010), razão pela qual é inatacável quanto ao prazo.
E o que dizer quanto aos fundamentos em que se alicerça esse acto de indeferimento expresso?
Segundo este o ora impugnante não comprovou deter meios de subsistência, pois:
-não chegou a exercer funções no âmbito do contrato apresentado em sede de instrução do pedido de renovação da autorização de residência;
-não comprovou igualmente o cumprimento das suas obrigações fiscais (foi apresentada cópia do IRS de 2008, sem que haja qualquer documento confirmativo da entrega pessoal ou por via electrónica nas Finanças), razão pela qual o rendimento nela declarado não pode à data do pedido ser considerado;
-não demonstrou igualmente ter cumprido as suas obrigações perante a Segurança Social, visto que não apresenta qualquer desconto desde 2009;
-também não comprovou a existência de condições de alojamento, pois que se apurou que a morada que constava no referido Atestado da Junta de Freguesia, dizia respeito a um imóvel arrendado a outro cidadão marroquino, de nome M. …, desde Janeiro de 2010 e contactada a proprietária da casa, esta informou: “ Ter alugado a casa a diversas cidadãos marroquinos, por um ou dois meses, e que posteriormente deixam a casa, invocando encontrarem-se a trabalhar no mar” (cfr. o Relatório de 23/04/2010, da Delegação da Figueira da Foz).
De facto, a lei elencou como requisito imperativo para a renovação de autorização de residência temporária a posse de meios de subsistência.
E a natureza desses meios e os respectivos quantitativos surgem identificados na Portaria nº 1563/2007, de 11/12, designadamente, em sede do artº 2º infra transcrito:
“ 1. Para efeitos da presente portaria, considera-se Meios de subsistência os recursos estáveis e regulares que sejam suficientes para as necessidades essenciais do cidadão estrangeiro (…) designadamente para alimentação, alojamento e cuidados de saúde e higiene (…).
2. O critério de determinação dos meios de subsistência é efectuado por referência à retribuição mensal mínima garantida (…) atenta a respectiva natureza e regularidade líquida de quotizações para a segurança social com a seguinte valoração per capita em cada agregado familiar:
a) Primeiro adulto 100% (…)”.
b) (…)
Constitui princípio geral da regulação da circulação das pessoas, acolhido quer em normas de direito interno quer em instrumentos internacionais, que nenhum cidadão estrangeiro pode entrar e /ou permanecer no território de um determinado país sem que disponha de meios de subsistência, por forma a não constituir encargo para o Estado de acolhimento.
O recorrente alega que, no caso concreto, ao contrário do entendimento da sentença, resulta inequívoco que o aqui recorrido não logra preencher dois dos requisitos cumulativos elencados na lei para a renovação de autorização de residência – a posse dos meios de subsistência e de condições de alojamento.
Como tal conclui que a sentença procedeu a um incorrecto enquadramento dos factos.
Ora, tem razão o recorrente quando alega que, para aferir da observância da posse de meios de subsistência, não se pode bastar com juízo de probabilidade, havendo de recorrer aos meios de prova em Direito admitidos, nomeadamente, aos constantes do artº 63º nºs 1 a 3 do Decreto Regulamentar nº 84/2007, de 5/11, a seguir transcritos:
1- O pedido de renovação de autorização de residência temporária deve ser acompanhado dos seguintes documentos:
a) (…)
b) Comprovativo da posse de meios de subsistência, nos termos a definir na portaria na portaria a que se refere a alínea d) do nº1 do artigo 52º da Lei nº 23/2007, de 4 de Julho;
c) Comprovativo de que dispõe alojamento;
d) (…)
2- O pedido é ainda instruído com informação necessária para a verificação do cumprimento das obrigações fiscais e perante a segurança social (…)
3- O pedido de renovação de autorização de residência emitida para o exercício de uma actividade profissional é ainda acompanhado dos acompanhados dos seguintes documentos:
a) Contrato de trabalho ou declaração da entidade empregadora confirmando a manutenção de relação laboral ou de outra entidade legalmente autorizada; ou
b) Contrato de prestação de serviços ou requerimento para a verificação da declaração de IRS junto da administração tributária, por forma a atestar a manutenção da actividade;
4- (…)
5- (…)
À data, exigia-se ao cidadão estrangeiro que efectuasse pedido de renovação de autorização de residência que auferisse rendimentos anuais idênticos aos legalmente exigidos para a concessão do tipo de visto de residência correspondente. (cfr. Artigo 7º da portaria).
Desta forma, o cidadão estrangeiro que pretendesse renovar a autorização de residência temporária em 2010, deveria comprovar ser possuidor em 2009, de meios de subsistência no valor mínimo de Euros 2.803,50 (Dois mil oitocentos e três euros e cinquenta cêntimos).
Advoga ainda o recorrente que o aqui recorrido não lograva à data auferir tal quantitativo, pois em 2008 não tinha apresentado prova válida dos rendimentos auferidos, e, relativamente ao ano de 2009, apresentou um contrato de trabalho com a empresa P. … celebrado em Dezembro de 2009, cuja relação laboral não foi comprovada pois nunca compareceu no local de trabalho. (cfr.o relatório da Delegação do SEF da Figueira da Foz de 23/04/2010).
Desta feita conclui que foi o apuramento deste condicionalismo factual que esteve na base do indeferimento do pedido, em consonância com a Lei nº 23/2007, de 4 de Julho e a Portaria nº 1563/2007, de 11 de Dezembro.
Ora atentos estes elementos trazidos pelo recorrente, o vício de incorrecto enquadramento dos factos que é imputado à sentença, a circunstância desta, em sede de motivação da factualidade levada ao probatório, se limitar a “explicar” que considerou provada a matéria de facto, com relevância para a decisão, “Com base nos documentos junto aos autos e no processo administrativo” e o facto do aqui recorrido ter indicado testemunhas e alegado que está a ser vítima de um processo burocrático, impõe-se, antes de mais e de molde a desfazer quaisquer dúvidas, determinar que o Tribunal a quo ouça as testemunhas arroladas e as confronte com os elementos recolhidos pelo recorrente.
Na verdade, como este não deixa de invocar, para aferir da observância da posse de meios de subsistência, não nos podemos bastar com um juízo de probabilidade.
Além disso, de acordo com os ditames do princípio do inquisitório, da legalidade e da necessidade da busca da verdade material, o Tribunal pode/deve averiguar a efectiva existência/veracidade/cumprimento dos requisitos legais necessários à procedência da pretensão do recorrido, não se bastando com a mera apresentação formal de documentos exibidos, salvo os documentos dotados de eficácia probatória plena.
A prova tem de ser apreciada de forma crítica.
O recorrente invoca, e bem, que não exige que cada cidadão estrangeiro seja proprietário ou arrendatário do imóvel onde se aloja, porquanto, naturalmente tem em consideração a mobilidade imanente aos trabalhadores; porém, “é também igualmente óbvio que um cidadão tem de ter uma morada certa e efectiva e que não sirva apenas para receber a correspondência.”
A propósito da nossa posição em matéria de apreciação da prova, ainda que num contexto diferente, sumariámos o seguinte:
(…)
II.1- A garantia do duplo grau de jurisdição da matéria de facto não subverte o princípio da livre apreciação da prova por parte do julgador, sendo que na formação da convicção daquele quanto ao julgamento fáctico da causa não intervêm apenas elementos racionalmente demonstráveis, mas também factores não materializados, pois a valoração de um depoimento é algo absolutamente imperceptível na gravação e/ou na respectiva transcrição.
III- Ao tribunal compete ainda justificar os motivos da decisão sobre a matéria de facto, revelando as razões que o levaram a certa conclusão e não a outra, perante os meios de prova produzidos e posições que as partes tomaram nos articulados sobre a factualidade em discussão -nº 2 do artº 653º do C.P.Civil.
IV- A exigência da motivação da decisão não se destina a obter a exteriorização das razões psicológicas da convicção do juiz, mas a permitir que o juiz convença os terceiros da sua correcção. Através da fundamentação, o juiz passa de convencido a convincente.-ac. deste TCAN de 16/12/2011, no rec. nº 00315/11.2BECBR-A (http://www.dgsi.pt/jtcn.).
Daqui decorre que a decisão posta em crise não pode manter-se na ordem jurídica.
O Tribunal tem de ouvir as testemunhas oportunamente apresentadas, analisar a prova documental junta aos autos e ao processo administrativo, confrontar aquelas com estes elementos, e só depois poderá proferir sentença que avalie da legalidade (ou não) do acto de indeferimento expresso sub judice vide o Decreto-Lei nº 252/00, de 16/10, que no artigo 1º, estipula que: “ 1. O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (…) é um serviço de segurança, organizado hierarquicamente na dependência do Ministro da Administração Interna (…) e que no quadro da política de segurança interna, tem por objectivos fundamentais controlar (…) a permanência e actividades de estrangeiros em território nacional (…)
Estipulando o artº 2º daquele diploma que “ São atribuições do SEF:
(…)
e) Controlar e fiscalizar a permanência e actividades dos estrangeiros em todo o território nacional;
(…), sendo que esta validade tem de ser aferida por referência ao momento da prática do deferimento tácito, isto é, tendo presente que o recorrido tinha de preencher os requisitos legais vinculativos à data de 06 de Março de 2010.
Procedem, assim, as conclusões da alegação de recurso.
DECISÃO
Termos em que se acorda em conceder provimento ao recurso e, em consequência, revogar a sentença recorrida e determinar a baixa dos autos à 1ª instância, de molde a ouvir as testemunhas arroladas e de seguida proferir decisão que avalie se o acto de indeferimento expresso do pedido, proferido em 09 de Junho de 2010, que revogou o deferimento tácito anteriormente ocorrido, é ou não válido.
Custas pelo recorrido.
Notifique e DN.
Porto, 24/02/2012
Ass. Fernanda Brandão
Ass. José Augusto Araújo Veloso
Ass. Antero Pires Salvador