Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00976/11.2BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:06/06/2019
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Paula Moura Teixeira
Descritores:ÁREA BRUTA DEPENDENTE, ÁREA BRUTA PRIVATIVA; AVALIAÇÃO COM BASE NO PREÇO DE MERCADO.
Sumário:
I. A lei define como área bruta privativa a superfície total medida pelo perímetro exterior e eixos das paredes ou outros elementos separadores do edifício ou da fração, incluindo varandas privativas fechadas, caves e sótãos privativos com utilização idêntica à do edifício ou da fração, a que se aplica o coeficiente 1.
II. Da interpretação do n.º 3 do art.º 40.º do CIMI, decorre que, a primeira subsunção a efetuar é, quanto à área bruta privativa, e só se nela não couber é que se passará a poder subsumir na categoria da área bruta dependente.
III. A norma do citado n.º 3 dá expressa primazia ao referir-se que os elementos que menciona, - as garagens, os parqueamentos, as arrecadações, as instalações para animais, os sótãos ou caves acessíveis e as varandas - poderão constituir a área bruta dependente se não forem de integrar na área bruta privativa, pelo que cabendo nesta primeira, já não torna necessário saber se também poderiam ser integrados naquela outra. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:AMFG
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Votação:Unanimidade
Decisão:
Anular a decisão recorrida
Ordenar a baixa dos autos
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
O Recorrente AMFG, melhor identificado nos autos, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Braga, que julgou improcedente a pretensão pelo mesmo deduzida, no âmbito da presente impugnação judicial visando a 2.ª avaliação para efeitos de liquidação de imposto municipal sobre imóveis (IMI) efetuada pelo Serviço de Finanças de Guimarães, relativa ao prédio urbano sito na Travessa M..., freguesia da Costa, concelho de Guimarães, inscrito na respetiva matriz sob o art.º 1483º. a que foi atribuído o valor patrimonial tributário (VPT) de € 683.330,00.
Por despacho proferido em 14.03.2012, foi deferida a intervenção provocada, requerida pela Recorrida Fazenda Pública, da sociedade IVNI, S.A., a qual veio nos termos do art.º 327.º do CPC fazer seus os articulados da impugnante.
*
O Recorrente interpôs dois recursos sendo um do despacho interlocutório que dispensou a inquirição de testemunhas e outro sobre decisão final, a saber:
A) Recurso de Despacho Interlocutório.
Por despacho do MM Juiz titular do processo de 15.11.2011 (fls 74 do processo em suporta físico) foi dispensada a prova testemunhal, com o qual não concordou tendo interposto recurso, o qual subiu a final.
E para tal formulou nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem:
“(..) 1ª - A decisão em crise dispensou a produção de prova testemunhal, em virtude de considerar que os factos alegados pelo impugnante para o efeito são meras conclusões ou se mostram irrelevantes para o cerne da questão decidenda.
2ª - No âmbito dos presentes autos, veio o impugnante colocar em causa a 2.ª avaliação realizada pela administração fiscal quanto ao prédio urbano destinado a habitação, sito na Travessa M..., freguesia da Costa, concelho de Guimarães, inscrito na matriz predial urbana da freguesia da Costa sob o artigo 1483.
3ª- A errada determinação de qualquer um dos elementos integrantes da expressão contida no artigo 38°, n° 1, do CIMI conduz, necessariamente, a uma incorrecta determinação do valor patrimonial tributário do prédio avaliado.
4ª - Um dos factores constantes daquela expressão é o factor "A" o qual corresponde à área de construção mais a área excedente à área de implantação, calculado nos termos do disposto no artigo 40°, n° 1, do CIMI.
5ª - A errada quantificação de cada um dos factores desta expressão do artigo 40°, n° 1, do CIMI resultará na errada determinação da área bruta de construção e da área excedente à de implantação do prédio objecto de avaliação, o que, por sua vez, levará à errada quantificação do seu valor patrimonial tributário.
- Por forma a permitir uma correcta determinação da área bruta de construção e da área excedente à de implantação do prédio objecto de avaliação, importará, sempre, determinar quer a sua área bruta privativa do prédio (Aa) quer a sua área bruta dependente (Ab).
7ª - Para definir qual a área bruta privativa e qual área bruta dependente ter-se-á de definir quais os espaços de utilização coincidente com prevista para o prédio, caso em que estaremos perante áreas brutas privativas, e quais os espaços cuja utilização é acessória relativamente ao uso a que o prédio se destina, caso em que estaremos perante áreas brutas dependentes.
8ª - A utilização de cada um dos espaços tem de ser apurada através das características, especialidades, acabamento e utilização dada a cada um desses espaços.
9ª - O cerne da presente impugnação prende-se com a determinação da área bruta privativa do prédio (Aa) e da área bruta dependente (Ab).
10ª - Na sua impugnação o recorrente alegou factos que permitem distinguir e qualificar os espaços de área bruta privativa e de área bruta dependente, fazendo alusão às características de tais espaços, aos acabamentos nele empregues e qual a utilização que lhes é dada.
11ª - A prova das características, especificidades, acabamentos empregues e a utilização que lhes é dada é essencial para qualificar os espaços como sendo de área bruta privativa ou de área bruta dependente.
12ª - De acordo com as várias soluções plausíveis do direito, é necessário fazer prova testemunhal sobre os factos alegados em sede de impugnação.
13ª- A decisão em crise viola o disposto nos arts. 114° e 115° do Código de Processo e Procedimento Tributário.
Termos em que, com o douto suprimento de Vossas Excelências, se deverá julgar totalmente procedente o presente recurso, revogando-se a decisão recorrida, fazendo-se assim a costumada JUSTIÇA !
B) Recurso de Decisão Final
O Recorrente não conformado com a decisão final interpôs recurso, tendo formulado as seguintes conclusões que se reproduzem:
“(…)
1- O recorrente formulou na impugnação dois pedidos totalmente distintos, independentes e autónomos entre si.
2- O Tribunal "a quo", na sentença recorrida não só não se pronunciou sobre o segundo pedido formulado na impugnação como também não declarou que dela não podia tomar conhecimento.
3- Tal comportamento constitui omissão de pronúncia vício que enferma de nulidade a sentença ora recorrida, cfr. arts. 660°, n.° 2, e 668°, n.° 1, al. b) e d), do Código de Processo Civil.
4- O Tribunal " a quo" não só não considerou como provado que o prédio objecto de avaliação possuísse as áreas brutas privativas e as áreas brutas dependentes contantes da avaliação promovida pela administração tributária, como também não deu como provado que o mesmo prédio possuísse as áreas brutas privativas e dependentes alegadas pelo recorrente, pelo que não poderia ter proferido a decisão ora recorrida.
5- Pois, para o fazer, teria de ter dado como provado que o prédio objecto de avaliação possuía às áreas brutas privativas e as áreas brutas dependentes constantes da avaliação, o que não sucedeu.
6- Ao não constar da sentença recorrida nenhum daqueles factos, fossem os constantes da avaliação impugnada, fossem os alegados pelo ora recorrente, e sendo os mesmos essenciais para a boa decisão da causa segundo as várias soluções plausíveis de direito, terá de se concluir que é a sentença recorrida omissa quanto aos factos essenciais para justificar a decisão proferida nos presentes autos, o que, nos termos do disposto no art. 668°, n° 1, al. b), do CPC, implica a sua nulidade.
7- O Tribunal "a quo" não podia ter proferido decisão quanto à matéria de facto relevante sem que previamente tivesse tido em consideração o requerimento de prova apresentado pelo ora recorrente, pois a sua produção era essencial para demonstração dos factos por este alegados.
8- Na impugnação judicial foram formuladas questões de facto e não só questões de direito.
9- A decisão da causa deve ser feita segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito e não apenas de acordo com a decisão que o Tribunal pondera proferir.
10- Tendo decidido sobre a matéria de facto sem, pelo menos, a produção de prova testemunhal requerida pelo Recorrente e tendo desconsiderado in integrum toda a factualidade por este alegada, incorreu a decisão recorrida em manifesto erro de julgamento.
11- Porque os autos não contêm os elementos probatórios que permitam ao Tribunal conhecer da acção, impõe-se, ao abrigo do disposto no art° 712° n.° 4, do CPC, anular a decisão recorrida com a consequente remessa dos autos ao tribunal de 1.ª instância, para aí se efectuarem as diligências instrutórias que se mostrem necessárias com vista à fixação da factualidade relevante em ordem à decisão da causa.
12- A decisão recorrida radica na premissa de que o sistema de avaliações introduzido com a aprovação do CIMI assenta em factores exclusivamente objectivos.
13- O valor patrimonial de um qualquer prédio avaliado nos termos do CIMI corresponde ao resultado obtido pela aplicação da fórmula VPT = VC x A x CA x CL x CQ x CV, sendo certo que nem todos os elementos que integram aquela fórmula são estritamente objectivos.
14- A destrinça entre áreas brutas privativas e áreas brutas dependentes assenta na concreta utilização de um espaço como sendo acessório ou integrador da utilização principal a que se destina o imóvel.
15- A sentença recorrida não só não dá como provada a quantificação de cada uma das áreas que integram o imóvel, como também nada refere no que respeita a que espaços terá considerado como sendo integrantes da área bruta privativa e quais os espaços considerados como integrantes da área bruta dependente.
16- Tal como a sentença recorrida, também a avaliação impugnada é totalmente omissa quanto a esta matéria pois também não refere quais as concretas áreas que nessa avaliação foram consideradas como integrantes da sua área bruta privativa do prédio ou as integrantes da sua área bruta dependente.
17- Todos os espaços destinados à vivência diária e habitual de quem habita o imóvel objecto de avaliação deverão ser enquadradas no conceito de área bruta privativa.
18- Para o correcto desenvolvimento da fórmula VPT = VC x A x CA x CL x CQ x CV importará quantificar devidamente o factor A nela indicado, o qual corresponde à área de construção mais a área excedente à área de implantação do prédio avaliado, valor que é obtido, nos termos do disposto no artigo 40°, n° 1, do CIMI, de acordo com a expressão A = (Aa + Ab) x Caj + Ac + Ad.
19- Ou seja, da errada quantificação de cada um dos factores desta última expressão resultará a errada determinação da área bruta de construção e da área excedente à de implantação do prédio objecto de avaliação, o que, por sua vez, levará à errada quantificação do seu valor patrimonial tributário.
20- Logo, para permitir uma correcta determinação da área bruta de construção e da área excedente à de implantação do prédio objecto de avaliação, importaria, antes de mais, que o Tribunal "a quo" determinasse quer a área bruta privativa (Aa) quer a área bruta dependente (Ab) do prédio objecto de avaliação, porque, quanto mais não seja, as áreas brutas privativas são quantificadas de acordo com o coeficiente 1 ao passo que as áreas brutas dependentes são quantificadas de acordo com o coeficiente 0,30.
21- O Tribunal " a quo" não fez.
22- A matéria dada como provada pelo Tribunal "a quo" evidencia que o prédio objecto da avaliação impugnada possui características próprias quer ao nível dos seus espaços quer dos materiais que foram utilizados na sua construção, características essas que o permitem diferenciar de outros imóveis construídos na zona em que o mesmo se encontra impantado, sendo também bem evidenciadora da sumptuosidade, áreas invulgares e da arquitectura que o caracterizam.
23- O valor patrimonial tributário do imóvel que resultou da avaliação impugnada é inferior em mais de 15% ao valor de mercado do imóvel, seja este considerado o valor da avaliação de mercado junta aos autos (1.670.000,00€), seja considerado o valor pelo qual o imóvel foi efectivamente transacionado (1.350.000,00€).
24- Tais características diferenciadoras e a distorção entre o valor patrimonial tributário e o valor de mercado do imóvel obrigariam, nos termos do art. 76° do CIMI, à realização de uma nova avaliação do imóvel embora apenas para efeito de IRS, IRC e IMT.
25- Tal avaliação, destinada apenas para efeitos de IRS, IRC e IMT, nunca foi efectivamente efectuada o que acarretou um grave prejuízo para o ora recorrente em sede de cálculo do seu IRS.
26- Pelo que a omissão de pronúncia por parte do Tribunal "a quo" sobre este segmento do pedido formulado pelo recorrente importa-lhe um grave prejuízo e fundamenta, como se disse já, a nulidade da sentença proferida.
27- Entende o recorrente que os documentos por si juntos aos autos, nomeadamente a planta do imóvel e o seu relatório de avaliação, acompanhados dos elementos constantes do processo administrativo, nomeadamente o comprovativo provisório da 2ª avaliação, habilitavam o Tribunal "a quo" a considerar como provados os seguintes factos:
"12 - O prédio avaliado possui a área bruta privativa de 912m2 e não de 583m2.
13- O prédio avaliado possui a área bruta dependente de 159m2 e não de 492m2.
14- O prédio avaliado possui um valor de mercado não inferior a 1.350.000,00€
15- O prédio avaliado possui características valorativas que o diferenciam do padrão normal para a zona no qual se encontra integrado, designadamente no que respeita à sua sumptuosidade, área e arquitectura.
16- O valor patrimonial tributário do prédio avaliado é inferior, em mais de 15%, ao seu valor de mercado."
28 - A decisão em crise viola as disposições conjugadas dos artigos 660°, n.° 2 e 668° n.° 1 al. b) e d) do Código de Processo Civil e 40°, n° 1, 2 e 3 e 76°, n° 3 e 5 do CIMI..
Termos em que se requer seja revogada, por ser nula, a sentença recorrida, ou, caso assim não se entenda, seja reformulada a matéria assente de modo a que da mesma passa a constar a matéria supra elencada alterando-se a decisão proferida, seguindo-se os demais termos, fazendo-se assim a habitual justiça.(…)”
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A Recorrida e a sociedade IVNI, S.A., (chamado por intervenção provocada) não intervieram nos autos.
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O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
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Colhidos os vistos das Exmªs Juízas Desembargadoras Adjuntas, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.
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2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, as quais são delimitadas pelas conclusões das respetivas alegações, sendo:
A) No recurso interlocutório, as de saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao dispensar a inquirição de testemunhas:
B) No recurso da decisão final as de saber se a sentença incorreu em nulidade, por omissão de pronúncia, e por não especificação dos factos, (ii) erro de julgamento de facto e direito por errada interpretação e aplicação do disposto nos artigos 40.º n.º 2 e 3 do CIMI.
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3. DO JULGAMENTO DE FACTO
3.1. Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:
“(…)II. Factos
1) O prédio urbano sito na Travessa M..., freguesia da Costa, concelho de Guimarães, inscrito na respectiva matriz sob o art. 1483º, imóvel em questão nos presentes autos, foi doado ao impugnante pelos pais por escritura pública de doação celebrada em 13.01 .2010.
2) O prédio objecto de avaliação é um prédio urbano composto uma moradia T4 com logradouro, composta no seu rés-do-chão por quatro quartos, todos com vestíbulo, instalações sanitárias e zona de vestir, zona de átrio e distribuição, escritório, sala comum, sala de banhos com piscina interior, instalação sanitária de serviço e cozinha com lavandaria.
3) Essa moradia possui, na cave, zona de distribuição, garrafeira, duas instalações sanitárias de serviço, sala de jogos com zona de arrumos, sala de cinema, sala de desporto/ginásio com instalação sanitária de e vestiário/balneário com banho turco, despensa, garagem e área técnica.
4) Esta moradia, ao nível do seu exterior, foi construído em estrutura de betão armado com alvenaria dupla com isolamentos térmicos e acústicos, revestimentos de fachada ventilada em panos de granito e ardósia, composta com soluções de estrutura de ferro, caixilharia de alumínio com ruptura térmica e vidros duplos, estores exteriores em lâminas de alumínio reguláveis e com comandos eléctricos, cobertura com laje de betão com isolamentos e revestimentos a godo, sendo que o espaço exterior se encontra integralmente murado e arborizado com sistema de rega e iluminação do campo de jogos,
5) Ao nível dos seus acabamentos interiores, foram utilizados pavimentos em soalho de sucupira, granitos, mármores, linóleo, deck de madeira e cerâmicos, paredes estanhadas, revestidas a apainelados de madeira, granitos, mármore e ardósia, tectos falsos com várias soluções de luz indirecta e projectores, sendo certo que todos os espaços, incluindo a cozinha e as instalações sanitárias, possuem soluções e matérias de qualidade e estética apurados, ao que acresce um vasto conjunto de equipamentos instalados por toda a moradia, nomeadamente, ar condicionado, desumidificação, vídeo-vigilância e alarme.
6) Em 29.01.2010, o impugnante vendeu o referido prédio à sociedade "IVNI, S.A." pelo valor de 1.350.000,00€
7) 06.01.2010, anteriormente às referidas transmissões, tinha sido solicitada a avaliação do imóvel em causa, tendo sido indicado como motivo prédio novo.
8) Na modelo 1 que foi entregue, foram referidas as seguintes áreas:
Área total do terreno - 4.932m2;
Área de implantação do prédio - 600m2;
Área bruta de construção -1 .075m2;
Área bruta dependente - 492m2;
Área bruta privativa - 583m2.
9) Em resultado da avaliação, foi atribuído ao imóvel em questão o Valor Patrimonial Tributário (VPT) de € 683.330,00, sendo que, as áreas consideradas foram as declaradas na Modelo 1 e supra referidas.
10) Por requerimento datado de 16-11-2010, o Impugnante pediu 2ª Avaliação, alegando que " ... é medianamente claro que certas áreas que preenchem os requisitos para serem consideradas áreas brutas privativas, foram, na avaliação efectuada, indevidamente, consideradas áreas brutas dependentes",
11) Em 17 de Fevereiro de 2011, no seguimento do referido pedido, reuniu a Comissão de Avaliação, de que resultou um Termo de Avaliação, e do qual se retira que não houve acordo entre o perito regional, o vogal nomeado pela Câmara Municipal de Guimarães e o representante do sujeito passivo. (…)”.
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4. DO JULGAMENTO DE DIREITO
4.1. Uma vez, que vem alegado erro de julgamento de facto e de direito, iniciaremos pelo recurso da sentença recorrida.
Nas conclusões 1ª a 3ª o Recorrente imputa à sentença recorrida nulidade, por omissão de pronúncia, alega que formulou na impugnação dois pedidos totalmente distintos, independentes e autónomos entre si.
E que o Tribunal "a quo", na sentença recorrida não só não se pronunciou sobre o segundo pedido formulado na impugnação como também não declarou que dela não podia tomar conhecimento.
Tal comportamento constitui omissão de pronúncia vício que enferma de nulidade a sentença ora recorrida.
Prossegue na conclusões – 22ª a 26ª – alegando que a matéria dada como provada pelo Tribunal "a quo" evidencia que o prédio objeto da avaliação impugnada possui características próprias quer ao nível dos seus espaços quer dos materiais que foram utilizados na sua construção, características essas que o permitem diferenciar de outros imóveis construídos na zona em que o mesmo se encontra impantado, sendo também bem evidenciadora da sumptuosidade, áreas invulgares e da arquitectura que o caracterizam.
O valor patrimonial tributário do imóvel que resultou da avaliação impugnada é inferior em mais de 15% ao valor de mercado do imóvel, seja este considerado o valor da avaliação de mercado junta aos autos (1.670.000,00€), seja considerado o valor pelo qual o imóvel foi efetivamente transacionado (1.350.000,00€).
Tais características diferenciadoras e a distorção entre o valor patrimonial tributário e o valor de mercado do imóvel obrigariam, nos termos do art. 76° do CIMI, à realização de uma nova avaliação do imóvel embora apenas para efeito de IRS, IRC e IMT.
Tal avaliação, destinada apenas para efeitos de IRS, IRC e IMT, nunca foi efetivamente efetuada o que acarretou um grave prejuízo para o ora Recorrente em sede de cálculo do seu IRS.
Pelo que a omissão de pronúncia por parte do Tribunal "a quo" sobre este segmento do pedido formulado pelo Recorrente importa-lhe um grave prejuízo e fundamenta, a nulidade da sentença proferida.
Vejamos:
Nos artigos 125.º do CPPT e art.º 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC (correspondente ao ex-artigo 668.º), preveem como causa de nulidade da sentença a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou conheça questões de que não pode tomar conhecimento.
A omissão de pronúncia está relacionada com o dever que é imposto ao juiz pelo artigo 608.º, n.º 2 do CPC, (ex- artigo 660.º), em que se prevê que o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, ressalvando aquelas que forem prejudicadas pela solução dada a outra não podendo ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.
A nulidade da sentença, por omissão de pronúncia verifica-se quando existe uma omissão dos deveres de cognição do tribunal, o que sucederá quando o juiz não tenha resolvido todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação e cuja decisão não esteja prejudicada pela solução dada a outras.
É entendimento pacífico e reiterado da jurisprudência que a omissão de pronúncia existe quando o tribunal deixa, em absoluto, de apreciar e decidir as questões que lhe são colocadas, e não quando deixa de apreciar argumentos, considerações, raciocínios, ou razões invocados pela parte em sustentação do seu ponto de vista quanto à apreciação e decisão dessas questões.
Portanto, a nulidade só ocorre nos casos em que o tribunal não tome posição sobre qualquer questão sobre a qual devesse tomar posição, inclusivamente não decidindo explicitamente que não pode dela tomar conhecimento. (Cfr. acórdãos do STA n.ºs 574/11 de 13.07.2011 e 01200/12 de 12.02.2015 e do TCAN nos acórdãos n.ºs 01903/12.5 BEBRG de 26.09.2013, 1481/08.0BEBRG de 10.10.2013 e 02206/10.5BEBRG de 16.10.2014).
O Recorrente alega que na petição inicial que invocou dois pedidos totalmente distintos, independentes e autónomos entre si, sendo um deles o seguinte: “Mais se requer que por existir distorção entre o valor patrimonial tributário do prédio calculado nos termos do art.º 38.º ss do CIMI e o seu real valor de mercado, seja o prédio avaliado, para efeitos de IRS, IRC e IMT, nos termos do dispostos no artigo 46.º n.º2 do CIMI por remissão do artigo 75.º n.º 4 do mesmo Código.”
Compulsada a petição inicial nos pontos 52.º a 72.º desenvolve a causa de pedir que culmina com o pedido supra a final.
Com efeito o tribunal à quo não se pronunciou sobre esta questão o conduz à ocorrência da nulidade, de sentença por omissão de prónuncia.
O n.º 2 art.º 665.º do CPC prevê a hipótese de o TCA se entender que a apelação procede e nada obsta à apreciação daquela, dela conhece no mesmo acórdão em que revogar a decisão recorrida, sempre que disponha de elementos necessários.
E é jurisprudência deste tribunal espelhada nos acórdãos n.º 00104/03-Porto de 12.06.2014, 0820/06.2 BEVIS de 12.01.2012 e 0363/08.0 BEPNL de 13.11.2014 disponível em www.dgsi.pt., à exceção deste último que o TCAN conhecerá do mérito, em substituição, se os autos fornecerem os necessários elementos.
Consta do acórdão n.º 00104/03-Porto de 12.06.2014 com o qual se concorda sem reservas, que “(…) Porém, como se decidiu no Acórdão do S.T.A. de 17-10-2001, Proc. nº 26.193, tal conhecimento em substituição, apenas pode ter lugar quando o tribunal recorrido tenha conhecido e fixado o competente quadro probatório atinente à matéria do fundo da causa, já que o Tribunal superior pode alterar a matéria de facto fixada no probatório da sentença recorrida mas não se pode substituir por completo, àquele, no julgamento de tal matéria - cfr. nº 1 do art. 712º do C. Proc. Civil (actual art. 662º) - pelo que no caso, não tendo a M. Juiz do tribunal “a quo” fixado na sentença recorrida, qualquer matéria relativa às demais questões suscitadas quanto ao mérito da presente impugnação judicial, apenas tendo apreciada a aludida questão de inconstitucionalidade (e mesmo aqui sem considerar toda a dimensão da questão nos termos propostos pela impugnante) e considerada a matéria de facto relativa ao conhecimento da citada questão e na dimensão descrita, tal conhecimento em substituição logra inviabilizado, pelo que os autos terão de baixar à 1.ª Instância para tal matéria de facto ser julgada e ser proferida nova decisão em conformidade, se outro fundamento, diverso do ora decidido, a tal não obstar.(…)”
O tribunal à quo não se pronunciou sobre a questão, quer em termos de factos provados quer como factos não provados e não foi sido produzida prova testemunhal.
Nesta conformidade, este tribunal não dispõe dos elementos necessários para decidir em substituição, pelo que se impõe a baixa dos autos à 1ª instância para que seja proferida nova decisão, em conformidade com o estatuído no art.º 124º do CPPT, salvo se outro fundamento, diverso do ora decidido, a tal não obstar.
Prosseguindo:
4.2. A questão principal a decidir nos presentes autos prende-se em saber se a sentença incorreu em erro de julgamento da matéria de direito, por errada interpretação e aplicação do disposto nos artigos 40.º n.º 2 e 3 do CIMI, sendo certo que a divergência do Recorrente é relativa à área bruta privativa e à área bruta dependente, considerando que a primeira deveria ser superior e a segunda inferior, ou seja, a área bruta privativa deveria ser 916 m2 e não 583 m2 e área bruta dependente de 159 m2 e não de 492 m2. Entende que a zona da cave, onde se localiza zona de distribuição, garrafeira, duas instalações sanitárias de serviço, sala de jogos com zona de arrumos, sala de cinema, sala de desporto/ginásio com instalações sanitárias de serviço vestiário/balneário com banho turco, dispensa, fazem parte integrante da aréa bruta privativa, (com excessão da garagem e área técnica).
A sentença recorrida julgou a impugnação judicial improcedente com base na argumentação de que os critérios na fórmula constante do art.º 38.º do CIMI assentam em factores objetivos e relativamente à questão equacionada referiu que”(…) Sem necessidade de grande e elaborado sustento doutrinal, considerando tudo quanto acima foi dito, mormente as definições de espaço habitacional constantes de diplomas como o RGEU, acima referido, temos certo que não se poderá considerar Área Bruta Privativa, algo como uma piscina, por mais sumptuosa que a mesma se mostre (aí poderá entrar, sim o Coeficiente Majorativo Específico)
De resto note-se, o próprio perito nomeado da impugnante não se insurgiu quanto a classificação das áreas brutas privativas e dependente, antes apelando à qualidade da construção e materiais usados bem como a excelente localização do imóvel (factores tomados em consideração, no termo de avaliação de fls. 81 do apenso.) (…).”
Porém não podemos concordar com tal entendimento, sendo certo que a questão passa por averiguar se as áreas em questão enquadram ou não área bruta privativa ou área bruta dependente e para tal importa fazer a sua distinção.
O artigo 40.º do CIMI, na redação à data dos factos, com o título “Tipos de áreas dos prédios edificados” preceitua que: “1 - A área bruta de construção do edifício ou da fracção e a área excedente à de implantação (A) resultam da seguinte expressão:
A= (Aa + Ab) x Caj + Ac + Ad
em que:
Aa representa a área bruta privativa;
Ab representa as áreas brutas dependentes;
Caj representa o coeficiente de ajustamento de áreas;
Ac representa a área de terreno livre até ao limite de duas vezes a área de implantação;
Ad representa área de terreno livre que excede o limite de duas vezes a área de implantação.
2 - A área bruta privativa (Aa) é a superfície total medida pelo perímetro exterior e eixos das paredes ou outros elementos separadores do edifício ou da fração, incluindo varandas privativas fechadas, caves e sótãos privativos com utilização idêntica à do edifício ou da fração, a que se aplica o coeficiente 1.
3 - As áreas brutas dependentes (Ab) são as áreas cobertas e fechadas de uso exclusivo, ainda que constituam partes comuns, mesmo que situadas no exterior do edifício ou da fração, cujas utilizações são acessórias relativamente ao uso a que se destina o edifico ou fração, considerando-se, para esse efeito, locais acessórios as garagens, os parqueamentos, as arrecadações, as instalações para animais, os sótãos ou caves acessíveis e as varandas, desde que não integrados na área bruta privativa, e outros locais privativos de função distinta das anteriores, a que se aplica o coeficiente 0,30.
4-(…)”.(destacado nosso).
Assim, a lei define como área bruta privativa a superfície total medida pelo perímetro exterior e eixos das paredes ou outros elementos separadores do edifício ou da fração, incluindo varandas privativas fechadas, caves e sótãos privativos com utilização idêntica à do edifício ou da fração, a que se aplica o coeficiente 1.
Segundo JOSÉ MARIA F. PIRES, in Lições de Impostos sobre o Património e do Selo, Almedina, Coimbra, 2010, p. 63 e seg., na definição do conceito de área bruta privativa a lei estabelece alguns requisitos essenciais, a saber. “(…) A área bruta privativa é a parte do prédio que está afeta à utilização principal para que o prédio serve. Assim, numa moradia ou num edifício de habitação, a área bruta privativa corresponde àquela que está especificamente afeta à habitação, que é o interior utilizado pelos respectivos moradores.
(…)
Para se apurar a área bruta privativa é necessário antes de mais determinar qual a afetação principal do prédio, em conformidade com a classificação dos tipos de prédios em função da sua utilização que está prevista no artigo 41.º do CIMI. Determinada essa afetação a área bruta privativa é a utilizada na função que lhe corresponde, sendo daqui excluídas as áreas de apoio e ou subsidiárias.
(…)”
Segundo o mesmo autor na definição do conceito de área bruta dependente, a lei estabelece alguns requisitos essenciais, a saber:
“i) Em primeiro lugar o requisito da subsidiariedade. Estas áreas têm de estar ao serviço de uma qualquer área bruta privativa. A sua utilização deve ser dependente e não principal;
ii) Em segundo lugar têm que ser áreas cobertas e fechadas. Não basta que essas áreas sejam meramente cobertas, têm que ser fechadas;
iii) Em terceiro lugar devem ser áreas de uso exclusivo. A sua utilização tem que ter carácter exclusivo, não podendo, por isso, ser de utilização comum ou em conjunto com outros titulares. (…)”.
Com efeito, e como bem refere a Recorrente, a destrinça entre áreas brutas privativas e áreas brutas dependentes assenta na concreta utilização do espaço como sendo acessório ou integrador da utilização principal a que se destina o imóvel.
Acresce ainda referir que da interpretação do n.º 3 do art.º 40.º do CIMI, decorre que, a primeira subsunção a efetuar é, quanto à área bruta privativa, e só se nela não couber é que se passará a poder subsumir na categoria da área bruta dependente.
A norma do citado n.º 3 dá expressa primazia ao referir-se que os elementos que menciona, - as garagens, os parqueamentos, as arrecadações, as instalações para animais, os sótãos ou caves acessíveis e as varandas - poderão constituir a área bruta dependente se não forem de integrar na área bruta privativa, pelo que cabendo nesta primeira, já não se torna necessário saber se também poderiam ser integrados naquela outra. (Cfr. Acórdão do TACS 05398/12 de 02.10.2012 05414/12 de 11.09.2012 e 5929/12 de 11.06.2013).
A sentença recorrida dá como assente nos pontos 2 e 3 que o prédio objeto de avaliação é um prédio urbano, moradia T4, com logradouro, composta no seu rés-do-chão por quatro quartos, todos com vestíbulo, instalações sanitárias e zona de vestir, zona de átrio e distribuição, escritório, sala comum, sala de banhos com piscina interior, instalação sanitária de serviço e cozinha com lavandaria.
E que possui, na cave, zona de distribuição, garrafeira, duas instalações sanitárias de serviço, sala de jogos com zona de arrumos, sala de cinema, sala de desporto/ginásio com instalação sanitária e vestiário/balneário com banho turco, despensa, garagem e área técnica.
Estes factos, porém, não são significativos para apurar se se trata de área bruta dependente ou área bruta privativa.
Acresce referir que o Recorrente arrolou testemunhas, pretendendo que fossem ouvidas relativamente aos pontos da petição inicial n.º s 1.º, 9.º, 18.º a 37.º, 42.º, 43.º, 51.º, 53.º, 54.º, e 60.º a 69.º da impugnação judicial.
Por despacho da MM. juíza foi dispensada a produção da prova testemunhal, com fundamento que os factos alegados para o efeito são meras conclusões ou se mostram irrelevantes para o cerne da questão dicidenda.
Analisados os itens identificados pelo Recorrente verifica-se que alguns tens cariz conclusivo, no entanto, fica bem patente que pretendia fazer prova que zona da cave, onde se localiza zona de distribuição, garrafeira, duas instalações sanitárias de serviço, sala de jogos com zona de arrumos, sala de cinema, sala de desporto/ginasio com instalações sanitárias de serviço vestiário/balneário com banho turco, dispensa, fazem parte integrante da area bruta privativa, e da distorção entre o valor de mercado do prédio e o seu valor patrimonial tributário.
A sentença recorrida deu, no ponto n.º 3 da matéria de facto, como provado essa zona de cave, no entanto, nada se fixou quanto à área por ela ocupada e ainda quanto à sua utilização.
Tambem não foi apurado, em que termos foram quantificadas essas aréas na primeira avaliação nem dos autos nem do PA apenso aos autos consta qualquer documentação alusiva, com excessão do modelo 1.
Destarte, do que vem dito, importa apurar quais as áreas e respetiva utilização, com vista a concluir se é errónea a qualificação efetuada.
Tendo a Recorrente impugnado a legalidade da avaliação por errada quantificação, propondo-se fazer prova se impõem a inquirição de testemunhas com vista, ao apuramento da situação factual e da verdade material consequente enquadramento legal.
Assim, a sentença recorrida ao julgar que não existiu qualquer erro na qualificação das áreas, sem apurar as circunstâncias factuais, incorreu em erro de julgamento, o que conduz necessáriamente à anulação da sentença recorrida e a remessa dos autos à primeira instância com vista à ampliação da matéria de facto.
Nesta conformidade, ter-se de concluir que a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de direito e de facto, mostrando necessária a inquirição de testemunhas e a realização de outras diligências que se mostrem necessárias ao apuramento da verdade material.
Nesta conformidade, procede o recurso ficando prejudicado o conhecimento das demais questões e do recurso interlocutório.
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4.3. E assim, formulando as seguintes conclusões/sumário:
I. A lei define como área bruta privativa a superfície total medida pelo perímetro exterior e eixos das paredes ou outros elementos separadores do edifício ou da fração, incluindo varandas privativas fechadas, caves e sótãos privativos com utilização idêntica à do edifício ou da fração, a que se aplica o coeficiente 1.
II. Da interpretação do n.º 3 do art.º 40.º do CIMI, decorre que, a primeira subsunção a efetuar é, quanto à área bruta privativa, e só se nela não couber é que se passará a poder subsumir na categoria da área bruta dependente.
III. A norma do citado n.º 3 dá expressa primazia ao referir-se que os elementos que menciona, - as garagens, os parqueamentos, as arrecadações, as instalações para animais, os sótãos ou caves acessíveis e as varandas - poderão constituir a área bruta dependente se não forem de integrar na área bruta privativa, pelo que cabendo nesta primeira, já não torna necessário saber se também poderiam ser integrados naquela outra.
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5. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, anular a sentença recorrida, ordenar a baixa dos autos ao tribunal recorrido para ampliação da matéria de facto e posterior julgamento de direito.
Após trânsito em julgado, remeta-se cópia do presente acórdão aos serviços, melhor identificados a fls. 117 dos autos, para os devidos efeitos.
Custas pela Recorrida Fazenda Pública.
Porto, 6 de junho de 2019
Ass. Paula Maria Dias de Moura Teixeira
Ass. Maria da Conceição Soares
Ass. Maria do Rosário Pais