Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00040/17.0BEVIS
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:11/15/2019
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:Frederico Macedo Branco
Descritores:ESTATUTO DO JORNALISTA; ESTATUTO DOS ELEITOS LOCAIS; EXERCÍCIO SIMULTÂNEO DE FUNÇÕES; MEMBRO DE ASSEMBLEIA DE FREGUESIA;
Sumário:1 – Exerce simultaneamente ambas as atividades, de jornalista e de membro da assembleia de freguesia, o jornalista que, nessa qualidade, aciona a gravação audiovisual, por meios técnicos adequados a essa finalidade, antes do início da sessão ou reunião de uma assembleia de freguesia visando a gravação da mesma, ocupando, de seguida, o lugar na Assembleia de Freguesia, na qualidade de eleito local, enquanto aquela gravação decorre.

2 - Nessas circunstâncias, o jornalista diretor de jornal da imprensa local e eleito local membro de assembleia de freguesia incorre em situação de conflito de interesses, com violação de deveres decorrentes de normas legais e de regras de carácter deontológico, designadamente, afronta do dever ínsito no nº 1 do artigo 14º do Estatuto do Jornalista, o dever do exercício da respetiva atividade com respeito pela ética profissional, bem como o dever de recusar funções ou tarefas suscetíveis de comprometer a sua independência e integridade profissional [alínea c) do nº 1 do mesmo artigo], como também do dever de respeitar o fim público dos poderes em que se encontra investido enquanto eleito local, do dever de não patrocínio de interesses particulares, próprios ou de terceiros, de qualquer natureza, no exercício das suas funções, do dever de não participar na apresentação, discussão ou votação de assuntos em que tenha interesse ou intervenção e de não usar, para fins de interesse próprio ou de terceiros, informações a que tenha acesso no exercício das suas funções [cfr. alínea b), subalíneas ii), iii), iv) e vi), do artigo 4º do Estatuto dos Eleitos Locais.

3 - A conduta de um jornalista, nessa qualidade, decorre de uma ética, enquanto pensamento moral que acolhe um conjunto de valores e princípios que regulam o seu comportamento ou atuação, e da observância da deontologia, enquanto regras e princípios que regem a conduta profissional.

4 - Os jornalistas têm o dever de acatar o disposto no Código Deontológico do Jornalista, e neste, visando particularmente as circunstâncias referidas em I, o seu ponto 10, ab initio, “O jornalista deve recusar funções, tarefas e benefícios suscetíveis de comprometer o seu estatuto de independência e a sua integridade profissional”, e, in fine, “O jornalista não deve valer-se da sua condição profissional para noticiar assuntos em que tenha interesse”.*
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:L. F. . C. F.
Votação:Unanimidade
Nº do Volume:Junta de Freguesia de M...
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I Relatório
L. F. . C. F., no âmbito da Ação Administrativa Comum para condenação a abstenção de comportamentos intentada pela Junta de Freguesia de M..., tendente, em síntese, “a condenar o Réu a abster-se de gravar e colher imagens da assembleia de freguesia de M... ... deixando de perturbar o normal andamento da mesma ...” inconformado com a Sentença proferida no TAF de Viseu em 31 de março de 2019 que o condenou “a abster-se de gravar e colher imagens da Assembleia de Freguesia de M... ... deixando de perturbar o normal andamento da mesma ... quando está na qualidade de eleito local e membro da mesma”, veio interpor recurso jurisdicional da referida decisão, aí tendo concluído:
“1. Da condenação do recorrente e da fundamentação da sentença parece resultar que o bem jurídico que o tribunal considerou violada pela sua atuação foi um de três: a garantia de normal funcionamento da assembleia de freguesia; os direitos e deveres do recorrente enquanto jornalista e sobretudo a sua independência; os direitos e deveres do recorrente enquanto eleito local e sobretudo o seu dever de participação ativa na assembleia.
2. Porque relevantes para a apreciação da possibilidade de a atuação do recorrente perturbar o funcionamento da assembleia, deverá ser admitido a fazer prova sobre os factos alegados nos artigos 6, 7 e 8 da contestação.
3. A atuação do recorrente, ao acionar uma câmara de filmar digital, não é suscetível, só por si, de perturbar os trabalhos da assembleia.
4. A considerar-se que a atuação do recorrente, ao acionar uma câmara de filmar digital previamente a participar na assembleia viola os seus deveres enquanto jornalista, então nem a autora nem o tribunal administrativo têm jurisdição sobre esse comportamento, que será sindicável, quanto muito, pela Comissão da Carteira Profissional.
5. A considerar-se que a atuação do recorrente, ao acionar uma câmara de filmar digital, previamente a participar na assembleia, viola os seus deveres enquanto deputado eleito da assembleia de freguesia, assim se justificando a jurisdição administrativa, ainda seria necessário considerar-se que esse ato constitui um ato administrativo nos termos e para os efeitos do art.º 37.º, 2, c), do CPTA - e não é.
6. A única forma de enquadrar a atuação do recorrente na jurisdição administrativa no dispositivo seria proibir a sua participação na assembleia quando tivesse acionado a máquina de filmar e não proibir a sua atividade enquanto jornalista quando participasse como deputado na assembleia.
7. Uma vez que tal pedido não foi formulado, nunca o recorrente poderia ver proibida, nessas circunstâncias, a sua participação na assembleia.
8. A atuação do recorrente não se encontra proibida por nenhuma norma jurídica.
9. A douta sentença recorrida viola, para além do mais, os artigos 38.º e 48.º da Constituição da República Portuguesa e o art.º 37.º, 2, c), do CPTA.
Termos em que deverá ser revogada a douta sentença recorrida, absolvendo-se o réu do pedido; caso assim se não entenda, deverão os autos prosseguir para o réu poder fazer prova da matéria por si alegada nos artigos 6.º, 7.º e 8.º da contestação.”

A aqui Recorrida/JF veio apresentar as suas contra-alegações de Recurso em 1 de julho de 2019, sem conclusões, afirmando, a final, que “inexiste assim qualquer vício da sentença, razão pela qual deve a sentença recorrida ser mantida, improcedendo assim o recurso, fazendo-se a devida Justiça.”
O Recurso Jurisdicional apresentado veio a ser admitido por despacho de 23 de setembro de 2019.
O Ministério Público junto deste Tribunal notificado a 1 de outubro de 2019, nada veio dizer, requerer ou Promover.
Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
II - Questões a apreciar
Importa apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos artº.s 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA, importando verificar, designadamente, se se mostrará adequado e eticamente admissível, o exercício simultâneo da atividade de jornalista com a de eleito Local numa Assembleia de Freguesia.

III – Fundamentação de Facto
O Tribunal a quo considerou a seguinte factualidade:
“1) Na sequência das eleições autárquicas do ano de 2013, foram eleitos, entre outros, na Freguesia de M..., concelho de Tondela, o aqui réu, pelo Partido Socialista, que exerce as funções de membro da Assembleia de Freguesia e os Senhores J. A. . O. D., que exerce as de Presidente de Junta e o Senhor H. G. R., que exerce as funções de Presidente da Assembleia de Freguesia, estes dois pelo Partido Social Democrata.
2) Desde então e nos termos do art.º 11, n.º 1 da Lei 75/2013 de 12 de Setembro, que a Assembleia de Freguesia tem reunido ordinariamente nos meses de Abril, Junho, Setembro e Novembro ou Dezembro.
3) Em 21 de Dezembro de 2013, os eleitos locais daquela freguesia aprovaram nos termos do artº 10º nº 1, al. a) daquela lei, o Regimento da Assembleia de Freguesia de M..., que se junta como Doc. n.º 1 e cujo conteúdo se dá aqui como integralmente reproduzido.
4) Que regula e tem regulado desde então o funcionamento daquele órgão.
5) Desde que foi eleito em 2013 que o Réu tem exercido as suas funções de eleito local, vogal da Assembleia de Freguesia de M....
6) O Réu é também diretor da publicação trimestral gratuita propriedade da Casa do Povo de M..., AUGACIAR, Doc nº 2 e cujo conteúdo se dá aqui como integralmente reproduzido.
7) Acontece porém que em Dezembro de 2015, na Assembleia ordinária da Assembleia do dia 21, o réu montou e colocou a funcionar para colheita de som e imagem uma câmara de filmar, para gravar a assembleia.
8) Nenhum pedido de gravação foi feito chegar ao presidente da Assembleia de Freguesia ou à mesa para tanto.
9) O presidente daquela Assembleia, H. G. R., na sua qualidade de presidente da Assembleia de Freguesia ou à mesa para tanto questionou de quem era a máquina.
10) Ao que o Réu responder ser dele.
11) O presidente da Assembleia de Freguesia pediu-lhe que a desligasse e este recusou fazê-lo, alegando ser “diretor do AUGACIAR”.
12) O presidente da Junta, no uso da palavra informou que não dava autorização pessoal para ser filmado.
13) Após a abertura dos trabalhos da Assembleia o eleito local A. F. e R. S. usaram da palavra e questionaram sobre a qualidade em que o réu gravava, isto é, se enquanto eleito local ou enquanto diretor do Augaciar e se era ou não jornalista.
14) Pela mesa da Assembleia ter dúvidas sobre a legalidade da gravação e filmagem, a sua eventual dupla qualidade de jornalista e eleito local e a falta de autorização da mesa para filmar.
15) O presidente da mesa da Assembleia suspendeu então os trabalhos.
16) Tudo conforme ata que se junta como doc nº 3 e cujo conteúdo se dá aqui como integralmente reproduzido.
17) No dia 29 de dezembro, na continuação da AF, o réu persistiu no comportamento de montar uma máquina de filmar e começou a gravar, colhendo imagens e som dos trabalhos, ainda antes do início da assembleia.
18) Informando que iria gravar na qualidade de diretor do Augaciar.
19) Questionado sobre se estava identificado como jornalista, respondeu que era diretor do Augaciar.
20) Questionado sobre em que qualidade está na assembleia, se enquanto jornalista ou eleito local, esclareceu que tinha ligado a câmara como diretor do jornal e que estava presente na Assembleia como eleito.
21) O presidente da mesa, face às dúvidas que demonstrou ter sobre a legalidade da gravação e colheita de imagens, decidiu colocar o assunto à votação da assembleia, nos seguintes termos: “Quem é que é a favor que seja filmada ou gravada a reunião?”.
22) Votação essa que obteve um voto a favor da eleita E. P. e os votos contra de H. R., R. S., R. C., A. F. e R. L..
23) O réu recusou-se a votar a questão, por considerar se tratar de uma proposta ilegal.
24) A câmara continuou a gravar e colher imagens.
25) O Presidente da Assembleia por entender que os trabalhos estavam a ser perturbados, solicitou a presença da GNR.
26) Que compareceu no local.
27) E questionaram os agentes ao eleito local, ora réu nos presentes autos, se tinha credencial para poder gravar e filmar.
28) A GNR procedeu à sua detenção, com apreensão do material.
29) E o réu acompanhou a GNR, saindo em conjunto da sala da Junta, onde decorriam os trabalhos da Assembleia.
30) Tendo corrido posteriormente um inquérito judicial nessa sequência, na Comarca de Viseu, Tondela, com o nº 447/15.8GCTND, conforme melhor identificação no Doc nº 4 que se junta.
31) Em que o réu foi acusado do crime de desobediência e condenado naquela comarca, havendo entretanto recorrido para o tribunal superior, da Relação de Coimbra, dessa sentença, aguardando a consequente decisão.
32) Daquela reunião foi lavrada ata, que se junta como doc. nº 5 e cujo conteúdo se dá aqui como integralmente reproduzido.
33) Aconteceu ainda que o Presidente da Assembleia de Freguesia de M..., convocou uma reunião ordinária para o dia 23 de Abril de 2016.
34) E novamente nessa Assembleia o réu montou e colocou a funcionar, para colheita de som e imagem, uma câmara de filmar, para gravar a assembleia, ainda antes do seu início.
35) O presidente daquela Assembleia, H. G. R., por nenhum pedido de gravação lhe ter sido feito chegar, na sua qualidade de presidente da Assembleia de Freguesia ou à mesa para tanto,
36) Questionou de quem era a máquina.
37) Ao que o Réu acabou por responder ser dele.
38) O presidente da Assembleia de Freguesia questionou o Réu se tinha credencial de jornalista, à semelhança de outros jornalistas que ali se encontravam, nomeadamente a Sra. D. M. C. R. e o S. A. P..
39) Ao que o Réu respondeu que o presidente não sabia o que era uma credencial, acabando por nunca se identificar sobre a qualidade em que gravava e colhia imagens.
40) Informado pelo presidente da Assembleia que se tivesse identificação de jornalista podia continuar com a gravação e se não e tivesse e estivesse ali na qualidade de eleito local, deveria desligar a máquina.
41) Recusou desligar o equipamento, respondendo que estava na qualidade de eleito local.
42) E que “o senhor presidente e o juiz de Tondela nada sabiam sobre incompatibilidade de estatutos e órgãos de soberania.”
43) Alegando que os dois cargos são compatíveis, não havendo incompatibilidade.
44) O presidente retorquiu, informando que tem consigo um parecer da Anafre, a solicitação da Junta, e outro da CCDRC que confirmam a impossibilidade legal da gravação que o réu pretendia efetuar, na qualidade de eleito local, exibindo-os, conforme doc nºs 6 e 7, que se juntam e cujo conteúdo de dá aqui como integralmente reproduzidos.
45) E pedindo-lhe que desligasse a máquina de filmar, ao que este recusou fazê-lo.
46) Informando que não aceitava qualquer parecer e só haveria uma coisa que o impedisse de gravar ou estar ali, que era uma decisão judicial.
47) E como a Assembleia não a tinha, não desligava e viessem os pareceres que viessem e ele continuaria a gravar.
48) O presidente da mesa da Assembleia, como o réu persistia na continuação da gravação, continuando a argumentar sobre a essa possibilidade legal e na compatibilidade do seu estatuto de diretor do Augaciar com o de eleito local, suspendeu então os trabalhos, agendando a sua continuação para o dia 27 de Abril pelas 21 horas no mesmo local.
49) Tudo conforme gravação que posteriormente publicitou em diversos sítios da internet, designadamente no sitio da internet da casa do povo de M... e no Youtube, em:http://www.-----M....pt/verpagina/35https://www.----.com/watch?v=0-JgYdxagbM
50) No dia 27 de Abril na continuação da AF, o réu persistiu no comportamento e na vontade de filmar, colhendo imagens e som dos trabalhos na assembleia antes e depois do seu início.
51) Pelo que a GNR procedeu de novo à sua detenção, novamente com apreensão do material.
52) Tendo corrido um inquérito judicial nessa sequência, na Comarca de Viseu, Tondela, com o nº 106/16.4GCTND, conforme identificação na notificação anexa que se junta como doc. nº 8 que se junta e cujo conteúdo se dá aqui como integralmente reproduzido.
53) Em que o réu foi acusado do crime de desobediência.
54) Sobre os factos atrás relatados muitas notícias saíram em diversos canais de comunicação escrita, como sejam a exemplo a folha de T…, Doc. nº 9, o Jornal de T…, doc nº 10 e o Diário de V…, Doc nº 11.
55) E na internet, em diversos sítios.
56) O réu desde sempre que prestou declarações sobre os fatos e fez questão de os publicitar, invocando sempre que podia exercer as suas funções de eleito local na assembleia de freguesia e colher imagens e sons também na qualidade de diretor do Augaciar, publicação da Casa do Povo de M..., exercendo os dois cargos em simultâneo.
57) Além de que continua a dizer a toda a gente e a todos os órgãos de comunicação social, inclusive publicitar nas declarações que tem feito, que persistirá neste comportamento em todas as próximas Assembleias de Freguesia que se agendarem.
58) Foi comunicado que a Assembleia não autorizava a colheita de som e imagem.
59) O requerido, para além de deputado da Assembleia de Freguesia de M..., é diretor da publicação periódica trimestral “Augaciar”, propriedade da Casa do Povo de M..., registada na Entidade Reguladora para a Comunicação Social sob o número de registo 126555, sujeita ao depósito legal (Decreto-Lei n.º 74/82, de 3 de Março) para publicações n.º 379087/14.
60) No processo 447/15.8 GCTND.C1 foi proferida decisão do Tribunal da Relação de Coimbra com a data de 16/02/2017, em que foi Relator o Juiz Desembargador Abílio Ramalho, que confirmou a sentença proferida em 1.ª instância.
61) No processo 106/16.4GCTND.C1 foi proferida decisão do Tribunal da Relação de Coimbra com a data de 09/01/2017, em que foi Relator o Juiz Desembargador Jorge França) que conformou a sentença proferida em 1.ª instância.
62) O Requerente, em 30 de Dezembro de 2015 deu entrada na Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) de uma participação com fundamento na proibição de gravação de Assembleia de freguesia de M... em 29.12.2015.
63) Tendo tal entidade instaurado um processo, que deu origem à deliberação ERC/2016/225 (DJ), de 17 de Outubro de 2016, que se cita:
“V. Análise e fundamentação …
…A este propósito, assinala-se que se afigura eticamente questionável a admissibilidade concreta de exercício, em simultâneo, num mesmo ato, das funções de jornalista e de membro de uma assembleia de freguesia. Em concreto, colocar a câmara a gravar de um lado, enquanto se exerce o mandato de deputado num outro, configura um exercício de jornalismo que suscita questões de conduta profissional que são patentes.
Assim, entende o Conselho Regulador que o Queixoso, enquanto exerça o jornalismo e esteja presente na sessão para os efeitos informativos – a finalidade por excelência do direito de acesso – não pode ser impedido de fazê-lo, mas já não poderá fazer valer os seus direitos de jornalista quando age enquanto membro da assembleia de freguesia.
“VI. Deliberação
… a circunstância do exercício simultâneo das funções de jornalistas e de membro de uma assembleia de freguesia, no mesmo ato, tem contornos ético-profissionais questionáveis e que o direito de acesso dos jornalistas só pode ser reconhecido ao Queixoso quanto este atua enquanto tal;
Remeter a presente deliberação ao conhecimento da Comissão da Carteira de Jornalistas para os efeitos tidos por convenientes, considerando que poderá estar em causa o cumprimento dos deveres de jornalistas, previstos no artigo 14º do EJ.”
64) O Réu apresentou ao Ministério da Administração Interna, na Inspeção Geral das Administração Interna uma queixa, na sequência das detenções efetuadas pela GNR nas seções das assembleias de freguesia de 29 de Dezembro de 2015 e 27 de Abril de 2016, que correu termos naqueles Ministério sob a referência PA 2/2016, PROP-172/2016.
65) Que por despacho de 26 de Outubro de 2016 foi arquivada, conforme notificação ao presidente da Junta de Freguesia de M..., de 2.11.2016, Doc. nº 17, constando o seguinte: “3. Análise dos Factos
3.1 – Direitos e deveres dos eleitos locais.
a) Sobre o exercício simultâneo de duas funções
… Conclui-se deste regime que os eleitos locais, enquanto participantes nas reuniões dos órgãos autárquicos a que pertencem, têm legalmente criadas as condições para exercerem em exclusividade a função para a qual estão a ser pagos por dinheiros públicos. E este regime não deve ser confundido com o regime de incompatibilidades. Trata-se unicamente da impossibilidade de, estando a ser pago para num dado momento exercer uma determinada função de caráter público, nesse mesmo momento não poder exercer qualquer outra função, seja ele compatível ou incompatível, porque está a ser pago para exercer, por um curto período de tempo, (algumas horas), a função para a qual foi eleito.
Ao pretender exercer as duas funções simultaneamente o queixoso cria a dúvida insanável de se saber, em cada momento, qual a personagem que está a encarnar, se a de deputado local, se a de jornalista. …
Num regime democrático qualquer eleito para um órgão colegial, a quem é dado o poder de participar ma elaboração e aprovação do regimento de funcionamento desse órgão, deve obediência às normas de funcionamento que venham a ser aprovadas por maioria.…
c) Sobre as gravações durante o funcionamento da Assembleia de Freguesia
… qualquer outra gravação deverá ser submetida a deliberação da Assembleia…. As Assembleias de Freguesia são soberanas no que tange às duas normas de funcionamento.
3.2- Sobre o exercício da atividade de jornalista, e sobre a recolha de som e imagem durante o exercício dessa atividade.
Importa referir ainda o incumprimento da alínea i) do artigo 14º do Estatuto de Jornalista uma vez que o queixoso não estava autorizado e utilizar a camara de vídeo nas sessões da Assembleia de Freguesia, por deliberação expressa daquele órgão autárquico.
4. Conclusões
4.1 – Um membro de uma Assembleia de Freguesia, no exercício da função para a qual foi democraticamente eleito, auferindo uma remuneração para o exercício desse cargo, enquanto o exerce deve-o fazer em regime de exclusividade.
4.2 – Não sendo a atividade de jornalista incompatível com o exercício de mandato de membro de uma assembleia de freguesia, o exercício simultâneo das duas atividades, sob o ponto de vista da ética profissional a que os jornalistas estão obrigados é no mínimo questionável.
4.3 – A Assembleia de Freguesia de M... deliberou democraticamente sobre normas do seu funcionamento, devendo essas normas ser acatadas pelos seus membros. Quaisquer dos membros das Assembleias de Freguesia que questionem a legalidade de normas aprovadas, poderão recorrer das mesmas para as instâncias competentes, mas enquanto em vigor deverão cumpri-las.”

IV – Do Direito
Discorreu-se, no que aqui releva, na fundamentação de direito da decisão recorrida, o seguinte:
“(...) Ora, a questão que se coloca nos presentes autos é a de saber se o Réu pode exercer em simultâneo as funções de jornalista ou de diretor de jornal e de eleito local, em plena Assembleia de Freguesia.
Importa, assim, aferir se estão a ser colocados obstáculos ao exercício pelo requerente do direito à informação e à liberdade de imprensa, previstos como direitos fundamentais pela Constituição da República Portuguesa nos artigos 37.º e 38.º, assim como do direito de participação política previsto no art.º 48.º e seguintes da Lei Fundamental, que carecem de tutela.
(...)
Ora, no caso vertente, atenta a matéria provada não se vislumbra qualquer violação dos mencionados direitos, liberdades e garantias, porquanto ao Requerente não foi vedado nem inibido o legítimo exercício da atividade de um jornalista. O que lhe foi vedado foi o exercício em simultâneo de membro local eleito para a Assembleia de Freguesia poder gravar e colher imagens na qualidade de jornalista.
Entendemos que não é admissível o exercício em simultâneo de jornalista e de membro eleito para a Assembleia de Freguesia.
Os motivos para que tal exercício não seja possível em simultâneo foram suficientemente explanados nos acórdãos mencionados, e com os quais concordamos integralmente.
Assim, resulta do Acórdão proferido no âmbito do processo n.º 447/15.8GCTND.C1 (melhor supra identificado, disponível em www.dgsi.pt).
“… Ademais, é-nos de apodítico juízo lhe também não assistir o – pessoalmente – assumido direito de simultâneo e acumulativo exercício na dita sessão – ou noutra qualquer – da função autárquica de membro (eleito local) da Assembleia de Freguesia e de Jornalista, por evidente inconciliabilidade dos respetivos conteúdos funcionais, não por o primeiro inerir a órgão de soberania, como incompreensivelmente afirmado na referenciada sentença (!) – já que apenas são órgãos de soberania o Presidente da República, a Assembleia da República, o Governo e os Tribunais, (cfr.art.º 110.º da Constituição nacional), categorias em que, axiomaticamente, se não integra a Assembleia de Freguesia (ou qualquer outro órgão autárquico)! –, ou por abstratamente existir entre tais atividades qualquer das incompatibilidades legais prevenidas sob o art.º 3.º/1 – máxime als. e) e f) – do Estatuto do Jornalista[11] [a primeira com referência ao art.º 1.º/2 da Lei n.º 64/93, de 26/08 (na versão decorrente da alteração introduzida pela Lei n.º 28/95, de 26/08, e pela Lei Orgânica n.º 1/2011, de 30/11)[12]], mas porque a legal vinculatividade à nucleariedade dos pertinentes deveres legais – de deputado local – postulados pelo art.º 4.º do Estatuto dos Eleitos Locais (aprovado pela Lei n.º 29/87, de 30/06)[13], e pelo 15.º do Regimento da Assembleia de Freguesia de X...[14], máxime de escrupuloso respeito pela pertinente normação legal e regimental, pela imparcial prossecução do interesse público e pelo fim público dos próprios poderes, e de empenhada, ativa, efetiva e contributiva participação nas correspetivas reuniões ordinárias e extraordinárias, com rigorosa observância da ordem e disciplina fixada na lei e no regimento – naturalmente colorida pela orientação política da correspondente força partidária –, bem como da autoridade e direção do presidente da mesa, se encontra em evidente assimetria com as fundamentais características do múnus jornalístico – legais e deontológicas –, essencialmente pautado pela independência, mormente do poder político, e liberdade de desapaixonada objetividade informativa do respetivo profissional, [cfr., máxime, arts. 37.º/1/2 e 38.º/1/2/a)/b)/4 da Constituição 6.º/a)/d) e 14.º/1/a) do Estatuto do Jornalista].
Como em tudo na vida, terá de optar e arcar com as emergentes consequências: ou contextualmente assume integral e proactivamente o cargo para que foi eleito, com escrupuloso cumprimento das pertinentes regras legais e regimentais, incluindo as atinentes ao ordeiro respeito pela institucional autoridade do presidente da AF [designadamente das prevenidas sob os arts. 14.º/1 do Regime Jurídico das Autarquias Locais (aprovado pela Lei n.º 75/2013, de 12/09)[15], 18.º/1/a)/d)/e)/i)/j) do Regimento da AF[16] e 21.º/2 do Código do Procedimento Administrativo (aprovado pelo D.L. n.º 4/2015, de 07/01)[17]], como qualquer outro elemento, ou, caso persista em similar contumácia e disruptiva postura de afrontação, provocação e desrespeito das regras regimentais, seguramente legitimará a adoção pelo presidente da AF de pertinentes medidas de polícia para adequada reposição da ordem e do regular funcionamento da correspondente sessão – e, no limite, pela mesa, de marcação de falta injustificada, cuja repetição incontornavelmente condicionará a própria perda de mandato, reunidos que sejam os requisitos quantitativos estabelecidos sob o art.º 13.º/1/b) do Regimento –, em rigoroso exercício dos respetivos poderes-deveres institucionais conferidos pela enunciada dimensão normativa emergente da conjugada interpretação dos arts. 14.º/1/a)/d)/e)/i)/j) do RJAL, 18.º/1/a)/d)/e)/i)/j) do Regimento e 21.º/2 do CPA, em que naturalmente se insere a convocação de pertinente autoridade policial para adequada atuação, quiçá detenção em flagrante delito de crime de desobediência, como na referenciada ocasião aconteceu, [em estrita observância da disciplina jurídico-processual firmada sob os arts. 254.º/1/a), 255.º/1/a) e 256.º/1 do CPP].
… Carece, obviamente, de jurídica sustentabilidade a residual argumentação de legitimação de gravação de imagem e som na qualidade de comum cidadão, já que a sua presença na referenciada sessão da AF de X... fora precisamente ditada pela convocação regimental na estrita qualidade de eleito local (deputado de assembleia de freguesia), como tal institucional e rigorosamente vinculado à já sobejamente caracterizada disciplina do próprio ato, cuja regulamentação, ademais, apenas permite a especial gravação oficial e provisória caracterizada sob o art.º 31.º/1 do Regimento para específico apoio à elaboração das atas, e até à respetiva aprovação (após o que deverá ser apagada)”.
Bem como resulta do Acórdão proferido no âmbito do processo n.º 106/16.4GCTND.C1 (melhor supra identificado, disponível em www.dgsi.pt), e, repetimos, com o qual concordamos:
“… Em primeiro lugar, é incompatível o exercício simultâneo das funções de eleito local e de jornalista; com efeito, não se compreende como poderia o recorrente, nessas circunstâncias conciliar direitos inconciliáveis, num mesmo ato. Referimo-nos ao seu direito de exercício de participação ativa na reunião do órgão (artº 4º, c), do E.E.L.) e ao seu dever de isenção, enquanto jornalista (artº 14º, 1, a) do E.J.).
O desempenho do cargo político para que foi o recorrente eleito pressupõe a sua participação nas reuniões do órgão por inteiro e em exclusivo; não se coaduna essa participação com o simultâneo desempenho de uma outra atividade paralela, designadamente a de jornalista, que dele exige uma obrigação de isenção, incompatível com a luta partidária que, por regra, tem lugar naquele fórum participativo. Atente-se em que a norma do artº 3º, 1, f) do mesmo EJ estabelece uma incompatibilidade absoluta entre o exercício da profissão de jornalista e o desempenho de qualquer função executiva, em regime de permanência, a tempo inteiro ou a meio tempo, em órgão autárquico.
Ora se existe uma incompatibilidade absoluta em tal caso, bem se compreende, que, por identidade de razões, exista uma incompatibilidade relativa, em caso de desempenho da atividade de jornalista na reunião de órgão autárquico que ele integre. Aliás, o referido artº 14º, no seu nº 1, c), concede ao jornalista a faculdade de recusar o desempenho de funções suscetíveis de comprometer a sua independência profissional. No nosso caso, o desempenho daquelas funções políticas opõe-se necessariamente ao concomitante exercício da atividade jornalística.”
Como resulta dos princípios que norteiam a atividade de jornalista, em que qualquer jornalista deve ser isento por força da Lei 1/99 de 1 de Janeiro, artº 14º nº 1, al. a).
Sendo que, o exercício do mandato político não é isento porquanto é marcado pela ideologia política do partido do eleito. E o Réu como eleito local, deve exercer a sua participação ativa na assembleia para que foi eleito, em obediência ao artº 4º da lei 29/87 de 30 de Junho, em particular al. a)i, b) ii e c)i.
Veja-se a este propósito o sumário do Ac. do TCA-Norte de 15/09/2017, proferido no âmbito do processo n.º 121/17.0BEVIS, que se transcreve: I - Exerce simultaneamente ambas as atividades, de jornalista e de membro da assembleia de freguesia, o jornalista que, nessa qualidade, aciona a gravação audiovisual, por meios técnicos adequados a essa finalidade, antes do início da sessão ou reunião de uma assembleia de freguesia visando a gravação da mesma, tomando, de seguida, lugar no seio daquele órgão autárquico para na sessão ou reunião participar, na qualidade de eleito local e membro dessa assembleia, enquanto aquela gravação ocorre. II - Nessas circunstâncias, o jornalista diretor de jornal da imprensa local e eleito local membro de assembleia de freguesia incorre em situação de conflito de interesses, com violação de deveres decorrentes de normas legais e de regras de carácter deontológico, designadamente, afronta do dever ínsito no nº 1 do artigo 14º do Estatuto do Jornalista, o dever do exercício da respetiva atividade com respeito pela ética profissional, bem como o dever de recusar funções ou tarefas suscetíveis de comprometer a sua independência e integridade profissional [alínea c) do nº 1 do mesmo artigo], como também do dever de respeitar o fim público dos poderes em que se encontra investido enquanto eleito local, do dever de não patrocínio de interesses particulares, próprios ou de terceiros, de qualquer natureza, no exercício das suas funções, do dever de não participar na apresentação, discussão ou votação de assuntos em que tenha interesse ou intervenção e de não usar, para fins de interesse próprio ou de terceiros, informações a que tenha acesso no exercício das suas funções [cfr. alínea b), subalíneas ii), iii), iv) e vi), do artigo 4º do Estatuto dos Eleitos Locais].
III - A conduta de um jornalista, nessa qualidade, decorre de uma ética, enquanto pensamento moral que acolhe um conjunto de valores e princípios que regulam o seu comportamento ou atuação, e da observância da deontologia, enquanto regras e princípios que regem a conduta profissional. IV - Os jornalistas têm o dever de acatar o disposto no Código Deontológico do Jornalista, e neste, visando particularmente as circunstâncias referidas em I, o seu ponto 10, ab initio, “O jornalista deve recusar funções, tarefas e benefícios suscetíveis de comprometer o seu estatuto de independência e a sua integridade profissional”, e, in fine, “O jornalista não deve valer-se da sua condição profissional para noticiar assuntos em que tenha interesse”.
Assim sendo, a atividade de jornalista não pode ser exercida em simultâneo com a função de eleito local e membro da Assembleia de Freguesia.
Pelo que, assiste razão à Autora em não permitir tal situação. O réu enquanto membro da assembleia de freguesia não pode exercer nesta as funções de jornalista e vice-versa, devendo optar naquela, por uma única posição.”

Analisemos então o suscitado.
Recorda-se desde já ter sido decidido na sentença recorrida, julgar “(...) a presente ação procedente por provada, condenado o Réu a abster-se de gravar e colher imagens da Assembleia de Freguesia de M..., concelho de T…, por qualquer meio ou recurso a quaisquer equipamentos, eletrónicos, manuais ou artesanais, deixando de perturbar o normal andamento da mesma e respeitando o funcionamento da Assembleia, quando nela está na qualidade de eleito local e membro da mesma, com as devidas consequências legais.”

Vejamos:
Da incompetência do Tribunal,
Ainda que de modo algo titubeante, vem suscitada a incompetência material dos TAF para julgar a presente Ação.

Mal se alcança o suscitado, sendo certo que o art 37 nº 1, alínea h) do CPTA expressamente prevê a possibilidade de uma ação administrativa visando a “Condenação à adoção ou abstenção de comportamentos pela Administração Pública ou por particulares.”

Acresce que o aqui Recorrente intentou exatamente nos Tribunais Administrativos, Processo com objeto e objetivo conexo com a matéria aqui controvertida (Procº nº 121/17.0BEVIS), no qual peticionou que “(...) deverão as Requeridas (Junta de Freguesia de M... e GNR) ser intimadas para se absterem de colocar obstáculos ao exercício pelo requerente (aqui Recorrente) do direito à informação e à liberdade de imprensa, como jornalista, e de participação na Assembleia de Freguesia de M... como deputado eleito”

O referido Processo veio a ser julgado em Recurso neste TCAN, sem que a questão da competência material tivesse sequer sido suscitada.

Em face do referido, não se reconhece a verificação da suscitada incompetência material dos Tribunais Administrativos para julgar a presente Ação.

Por outro lado, entende ainda o aqui Recorrente que deverá ser admitido a fazer prova sobre os factos alegados nos artigos 6, 7 e 8 da contestação.
Em qualquer caso, é o próprio Recorrente quem não apresentou qualquer meio de prova, testemunhal ou documental, para fazer prova do conclusivamente invocado, e que, em qualquer caso, se circunscreve predominantemente à dimensão do equipamento de gravação e à desnecessidade de qualquer intervenção durante o seu funcionamento, o que determina a irrelevância decisória de qualquer prova que se fizesse em função do suscitado, quanto ao fundo da decisão controvertida.

Na realidade, o essencial da questão controvertida, prende-se com a incompatibilidade do exercício simultâneos de funções de Jornalista e Eleito Local.

Abordada e ultrapassada a referida questão, sublinha-se agora que a questão subjacente à presente Ação já foi sucessivamente decidida quer pelos Tribunais Administrativos, quer pelo Tribunal da Relação de Coimbra, nomeadamente no processo nº 447/15.8 GCTND.C1 de 16/02/2017, e no processo nº 106/16.4GCTND.C1, onde em 09/01/2017, se discorreu o seguinte:
“Ademais, é-nos de apodíctico juízo lhe também não assistir o – pessoalmente – assumido direito de simultâneo e acumulativo exercício na dita sessão – ou noutra qualquer – da função autárquica de membro (eleito local) da Assembleia de Freguesia e de Jornalista, por evidente inconciliabilidade dos respetivos conteúdos funcionais, não por o primeiro inerir a órgão de soberania, como incompreensivelmente afirmado na referenciada sentença (!) – já que apenas são órgãos de soberania o Presidente da República, a Assembleia da República, o Governo e os Tribunais, (cfr. art.º 110.º da Constituição nacional), categorias em que, axiomaticamente, se não integra a Assembleia de Freguesia (ou qualquer outro órgão autárquico)! –, ou por abstratamente existir entre tais atividades qualquer das incompatibilidades legais prevenidas sob o art.º 3.º/1 – máxime als. e) e f) – do Estatuto do Jornalista [a primeira com referência ao art.º 1.º/2 da Lei n.º 64/93, de 26/08 (na versão decorrente da alteração introduzida pela Lei n.º 28/95, de 26/08, e pela Lei Orgânica n.º 1/2011, de 30/11)[12]], mas porque a legal vinculatividade à nucleariedade dos pertinentes deveres legais – de deputado local – postulados pelo art.º 4.º do Estatuto dos Eleitos Locais (aprovado pela Lei n.º 29/87, de 30/06), e pelo 15.º do Regimento da Assembleia de Freguesia de X... , máxime de escrupuloso respeito pela pertinente normação legal e regimental, pela imparcial prossecução do interesse público e pelo fim público dos próprios poderes, e de empenhada, ativa, efetiva e contributiva participação nas correspetivas reuniões ordinárias e extraordinárias, com rigorosa observância da ordem e disciplina fixada na lei e no regimento – naturalmente colorida pela orientação política da correspondente força partidária –, bem como da autoridade e direção do presidente da mesa, se encontra em evidente assimetria com as fundamentais características do múnus jornalístico – legais e deontológicas –, essencialmente pautado pela independência, mormente do poder político, e liberdade de desapaixonada objetividade informativa do respetivo profissional, [cfr., máxime, arts. 37.º/1/2 e 38.º/1/2/a)/b)/4 da Constituição 6.º/a)/d) e 14.º/1/a) do Estatuto do Jornalista].
Como em tudo na vida, terá de optar e arcar com as emergentes consequências: ou contextualmente assume integral e proactivamente o cargo para que foi eleito, com escrupuloso cumprimento das pertinentes regras legais e regimentais, incluindo as atinentes ao ordeiro respeito pela institucional autoridade do presidente da AF [designadamente das prevenidas sob os arts. 14.º/1 do Regime Jurídico das Autarquias Locais (aprovado pela Lei n.º 75/2013, de 12/09)[15], 18.º/1/a)/d)/e)/i)/j) do Regimento da AF[16] e 21.º/2 do Código do Procedimento Administrativo (aprovado pelo D.L. n.º 4/2015, de 07/01)[17], como qualquer outro elemento, ou, caso persista em similar contumácia e disruptiva postura de afrontação, provocação e desrespeito das regras regimentais, seguramente legitimará a adoção pelo presidente da AF de pertinentes medidas de polícia para adequada reposição da ordem e do regular funcionamento da correspondente sessão – e, no limite, pela mesa, de marcação de falta injustificada, cuja repetição incontornavelmente condicionará a própria perda de mandato, reunidos que sejam os requisitos quantitativos estabelecidos sob o art.º 13.º/1/b) do Regimento –, em rigoroso exercício dos respetivos poderes-deveres institucionais conferidos pela enunciada dimensão normativa emergente da conjugada interpretação dos arts. 14.º/1/a)/d)/e)/i)/j) do RJAL, 18.º/1/a)/d)/e)/i)/j) do Regimento e 21.º/2 do CPA, em que naturalmente se insere a convocação de pertinente autoridade policial para adequada atuação, quiçá detenção em flagrante delito de crime de desobediência, como na referenciada ocasião aconteceu, [em estrita observância da disciplina jurídico-processual firmada sob os arts. 254.º/1/a), 255.º/1/a) e 256.º/1 do CPP].
Não vale tudo na luta política!...
Carece, obviamente, de jurídica sustentabilidade a residual argumentação de legitimação de gravação de imagem e som na qualidade de comum cidadão, já que a sua presença na referenciada sessão da AF de X... fora precisamente ditada pela convocação regimental na estrita qualidade de eleito local (deputado de assembleia de freguesia), como tal institucional e rigorosamente vinculado à já sobejamente caracterizada disciplina do próprio ato, cuja regulamentação, ademais, apenas permite a especial gravação oficial e provisória caracterizada sob o art.º 31.º/1 do Regimento para específico apoio à elaboração das atas, e até à respetiva aprovação (após o que deverá ser apagada) ” – v.g. Acórdão 447/15.8GCTND.C1.

Mas retornemos ao objeto da presente Ação.
Recorda-se que a Junta de Freguesia peticiona originariamente que o Demandado “seja condenado a abster-se de gravar e colher imagens da assembleia de freguesia de M..., concelho de Tondela, por qualquer meio ou recurso a quaisquer equipamentos, eletrónicos, manuais ou artesanais, deixando de perturbar o normal andamento da mesma e respeitando o funcionamento da Assembleia, quando nela está presente e participa na qualidade de eleito local e membro da mesma, tudo acrescido das demais consequências legais”.

Resulta dos contornos factuais da presente Ação que o Demandado, aqui Recorrente, enquanto membro da Assembleia de Freguesia tem sido confrontado pelo Presidente da Mesa da Assembleia de Freguesia, no sentido de optar pelo exercício de uma das funções, ou a de membro da assembleia ou de jornalista, não podendo exercer em simultâneo ambas as funções, mormente a circunstância de insistir na utilização durante as Sessões, nomeadamente, de meios de gravação audiovisual.

No essencial, mutatis mutandis, acompanhar-se-á muito do expendido a este respeito no acórdão deste TCAN nº 121/17.0BEVIS, de 15-09-2017, cuja questão subjacente era análoga àquela que aqui se mostra controvertida.

O cerne da questão suscitada prende-se com a necessidade de verificar se nas situações de facto concretamente enunciadas, conexas com a realização de Assembleias de Freguesia, se possam verificar incidentes idênticos aos aqui descritos, impondo-se encontrar uma saída legal que permita o normal funcionamento do órgão autárquico em questão.

O aqui Recorrente insiste que a sua atividade de recolha de som e imagem da Assembleia de Freguesia se limita a montar em tripé e a pôr em funcionamento o aparelho de gravação, que deixa a funcionar, sem qualquer ulterior intervenção.

É certo que nos termos do nº 2 do artigo 10º do Estatuto do jornalista, “para a efetivação do exercício do direito previsto no número anterior, os órgãos de comunicação social têm direito a utilizar os meios técnicos e humanos necessários ao desempenho da sua atividade”.

Em qualquer caso, não é suposto que um qualquer membro de uma Assembleia de Freguesia possa estar presente nas respetivas Sessões numa dualidade de funções, sob pena de desvirtuar o próprio funcionamento do órgão autárquico, perante uma manifesta promiscuidade funcional.

Se será verdade que o equipamento de recolha de som e imagem, funcionará automaticamente, não é menos verdade que a sua instalação e ativação resultarão funcional e incontornavelmente da atividade de Jornalista do aqui Recorrente.

Vejamos pontualmente o enquadramento constitucional e infraconstitucional da matéria controvertida.

A atividade de divulgação de ideias e imagens através dos órgãos de comunicação social teve acolhimento na Constituição da República Portuguesa a um nível de máxima dignidade jurídico-constitucional, consagrando a liberdade de expressão e informação e a liberdade de imprensa e meios de comunicação social como direitos fundamentais, no capítulo dos direitos, liberdades e garantias pessoais.

Assim, nos termos do n.º 1 do artigo 38º, com nossa relevância de sublinhado:
"1. É garantida a liberdade de imprensa.
2. A liberdade de imprensa implica:
a) A liberdade de expressão e criação dos jornalistas e colaboradores, bem como a intervenção dos primeiros na orientação editorial dos respetivos órgãos de comunicação social, salvo quando tiverem natureza doutrinária ou confessional;
b) O direito dos jornalistas, nos termos da lei, ao acesso às fontes de informação e à proteção da independência e do sigilo profissionais, bem como o direito de elegerem conselhos de redação;
c) O direito de fundação de jornais e de quaisquer outras publicações, independentemente de autorização administrativa, caução ou habilitação prévias.”.

Consequentemente, cabe à lei delimitar o âmbito de tais direitos e garantir o seu exercício, revelando ou concretizando limites imanentes e «assegurando meios de garantia (v.g., definindo o regime de emprego e as incompatibilidades dos jornalistas)», como esclarecem Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da república Portuguesa Anotada, Coimbra, 3ª ed., p. 231.

Por outro lado, dispõe o nº 1 do artigo 39º da CRP, o seguinte:
“1. Cabe a uma entidade administrativa independente assegurar nos meios de comunicação social:
a) O direito à informação e a liberdade de imprensa;
b) A não concentração da titularidade dos meios de comunicação social;
c) A independência perante o poder político e o poder económico;
d) O respeito pelos direitos, liberdades e garantias pessoais;
e) O respeito pelas normas reguladoras das atividades de comunicação social;
f) A possibilidade de expressão e confronto das diversas correntes de opinião;
g) O exercício dos direitos de antena, de resposta e de réplica política.”

Como afirmaram igualmente, reportadamente à Lei Constitucional nº 1/89, Gomes Canotilho e Vital Moreira, a instituição da Alta Autoridade para a Comunicação Social, «significa, desde logo, que a Constituição considera os direitos fundamentais aí referidos como princípios estruturantes de uma ordem constitucional democrática e livre e que constitui uma responsabilidade pública assegurar o seu exercício, criando garantias de defesa orgânico-institucionais», mais se afirmando que, «não apenas para garantir os referidos princípios nos órgãos de comunicação social públicos mas também nos privados».

A Lei de Imprensa (Lei nº 2/99, de 13 de Janeiro, com as alterações introduzidas pela Rect. nº 9/99, de 04/03, Lei nº 18/2003, de 11/06, Lei nº 19/2012, de 08/05 e Lei nº 78/2015, de 29/07) verte no seu artigo 1º, sob a epígrafe “garantia de liberdade de imprensa”:
“Garantia de liberdade de imprensa
1 - É garantida a liberdade de imprensa, nos termos da Constituição e da lei.
2 - A liberdade de imprensa abrange o direito de informar, de se informar e de ser informado, sem impedimentos nem discriminações.
3 - O exercício destes direitos não pode ser impedido ou limitado por qualquer tipo ou forma de censura.”

Sobre o seu conteúdo, refere-se no artigo 2º:
“1 - A liberdade de imprensa implica:
a) O reconhecimento dos direitos e liberdades fundamentais dos jornalistas, nomeadamente os referidos no artigo 22.º da presente lei;
b) O direito de fundação de jornais e quaisquer outras publicações, independentemente de autorização administrativa, caução ou habilitação prévias;
c) O direito de livre impressão e circulação de publicações, sem que alguém a isso se possa opor por quaisquer meios não previstos na lei.
2 - O direito dos cidadãos a serem informados é garantido, nomeadamente, através:
a) De medidas que impeçam níveis de concentração lesivos do pluralismo da informação;
b) Da publicação do estatuto editorial das publicações informativas;
c) Do reconhecimento dos direitos de resposta e de retificação;
d) Da identificação e veracidade da publicidade;
e) Do acesso à Alta Autoridade para a Comunicação Social, para salvaguarda da isenção e do rigor informativos;
f) Do respeito pelas normas deontológicas no exercício da atividade jornalística.”.

Já no artigo 3º refere-se o seguinte:
“A liberdade de imprensa tem como únicos limites os que decorrem da Constituição e da lei, de forma a salvaguardar o rigor e a objetividade da informação, a garantir os direitos ao bom nome, à reserva da intimidade da vida privada, à imagem e à palavra dos cidadãos e a defender o interesse público e a ordem democrática.”

Quanto ao direito dos jornalistas, refere o artigo 22º da Lei de Imprensa:
“Constituem direitos fundamentais dos jornalistas, com o conteúdo e a extensão definidos na Constituição e no Estatuto do Jornalista:
a) A liberdade de expressão e de criação;
b) A liberdade de acesso às fontes de informação, incluindo o direito de acesso a locais públicos e respetiva proteção;
c) O direito ao sigilo profissional;
d) A garantia de independência e da cláusula de consciência;
e) O direito de participação na orientação do respetivo órgão de informação.”

Finalmente, sob a epígrafe “atentado à liberdade de imprensa”, dispõe o artigo 33º:
“1 - É punido com pena de prisão de 3 meses a 2 anos ou multa de 25 a 100 dias aquele que, fora dos casos previstos na lei e com o intuito de atentar contra a liberdade de imprensa:
a) Impedir ou perturbar a composição, impressão, distribuição e livre circulação de publicações;
b) Apreender quaisquer publicações;
c) Apreender ou danificar quaisquer materiais necessários ao exercício da atividade jornalística.
2 - Se o infrator for agente do Estado ou de pessoa coletiva pública e agir nessa qualidade, é punido com prisão de 3 meses a 3 anos ou multa de 30 a 150 dias, se pena mais grave lhe não couber nos termos da lei penal.”

Já o Estatuto do Jornalista, aprovado pela Lei n.º 1/99, de 1 de Janeiro, com as alterações introduzidas pela Lei nº 64/2007, de 06/11, e Rect. nº 114/2007, de 20/12), refere, nomeadamente, o seguinte:
“Artigo 6.º
Direitos
Constituem direitos fundamentais dos jornalistas:
a) A liberdade de expressão e de criação;
b) A liberdade de acesso às fontes de informação;
c) A garantia de sigilo profissional;
d) A garantia de independência;
e) A participação na orientação do respetivo órgão de informação.
Artigo 7.º
Liberdade de expressão e criação
A liberdade de expressão e criação dos jornalistas não está sujeita a impedimentos ou discriminações nem subordinada a qualquer tipo ou forma de censura.
(…)
Artigo 9.º
Direito de acesso a locais públicos
1 - Os jornalistas têm o direito de acesso a locais abertos ao público desde que para fins de cobertura informativa.
2 - O disposto no número anterior é extensivo aos locais que, embora não acessíveis ao público, sejam abertos à generalidade da comunicação social.
3 - Nos espetáculos ou outros eventos com entradas pagas em que o afluxo previsível de espectadores justifique a imposição de condicionamentos de acesso poderão ser estabelecidos sistemas de credenciação de jornalistas por órgão de comunicação social.
4 - O regime estabelecido nos números anteriores é assegurado em condições de igualdade por quem controle o referido acesso.
Artigo 10.º
Exercício do direito de acesso
1 - Os jornalistas não podem ser impedidos de entrar ou permanecer nos locais referidos no artigo anterior quando a sua presença for exigida pelo exercício da respetiva atividade profissional, sem outras limitações além das decorrentes da lei.
2 - Para a efetivação do exercício do direito previsto no número anterior, os órgãos de comunicação social têm direito a utilizar os meios técnicos e humanos necessários ao desempenho da sua atividade.
3 - Nos espetáculos com entradas pagas, em que os locais destinados à comunicação social sejam insuficientes, será dada prioridade aos órgãos de comunicação de âmbito nacional e aos de âmbito local do concelho onde se realiza o evento.
4 - Em caso de desacordo entre os organizadores do espetáculo e os órgãos de comunicação social, na efetivação dos direitos previstos nos números anteriores, qualquer dos interessados pode requerer a intervenção da Entidade Reguladora para a Comunicação Social, tendo a deliberação deste órgão natureza vinculativa e incorrendo em crime de desobediência quem não a acatar.
5 - Os jornalistas têm direito a um regime especial que permita a circulação e estacionamento de viaturas utilizadas no exercício das respectivas funções, nos termos a estabelecer por portaria conjunta dos membros do Governo responsáveis pelas áreas da administração interna e da comunicação social.
(…)
Artigo 14.º
Deveres
1 - Constitui dever fundamental dos jornalistas exercer a respetiva atividade com respeito pela ética profissional, competindo-lhes, designadamente:
a) Informar com rigor e isenção, rejeitando o sensacionalismo e demarcando claramente os factos da opinião;
b) Repudiar a censura ou outras formas ilegítimas de limitação da liberdade de expressão e do direito de informar, bem como divulgar as condutas atentatórias do exercício destes direitos;
c) Recusar funções ou tarefas suscetíveis de comprometer a sua independência e integridade profissional;
d) Respeitar a orientação e os objetivos definidos no estatuto editorial do órgão de comunicação social para que trabalhem;
e) Procurar a diversificação das suas fontes de informação e ouvir as partes com interesses atendíveis nos casos de que se ocupem;
f) Identificar, como regra, as suas fontes de informação, e atribuir as opiniões recolhidas aos respetivos autores.
2 - São ainda deveres dos jornalistas:
a) Proteger a confidencialidade das fontes de informação na medida do exigível em cada situação, tendo em conta o disposto no artigo 11.º, exceto se os tentarem usar para obter benefícios ilegítimos ou para veicular informações falsas;
b) Proceder à retificação das incorreções ou imprecisões que lhes sejam imputáveis;
c) Abster-se de formular acusações sem provas e respeitar a presunção de inocência;
d) Abster-se de recolher declarações ou imagens que atinjam a dignidade das pessoas através da exploração da sua vulnerabilidade psicológica, emocional ou física;
e) Não tratar discriminatoriamente as pessoas, designadamente em razão da ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual;
f) Não recolher imagens e sons com o recurso a meios não autorizados a não ser que se verifique um estado de necessidade para a segurança das pessoas envolvidas e o interesse público o justifique;
g) Não identificar, direta ou indiretamente, as vítimas de crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual, contra a honra ou contra a reserva da vida privada até à audiência de julgamento, e para além dela, se o ofendido for menor de 16 anos, bem como os menores que tiverem sido objeto de medidas tutelares sancionatórias;
h) Preservar, salvo razões de incontestável interesse público, a reserva da intimidade, bem como respeitar a privacidade de acordo com a natureza do caso e a condição das pessoas;
i) Identificar-se, salvo razões de manifesto interesse público, como jornalista e não encenar ou falsificar situações com o intuito de abusar da boa fé do público;
j) Não utilizar ou apresentar como sua qualquer criação ou prestação alheia;
l) Abster-se de participar no tratamento ou apresentação de materiais lúdicos, designadamente concursos ou passatempos, e de televotos.
3 - Sem prejuízo da responsabilidade criminal ou civil que ao caso couber nos termos gerais, a violação da componente deontológica dos deveres referidos no número anterior apenas pode dar lugar ao regime de responsabilidade disciplinar previsto na presente lei.
(…)
Artigo 19.º
Atentado à liberdade de informação
1 - Quem, com o intuito de atentar contra a liberdade de informação, apreender ou danificar quaisquer materiais necessários ao exercício da atividade jornalística pelos possuidores dos títulos previstos na presente lei ou impedir a entrada ou permanência em locais públicos para fins de cobertura informativa nos termos do artigo 9.º e dos n.ºs 1, 2 e 3 do artigo 10.º, é punido com prisão até 1 ano ou com multa até 120 dias.
2 - Se o infrator for agente ou funcionário do Estado ou de pessoa coletiva pública e agir nessa qualidade, é punido com prisão até 2 anos ou com multa até 240 dias, se pena mais grave lhe não couber nos termos da lei penal.”.

O Decreto-Lei nº 70/2008, de 15 de Abril, veio a estabelecer, tal como consta do seu artigo 1º, as regras de organização e funcionamento da Comissão da Carteira Profissional de Jornalista (CCPJ), tendo ainda como objeto a regulamentação do sistema de acreditação profissional dos jornalistas e do respetivo regime de deveres e incompatibilidades profissionais, estando sujeitos às suas disposições os jornalistas, equiparados a jornalistas, correspondentes e colaboradores da área informativa de órgãos de comunicação social que exerçam a sua atividade em território nacional (artigo 2º), sendo que, de harmonia com o nº 1 do seu artigo 17º:
“1 - A ocorrência superveniente de incompatibilidade, prevista no Estatuto do Jornalista, suspende o direito ao título profissional de jornalista, de estagiário ou de equiparado, e implica:
a) O dever de o titular comunicar à CCPJ a correspondente situação e de proceder à entrega do título;
b) A não renovação do título enquanto subsistir a incompatibilidade e durante os prazos de impedimento referidos no artigo 3.º do Estatuto do Jornalista.”.

Tal como evidenciado pelo Sindicato dos Jornalistas, os jornalistas portugueses regem-se por um Código Deontológico que aprovaram em 4 de Maio de 1993, numa consulta que abrangeu todos os profissionais detentores de Carteira Profissional. O texto do projeto havia sido preliminarmente discutido e aprovado em Assembleia Geral realizada em 22 de Março de 1993.

Do mesmo consta, designadamente:
“(…)
3.O jornalista deve lutar contra as restrições no acesso às fontes de informação e as tentativas de limitar a liberdade de expressão e o direito de informar. É obrigação do jornalista divulgar as ofensas a estes direitos.
4.O jornalista deve utilizar meios leais para obter informações, imagens ou documentos e proibir-se de abusar da boa-fé de quem quer que seja. A identificação como jornalista é a regra e outros processos só podem justificar-se por razões de incontestável interesse público.
(…)
9.O jornalista deve respeitar a privacidade dos cidadãos excerto quando estiver em causa o interesse público ou a conduta do indivíduo contradiga, manifestamente, valores e princípios que publicamente defende. O jornalista obriga-se, antes de recolher declarações e imagens, a atender às condições de serenidade, liberdade e responsabilidade das pessoas envolvidas.
10.O jornalista deve recusar funções, tarefas e benefícios suscetíveis de comprometer o seu estatuto de independência e a sua integridade profissional. O jornalista não deve valer-se da sua condição profissional para noticiar assuntos em que tenha interesses.”

Sublinha-se que o jornal de que o aqui Recorrente é diretor, é um órgão da imprensa regional.

Sobre a imprensa regional, considera o legislador: “A imprensa regional desempenha um papel altamente relevante, não só no âmbito territorial a que naturalmente mais diz respeito, mas também na informação e contributo para a manutenção de laços de autêntica familiaridade entre as gentes locais e as comunidades de emigrantes dispersas pelas partes mais longínquas do Mundo. Muitas vezes, ela é, com efeito, o único veículo de publicitação das aspirações a que a imprensa de expansão nacional dificilmente é sensível; e constitui, por outro lado, um autêntico veículo de difusão, junto daqueles que se encontram fora do País, daquilo que se passa com os que não os quiseram ou não puderam acompanhar. Além disso, tem, por regra, sabido desempenhar uma função cultural a que nenhum órgão de comunicação social pode manter-se alheio.” — lê-se no preâmbulo do Decreto-Lei nº 106/88, de 31 de Março, que aprovou o Estatuto da Imprensa Regional (EIR).
Como dispõe o artigo 9º, a imprensa regional continua a reger-se pela Lei de Imprensa em tudo o que não estiver previsto no presente Estatuto.

Sendo uma publicação periódica de informação geral, destinada predominantemente às Respectivas comunidades regionais e locais (cfr. artigo 1º do EIR), as suas funções integram especificidades que o artigo 2º refere:
“a) Promover a informação respeitante às diversas regiões, como parte integrante da informação nacional, nas suas múltiplas facetas;
b) Contribuir para o desenvolvimento da cultura e identidade regional através do conhecimento e compreensão do ambiente social, político e económico das regiões e localidades, bem como para a promoção das suas potencialidades de desenvolvimento;
c) Assegurar às comunidades regionais e locais o fácil acesso à informação;
d) Contribuir para o enriquecimento cultural e informativo das comunidades regionais e locais, bem como para a ocupação dos seus tempos livres;
e) Proporcionar aos emigrantes portugueses no estrangeiro informação geral sobre as suas comunidades de origem, fortalecendo os laços entre eles e as respectivas localidades e regiões;
f) Favorecer uma visão da problemática regional, integrada no todo nacional e internacional.”

De harmonia com o artigo 7º do EIR, constituem direitos dos jornalistas da imprensa regional, para além da garantia de independência e de sigilo, a liberdade de criação, expressão e divulgação e a liberdade de acesso às fontes de informação, que abrange o livre acesso às fontes de informação dependentes da administração direta ou indireta do Estado, das entidades autárquicas ou outros entes públicos cujo âmbito de funcionamento incida fundamentalmente na localidade ou região sede do órgão de imprensa regional em que exerçam funções, sem prejuízo das restrições gerais estabelecidas na Lei de Imprensa.

Assim, para efetivação do disposto no número anterior são reconhecidos aos jornalistas da imprensa regional em exercício de funções o direito de não serem impedidos de desempenhar a respetiva função em qualquer local de acesso público onde a sua presença seja ditada pelo exercício da sua atividade; Como também o direito de não serem desapossados do material utilizado ou obrigados a exibir os elementos recolhidos, a não ser por mandado judicial nos termos da lei.

No que concerne já aos deveres, refere o Artº 8º do mesmo EIR, que constituem seus deveres fundamentais respeitar escrupulosamente a verdade, o rigor e objetividade da informação, respeitar a orientação e os objetivos definidos no estatuto editorial da publicação em que trabalhem e observar os limites ao exercício da liberdade de imprensa nos termos da lei.

No que concerne já à organização local do Estado, prevê a Constituição a existência de autarquias locais, entre as quais as freguesias, dotadas de órgãos representativos - deliberativos (assembleia de freguesia) e executivos (junta de freguesia), os quais visam a prossecução de interesses próprios das populações respectivas (artigos 235º e 239º), afirmando-se o princípio da sua autonomia no artigo 6º, enquanto forma de administração autónoma territorial, o que não exclui a tutela estadual (artigo 242º), e dotadas de poder regulamentar próprio nos limites que o artigo 241º verte.

De entre as competências de funcionamento, nos termos do nº 1 do artigo 10º da Lei nº 75/2013, de 12 d Setembro, na redação da Lei n.º 42/2016, de 28/12, Lei n.º 7-A/2016, de 30/03, Lei n.º 69/2015, de 16/07, Lei n.º 25/2015, de 30/03, Retificação n.º 50-A/2013, de 11/11, e Retificação n.º 46-C/2013, de 01/11, compete à assembleia de freguesia elaborar e aprovar o seu regimento.

Nos termos do disposto no artigo 32º do Regimento da Assembleia de Freguesia de M..., aprovado em 21 de Dezembro de 2013, as sessões da assembleia são públicas, não podendo ser vedada a entrada a pessoas a que elas pretendam assistir, o que verte o disposto no artigo 49º da referida Lei nº 75/2013, que dispõe:
“Artigo 49.º
Sessões e reuniões
1 - As sessões dos órgãos deliberativos das autarquias locais são públicas, sendo fixado, nos termos do regimento, um período para intervenção e esclarecimento ao público.
2 - Os órgãos executivos das autarquias locais realizam, pelo menos, uma reunião pública mensal, aplicando-se, com as devidas adaptações, o disposto na parte final do número anterior.
3 - Às sessões e reuniões dos órgãos das autarquias locais deve ser dada publicidade, com indicação dos dias, horas e locais da sua realização, de forma a promover o conhecimento dos interessados com uma antecedência de, pelo menos, dois dias úteis sobre a data das mesmas.
4 - A nenhum cidadão é permitido intrometer-se nas discussões, aplaudir ou reprovar as opiniões emitidas, as votações feitas ou as deliberações tomadas.
5 - A violação do disposto no número anterior é punida com coima de (euro) 150 a (euro) 750, para cuja aplicação é competente o juiz da comarca, após participação do presidente do respetivo órgão.
6 - As atas das sessões e reuniões, terminada a menção aos assuntos incluídos na ordem do dia, fazem referência sumária às eventuais intervenções do público na solicitação de esclarecimentos e às respostas dadas.”

Dispõe ainda o artigo 31º daquele Regimento que: “Para efeitos de elaboração da redação das atas as reuniões serão gravadas. Estas gravações servirão apenas para este efeito e serão apagadas logo após a aprovação das atas”.

Assim, visando a elaboração das atas (artigo 57º da Lei nº 75/2013, de 12 de Setembro) ordena o identificado Regimento a gravação, que servirão apenas para a redação das atas, sendo no mais despicienda pela simples razão de que a aprovação e assinatura das atas e suas minutas é condição de eficácia das deliberações adotadas nas respectivas sessões ou reuniões e, como tal, são as atas, nos termos da lei, que não a gravação, as únicas peças previstas para relatar, descrever ou registar o que se passou na sessão ou reunião.

Nos termos do nº 1 do referido artigo 57º da Lei nº 75/2013, “De cada sessão ou reunião é lavrada ata, a qual contém um resumo do que de essencial nela se tiver passado, indicando, designadamente, a data e o local da sessão ou reunião, os membros presentes e ausentes, os assuntos apreciados, as decisões e deliberações tomadas e a forma e o resultado das respetivas votações e, bem assim, o facto de a ata ter sido lida e aprovada”, dispondo o seu nº 4: “As deliberações dos órgãos só adquirem eficácia depois de aprovadas e assinadas as respetivas atas ou depois de assinadas as minutas, nos termos dos números anteriores”.

No que concerne já e especificamente ao Eleito Local, a lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos, como vertem os nºs 1 e 2 do artigo 18º da CRP, e mesmo no caso de suspensão do exercício de direitos, a Constituição contém uma cláusula de intangibilidade de certos direitos no nº 6 do artigo 19º.

Relativamente ao estatuto de titulares de cargos políticos e segundo o nº 2 do artigo 117º, a lei dispõe sobre os deveres, responsabilidades e incompatibilidades dos titulares de cargos políticos, as consequências do respetivo incumprimento, bem como sobre os respetivos direitos, regalias e imunidades.

O Estatuto dos Eleitos Locais está fixado na Lei nº 29/87, de 30 de Junho, com a redação conferida pela Lei n.º 53-F/2006, de 29/12, Lei n.º 52-A/2005, de 10/10), Lei n.º 22/2004, de 17/06, Lei n.º 86/2001, de 10/08, Lei n.º 50/99, de 24/06, Lei n.º 127/97, de 11/12, Lei n.º 11/96, de 18/04, Lei n.º 11/91, de 17/05, Lei n.º 1/91, de 10/01, e Lei n.º 97/89, de 15/12).

Quanto ao regime do desempenho de funções, dispõe no artigo 2º, nº 4, entre o mais, que “os membros dos órgãos deliberativos e consultivos são dispensados das suas funções profissionais, mediante aviso antecipado à entidade empregadora, quando o exija a sua participação em atos relacionados com as suas funções de eleitos, designadamente em reuniões dos órgãos e comissões a que pertencem ou em atos oficiais a que devem comparecer”.

Isto significa que o regime de desempenho de funções dos eleitos locais, enquanto membros dos órgãos deliberativos e consultivos, permite que os mesmos mantenham, durante o respetivo mandato, as suas atividades ou funções profissionais.

Quanto ao exercício das suas funções, os eleitos locais estão vinculados ao cumprimento dos princípios constantes do artigo 4º do mesmo Estatuto dos Eleitos Locais, que aqui se vertem, com nossos sublinhados de relevância das matérias:
“No exercício das suas funções, os eleitos locais estão vinculados ao cumprimento dos seguintes princípios:
a) Em matéria de legalidade e direitos dos cidadãos:
i) Observar escrupulosamente as normas legais e regulamentares aplicáveis aos atos por si praticados ou pelos órgãos a que pertencem;
ii) Cumprir e fazer cumprir as normas constitucionais e legais relativas à defesa dos interesses e direitos dos cidadãos no âmbito das suas competências;
iii) Atuar com justiça e imparcialidade;
b) Em matéria de prossecução do interesse público:
i) Salvaguardar e defender os interesses públicos do Estado e da respetiva autarquia;
ii) Respeitar o fim público dos poderes em que se encontram investidos;
iii) Não patrocinar interesses particulares, próprios ou de terceiros, de qualquer natureza, quer no exercício das suas funções, quer invocando a qualidade de membro de órgão autárquico;
iv) Não intervir em processo administrativo, ato ou contrato de direito público ou privado nem participar na apresentação, discussão ou votação de assuntos em que tenha interesse ou intervenção, por si ou como representante ou gestor de negócios de outra pessoa, ou em que tenha interesse ou intervenção em idênticas qualidades o seu cônjuge, parente ou afim em linha reta ou até ao 2.º grau da linha colateral, bem como qualquer pessoa com quem viva em economia comum;
v) Não celebrar com a autarquia qualquer contrato, salvo de adesão;
vi) Não usar, para fins de interesse próprio ou de terceiros, informações a que tenha acesso no exercício das suas funções;
c) Em matéria de funcionamento dos órgãos de que sejam titulares:
i) Participar nas reuniões ordinárias e extraordinárias dos órgãos autárquicos;
ii) Participar em todos os organismos onde estão em representação do município ou da freguesia.”

O Estatuto do Jornalista, no âmbito das incompatibilidades, constantes do artigo 3º, refere nas suas alíneas e) e f) do nº 1, o seguinte:
“1 - O exercício da profissão de jornalista é incompatível com o desempenho de: (…)
e) Funções enquanto titulares de órgãos de soberania ou de outros cargos políticos, tal como identificados nas alíneas a), b), c), e) e g) do n.º 2 do artigo 1.º da Lei n.º 64/93, de 26 de Agosto, alterada pelas Leis n.ºs 39-B/94, de 27 de Dezembro, 28/95, de 18 de Agosto, 42/96, de 31 de Agosto, e 12/98, de 24 de Fevereiro, e enquanto deputados nas Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas, bem como funções de assessoria, política ou técnica, a tais cargos associadas;
f) Funções executivas, em regime de permanência, a tempo inteiro ou a meio tempo, em órgão autárquico.”

A Lei nº 64/93, de 26 de Agosto, na redação conferida pela Lei Orgânica n.º 1/2011, de 30/11, Decreto-Lei n.º 71/2007, de 27/03, Lei n.º 12/98, de 24/02, Lei n.º 42/96, de 31/08, Lei n.º 12/96, de 18/04, Lei n.º 28/95, de 26/08 e Lei n.º 39-B/94, de 27/12, regula o regime do exercício de funções pelos titulares de órgãos de soberania e por titulares de outros cargos políticos.

Em face do disposto no nº 2 do seu artigo 1º, o Recorrente, enquanto membro da assembleia de freguesia, não é considerado titular de cargo político, pois, ao nível do poder autárquico, apenas assim são considerados o presidente e vereador a tempo inteiro das câmaras municipais.

Também não pode ser considerado titular de alto cargo público, pois a sua situação enquanto eleito local não é subsumível ao disposto no artigo 3º da Lei 64/93.

Assim, a situação de membro de uma assembleia de freguesia não se mostra subsumível à previsão normativa da supra referida alínea e) do nº 1 do artigo 3º do Estatuto do Jornalista.

Ademais, a freguesia não é um órgão de soberania (cfr. artigo 110º da CRP) e os seus membros não figuram no elenco dos cargos políticos vertidos nas referidas alíneas a), b), c), e) e g) do n.º 2 do artigo 1.º da Lei n.º 64/93, de 26 de Agosto, nem, por fim, estamos perante deputado em qualquer das Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas.

Também não se mostra subsumível à supra transcrita alínea f) do nº 1 do artigo 3º do Estatuto do Jornalista, aliás, na lógica do âmbito da Lei nº 64/93, definido no seu artigo 1º, uma vez que a assembleia de freguesia é um órgão deliberativo (artigo 6º, nº 1, da Lei nº 75/2013, de 12 de Setembro), que não executivo.

Aqui chegados, importa sintetizar o seguinte:
I. A assembleia de freguesia é o órgão deliberativo da freguesia, sendo esta uma autarquia local que integra a organização democrática do Estado;
II. As sessões da assembleia de freguesia são públicas, não podendo ser vedada a entrada a pessoas a que elas pretendam assistir;
III. Todos os cidadãos têm o direito de tomar parte na vida política e na direção dos assuntos públicos do país, diretamente ou por intermédio de representantes livremente eleitos, como garante o artigo 48º da CRP, o que constitui um instrumento fundamental de consolidação do sistema democrático (artigo 109º da CRP).
IV. Relativamente ao estatuto de titulares de cargos políticos e segundo o comando constitucional ínsito no nº 2 do artigo 117º, a lei dispõe sobre os deveres, responsabilidades e incompatibilidades dos titulares de cargos políticos, as consequências do respetivo incumprimento, bem como sobre os seus direitos, regalias e imunidades.
V. Quanto ao regime do exercício de funções, para efeitos da Lei nº 64/93, de 26 de Agosto, que estabelece o regime jurídico de incompatibilidades e impedimentos dos titulares de cargos políticos e altos cargos públicos, os membros da assembleia de freguesia não são considerados titulares de cargo político, pois, ao nível do poder autárquico, apenas assim são considerados o presidente e vereador a tempo inteiro das câmaras municipais (artigo 1º, nº 2).
VI. O Estatuto dos Eleitos Locais, definido pela Lei n.º 29/87, de 30 de Junho, deixa expresso no seu artigo 2º, nºs 4 e 6, que, designadamente, os membros dos órgãos deliberativos e consultivos são dispensados das suas funções profissionais, mediante aviso antecipado à entidade empregadora, quando o exija a sua participação em atos relacionados com as suas funções de eleitos, e ainda, que todas as entidades públicas e privadas estão sujeitas ao dever geral de cooperação para com os eleitos locais no exercício das suas funções.
VII. Vinculados a participar nas sessões e reuniões, os eleitos locais estão ainda vinculados, em matéria de prossecução do interesse público, entre o mais constante do artigo 4º do EEL:
a. Respeitar o fim público dos poderes em que se encontram investidos;
b. Não patrocinar interesses particulares, próprios ou de terceiros, de qualquer natureza, quer no exercício das suas funções, quer invocando a qualidade de membro de órgão autárquico;
c. Não participar na apresentação, discussão ou votação de assuntos em que tenha interesse ou intervenção, por si ou como representante ou gestor de negócios de outra pessoa;
d. Não usar, para fins de interesse próprio ou de terceiros, informações a que tenha acesso no exercício das suas funções;
VIII. Os jornalistas têm o direito de acesso a locais abertos ao público, ou abertos à generalidade da comunicação social, desde que para fins de cobertura informativa, não podendo ser impedidos de entrar ou permanecer nesses locais quando a sua presença for exigida pelo exercício da respetiva atividade profissional, sem outras limitações além das decorrentes da lei e têm direito a utilizar os meios técnicos e humanos necessários ao desempenho da sua atividade — artigos 9º e 10º do Estatuto do Jornalista;
IX. Constitui dever fundamental dos jornalistas exercer a respetiva atividade com respeito pela ética profissional, designadamente, entre o mais constante do artigo 14º do Estatuto do Jornalista:
a. Informar com rigor e isenção;
b. Recusar funções ou tarefas suscetíveis de comprometer a sua independência e integridade profissional;
X. Especificamente no âmbito da imprensa regional, são reconhecidos aos seus jornalistas em exercício de funções o direito de não serem impedidos de desempenhar a respetiva função em qualquer local de acesso público onde a sua presença seja ditada pelo exercício da sua atividade; Como também o direito de não serem desapossados do material utilizado ou obrigados a exibir os elementos recolhidos, a não ser por mandado judicial nos termos da lei; Além disso, têm o direito de serem apoiados pelas autoridades no bom desempenho das suas funções (cfr. artigo 7º do EIR).
XI. Já no campo dos deveres, tal como verte o artigo 8º do mesmo EIR, constituem seus deveres respeitar escrupulosamente a verdade, o rigor e objetividade da informação, respeitar a orientação e os objetivos definidos no estatuto editorial da publicação em que trabalhem e observar os limites ao exercício da liberdade de imprensa nos termos da lei.
XII. Entre os demais deveres constantes do Código Deontológico dos Jornalistas, consta no ponto 10: O jornalista deve recusar funções, tarefas e benefícios suscetíveis de comprometer o seu estatuto de independência e a sua integridade profissional. O jornalista não deve valer-se da sua condição profissional para noticiar assuntos em que tenha interesse.
XIII. A utilização de meios técnicos, v.g. de gravação audiovisual, constitui uma forma instrumental de exercício do direito previsto no nº 1 do artigo 10º do estatuto do Jornalista;
XIV. Exerce simultaneamente ambas as atividades, de jornalista e de membro da assembleia de freguesia, o jornalista que, nessa qualidade, aciona a gravação audiovisual, por meios técnicos adequados a essa finalidade, antes do início da sessão ou reunião de uma assembleia de freguesia visando a gravação da mesma, tomando, de seguida, lugar no seio daquele órgão autárquico para na sessão ou reunião participar, na qualidade de eleito local e membro dessa assembleia, enquanto aquela gravação decorre.

Importa agora verificar e analisar o regime de deveres e incompatibilidades dos jornalistas.

O artigo 39º da CRP prevê a regulação da comunicação social, cometendo a uma entidade administrativa independente, cuja composição, competências, organização e funcionamento são definidas por lei, assegurar nos meios de comunicação social, entre o mais, o direito à informação e a liberdade de imprensa, bem como o respeito pelas normas reguladoras das atividades de comunicação social.

A Alta Autoridade para a Comunicação Social que a Constituição previa naquele artigo 39º anteriormente às alterações introduzidas pela Lei Constitucional nº 1/2004, de 24 de Julho, foi extinta, na sequência dessa alteração, e substituída pela ERC – Entidade Reguladora para a Comunicação Social, criada pela Lei nº 53/2005, de 8 de Novembro, pessoa coletiva de direito público, dotada de autonomia administrativa e financeira, com natureza de entidade administrativa independente, exercendo os necessários poderes de regulação e supervisão (artigo 1º), estando sujeitas à sua supervisão e intervenção do conselho regulador todas as entidades (pessoas singulares ou coletivas) que, sob jurisdição do Estado Português, prossigam atividades de comunicação (artigo 6º).

De entre as atribuições da ERC constantes do artigo 8º do referido diploma legal, destacam-se, por maior pendor imediatamente relevante à economia do caso presente, a de assegurar o livre exercício do direito à informação e à liberdade de imprensa, zelar pela independência das entidades que prosseguem atividades de comunicação social perante os poderes político e económico, garantir o respeito pelos direitos, liberdades e garantias, assegurar o cumprimento das normas reguladoras das atividades de comunicação social.

No exercício das suas atribuições, a ERC assume os direitos e obrigações atribuídos ao Estado nas disposições legais e regulamentares aplicáveis, designadamente, quanto à cobrança coerciva de taxas, rendimentos do serviço e outros créditos e à fiscalização do cumprimento das obrigações de serviço público no sector da comunicação social, à determinação da prática das infrações respectivas e à aplicação das competentes sanções (artigo 12º).

De notar ainda que no exercício dos poderes de supervisão, a ERC pode proceder a averiguações e exames em qualquer entidade ou local, no quadro da prossecução das atribuições que lhe estão cometidas, cabendo aos operadores de comunicação social alvo de supervisão facultar o acesso a todos os meios necessários para o efeito (cfr. artigo 53º da mencionada Lei nº 53/2005).

Acresce que, a qualquer interessado assiste o direito de queixa relativa a comportamento suscetível de configurar violação de direitos, liberdades e garantias ou de quaisquer normas legais ou regulamentares aplicáveis às atividades de comunicação social, nos termos previstos no artigo 55º, originando um procedimento com observância do princípio do contraditório e audiência de conciliação, que culmina no dever de decisão (artigos 55º a 58º).

Se bem que as diretivas e recomendações não tenham carácter vinculativo (artigo 63º), já as decisões adotadas pelo conselho regulador (órgão da ERC - artigos 13º e 14º) têm carácter vinculativo, sendo notificadas aos respetivos destinatários, tal como vertido no artigo 64º, nºs 1 e 2, e os membros dos órgãos executivos das entidades que prosseguem atividades de comunicação social bem como os diretores de publicações e diretores de programação e informação dos operadores de rádio e de televisão serão pessoalmente responsáveis pelo cumprimento da decisão proferida (nº 3 do mesmo artigo 64º).

Por outro lado, compete à ERC, no âmbito dos procedimentos sancionatórios (artigo 67º), designadamente, processar e punir a prática das contraordenações previstas nos presentes Estatutos, bem como aquelas que lhe forem atribuídas por qualquer outro diploma, em matéria de comunicação social, incumbindo-lhe, ainda, participar às autoridades competentes a prática de ilícitos penais de que tome conhecimento no desempenho das suas funções.

De harmonia e nos termos do disposto nos artigos 68º a 71º da identificada Lei nº 53/2005, constituem contraordenações puníveis com coima a recusa de colaboração, a recusa de acesso para averiguações e exames, a não preservação de registo e a recusa de acatamento e cumprimento deficiente de decisão, com o intuito de impedir os efeitos por ela visados de decisões, entre o mais, que imponha o cumprimento das obrigações inerentes ao licenciamento e autorização do acesso às atividades de comunicação social, sejam estas decorrentes da lei, de regulamento ou de contrato administrativo.

O controlo judicial da atividade dos órgãos e agentes da ERC mostra-se definido no artigo 75º:
“1 - A atividade dos órgãos e agentes da ERC fica sujeita à jurisdição administrativa, nos termos e limites expressamente previstos pelo Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais.
2 - As sanções por prática de ilícitos de mera ordenação social são impugnáveis junto dos tribunais judiciais competentes.
3 - Das decisões proferidas no âmbito da resolução de litígios cabe recurso para os tribunais judiciais ou arbitrais, nos termos previstos na lei.
4 - A instauração de ação administrativa para impugnação de decisão da ERC ou a interposição de recurso para os tribunais judiciais ou arbitrais não suspende os efeitos da decisão impugnada ou recorrida, salvo decretação da correspondente providência cautelar.”

Vejamos agora a Comissão da Carteira Profissional de Jornalista (CCPJ).
Esta CCPJ foi instituída pelo Decreto-Lei nº 291/94, de 16 de Novembro, em alteração ao artigo 2º do Decreto-Lei nº 513/79, de 24 de Dezembro, (que aprovou o Regulamento da Carteira profissional do Jornalista).

O Decreto-Lei nº 70/2008, de 15 de Abril, veio estabelecer as regras de organização e funcionamento da Comissão da Carteira Profissional de Jornalista (CCPJ), tendo ainda como objeto a regulamentação do sistema de acreditação profissional dos jornalistas e do respetivo regime de deveres e incompatibilidades profissionais.

Lê-se no seu preâmbulo: “A Lei n.º 64/2007, de 6 de Novembro, que alterou a Lei n.º 1/99, de 13 de Janeiro (aprova o Estatuto do Jornalista), ditou o reforço de competências e a alteração da composição da Comissão da Carteira Profissional de Jornalista (CCPJ). Se a esta entidade continuam a ser atribuídas as funções de assegurar o funcionamento do sistema de acreditação dos profissionais da informação dos órgãos de comunicação social e a salvaguarda do regime de incompatibilidades profissionais dos jornalistas, acrescem-lhe agora as de verificar, e eventualmente sancionar, o incumprimento de alguns dos deveres legais que sobre eles impendem. Passou também a CCPJ a ocupar-se da organização das comissões de arbitragem em matéria de litígios relativos a direitos de autor dos jornalistas cuja constituição lhe venha a ser solicitada.”

A CCPJ é um organismo independente de direito público, ao qual incumbe assegurar o funcionamento do sistema de acreditação profissional dos jornalistas, equiparados a jornalistas, correspondentes e colaboradores da área informativa dos órgãos de comunicação social, bem como o cumprimento dos respetivos deveres profissionais, nos termos do Estatuto do Jornalista e do presente decreto-lei, tal como verte o artigo 3º do referido Decreto-Lei nº 70/2008.

Estão sujeitos às suas disposições os jornalistas, equiparados a jornalistas, correspondentes e colaboradores da área informativa de órgãos de comunicação social que exerçam a sua atividade em território nacional (artigo 2º).

À CCPJ compete, nos termos do disposto no artigo 4º do referido diploma legal:
“a) Atribuir, renovar, suspender ou cassar os títulos de acreditação profissional dos jornalistas, equiparados a jornalistas, correspondentes e colaboradores da área informativa dos órgãos de comunicação social;
b) Apreciar, julgar e sancionar a violação, pelos jornalistas, equiparados a jornalistas, correspondentes e colaboradores da área informativa dos órgãos de comunicação social, dos deveres profissionais enunciados no n.º 2 do artigo 14.º do Estatuto do Jornalista;
c) Aprovar, após consulta pública aos jornalistas, o regulamento aplicável ao procedimento disciplinar e promover a sua publicação, nos termos da lei;
d) Assegurar a constituição e o funcionamento das comissões de arbitragem previstas no artigo 7.º-C do Estatuto do Jornalista e aprovar o respetivo regulamento;
e) Instruir os processos de contraordenação por infração aos artigos 3.º, 4.º, 5.º, 7.º-A, 7.º-B, 15.º e 17.º do Estatuto do Jornalista e aplicar as respectivas coimas e sanções acessórias;
f) Aprovar o regulamento e organizar o processo eleitoral dos membros da CCPJ designados pelos jornalistas profissionais;
g) Exercer os demais poderes que lhe sejam conferidos por lei.”

A CCPJ tem ainda poderes de cassação do título de jornalista, nos termos previstos no nº 4 do artigo 17º e exerce o poder disciplinar profissional, nos termos dispostos nos artigos 23º a 25º.

A ERC, no seguimento de queixa apresentada pelo aqui Recorrente, emitiu deliberação sobre a matéria, em 12-10-2016, e nela lê-se, designadamente:
“V. Análise e fundamentação
(…)
53. A este propósito, assinala-se que se afigura eticamente questionável a admissibilidade concreta de exercício, em simultâneo, num mesmo ato, das funções de jornalista e de membro de uma assembleia de freguesia. Em concreto, colocar a câmara a gravar de um lado, enquanto se exerce o mandato de deputado num outro, configura um exercício de jornalismo que suscita questões de conduta profissional que são patentes.
54. Assim, entende o Conselho Regulador que o Queixoso, enquanto exerça o jornalismo e esteja presente na sessão para os efeitos informativos – a finalidade por excelência do direito de acesso – não pode ser impedido de fazê-lo, mas já não poderá fazer valer os seus direitos de jornalista quando age enquanto membro da assembleia de freguesia.
(…)
VI. Deliberação
(…)
E, por último, atendendo a que a circunstância do exercício simultâneo das funções de jornalistas e de membro de uma assembleia de freguesia, no mesmo ato, tem contornos ético-profissionais questionáveis e que o direito de acesso dos jornalistas só pode ser reconhecido ao Queixoso quanto este atua enquanto tal;
O conselho Regulador (…) delibera:
1. Alertar a Assembleia de Freguesia de ML para a necessidade de observância das normas respeitantes ao direito de acesso a lugares públicos pelos jornalistas, abstendo-se de impedir, por qualquer modo, o exercício deste direito, o qual inclui os meios técnicos necessários ao desempenho da profissão;
2. Remeter a presente deliberação ao conhecimento da Comissão da Carteira de Jornalistas para os efeitos tidos por convenientes, considerando que poderá estar em causa o cumprimento dos deveres de jornalistas, previstos no artigo 14º do EJ.”

O que está aqui em causa, como já esteve noutros processos de natureza análoga, será verificar se poderá o aqui Recorrente, enquanto membro de uma assembleia de freguesia participar numa sessão ou reunião da mesma e, simultaneamente, exercer a atividade de jornalista, ainda que por intermédio de meios mecânicos de funcionamento autónomo sem que incorra na violação da juridicidade aplicável.

Antecipa-se desde logo que a nossa opção é negativa, sob pena de se gerar um clima de intensa promiscuidade funcional.

O Recorrente, sendo diretor e equiparado a jornalista da publicação trimestral, integrante da imprensa regional, propriedade da Casa do Povo de M..., (Cfr. Decreto-Lei nº 4/82, de 11 de Janeiro e Decreto-lei nº 246/90, de 27 de Julho) está necessariamente sujeito à observância das regras e deontologia que regem a atividade jornalística.

Por outro lado, e incontornavelmente, enquanto eleito local deve obediência às vinculações, entre o mais, ínsitas no referido artigo 4º do EEL.

Enquanto eleito local, o membro de assembleia de freguesia, obtém a sua legitimidade do sufrágio eleitoral, pelo que não pode confundir essas funções com o seu desempenho profissional.

Se é certo que um jornalista, simultaneamente eleito local, não deixa de poder exercer ambas as funções, o que é facto é que não deverá confundi-las promiscuamente, aproveitando-se das prerrogativas de uma delas, para o desempenho da sua outra função.

Sintomaticamente, refere-se no poto 10 do Código Deontológico do Jornalista, que o “O jornalista deve recusar funções, tarefas e benefícios suscetíveis de comprometer o seu estatuto de independência e a sua integridade profissional.”; mais afirmando que “O jornalista não deve valer-se da sua condição profissional para noticiar assuntos em que tenha interesse.”

Estamos pois manifestamente, perante um claro conflito de interesses, com implicações ao nível da imparcialidade e da isenção jornalística.
Em concreto, se a simultaneidade da titularidade dos direitos decorrentes da atividade de jornalista e de membro da Assembleia de Freguesia, nas palavras da ERC, “suscita questões de conduta profissional que são patentes”, já a situação do exercício simultâneo da atividade jornalística e de participação na qualidade de eleito local em sessão ou reunião de assembleia de freguesia enquanto seu membro agrava a afronta do dever ínsito no nº 1 do artigo 14º do Estatuto do Jornalista, a saber, o dever do exercício da respetiva atividade com respeito pela ética profissional, bem como o dever de recusar funções ou tarefas suscetíveis de comprometer a sua independência e integridade profissional [alínea c) do nº 1 do mesmo artigo].

Efetivamente, a liberdade de informação e de imprensa, tal como quaisquer outros direitos, liberdades e garantias não constituem direitos ilimitados nem absolutos.

No balanceamento que se faça entre a liberdade de imprensa e o direito de participação na vida política, impõe-se no caso concreto, não escamotear nem esquecer a necessidade de ambos os conceitos poderem “conviver” sem que nenhum deles possa ser intoleravelmente comprimido pelo outro de modo inaceitável, nem permitindo uma subsistência promiscua entre ambos.

Improcedem assim totalmente os fundamentos do recurso.
* * *
Deste modo, em conformidade com o precedentemente expendido, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao Recurso, confirmando-se a Sentença Recorrida.

Custas pelo Recorrente.

Porto, 15 de novembro de 2019

Frederico de Frias Macedo Branco
Nuno Coutinho
Ricardo de Oliveira e Sousa