Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00472/06.0BEVIS
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:10/18/2018
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:Paula Moura Teixeira
Descritores:CUSTOS FISCAIS; PRINCÍPIO DO INQUISITÓRIO; TRIBUTAÇÃO AUTÓNOMA;
Sumário:I. Da conjunção dos artigos 712.º e 685º-B.º do CPC, (atuais art.ºs 662.º e 640.º) que a Relação [in casu a Tribunal Central] deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se a prova produzida impuser decisão diversa desde que o recorrente especifique os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados indique os concretos meios probatórios.
II. Os artigos 99.º da LGT e 13.º do CPPT não descaracterizam nem invalidam, o princípio base do processo tributário do impulso processual, quer do contribuinte/sujeito passivo quer da Fazenda Pública, nomeadamente quanto à prova dos factos que pretende que o tribunal reconheça.
III. O princípio da investigação/inquisitório tem por objetivo superar insuficiências de alegação e de prova das partes, mas move-se dentro dos limites fixados dos factos alegados e de conhecimento oficioso.
IV. A Administração Tributária em sede de procedimento tributário, com vista à liquidação de impostos, e por força do art.º 58.º do LGT, tem por incumbência a descoberta da verdade material, pautando-se por critérios objetivos, apurar os factos, independentemente de os mesmos lhe serem ou não desfavoráveis.
É sobre a Administração Fiscal que incide o ónus de provar a existência de todos os pressupostos que a determinaram a efetuar correções ao declarado pelo contribuinte, incumbindo-lhe, por isso, indagar sobre a verificação do facto tributário que afirma ter existido, através da realização de todas as diligências necessárias à descoberta da verdade material. *
*Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:Autoridade Tributária e Aduaneira
Recorrido 1:CPEE, S.A.
Votação:Unanimidade
Decisão:
Negar provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
A Recorrente, Autoridade Tributária e Aduaneira, interpôs recurso da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, que julgou procedente a impugnação judicial instaurada por CPEE, S.A.", pessoa coletiva n.º 5...62, relativa à liquidação adicional n° 2005 00001276813, referente a IRC, do ano de 2001 no montante de € 1.136.029,51.
A Recorrente não se conformou com a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, tendo interposto o presente recurso, formulou nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem:
A. Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença que considerou procedente a impugnação judicial deduzida por CPEE, S.A. contra a liquidação adicional de IRC n.° 2005 00001276813, referente ao exercício de 2001.
B. O objecto do presente recurso prende-se com a consideração ou não como custo fiscal dos pagamentos efectuados pela impugnante, a titulo de comissões, a uma sociedade não residente — a "PLT, S.A? —, bem como determinar se tais despesas são ou não susceptíveis de tributação autónoma por via da sua confidencialidade.
C. O douto Tribunal a quo considerou que se mostra "verificado o requisito da indispensabilidade" e que "as comissões pagas pela impugnante não podem ser tributadas autonomamente, como despesas confidenciais (...) por não comungarem dessa natureza de confidencialidade".
I- DA ANULACÃO OFICIOSA DA SENTENÇA
D. O douto Tribunal a quo considerou como NÃO PROVADOS os factos elencados nas alíneas A) a C), relativos às sociedades "PLT, S,A." e "PKT LLC", mormente no que tange à sede, objecto social, sócios e membros da administração, na medida em que "para a prova de tais factos seria necessário documento autêntico, emitido pelas autoridades do país de origem dessa sociedades"
E. A não consideração de tais factos como provados sem a realização de quaisquer diligências probatórias por parte do Tribunal constitui uma violação do principio do inquisitório, nos termos dos artigos 13.° do CPPT e 99.° da LGT, na medida em que deveria ter oficiosamente solicitado junto das entidades competentes a emissão do documento autêntico que confirmasse ou infirmasse os factos que a Administração alegou.
F. Para além de não ter sido formulado qualquer juízo quanto à sua desnecessidade, é notória a sua relevância nos presentes autos, como se alcança desde logo pelo especial enfoque concedido a tais factos na estrutura da sentença e pelo exposto nas conclusões T. e U. do presente recurso.
G. Estamos perante um caso de insuficiência instrutória, que conduz à anulação recorrido, para melhor investigação e nova decisão, tal como preceitua a artigo 712° n.° 4 do CPC, por força dos artigos 792.° e 749.° do mesmo diploma, bem como da alínea e) do artigo 2.° do CPPT.
H. Foram, assim, violados os artigos 13.° do CPPT, 99.° da LGT e n.° 3 do artigo 659.° do CPC.
Sem prescindir,
II-- DO ERRO DE JULGAMENTO DA MATÉRIA DE FACTO
II.1 - DOS CUSTOS SUPORTADOS COM O PAGAMENTO DE COMISSÕES A NÃO RESIDENTES
I. Um custo é fiscalmente dedutivel se for efectivo (existente, real), se tiver sido devidamente contabilizado como tal e em obediência aos critérios de imputação temporal, se for comprovado (justificado) e se se revelar indispensãvel para a realização dos proveitos ou para a manutenção da respectiva fonte produtora.
J. Os SIT põem em causa tais custos com base na sua inexistência e não comprovação, entendendo o douto Tribunal a quo, em consonância com a impugnante, que tal factualidade se não verifica, pelo que a liquidação em causa foi anulada.
K. Quanto aos requisitos da efectividade e comprovação do custo, entendeu o douto Tribunal recorrido que "a contabilidade da impugnante reflecte todos os movimentos relacionados com a relação contratual estabelecida com a «PLT, S.A.», que se mostram devidamente sustentados em documentos", ao passo que a AT "não carreou indícios fundados de que esses documentos justificativos não titulam transacções reais, de modo a abalar a credibilidade da contabilidade da impugnante".
L. Refere ainda a sentença que "não se alcança a existência desta «relação triangular» envolvendo a impugnante", tanto mais que "nestes autos está em causa um contrato celebrado entre uma empresa portuguesa e uma sociedade com sede na Suíça (e não no Reino Unido)".
M. Porém, a ligação estabelecida pelos SIT entre este esquema e a "PLT, S.A." resulta do facto de a "PLT Partners Limited", com domicílio fiscal no Reino Unido, e que antecedeu a "P… S.A." nas relações comerciais com a impugnante, ter transferido, no início de 1999, a sua carteira de agenciamento de clientes da CPEE para a referida "PLT, S.A.", na altura em que as autoridades fiscais daquele país detectaram a existência de esquemas de planeamento abusivo ligados a este tipo de contratos de agenciamento.
N. Assim, deve ainda ser dado como provado o seguinte facto: "27-A. A sociedade PLT, S.A.» sucedeu à «PLT Partners Limited. a partir de 12/06/1999 " [corno resulta dos elementos constantes dos anexos 12 e 13 ao RIT, bem como dos quadro de pág. 3 do RIT e do documento autêntico, emitido pelas autoridades do país de origem dessa sociedade, a requerer oficiosamente pelo douto Tribunal a quo em obediência ao princípio do inquisitório, como supra exposto nas conclusões D. a H. deste recurso].
O. O douto Tribunal a quo considerou que as "vendas para o mercado externo aumentaram consideravelmente' a partir do ano em que a "PLT, S.A." iniciou a sua prestação de serviços e que existe uma relação entre a acção desta última e as vendas efectuadas.
P. Os SIT, no entanto, apresentaram factos, ancorados na análise contabilístico- fiscal efectuada em sede inspectiva (vide ponto 11.3.1.7 do relatório), que contradizem a convicção formada pelo douto julgador neste particular, transcritos no ponto 24. deste recurso, para os quais s e rem ete por uma questão de economia processual.
Q. A douta sentença refere que não se pode afirmar que a "PLT, S.A." não controlava as vendas; porém, face ao que consta no RIT, transcrito no ponto 25. deste recurso, para o qual se remete por uma questão de economia processual, constatamos que o procedimento descrito não permite concluir que o controlo das comissões passasse pela "PLT, S.A.", tal como sucedia com a outra prestadora de serviços à impugnante, a "SJA" ("SJ & Associates Limited").
R. O douto Tribunal a quo entendeu que a impugnante apresentou toda a documentação atinente à prestação de serviços e, consequentemente, documentou o custo por si incorrido.
S. No entanto, o que os SIT põem em causa não é a sua existência, mas a sua idoneidade para comprovar a efectiva realização daquelas operações
T. Face à notificação efectuada à impugnante (descrita no ponto 31. deste recurso), no sentido de serem entregues os "comprovativos necessários, prestando os esclarecimentos indispensáveis e demonstrando, de forma clara e inequívoca" que se verificavam os pressupostos para a sua aceitação como custo fiscal, e atendendo à sua resposta, os Serviços procederam a uma cuidada análise dos argumentos por aquela expendidos, tendo concluído, ancorados nas normais regras de experiência e estabelecendo uma relação etiológica entre o comportamento da Autora e as explicações por ela avançadas, que estas não se revelavam aptas a fundamentar a efectividade e comprovação de tais custos (cfr. ponto 32. deste recurso)
U. Atendendo ao que consta neste ponto 32., justifica-se a intervenção oficiosa do douto Tribunal recorrido, no sentido da obtenção da prova respeitante aos elementos relativos à constituição e administração das sociedades intervenientes, de molde a que se mostrem documentalmente provados os factos atinentes, por exemplo, a JER e à sua relação com a "PLT, S.A." e com a "PKT LLC".
V. Não se torna necessário que a AT, no decurso da sua actividade instrutória, prove os pressupostos da simulação negociai, bastando a prova de elementos indiciários que permitam concluir nesse sentido, i.e., de indícios credíveis e objectivos que traduzam uma probabilidade elevada de que os documentos nos quais a impugnante suporta os seus custos se encontram inquinados por aquele vício, o que, s.m.j., foi plenamente conseguido por parte da Administração Tributária.
W. Foram, assim, violados os artigo 23.° n.° 1 do CIRC, 74.° da LGT e 342,° do Código Civil.
II.2 — DA TRIBUTAÇÃO AUTÓNOMA DAS COMISSÕES
X. Como consta na douta sentença recorrida, "a Administração Tributária não se limitou a desconsiderar como um custo do exercício o valor das comissões, acrescendo-o ao lucro tributável declarado, pois que também procedeu à sua tributação autónoma nos termos do artigo 81.° n.° 1 do CIRC, comno despesa confidenciar, conclusão esta alicerçada no RIT, cujo excerto se transcreveu no ponto 37. deste recurso.
Y. O Tribunal recorrido entendeu que "as comissões pagas pela impugnante não podem ser tributadas autonomamente, como despesas confidenciais, como pretendido pela Administração Tributária, por não comungarem dessa natureza de confidencialidade, sendo de subsumir à categoria de encargos devidamente documentados, por se encontrarem devidamente apoiadas em documentos externos de molde a evidenciar a causa, natureza e montante".
Z. Porém, o que os SIT defendem é que, a partir do momento em que consideram que os serviços de agenciamento não foram efectivamente prestados, os montantes referentes a tais serviços tiveram forçosamente de sair da esfera da sociedade impugnante, destinando-se a uma ou mais entidades terceiras e estranhas ao circuito comercial estabelecido entre a "CPEE" e a "PLT, S.A." Logo, por não existir suporte documental para estes pagamentos a terceiros, a AT considerou-os como despesas confidenciais e, como tal, sujeitas ao regime da tributação autónoma.
AA. Não se pode afirmar que a despesa se encontra devidamente documentada, de modo a que se possa conhecer a sua natureza, origem e finalidade — qualquer um destes elementos é desconhecido, atendendo a que apenas formalmente se encontram evidenciados na contabilidade.
BB. Foi, assim, violado o n.° 1 do artigo 81.° do CIRC.
Nestes termos e nos melhores de direito, deverá o presente recurso ser julgado procedente, com a consequente anulação oficiosa da douta sentença ou, caso assim se não entenda, com a revogação da mesma, por padecer de um erro de julgamento de facto e de direito, assim se fazendo ..(…)”
*
A Recorrida contra alegou e formulou as seguintes conclusões:
A. O princípio da legalidade e do inquisitório vigente no procedimento tributário impõe à Administração fiscal que reúna as provas e indícios suficientes para fundamentar os seus actos, estando-lhe vedada a possibilidade de proceder à liquidação de imposto com base em meras suposições e "estranhezas".
B. No presente processo, a Administração fiscal violou o princípio da legalidade e o dever de fundamentação, liquidando imposto com base em indícios frágeis e no paralelismo traçado com alegadas estruturas de planeamento fiscal abusivo, com recurso a simulação, sem ter alegado qualquer facto que permita concluir pela ligação da Recorrida com tais estruturas ou indiciado qual fosse o negócio simulado e o negócio
C. Demonstração clara da falta de diligência da Administração fiscal, em violação do princípio da legalidade e do inquisitório, é o que agora vem requerer: que o Tribunal diligencie pela obtenção de um documento autêntico para prova de um facto por si alegado e que poderia e deveria ter sido provado pelo referido documento no decurso da inspecção tributária e não com base em meros prints informáticos retirados de websites de credibilidade discutível.
D. Acresce que, ainda que a Fazenda Pública lograsse provar os factos que considera erradamente dados como não provados, ainda assim, não haveriam suficientes factos nos autos que permitissem ao Tribunal concluir pela simulação das prestações de serviços contratadas pela Recorrida à sociedade Suíça PLT, S.A., sendo certo que o princípio do dispositivo mitigado que vigora em processo tributário impede que o Tribunal tome conhecimento de factos não alegados pelas partes.
E. Conforme se lê no Acórdão do TCAS, de 23.03.2011, processo n.° 04593/11 «De acordo com o princípio da investigação (cfrarr 99, da L. G. Tributária), as diligências instrutórias a levar a cabo pelo Tribunal estão limitadas aos factos alegados pelas partes ou aos que oficiosamente seja lícito ao Juiz tomar conhecimento, mais prevendo a lei a nulidade da sentença quando se pronuncie sobre questões que o Tribunal não deva conhecer. ».
F. O princípio do inquisitório, ou mais exactamente, o princípio da investigação vigente no processo tributário e consagrado pelos artigos 13.° do CPPT e 99.° da LGT, não impõe um dever ao juiz de se substituir às partes na sua actividade probatória, mas antes um dever de buscar a verdade material perante qualquer dúvida que subsista na sua mente em resultado do contraditório das partes.
G. Ainda nos mesmo Acórdão se refere que «O dito princípio da investigação, consagrado igualmente no arr. 13, do C. P. P. Tributário, não implica que o contribuinte se limite a articular os factos sem curar de saber da sua prova, especialmente quando a lei expressamente lhe impõe esse ónus probatório.»
H. Porque na verdade, considerar que o Tribunal se deve substituir às partes, realizando uma verdadeira "inspecção tributária" resultaria na subversão do princípio da separação de poderes.
I. No caso concreto, e conforme supra exposto, a prova dos factos requerida pela Fazenda Pública não se mostra essencial à boa decisão da causa, porquanto tal facto por si e em conjunto com os factos de que o juiz pode conhecer, não serão os suficientes para suportar a pretensão da Fazenda Pública.
J. Termos em que se deverá indeferir a pretensão da Fazenda Pública de anulação da sentença recorrida.
K. Mais requer a Fazenda Pública que o Tribunal diligencie pela prova de que «27-A. A sociedade «PLT, S.A.» sucedeu à «PLT Partners Limited» a partir de 12/06/1999» pretendendo com isso justificar «a ligação estabelecida pelos SIT entre este esquema e a "PLT, S.A."».
L. Não existindo qualquer tipo de indício da ligação da Recorrida ou do Grupo PLT com a empresa "E&C/ WJB ", não se descortina em que medida é que a prova requerida, sendo possível, possa resultar em algum facto relevante para a descoberta da verdade material e boa decisão da causa.
M. Não podendo ser considerado argumento relevante a mera residência de um prestador de serviços anterior no Reino Unido, não sendo admissível considerar que todas as sociedades residentes no Reino Unido estão provavelmente envolvidas em esquemas de evasão fiscal.
N. Conforme considera o Ministério Público no seu parecer a fls 221/223, a Administração fiscal "não intenta provar, ainda que indiciariamente, a existência de elementos caracterizadores da simulação (...).Ora, como é evidente e resulta da lei, a AT não pode proceder a correcções à matéria colectável declarada por um contribuinte com base em meras suposições."
O. Considera ainda a Fazenda Pública que a convicção do Tribunal de que ''as vendas para o mercado externo aumentaram consideravelmente" a partir do ano em que a "PLT, S.A." iniciou a sua prestação de serviços e que existe uma relação entre a acção desta última e as vendas efectuadas" é contradita pelos factos apresentados pelos SIT (cfr. conclusões O e P das alegações).
P. Tal alegação é falsa. A afirmação do Tribunal a páginas 16 da sentença recorrida é de que «a partir de 1999, ano em que a "PLT, S.A." iniciou a prestação de serviços, as vendas para o mercado externo aumentaram consideravelmente, passando de cerca de 28,4 milhões de euros em 1998 para 47,3 milhões de euros em 1999 e continuando a aumentar, registando em 2002, o valor de 75,6 milhões de euros".
Q. A referida afirmação corresponde exactamente aos factos trazidos aos autos pela própria Administração fiscal.
R. A verdade é que a tendência demonstrada foi de crescimento acentuado, ainda que com uma ligeira quebra no exercício de 2001 decorrente da crise económica sentida a nível mundial.
S. A verdade é que existe uma correlação temporal notória entre esse crescimento e a contratação dos serviços da PLT, S.A..
T. A verdade é que a Fazenda Pública não consegue ela própria encontrar outra justificação para tal crescimento que não a política de internacionalização da Recorrida, da qual faz parte integrante a contratação de um marketeer no centro da Europa.
U. Em quarto lugar, pretende a Fazenda Pública que o Tribunal considere como indício relevante da existência do seu (fantasioso) esquema de simulação o facto de os pagamentos de comissões efectuados PLT, S.A. não serem feitos nos mesmos termos que foram posteriormente efectuados à "SJA".
V. Ora, conforme amplamente demonstrado na p.i., a PLT S.A., ao contrário da SJA, desenvolvia acções de promoção e marketing, nunca de intermediação de vendas ou distribuição de bens, não sendo por isso minimamente comparáveis os termos e condições em que são apurados os pagamentos de comissões: se num caso estamos perante uma verdadeira comissão de venda paga a uma entidade com funções de intermediação, no outro caso, estamos perante um pagamento de uma prestação de serviços de promoção que, por estar indexado a resultados, depende do volume de vendas.
W. A PLT S.A., não sendo responsável pela intermediação das vendas, teria de ser remunerada com base na informação prestada pela Recorrida.
X. Por fim, a Recorrida não pode aceitar a possibilidade de tributação autónoma dos valores pagos à PLT, S.A..
Y. Conforme explica António Portugal 2, "o critério que presidiu à instituição do regime legal de tributação autónoma, a par da preclusão da dedutibilidade das despesas confidenciais como custo fiscalmente aceite," reconduz-se "à necessidade de evitar uma potencial situação de dupla evasão fiscal, respectivamente, na esfera do beneficiário da despesa e na esfera do sujeito passivo que nela incorre (..)".
Z. Assim, tem sido jurisprudência assente nos Tribunais Portugueses que as «Despesas confidenciais são despesas que, «como a sua própria designação indica, não são especificadas ou identificadas, quanto à natureza, origem e finalidade- Cfr. neste sentido o acórdão do STA de 23.3.1994, recurso n.° 17 812. Tratam-se de despesas que, pela sua própria natureza, não são documentadas".
AA. A realidade é que, quando a despesas está documentada e os fluxos monetários são efectivos como acontece no caso sub judice, o beneficiário da despesa está perfeitamente identificado, não lhe sendo possível omitir o rendimento auferido nas suas declarações de impostos.
BB. De realçar que a Administração fiscal atesta a veracidade dos fluxos monetários e a existência de um contrato de prestação de serviços e de facturas, contestando apenas que tenha existido efectiva prestação de serviços.
CC. Pelo exposto se conclui que a presente liquidação de imposto é ilegal, não sendo as despesas em causa passíveis a tributação autónoma.
Em face de toda a factualidade exposta, e porque a douta sentença bem decidiu, deve a mesma ser mantida e negado provimento ao recurso apresentado pela Fazenda Pública.
*
O Exmº. Procurador - Geral Adjunto junto deste tribunal não emitiu parecer.
*
Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.
2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente as quais são delimitadas pelas conclusões das respetivas alegações de recurso nos termos dos artigos 635º, nº4 e 639º CPC, ex vi artigo 281.º do CPPT, sendo as de saber se a sentença incorreu em erro de julgamento de facto e de direiro (i) por violação do princípio do inquisitório; (ii) violação do art.º 23.º, 81.º do CRC e n.º1 do art.º 74.º da LGT relativamente aos pagamentos efectuados pela Recorrente, a titulo de comissões, a uma sociedade não residente, PLT S.A, bem como essas se comissões podem ser tributadas autonomamente, como despesas confidenciais, por não comungarem da natureza de confidencialidade.
3. JULGAMENTO DE FACTO
3.1. No Tribunal a quo, o julgamento da matéria de facto foi efetuado nos seguintes termos:
FACTOS PROVADOS
1. A Impugnante, "CPEE, S.A.", CF n° 5...62, tem como objecto social a indústria e comércio de embalagens e produtos afins, enchimentos e equipamentos industriais, incluindo as actividades auxiliares ou complementares que directa ou indirectamente se relacionem com a actividade principal.
2. Na sequência de inspecção efectuada, credenciada pela Ordem de Serviço n° 01200500432, de 4/3/2005, que decorreu entre 8/8/2005 e 15/11/2005, e abrangeu os exercícios de 2001 e 2002, foram efectuadas alterações à matéria colectável, em sede de IRC, referentes a 2001, no montante de € 1.124.148,18, e efectuada a tributação autónoma de "despesas confidenciais" que ascenderam a E 584.611,36.
3. As correcções resultaram da desconsideração, como custo fiscal, de comissões pagas a uma sociedade não residente, "PLT, S.A." por a Administração Tributária considerar que estas comissões não estão associadas a quaisquer serviços de intermediação prestados por aquela sociedade.
4. A impugnante foi notificada em 19/12/2005 da liquidação adicional n° 2005 00001276813, referente a IRC, relativo a 2001, no montante de € 1.136.029,51, que admitia pagamento voluntário até 18/1/2006.
5. Com vista a cobrança da quantia aludida em 4 foi instaurado o Processo de Execução Fiscal n° 19120060100093, a correr termos no Serviço de Finanças de Vale de Cambra.
6. A impugnante, em 19/4/2006, prestou garantia bancária, no âmbito do Processo de Execução Fiscal aludido em 5, a fim de obter a suspensão a que alude o artigo 169° do Código de Procedimento e de Processo Tributário, conforme documentos de fls. 103 a 105, que se dão por integralmente reproduzidos.
7. A impugnante é a empresa mãe de um conjunto de sociedades e unidades industriais e de distribuição que integram verticalmente toda a actividade de embalagens, com uma posição dominante no mercado europeu, e possui unidades fabris em Espanha, Polónia, Alemanha e Reino Unido.
8. Em 2001, a sociedade impugnante foi adquirida pelo grupo RAR, tendo sido alvo de reestruturação mediante a criação de duas divisões: a divisão de embalagem (que compreende os segmentos de embalagens alimentares, embalagens industriais e embalagens de aerossóis) e a divisão de enchimento (que engloba os segmentos de enchimento, copacking — reempacotamento, reembalamento —, embalagens de plástico e a distribuição).
9. Em Outubro de 2003, na sequência de acordo celebrado entre a RARSC, S.A. e a CCLIL, então accionistas da CPEE e das empresas designadas por CCL CM Europe, respectivamente, foi alienado 40% do capital detido na CPEE e esta última adquiriu o capital das empresas CCL CM Europe, surgindo, assim, a CPEE, S.A..
10. A CPEE é uma empresa de integração vertical pois abrange a produção de embalagens de aerossol em folha de flandres, o seu enchimento, a formulação dos produtos, acompanhamento e apoio no serviço de entrega das mercadorias nos vários destinos indicados pelos seus clientes, o que lhe permite reduzir custos e aumentar a rentabilidade.
11. O volume de negócios da empresa, quer para o mercado interno quer para o mercado externo, entre os anos de 1995 e 2005, ascendeu aos seguintes valores:
EXERCÍCIO199519981999200020012002200320042005
VOLUME NEGÓCIOS51.913.303,9462.556.473,9079.441.919,9790.380.218,6788.576.378,00108.175.941,00112.152.141,00124.386.684,00134.305.825,00
Mercado Interno33.224.294,4534.145.703,8532.065.058.2133.546.213,6335.783.880,0032.501.270,0030.839.733,0032.540.454,0034.535.515,00
Mercado Externo18.689.009,4028.410.770,0447.376.861,7656.834.005.0552.792.498,0075.674.671,0081.312.408,0091.846.230.0099.770.310.00
EM PERCENTAGEM100,0%100,0%100,0%100,0%100,0%100,0%100,0%100,0%100.0%
Mercado Interno64,0%54,6%40,4%37,1%40,4%30,0%27,5%26,2%25.7%
Mercado Externo36,0%45,4%59,6%62,9%59,6%70,0%72,5%73.8%74,3%
12. A actividade da CPEE dirige-se a empresas e não visa o público em geral.
13. O mercado externo aludido em 11 é genericamente constituído por países europeus dos quais se destacam, entre outros, o Reino Unido, a Espanha, a França e os Países do Benelux.
14. A " CPEE " tem como principais clientes as seguintes empresas multinacionais de produtos de consumo: G…; J…; S…; C…; U….
15. Em 27 de Abril de 1999 foi assinado entre CPEE, S.A. e PLT, S.A., com sede na Suíça, o acordo constante de fls. 42 a 56, que se dá por integralmente reproduzido (cuja tradução certificada consta a fls. 109 a 124), nos termos do qual, a CPEE contratou os serviços da PLT como sua agente de negociação ou conclusão de negócios de indústria na zona europeia, que inclui a Europa e a Confederação dos Estados Independentes (designada por "Território"), tendo a PLT, por sua vez, aceitado tal contratação, comprometendo-se a agir em seu nome próprio e num regime de não exclusividade a favor da CPEE.
16. Nos termos do acordo aludido em 15, a "PLT, S.A." comprometeu-se a realizar os melhores esforços para promover e vender os negócios de indústria da impugnante a clientes e potenciais clientes no território e levar a cabo a promoção e o marketing do negócio de indústria no território, com todo o cuidado e diligência, devendo cultivar e manter boas relações com os clientes e potenciais clientes de acordo com os princípios comerciais.
17. As partes declararam que o acordo celebrado entraria em vigor na data da assinatura, sendo renovável automaticamente em cada aniversário, excepto se terminasse nas condições previstas na cláusula n° 11.
18. Foi ainda acordado, em tal escrito, que, como contrapartida e remuneração pelos serviços prestados, a PLT teria direito a um pagamento de 6,5% das receitas respeitantes a todos os negócios de indústria negociados e concluídos.
19. No relatório de inspecção à actividade da impugnante consta, "as comissões eram determinadas com base em duas percentagens: 1% sobre o recebimento das vendas relativas aos produtos reembalados ("repacking" ou "copacking") e 6,5% sobre o recebimento das vendas respeitantes às embalagens vazias e ao enchimento ("contract manufacturing" ou "contract filling" ou "contract operations"). As vendas dos produtos reembalados geravam uma comissão de apenas 1%, pelo facto destes produtos serem de valor acrescentado muito reduzido. ".
20. Relativamente ao pagamento das comissões, consta do relatório de inspecção, "Para a determinação das comissões, tendo em vista a sua especialização mensal, a "C CPEE " utilizava os saldos em aberto ("open items" como era por ela designado), no final de cada mês, dos clientes sobre os quais iriam ser pagas as comissões, acrescidos dos valores já recebidos de clientes para os quais ainda não tinham sido facturadas as respectivas comissões pelo agente, juntando para o efeito as listagens das vendas recebidas cuja comissão não tinha ainda sido facturada pelo agente. Posteriormente, para comunicação do seu valor definitivo à "PLT, S.A.", para esta proceder à sua facturação, a " CPEE " remetia àquela as listagens onde eram evidenciadas as vendas cujo pagamento já havia sido efectuado pelos clientes e a respectiva comissão calculada. Nesta conformidade, as comissões eram determinadas através dos saldos em aberto ("open items") dos clientes sobre os quais iriam ser pagas as comissões, acrescidos dos valores já recebidos de clientes para os quais ainda não tinham sido facturadas as respectivas comissões pelo agente, para efeito da sua especialização mensal, e não com base nas vendas restritas ao mês em causa, e, consequentemente, o valor das comissões efectivas que era dado a conhecer à "PLT, S.A." para esta facturar, era determinado com base naquelas vendas que já haviam sido recebidas dos clientes."
21. No ano de 2001, a "PLT, S.A." emitiu facturas no total de € 1.169.222,72, que a impugnante contabilizou, nas datas e valores que seguem, conforme quadro de fls.13 verso do P.A. que se dá por reproduzido:
FacturaDataDescriçãoValor
1084185.1.2001Comissões referentes aos meses de Outubro, Novembro e Dezembro de 2000E 63.834,03
1084175.1.2001Comissões referentes aos meses de Outubro, Novembro e Dezembro de 2000€ 219.689,18
1092686.4.2001Comissões referentes aos meses de Janeiro, Fevereiro e Março de 2001€ 281.328,20
1092676.4.2001Comissões referentes aos meses de Janeiro, Fevereiro e Março de 2001€ 104.915,13
1094976.7.2001Comissões referentes aos meses de Abril, Maio e Junho de 2001€ 308.335,09
1106535.10.2001Comissões referentes aos meses de Julho, Agosto e Setembro de 2001E 191.121,09
22. Como consta do relatório, as facturas identificadas em 21 foram processadas no início do mês seguinte ao final de cada trimestre de acordo com listagens mensais detalhadas remetidas antecipadamente pela COLEPCCL, e a fls. 13 verso do P.A.,"a PLT, S.A. limita-se apenas a elaborar um mapa resumo que anexa à respectiva factura de acordo com as indicações remetidas pela CPEE, mostrando, com isso, incapacidade para apurar as comissões que terá de receber pela sua intermediação nas vendas para os clientes em causa, confiando plenamente no apuramento efectuado pela " CPEE", o que é de estranhar!"
23. Entre a PLT e a impugnante foi trocada diversa correspondência, relativamente ao desenvolvimento da relação contratual, conforme documentos de fls. 57 a 75 (com tradução certificada a fls. 142 a 196), que se dão por reproduzidos.
24. Quanto aos pagamentos efectuados, escreve-se no relatório: "Da análise à conta "30030", do fornecedor "PLT, S.A.", constatámos que o pagamento das referidas facturas ocorreu, também no ano de 2001, por transferência bancária para a conta anteriormente referida. Em Anexo 10, apresentamos extracto da conta "30030" relativa ao exercício de 2001, e documentos de suporte ao registo dos pagamentos nela efectuados.".
25. O acordo celebrado entre a impugnante e a PLT, S.A. cessou, de forma consensual, no dia 1 de Dezembro de 2002.
26. Como fundamento para a cessação do contrato, a impugnante remeteu uma carta datada de 15 de Julho 2002, dirigida à PLT, da qual consta, "(...)Gostaríamos de reunir convosco urgentemente, visto que acreditamos que o substancial aumento dos níveis de exportação do Grupo CPEE durante o ano de 2002 não foram devidos aos vossos esforços comerciais, ao contrário da nossa percepção em relação aos anos precedentes
De facto é esta a nossa conclusão da análise das nossas relações presentes que durante o ano de 2002 o nível do serviço que nos foi prestado pela PLT não é comparável com os altos níveis de 2001.
Acresce que a nossa crescente estratégia de reorganização exige uma alta motivação e um parceiro comercial activo, com uma forte presença não só na Europa mas também nos Estados Unidos.
Considerando esta situação, gostaríamos de reunir convosco o mais cedo possível para discutir o futuro da nossa futura relação. (..). „
27. Do relatório de inspecção consta, "É nossa convicção que os pagamentos efectuados em nome da PLT, S.A. e da PKT LLC foram uma forma de encobrir retiradas de dinheiro (sem levantar quaisquer desconfianças), para pagamento de eventuais "luvas" a elementos com bastante poder de decisão nas organizações do mercado externo suas clientes ou potenciais clientes, uma vez que foi referido, no esclarecimento prestado aquando da acção inspectiva ao exercício de 2001, que a CPEE, para a sua projecção internacional, necessitou de intervir ao mais alto nível, promovendo o seu nome e os seus produtos junto dos conselhos de administração de clientes e potenciais clientes, sendo esse contacto, na maior parte das vezes, feito pessoalmente"
28. A sociedade PKT LLC sucedeu à "PLT, S.A." a partir de 2/12/2002.
29. A "PLT, S.A." tem sede em Genebra, inscrita como contribuinte n° 060 719 021, e está sujeita a imposto cantonal e municipal, bem como a imposto federal directo, conforme documento de fls. 58, traduzido a fls. 146, que se dá por reproduzido.
30. A presente impugnação foi apresentada em 23/3/2006.
FACTOS NÃO PROVADOS
Nada mais se provou com interesse para o conhecimento do mérito, designadamente não se provou que:
A) A sociedade "PLT, S.A." tem como objecto a importação e comércio de produtos, nomeadamente de produtos lácteos e agrícolas, bem como actividades de representação e marketing com eles relacionados; aquisição de bens imobiliários exclusivamente no estrangeiro; tomada de participações em sociedades ou empresas, excluindo participações imobiliárias na Suíça do ponto de vista da LFAIE.
B) A sociedade "PLT, S.A.", tem como administrador RJ, de Genêve, Confignon, administrador único com assinatura individual.
C) A sociedade "PKT LLC", New York, USA, foi inscrita no Estado de Nova York, EUA, a 2002.11.06, com o n° F021106000566, e tem como objecto comissionista e a venda de produtos lácteos e seus derivados", e tem como administradores: FJB, do Panamá, e SAM, do Panamá, os dois com assinatura individual. Assinatura individual limitada aos assuntos da sucursal de Riedweg JE, de Genêve, Confignon, director da sucursal.
Inexistem outros factos não provados com relevância para a decisão a proferir. (…).”
3.2.Na conclusão N., a Recorrente alega que deverá ser dado como provado o seguinte facto: "27-A. A sociedade PLT, S.A.” sucedeu à “PLT Partners Limited” a partir de 12/06/1999 ", como resulta dos elementos constantes dos anexos 12 e 13 ao RIT, bem como dos quadro de pág. 3 do RIT e do documento autêntico, emitido pelas autoridades do país de origem dessa sociedade, a requerer oficiosamente pelo douto Tribunal a quo em obediência ao princípio do inquisitório, como supra exposto nas conclusões D. a H. deste recurso.
Na conclusão U. alega que atendendo ao que consta no ponto 32, da motivação do recurso, justifica-se a intervenção oficiosa do douto Tribunal recorrido, no sentido da obtenção da prova respeitante aos elementos relativos à constituição e administração das sociedades intervenientes, de molde a que se mostrem documentalmente provados os factos atinentes, por exemplo, a JER e à sua relação com a "PLT, S.A." e com a "PKT LLC".
Vejamos:
O n.º 1 do artigo 712.º (atual art.º 662.°) do Código de Processo Civil (CPC) , determina que A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.”
Por sua vez, o art.º 685º-B.º do CPC, (atual art.º 640.º) do mesmo diploma impõe que “1 - Quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;

2 – No caso previsto na alínea b) do númeno anterior, quando os meios probatórios invocados como fundamento em erro na apreciação das provas tenham sido gravados e seja possível a identificação precisa e separada dos depoimentos, nos termos do disposto no número n.º2 do artigo 522.º C, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso no que se refere á impugnação da matéria de facto, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa proceder à respectiva transcrição (…).”
Resulta da conjunção dos artigos 712.º e 685º-B.º do CPC, (atuais art.ºs 662.º e 640.º) que a Relação [in casu a Tribunal Central] deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se a prova produzida impuser decisão diversa desde que o recorrente especifique os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados indique os concretos meios probatórios.
Compete ao TCA reapreciar, não apenas se a convicção expressa pelo tribunal a quo tem suporte razoável na prova indicada e os restantes elementos constantes dos autos revelam, mas, também, avaliar e valorar (de acordo com o princípio da livre convicção) toda a prova produzida nos autos em termos de formar a sua própria convicção, relativamente aos concretos pontos da matéria de facto objeto de impugnação.
E consequentemente modificar a decisão de facto se, relativamente aos mesmos, tiver formado uma convicção segura da existência de erro de julgamento da matéria de facto.
Assim, para que o TCA possa proceder alteração da matéria de facto, devem ser indicados os pontos de facto considerados incorretamente julgados, indicados os concretos meios de prova constantes do processo ou de gravação realizada, que imponham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
O tribunal superior fica legitimado se esses meios de prova conduzirem e impuserem uma decisão diversa da proferida concluindo-se ter a 1ª instância incorrido em erro de apreciação das provas.
No entanto, a garantia do duplo grau de jurisdição não subverte o princípio da livre apreciação das provas previsto no art.º. 655.º do CPC (atual n.º5 do art.º 607º).
Por força do referido princípio, as provas são apreciadas livremente, de acordo com a convicção que geram no julgador acerca da existência de cada facto, ficando afastadas as situações de prova legal que se verifiquem, por força do disposto nos artigos 350.º, nº 1, 358.º, 371.º e 376.º, todos do Código Civil, nomeadamente, da prova por confissão, por documentos autênticos, por certos documentos particulares quanto à materialidade das suas declarações e por presunções legais.
A alteração da matéria de facto pelo Tribunal ad quem tem lugar necessariamente nos casos de manifesta desconformidade entre as provas produzidas e a decisão proferida, traduzida num erro evidente na apreciação das provas, que implica uma decisão diversa.
Relativamente ao facto (27-A) que a Recorrente pretende que seja aditado foram analisados os documentos constantes nos anexos 12 e 13 do Relatório de Inspeção bem como o quadro da página 3 do Relatório, não sendo possível concluir que a sociedade PLT, S.A.” sucedeu à “PLT Partners Limited” a partir de 12.06.1999.
O anexo 12 do Relatório é um print informático, extraído do VIES – Sistema de Informação de Trocas Intracomunitárias, no qual consta elementos de identificação da sociedade PLT Partners Limited, nomeadamente número de IVA, estado membro, e o endereço e data de início e de termo de atividade.
O anexo 13 trata-se deAgreement of Comercial Representationcelebrado entre CPEE, e a PLT Partners International (Guernsey) Limited , com sede 7 New Street, St Peter Port, Guernsey e vários documentos relativas a correspondência enviada por aquela sociedade para a CPEE.
Analisado o quadro de pág. 3 do Relatório de Inspeção não existe qualquer correspondência ou alusão às referidas sociedades.
Destes documentos não se retira que a sociedade PLT, S.A. sucedeu à PLT Partners Limited a partir de 12.06.1999.
Para prova de tal facto indica ainda, a Recorrente, como elemento de prova o documento autêntico, emitido pelas autoridades do país de origem dessa sociedade, a requerer oficiosamente pelo Tribunal a quo em obediência ao princípio do inquisitório, como expôs nas conclusões D. a H. do recurso.
E o mesmo se diga, em relação ao alegado pela Recorrente na conclusão U. justificando-se a intervenção oficiosa do douto Tribunal recorrido, no sentido da obtenção da prova respeitante aos elementos relativos à constituição e administração das sociedades intervenientes, de molde a que se mostrem documentalmente provados os factos atinentes, por exemplo, a JER e à sua relação com a "PLT, S.A." e com a "PKT LLC" .
Como melhor infra se verá, a propósito do erro de julgamento por violação do princípio de investigação, a Administração esta condicionada, em sede de procedimento tributário, ao princípio do inquisitório, previsto no art.º 58.º do LGT, incumbindo-lhe a descoberta da verdade material, pautando-se por critérios objetivos no apuramento dos factos, independentemente de os mesmos lhe serem ou não desfavoráveis.
Pretendendo a Recorrente, liquidar imposto de IRC, impunha-se demonstrar factos constitutivos dos direitos da administração tributária e para tal demostrar os pressupostos da sua atuação, não relegando para o Tribunal o apuramento de tais factos.
Nesta conformidade não ocorreu erro de julgamento pelo que improcede o recurso nesta parte.
4. JULGAMENTO DE DIREITO
4.1. Nas conclusões D) a H) alega a Recorrente erro de julgamento, por violação dos 13.° do CPPT e 99.° da LGT, referindo que o Tribunal a quo considerou como não provados os factos elencados nas alíneas A) a C), relativos às sociedades "PLT, S,A." e "PKT LLC", no que tange à sede, objeto social, sócios e membros da administração, na medida em que "para a prova de tais factos seria necessário documento autêntico, emitido pelas autoridades do país de origem dessa sociedades".
A Recorrente alega que a não consideração de tais factos como provados sem a realização de quaisquer diligências probatórias por parte do Tribunal constitui uma violação do princípio do inquisitório, nos termos dos artigos 13.° do CPPT e 99.° da LGT, na medida em que deveria ter oficiosamente solicitado junto das entidades competentes a emissão do documento autêntico que confirmasse ou infirmasse os factos que a Administração alegou sendo notória a sua relevância nos presentes autos.
Entende a Recorrente que estamos perante um caso de insuficiência instrutória, que conduz à anulação oficiosa da sentença.
Vejamos:
O n.º 1 do art.º 13.º do CPPT determina que incumbe aos juízes dos tribunais tributários a direção e julgamento dos processos da sua jurisdição, devendo realizar ou ordenar todas as diligências que considerem úteis ao apuramento da verdade relativamente aos factos que lhe seja lícito conhecer.
O n.º1 do art.º 99.º da LGT preceitua que “O tribunal deve realizar ou ordenar oficiosamente todas as diligências que se lhe afigure úteis para conhecer a verdade material relativamente aos factos alegados ou de que oficiosamente pode conhecer.”
Estes normativos consagram o princípio da investigação ou do inquisitório, que consiste no poder de juiz ordenar as diligências que entender úteis e necessárias para a descoberta da verdade.
Assim, o tribunal deve realizar ou ordenar oficiosamente todas as diligências que se lhe afigure úteis para conhecer a verdade material relativamente aos factos alegados, no entanto não pode substituir-se às partes realizando ele a prova que as partes tinham que produzir.
Os artigos 99.º da LGT e 13.º do CPPT não descaracterizam nem invalidam, o princípio base do processo tributário do impulso processual, quer do contribuinte/sujeito passivo quer da Fazenda Pública, nomeadamente quanto à prova dos factos que pretende que o tribunal reconheça.
O princípio da investigação/inquisitório tem por objetivo superar insuficiências de alegação e de prova das partes, mas move-se dentro dos limites fixados dos factos alegados e de conhecimento oficioso.
Como é sabido, e como supra se referiu, a Administração Tributária em sede de procedimento tributário, com vista à liquidação de impostos, e por força do art.º 58.º do LGT, tem por incumbência a descoberta da verdade material, pautando-se por critérios objetivos, apurar os factos, independentemente de os mesmos lhe serem ou não desfavoráveis.
Acresce que o art.º 58.º da LGT terá de ser interpretado em conjugação com o art.º 74.º da LGT o qual estabelece as regras relativas à repartição do ónus probandi.
Preceitua, o n.º 1 do art.º 74.º da LGT que o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque.
Pretendendo a Fazenda Pública, liquidar IRC do ano de 2001, impunha-se demonstrar factos constitutivos dos direitos da administração tributária a esse tributo.
Assim, a Administração Fiscal, no procedimento, deve realizar as diligências necessárias à satisfação do interesse público e à descoberta da verdade material, competindo-lhe, a prova dos factos constitutivos dos direitos que se arroga.
Entende a Recorrente que na sentença recorrida, se deu como não provados os factos A) e B), considerando que para a prova de tais factos seria necessário documento autêntico, emitido pelas autoridades do país de origem dessa sociedade, o que deveria ser providenciado pelo Tribunal a quo.
Entende a Recorrente, que no âmbito do seu poder inquisitório, competia-lhe averiguar relativamente às sociedades PLT, S,A. e PKT LLC, qual o objeto social, sede, sócios e membros da administração.
Porém, encontra-se equivocada, pois como é sabido, uma vez que, a Administração Tributária, se arroga à liquidação de imposto, tem por encargo probatório, nos termos do n.º1 do art.º 74.º da LGT, a prova dos factos constitutivos dos direitos à liquidação. Se pretendia liquidar IRC, impunha-se demonstrar os factos constitutivos desse direito e se para tal era necessário averiguar a relação entre as sociedades PLT, S,A. e PKT LLC, qual o objeto social, sede, sócios e membros da administração, bem como a posição de JER e a sua relação com a "PLT, S.A." e com a "PKT LLC"., devendo ter ido mais longe na investigação em sede de procedimento tributário.
Face ao exposto, a sentença recorrida não incorreu em erro de julgamento de direito, por violação do princípio do inquisitório pelo que improcede, destarte, a pretensão da Recorrente.
4.2. Nas conclusões I. a W. a Recorrente alega que a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, por violação do art.º 23.º n.º1 do CIRC art.º 74.º da LGT e 342.º do CPC.
Atento o já decidido e apreciado nos pontos 3.2 e 4.1., relativamente ao princípio do inquisitório e ao ónus da prova, passaremos de imediato à violação do art.º 23.º n.º1 do CIRC.
Na tributação em IRC, o lucro tributável tem como suporte o resultado apurado na contabilidade a qual deverá, designadamente, estar organizada nos termos da lei comercial e fiscal e outras disposições legais em vigor para o respetivo setor de atividade e refletir todas as operações realizadas pelo sujeito passivo permitindo o controlo do lucro tributável. (cfr. art. 17º, nº 3, als. a) e b) e do CIRC),
Estando a contabilidade organizada, presume-se a veracidade dos dados e apuramentos decorrentes, salvo se se verificarem erros, inexatidões ou outros indícios fundados de que ela não reflete a matéria tributável efetiva do contribuinte por força do art.º 75º da LGT.
O n.º 2 do art.º 3, do CIRC, define o lucro tributável como resultante da “diferença entre os valores do património líquido no fim e no início do período de tributação, com as correcções estabelecidas neste Código”.
Assim, o lucro tributável das pessoas coletivas é constituído pela soma algébrica do resultado líquido de exercício e das variações patrimoniais positivas e negativas verificadas no mesmo período, determinadas com base na contabilidade, nos termos do n.º 1 do art.º 17.º do CIRC.
Por sua vez, o n.º 1 do art.º 23.º do CIRC prevê que “[c]onsideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a impostos ou para a manutenção da fonte produtora...”
O referido preceito procede a uma enumeração meramente exemplificativa de encargos que podem ser considerados custos ou perdas.
Os custos ou perdas da empresa são os elementos negativos da conta de resultados, os quais são dedutíveis do ponto de vista fiscal quando, devidamente comprovados, forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtiva da empresa em causa.
E se não se verificarem estes requisitos implica a desconsideração custos, devendo os respetivos montantes ser adicionados ao resultado contabilístico. (Cfr. Acórdãos 4690/11 de 07.02.2012 e 7524/14 de 29.05.2014 do TCAS disponível em www.dgsi.pt.)
No que concerne ao requisito da indispensabilidade de um custo, tem a jurisprudência e a doutrina entendido, que é um conceito indeterminado sendo necessário o preenchimento casuístico, que passa pela análise na perspetiva económica e empresarial, na perceção de uma relação de causalidade económica entre a assunção de um encargo e a sua realização no interesse da empresa, atento à sua atividade, sendo vedado à Administração Fiscal atuações que coloquem em crise o princípio da liberdade de gestão e de autonomia da vontade do sujeito passivo.
E se a Administração Fiscal duvidar fundamentadamente da inserção no interesse societário de determinada despesa, impende sobre o contribuinte o ónus de prova de que tal operação se insere no respetivo escopo societário Cfr. Acórdãos 1236/05 de 29.03.2006 do STA e 1107/06 de 17.07.2007, do TCAS disponível em www.dgsi.pt.)
Por força do artigo 74.º n.º 1 da LGT, é sobre a Administração Fiscal que incide o ónus de provar a existência de todos os pressupostos que a levaram a efetuar correções ao declarado pelo contribuinte, incumbindo-lhe, por isso, indagar sobre a verificação do facto tributário que afirma ter existido, através da realização de todas as diligências necessárias à descoberta da verdade material.
No entanto, tem-se entendido que tal prova não tem de ser direta antes pode resultar de circunstâncias paralelas e indiretas que, atenta a idoneidade dos respetivos meios de suporte e as regras da experiência comum, indiciem, por critérios de razoabilidade e normalidade, um determinado resultado atendível.
Importa agora debruçarmos sobre os fundamentos que levaram a Administração a não aceitar como custos a comissões pagas à sociedade PLT S.A, sediada na Suíça.
A Administração Fiscal desconsiderou os custos que a Recorrente contabilizou, no exercício de 2001, relativos a comissões pagas a não residentes, debitadas na conta de custos à sociedade PLT, S.A., no valor de € 1 169 222,72 por entender que não correspondem a quaisquer serviços prestados na promoção e marketing dos negócios da CPEE, quer junto dos seus habituais clientes, quer junto de potenciais clientes a angariar.
A sentença recorrida após fazer o enquadramento legal dos custos apreciou os factos e decidiu nos seguintes termos que “Assim, quando o acto da Administração se traduza na afirmação positiva da prática pelo contribuinte do facto tributário, e da sua expressão quantitativa, é a ela que incumbe a prova da sua verificação, devendo a dúvida ser resolvida pelo tribunal contra ela.
Por força desse entendimento, a Administração Tributária tem o ónus de demonstrar a factualidade que permita considerar determinada operação como simulada, factualidade essa que tem de ser susceptível de abalar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte e dos respectivos documentos de suporte (atento o princípio da declaração e da veracidade da escrita vigente no nosso direito), só então passando a competir ao contribuinte o ónus de prova de que as operações se realizaram efectivamente.
No caso em apreço, a impugnante pagou comissões a uma entidade residente na Suíça, no âmbito de um contrato celebrado entre ambas, nos termos do qual esta se comprometeu a promover o negócio daquela junto de clientes europeus.
Em conformidade com tal acordo a contabilidade da impugnante reflecte todos os movimentos relacionados com a relação contratual estabelecida com a "PLT, S.A.", que se mostram devidamente sustentados em documentos.
Com efeito, a impugnante apresentou o contrato celebrado com a sociedade prestadora de serviços, as facturas relativas à aquisição dos serviços contratados à sociedade não residente, bem como comprovou os fluxos monetários relativos aos correspondentes pagamentos, e identificou o beneficiário de tais pagamentos.
Por outro lado, afigura-se que a Administração Tributária não carreou indícios fundados de que esses documentos justificativos não titulam transacções reais, de modo a abalar a credibilidade da contabilidade da impugnante.
A Administração Tributária delineou um esquema de planeamento fiscal abusivo, que consistia no seguinte: uma empresa do Reino Unido celebra um contrato com uma empresa de outra jurisdição com o objectivo de lhe prestar serviços. Por sua vez, a empresa do Reino Unido celebra também um contrato com uma empresa sedeada num paraíso fiscal, através do qual subcontrata àquela a prestação de serviços a efectuar à empresa da outra nacionalidade. Por fim, a empresa do paraíso fiscal retém o dinheiro pago pela empresa da outra nacionalidade via empresa do Reino Unido. Todas as empresas teriam de estar normalmente sob controlo comum para que a intervenção no esquema de triangulação de operações fosse infalível.
Porém, compulsados os factos assentes e analisado o relatório de inspecção e documentos anexos, não se alcança a existência desta "relação triangular" envolvendo a impugnante.
Com efeito, nestes autos, está em causa um contrato celebrado entre uma empresa portuguesa e uma sociedade com sede na Suíça (e não no Reino Unido), desconhecendo-se a intervenção de qualquer outra, designadamente, oriunda de um paraíso fiscal.
Além disso, da factualidade assente não se descortina qual a entidade comum às duas empresas, que estaria a controlar a operação, facto que, a existir, não foi demonstrado pela Administração Tributária.
De resto, também não foi explicitado qual o destino ou o percurso do dinheiro pago à "PLT, S.A." a título de comissões, de forma a que o mesmo voltasse às mãos da impugnante, ou a demonstração de que foi usado com outro fim que não o declarado, ou entregue a outro destinatário.
(…)
A Fazenda Pública, no relatório elaborado, menciona que não é possível relacionar as comissões pagas com as vendas intermediadas pela PLT. Todavia, tal como alegado pela impugnante, do contrato celebrado resulta que a prestação de serviços acordada consistia apenas na promoção e marketing do negócio e não na intermediação de quaisquer vendas.
Relativamente à remuneração, a administração fiscal apurou que as comissões (de 1% ou 6,5%) eram determinadas com base em listagens, remetidas pela impugnante à "PLT, S.A.", contendo as vendas cujo pagamento já tinha sido efectuado pelos clientes e a respectiva comissão calculada.
Por outro lado, da factualidade assente em 11 resulta que, a partir de 1999, ano em que a "PLT, S.A." iniciou a prestação de serviços, as vendas para o mercado externo aumentaram consideravelmente, passando de cerca de 28,4 milhões de euros em 1998 para 47,3 milhões de euros em 1999 e continuando a aumentar, registando, em 2002, o valor de 75,6 milhões de euros.
Ora, sendo as comissões pagas em função do valor das vendas já recebido dos clientes, devidamente contabilizado, não se pode afirmar que não existe relação entre a acção da "PLT, S.A." e as vendas efectuadas, nem pode afirmar-se que esta não controlava as vendas.
Acresce que o aumento das vendas para o mercado externo, em conjugação com o facto de o mercado externo ser constituído, maioritariamente por países europeus e a acção da PLT de localizar na Europa, conforme resulta da factualidade provada, indicia que a prestação de serviços foi efectiva, pois que, se o volume de negócios com os países europeus registou um aumento significativo, não demonstrando a Fazenda Pública outra razão para tal acontecer, resulta fortemente indiciada uma relação de causa/efeito entre a acção de promoção da PLT e esse aumento das vendas.
Deste modo, dos elementos que resultam dos autos, não é possível afirmar a existência de simulação em relação à prestação de serviços a que se reportam as facturas.
Na verdade, os elementos que serviram para a Administração Tributária obter as conclusões que serviram de base à liquidação são todos de natureza indiciária, permitindo diversas interpretações, sem que se vislumbre um único elemento de natureza probatória directa.
A maior parte das vezes a prova da simulação atinge-se de forma indiciária sendo manifestamente difícil de obter a prova directa. Todavia, a prova indiciária tem de se mostrar suficientemente sólida e segura para permitir, com a segurança necessária, lograr aquela conclusão.
Ora, os indícios apontados pela Administração Fiscal nada permitem concluir quanto à questão fulcral, qual seja saber se à impugnante foram ou não prestados os serviços titulados pelas facturas.
As "estranhezas" manifestadas no relatório nomeadamente quanto à forma consensual como cessou a relação contratual com a PLT, S.A., o facto de a sociedade suíça alegadamente não controlar as vendas sobre que incidem as comissões, não são idóneos a demonstrar que a prestação de serviços entre a impugnante e a sociedade não residente não existiu.
Assim, não logrou a Fazenda Pública demonstrar indícios concretos que permitam afastar a credibilidade dos documentos apresentados pela impugnante.
Por outro lado, a indispensabilidade do custo suportado com o pagamento de comissões, para a obtenção de proveitos é indubitável, face ao objecto social da empresa, requisito, aliás, que a Fazenda Pública nem sequer equaciona por desconsiderar liminarmente o custo fiscal.
Na verdade, é inquestionável a necessidade de acções de promoção da actividade das empresas junto de clientes (existentes e potenciais), por forma a aumentar as vendas e ganhar quota de mercado, sendo que, para isso, recorrem a diversos meios, designadamente, a intervenção de terceiros, que podem ser remunerados sob a forma de comissões.
Mostra-se, assim, verificado o requisito da indispensabilidade, e infundadas as conclusões em que se baseou a Administração Tributária para emitir a liquidação impugnada.(..)”
A sentença recorrida não nos merece reparo, uma vez, que a Administração Tributária, em sede de IRC, tem o ónus de demonstrar a factualidade que a levou a desconsiderar determinado custo inscrito na contabilidade, factualidade essa que tem de ser suscetível de abalar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte e dos respetivos documentos de suporte, atento o princípio da declaração e da veracidade da escrita vigente no art.º 75º do CPPT.
Como refere a sentença, os factos em que se baseia a Recorrente, é num hipotético planeamento fiscal abusivo, que tem por pressuposto uma relação triangular, que envolve a Recorrida e eventuais empresas sediadas no Reino Unido e a PLT, S.A. que não ficou minimamente demonstrando. Alega a Recorrente que a inspeção estabeleceu uma ligação entre a Recorrida e a PLT, S.A, sediada na Suíça, resultante do facto da PLT Partnerns Limitid, com domicílio fiscal no Reino Unido, e que antecedeu a PLT, nas relações comerciais ter transferido, no início de 1999, (o IRC em causa é do ano de 2001) a carteira de agenciamento de clientes da CPEE para a PLT. S.A., na altura em que as autoridades fiscais daquele país detetaram a existência de esquemas de planeamento fiscal abusivo.
Dai a Recorrente entender que deveria ser dado como provado que a sociedade PLT, S.A. sucedeu à PLT Partners Limitedo a partir de 12.06.1999, entendendo que teria de ser o tribunal a quo no exercíco do princípio do inquisitório, a provar pois a Recorrente não obteve dados que sustente tal afirmação tal como se deixou dito e se analisou no ponto 3.2 e 4.1 deste acordão.
Refere ainda a Recorrente, ao longo das sua alegações, que se justifica-se a intervenção oficiosa do Tribunal recorrido, no sentido da obtenção da prova respeitante aos elementos relativos à constituição e administração das sociedades intervenientes, de molde a que se mostrem documentalmente provados os factos atinentes, como por exemplo, a JER e à sua relação com a "PLT, S.A." e com a "PKT LLC".
Analisados os factos provados e não provados, que não foram impugnados, bem como o relatório de inspecção e documentos anexos, não se alcança a existência desta "relação triangular" envolvendo a Recorrente.
Resulta apurado a existência de contato celebrado entre a Recorrida com a sociedade PLT, S.A. com sede na Suíça (e não no Reino Unido), não se vislumbrando a interposição de qualquer outro intervenientes, quer residente no Reino Unido quer em qualquer país classificada como paraíso fiscal.
E como bem refere a sentença recorrida, também não foi explicitado qual o destino ou o percurso do dinheiro pago à "PLT, S.A." a título de comissões, de forma a que o mesmo voltasse às mãos da Recorrida, ou a demonstração de que foi usado com outro fim que não o declarado, ou entregue a outro destinatário.
Tambem não releva o facto de, de inspeção no Relatorio não relacionar as comissões pagas com as vendas onde interviu a PLT S.A, sendo que ficou provado os serviços prestados consistiam na promoção e marketing do negócio e não na intermediação das vendas.
Quanto o modo de pagamento dos serviços, as facturas eram emitidas pela PLT S.A. no início do mês seguinte ao final de cada trimestre de acordo com listagens mensais detalhadas remetidas antecipadamente pela CPEE.
Também não se pode considerar um indício relevante o facto dos pagamentos à PLT S.A, ser feitos de modo diferente da SJA, (em data posterior ao exercício em causa) uma vez esta empresa desenvolvia ação na intermediação de vendas e na área de distribuição de bens.
As conclusões formuladas pela Administração Tributária, não permitem concluir com alguma certeza ou com um grau de probabilidade elevado que as faturas não correspondem a custos de serviços efetivos e reais prestados, pelo que terá de se presumir a veracidade desses custos documentados e contabilizados, resolvendo contra a Administração Tributária a sorte da decisão.
Em síntese, para a desconsideração dos custos com as comissões da PLT S.A., impunha-se que a Administração Tributária fizesse cessar a presunção de veracidade da escrita e dos respetivos documentos de suporte através da enunciação de elementos concretos ou indiciários que denunciassem a dispensabilidade desses bens para a atividade da Recorrente, não bastando à Administração Tributária afirmar, de forma conclusiva, que não correspondem a serviços prestados, sem efetivamente sustentar essa afirmação.
Nesta conformidade, a sentença recorrida não violou o disposto no artº. 23.º do CIRC, improcedendo assim, a pretensão da Recorrente.
4.3. A Recorrente alega nas conclusões X) a BB) que a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, por violação do n.º1 do art.º81.º do CIRC, que a classificação efetuada pela Administração Tributária, relativamente aos montantes não aceites como custos (comissões) não eram despesas confidenciais e como tal não sujeitas a tributação autónoma.
Tendo-se concluído no ponto anterior deste acórdão que a Administração Fiscal não logrou provar que os serviços de agenciamento não foram prestados, a situação do Recorrida fica incólume, pelo que mostra-se desnecessário, e fica prejudicada a apreciação hipotética, se que tais custos deveriam ou não ser considerados como despesas confidenciais, e como tal sujeitas ou não a tributação autónoma.
4.5. E assim formulamos as seguintes conclusões/sumário:
I. Da conjunção dos artigos 712.º e 685º-B.º do CPC, (atuais art.ºs 662.º e 640.º) que a Relação [in casu a Tribunal Central] deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se a prova produzida impuser decisão diversa desde que o recorrente especifique os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados indique os concretos meios probatórios.
II. Os artigos 99.º da LGT e 13.º do CPPT não descaracterizam nem invalidam, o princípio base do processo tributário do impulso processual, quer do contribuinte/sujeito passivo quer da Fazenda Pública, nomeadamente quanto à prova dos factos que pretende que o tribunal reconheça.
III. O princípio da investigação/inquisitório tem por objetivo superar insuficiências de alegação e de prova das partes, mas move-se dentro dos limites fixados dos factos alegados e de conhecimento oficioso.
IV. A Administração Tributária em sede de procedimento tributário, com vista à liquidação de impostos, e por força do art.º 58.º do LGT, tem por incumbência a descoberta da verdade material, pautando-se por critérios objetivos, apurar os factos, independentemente de os mesmos lhe serem ou não desfavoráveis.
V. É sobre a Administração Fiscal que incide o ónus de provar a existência de todos os pressupostos que a determinaram a efetuar correções ao declarado pelo contribuinte, incumbindo-lhe, por isso, indagar sobre a verificação do facto tributário que afirma ter existido, através da realização de todas as diligências necessárias à descoberta da verdade material.
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5. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, em negar provimento ao recurso interposto e confirmar a sentença recorrida.
Custas pela Recorrente, dispensando o remanescente da taxa de justiça, nos termos do art.º 6.º n.º 7 do art.º do RCP, uma vez, que não trata de processo de elevada complexidade.
Porto, 18 de outubro de 2018
Ass. Paula Maria Dias de Moura Teixeira
Ass. Fernanda Esteves
Ass. Cristina Nova