Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00796/20.3BEPNF
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:07/15/2022
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Paulo Ferreira de Magalhães
Descritores:CONDENAÇÃO EM CUSTAS; NOTIFICAÇÃO DA CONTA; PEDIDO DE DISPENSA DO PAGAMENTO DO REMANESCENTE DA TAXA DE JUSTIÇA;
JUSTO IMPEDIMENTO
Sumário:1 – Quando as partes não concordem com o segmento decisório relativo à condenação em custas, dela devem interpor recurso [Cfr. artigo 627.º, n.º 1 do CPC] ou requerer a sua reforma quanto a custas [Cfr. artigo 616.º, n.ºs 1 e 3 do CPC].

2 – Decorrido o prazo para a dedução do recurso ou do pedido de reforma da decisão quanto a custas, e tendo as Autoras sido notificadas para pagamento das custas da sua responsabilidade, é extemporâneo o pedido formulado atinente à dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 7 do RCP.

3 – Nos termos e para efeitos do disposto no artigo 140.º do CPC, a parte que alegue a ocorrência de justo impedimento para a prática de acto fora de prazo, deve oferecer a respectiva prova.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Impugnação Urgente - Contencioso pré-contratual (arts. 100º e segs. CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:


I - RELATÓRIO



T..., S.A. e G..., Ld.ª, Autoras na acção administrativa urgente de contencioso pré-contratual que intentaram contra o Centro Hospitalar de ..., EPE, inconformadas com o despacho datado de 07 de abril de 2022, pelo qual foi julgado improcedente o pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça formulado pelo seu requerimento datado de 23 de março de 2022, vêm apresentar recurso de Apelação.
*

No âmbito das Alegações por si apresentadas, elencaram a final as conclusões que ora se reproduzem:

“EM CONCLUSÃO
AS RECORRENTES entendem que:
I. Vem o presente recurso interposto do despacho de 07.04.2022 que indeferiu o pedido de dispensa do remanescente da taxa de justiça requerido pelas AA. nos presentes autos com fundamento no impedimento verificado pela Mandatária.
II. Salvo o devido respeito, o Tribunal a quo faz uma incorrecta interpretação da matéria relativa ao artigo 140º do Código de Processo Civil.
III. Atendendo os documentos juntos aos autos pela Mandatária das Recorrentes e a prova produzida, não se pode aceitar conclusão ínsita no Despacho ora em crise, que não admite a comprovada situação de doença de terceiro – pai da Mandatária subscritora – no período compreendido entre os dias 18.02.2022 e o dia 23.03.2022, isto porque “... não vem minimamente comprovado o impedimento que vem alegado”.
IV. Com o Requerimento de fls. 1028, foi junta a informação clínica relacionada com o estado de saúde do seu pai para fundamentar devidamente o justo impedimento verificado.
V. Conforme se pode comprovar, o pai da Mandatária foi admitido no Hospital ... no dia 19 de Janeiro de 2022 por quadro de sépsis com ponto de partida abdominal; enfarte do miocárdio, subagudo.
VI. Teve alta da referida Unidade Hospitalar no dia 04.02.2022 com o seguinte diagnóstico de saída: sépsis com ponto de partida abdominal; enfarte do miocárdio; insuficiência cardíaca com FE reduzida; doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC).
VII. A sepsis é uma doença que surge quando a reação do organismo a uma infeção é de tal forma exuberante que é capaz de comprometer o normal funcionamento dos órgãos do próprio organismo e nos casos mais graves, designados de choque séptico, apresenta uma mortalidade superior a 40% – cfr. https://msd.pt/news/comunicado-msd-ter-vih-nao-e-ser-vih/
VIII. A 5 de fevereiro o pai da Mandatária teve um episódio de dessaturação após acesso de tosse com libertação de expetoração, que levou ao seu encaminhamento para o Centro Hospitalar ..., onde esteve novamente internado (no domicílio) até ao dia 18 de Fevereiro de 2022, internamento que teve lugar na casa da Mandatária.
IX. Após a alta domiciliária o pai da Recorrente manteve-se acamado, prostrado e ao seu cuidado diário.
X. É isso mesmo que atesta a declaração médica subscrita pelo Dr. AA, médico especialista em Medicina Interna, que acompanhou todo o processo, ao referir que a Recorrente teve de prestar cuidados médicos imprescindíveis e inadiáveis a seu pai Sr. BB de 85 anos com risco vital e internamentos de 19/01/2022 a 4/02/2022 e internamento domiciliário de 4/02/2022 até 18/02/2022, tem necessitado de cuidados familiares até à presente data.”, declaração que data de 23 de Março de 2022.
XI. Tendo o médico subscritor daquela declaração vindo concretizar, nesta data, que “…. Em concreto, o paciente foi internado por quadro de sepsis e enfarte agudo, tendo tido alta hospitalar com estes diagnósticos confirmados e ainda DPOC e insuficiência cardíaca. Passou para cuidados e vigilância no domicílio que foram prestados e coordenados em permanência pela filha CC uma vez que a esposa tem a esta data 83 anos. O quadro clínico era bastante débil pelo que a vigilância contínua e próxima era imprescindível e determinante para a alta hospitalar que beneficiava o doente. A partir de 18/2 o doente estabilizou e esta vigilância manteve-se, mas com caracter não permanente e seguimento em ambulatório em contexto hospitalar no dia 04/03, 11/03 e 18/03/2022…” tudo conforme resulta da declaração emitida sob compromisso de honra, em 28.04.2022, que qui se junta e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido. (Documento n.º ...)
XII. Entre os dias 19 de janeiro e 4 de fevereiro de 2022 a Mandatária esteve no Hospital a acompanhar o internamento hospitalar do pai.
XIII. Do dia 5 até ao dia 18 de fevereiro o pai da Mandatária esteve em internamento domiciliário.
XIV. Sendo que, a partir dessa data o pai da Mandatária manteve um estado de saúde débil, totalmente dependente para os cuidados diários como comer, vestir, tomar banho, tendo permanecido aos cuidados da Recorrente, que esteve impedida de se ausentar de casa;
XV. Não conseguiu reunir com clientes, nem comparecer a diligências processuais.
XVI. No caso concreto, pelo que foi dito e da prova produzida, nomeadamente documental, não se concretiza o entendimento do tribunal em reconhecer a situação de justo impedimento até ao dia 18.02.2022 e não reconhecer esse mesmo estado a partir dessa data, atendendo a declaração médica junta aos autos.
XVII. Veio a ter alta em 18.02.2022, sendo que permaneceu aos cuidados da Mandatária, nomeadamente medicamentosos e realizando deslocações frequentes a consultas e tratamentos.
XVIII. O impedimento a que a Mandatária se viu confrontada não é devido a qualquer culpa, negligência ou imprevidência da sua parte.
XIX. Nos termos do Despacho ora em crise, “o Regulamento de Custas Processuais prevê no n.º 7 do seu artigo 6.º que “nas causas de valor superior a (euro) 275 000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento.”
XX. Concluindo, nestes termos, que seria de aplicar o artigo 6º, nº 7 do RCP.
XXI. Mas o mencionado artigo 6º, nº 7 do RCP tem o seu âmbito de aplicação limitado aos processos que se subsumam às regras gerais de fixação da taxa de justiça.
XXII. Sucede que, no que respeita à acção de natureza urgente de processo contencioso pré-contratual, a tributação desta acção é determinada segundo a regra especial prevista no artigo 7º, nº 1, 2ª parte do RCP, de acordo com a Tabela II, que faz parte integrante do referido RCP: “Incidente/ procedimento/ execução”, linha “processo administrativos urgentes (artigos 97º e 100º do CPTA), rúbrica “Contencioso Pré-Contratual”.
XXIII. Aliás, é isso que decorre do ponto referente à responsabilização por custas constante do acórdão, segundo o qual se lê “Vencida, as custas do processo serão suportadas pela Autora – cf. artigo 527º do CPC aplicável ex vi do artigo 1º do CPTA e artigo 7º, nº 1 do RCP e Tabela II anexa.”
XXIV. Como referido, o artigo 6º, nº 7 do RCP tem o seu âmbito de aplicação limitado aos processos que subsumam às regras gerais de fixação da taxa de justiça, que não é o caso dos processos especiais aos quais é aplicável o regime especial do disposto no artigo 7º, nº 1, 2ª parte do RCP e tabela II anexa, onde se inclui o processo de contencioso pré-contratual.
XXV. Assim, no âmbito da Tabela II-A, a taxa devida por esta acção incluir-se-á, no caso, na rubrica referente a “contencioso pré-contratual”, correspondente a 2 UC, razão pela qual errou o Despacho em crise ao incluir a conta de custas nos termos do artigo 6º, nº 7 do RCP.
XXVI. Ao determinar a extemporaneidade do requerimento quanto à dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça com base no artigo 6º, nº 7 do RCP errou o Tribunal a quo na interpretação e aplicação da norma ao contencioso pré contratual, o que determina a nulidade do Despacho.
XXVII. Mas mais, no requerimento de fls. 1028 as Recorrentes requereram expressamente o pedido dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, por estarem verificados os legais pressupostos ínsitos no n.º 7, do artigo 6º do Regulamento das Custas Processuais, não se tendo o tribunal a quo pronunciado quanto ao requerido.
XXVIII. Infringindo assim o artigo 6º, nº 7 do Regulamento das Custas Processuais, infração esta produtora da nulidade do despacho sob recurso (artigos 613º, nº 3 e 615º, nº 1, al. d), ambos do CPC).
XXIX. Motivos pelos quais, e muito embora sem que isso possa representar, nem represente, qualquer desprimor, por pequeno, ou mínimo até, que seja, para com a Exma. Senhora Doutora Juíza que o prolatou, deverá ser declarado nulo, ou então anulado, o despacho sob crítica.
XXX. A Mandatária indicou inteira disponibilidade para colaborar com o tribunal, prestando todos os esclarecimentos necessários, inclusive pessoalmente o que não foi atendido pela Juiz a quo.
XXXI. Prolatando-se, em substituição de tal douto despacho, não menos douto acórdão, que, determine que o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, decida da dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, o que se peticiona a V. Exas..
XXXII. Conclui-se que, deve ser reconhecido o justo impedimento invocado pela recorrente e admitido o requerimento de dispensa do remanescente da taxa de justiça e revogar-se o douto Despacho que inferiu o justo impedimento, nos termos do artigo 140º do CPC.
NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO QUE V. EXAS. MUI DOUTAMENTE SUPRIRÃO, DEVE SER CONCEDIDO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO E, EM CONSEQUÊNCIA, SER REVOGADA O DESPACHO SOB RECURSO NOS TERMOS SUPRA CONSIGNADOS, TUDO COM AS DEMAIS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS.
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A Recorrida Centro Hospitalar de ..., EPE, não apresentou Contra alegações.
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O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso, fixando os seus efeitos.
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O Ministério Público junto deste Tribunal Superior não emitiu parecer sobre o mérito do presente recurso jurisdicional.

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Com dispensa dos vistos legais [mas com envio prévio do projecto de Acórdão], cumpre apreciar e decidir.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelas Recorrentes, cujo objecto do recurso está delimitado pelas conclusões das respectivas Alegações - Cfr. artigos 144.º, n.º 1 do CPTA, e artigos 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º, ambos do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigos 1.º e 140.º, n.º 3 do CPTA [sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem deva conhecer oficiosamente], sendo que, de todo o modo, em caso de procedência da pretensão recursiva, o Tribunal ad quem não se limita a cassar a decisão judicial recorrida pois que, ainda que a declare nula, sempre tem de decidir “… o objecto da causa, conhecendo do facto e do direito.” [Cfr. artigo 149.º, n.º 1 do CPC], reunidos que estejam os necessários pressupostos e condições legalmente exigidas.

Assim, as questões que vêm suscitadas pelas Recorrentes e patenteadas nas conclusões das suas Alegações resumem-se, a final e em suma, em apreciar e decidir sobre se a decisão recorrida:

(i) padece de nulidade por omissão de pronúncia [Cfr. conclusões XXVII a XXIX];

(ii) padece de erro de julgamento em matéria de direito em torno da aplicação do artigo 140.º do Código de Processo Civil [Cfr. conclusões II a XVIII];

(iii) padece de erro de julgamento em matéria de direito em torno da aplicação do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais [Cfr. conclusões XIX a XXVI].
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III - FUNDAMENTOS
IIIi - DE FACTO

Pese embora o Tribunal a quo não tenha fixado na decisão recorrida qual a factualidade que teve como provada para efeitos da apreciação e indeferimento do pedido aí formulado pelas Autoras ora Recorrentes, de todo o modo, em face do que resulta do seu processado, para efeitos do julgamento do presente recurso jurisdicional é possível com toda a segurança jurídica fixar a que segue:

1 – No dia 28 de janeiro de 2022 foi proferido nestes autos Acórdão por este TCA Norte, pelo qual foi negado provimento ao recurso jurisdicional interposto pelas Autoras ora Recorrentes – Cfr. fls. dos autos;

2 – As Autoras foram notificadas desse Acórdão no dia 31 de janeiro de 2022 – Cfr. fls. dos autos; facto admitido pelas Recorrentes;

3 – Aquele Acórdão deste TCA Norte transitou em julgado em 18 de fevereiro de 2022 – Cfr. fls. dos autos;

4 – As Autoras foram notificadas da conta de custas em 22 de março de 2022 – Cfr. fls. dos autos;

5 – No dia 23 de março de 2022, as Autoras apresentaram requerimento para efeitos de dispensa do pagamento da taxa de justiça remanescente, tendo para tanto invocado a ocorrência de justo impedimento da sua mandatária para efeitos da tempestividade da apresentação desse pedido – Cfr. fls. dos autos;

6 – Com referência a esse pedido, o Tribunal a quo proferiu a decisão datada de 07 de abril de 2022, sob recurso, pela qual julgou pelo seu indeferimento – Cfr. fls. dos autos.
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IIIii - DE DIREITO

Está em causa a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que indeferiu o pedido que as Autores formularam por seu requerimento datado de 23 de março de 2022, atinente ao pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça.

Constituindo os recursos jurisdicionais os meios específicos de impugnação de decisões judiciais por via dos quais os recorrentes pretendem alterar as sentenças recorridas nas concretas matérias que os afectem e que sejam alvo da sua sindicância, é necessário e imprescindível que no âmbito das alegações de recurso os recorrentes prossigam de forma clara e objectiva as premissas do silogismo judiciário em que se apoiou a decisão recorrida, por forma a evidenciar os erros em que a mesma incorreu.

Os fundamentos para a dedução de recursos jurisdicionais têm na sua base, ou causas de nulidade das sentenças a que se reporta taxativamente o artigo 615.º do CPC, que correspondem a casos de irregularidades que afectam formalmente a sentença e provocam dúvidas sobre a sua autenticidade, ou erros de julgamento (error in judicando) de facto e/ou de direito imputadas às sentenças recorridas, resultantes de desacerto quanto à realidade factual (error facti) ou na aplicação do direito (error juris), em termos tais que o decidido não está em correspondência com a realidade fáctica ou normativa.

Atento o teor das conclusões das Alegações de recurso apresentadas pelas Recorrentes, as mesmas ancoram a sua pretensão recursiva sob três domínios, a saber (i) em torno da invocada nulidade da decisão por omissão de pronúncia [Cfr. conclusões XXVII a XXIX], (ii) em torno do invocado erro de julgamento em matéria de direito decorrente da aplicação do artigo 140.º do Código de Processo Civil [Cfr. conclusões II a XVIII]; e por último, (iii) em torno do invocado erro de julgamento em matéria de direito decorrente da aplicação do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais [Cfr. conclusões XIX a XXVI].

Patentemente, o que pretendem as Recorrentes, a final, é que seja apreciado do bem fundado do pedido por si formulado por forma a que lhes fosse/seja deferido o pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça.

Vejamos então.

Depois de ter empreendido a análise do pedido formulado pelas Autoras ora Recorrentes, e tendo presentes as várias causas de pedir que lhe estavam justapostas, o Tribunal a quo aplicou os regimes jurídicos que julgou ser convocáveis, e em suma, sobre o momento em que pode ser apresentado esse pedido, e sobre a ocorrência de justo impedimento obstativa da atempada apresentação desse pedido, tendo vindo a apreciar e a decidir que a situação relativamente à qual a Senhora mandatária das Autoras invocou a ocorrência da situação de justo impedimento teria cabimento até ao dia 18 de fevereiro de 2022, mas já não após essa data e até ao dia 23 de março de 2022, data em que foi apresentado o pedido de dispensa do pagamento, e assim alcançado esse julgamento, veio a decidir o Tribunal a quo que por ter esse pedido sido apresentado após a notificação para pagamento da conta de custas, que esse pedido é assim intempestivo, e que por essa razão não foi assim conhecida da existência dos pressupostos da dispensa do pagamento.

Por ter interesse para a decisão a proferir, para aqui extraímos parte da essência da fundamentação aportada pelo Tribunal a quo na decisão recorrida, como segue:

Início da transcrição
“[…]
Notificada da conta de custas vem a Ilustre Mandatária da Autora, requerer a dispensa do pagamento da taxa de justiça remanescente, alegando que “foi notificada em 31.01.2022 do douto acórdão do Tribunal de Central Administrativo Norte, que negou provimento ao recurso por si interposto; 2 – O aludido acórdão transitou em julgado em 18.02.2021. 3 - Ora, nessa data o pai da mandatária estava internado com um quadro de saúde muito grave, com prognóstico muito reservado e em risco de vida, conforme se pode verificar pelos relatórios hospitalares que aqui se juntam. (Docs n.ºs 1 e 2) 4- Veio a ter alta em 18.02.2022, sendo que, a esta data, permanece com cuidados pela mandatária, nomeadamente medicamentosos e realizando deslocações frequentes a consultas e tratamentos. (Doc. n.º 3) 5 – O impedimento a que a mandatário se viu confrontada não é devido a qualquer culpa, negligência ou imprevidência da sua parte. 6 - Esta situação inesperada impediu, em absoluto, apresentação prévia do pedido dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, que ora se requer por estarem verificados os legais pressupostos ínsitos no n.º 7, do art.º 6º do Regulamento das Custas Processuais. 7 - A mandatária, ora requerente exerce a profissão no regime de prática isolada e a procuração estava outorgada apenas a seu favor. Acresce que, 8 - A matéria que se discutiu nos presentes autos não teve especial complexidade, pois foi decidida em saneador/sentença, não tendo existido audiência de julgamento. 9 - As partes tiveram uma conduta processual exemplar, auxiliando o Tribunal em tudo quanto lhes foi solicitado e contribuindo para uma justiça célere e eficaz. 10 - Pelo que, estão verificados os pressupostos que permitem ao Juiz dispensar o pagamento deste remanescente, nos termos do n.º 7, do citado art.º 6º do RCP”.
[…]
Cumpre apreciar e decidir.
O Regulamento de Custas Processuais prevê no n.º 7 do seu artigo 6.º que “nas causas de valor superior a (euro) 275 000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento.”.
O citado normativo consagra, pois, uma exceção à regra geral de que a taxa de justiça é fixada “em função do valor e complexidade da causa” (artigos 6.º, n.º 1 e 11º, do RCP e 529º do atual CPC), permitindo ao juiz dispensar o pagamento, quer da totalidade, quer de uma fração ou percentagem do remanescente da taxa de justiça devida a final, pelo facto de o valor da causa exceder o patamar de €275.000, em função da ponderação das especificidades da situação concreta (utilidade económica da causa, complexidade do processado e comportamento das partes), norteada pelos princípios da proporcionalidade e da igualdade. – cf. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 04-05-2017.
Conforme se refere no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 1-02-2017, proferido no Processo n.º 0891/16, “justifica-se a dispensa do remanescente da taxa de justiça devida em 1.ª instância, quer na totalidade, quer numa fracção ou percentagem, ao abrigo do disposto no n.º 7 do art. 6.º do RCP, se a conduta processual das partes não obstar a essa dispensa e se, não obstante a questão aí decidida não se afigurar de complexidade inferior à comum, o montante da taxa de justiça devida se afigurar manifestamente desproporcionado em face do concreto serviço prestado, pondo em causa a relação sinalagmática que a taxa pressupõe.”
Quanto ao momento temporal para solicitar a dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, a jurisprudência é unânime em considerar que a dispensa ou redução do remanescente da taxa de justiça não pode ser requerida e apreciada depois de elaborada a conta e notificada às partes.
[…]
No caso em apreço, a Autora vem, após notificação datada de 22/3/2022 para efectuar o pagamento da conta de custas da sua responsabilidade, apresentar o requerimento em apreciação, alegando que foi notificada em 31.01.2022 do acórdão do TCAN, que negou provimento ao recurso por si interposto e que transitou em julgado em 18.02.2021 e que, nesta data, o pai da mandatária estava internado com um quadro de saúde muito grave, com prognóstico muito reservado e em risco de vida, tendo vindo a ter alta em 18.02.2022, o que vem comprovado com as respectivas declarações médicas. Mais alega que, nesta data, data da apresentação do requerimento em apreço, isto é, em 23/3/2022, permanece com cuidados pela mandatária, nomeadamente medicamentosos e realizando deslocações frequentes a consultas e tratamentos, não tendo sido junto qualquer documento comprovativo desta última alegação.
Segundo o artigo 140º do CPC, "Considera-se justo impedimento o evento não imputável à parte nem aos seus representantes ou mandatários, que obste à prática atempada do ato" (n.º1), sendo que, "A parte que alegar o justo impedimento oferecerá a respetiva prova; o juiz, ouvida a parte contrária, admitirá o requerente a praticar o ato fora do prazo, se julgar verificado o impedimento e reconhecer que a parte se apresentou a requerer logo que ele cessou" (n.º 2).
Assim, são requisitos do justo impedimento: a) a existência de um evento não imputável à parte nem a título de negligência); b) determinador da impossibilidade do ato ser praticado pela parte ou mandatário; c) invocação do justo impedimento logo que o mesmo cesse; d) prática do ato processual em falta de imediato.
A este respeito, escreve [Lebre] de Freitas que constitui justo impedimento “as situações de doença súbita (...) quando configurem um obstáculo razoável e objetivo à prática do ato, tidas em conta as condições mínimas de garantia do exercício do direito em causa (...). Hoje, constituem justo impedimento não só a impossibilidade total e absoluta, mas também o obstáculo à plena realização do ato, tal como a parte ou o mandatário a prefiguraram; mas continuará a não haver justo impedimento se o ato a praticar pelo mandatário impedido constituía facto perfeitamente fungível.” – Código de Processo Civil Anotado, Vol. 1.º, 3.ª Ed., pág. 275-276)
No conceito de justo impedimento integra-se, assim, todo o evento que obste à prática atempada de acto, desde que não seja imputável à parte que o invoca nem aos seus representantes ou mandatários, constituindo uma derrogação à regra da extinção do direito de praticar um acto pelo decurso de um prazo peremptório. Tem sido entendido que o evento obstaculizador da prática do acto não deve ser imputável a título de culpa à parte ou ao seu mandatário, não obstando à possibilidade destes terem tido participação na ocorrência, desde que, nos termos gerais, tal não envolva um juízo de censurabilidade.
In casu atento o alegado e os documentos apresentados, reconhecemos que se tem como verificada uma situação justificativa da não apresentação do pedido de reforma do acórdão do TCAN que manteve a decisão proferida em 1ª instância, com a consequente manutenção da condenação em custas a cargo da A. até à data em que vem comprovada a situação de doença de terceiro que, admitimos, possa estar numa situação de dependência da subscritora do presente requerimento, isto é, até 18/2/2022.
Todavia, o mesmo não se pode dizer em relação a todo o período posterior a essa data e até 23/3/2022, data em que apresentou o requerimento de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, uma vez que não vem minimamente comprovado o impedimento que vem alegado nem tão pouco a imprevisibilidade desse impedimento que tenha impedido a apresentação do requerimento sob apreciação, até porque, se trata de situação que permanecia desde a data do internamento do pai (19/1/2022) o que teria permitido a tomada de decisão atempada de eventual substabelecimento em outro colega da Senhora Advogada.
Nesta medida, julgamos que o caso concreto dos autos não cai no âmbito da previsão legal de justo impedimento, porque não decorre de facto inesperado, não imputável à parte ou ao seu mandatário, relativo a estado de saúde de terceiro a cargo deste último.
Assim, não se reconhecendo a ocorrência de justo impedimento e uma vez que a Autora vem, agora, após a elaboração da conta, requerer a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, impõe-se concluir que o pedido é intempestivo o que constitui obstáculo ao conhecimento da existência ou não dos pressupostos da dispensa, conduzindo ao indeferimento do que vem requerido.
Termos em que, se indefere o pedido de dispensa do remanescente da taxa de justiça.
Notifique.
[…]”
Fim da transcrição

Ou seja, em face do que assim apreciou e decidiu o Tribunal a quo, está contido nesse seu julgamento que quando as Autoras vieram a apresentar nos autos o requerimento tendente à dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, que tal ocorreu já fora de prazo, pois que o foi após a notificação da conta de custas, sendo que para tanto, apreciou e decidiu, como questão prévia, que ocorrendo/podendo ocorrer justo impedimento para a não prática tempestiva desse pedido por parte da sua mandatária judicial até ao dia 18 de fevereiro de 2022, que não foi julgado verificado o impedimento após essa data, e que por essa razão, não reconheceu às Autoras o direito a praticar o acto fora de prazo.

Aqui chegados, cumpre apreciar da ocorrência da invocada nulidade imputada à decisão recorrida.

A este propósito, referiram as Recorrentes sob as conclusões XXVII a XXIX e em torno da invocada nulidade da decisão por omissão de pronúncia, em suma, que requereram expressamente o pedido dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, por estarem verificados os legais pressupostos a que se reporta o artigo 6.º, n.º 7 do Regulamento das Custas Processuais, e que o Tribunal a quo não se pronunciou quanto ao requerido, que consideram assim ser infração produtora da nulidade da decisão recorrida nos termos dos artigos 613.º, n.º 3 e 615.º, n.º 1, alínea d), ambos do CPC.

E por reporte à invocada nulidade imputada à decisão recorrida [Cfr. artigo 615.º do CPC], cumpre para aqui extrair este normativo, como segue:

Artigo 615.º
Causas de nulidade da sentença
1 - É nula a sentença quando:
a) Não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.
2 - A omissão prevista na alínea a) do número anterior é suprida oficiosamente, ou a requerimento de qualquer das partes, enquanto for possível colher a assinatura do juiz que proferiu a sentença, devendo este declarar no processo a data em que apôs a assinatura.
3 - Quando a assinatura seja aposta por meios eletrónicos, não há lugar à declaração prevista no número anterior.
4 - As nulidades mencionadas nas alíneas b) a e) do n.º 1 só podem ser arguidas perante o tribunal que proferiu a sentença se esta não admitir recurso ordinário, podendo o recurso, no caso contrário, ter como fundamento qualquer dessas nulidades.”

Mas não assiste razão às Recorrentes.

Vejamos então.

As causas de nulidade da sentença vêm taxativamente enumeradas naquele artigo 615.º do CPC, figurando entre as mesmas a omissão de pronúncia [cfr. artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC].

Neste domínio, importa ter presente que a mesma [a Sentença/despacho] se deve mostrar em consonância com o disposto no artigo 608.º, n.º 2 do CPC, nos termos do qual “O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras;”.

Ou seja, impõe-se assim ao tribunal conhecer e decidir todas as questões que lhe sejam submetidas pelas partes, concretamente todos os pedidos, todas as causas de pedir e todas as excepções, e ainda aquelas que sejam de conhecimento oficioso, sendo que, quando assim não o faça, a decisão proferida é nula por omissão de pronúncia.

Assim não sucede, porém, relativamente àquelas questões que o tribunal deixa de conhecer por a sua apreciação resultar prejudicada em face da solução dada a outras, porquanto a nulidade por omissão de pronúncia só ocorre quando haja uma omissão de pronúncia absoluta, isto é, quando o juiz não conheceu determinada questão suscitada pelas partes, silenciando totalmente a razão pelo qual não o fazia.

Isto posto e regressando ao caso dos autos, está fácil de ver que que as Recorrentes confundem/misturam a ocorrência de nulidade com a ocorrência de eventual erro de julgamento, até em face do que alegaram sob a conclusão XXVI.

Como assim referem as Recorrentes, e como assim de resto decorre da decisão recorrida, o Tribunal a quo não apreciou o pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça porque julgou da extemporaneidade do requerimento apresentado.

Portanto, não cometeu o Tribunal a quo a invocada nulidade atinente à omissão de pronúncia quanto ao pedido formulado, pois que julgou que a extemporaneidade do pedido “... constitui obstáculo ao conhecimento da existência ou não dos pressupostos da dispensa ...“, e como assim perpassa da conclusão XXVI, estará em causa a ocorrência de eventual erro de julgamento, mas já não de omissão de pronúncia.

Improcede assim a pretensão recursiva da Recorrente em torno da nulidade imputada à decisão recorrida.

Cumpre agora conhecer do invocado erro de julgamento em matéria de direito, como sustentado pelas Recorrentes sob as conclusões II a XVIII, em torno da aplicação do artigo 140.º do Código de Processo Civil.

Sustentaram as Recorrentes, em suma, que o Tribunal a quo faz uma incorrecta interpretação da matéria relativa ao artigo 140.º do Código de Processo Civil, por considerarem que em face dos documentos que foram juntos pela sua mandatária, que são atinentes a informação clínica relacionada com o estado de saúde do seu pai, designadamente a declaração médica subscrita pelo Médico AA, datada de 23 de março de 2022, está comprovado o invocado justo impedimento, tendo enfatizado que aquele Médico veio a “concretizar“ por uma outra declaração, datada de 28 de abril de 2022, que as Recorrentes juntaram como documento ... com as suas Alegações de recurso.

Ora, compulsadas as conclusões XI, XIV, XV, e compaginando-as com o vertido sob os pontos 3, 4, 5, 6 e 7 do requerimento datado de 23 de março de 2022, delas emerge que as Recorrentes inovam nos fundamentos invocados junto deste Tribunal de recurso, pois que tanto não foi alegado naquele requerimento [apresentado em 23 de março de 2022], nem aí foi apresentada prova em torno dessa matéria, como assim determina o artigo 140.º, n.º 2 do CPC.

E como assim julgou o Tribunal a quo, se a não apresentação do requerimento para dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça até à data de 18 de fevereiro de 2022 tinha a seu coberto o justo impedimento da Senhora mandatária das Autoras fundado na situação de dependência do seu pai, se bem que em grande parte do tempo decorrido desde 19 de janeiro de 2022 e até ao dia 04 de fevereiro de 2022, o progenitor esteve internado em instituição hospitalar para o que em nada poderia a mesma contribuir em ordem à melhoria da sua saúde, já após o dia 18 de fevereiro de 2022 e em face da prova documental carreada para fundamentar o justo impedimento, dela não resulta por que termos é que a Senhora mandatária das Autoras continuou a considerar-se numa situação de justo impedimento.

Aliás, pelo teor da declaração médica que vem a ser apresentada nesta instância de recurso, até vem a ser concretizado que a “... partir de 18/2 o doente estabilizou e esta vigilância manteve-se, mas com carácter não permanente e seguimento em ambulatório...“, razão porque as Autoras não lograram fazer a prova necessária em torno da impossibilidade total e absoluta da sua mandatária, nem da existência de obstáculo à tempestiva apresentação do pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça antes da notificação da conta de custas, que ocorreu no dia 22 de março de 2022, precisamente o dia anterior aquele em que foi invocado o justo impedimento e apresentado o pedido de dispensa de pagamento.

Ou seja, em face do que assim julgou o Tribunal a quo, o pedido que as Autoras entendessem formular visando a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, por não concordarem com o segmento decisório constante do Acórdão deste TCA Norte relativo à condenação em custas, teria de ser deduzido em sede de recuso jurisdicional ou em sede de reforma da decisão quanto a custas [Cfr. artigos 627.º, n.º 1 e 616.º, n.º 1, ambos do CPC], cujo termo inicial do prazo se iniciou no dia 18 de fevereiro de 2022, face à reconhecida dependência do pai da Senhora mandatária das Autoras até essa data.

Ora, como assim dimana da decisão recorrida, as Autoras não interpuseram recurso jurisdicional nem requereram a reforma da decisão quanto a custas, antes tendo aceite essa decisão, antes tendo requerido a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 7 do RCP, que consubstancia uma excepção à regra geral em matéria de custas, como patenteado sob os artigos 6.º, n.º 1 e 11.º, ambos do RCP, e artigo 529.º do CPC.

Note-se que aquela data atinente ao dia 18 de fevereiro de 2022, é respeitante a factualidade invocada pela Senhora mandatária das Autoras, nos termos e para efeitos do disposto no artigo 140.º, n.º 2 do CPC.

Com efeito, tendo a Senhora mandatária das Autoras alegado a ocorrência de justo impedimento para não ter apresentado o pedido na temporalidade processual legalmente devida, e tendo para tanto oferecido a respectiva prova, como era seu ónus, que está vazada em prova documental, a que se reportam os documentos ..., ... e ... juntos com o requerimento datado de 23 de março de 2022 [Cfr. pontos 3 e 4 do requerimento], do que se retira dessa prova documental apresentada, é que de facto o pai da Senhora Advogada teve episódios de doença que determinava o seu internamento em instituição hospitalar, e também no domicilio, desde o dia 19 de janeiro de 2022 a 04 de fevereiro de 2022 [no Hospital ...], e desde o dia 08 de fevereiro de 2022, no âmbito da Unidade de Hospitalização Domiciliária do Centro Hospitalar de ....

Do documento emitido pelo Hospital ... em 04 de fevereiro de 2022, atinente a informação clínica à data da alta, extrai-se de entre o mais aí constante, que aquando do seu internamento em 19 de janeiro de 2022, o pai da Senhora mandatária das Autoras, com 84 anos de idade, tinha um diagnóstico com várias patologias de saúde, e que vivia com a sua mulher.

Como assim apreciou o Tribunal a quo, também este Tribunal de recurso admite a possibilidade de o pai da Senhora mandatária das Autoras se encontrar numa situação de dependência da sua pessoa [da Senhora mandatária] até ao dia 18 de fevereiro de 2022, que por coincidência foi também o dia em que ocorreu o trânsito em julgado do Acórdão deste TCA Norte datado de 28 de janeiro de 2022.

Essa situação de justo impedimento decorrente da dependência do pai da Senhora mandatária das Autoras ocorreu, não porque a Senhora mandatária da Autora tenha estado impedida/dedicada a tratar de seu pai nesse período antecedente e após a notificação em 31 de janeiro de 2022 do Acórdão deste TCAN datado de 28 de janeiro de 2022, já que o mesmo estava internado em instituição hospitalar, e para o que a mesma em absolutamente nada podia contribuir, antes porém porque, como assim julgamos, e por experiência de vida, toda a ambiência por si vivenciada e que foi determinante do internamento do seu pai foi/terá sido emocionalmente perturbadora e incapacitante para o exercício da sua função de Advogada e em particular de mandatária das Autoras.

Ou seja, e como assim julgamos, a situação médica do pai da Autora esteve a ser tratada/debelada em instituição hospitalar até 04 de fevereiro de 2022, tendo após dado entrada no Serviço de Urgência do Centro Hospitalar de ... no dia 05 de fevereiro de 2022, e sido depois admitido na Unidade de Hospitalização Domiciliária no período de 08 a16 de fevereiro de 2022 [se bem que identifiquemos alguma incorrecção no documento emitido pelo CH de ..., pois que a nota de alta está datada – a final - de 15 de fevereiro de 2022, mas na primeira página vem referido, sob forma manuscrita efectuada sobre a forma mecânica, a menção à data de 18 de fevereiro de 2022], sendo que, foi assim neste período [de 08 a 16/02] que a Senhora mandatária das Autoras terá estado em exercício de maiores cuidados a prestar ao seu pai.

Demos todavia por assente, em conformidade com o alegado pela Senhora mandatária das Autoras sob o ponto 4 do seu requerimento datado de 23 de março de 2022, que o pai da Senhora mandatária das Autoras veio a ter alta médica no dia 18 de fevereiro de 2022, alta médica esta que se caracteriza nos seguintes termos: o paciente estava internado em serviço domiciliário até essa data, mas deixou depois de estar sob esse regime a partir dessa data.

Para efeitos de prova do alegado sob o ponto 4 daquele requerimento datado de 23 de março de 2022, isto é de que a partir do dia 18 de fevereiro de 2022 permanece com cuidados pela Senhora mandatária das Autoras, nomeadamente medicamentosos, e com realização de deslocações frequentes a consultas e tratamentos, foi junta uma declaração subscrita pelo Médico AA, datada de 23 de março de 2022.

Dessa declaração extrai-se, entre o mais, que no período de 19 de janeiro de 2022 a 04 de fevereiro de 2022, a Senhora mandatária das Autoras teve de prestar ao seu pai cuidados médicos imprescindíveis e inadiáveis.

Como assim julgamos, a junção desta declaração médica para efeitos de justificar o impedimento da Senhora mandatária das Autoras naquele período sempre se mostrava imprestável pois que nesse período e em face do internamento hospitalar de seu pai face às patologias evidenciadas, nada [mais] podia a mesma fazer. É o que a experiência de vida nos demonstra e com evidência, e ainda por cima, no actual contexto pandémico, em que os pacientes internados não podiam ser/estar acompanhados por familiar, estando assim entregues aos cuidados de saúde dos profissionais de saúde da instituição hospitalar.

A essa declaração médica datada de 23 de março de 2022, pode todavia ser dada alguma valia em torno de que o pai da Senhora mandatária esteve em internamento domiciliário no período de 04 de fevereiro a 18 de fevereiro de 2022, pois que o paciente estava em sua casa, num contexto similar a um internamento hospitalar, mas que requeria menos incidência de observação médica, situação em que os seus familiares podiam estar presentes e cuidar do paciente, isto é, que a Senhora mandatária das Autoras estivesse atarefada, com dispêndio do seu tempo, no auxílio a seu pai na casa deste.

Mas com referência ao período decorrido a partir desta data de 18 de fevereiro de 2022, a prova querida fazer por aquela declaração datada de 23 de março de 2022 não se revela de todo bastante, em termos de a Senhora mandatária poder ser havida como se encontrando numa situação de justo impedimento para a prática de acto.

Como de resto assim apreciou e decidiu o Tribunal a quo, e cujo julgamento não merece deste Tribunal de recurso qualquer reparo.

Efectivamente, a Senhora mandatária das Autoras não ofereceu prova nos termos e para efeitos do disposto no artigo 140.º, n.º 2 do CPC, de que ainda se encontrava numa situação de justo impedimento após aquele dia 18 de fevereiro de 2022.

Sabemos por experiência de vida, que uma pessoa idosa, tenha ou não problemas de saúde, carece sempre de cuidados, maiores ou menores, dos seus familiares. A declaração médica de 23 de março de 2022 o que permite alcançar nesse domínio, é assim uma evidência, uma conclusão.

Ponto é saber se a Senhora mandatária das Autoras apresentou prova do seu justo impedimento após a data de 18 de fevereiro de 2022. E como assim julgamos essa prova não foi apresentada, nem sequer à posteriori, se considerássemos a declaração que o mesmo Médico AA veio a fazer em 28 de abril de 2022 e que foi junta com as Alegações de recurso, pois que como aí vem mencionado a final [Cfr. 5.º parágrafo], e de “modo cirúrgico”, a partir de 18 de fevereiro de 2022, o pai da Senhora mandatária estabilizou tendo-se mantido a vigilância por si exercida, mas com carácter não permanente, com seguimento do seu pai em ambulatório em contexto hospitalar em 3 datas, já do mês de março de 2022.

Como assim julgamos, a prova apresentada pela Senhora mandatária das Autoras em cumprimento do ónus que sobre si impendia para efeitos do disposto no artigo 140.º do CPC, não se mostrou bastante para ser julgado verificada a continuidade do seu impedimento, e de que tal só e apenas cessou no dia 23 de março de 2022, quando veio a apresentar o requerimento de dispensa do pagamento.

Como assim decorre do alegado no requerimento datado de 23 de março de 2022, sob os seus pontos 4 e 5 e por reporte ao documento n.º ... referente à declaração médica datada de 23 de março de 2022, a Senhora mandatária invoca o dia 18 de fevereiro de 2022 como sendo a data da alta médica do seu pai e que após essa data continuou a prestar-lhe cuidados, sem que se retire da prova apresentada que esses cuidados justificavam a manutenção do seu justo impedimento para a prática de acto nos autos a partir de 18 de fevereiro de 2022, e mais importante, porque é que foi então a partir de 23 de março de 2022 que no seu entender [da Senhora mandatária das Autoras] vem a cessar o seu impedimento.

Não tendo sido empreendida essa alegação e prova pelas Autoras, apresenta-se assim também como uma coincidência, o facto de no dia 22 de março de 2022 a Senhora mandatária das Autoras ter sido notificada para pagamento da conta de custas.

Ora, atento o valor da causa, a Senhora mandatária das Autoras, enquanto profissional do foro, estava em condições de saber e conhecer, de forma antecipada, que porque assim não foi apreciado e decidido por decisão judicial, que aquando da elaboração da conta final de custas, seria exigida à parte que representa, o remanescente da taxa de justiça que seja da sua responsabilidade.

Como assim julgamos, com o contexto alinhavado pelas Autoras, e que seria determinante do justo impedimento até ao dia em que apresentou o requerimento em 23 de março de 2022, afigurar-se-ia como de alegação relevante [e da apresentação da respectiva prova], como assim julgamos e se disso tivesse sido o caso, a referência a que a Senhora mandatária das Autoras era filha única, ou a única de todos os descendentes de seus pais com capacidade para lhe prestar os cuidados de saúde, que a Senhora mandatária vivia ou teve de passar a viver em casa dos seus pais, e que a sua mãe era absolutamente incapaz de prestar quaisquer cuidados assistenciais ao seu pai [pois a idade de 84 anos não reveste por si qualquer incapacidade], e também, que a Senhora mandatária das Autoras, desde pelo menos 19 de janeiro de 2022 até 23 de março de 2022 se viu impedida, em absoluto, de exercer o seu mandato enquanto Advogada, neste e em todos os outros processos em que assim está constituída.

Daí que, sendo de manter o julgamento de extemporaneidade tirado pelo Tribunal a quo, é assim incontornável o seu julgamento consequente quanto à existência de obstáculo para efeitos de conhecimento da existência dos invocados pressupostos da dispensa de pagamento a que se reporta o artigo 6.º, n.º 7 do RCP.

E neste patamar, julgamos que as conclusões XX a XXV constituem questão nova sobre a qual a qual não recaiu julgamento do Tribunal a quo, pois que de resto assim não se trata de matéria alegada pelas Autoras ora Recorrentes no requerimento a que se reporta a decisão recorrida, antes porém visam atacar o Acórdão deste TCA Norte datado de 28 de janeiro de 2022, no segmento decisório atinente à condenação em custas, actuação das Recorrentes que também se mostra flagrantemente extemporânea, para além de que a matéria vertidas nestas conclusões está até em dissonância com o pedido de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, que constituía a questão nuclear da pretensão das Autoras ora Recorrentes junto do Tribunal a quo, assim como junto deste Tribunal de recurso, como assim deflui das conclusões XXXI e XXXII.

Termos em que, porque do julgamento tirado pelo Tribunal a quo não podem retirar-se quaisquer outras consequências, a pretensão recursiva das Recorrentes tem assim de improceder na sua totalidade.

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E assim formulamos as seguintes CONCLUSÕES/SUMÁRIO:

Descritores: Condenação em custas; Notificação da conta; Pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça; Justo impedimento.

1 – Quando as partes não concordem com o segmento decisório relativo à condenação em custas, dela devem interpor recurso [Cfr. artigo 627.º, n.º 1 do CPC] ou requerer a sua reforma quanto a custas [Cfr. artigo 616.º, n.ºs 1 e 3 do CPC].

2 – Decorrido o prazo para a dedução do recurso ou do pedido de reforma da decisão quanto a custas, e tendo as Autoras sido notificadas para pagamento das custas da sua responsabilidade, é extemporâneo o pedido formulado atinente à dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 7 do RCP.

3 – Nos termos e para efeitos do disposto no artigo 140.º do CPC, a parte que alegue a ocorrência de justo impedimento para a prática de acto fora de prazo, deve oferecer a respectiva prova.
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IV – DECISÃO

Nestes termos, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202.º da Constituição da República Portuguesa, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal, Acordam em conferência em NEGAR PROVIMENTO ao recurso interposto pelas Recorrentes T..., S.A. e G..., Ld.ª, confirmando a decisão recorrida.
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Custas a cargo das Recorrentes – Cfr. artigo 527.º, n.ºs 1 e 2 do CPC.
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Notifique.
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Porto, 15 de julho de 2022.

Paulo Ferreira de Magalhães, relator
Antero Salvador
Helena Ribeiro