Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02291/14.0BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:04/12/2018
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Cristina Travassos Bento
Descritores:EXTINÇÃO DA INSTÂNCIA
INUTILIDADE SUPERVENIENTE DA LIDE
OPOSIÇÃO JUDICIAL
RESPONSABILIDADE PELAS CUSTAS
Sumário:I - Seguindo a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, que tem vindo a adoptar uma posição de grande flexibilidade na interpretação do pedido quando, em face da concreta causa de pedir invocada, se possa intuir qual a verdadeira pretensão, a sentença ao considerar que a pretensão era a da suspensão da execução e não a sua extinção, fez correcta apreciação do pedido de oposição judicial, genericamente formulado.
II – Pretendendo a oponente a suspensão da execução, fundada na sua declaração de insolvência, é à própria oponente que terão de ser imputadas as custas da extinção da instância, por inutilidade superveniente da lide, porquanto a declaração de insolvência não derivou da actuação da Fazenda Pública, e apenas com a petição de oposição a oponente informou que tinha sido declara insolvente.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Autoridade Tributária e Aduaneira
Recorrido 1:G...
Decisão:Concedido provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Relatório

A fazenda Pública veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto no segmento que determinou a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide e a condenou em custas.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso com as conclusões, que aqui se transcrevem:

“A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que determinou a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, condenando em custas a Oponente e a Fazenda Pública em partes iguais.
B. Não se conforma a Fazenda Pública com a sua condenação em custas, uma vez ser seu entendimento não ter ocorrido (ainda) a inutilidade da presente lide.
C. Sucede que, ao contrário do que refere a Sentença de que se recorre, a pretensão da Oponente não é a sustação do processo executivo, mas sim o “arquivamento dos processos de reversão de execução fiscal em causa.”, que constitui, afinal, o pedido apresentado em sede de petição inicial de oposição.
D. Não pode a Fazenda Pública concordar a conclusão vertida na sentença de que se recorre, no sentido de ter ocorrido a inutilidade superveniente da lide, com a Fazenda Pública a ser considerada responsável pelas custas.
E. Na realidade, a pretensão da autora/Oponente não se tratava da suspensão do processo de execução fiscal, mas sim o arquivamento dos processos de reversão,
F. motivo pelo qual não perderam (ainda) os autos utilidade, não podendo por isso ser determinada a extinção da instância nos termos da alínea e) do artigo 277.º do CPC.
G. Veja-se, neste sentido, o sumário do Acórdão do STA, de 07.11.2012, no processo n.º 0375/12, disponível em www.dgsi.pt.
- No entanto, sem prescindir,
H. Ainda que do pedido constasse, o que não se concede, nem concebe, a suspensão da reversão da execução fiscal em causa, entende a Fazenda Pública que jamais lhe poderia ser atribuída a responsabilidade pelas custas, nos termos do artigo 536.º, n.º 3 (segunda parte);
I. Entende a Fazenda Pública que deveriam constar dos factos dados como provados os seguintes acontecimentos factuais, indicados por ordem cronológica, e que levariam a concluir em sentido diverso ao decidido, no que respeita à responsabilidade pelas custas por parte da Fazenda Pública, senão vejamos:
- Por sentença datada de 26.12.2008, proferida no âmbito do processo n.º 839/08.9TYVNG, que correu termos no 3.º Juízo do Tribunal de Comércio de Vila Nova de Gaia, foi declarada da insolvência da sociedade devedora original, “D… SA”, NIPC 5…, com carácter pleno;
- Face ao teor da referida sentença, foram suspensas pelo Órgão de execução fiscal as execuções contra a executada original, nos termos do artigo 180.º, do CPPT e artigo 88.º do CIRE, até ao encerramento do processo de insolvência;
- Da referida sentença resultou a apreensão imediata por parte do Administrador de Insolvência de todos os bens da insolvente, ainda que arrestados, penhorados, ou por qualquer outra forma apreendidos ou detidos, conforme o disposto na al. g) do artigo 36.º do CIRE;
- Através de despacho judicial de 01.06.2011, foi declarado o encerramento do processo de insolvência da sociedade devedora original, determinado por rateio final, nos termos da alínea a), do n.º 1, do artigo 230.º, do CIRE;
- Em 15.07.2011 é efectuado o registo do cancelamento da matrícula da sociedade devedora originária na respectiva Conservatória de Registo Comercial;
- Em resultado do rateio final, coube à Fazenda Nacional o valor de € 79.700,46;
- Face à “fundada insuficiência dos bens penhorados da devedora”, decorrente da situação de insolvência da devedora originária, fundamento suficiente para o chamamento à execução dos seus responsáveis subsidiários, a presente execução reunia os pressupostos para a reversão da dívida relativa a IRS/ret. fonte, referente ao período Out/2005, no valor de €6.908,22, contra a responsável subsidiária, na qualidade de administradora única constante do registo da Conservatória de Registo Comercial, nos termos do n.º 2, do artigo 153.º, do CPPT, com fundamento na alínea b), do n.º 1, do artigo 24.º, da LGT;
- Em 19.10.2012, pelas 18:15, foi proferida sentença de declaração de insolvência da aqui Oponente, G…, NIF 1…, no âmbito do processo de insolvência n.º 8729/12.4TBVNG, que correu termos no 6.º Juízo Cível de Vila Nova de Gaia;
- Por despacho emitido pelo Serviço de Finanças do Porto 2 (SF Porto 2), em 29.10.2012, deu-se início ao processo de reversão da dívida fiscal, acima melhor identificada, com a notificação para audição prévia da responsável subsidiária, nos termos do artigo 23.º, n.º 4, da LGT;
- O prazo concedido para o exercício do direito de audição prévia decorreu sem que a revertida, e aqui Oponente, o tivesse exercido.
- Reunidas as condições para o prosseguimento da reversão contra a responsável subsidiária, aqui Oponente, na qualidade de administradora única constante do registo da Conservatória de Registo Comercial,
- em 20.05.2013 é proferido o despacho pelo SF Porto 2 a determinar o prosseguimento da reversão contra a aqui Oponente, na qualidade de responsável subsidiária, procedendo-se à citação da mesma em 22.05.2013;
- Em 17.06.2013 é apresentada pela aqui Oponente oposição à execução, onde requer, a final, “a procedência da presente oposição, com todas as consequências legais, nomeadamente com o arquivamento dos processos de reversão de execução fiscal em causa.”
J. Ora, decorre dos factos enunciados que, tendo a Oponente tido a oportunidade de, em sede de exercício do direito de audição prévia, informar o SF Porto 2 da existência de uma sentença a declará-la como insolvente, proferida no âmbito do processo n.º 8729/12.4TBVNG, que correu termos no 6.º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia, e, assim, obrigar à sustação da execução fiscal, não o fez.
K. De acordo com a prova produzida nos autos, o SF Porto 2 tomou conhecimento da sentença de declaração de insolvência da aqui Oponente apenas em sede de Oposição à execução;
L. Conclui-se que a impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide não é imputável ao réu ou requerido (neste caso, a AT), mas sim ao autor ou requerente (neste caso, a Oponente),
M. uma vez que foi esta última que, em sede de exercício do direito de audição prévia, se absteve de comunicar ao SF Porto 2 a existência de sentença de insolvência que sobre ela incidia.
N. Ao fazê-lo apenas em sede de oposição à execução, levou a que o SF Porto 2 apenas tivesse tomado conhecimento do facto nessa data, vendo-se impossibilitado de fazer cessar o processo de oposição,
O. uma vez que “são os tribunais os competentes para decidir o destino a dar à oposição, nos termos das disposições constantes dos arts. 151º, nº1, do CPPT e 49º, nº1, alínea d), e 49º-A, nºs 1, alínea c), 2, alínea c), e 3, alínea c), do ETAF de 2002.”, (1)
P. mas procedendo de seguida à suspensão do processo de execução fiscal, conforme refere na informação elaborada nos termos do artigo 208.º, do CPPT.
Q. Foi a aqui Oponente que deu causa à acção, uma vez que a mesmo não efectuou o pagamento da divida exequenda que se encontra(va) em cobrança coerciva no processo de execução fiscal que corria termos no SF Porto 2.
R. Foi a ora Oponente que deu causa à inutilidade da presente lide, uma vez que, ao não informar o SF Porto 2 da existência da sentença que decretou a sua insolvência em sede de audição prévia não permitiu que fosse sustada a execução em devido tempo,
S. apenas o tendo sido, quando, em sede de Oposição, e de acordo com aquilo que parece resultar dos autos, o Serviço de Finanças deu conta da existência da situação de insolvência da aqui Oponente.
T. Nestes termos, devem as custas ser exclusivamente a cargo da Oponente, nos termos do disposto na primeira parte, do n.º 3 do artigo 536.º do CPC, e não a cargo da Fazenda Pública.
U. Ao decidir como decidiu, é entendimento da Fazenda Pública que se fez na douta sentença recorrida errónea subsunção dos factos ao ordenamento jurídico aplicável, maxime do art. 536.º, n.º 3, do CPC.
V. Padece assim a douta sentença sob recurso de erro de julgamento da matéria de facto e de direito, porquanto fez errónea interpretação dos factos e errónea aplicação das normas legais subsumíveis ao caso concreto,
W. razão pela qual deverá ser revogada e substituída por acórdão que declare e determine que a responsabilidade pelas custas deverá ser da responsabilidade exclusiva da Oponente. “


A Recorrida não apresentou contra-alegações.

Após a subida dos autos a este Tribunal Central Administrativo Norte, o Exmo Procurador-Geral Adjunto emitiu Parecer, a fls. 124, no sentido de ser concedido provimento do recurso.

Colhidos os vistos legais junto das Exmas. Juízes-Adjuntas vem o processo à Conferência para julgamento.

I.1 Objecto do recurso - Questões a apreciar e decidir:


As questões suscitadas pela Recorrente nas alegações de recurso e delimitadas pelas respectivas conclusões - artigos 608, nº 2, 635º, nº 4 e 5, todos do Código de Processo Civil (CPC), “ex vi” artigo 2º, alínea e) e artigo 281º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) - são as de saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento (i) ao decidir pela extinção da instância por inutilidade superveniente da lide; (ii) ao condenar em custas a Fazenda Pública, no segmento respectivo.


II. Fundamentação

II.1 Dos Factos

No Tribunal a quo, quanto à questão a apreciar apenas se elencou o seguinte facto

- Consta de informação proferida em 22.09.2014, pelo Serviço de Finanças que “ no que respeita à responsável subsidiária, o processo encontra-se suspenso por declaração de insolvência” (fls 36)
II.1.1 Ao abrigo do n.º 1 do artigo art.º 662.º, do Código de Processo Civil, em face dos documentos existentes nos autos, acorda-se em aditar ao probatório os seguintes pontos:
“A) Foi instaurado no Serviço de Finanças do Porto 2 o processo executivo 3182200601000829, contra “D…, SA”por dívidas de IRS e Imposto de Selo de 2005 – cfr 36 dos autos;
B) Por sentença de 26.12.2008, proferida no âmbito do processo n.º 839/08.9TYVNG, que correu termos no 3.º Juízo do Tribunal de Comércio de Vila Nova de Gaia, foi declarada da insolvência da sociedade identificada na alínea A, com carácter pleno – cfr. folhas 42 dos autos;
C) Em 01.06.2011, por despacho judicial, foi declarado o encerramento do processo de insolvência referido na alínea antecedente, determinado por rateio final, nos termos da alínea a), do n.º 1, do artigo 230.º, do CIRE –cfr. folhas 42 dos autos;
D) Em 15.07.2011 é efectuado o registo do cancelamento da matrícula da sociedade devedora originária na Conservatória de Registo Comercial competente – cfr. folhas 42 dos autos;
E) Em 19.12.2012, no âmbito do processo que corre termos no 6º juízo cível do Tribunal Judicial de V N Gaia, sob o nº 8729/12.4TBNVNG, foi declarada a insolvência da oponente – cfr. folhas 35 dos autos;”
F) Após a reversão da execução fiscal identificada na alínea A) contra a agora oponente, G…, foi a mesma citada em 22.05.2013 para a execução – cfr. folhas 39 a 41 dos autos;
G) A presente oposição à execução fiscal foi interposta em 17.06.2013 – cfr. folhas 4 e ss.”

Veio a Recorrente insurgir-se contra o julgamento de facto, requerendo o aditamento de factos, identificando-os, que segundo ela levariam a concluir em sentido diverso do decidido. (Conclusão I).
Uma vez que, este Tribunal de recurso aditou já oficiosamente os factos que considera indispensáveis à decisão, consideramos prejudicado o aditamento dos factos requeridos.


II.2 Do Direito

II.2.1 A sentença proferida nos presentes autos apreciou as duas questões que lhe foram colocadas na p.i., tendo absolvido a Fazenda Pública, quanto à declaração de nulidade de citação, por ocorrência de erro na forma de processo, sem possibilidade de convolação. Quanto à sustação da execução, por insolvência da oponente, determinou a extinção da instância, por inutilidade superveniente da lide, dado o processo executivo já se encontrar suspenso.
A Fazenda Pública interpôs o presente recurso jurisdicional, quanto ao segundo segmento da decisão.

A primeira questão que, por suscitada, importa pois apreciar é saber se a sentença incorreu em erro de julgamento ao determinar a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide.
A M juiz a quo fundamentou a decisão quanto ao presente segmento, como agora se transcreve:
No que concerne ao pedido de sustação do processo executivo, consta de Informação proferida em 22/09/2014, pelo Serviço de Finanças, que “No que respeita à responsável subsidiária, o processo encontra-se suspenso por declaração de insolvência” (fls 36).
Verifica-se, pois, que o órgão de execução fiscal, no decurso dos presentes autos, atendeu à pretensão da Oponente, tornando inútil o prosseguimento da presente lide.
De facto, conforme refere José Lebre de Freitas (2) “A impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide dá-se quando, ocorrido na pendência da instância, a pretensão do autor não se pode manter, por virtude do desaparecimento dos sujeitos ou do objecto do processo, ou encontra satisfação fora do esquema da providência pretendida. Num e noutro caso, a solução do litígio deixa de interessar – além, por impossibilidade de atingir o resultado visado; aqui, por ele já ter sido atingido por outro meio”. [sublinhado nosso]
Conclui-se assim, que tendo a pretensão relativa à suspensão do P.E.F. sido satisfeita, os presentes autos perderam utilidade, o que determina a extinção da instância, nos termos da alínea e) do artigo 277.º do C.P.C., sendo a Fazenda Pública responsável pelas custas, nesta parte (cfr segunda parte do n.º 3 do artigo 536.º do C.P.C.).”

Alegou a agora Recorrente, que o pedido feito pela oponente não era a sustação do processo executivo, mas sim o “arquivamento dos processos de reversão de execução fiscal em causa”, motivo pela qual os autos não perderam utilidade, não podendo por isso ser determinada a extinção da instância nos termos da alínea e) do artigo 277º do CPC. [Conclusões B) a G)]

Apreciemos.

A oponente, aqui Recorrida, após alegar a nulidade de citação e a não suspensão do processo executivo após a sua declaração de insolvência, terminou a sua petição inicial de oposição com o seguinte pedido ”Termos em que se requer a procedência da presente oposição, com todas as consequências legais, nomeadamente com o arquivamento dos processos de reversão de execução fiscal em causa”
Decorre do transcrito que o pedido formulado foi o da procedência da oposição, pedido genérico que terá de ser concatenado com os fundamentos invocados na petição inicial. Ora, numa leitura que garanta a máxima protecção dos interesses e direitos do Executado, e apesar de o arquivamento ser uma das possíveis consequências da sua procedência, no caso, em face do alegado, decorre que o fim pretendido com a procedência da oposição só teria como consequência a suspensão da execução e não a sua extinção. E será assim de acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, que tem vindo a adoptar uma posição de grande flexibilidade na interpretação do pedido quando, em face da concreta causa de pedir invocada, se possa intuir qual a verdadeira pretensão - veja-se neste sentido o acórdão do STA 01.02.2017 processo 0200/16.
Sendo pacífico que a petição deve ser interpretada conciliando o pedido com a causa de pedir haverá que determinar se a oposição à execução pode visar a suspensão da execução, nos termos do artigo 204º do CPPT, dado que o objecto de tal meio processual é a extinção da execução fiscal relativamente a quem deduz oposição, e não a suspensão do processo de execução.
Tanto a doutrina como a jurisprudência são unânimes em aceitar que a suspensão da execução fundada em determinados pressupostos é fundamento de oposição à execução, nos termos da alínea i) daquele artigo. Ali se menciona que “quaisquer fundamentos não referidos nas alíneas anteriores, a provar apenas por documento, desde que não envolvam a apreciação da legalidade da liquidação da dívida exequenda, nem representem interferência em matéria de exclusiva competência da entidade que houver extraído o título”.
Como refere o Cons. Jorge Lopes de Sousa, para o que aqui se analisa, em anotação ao artigo 204º no Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, 6ª edição, 2011, III volume, anotação 39, pag 502: ” (…)A oposição à execução , em regra, visa a extinção da execução, total ou parcial. Mas pode ter também por objecto a suspensão da execução.
Esta justifica-se nos casos em que seja afectada por qualquer motivo a exigibilidade da dívida, por motivo não definitivo, mas meramente temporário.(…)
Outra situação será a da existência de um obstáculo meramente temporário ao prosseguimento da execução, como a existência de um processo de falência ou de insolvência (…) pois esse prosseguimento viola o disposto nos arts 264º, nº 1 do CPT e 180º do CPPT.
(…)
Tratar-se-á de fundamentos enquadráveis na alínea i) do nº1 deste art. 204º do CPPT”
Também a jurisprudência assim o entende. Vejam-se, entre outros, os acórdãos do STA de 27.05.2009, processo 330/09.
Assente a premissa de que a oposição à execução fiscal pode ter por finalidade a suspensão daquela execução e não a sua extinção, é corolário lógico/jurídico que a suspensão da execução pelo órgão de execução fiscal, após a dedução da oposição, levará à inutilidade superveniente desta, por se mostrar satisfeito o seu desiderato.
A inutilidade superveniente da lide (al. e) do actual art. 277.º do CPC – correspondente ao anterior art. 287.º) ocorre quando, por facto ocorrido na pendência da instância, a solução do litígio deixe de ter todo o interesse e utilidade, conduzindo, por isso, à extinção da instância, pois que a pretensão do autor não poderá, então, manter-se, por virtude do desaparecimento dos sujeitos ou do objecto do processo

Pelo que, bem andou a sentença recorrida ao determinar a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide. A inutilidade superveniente da lide (al. e) do actual art. 277.º do CPC .
Sucumbem, assim, as conclusões quanto ao presente segmento de recurso.

II.2.2 Subsidiariamente, a Recorrente alega que mesmo decretada a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, as custas em que foi condenada nunca lhe poderiam ser imputadas, dado que o desconhecimento da existência do processo de insolvência, apenas à oponente, aqui Recorrida, poderia ser imputado, porquanto só com a dedução da oposição a Administração Fiscal foi informada da existência do decretamento da sua insolvência. A aqui recorrida é que deu causa à inutilidade da lide, pelo que é aquela que deverá ser responsável pelas custas nos termos do artigo 536º, nº 3 do CPC (Conclusões J a U)

De acordo com a regra geral em matéria de custas, a decisão que julgar a causa condenará em custas a parte que a elas houver dado causa, ou seja, dá causa às custas a parte vencida, na proporção em que o for. Tal princípio encontra-se firmado no artigo 527.º do Código de Processo Civil (CPC), que refere:1. A decisão que julgue a acção ou algum dos seus incidentes ou recursos condenará em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito.
2. Entende-se que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for.
3. No caso de condenação por obrigação solidária, a solidariedade estende-se às custas”.
Esta regra geral de responsabilidade pelo pagamento das custas assenta, a título principal, no princípio da causalidade e subsidiariamente, no da vantagem ou proveito processual, sendo aquele indiciado pelo princípio da sucumbência, pelo que deverá pagar as custas a parte vencida, na respectiva proporção.
O que justifica a condenação em custas de determinado litigante é o nexo de causalidade existente entre as despesas do litígio e o comportamento desse litigante” Alberto dos Reis in Código de Processo Civil, anotado, Vol. II, pág. 202. “Paga as custas o vencido porquê? Porque se comportou por maneira a dar causa à acção e consequentemente às despesas judiciais que ela ocasiona, ou então porque ofereceu resistência infundada à pretensão do autor”idem, pág. 202/203. A relação de causalidade é denunciada por certos índices, o primeiro e o principal dos quais é a sucumbência. Não há, pois, oposição alguma entre o princípio da causalidade e o princípio da sucumbência como fundamento da responsabilidade pelas custas; se deve suportá-las o vencido, a razão é esta: a sucumbência é a revelação da causalidade, quer dizer, a parte vencida suporta as custas precisamente porque deu causa a elas.” – idem, pag 201.
Para o que aqui se aprecia importa considerar o disposto no artigo 536.º do CPC, sob a epígrafe de “repartição das custas”, onde se pode ler:
1- Quando a demanda do autor ou requerente ou a oposição do réu ou requerido eram fundadas no momento em que foram intentadas ou deduzidas e deixaram de o ser por circunstâncias supervenientes a estes não imputáveis, as custas são repartidas entre aqueles em partes iguais.
2- Considera-se que ocorreu uma alteração das circunstâncias não imputável às partes quando:
a) A pretensão do autor ou requerido ou oposição do réu ou requerente se houverem fundado em disposição legal entretanto alterada ou revogada;
b) Quando ocorra uma reversão de jurisprudência constante em que se haja fundado a pretensão do autor ou requerente ou oposição do réu ou requerido;
c) Quando ocorra, no decurso do processo, prescrição ou amnistia;
d) Quando, em processo de execução, o património que serviria de garantia aos credores se tiver dissipado por facto não imputável ao executado;
e) Quando se trate de ação tendente à satisfação de obrigações pecuniárias e venha a ocorrer a declaração de insolvência do réu ou executado, desde que, à data da propositura da ação, não fosse previsível para o autor a referida insolvência.
3 – Nos restantes casos de extinção da instância por impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide, a responsabilidade pelas custas fica a cargo do autor ou requerente, salvo se tal impossibilidade ou inutilidade for imputável ao réu ou requerido, caso em que é este o responsável pela totalidade das custas
4 – Considera-se, designadamente, que é imputável ao réu ou requerido a inutilidade superveniente da lide quando esta decorra da satisfação voluntária, por parte deste, da pretensão do autor ou requerente, fora dos casos previstos no nº 2 do artigo anterior e salvo se, em caso de acordo, as partes acordem a repartição das custas”.

De acordo com o normativo, agora transcrito, quando a instância se extinguir por impossibilidade ou inutilidade da lide, as custas ficam a cargo do autor, salvo se a inutilidade ou impossibilidade resultar de facto imputável ao réu, que nesse caso as pagará.
Como salienta Salvador da Costa, in Regulamento das Custas Processuais, Anotado e Comentado, Almedina, 2ª edição, página 87, o que neste normativo se prescreve «é inspirado pelo princípio de que, não havendo sucumbência, não é legítimo onerar o réu ou o demandado com o pagamento das custas da acção, por ele não ter dado origem ao facto determinante da inutilidade ou impossibilidade superveniente da lide, o que constitui corolário do princípio da causalidade na sua formulação negativa.
Verifica-se uma situação de impossibilidade superveniente da lide, por exemplo, no caso de a pessoa que intentou a acção de denúncia do contrato de arrendamento para habitação própria haver falecido; e há inutilidade superveniente da lide, por exemplo, quando, durante a pendência da acção condenatória no pagamento de determinada quantia, o réu procedeu à entrega ao autor do montante pecuniário em causa.

No primeiro caso, o réu não suportará o pagamento das custas da acção, ainda que a tenha contestado, visto que o facto determinante da extinção da instância não lhe é imputável; no segundo, porque o acto de pagamento determinante da extinção de instância lhe é imputável, cabe -lhe realizar o seu pagamento».
No caso em apreço, a inutilidade superveniente da instância foi determinada com os seguintes fundamentos, cuja sentença passamos a transcrever parcialmente:
“(…)Conclui-se assim, que tendo a pretensão relativa à suspensão do P.E.F. sido satisfeita, os presentes autos perderam utilidade, o que determina a extinção da instância, nos termos da alínea e) do artigo 277.º do C.P.C., sendo a Fazenda Pública responsável pelas custas, nesta parte (cfr segunda parte do n.º 3 do artigo 536.º do C.P.C.).”

Considerada a factualidade supra fixada está em causa aferir se, em concreto, a condenação da recorrente nas custas, pela inutilidade superveniente da lide, se mostra conforme com o disposto no artigo 536.º, n.º 3 do CPC (dado não ser aplicável in casu o disposto nos seus n.º 1 e n.º 2).
Ora, no caso “subjudice”, resulta dos autos que a inutilidade superveniente da lide não pode ser imputada à Fazenda Pública. Isto porque a declaração de insolvência da oponente não foi consequência de actuação da Fazenda Pública, e teve antes como causa o facto de a ora recorrente, apenas com a petição de oposição ter informado que tinha sido declara insolvente.

É importante lembrar que, no caso de impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide, a responsabilidade do autor pelas custas não depende de tal impossibilidade ou inutilidade ser imputável a este. A regra, nestas situações, é as custas serem da responsabilidade do autor. Se não quiser assumir tal responsabilidade, tem o autor o ónus da prova de que a impossibilidade ou inutilidade deriva de facto imputável ao réu.
Nesta conformidade, a responsabilidade do autor pelas custas, nos casos de inutilidade superveniente da lide previstos no artigo 536.º, n.º 3 do CPC, determina-se por exclusão dos casos em que é responsável o réu, isto é, o autor é sempre responsável quando não o for o réu, sendo que este só o é quando o facto de que resulta a inutilidade lhe for imputável.
No caso, a conduta da Fazenda Pública, de suspender, apenas no decurso da oposição, o processo de execução fiscal, decorre de, apenas com a respectiva petição inicial a opoente, agora recorrida, ter informado que tinha sido declarada insolvente. Na verdade, resulta dos factos fixados que a Fazenda Pública não protelou a decisão de suspender o processo de execução fiscal, antes actuou em consequência do comportamento da recorrente. Só com a dedução da oposição, a Fazenda Pública teve conhecimento de que a oponente tinha sido declarada insolvente em momento anterior à sua citação.

Nos termos do n.º 3, nos casos em que a inutilidade superveniente da lide resulte de circunstâncias que não as referidas nos dois primeiros números do artigo 536.º, paga as custas o autor, a menos que a impossibilidade ou inutilidade seja imputável ao réu, caso em que este responde pelas custas; ou seja, nesses casos, o autor é sempre responsável pelas custas quando não o for o réu, sendo que este só o é quando o facto de que resulta a inutilidade lhe for objectivamente imputável. Neste preciso sentido veja-se o acórdão deste TCAN, de 15/11/2007, proferido no âmbito do processo n.º 02116/04.5BEPRT
Ora, o facto que está na origem da inutilidade não é do domínio da Fazenda Pública, não lhe é objectivamente imputável, logo, não é imputável ao réu, pois tal facto é a declaração de insolvência da oponente, que foi trazido ao conhecimento da Fazenda Pública, repita-se, com a dedução da oposição.
Assim, e atenta a regra do n.º 3 do artigo 536.º do CPC, a responsabilidade pelas custas não poderá deixar de recair sobre a oponente, ora recorrida, que nos autos de oposição assume a posição de autora, enquanto a Fazenda Pública assume a de réu.
Em face do exposto, a sentença recorrida, incorreu em erro de julgamento na interpretação que fez do artigo 536.º, n.º 3 do CPC, pelo que deve ser revogada.
Procedendo as conclusões de recurso, é de lhe conceder provimento, e considerar responsável pelas custas, neste segmento, a autora, aqui recorrida.


III. Decisão

Termos em que, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e condenar a oponente, aqui Recorrida, nas custas do processo.
Custas a cargo da Recorrida, não sendo devida a taxa de justiça, por não ter contra-alegado.
Porto, 12 de Abril de 2018.
Ass. Cristina Travassos Bento

Ass. Paula Moura Teixeira

Ass. Fernanda Esteves


(1) Nos termos do Acórdão do STA, de 15.02.2012, no processo n.º 098/12, disponível em www.dgsi.pt.
(2) In Código de Processo Civil Anotado, Volume I, Coimbra Editora, 1999, pág. 512.