Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00986/15.0BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:05/03/2019
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Ricardo de Oliveira e Sousa
Descritores:NULIDADE DE SENTENÇA, POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA; ILEGITIMIDADE PROCESSUAL PASSIVA; FALTA DE IDENTIFICAÇÃO DE CONTRAINTERESSADOS; DESPACHO DE APERFEIÇOAMENTO; ABSOLVIÇÃO DA INSTÂNCIA;
ARTIGO 88º, Nº.2 DO CPTA, NA VERSÃO ANTERIOR AO DECRETO-LEI Nº 214-G/2015 DE 02.10.
Sumário:
I- A nulidade do acórdão por omissão de pronúncia [art. 668º nº 1 d) do CPC], traduzindo-se no incumprimento, por parte do julgador, do dever consignado no art. 607º nº 2 - 1ª parte - do CPC, só ocorre quando o tribunal, pura e simplesmente, não tome posição sobre qualquer questão que devesse conhecer, inclusivamente, não decidindo explicitamente que não pode dela tomar conhecimento, sendo que só têm dignidade de questões as pretensões processuais formuladas pelas partes ao tribunal e não os argumentos por elas usados em defesa das mesmas, não estando o tribunal vinculado a apreciar todos os argumentos utilizados pelas partes.
II- Nos termos do artigo 88º, nº 2 do CPTA, na versão anterior ao Decreto-lei nº 214-G/2015 de 02.10, na impossibilidade de correção oficiosa de questão que possa obstar ao prosseguimento do processo, deve o juiz providenciar pelo convite ao aperfeiçoamento do libelo inicial com vista ao suprimento de matéria excetiva dilatória no prazo de 10 dias.
III- O convite ao aperfeiçoamento só não será admissível, havendo lugar a decisão de absolvição da instância, quando estejamos em presença da exceção dilatória insuprível que não consinta a renovação da instância [v.g., a inimpugnabilidade do ato, a ineptidão da petição inicial, a caducidade do direito de ação, a litisconsórcio, o caso julgado].
IV- A falta de legitimidade processual passiva, aferida na vertente de falta de identificação de contrainteressados, integra matéria dilatória perfeitamente suprível, pelo que se impõe a prolação de despacho de aperfeiçoamento do libelo inicial previamente à decisão de absolvição da instância.
Na situação recursiva, perante o dissídio das partes - por parte do Recorrente [que defende a tese da inexistência de contra-interessados], e, por parte do Recorrido [que defende a sua existência], impunha-se ao Tribunal a quo decidir se existiam ou não contra-interessados, e, perante a sua perspetiva da questão, convidar [ou não] ao aperfeiçoamento com vista ao suprimento da matéria excetiva em análise, que não apenas a mera notificação para se pronunciar novamente acerca da questão prévia colocada expressamente na contestação, que foi o que, na realidade, aconteceu. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:SINDICATO DOS TRABALHADORES EM FUNÇÕES PÚBLICAS E SOCIAIS DO NORTE
Recorrido 1:INSTITUTO DE SEGURANÇA SOCIAL
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:
Conceder provimento ao recurso
Revogar a decisão recorrida
Ordenar a baixa dos autos
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I – RELATÓRIO
SINDICATO DOS TRABALHADORES EM FUNÇÕES PÚBLICAS E SOCIAIS DO NORTE, em representação dos seus associados devidamente identificados, vem intentar o presente RECURSO JURISDICIONAL do despacho saneador-sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto [doravante T.A.F. do Porto], de 06.04.2018, proferido no âmbito da Ação Administrativa que o Recorrente intentou contra o INSTITUTO DE SEGURANÇA SOCIAL, que julgou procedente a exceção dilatória de ilegitimidade processual passiva, aferida da vertente da falta de identificação de contrainteressados, e, consequentemente, absolveu o Réu da instância.
Em alegações, o Recorrente formula as conclusões que ora se reproduzem, que delimitam o objeto do recurso:
(…)
1. A sentença recorrida está inquinada com vício de nulidade, nos termos do art. 615º, n.1, por remissão para o art.º 195º, nº 1 in fine,
2. Na exata medida em que decide erroneamente pôr fim ao processo, não analisando a questão de direito, quando o deveria ter feito pois que, do provimento da ação não decorre qualquer prejuízo para nenhum trabalhador dos não inseridos no procedimento em causa.
Ainda,
3. Nos termos do art.º 615º, nº 1 al. d) CPC, ex vi art.º 1º e 140º CPTA, traduzindo-se o mesmo no facto de o Tribunal a quo não se pronunciar sobre questões que devia conhecer, mormente os factos e vícios apontados ao ato impugnado.
Ademais,
4. Todo o procedimento administrativo de que resultou o ato que se sindica é inconstitucional e padece de inúmeras ilegalidades quer formais quer procedimentais apontadas na ação, pelo que é essa matéria de facto e de direito que merece ser apreciada.
5. A invocação da exceção dilatória da falta de indicação de contrainteressados não pode proceder na exata medida em que não existem contrainteressados na relação material controvertida presente nesta demanda.
6. A noção de contrainteressado tem de ser construída a partir do prejuízo que aquele terá se não for chamado a juízo e não a partir do eventual interesse que alguém pudesse ter em ser parte na ação [Neste sentido veja-se Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, Processo n° 01018/15, de 12 de novembro de 2015].
7. Os prejuízos a averiguar são os passíveis de advir direta ou indiretamente dos resultados do litígio e,
8. Neste sentido, entendemos não haver contrainteressados a invocar, pois que não se alcança quem possa ser prejudicado com a presente demanda.
9. De facto, a colocação na situação de requalificação apenas produz efeitos para os trabalhadores atingidos por tal ato e não para os trabalhadores que ocupam os postos de trabalho tidos como necessários, tanto mais que os inseridos no processo de requalificação não são nem nunca forma definidos como desnecessários
10. Apenas os trabalhadores colocados em situação de requalificação têm interesse em agir na presente demanda, uma vez que, apenas eles são afetados pela existência e devidos efeitos do ato administrativo ora sindicado.
11. Destarte, não existem contrainteressados na medida em que os trabalhadores que atualmente ocupam os postos de trabalho, pela procedência da presente ação, não sofrerão qualquer prejuízo identificável.
12. Isto é, a sentença recorrida erra na medida em que entende existirem contrainteressados, dando assim como reconhecido a sua não identificação e, bem assim a impossibilidade de prosseguimento dos presentes autos. Mas, vejamos ainda,
13. Se os trabalhadores colocados em requalificação pertencem aos mais diversos serviços do recorrido, questiona-se quem serão então os contrainteressados?
14. Todos os demais trabalhadores com a mesma categoria. Todos? E,
15. Se assim é como discernir relativamente aos que foram considerados incursos no presente processo de requalificação? Que fundamentação se pode arguir para os que foram inseridos na requalificação?
16. Ademais, nem tão pouco se poderia falar em trabalhadores em excesso na medida em que ao mesmo tempo o recorrido admitiu ao serviço centenas de trabalhadores em regime de avença, tudo como melhor se deixou expresso na Pie aqui se dá como integralmente reproduzido. Isto é,
17. Os vícios apontados ao ato impugnado existem de facto, tal como se alcança da sentença - ainda sob recurso - supra melhor identificada.
Termos em que, sempre com o douto suprimento de V. E^, deve ser dado provimento ao presente recurso, anulando-se a decisão recorrida, tudo, com as legais consequências.
Como é de Justiça!
(…)”.
*
Notificado que foi para o efeito, o Recorrido apresentou contra-alegações, que rematou da seguinte forma:
“(…)
A. A douta sentença recorrida garantiu a segurança jurídica e não está eivada dos vícios que o Recorrente lhe imputa, mormente, o vício de nulidade previsto no artigo 615.°, n.° 1 ex vi 195, n.° 1 do CPTA.
B. O Recorrente procura advogar e sustentar a inexistência de contrainteressados na presente ação, em virtude de, na sua ótica, não existirem trabalhadores prejudicados pela eventual anulação do ato impugnado, mormente, porquanto as funções destes trabalhadores foram distribuídas por outros trabalhadores não afetados pelo processo de requalificação. Sem razão;
C. Como se referiu em sede de contestação e ora se reitera para todos os efeitos legais, foi comprovado no âmbito do ISS, IP, o claro desfasamento do pessoal afeto a este Instituto., tal como plasmado, de entre o mais, nos mapas comparativos, face às necessidades permanentes para a prossecução das respetivas atribuições a dois níveis: por um lado, os trabalhadores que exerciam funções nos estabelecimentos integrados e que integram essencialmente as carreiras não revistas e subsistentes acima referidas, por outro os trabalhadores integrados na carreira de assistente operacional que, por mudanças de procedimento, bem como, também pela referida alteração do modelo de gestão dos estabelecimentos se revelam excessivos, tendo revelado em cada um dos Centros Distritais que o número de postos ocupados é superior ao número de postos necessários nas carreiras acima referidas.
D. O referido desajuste encontra-se refletido no mapa comparativo entre o número de efetivos existentes e o número de postos de trabalho necessários para assegurar a prossecução e o exercício das atribuições e competências e para a realização dos objetivos do ISS, I.P., tendo sido objeto de despacho do membro do governo da Tutela, em 28/09/2014, e equivale ao reconhecimento de que o número, carreiras ou áreas de atividade dos trabalhadores afetos aos serviços, in casu, ao Centro Distrital da Segurança Social do Porto, era desajustado face às necessidades permanentes ou prossecução dos seus objetivos designadamente, 120 postos de trabalho necessários de assistente operacional (vide anexo II fls. 55 do PA).
E. Ora, nos termos do artigo 78, n.° 1 alínea f) do CPTA, o Autor está obrigado a identificar na p.i. os contrainteressados, tendo em consideração que deverão ser obrigatoriamente demandados todos os que possam ser prejudicados com a procedência da ação ou que tenham interesse na manutenção do ato impugnado- cfr. artigos 57.° e 68.°, n.° 2 do CPTA.
F. Na verdade, através da deliberação ora impugnada, o Réu procedeu à aprovação da lista nominativa com os resultados dos trabalhadores avaliados (da carreira/categoria de assistente operacional da unidade desconcentrada do Réu - Centro Distrital do Porto) por ordem decrescente, decorrentes da aplicação do método de seleção Avaliação de Competências Profissionais, elaboradas de acordo com o n.° 6 do artigo 252.° da LTFP, e à consequente colocação em situação de requalificação dos trabalhadores posicionados abaixo da 120° posição (posição essa correspondente aos postos de trabalho necessários na categoria de assistente operacional, no âmbito do submapa pessoal do CDist. do Porto).
G. Desse modo, se é certa a existência dos trabalhares graduados abaixo da 120.° posição que, em consequência da classificação e posicionamento obtido, passaram à situação de requalificação também é clarividente a existência dos trabalhadores graduados dentro dos postos de trabalho necessários (1.° a 120.° posição), cuja relevância o ora Recorrente teimosamente tende a desconsiderar (o que apenas se apreende em função do prosseguimento de uma douta estratégia de defesa, com vista a obviar eventuais conflitos de interesses provenientes da eventual demanda nos presentes autos de contrainteressados que sejam seus filiados).
H. Pelo que, como bem aludiu o douto Tribunal a quo “Ora, na presente ação o Autor imputa ao ato de homologação da referida lista diversas ilegalidades de ordem formal e procedimental, cuja procedência poderá dar lugar à repetição do procedimento e a uma eventual repetição do procedimento de avaliação dos trabalhadores integrados na carreira de assistente operacional, entre os quais os trabalhadores que, no procedimento aqui em questão, ficaram colocados nas primeiras 120 posições da lista nominativa.
É nessa medida manifesto que os trabalhadores que ficaram graduados nas primeiras 120 posições podem ser prejudicados pela eventual anulação do ato que homologou tal lista aqui impugnado, tendo, por conseguinte, legitimo interesse na manutenção, porquanto, com ele vira a sua situação laboral inalterada, ao contrario do verificado relativamente aos representados pelo Autor, que foram colocados em situação de requalificação."
I. O Réu nunca esteve a substituir os assistentes operacionais requalificados por CEIS, trabalhadores em regime de trabalho temporário ou trabalhadores integrados em estágios profissionais.
J. Desse modo, tendo o doutro Tribunal oportunamente convidado o Autor para identificar os contrainteressados nos presentes autos no prazo legalmente fixado para o efeito e não tendo obtido o devido impulso processual do mesmo, bem decidiu o Tribunal a quo ao absolver o Réu da instância.
K. No tocante à sentença proferida no proc. 1053/15.2BEPRT e suposta decisão diametralmente inversa ao decidido nos presentes autos, cumpre apenas assinalar que o douto Tribunal no processo em referência se eximiu de se pronunciar sobre a exceção dilatória de indicação de contrainteressados suscitada pelo Réu, à revelia do consignado no artigo 88.°, n.°1, alínea a), do CPTA, o que não se verificou nos presentes autos, em respeito pelo citado comando jurídico.
Termos em que, com o douto suprimento de V. Exas. deverá ser mantida a sentença ora recorrida, negando-se provimento ao presente recurso jurisdicional.
(…)”
*
O Tribunal a quo proferiu despacho de sustentação, a negar a existência de qualquer nulidade da decisão recorrida.
*
O Ministério Público neste Tribunal não emitiu o parecer a que alude o artigo 146º, nº.1 do CPTA.
*
Com dispensa de vistos prévios, cumpre, pois, apreciar e decidir, já que nada a tal obsta.
II – DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A DECIDIR
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, de acordo com o disposto nos artigos 144.º n.º 2 e 146.º n.º 4 do C.P.T.A. e dos artigos 5.º, 608.º n.º 2, 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do novo CPC ex vi dos artigos 1.º e 140.º do CPTA.
Neste pressuposto, as questões essenciais a dirimir resumem-se a saber se o despacho saneador-sentença recorrido, ao determinar a procedência da exceção dilatória de falta de identificação de contrainteressados, (i) enferma de nulidade por omissão de pronúncia, bem como se (ii) incorre em erro de julgamento, por errada interpretação do direito.
Assim sendo, estas serão, por razões de precedência lógica, as questões a apreciar e decidir.
III – FUNDAMENTAÇÃO
III.1 – DE FACTO
O Tribunal a quo não fixou factos, em face do que aqui se impõe estabelecer a matéria de facto, rectius, ocorrências processuais, mais relevante à decisão a proferir:
A. Em 30 de março de 2015, o Sindicato Autor, em representação dos associados [RA] devidamente identificados no libelo inicial corrigido que faz fls. 352 e seguintes dos autos, interpôs a presente ação no T.A.F. do Porto com vista à impugnação da deliberação de 28 de janeiro de 2015 do Conselho Diretivo do ISS, IP, que aprovou a lista nominativa com os resultados dos trabalhadores avaliados da carreira de assistente assistentes operacionais da unidade desconcertada do ISS, IP – Centro Distrital do Porto, por ordem decrescente, e a consequente colocação em situação de requalificação dos trabalhadores posicionados abaixo de 120º posição, onde se integram os aqui RA [cfr. fls. 351 e seguintes dos autos físicos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido];
B. Regularmente citado, o Réu contestou em tempo, tendo suscitado matéria excetiva [de entre outra, a falta de identificação dos contra-interessados] e pugnado pela improcedência da presente ação [cfr. fls. 399 e seguintes dos autos físicos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido];
C. Em 10.04.2017, o Autor replicou parte da matéria excetiva suscitada, tendo concluído pela improcedência da mesma [cfr. fls. 434 e seguintes dos autos físicos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido];
D. Em 31.10.2017, o Sr. Juiz a quo prolatou despacho a determinar a notificação do Autor para, no prazo de 10 dias, vir aos autos “(…) indicar os contra-interessados (os tais trabalhadores que os estão a substituir nos postos de trabalho e que serão inevitavelmente afetados pela anulação do ato em crise, nos termos legalmente exigidos (…)” [cfr. fls. 438 dos autos físicos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido];
E. Na sequência de tal, veio o Autor, em 14.11.2017, responder, de entre outros elementos, e no mais essencial, “(…) não haver contrainteressados no presente processo, pois que o êxito da presente demanda não coloca em causa os direitos de nenhum trabalhador, antes a todo beneficiará (…)” [cfr. fls. 443 e seguintes dos autos físicos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido];
F. O Réu contraditou esta alegação, sustentando, em síntese, a existência de contrainteressados traduzida nos candidatos graduados dentro dos postos de trabalho [1ª a 120ª posição] que, em consequência da alteração da graduação imposta pela eventual anulação do ato impugnado, passariam à situação de requalificação [cfr. fls. 486 e seguintes dos autos físicos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido];
G. Contra esta atuação processual sobreveio, em 22.01.2018, o despacho saneador sentença ora recorrido [cfr. fls. 488 e seguintes dos autos físicos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido].
*
III.2 - DO DIREITO
Assente a factualidade que antecede, cumpre, agora, apreciar as questões suscitadas no recurso jurisdicionais em análise.
I- Da nulidade imputada à decisão recorrida, por omissão de pronúncia
O Recorrente começa por arguir a nulidade da sentença recorrida, com fundamento na alínea d) do artigo 615º do CPC ex vi artigo 1º do CPTA.
Sustenta, para tanto, brevitatis causae, que o Tribunal não se pronunciou questões que devia conhecer, mormente os factos e vícios apontados ao ato impugnado.
Quid iuris?
De acordo com o art. 608º n.º 2 do Código de Processo Civil (CPC), “(…) O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, (...).”
A inobservância de tal comando é, como se sabe, sancionada com a nulidade da sentença: art. 615º n.º 1 al. d) CPC.
O exato conteúdo do que sejam as questões a resolver de que falam tais normativos foi objeto de abundante tratamento jurisprudencial.
Destaca-se, nesta problemática, o Acórdão produzido por este Tribunal Central Administrativo Norte de 07.01.2016, no processo 02279/11.5BEPRT: cujo teor ora parcialmente se transcreve: “(…) “As causas determinantes de nulidade de decisões judiciais correspondem a irregularidades que afetam formalmente a sentença e provocam dúvidas sobre a sua validade encontrando-se tipificadas, de forma taxativa, no artigo 615.º do CPC. O que não se confunde, naturalmente, com errados fundamentos de facto e/ou de direito.
Determina o artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC, aplicável por força do disposto no artigo 1.º do CPTA, que a nulidade por omissão de pronúncia ocorre “quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”.
Este preceito relaciona-se com o comando ínsito na primeira parte do n.º 2 do artigo 608.º do mesmo diploma, segundo o qual o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, e não todos e cada um dos argumentos/fundamentos apresentados pelas partes, e excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras – cfr. Alberto Reis, Código de Processo Civil anotado, volume V, Coimbra 1984 (reimpressão); e os acórdãos, entre outros, do STA de 03.07.2007, rec. 043/07, de 11.9.2007, recurso 059/07, de 10.09.2008, recurso 0812/07, de 28.01.2009, recurso 0667/08, e de 28.10.2009, recurso 098/09 de 17/03/2010, rec. 0964/09).
Do mesmo modo estipula o artigo 95.º do CPTA que “Sem prejuízo do disposto no número seguinte, o tribunal deve decidir, na sentença ou acórdão, todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e não pode ocupar-se senão das questões suscitadas, salvo quando a lei lhe permita ou imponha o conhecimento oficioso de outras”.
Questões, para este efeito, são pois as pretensões processuais formuladas pelas partes no processo que requerem decisão do juiz, bem como os pressupostos processuais de ordem geral e os específicos de qualquer ato (processual), quando realmente debatidos entre as partes – cfr. Antunes Varela in RLJ, Ano 122.º, p. 112 – a decidir pelo Tribunal enquanto problemas fundamentais e necessários à decisão da causa – cfr. Teixeira de Sousa in “Estudos sobre o novo Processo Civil”, Lex, Lx 1997, págs. 220 e 221.
Exige-se pois ao Tribunal que examine toda a matéria de facto alegada pelas partes e analise todos pedidos formulados por elas, com exceção das matérias ou pedidos que forem juridicamente irrelevantes ou cuja apreciação se torne inútil pelo enquadramento jurídico escolhido ou pela resposta fornecida a outras questões – cfr. M. Teixeira de Sousa, ob. e pp. cits.”.
Posição que se manteve no acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte de 20.10.2017, no Procº. n.º 00048/17.6, que: “(…) A questão está desde logo em saber se o tribunal se deixou de pronunciar face ao suscitado e, em qualquer caso, se teria de o fazer.
Referiu a este propósito o STJ, no seu acórdão de 21.12.2005, no Processo n.º 05B2287 que:
“A nulidade do acórdão por omissão de pronúncia (art. 668º nº 1 d) do CPC), traduzindo-se no incumprimento, por parte do julgador, do dever consignado no art. 660º nº 2 - 1ª parte - do CPC, só acontece quando não haja pronúncia sobre pontos fáctico-jurídicos estruturantes das posições dos pleiteantes, nomeadamente as que se prendem com a causa de pedir, pedido e exceções (excetuados aqueles cuja decisão esteja prejudicada por mor do plasmado no último dos normativos citados), não, pois, quando tão só ocorre mera ausência de discussão das "razões ou dos "argumentos" invocados pelas partes para concluir sobre as questões suscitadas.”
Como se refere no Acórdão, desta feita do STA nº 01035/12, de 11-03-2015, “a nulidade de sentença por omissão de pronúncia só ocorre quando o tribunal deixar de apreciar questão que devia conhecer (artigos 668.º, n.º 1, alínea d) e 660.º, n.º 2 do Código de Processo Civil revogado, aplicável no caso sub judice).
(…)
Resulta também do artº 95º, nº 1, do CPTA que, sem prejuízo do disposto no número seguinte, o tribunal deve decidir, na sentença ou acórdão, todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e não pode ocupar-se senão das questões suscitadas, salvo quando a lei lhe permita ou imponha o conhecimento oficioso de outras.
Como este Supremo Tribunal Administrativo vem entendendo, haverá omissão de pronúncia sempre que o tribunal, pura e simplesmente, não tome posição sobre qualquer questão que devesse conhecer, inclusivamente, não decidindo explicitamente que não pode dela tomar conhecimento – cf. neste sentido Acórdãos de 19.02.2014, recurso 126/14, de 09.04.2008, recurso 756/07, e de 23.04.2008, recurso 964/06.
Numa correta abordagem da questão importa ainda ter presente, como também vem sublinhando de forma pacífica a jurisprudência, que esta obrigação não significa que o juiz tenha de conhecer todos os argumentos ou considerações que as partes hajam produzido. Uma coisa são as questões submetidas ao Tribunal e outra são os argumentos que se usam na sua defesa para fazer valer o seu ponto de vista.
Sendo que só têm dignidade de questões as pretensões processuais formuladas pelas partes ao tribunal e não os argumentos por elas usados em defesa das mesmas, não estando o tribunal vinculado a apreciar todos os argumentos utilizados pelas partes.”
Em reforço deste entendimento, ressalte-se o expendido no Acórdão do S.T.A. de 12.06.2018 [processo n.º 0930/12.7BALSB], consultável em www.dgsi.pt: “(…)
24. Caraterizando a arguida nulidade de decisão temos que a mesma se consubstancia na infração ao dever que impende sobre o tribunal de resolver todas as questões que as partes hajam submetido à sua apreciação excetuadas aquelas cuja decisão esteja ou fique prejudicada pela solução dada a outras [cfr. art. 608.º, n.º 2, CPC].
25. Com efeito, o tribunal deve examinar toda a matéria de facto alegada pelas partes e analisar todos os pedidos/pretensões pelas mesmas formulados, ressalvadas apenas as matérias ou pedidos/pretensões que forem juridicamente irrelevantes ou cuja apreciação se haja tornado inútil pelo enquadramento jurídico escolhido ou pela resposta fornecida a outras questões.
26. Questões para este efeito são, assim, todas as pretensões processuais formuladas pelas partes que exigem decisão do julgador, bem como, ainda, os pressupostos processuais [gerais e específicos] debatidos nos autos, sendo que não podem confundir-se aquilo que são as questões que os litigantes submetem à apreciação e decisão do tribunal com o que são as razões de facto ou de direito, os argumentos, ou os pressupostos em que cada a parte funda a sua posição nas questões objeto de litígio (…)”.
Munidos destes considerandos de enquadramento jurisprudencial, e regressando ao caso concreto, adiante-se, desde já, que o Tribunal a quo não deixou de conhecer de qualquer questão de que devesse conhecer.
Na verdade, o Autor vem peticionar a invalidação da deliberação de 28 de janeiro de 2015 do Conselho Diretivo do ISS, IP, que aprovou a lista nominativa com os resultados dos trabalhadores avaliados da carreira de assistente assistentes operacionais da unidade desconcertada do ISS, IP – Centro Distrital do Porto, por ordem decrescente, e a consequente colocação em situação de requalificação dos trabalhadores posicionados abaixo de 120º posição, onde se integram os aqui RA.
Ora, tendo o Réu suscitado matéria excetiva, de entre outra, a falta de identificação dos contra-interessados, tinha o Tribunal a quo que conhecer desta defesa por exceção.
Se tinha que dela conhecer, e sabendo-se que a exceção dilatória de ilegitimidade processual, aferida na vertente da falta de identificação de contrainteressados, que se julgou verificada, obsta ao prosseguimento do processo, nos termos do disposto no artigo 89º, nº.1, alínea f) do C.P.T.A., na versão anterior ao Decreto-Lei n.° 214-G/2015, de 02.10, então não há qualquer omissão de pronúncia, uma vez que esta não se abrange as questões submetidas pelas partes, mormente quanto ao mérito da ação, cujo conhecimento resulte prejudicado pela solução dada a outras, como acontece no caso em apreço.
Concludentemente, a sentença recorrida não padece da assacada nulidade por omissão de pronúncia [fundada na violação dos artigos 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC e artigos 95.º e 71.º n.º 1 do CPTA], a qual improcede.
II- Do imputado erro de julgamento em torno da falta de identificação dos contrainteressados
Cumpre, agora, apreciar se o Tribunal a quo, ao julgar procedente a exceção dilatória de ilegitimidade processual passiva, aferida da vertente da falta de identificação de contrainteressados, incorreu em erro de julgamento, por errada aplicação do direito.
Para facilidade de análise, convoquemos, no que ao direito concerne, o que discorreu na 1ª instância:
“(…)
O Réu vem excecionar com fundamento na falta de indicação dos contrainteressados, por parte do Autor, correspondentes aos 120 trabalhadores que foram colocados nos primeiros lugares da lista nominativa elaborada na sequência do processo de seleção, e que vieram a ser reafetados nos serviços do Réu.
Notificada para indicar os contrainteressados, o Autor não o fez, argumentando que as funções dos trabalhadores por ela representados na presente ação foram redistribuídas por outros trabalhadores não afetados pelo processo de requalificação, concluindo pela inexistência de contrainteressados.
Lê-se no art. 10°, n.° 1, do CPTA (na redação anterior à dada pelo Decreto-Lei n.° 214-G/2015, de 2.10), que “Cada ação deve ser proposta contra a outra parte na relação material controvertida e, quando for caso disso, contra as pessoas ou entidades titulares de interesses contrapostos aos do autor”, dispondo o art. 57° do mesmo código que “Para além da entidade autora do ato impugnado, são obrigatoriamente demandados os contrainteressados a quem o provimento do processo impugnatório possa diretamente prejudicar ou que tenham legítimo interesse na manutenção do ato impugnado e que possam ser identificados em função da relação material em causa ou dos documentos contidos no processo administrativo”, configurando uma situação de litisconsórcio necessário passivo.
Está em causa nos presentes autos a colocação em situação de requalificação dos trabalhadores aqui representados pelo Autor, afetos à unidade desconcentrada do Réu, Centro Distrital da Segurança Social do Porto, integrados na categoria de assistente operacional.
Para a colocação daqueles trabalhadores em situação de requalificação, o Réu elaborou um Estudo de Avaliação Organizacional, no qual procedeu à avaliação do ajustamento dos recursos humanos face às necessidades de funcionamento dos seus serviços, para em caso negativo, proceder a um processo de racionalização de efetivos. Naquele estudo o Réu concluiu que, na carreira de assistente operacional, o número de postos de trabalhos necessários (120) era inferior ao número de efetivos existentes, pelo que, procedeu à seleção dos trabalhadores a reafetar, de acordo com o estipulado no art. 251°, n.° 8, da Lei Geral de Trabalho em funções Públicas (LGTFP) (na redação dada pela Lei n.° 35/2014, de 20.06), por aplicação de um dos métodos de seleção previstos no art. 252° do mesmo diploma, findo o qual procedeu à elaboração de listas nominativas, por ordem decrescente de resultados (cfr. n.° 5), colocando em situação de requalificação os trabalhadores posicionados abaixo daquela posição 120a.
Ora, na presente ação, o Autor imputa ao ato de homologação da referida lista diversas ilegalidades de ordem formal e procedimental, cuja procedência poderá dar lugar à repetição do procedimento e a uma eventual repetição do procedimento de avaliação dos trabalhadores integrados na carreira de assistente operacional, entre os quais os trabalhadores que, no procedimento aqui em questão, ficaram colocados nas primeiras 120 posições da lista nominativa.
É nessa medida manifesto que os trabalhadores que ficaram graduados nas primeiras 120 posições podem ser prejudicados pela eventual anulação do ato que homologou tal lista, aqui impugnado, tendo, por conseguinte, legítimo interesse na sua manutenção, porquanto, com ele viram a sua situação laboral inalterada, ao contrário do verificado relativamente aos representados pelo Autor, que foram colocados em situação de requalificação. Por conseguinte devem ser tidos como contrainteressados na presente ação.
Nos termos da al. f) do n.° 1 do art. 89° do CPTA (na redação anterior à dada pelo Decreto- Lei n.° 214-G/2015, de 02.10), a falta de indicação dos contrainteressados constitui uma exceção dilatória, que obsta ao conhecimento do mérito da causa, dando lugar à absolvição do Réu da instância (cfr. art. 278°, n.° 1, al. d), do CPC, aplicável ex vi art. 1° do CPTA).
Pelo que, uma vez que o Autor não indicou os contrainteressados, não obstante o convite formulado pelo Tribunal, impõe-se a absolvição do Réu da instância. (…)”.
Adiante-se, desde já, que o assim decidido não é de manter.
Explicitemos pormenorizadamente esta nossa convicção, determinando, de antemão, a lei processual aplicável à situação sub judice.
Assim, e no domínio versado, sublinhe-se que o Decreto-Lei nº. 214-G/2015, de 2 de outubro, procedeu a uma reforma substancial do Código de Processo nos Tribunais Administrativos [CPTA], aprovado pela Lei nº. 15/2002, de 22 de fevereiro, e do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais [ETAF], aprovado pela Lei nº. 13/2002, de 19 de fevereiro - os dois diplomas estruturantes do sistema português de contencioso administrativo.
Introduziu também alterações pontuais em diferentes diplomas avulsos que versam sobre matéria processual administrativa ou matéria puramente administrativa, como é o caso do Código dos Contratos Públicos, do Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação, da Lei de Participação Procedimental e de Ação Popular, do Regime Jurídico da Tutela Administrativa, a Lei de Acesso aos Documentos Administrativos e da Lei de Acesso à Informação sobre Ambiente.
Estabelece o art. 15º, nº. 2 do Decreto-lei nº 214-G/2015 de 02.10. que “As alterações efetuadas pelo presente decreto-lei ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, aprovado pela Lei no 15/2002 de 22 de fevereiro, alterada pelas Leis nos 4-A/2003 de 19 de fevereiro, 59/2008 de 11 de setembro e 63/2011 de 14 de dezembro, só se aplicam aos processos administrativos que se iniciem após a sua entrada em vigor”.
O Decreto-lei nº. 214-G/2015 de 02.10, entrou em vigor 60 dias após a data da sua aplicação [cfr. 15º., nº. 1], ou seja, a 02.12.2015.
Considerando que a presente ação deu entrada em juízo no dia 31.03.2015, será de aplicar à mesma o C.P.T.A., na versão anterior ao Decreto-Lei nº. 214-G/2015.
Ora, e no que para o que aqui releva, dispõe o artigo 88º do [anterior] C.P.T.A., sob a epígrafe “Suprimento de exceções dilatórias e aperfeiçoamento dos articulados”, que:
“(…)
1 - Quando, no cumprimento do dever de suscitar e resolver todas as questões que possam obstar ao conhecimento do objecto do processo, verifique que as peças processuais enfermam de deficiências ou irregularidades de caráter formal, o juiz deve procurar corrigi-las oficiosamente.
2 - Quando a correção oficiosa não seja possível, o juiz profere despacho de aperfeiçoamento, destinado a providenciar o suprimento de exceções dilatórias e a convidar a parte a corrigir as irregularidades do articulado, fixando o prazo de 10 dias para o suprimento ou correção do vício, designadamente por faltarem requisitos legais ou não ter sido apresentado documento essencial ou de que a lei faça depender o prosseguimento da causa.
3 - Nos casos previstos nos números anteriores, são anulados os atos do processo entretanto praticados que não possam ser aproveitados, designadamente porque do seu aproveitamento resultaria uma diminuição de garantias para o demandado ou os demandados.
4 - A falta de suprimento ou correção, nos termos previstos no n.º 2, das deficiências ou irregularidades da petição determina a absolvição da instância, sem possibilidade de substituição da petição ao abrigo do disposto no artigo seguinte.
(…)”.
Do preceito de lei ordinária ora transcrito destaca-se a certeza que, na impossibilidade de correção oficiosa de questão que possa obstar ao prosseguimento do processo, deve o juiz providenciar pelo convite ao aperfeiçoamento do libelo inicial com vista ao suprimento de matéria excetiva dilatória no prazo de 10 dias.
Sobre a obrigatoriedade [ou não] da prolação do despacho de aperfeiçoamento com vista ao suprimento de exceções dilatórias, cabe ressaltar o sumariado no aresto deste Tribunal Central Administrativo Norte, de 07.14.2017, tirado no processo nº. 02969/14.9BEBRGO, consultável em www.dgsi.pt.:
“(…) o convite ao aperfeiçoamento só não será admissível, havendo lugar a decisão de absolvição da instância, quando estejamos em presença da exceção dilatória insuprível que não consinta a renovação da instância [v.g., a inimpugnabilidade do ato, a ineptidão da petição inicial, a caducidade do direito de ação, a litisconsórcio, o caso julgado].
Para além das enunciadas exemplificativamente no art. 89.º, n.º 3 CPTA contam-se, nomeadamente, entre as situações passíveis de suprimento ou correção a ilegitimidade passiva do demandado, a coligação ilegal, a falta identificação dos contrainteressados em preterição de litisconsórcio necessário passivo e a cumulação ilegal pretensões (…)”.
Acompanhando e acolhendo a interpretação assim declarada por este Tribunal Superior, tem-se, portanto, por assente, para o que ora nos interessa, que a falta de legitimidade processual passiva, aferida na vertente de falta de identificação de contrainteressados, integra matéria dilatória perfeitamente suprível, pelo que se impõe a prolação de despacho de aperfeiçoamento do libelo inicial previamente à decisão de absolvição da instância.
Volvendo ao caso concreto, cabe notar que se mostra provado que a matéria excetiva visada foi, primeiramente, suscitada pelo Réu na sua contestação, e, posteriormente, reequacionada pelo Tribunal no seu despacho de fls. 438 dos autos [suporte físico] no sentido do Autor “(…) indicar os contra-interessados (os tais trabalhadores que os estão a substituir nos postos de trabalho e que serão inevitavelmente afetados pela anulação do ato em crise, nos termos legalmente exigidos (…)”, ao que veio o Autor responder “(…) não haver contrainteressados no presente processo, pois que o êxito da presente demanda não coloca em causa os direitos de nenhum trabalhador, antes a todo beneficiará (…)”.
Assim, concluindo-se pela existência de contra-interessados, mas que não foram identificados no libelo inicial, nem sequer em sede de "resposta" à contestação e ao despacho que integra fls. 438 dos autos físicos, onde esta questão foi novamente equacionada, deveria o Tribunal a quo ter mesmo assim optado pelo convite ao aperfeiçoamento ou deveria ter desde logo enveredado pela absolvição da instância - como o fez ???
Cremos, nesta parte, em abono do regime processual que se vem de explanar e do disposto no art.º 7.º do CPTA, que se impunha o convite ao aperfeiçoamento do libelo inicial, até porque não estamos no domínio de uma verdadeira recusa de identificação de contrainteressados por parte do Autor, mas antes numa perspetiva de entendimento de inexistência dos mesmos no caso trazido a juízo.
Efetivamente, perante o dissídio das partes - por parte do Recorrente [que defende a tese da inexistência de contra-interessados], e, por parte do Recorrido [que defende a sua existência], impunha-se ao Tribunal a quo decidir se existiam ou não contra-interessados, e, perante a sua perspetiva da questão, convidar [ou não] ao aperfeiçoamento com vista ao suprimento da matéria excetiva em análise, que não apenas a mera notificação para se pronunciar novamente acerca da questão prévia colocada expressamente na contestação, que foi o que, na realidade, aconteceu.
Ou seja, não podia agora o Tribunal a quo absolver da instância o Sindicato Recorrente, por ilegitimidade passiva - não indicação/identificação dos contra-interessados -, por não ter dado cumprimento em momento anterior e adequado – despacho de aperfeiçoamento – ao que a norma do n.º 2 do art.º 88º do CPTA o "obrigava", sob pena da sua omissão não pode ser reparada e assim prejudicar os interesses legalmente acautelados dos recorrentes e mesmo em desrespeito do princípio pro actione - art.º 7.º do CPTA.
Por conseguinte, impõe-se conceder provimento parcial ao presente recurso jurisdicional, revogar o despacho saneador-sentença recorrido e determinar a baixa dos autos à 1ª instância, para que aí prossigam os seus ulteriores trâmites processuais, mormente com a prolação de despacho de aperfeiçoamento para suprir a falta de identificação dos contra-interessados, no prazo de 10 dias, como decorre obrigatoriamente do n.º 2 do art.º 88º do C.P.T.A.
Assim se decidirá.
***
IV – DISPOSITIVO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Administrativa deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202º da CRP, em conceder parcial provimento ao recurso jurisdicional “sub judice”, e, em consequência, revogar o despacho saneador-sentença recorrido e determinar a baixa dos mesmos para prosseguimento dos respetivos trâmites, mormente com a prolação de despacho de aperfeiçoamento para suprir a falta de identificação dos contra-interessados, no prazo de 10 dias, como decorre obrigatoriamente do n.º 2 do art.º 88º do C.P.T.A.
Custas pelo Recorrente e Recorrido, em ambas as instâncias, na proporção de 1/3 e 2/3.
Registe e Notifique-se.
Porto, 03 de maio de 2019
Ass. Ricardo de Oliveira e Sousa
Ass. Fernanda Brandão
Ass. Frederico de Frias Macedo Branco