Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01652/09.1BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:05/13/2021
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Tiago Miranda
Descritores:FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO DO ACTO VERSUS DA SENTENÇA, IRC, CUSTOS ELEGÍVEIS, FACTURAS COM OBJECTO GERAL E ABSTRACTO.
Sumário:I – Quer o artigo 77º da LGT quer o artigo 124º do CPA de 1991 referem-se aos requisitos de fundamentação do acto administrativo tributário. Quanto à sentença, se padecer, ela própria, de falta de fundamentação em matéria de facto ou de direito só pode violar os artigos 123º nº 2 e 125º nº 1 do CPPT e 607º do CPC. Assim, se uma sentença respaldar um acto administrativo que padeça de insuficiência ou falta de fundamentação, mas o fizer de modo fundamentado (ainda que sem razão) ela não padece de falta de fundamentação, embora possa violar o artigo 77º da LGT.

II- A mera menção de “serviços prestados de apoio a venda de gás” como fonte do crédito objecto de várias facturas é subsumível sem dificuldade no conceito de “omissões” e até no de “inexactidões” integrantes do disposto no artigo 75º nº 2 da LGT, pelo menos quando aquela extrema ambiguidade não é suprível por documentos integrantes da escrita do contribuinte tomador das facturas. Por isso cabe ao utilizador das facturas, contribuinte em IRC, o ónus de alegar e de provar que os custos com o objecto indefinido das facturas têm de facto uma relação de adequação em ordem à realização dos proveitos, para os efeitos do artigo 23º nº 1 do CIRC.

III - Não cumprem com o requisito da alínea a) e do nº 1 do artigo 640º do CPC as conclusões de alegação de recurso da decisão em matéria de facto nas quais se indica como factos indevidamente dados como provados, indiscriminadamente, dois artigos da descrição dos factos provados, na sentença recorrida, constituídos por extensas transcrições do RIT contendo uma vasta pluralidade de factos relevantes.

IV - Não cumprem com o requisito da alínea b) do nº 1 e a) e do nº 2 do artigo 640º do CPC as alegações e as conclusões de alegação de recurso em matéria de apreciação da prova nas quais se indica, indiscriminadamente, como prova de determinados factos que o recorrente alega terem sido indevidamente dados como não provados, extensas passagens de depoimentos de testemunhas, sem se discriminar que afirmações concretas destas impunham lógica ou prudencialmente decisão diversa da tomada.

V – Dado que não é pressuposto de facto dos actos impugnados a não ocorrência dos custos, mas sim e apenas a falta de comprovada indispensabilidade dos mesmos para a manutenção da fonte produtora, é perfeitamente compatível com a não consideração dos custos na impugnante, tomadora das facturas, a consideração dos correspondentes proveitos na matéria tributável da emissora das facturas.

VI - Para cumprir com o direito de participação dos administrados e o disposto no nº 7 do artigo 60º da LGT, não tem, a Administração, que levar a cabo toda a actividade de produção de prova e de averiguação de factos que lhe for requerida ou sugerida em audiência prévia. Desde logo, não lhe é exigível produzir prova relativamente a alegações de facto genéricas e ou de factos cuja relevância esteja prejudicada pelo que entender serem os pressupostos de direito do acto final do procedimento.

VII - A norma geral sobre a relevância e dedutibilidade dos custos ou perdas na determinação da matéria colectável do IRC extrai-se da conjugação do artigo 23º nº 1 com a alínea g) do nº 1 do artigo 42º do CIRC. Assim, tudo o que é necessário é que os custos tenham ocorrido, estejam devidamente documentados e tenham sido “comprovadamente” indispensáveis para a manutenção da fonte produtora.

VII – Não preenchem o pressuposto da indispensabilidade os custos mencionados em facturas apenas como pagamento de “serviços prestados de apoio a vendas de gás”, se na contabilidade do utilizador das facturas não houver qualquer documentação de que se possa extrair uma densificação deste conceito, suficiente para se conhecer a relação real e concreta com a manutenção da fonte produtora.*
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:N., LDA
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
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I - Relatório

N., LDA., NIPC (…), com sede em (…), interpôs recurso de apelação da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, proferida em 10/03/2016, que julgou improcedente a Impugnação Judicial por si deduzida contra os seguintes actos tributários:
a) Liquidação Adicional n° 2009 8310016325, no valor de € 3.959,99 de IRC do ano de 2005, acrescido de € 502,10 de juros compensatórios, totalizando € 4.462,09, emitida em 2009/08/24, na sequência da correcção meramente aritmética efectuada à matéria colectável declarada pela impugnante (Doc. n° 1 da PI);
b) Liquidação Adicional n° 2009 8310016354, do valor de € 3.960,00 de IRC do ano de 2005, acrescido de € 343,70 de juros compensatórios, totalizando € 4.303,70, emitida em 2009/08/24, na sequência da correcção meramente aritmética à matéria colectável declarada pela impugnante (Doc. n° 2 da PI),

Rematou a sua alegação com as seguintes conclusões:

CONCLUSÕES:
Iª As facturas (factos provados 3 e 4) emitidas por A. Lda. à Impugnante, resultam da prestação de serviços que a primeira daquelas empresas realizou para a segunda. Nas facturas que a AT não aceitou como gastos invocando que a descrição dos serviços não constitui uma denominação usual, foram descritos “serviços de apoio a vendas de gás (facto provado 5). Tais serviços foram executados pela testemunha P. dentro das horas de trabalho que como trabalhador dependente estava obrigado contratualmente a prestar à sua entidade patronal, a empresa A. Lda. Foi a A. Lda. que pagou as remunerações salariais ao referido funcionário durante o tempo em que este prestou os serviços à Impugnante. A testemunha explicou no seu depoimento a forma, o tempo, o modo e as circunstâncias e em que consistiu aquela prestação de serviços.
2ª A descrição dos serviços prestados a incluir na facturação em causa foi acordada pelas referidas empresas pela forma como se encontra traduzido nas facturas dos autos, bem como a quantidade, o preço unitário, o preço total e o valor do IVA a liquidar. A Administração Tributaria nunca questionou que o IVA incluído nas facturas em causa nestes autos, não estava bem liquidado.
3ª - A Impugnante pagou à A. Lda os serviços prestados pela testemunha P., que os facturou àquela, tal como consta do depoimento gravado da testemunha A., o contabilista certificado que presta serviços de contabilidade para a impugnante e também para a A.. Lda.
4ª - Como resulta dos autos (facto provado 9 - ponto 3, e que consta do anexo 4 do processo fiscal junto aos autos) existe uma conta corrente entre a A. Lda, e a Impugnante. Dessa conta corrente constam os encontros de contas, o encontro de contas corresponde à compensação a que se referem os artigos 847° e seguintes do Código Civil.
5ª- Quando duas pessoas sejam reciprocamente credor e devedor, qualquer destas pode livrar-se da sua obrigação por meio de compensação com a obrigação do seu credor, verificados os seguintes requisitos:
a) Ser o seu crédito exigível judicialmente e não proceder contra ele excepção, peremptória ou dilatória, de direito material;
b) Terem as duas obrigações por objecto coisas fungíveis da mesma espécie e qualidade.
Além destes requisitos resulta do corpo do n° l do artigo 847° do CC um outro, o da reciprocidade dos créditos, sendo este que justifica a compensação.
Sendo as partes, reciprocamente, credor e devedor, economizam-se com ela dois actos de cumprimento.
A compensação é uma forma de extinção das obrigações em que, no lugar do cumprimento, como sub-rogado dele, o devedor opõe o crédito que tem sobre o credor. Ao mesmo tempo que se exonera da sua divida, o compensante realiza o seu crédito, por uma espécie de acção directa (Pires de Lima e Antunes Varela in Código Civil Anotado, Vol. II 2ª edição, pág. 117). A compensação não obriga a fazer pagamentos, o saldo devedor é anulado com o saldo credor correspondente.
6ª - Nos anos em causa, tanto a Impugnante como a A., Lda. tinham, como aliás continuam a ter, a sua contabilidade organizada. Por isso, o Tribunal a quo deveria ter considerado verdadeiras e de boa fé nos termos legais as declarações da impugnante em sede de IRC e de IVA. O que, nem a AT nem o Tribunal "a quo" tiveram em consideração.
7ª - Se é verdade, como aliás o Tribunal a quo reconhece na sentença recorrida, (que) o disposto no artigo 36º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (CIVA) não se aplica em sede do IRC, também é verdade que, em parte alguma do PA e dos autos a AT provou que os gastos constantes das indicadas facturas não foram indispensáveis para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora dos rendimentos da Impugnante. E o ónus da prova aqui impende sobre a AT.
8ª Se, por um lado, os factos em causa nos autos admitem prova testemunhal, também é facto que nos termos e para os efeitos do disposto no n° 2 do art° 74° da Lei Geral Tributária, do Processo Fiscal de IRC e de IVA na posse da AT constam, arquivados em formato digital, documentos que constituem prova documental que o Tribunal a quo poderia (deveria e está obrigado pelo dever funcional de fazer justiça) ter consultado, caso entendesse que tal facto é essencial à decisão, designadamente, para provar o crescimento exponencial das vendas da impugnante desde o ano de 2003 em diante. O mérito desse trabalho é atribuído aos serviços prestados pela testemunha P., constantes das facturas em causa nos autos.
9ª - Do depoimento da testemunha P., cuja credibilidade e isenção foi expressamente reconhecida pelo tribunal na sentença, impunha-se uma decisão contrária à que foi proferida porquanto o próprio tribunal reconhece que os trabalhos que a testemunha P. efectuou para a Impugnante foram indispensáveis à realização dos rendimentos sujeitos a IRC.
10ª - Pelo que, em sede de IRC as facturas em causa deveriam ter sido aceites pela AT, e em consequência deveriam ter sido anuladas as liquidações adicionais de IRC impugnadas quanto aos anos de 2005 e 2006.
11ª - Na sentença ainda vem referido que a testemunha A. disse em julgamento que sabe apenas “... que o dr. P. é licenciado em gestão, é TOC, e fala fluentemente inglês e que ajudou na implementação do sistema informático'’. E quanto ao pagamento das facturas referiu apenas que “há encontro de contas entre os duas empresas porque umas são devedoras de outras. Ora, nos termos do disposto no artigo 847º n° 2 do CC. "se as duas dívidas não forem de igual montante, pode dar-se a compensação na parte correspondente”.
12ª - Consta também da sentença que, do depoimento da testemunha A., contabilista da Impugnante, não foi possível apurar se o valor constante das facturas foi pago. Esta testemunha referiu o encontro de contas, no entanto, esse encontro de contas em algum momento teve que gerar algum pagamento de uma empresa à outra. Ora, esta conclusão do tribunal recorrido não se subsume ao disposto no nº 2 do artigo 847º do CC. sendo certo que, a compensação entre as empresas pode revestir sempre aquele tipo de compensação da parte correspondente, não originando nunca qualquer pagamento, pelo menos, enquanto estas duas empresas forem simultaneamente clientes e fornecedores uma da outra como ainda acontece actualmente.
13ª - Estabelece o n° 1 do artigo 23º do CIRC que para a determinação do lucro tributável são dedutíveis todos os gastos e perdas incorridos ou suportados pelo sujeito passivo paro obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC. Pelo que, contrariamente ao entendimento do tribunal, devem as facturas em causa nos autos ser consideradas gastos da Impugnante para efeitos de IRC, não se revendo o Recorrente na tese defendida a quo quanto a este aspecto. Tanto mais que a AT não logrou fazer prova, como lhe competia, de que o Dr. P. não contribuiu de forma directa nem indirecta para a formação dos rendimentos da Impugnante e que, por isso, as facturas que foram emitidas pela A. Lda. deveriam ter sido aceites e consideradas como gastos fiscais da Impugnante.
14ª - Ainda que. o tribunal entendesse que a descrição constante das facturas (serviço de apoio as vendas de gás) não constituísse a denominação usual e habitual, estaria obrigada a fundamentar de facto e de direito tal questão. O que, como dela se alcança, não fez na sentença recorrida.
15ª - Neste processo estão em causa as liquidações adicionais de IRC, pelo que, neste processo não se aplica o disposto no artigo 36° do CIVA, sendo por isso admissível qualquer meio de prova quer quanto aos rendimentos quer quanto aos gastos. Apesar disso, o tribunal a quo não declarou nulas e de nenhum efeito para os efeitos legais as Liquidações Adicionais de IRC impugnadas. Por isso, não andou bem o tribunal a quo ao decidir como decidiu, pois, deveria ter considerado a compensação das contas das referidas empresas com base na conta-corrente, documento que se encontra nos autos no Anexo 4 do processo administrativo, o que não fez. Aliás, o tribunal o quo não percepcionou nem valorou tal realidade do conjunto de depoimentos prestados.
16ª - Por Isso, andou mal andou o tribunal (sic) ao não considerar a conta-corrente entre as empresas A. Lda e N. Lda. Não sendo as dívidas de igual montante, tal como resulta da conta-corrente constante do documento no Anexo 4 do processo administrativo, pode dar-se a compensação na parte correspondente, como resulta do artigo 647° n° 2 do Código Civil, norma que foi violada pela decisão recorrida.
17ª - 0 tribunal a quo deu como não provados os seguintes factos.
A) Nos anos de 2005 e 2006 as vendas da Impugnante aumentaram significativamente.
B) 0 Dr. P. foi também contratado pela sociedade comercial A. Lda" para prestar serviços pora a Impugnante na área da qualidade; segurança e desenvolvimento de novos produtos do sector do gás.
C) A sociedade comercial A. Lda e a Impugnante acordaram que suportaria a quantia anual de € 18.000,00 referente ao salário do Dr. P..
D) Os trabalhos referidos em 14) da matéria assente passaram a ser assegurados por um funcionário contratado pela Impugnante.
Não estamos, todavia, de acordo com o decidido a quo, porquanto, em sede de julgamento o tribunal não valorou diversos depoimentos das testemunhas, nomeadamente, das testemunhas P. e de A. (o contabilista certificado da Impugnante), que mereceram a credibilidade do tribunal.
18ª - Nos anos de 2005 e 2006 as vendas da Impugnante aumentaram significativamente, o que consta do próprio processo administrativo tributário da Impugnada (Direcção de Finanças de Viana do Castelo). Isto é, as declarações de IRC dos anos de 2005 e 2006 estão nos autos, e são demonstrativos (sic) desse facto. Nos termos do n° 2 do artigo 74° da LGT, conjugadamente com o dever funcional do tribunal de fazer justiça, a Impugnada tinha tudo ao seu alcance para considerar provado que as vendas da Impugnante aumentaram nos anos de 2005 e 2006, corroboradas pelos depoimentos das testemunhas, como adiante se indica. Além disso, as declarações dos contribuintes consideram-se verdadeiras, sendo este um dos princípios tributários.
19ª - Por essas razões, pelo facto de a AT não ter provado o contrário e tendo em conta a contabilidade organizada das duas referidas sociedades e ainda de que (sic) até prova em contrário as declarações dos contribuintes são verdadeiras, deveria o facto A), ter merecido o acolhimento do tribunal recorrido, que o considerou não provado. Os depoimentos das testemunhas P. e A. não foram levados em conta pelo tribunal o quo nesta matéria, que os não valorou, como deveria ter valorado, tal a sua credibilidade e isenção expressas na sentença.
20a - Impõe-se que ad quem a decisão seja revogada e modificada, e dê como provado o seguinte facto:
'Nos anos de 2005 e 2006 as vendas do Impugnante aumentaram significativamente"
21* - O tribunal recorrido deveria ter dado como provado que a testemunha P. foi também contratado pela empresa A. Lda. para prestar serviços para a Impugnante na área da qualidade, segurança e desenvolvimento de novos produtos do sector do gás. Porquanto, o facto de a AT não ter provado o contrário e tendo em conta a contabilidade organizada das duas sociedades em causa nestes autos e ainda de que, até prova em contrário as declarações dos contribuintes são verdadeiras e tanto mais que, dos depoimentos quer da testemunha P., quer do contabilista da Impugnante A., se retira o oposto do que o tribunal concluiu, depoimentos que o tribunal não valorou.
22ª - Por conseguinte, impõe-se que, ad quem se modifique o decidido, considerando-se provado o seguinte facto:
“O Dr. P. foi também contratado pelo sociedade comerciai A. Lda. para prestar serviços para a Impugnante na área da qualidade, segurança e desenvolvimento de novos produtos do sector do gás”.
23ª - Com apoio no que disse a testemunha A., e no facto de a AT não ter provado o contrário e tendo em conta a contabilidade organizada das duas referidas sociedades e ainda de que, (sic) até prova em contrário as declarações dos contribuintes são verdadeiras, o tribunal recorrido deveria ter considerado provado o facto não provado C).
24ª - Impõe-se. assim, que ad quem se modifique a resposta e se dê por provado o seguinte facto:
"A sociedade comercial A. Lda. e a Impugnante acordaram que esta suportaria o quantia anual de € 18.000,00 referente ao salário do Dr. P.."
25ª - Não resultam dúvidas nos autos, a avaliar pelos depoimentos das testemunhas A. e C., que após a saída da testemunha P. da Impugnante, do trabalho que este realizou e do know-how que trouxe para a empresa, foram contratadas mais 4 pessoas que antes não existiam no quadro da empresa.
26ª - Tendo em conta o facto da AT não ter provado o contrário, a existência de contabilidade organizada das duas sociedades em causa e ainda de que (sic), até prova em contrário as declarações dos contribuintes são verdadeiras, impõe-se seja modificada a decisão e seja considerado provado o seguinte facto:
"Os trabalhos referidos em 14) passaram o ser assegurados por 4 novos funcionários contratados pela Impugnante “
27ª - A AT não considerou os gastos das facturas em causa nos autos em sede do IRC da Impugnante dos anos de 2005 e 2006 e, consequentemente, emitiu à Recorrente as Liquidações Adicionais impugnadas em sede de IRC dos referidos anos; porém, aceitou que essas mesmas facturas (melhor dizendo os seus triplicados) fossem consideradas rendimentos em sede de IRC na sociedade A., Lda. nos anos de 2005 e 2006 em causa nos autos. O tribunal a quo não sopesou e não valorou os depoimentos da testemunha A., contabilista certificado da Impugnante, acabando por confirmar e por se conformar com a fundamentação do relatório final da fiscalização à Impugnante. A nosso ver, mal, pois deveria ter compreendido a realidade da empresa, deveria ter percebido que o trabalho da testemunha P. coincidiu com o período em que a Impugnante abriu horizontes e novas perspectivas, em parte resultantes das exigências da B., de quem é concessionária para a distribuição de gás (pelo menos) no distrito de Viana do Castelo, que passavam pela melhoria e certificação da qualidade dos serviços, e noutra parte resultante da abertura às novas tecnologias (uso da internet) a partir do ano de 2004 em diante. Não ver isto, é impedir que a Impugnante prove os factos A), B), C) e D), entre outros, que o tribunal considerou não provados.
28a - Por outro lado, quanto aos factos provados importa verter algumas considerações.
29ª - O tribunal a quo não põe em causa nenhuma das declarações prestadas pelo contribuinte no processo administrativo constantes do ponto 9 dos factos provados. Do processo administrativo, não existe qualquer prova que retirasse credibilidade à contabilidade organizada de ambas as sociedades, tanto à da Impugnante como à da A., Lda., a primazia da prova da sua contabilidade. A AT também não provou em parte alguma que os preços unitários e totais constantes das facturas impugnadas violavam o disposto sobre os preços de transferência, regulados pelo artigo 58° do CIRC vigente à data dos factos, actualmente o artigo 63° do CIRC. De facto, do processo administrativo nada consta que, tanto a A. Ida. como a N. Lda, não tivessem a contabilidade organizada, o que também não foi valorado, para efeitos da inversão do ónus da prova, como deveria ter sido na sentença a quo (sic).
30ª - Pelo que, a contabilidade das empresas deveria ter feito fé em tribunal para os efeitos do disposto no artigo 81° n° 1 da LGT. O tribunal não levou em consideração que era a Impugnada - a Direcção de Finanças de Viana do Castelo - quem tinha de fazer a prova de que os serviços não eram indispensáveis á formação do rendimento da impugnante nos anos de 2005 e 2006. A não entender-se assim, foi violado o disposto nos artigos 81° n° 1 e 75° n° 1 ambos da Lei Geral Tributária/LGT. Ao não considerar-se os gastos fiscais, como o fez a Direcção de Finanças de Viana do Castelo, conclui-se que a testemunha P. andou a trabalhar de borla para a Impugnante. O que não corresponde à verdade dos factos em mérito.
51a - Nem do processo administrativo nem da prova produzida em sede de audiência de julgamento resultou qualquer prova que pusesse em causa as declarações do contribuinte quando ouvido em termo de declarações a 16/05/2009, cujas declarações constam do ponto 8. dos factos provados. A decisão a quo viola o disposto no n° 1 do artigo 75° da LGT, que diz que "presumem-se verdadeiras e de boa fé as declarações dos contribuintes apresentados nos termos previstos na lei bem como os dados e apuramentos inscritas na sua contabilidade ou escrito, quando estas estiverem organizados de acordo com a legislação comercial e fiscal.
32ª - Dos factos provados em 9 e 10 da sentença apenas se reconhece que dos mesmos consta o que lá se encontra escrito, como resulta do texto inicial de cada ponto. Porque quanto à fundamentação retirada do relatório fiscal de avaliação e considerada como facto provado, a Recorrente não sustenta a tese da douta sentença a quo, em oposição com os fundamentos do recurso.
33a - Está-se de acordo quanto ao facto de nos presentes autos não se apreciar a impugnação para efeitos de IVA, por não ser a sede própria. Porém, quanto à questão da aplicação do disposto no art° 23°, n° 1, alínea b) do CIRC, tudo indica que o Tribunal, o quo não teve em conta a versão do artigo vigente à data dos factos que se transcreve:
"1 - Consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposta ou para a manutenção da fonte produtora, nomeadamente os seguintes:
b) Encargos de distribuição e venda, abrangendo os de transportes, publicidade e colocação de mercadorias;
Assim, da conclusão do fundamentado na sentença quanto a este ponto parece resultar que o eventual não cumprimento pela Impugnante das formalidades previstas no artigo 35° nº 5 alínea b) do CIVA não foi levado em consideração pela AT para atender à desconsideração das facturas em sede de IRC. Daí o tribunal a quo não ter apreciado a questão, por se tratar de matéria de IVA e não estar em causa nestes autos. É isto Que a Impugnante retira da fundamentação da sentença.
34ª - O tribunal a quo considera que não se verifica o vicio de falta de fundamentação invocada pela Impugnante quanto ao relatório final da fiscalização. Porém, entendemos que se verifica obscuridade e contradição quanto ao facto de os peritos da fiscalização reconhecerem a escrita comercial da sociedade A., Lda., nomeadamente, que as facturas em causa dizem respeito a serviços prestados de apoio às vendas de gás à Impugnante, mas não corrigiram para menos a matéria colectável em sede de IRC e de IVA dos anos de 2005 e de 2006 daquela sociedade a A., Lda.
35ª - Já em relação à escrita da Impugnante e às mesmas facturas em causa, os peritos alegam que não conseguem identificar os serviços de apoio às vendas de gás debitados, sem, contudo, identificarem quais foram os trabalhos de validação substantiva que executaram para fundamentar tal conclusão. Ora, sempre se deveria ter levado em conta que os trabalhos de validação substantiva de tais serviços, foram executados 3 a 5 anos antes do início da fiscalização, e como se alcança das declarações das testemunhas A., C. e P., revestiram trabalho intelectual e imaterial da testemunha P..
36ª - Não basta para o Tribunal a quo nem para o contribuinte que o Inspector Tributário afirme no seu Relatório de Fiscalização/RF que não conseguiu identificar os serviços constantes das facturas em causa nos autos. Sempre seria necessário que o inspector tivesse plasmado no Relatório quais os procedimentos, os trabalhos de campo e os testes analíticos e substantivos que efectuou que permitem afirmar (como afirmou) sem qualquer fundamentação de facto, que não conseguiu identificar os serviços prestados de apoio às vendas de gás à Impugnante pela A. Lda.
37ª - O tribunal a quo aceitou sem sindicar a fundamentação de facto da afirmação segundo a qual o inspector não conseguiu identificar os serviços prestados de apoio às vendas de gás, e pior ainda, utilizou-a para fundamentar a sua decisão final. Por estes motivos, a Impugnante entende que quanto a esta questão, não só o RF como também a sentença recorrida, padecem de falta de fundamentação por obscuridade, incompletude e contradição.
38ª - Esta, a dualidade de critérios revela contradição e falta de objectividade da fundamentação, e viola o disposto na alínea b) do n° 1 do artigo 23° do C1RC na redacção vigente à data dos factos, no artigo 77° da Lei Geral Tributária (LGT) e no artigo 124º do CPA. Na medida em que, os mesmos factos só podem assumir uma, e uma só realidade jurídica e tributária, quer na escrita da Impugnante quer na escrita da sociedade A., Lda. A afirmação do inspector no RF de que não conseguiu identificar os serviços prestados de apoio às vendas de gás não está fundamentada de facto porquanto não revela os trabalhos de auditoria que realizou nem o raciocínio lógico conclusivo de tal afirmação, tanto mais a notória dificuldade inerente à prova da realização de trabalho intelectual realizado 3 a 5 anos antes da fiscalização. Pelo que, o relatório final revela contradição e obscuridade na sua fundamentação, o que deve entender-se para efeitos da verificação do invocado vicio de falta de fundamentação.
39ª - A sentença recorrida sofre do vício de violação do dever de colaboração a que se refere o artigo 48° nº 1 da IGT. A Recorrente entende que o dever de colaboração não impende apenas sobre o contribuinte nas relações fiscais, havendo uma reciprocidade do dever de as partes colaborarem no seu relacionamento tributário. Como consta do facto provado 8, a Direcção de Finanças de Viana do Castelo não colaborou com a impugnante na questão da denominação dos serviços de apoio à venda de gás descrita nas facturas em causa para efeitos de correcção. Essa falta de colaboração revela apenas que, denominação usual é um conceito vago e abstracto não existindo nenhuma lei fiscal que imponha qualquer nível de concretização dos serviços prestados como parece que o Inspector Tributário e o Tribunal a quo pretendem. Em direito fiscal, o que não é vedado é permitido. Quer a AT quer o Tribunal a quo deveriam ter aceite tudo quanto sobre esta questão a Impugnante debitou no seu requerimento para o exercício 6o direito de audição prévia. Porque a Impugnante, na altura, pediu sem sucesso, à Direcção de Finanças de Viana do Castelo, como resulta dos autos, que lhe fosse indicada a denominação que deveria ser utilizada para proceder as correcções das facturas em causa nos termos do disposto no artigo 78° do OVA e para efeitos futuros. Os peritos, porém, resguardaram se na circunstância de não terem sido capazes de identificar os serviços, e não procuraram investigar nem justificaram o que é que os impedia de investigar melhor para saber mais. Aqui o ónus da prova é da AT, e não resulta dos autos qualquer prova nesse sentido. Por essas razões, a sentença recorrida errou ao decidir como decidiu, e devia ter julgado procedente o vício de violação da lei, nomeadamente, o disposto no artigo 48° da LGT.
40ª - Os peritos do relatório de fiscalização não investigaram nem apuraram ou identificaram antes nem depois do direito de audição prévia quanto à Impugnante:
a) O aumento das margens de comercialização dos produtos da Impugnante;
b) As vendas de novos produtos, que em anos anteriores não eram comercializados pela Impugnante, tais como os painéis solares e os painéis fotovoltaicos, entre outros que foram introduzidos no giro da empresa;
c) Quais os serviços prestados pela A. Lda. à Impugnante (através da testemunha P.) no apoio ao gás que foram realizados durante os anos de 2005 e 2006 (anos a que se referem as facturas em causa);
d) Os serviços que foram prestados pela A. Lda. à Impugnante, cujas empresas se complementam por causa do negócio da venda de gás, quanto à certificação do processo de qualidade exigido pela B., da qual é concessionária a Recorrente.
Todos estes elementos novos foram invocados e estão no direito de audição prévia que a Recorrente exerceu por escrito, como se alcança do processo administrativo na AT e junto aos autos. Porém, nenhum destes factos foi levado em consideração no relatório final como elementos novos invocados no direito de audição prévia, como da sua leitura se alcança. Tanto mais que, se o Inspector Tributário tivesse auditado aqueles factos, sempre poderia identificar pelo menos os efeitos que tais serviços de apoio às vendas de gás originaram na estrutura económica e financeira da Recorrente, podendo facilmente subentender e concluir pela existência de tais serviços. Pelo que, ao declarar a improcedência do vício a que se refere o disposto no artigo 60° n° 7 da LGT, a sentença recorrida não andou bem, o que deverá ser considerado ad quem.
41ª A questão de saber se deve ser aceite como custo fiscal para efeitos de IRC os serviços (sic) a que se referem as facturas desconsideradas pela Autoridade Tributária abrange a correcção da matéria tributável para efeitos de IRC, atendendo à desconsideração pela AT dos custos a que se refere a prestação de serviço elencada nas facturas referidas nos pontos 3 e 4 dos factos provados. A sentença recorrida confirmou o relatório final, o qual. padece de falta de fundamentação de facto, quando afirma que não conseguiram identificar os serviços prestados de apoio á vendas do gás e declarou que os custos foram bem desconsiderados para efeitos de IRC
42ª Os peritos da Direcção de Finanças do Distrito de Viana do Castelo não aceitaram como custos fiscais 6 (seis) facturas que a Recorrente escriturou na contabilidade durante o ano de 2005, assim identificadas:
o) Nº 20050742, de 30/04/2005, do valor de € 43 000,00 acrescido de € 570, 00 IVA.
b) N° 20051054, de 27/06/2005, do valor de €3 000,00 acrescido de 4 570,00 IVA
c) N° 20051311, de 30/07/2005, do valor de €3 000,00 acrescido de € 630,00 IVA
d) Nº 20051483, de 31/08/2005, do valor de € 3.000.00 acrescido de 4 630,00 IVA
e) Nº 20051598, de 26/09/2005, do valor de €3 000.00 acrescido de € 630.00 IVA
f) N° 20051792, de 25/10/2005, do valor de €3 000,00 acrescido de € 630,00 IVA.
Estas facturas estão relacionadas com a prestação de serviços de apoio a vendas de gás que ascendeu no ano de 2005 ao valor de €18.000,00, acrescido de € 3 660,00 de IVA à taxa legal. Este valor de € 18.000,00 foi acrescentado pela Direcção de Finanças de Viana do Castelo à matéria tributária declarada pela Impugnante em sede de IRC do ano de 2005, o que originou as seguintes liquidações adicionais.
- N° 2009 8310016325, aqui impugnada, do valor de € 3 959,99, acrescido ainda de € 502,10 de juros compensatórios, no valor total de € 4.462,09.
- Nº 09135316 do valor de €1.240.00. do período 0506T (de IVA):
- Nº 09135318 do valor de € 1.890.00. do período 05097 (de IVA): e,
- N° 09135320 do valor de €630.00, do período 0512T (de IVA).
43ª - As liquidações adicionais de IVA foram impugnadas pela Recorrente nos autos de processo de impugnação nº 1645/09 9BEBRG da Unidade Orgânica 2 deste Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, que se encontra em fase de recurso.
44a - Os Peritos da acção de fiscalização não aceitaram ainda como custos fiscais 3 facturas que a impugnante escriturou na sua contabilidade durante o ano de 2006, relativas ao referido contrato de prestação de serviços de apoio a vendas de gás, que ascendeu no ano de 2006 ao valor de €18.000,00, acrescido de € 3780,00 de IVA à taxa legal, a seguir identificadas:
a) N° PT060892, de 31/05/2006, do valor de € 2.250,00 acrescida de € 472,50 IVA.
b) Nº PT061028, de 30/06/2006, do valor de € 2 250,00 acrescida de € 472,50 IVA.
c) N° PT062171, de 29/12/2006. do valor de € 13.500,00 acrescida de € 2.835,00 IVA.
O referido valor de € 18.000,00 foi igualmente acrescentado pela Direcção de Finanças de Viana do Castelo à matéria tributária declarada pela Impugnante em sede de IRC do ano de 2006, e deu origem às seguintes liquidações adicionais:
- Nº 2009 8310016354 do valor de € 3.960,00 de IRC do ano de 2006, acrescido de € 343,70 de juros compensatórios, totalizando €4,303,70.
- N® 09135322, do montante de € 945,00, do período 0606T (de NA).
- N° 09135324, do montante de € 2 835,00 do período 0612T (de NA).
45ª - Todas as facturas preteritamente descritas nas conclusões 42ª e 44ª facturas (SIC) foram emitidas à Recorrente nos anos de 2005 e de 2006 pelo sujeito passivo de IVA, A., Lda. Nos anos de 2005 e de 2006 a Impugnante estava registada como sujeito passivo de NA, com direito a deduzir o imposto devido ou pago pela aquisição de bens e serviços a outros sujeitos passivos - alínea a) do nº 1 do artigo 19º do CIVA. A sociedade A., Ida. declarou no modelo 22 de IRC do ano de 2005 a matéria colectável de € 11.587,93. E a Impugnante declarou no modelo 22 de IRC do ano de 2005 a matéria colectável de € 474.4S7,49. A sociedade A.. Lda. declarou no modelo 22 de IRC do ano de 2006, a matéria colectável de € 11.867,62. E a Impugnante declarou no modelo 22 de IRC do ano de 2006 a matéria colectável de € 420,529,51. Todas as identificadas facturas contém a "denominação usual" dos serviços prestados, tal como exige a alínea b) do n° 5 do artigo 35º do CIVA e alínea b) do n° 1 do artigo 23° do CIRC. Normas que, contrariamente ao entendimento da Direcção de Finanças de Viana do Castelo, não exigem a discriminação concreta dos serviços prestados.
46ª Além da denominação usual dos serviços prestados, todas as referidas facturas contêm também a quantidade, a especificação dos elementos necessários à determinação da taxa de IVA aplicável e os demais elementos exigidos pelas leis tributárias, nomeadamente, pelo artigo 35° do CIVA, na redacção vigente à data dos factos, que são indispensáveis, quer para a determinação da taxa do IVA, quer para a sua consideração como custos fiscais em sede de IRC.
47ª - A Recorrente tem o direito a deduzir o 1VA devido ou pago por aquelas aquisições de bens e serviços a que se referem todas as facturas acima descritas. Assim como tem o direito a deduzi-las às matérias tributáveis de IRC dos anos de 2005 e 2006 como custos ou gastos fiscais, por terem sido indispensáveis para a formação dos rendimentos e para a manutenção da fonte produtora dos seus rendimentos nos citados anos. As prestações de serviços em causa estão devidamente documentadas de acordo com o CIVA e com o CIRC
48ª - As liquidações adicionais de IRC dos anos de 2005 e 2006 violam o disposto na alínea b) do nº 1 do artigo 23° e a alínea g) do n° 1 do artigo 41° do CIRC na redacção vigente à data dos factos. As liquidações adicionais de IVA preteritamente descritas dos anos de 2005 e de 2006 são ilegais, por violarem o disposto na alínea b) do n° 5 do artigo 35° e na alínea a) do n° 1 do artigo 19º ambos do CIVA, na redacção vigente à data dos factos.
49ª - Como se alcança do auto de declarações no âmbito do processo de fiscalização, o gerente da Recorrente prestou genericamente todos os esclarecimentos aos peritos sobre o conteúdo daquele contrato de avença por serviços prestados no apoio as vendas de gás. Ao mesmo tempo, foi corrigido para menos o valor da avença anual de € 18 000.00 das matérias tributarias em sede de IRC e de IVA da sociedade A.. Lda. em cada um dos anos de 2005 e 2006.
50ª - Os Peritos alegam no relatório da inspecção tributaria que não conseguiram identificar os serviços de apoio às vendas do gás. Em consequência disso, consideraram que as facturas eram simuladas, e que não existe nem nunca existiu o contrato de prestação de serviços entre as referidas sociedades, que consistiu na prestação de serviços realizada nos anos em causa (2005 e 2006) pela testemunha P.. Esta conclusão do relatório de fiscalização deu origem a um conjunto de procedimentos tributários que se abateram e agravaram sobre a Recorrente.
51ª - Na escrita comercial da sociedade A., Lda os peritos reconhecem que as facturas em causa dizem respeito a serviços prestados de apoio às vendas de gás à Recorrente, mas não corrigiram para menos a matéria colectável em sede de IRC e de IVA dos anos de 2005 e de 2006 daquela sociedade. Em relação à escrita da Recorrente e às mesmas facturas em causa, os Peritos já alegam que não conseguem identificar os serviços de apoio ás vendas de gás debitados. Esta dualidade de critérios revela contradição e falta de objectividade da fundamentação do relatório e viola o disposto na alínea b) do nº 1 do artigo 23º do CIRC na redacção vigente à data dos factos, no artigo 77° da lei Geral Tributária (LGT) e no artigo 124° do CPA. Na medida em que, os mesmos factos sô podem assumir uma e uma só realidade jurídica e tributária, quer na escrita da Recorrente, quer na escrita da sociedade A. Lda. O que não acontece quanto as Las (sic) de IRC que foram impugnadas nos autos.
52ª - Mesmo que a descrição utilizada pela sociedade A., Lda, nas facturas em causa ("serviços prestados de apoio nos vendos de gás" para descrever os serviços prestados) não correspondesse à "denominação usual", os Peritos sempre deveriam ter informado aquela sociedade sobre a denominação usual adequada, ainda que indicativamente, de modo a permitir a sua correcção.
53ª - 0 tribunal a quo afirma na sentença que a Impugnante não apresentou documentos como querendo dizer, sem, contudo, fundamentar de direito, que os factos em causa nos autos apenas admitem prova documental. Porém, em sede de IRC, os factos dos autos admitem prova testemunhal que a Impugnante entende ter sido feita. Dos documentos constantes do PA também se conclui que não assiste razão à AT para não considerar gastos em sede de IRC da Impugnante as facturas em causa nos autos. Por outro lado, do Processo Administrativo constam as declarações prestadas pelo gerente da Impugnante em auto de declarações que a AT não provou serem falsas, parcial ou totalmente. Na sentença, o tribunal a quo também não teve em conta tal facto documentado no PA junto aos autos. É notório que do processo fiscal da Impugnante junto aos autos constam, nos termos e para os efeitos do disposto no n° 2 do artigo 74° da IGT, todos os documentos relevantes para que o tribunal a quo pudesse interpretar e integrar os depoimentos das testemunhas. 0 tribunal não teve em consideração que a contabilidade da Impugnante estava organizada e que nunca foi posta em causa pela AT, o que faz prova plena em juízo.
54ª - Em consequência, o ónus da prova cabe à AT, a qual não logrou provar que o Dr. P. não prestou os serviços constantes das facturas em causa, apesar de o tribunal o puo ter entendido opostamente. 0 tribunal recorrido ao entender que, em caso de dúvida fundamentada sobre a relação justificativa de uma determinada despesa com a actividade do sujeito passivo o ónus da prova compete ao contribuinte, violou o princípio do ónus da prova dos sujeitos passivos com contabilidade organizada {como é o caso da Impugnante).
55ª - Ainda que assim ad quem se (não) entenda, sempre da prova documental junta ao processo administrativo que correu termos na Direcção Distrital de Finanças de Viana do Castelo, também nos autos, a que a acresce a prova produzida em audiência de julgamento, resultam todos os dados suficientes para que se entenda a operação económica posta em causa, isto é, os serviços que A. Lda. prestou à Recorrente de apoio às vendas de gás.
56ª - Existindo dúvidas sobre a existência ou não do facto tributário, o tribunal a quo estava vinculado a decidir a favor da Impugnante, tal é o princípio da lei fiscal. Perscrutados os autos, não vislumbramos, onde o ónus da prova impenda sobre a AT, que esta tenha utilizado para a sua avaliação final, meios de suporte idóneos segundo a experiência comum e segundo critérios de avaliação razoáveis e normais para chegar, como também chegou a sentença recorrida, à desconsideração dos custos. Nomeada mente, quanto ao facto essencial de se afirmar no Relatório Fiscal tout court que não foi possível identificar os serviços prestados de apoio ás vendas de gás.
57ª - A desconsideração dos custos pela AT, e pela sentença recorrida, utiliza de um lado, a validação das escritas comerciais da Recorrente e da empresa que prestou os serviços à Impugnante (A. Lda). E em contradição, desconsidera, do outro lado, os custos fiscais entendendo que os serviços não foram prestados por se tratar de uma simulação, com os fundamentos de que as sociedades são próximas (é público que existem inúmeros casos de empresas de sucesso no País com características semelhantes ás das referidas empresas), que foram entregues vários emails em inglês e mais uns relatórios de qualidade junto dos clientes que não foram compreendidos, e que a facturação dos serviços em causa só foi efectuada durante um lapso de tempo específico (Abril de 2005 a Dezembro de 2006), sendo que antes e depois dessas datas, não foram prestados quaisquer tipo de serviços relacionados com aqueles, o que causou estranheza na AT. Este tipo de critérios não pode ser ad quem considerado como normal e razoável, assim como a prova que impendia sobre a AT não pode, de modo algum, ser julgada coerente e legal no seu conjunto.
58ª - As testemunhas P. {a pessoa que materializou a prestação dos serviços de apoio à venda de gás), A. (o contabilista certificado da Recorrente, e que lhe presta serviços de contabilidade desde o seu início de actividade) e C. (funcionaria administrativa) depuseram de forma isenta e credível e complementaram a prova documental relativamente ao impugnado.
59ª - O tribunal a quo não se pronunciou, fundamentando de facto e de direito, tal como fez a AT na resposta ao exercício do direito de audição prévia, qual a razão pela qual a descrição constante das facturas (serviços de apoio as vendas de gás) não constitui uma denominação usual dos bens transmitidos ou dos serviços prestados, tanto mais que, em direito fiscal, o que não é vedado é permitido, e a lei não regula nem identifica as descrições dos bens e serviços que devem constar das facturas. Aliás, esta foi a argumentação que o inspector tributário invocou no relatório final para desconsiderar as facturas, mas não provou que os trabalhos em causa não foram realizados.
60ª - O tribunal a quo não levou em conta o que as testemunhas arroladas pela Impugnante disseram, cujos depoimentos se transcrevem integralmente e se anexam ao recurso. Pelo exposto, verifica-se erro de julgamento da matéria de facto, uma vez que o tribunal a quo na interpretação que faz dos factos em mérito também errou de direito, ao decidir como decidiu.
61ª - Consequentemente, para os efeitos do disposto no artigo 640° do NCPC:
a) Os factos provados 9 a 10 da sentença recorrida, que a nosso ver foram incorrectamente julgados, devem ser declarados não provados, com as legais consequências
b) Os factos não provados A, B. C e D da sentença recorrida, que a nosso ver foram julgados incorrectamente, devem ser declarados provados, impondo se que ad quem a decisão seja modificada, devendo os factos que se entendem deverem ser julgados provados passar a ter a seguinte redacção
A)
Nos anos de 2005 e 2006 as vendas da Impugnante aumentaram significativamente."
B)
“0 Dr. P. foi também contratado pela sociedade comercial A. Lda. para prestar serviços paro a Impugnante na área da qualidade segurança e desenvolvimento de novos produtos do sector do gás."
C)
“A sociedade comercial A. Lda. e a Impugnante acordaram que esta suportaria a quantia anual de €18.000.00 referente ao salário do Dr. P.
D)
"Os trabalhos referidos em 14) passaram a ser assegurados por 4 novos funcionários contratados pela Impugnante
c) Modificando-se a decisão proferida a quo sobre os factos provados e não provados, conforme as alíneas a) e b) da presente conclusão, deve ser proferida decisão ad quem sobre as questões de facto impugnadas em conformidade com todas as conclusões anteriores, no sentido do merecimento e da procedência do recurso.
d) Os meios probatórios Invocados como fundamento de erro na apreciação das provas foram gravados, tendo a Recorrente indicado com exactidão as passagens da gravação em que se funda o recurso com transcrição dos excertos que considera relevantes para a modificação da decisão a quo.
62ª - Em consequência de toda a fundamentação, deve o recurso merecer provimento, revogando-se ad quem a sentença recorrida no sentido das respectivas conclusões.

Notificada, a Fazenda Pública não respondeu à alegação.

O Digníssimo Procurador-geral Adjunto neste Tribunal teve vista no processo e emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso, do qual se transcreve o seguinte:
«(…)
II- Das conclusões resulta que, em sede de recurso, alega erro no julgamento da matéria de facto e erro na aplicação do direito
III- Da análise da sentença recorrida parece-nos que o recurso não merece provimento.
- A audição dos interessados destina-se a permitir a sua participação nas decisões que lhes dizem respeito, contribuindo para um cabal esclarecimento dos factos e uma mais adequada e justa decisão art° 60° da LGT e 45° do CPPT.
Por por (sic) força do n° 3, do art° 60 da LGT é dispensada nova audição antes da liquidação, se o contribuinte tiver sido anteriormente ouvido em qualquer das fases do procedimento a que se referem as alíneas b) a e) do n°1.
Como bem discorre e se pronunciou a douta sentença, analisado o relatório inspectivo constata-se que claramente a AT teve em conta os argumentos usados pela recorrente no exercício do direito de audição.
-Da ilegalidade da desconsideração dos custos
A impugnante foi sujeita a uma inspecção tributária versando o IRC dos anos de 2005 e 2006, sendo efectuadas correcções meramente aritméticas.
Em resultado dessa inspecção a AT concluiu existirem custos não indispensáveis, segundo a previsão do art° 23 do CIRC.
Nos termos do disposto no artigo 23.° n.°1 do CIRC, consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora.
Consideram-se gastos fiscalmente dedutíveis, nos termos do artigo 23.° e 34.° do CIRC, os gastos contabilísticos suportados pelas empresas e indispensáveis à realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou à manutenção da fonte produtora.
Integram esta categoria os que preenchem um conjunto de requisitos gerais necessários à dedutibilidade fiscal dos gastos, dos quais se destacam a comprovação material dos gastos realizados, a indispensabilidade dos gastos, a conexão dos gastos aos ganhos sujeitos a imposto e a efectividade dos gastos realizados.
A AF, no exercício da sua competência de fiscalização verifica a conformidade da actuação do contribuinte com a lei, actuando no uso de poderes vinculados submetida ao princípio da legalidade, cabendo-lhe a prova da verificação dos pressupostos que a determinaram a efectuar as correcções técnicas que suportam a liquidação.
Tem, assim, a A.T. o ónus de demonstrar a factualidade que a levou a desconsiderar um custo contabilizado, factualidade que tem de ser susceptível de abalar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte, atento o princípio da veracidade da declaração do contribuinte ínsito no art° 75° da LGT, só então passando a competir ao contribuinte o ónus de prova de que as operações se realizaram efectivamente.
Diz Vieira de Andrade, in Justiça Administrativa (Lições), “em contrapartida, caberá ao administrado apresentar prova bastante da ilegitimidade do acto, quando se mostrarem verificados esses pressupostos. “
No caso, porém, da prova da indispensabilidade dos custos, porque não está em causa a sua veracidade no que respeita à sua efectivação e montante, mas sim a comprovação do requisito legal da indispensabilidade, é ao contribuinte que cabe o ónus da prova da indispensabilidade para a obtenção dos proveitos ou manutenção da fonte produtora das verbas contabilizadas como custos fiscalmente dedutíveis.
(…)
Importa, pois, averiguar se a impugnante satisfez, como se impunha, os requisitos da prova necessários à afirmação dos pressupostos da consideração dos custos como custos fiscalmente dedutíveis, isto é, saber se esses custos se enquadram no conceito de custos, fiscalmente, dedutíveis do artigo 23° n.1 do CIRC e a comprovação desse requisito legal compete ao contribuinte, nos termos do disposto no artigo 342.° do C.Civil.
Ora não existe contrato escrito relativo aos serviços alegadamente prestados pela A., Lda, nem prova de meios de pagamento, sendo as próprias facturas muito vagas e se atentarmos no depoimento das testemunhas apresentadas pela impugnante constata-se também ser o mesmo vago e insuficiente bastando-se com Sim, Não, Hum hum. Tal como entendeu a AT e decidiu a douta sentença parece-nos que a impugnante não logrou demonstrar a existência de nexo causal da indispensabilidade dos custos que fez constar da declaração de rendimentos na realização dos proveitos e ou para a manutenção da fonte produtora.
Terão, pois, de acrescer à matéria colectável em sede de IRC.
Na verdade, competia à Impugnante provar que as despesas incorridas se revelavam essenciais para o exercício da actividade.
Também quanto ao ónus da prova resta-nos referir que à AT não cabia fazer prova directa da dispensabilidade dos custos, tendo, porém, abalado de modo devidamente fundamentado a presunção de veracidade da declaração do contribuinte.
Nos termos do art° 75.° da LGT, presumem-se verdadeiras e de boa fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal.
Porém, essa presunção não se verifica quando as declarações, contabilidade ou escrita revelarem omissões, erros, inexactidões ou indícios fundados de que não reflectem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo.
Como devidamente fundamenta a sentença, a recorrente não apresentou factos ou elementos capazes de contrariar a factualidade apurada.
A sentença a nosso ver ponderou as questões que lhe foram submetidas, a prova apresentada, especificando correctamente os meios de prova atendidos e o direito aplicável.
Pelo exposto, emitimos parecer no sentido da improcedência do recurso com manutenção da sentença recorrida.»

Dispensados os vistos, nos termos do artigo 657º nº 4 do CPC, cumpre apreciar e decidir.

II- Enunciação das questões a decidir

Conforme jurisprudência pacífica, o âmbito do recurso é delimitado pelo objecto das conclusões das alegações, interpretadas, como é lógico, em função daquilo que se pretende sintetizar, isto é, o corpo das alegações.

São de Hércules, os trabalhos de sistematização e síntese necessários para organizar e reduzir a questões essenciais umas “conclusões” de recurso como aquelas que aqui nos cabe conhecer. Com efeito trata-se de 61 conclusões que só nominalmente o são, desproporcionadamente extensas e repetitivas, expostas numa desarrumação sistemática que potencia os inconvenientes da prolixidade.

Parece-nos, contudo, que as questões colocadas a este tribunal de recurso são as seguintes:

1ª Questão
Padece, a sentença recorrida, de insuficiência de fundamentação em matéria de facto na medida em que assenta na consideração de facto de que a descrição dos trabalhos facturados (“serviço de apoio às vendas de gás”) não constitui denominação usual e habitual, mas não fundamenta essa afirmação, com o que viola os artigos 23º al b), 77º da LGT e 124º do CPA?

2ª Questão
Padece, a sentença recorrida, de insuficiência de fundamentação em matéria de facto, por aceitar acriticamente e usar como fundamento seu a infundamentada afirmação do RIT, de que não se consegue identificar os serviços prestados, de apoio às vendas de gás, com o que viola os artigos 23º a b), 77º da LGT e 124º do CPA?

3ª Questão
Errou, a sentença recorrida, em matéria de facto, ao laborar no entendimento de que impendia sobre a Impugnante o ónus de provar a veracidade do objecto das facturas emitidas pela “A. Lda” e identificadas e descritas no RIT e a sua indispensabilidade à formação do rendimento, uma vez que ela tinha a sua contabilidade organizada e não foi provado qualquer facto que lhe retirasse credibilidade, pelo que se presumia verdadeiro e de boa fé tudo o declarado pela Impugnante, conforme artigos 75º nº 1 e 81º nº 1 da LGT?

4ª Questão
Errou, a sentença recorrida, no julgamento em matéria de facto, ao dar como não provados os factos como tais enunciados de A a D, que deviam ter sido dados como provados nesses precisos termos, e ao dar como provados os factos como tal enunciados sob os nº 9 e 10?

5ª Questão
Errou, a sentença recorrida, no julgamento de direito, ao não julgar ser obscura, por contraditória, a fundamentação do RIT, que não explica por que reconhece as facturas na escrita da A. Lda (como proveitos) mas já não na escrita da Impugnante (como custos)?

6ª Questão
Errou de direito, a sentença recorrida, por não ter julgado procedente a alegação de violação, pela AT, do dever de colaboração com o contribuinte, expresso no artigo 48º nº 1 da LGT, por aquela não ter satisfeito o pedido feito pela Impugnante, em sede de audiência prévia, de lhe ser indicada a denominação dos serviços a apor em facturas de substituição das “não aceites”, nos termos e para os efeitos do artigo 78º do CIVA?

7ª Questão
Errou, no julgamento direito, a sentença recorrida, ao julgar improcedente a alegação do artigo 60º nº 7 da LGT (obrigatoriedade da consideração dos elementos novos suscitados em audiência prévia), já que os peritos da AT, após a pronúncia prévia da Impugnante, “não investigaram nem apuraram ou identificaram:
a) O aumento das margens de comercialização dos produtos da Impugnante;
b) As vendas de novos produtos, que em anos anteriores não eram comercializados pela Impugnante, tais como os painéis solares e os painéis fotovoltaicos, entre outros que foram introduzidos no giro da empresa;
c) Quais os serviços prestados pela A. Lda. à Impugnante (através da testemunha P.) no apoio ao gás que foram realizados durante os anos de 2005 e 2006 (anos a que se referem as facturas em causa);
d) Os serviços que foram prestados pela A. Lda. à Impugnante, cujas empresas se complementam por causa do negócio da venda de gás, quanto à certificação do processo de qualidade exigido pela B., da qual é concessionária a Recorrente.”

8ª Questão
Errou de direito, a sentença recorrida, violando, designadamente, os artigos 23º nº 1 alª b) e 41ª nº 1 alª g) do CIRC, ao julgar as facturas em causa desconsideráveis para efeitos de IRC, apesar de elas terem todas as menções essenciais para esse efeito?

III - Apreciação do objecto do recurso
A fundamentação da sentença recorrida em matéria de facto é a seguinte:

Com importância para a decisão da causa, estão provados os seguintes factos:
1) A Impugnante iniciou a sua actividade em 01 de Junho de 1993 e desenvolve como actividade principal a actividade de comércio por grosso de produtos petrolíferos (CAE 46711) que se consubstancia na venda de combustíveis gasosos, nomeadamente, gás em botija - cfr. fs. 7 e 46 do PA;
2) A Impugnante comercializa também acessórios e equipamentos relacionados com a instalação de sistemas de gás e diversos óleos e lubrificantes - cfr. fls. 46 do PA;
3) No ano de 2005, a sociedade comercial “A., Lda.” emitiu as seguintes facturas à Impugnante:
DataNúmeroValor s/ IVAIVATOTAL
30-04-200520050742€ 3.000,00€ 570,00€ 3.570,00
27-06-200520051054€ 3.000,00€ 570,00€ 3.750,00
30-07-200520051311€ 3.000,00€ 630,00€ 3.630,00
31-08-200520051483€ 3.000,00€ 630,00€ 3.630,00
26-09-200520051598€ 3.000,00€ 630,00€ 3.630,00
25-10-200520051792€ 3.000,00€ 630,00€ 3.630,00
TOTAIS 2005€ 18.000,00€ 3.660,00€21.660,00


4) No ano de 2006, a sociedade comercial “A., Lda.” emitiu as seguintes facturas à Impugnante:
DataNúmeroValor s/ IVAIVATOTAL
31-05-2006FT060892€ 2.250,00€ 472,50€ 2.722,50
30-06-2006FT061028€ 2.250,00€ 472,50€ 2.722,50
29-12-2006FT062171€ 13.500,00€ 2.835,00€ 16.335,00
TOTAIS 2006€ 18.000,00€ 3.780,00€21.780,00


5) As facturas referidas em 3) e 4) contêm no campo “designação” a expressão “serviços prestados apoio a vendas de gás - cf. fls. 69-70, 73-76, 88-90 do PA;
6) A Impugnante foi objecto de uma acção inspectiva credenciada pelas Ordens de Serviço n°s OI200900159 e OI200900272, de 13 de Abril de 2009 e 28 de Maio de 2009, respectivamente, para os exercícios de 2005 e 2006, com âmbito em IVA e IRC - cf. fls. 33-35 do PA;
7) Através do Ofício n.° 11005, datado de 14 de Julho de 2009, os Serviços de Inspecção Tributária comunicaram à Impugnante o projecto de relatório da inspecção tributária para, querendo, esta exercer o direito de audição nos termos previstos no art.° 60.° da LGT e art.° 60.° do RCPIT - c. fls. 100 e ss. do PA;
8) Em 27 de Julho de 2009, a Impugnante exerceu por escrito o direito de audição prévia, no qual alega que as facturas em causa identificam o tipo de serviço prestado, utilizando para o efeito uma denominação usual “apoio às vendas de gás”, bem como a quantidade correspondente ao número de meses do serviço prestado, o preço unitário e o valor do IVA; que não existe legislação que obrigue à celebração de qualquer contrato ou folha de obra subjacente à prestação de serviços referidos nas facturas em questão; para o caso de se entender que a descrição constante nas facturas não dá cumprimento ao disposto no art.° 36.°, n.° 5, alínea b) do CIVA, então recai sobre a administração tributária o dever de informar qual o descritivo correcto para suprir eventuais deficiências, nos termos do art.° 48.° do CPPT; que existe obscuridade, contradição e insuficiência da fundamentação legalmente exigida nos termos do art.° 125 do CPA e art.°s 23.° e 77.° do CIRC; que os serviços a que se referem as facturas indicadas foram efectivamente prestados - cf. fls. 103-132 do PA;
9) Em 12 de Agosto de 2009, a Impugnante foi notificada do relatório final da inspecção tributária, onde consta, nomeadamente, o seguinte:
(…) Ano de 2005
(...) o sujeito passivo contabilizou como custos da empresa, serviços prestados pela empresa “A., Lda ”.
(...)
Foi elaborado termo de declarações a 18 de Maio de 2009.
O sr. A., NIF (…), na qualidade de administrador da empresa N. , afirma que:
a) Tendo em consideração a localização geográfica do estabelecimento comercial A., Lda., o mesmo serve de apoio administrativo à N., concretamente, nas cobranças dos clientes da N., bem como no pagamento aos seus fornecedores...”
b) Os serviços que constam nas facturas referidas nos mapas constantes do termo de declarações, correspondem a: - trabalho administrativo de trabalhadores afectos ao quadro de pessoal da empresa A., Lda. Trabalho de prospecção e pesquisa de novos produtos e de novos fornecedores efectuados pelo colaborador P., também afecto ao quadro de pessoal da empresa A., Lda.
c) Não existem contratos nem “folhas de obra" subjacentes à prestação de tais serviços. Existe apenas um acordo verbal entre ambas as empresas no sentido da prestação dos mesmos.
d) Não existem meios de pagamento subjacentes à prestação desses serviços. No entanto, como as empresas têm operações de compra e venda recíprocas, é efectuado ocasionalmente um “encontro de contas entre as empresas”.
e) Questionado sobre o facto de tais serviços apenas terem sido facturados entre Abril de 2005 e Dezembro de 2006, refere que tal se deve ao lapso de tempo em que o colaborador P. esteve ao serviço da empresa A., Lda.
Tendo em consideração as características da empresa que presta os serviços aqui em análise, as afirmações transcritas no termo de declarações e o lapso temporal em que tais serviços foram facturados, podemos obter as seguintes conclusões:
1. Existem relacionamentos próximos e familiares entre os sócios das empresas “A., Lda” e “N. , Lda. ” na medida em que:
- O Sr. A. detém uma quota de 60% do capital social da empresa N. , Lda.” e uma quota de 10% no capital social da empresa “A., Lda’’
- O Sr. A., detém uma quota de 40% do capital social da empresa N. , Lda.” e é herdeiro do Sr. A., que detinha uma quota de 90% no capital social da empresa A., Lda.
- A facturação dos serviços em causa só foi efectuada durante um lapso de tempo muito específico (de Abril de 2005 a Dezembro de 2006). Tal período corresponde ao tempo em que o colaborador P., (nessa data genro do administrador da N., Sr. A.) esteve ao serviço da empresa A., Lda.
- Antes e após o período de tempo referido do ponto anterior, não foram facturados quaisquer tipo de serviços relacionados com os que agora são colocados em questão. Prova disso é o extracto de conta corrente obtido junto do fornecedor “A., Lda.” e que consta no anexo 4.
- Não existe qualquer contrato ou “folha de obra” subjacentes aos serviços que foram prestados.
- Não existem quaisquer meios de pagamento relacionados com os serviços prestados.
Assim sendo, entende-se que tais custos não devem ser aceites como fiscalmente dedutíveis, tendo em consideração o disposto no artigo 23.° do C1RC, (...).
(…)
Ano de 2006
Pelos motivos já expressos no ponto anterior, também os custos relacionados com tais serviços, adquiridos no ano de 2006 e referidos no mapa seguinte, não devem ser aceites fiscalmente (...)” - cfr. fls. 44-55 do PA;
10) No que se refere ao direito de audição da Impugnante, consta do relatório final da inspecção tributária, nomeadamente, o seguinte:
“(...) Analisado o direito de audição exercido pelo contribuinte contrapõe-se que:
I - Da descrição dos serviços nas facturas para efeitos de IVA
A. Os serviços que estão a ser objecto de análise não estão relacionados com exercício de funções de um contabilista, advogado ou engenheiro (...).
B. Relativamente a argumento apresentado pelo contribuinte no ponto 4.°, existe uma objectiva contradição com o declarado no ponto 2 do termo de declarações lavrado a 18 de Maio de 2009. Nesta data, o contribuinte afirma não existir qualquer tipo de contrato de prestação de serviços subjacente à prestação de serviços de apoio à venda de gás.
(...)
L. Relativamente à afirmação contida no ponto 16° informa-se que o ponto 1.3 do Ofício-Circulado n.° 181044 — SIVA, de 06 de Dezembro de 1991 (informação acessível a qualquer contribuinte e referida no capítulo III deste relatório), refere que “A facturação das prestações de serviços deverá sempre quantificar e especificar as operações, não podendo aceitar-se, por exemplo, a mera indicação de serviços prestados.”
(...)
II — Da desconsideração dos custos em sede de IRC — Artigo 23.° do CIRC
(...)
a) No projecto de relatório de inspecção notificado ao sujeito passivo, não foi colocado em causa a existência ou não de relações especiais entre as empresas A., Lda. e N. , Lda., para efeitos de fundamentação da aplicação do artigo 58.° do CIRC.
b) (...)
c)
c) (...)
d) (...)
e) (…)
f) (…)

g) Não tendo sido concretamente identificados o tipo de serviços prestados pela empresa A., Lda. à empresa N. , Lda. nunca seria possível identificar se tais serviços iriam contribuir ou não para o incremento das vendas ou então para a redução dos custos, ou mesmo para a comercialização de novos produtos.
h) (...)
i) O contribuinte também não apresentou qualquer prova de que os serviços referidos na alínea anterior foram efectivamente prestados. Limitou-se a enunciá-los, juntando uma série de cópias de mails escritos em língua inglesa, uma proposta de fornecimento de GPL embalado B. Light e uma ficha de inquérito à satisfação dos clientes.
j) Tais documentos não provam: que tipo de serviços foram prestados; quem prestou tais serviços e quando os mesmos foram prestados.
l) Quanto ao facto de os serviços passarem a ser executados, após 31-12-2006, pelo colaborador da própria empresa (N.), Sr. J. e estando este ao serviço da mesma já na altura em que tais serviços eram prestados pela empresa A., Lda., apenas vem reforçar a prova de que tais custos não se mostram indispensáveis para a realização dos proveitos da empresa, nos termos do artigo 23. ° do CIRC” — cf. fls. 61-66 do PA;

11) Na sequência das conclusões do relatório de inspecção, foi emitida a liquidação de IRC e juros compensatórios n.° 2009 8310016325, relativa ao ano de 2005, tendo na mesma sido apurado um montante de imposto a pagar no valor de € 4.462,09, do qual € 502,10 corresponde a juros compensatórios e emitida a liquidação de IRC e juros compensatórios n.° 2009 8310016354, relativa ao ano de 2006, tendo na mesma sido apurado um montante de imposto a pagar no valor de € 4.303,70, do qual € 1.639,29 corresponde a juros compensatórios - cf. documentos n.°s 1 e 2 juntos com a petição inicial;
12) O Dr. P. foi admitido na sociedade comercial “A., Lda.” em 2003, onde exerceu funções até 2007, nas áreas comercial e sistemas de informação e ainda no apoio à gestão.
13) O Dr. P. prestou serviços na Impugnante desde o ano de 2003, a pedido da gerência da “A., Lda.”.
14) Entre os serviços referidos em 13) contam-se a elaboração de mapas de preços e concorrência em excel, trabalhos no âmbito da qualidade, introdução de novos produtos e a implementação de um sistema informático.
15) Os serviços referidos em 14) eram maioritariamente realizados nas instalações da sociedade comercial “A., Lda.”
16) O Dr. P. era remunerado como colaborador da sociedade comercial “A., Lda” e não auferiu qualquer rendimento adicional pelos trabalhos referidos em 14).
17) A Impugnante tem actualmente cerca de 25 colaboradores e a A., Lda. tem cerca de 8 colaboradores, sendo que esta última mantém o quadro de pessoal, em termos quantitativos, que já tinha nos anos de 2005/2006.

Factos não provados

A. Nos anos de 2005 e 2006 as vendas da Impugnante aumentaram significativamente.
B. O Dr. P. foi também contratado pela sociedade comercial “A., Lda.” para prestar serviços para a Impugnante na área da qualidade, segurança e desenvolvimento de novos produtos do sector do gás.
C. A sociedade comercial “A., Lda.” e a Impugnante acordaram que esta suportaria a quantia anual de € 18.000,00 referente ao salário do Dr. P..
D. Os trabalhos referidos em 14) da matéria assente passaram a ser assegurados por um funcionário contratado pela Impugnante.
Fundamentação da matéria de facto:
O Tribunal julgou provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa com base na análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos pelas Partes e que não foram objecto de impugnação bem como no Processo Administrativo (PA), a que se fez referência supra em cada um dos pontos da matéria assente e bem assim dos depoimentos de todas as testemunhas inquiridas em audiência contraditória.
Quanto aos factos dados como provados em 12., 13., 14., 15., 16. e 17, o Tribunal formou a sua convicção atento o teor dos depoimentos prestados por A. e P.. O primeiro, técnico oficial de contas da Impugnante e da sociedade comercial “A., Lda.,” desde a respectiva constituição e que referiu ter lidado directamente com o Dr. P.. Não exercia as suas funções nas instalações das empresas, mas sim em gabinete de contabilidade. Como TOC das referidas empresas lançava todos os documentos na contabilidade, daí ter conhecimento de que o vencimento do Dr. P. era pago pela sociedade comercial “A., Lda.” e do número de funcionários que cada uma tem. Referiu também que o Dr. P. exercia funções a tempo inteiro nesta última sociedade e na Impugnante estava “de vez em quando”. Também referiu que a Impugnante desenvolveu um programa informático no valor de € 100.000,00 e que o Dr. P. trabalhou nesse programa.
Já a testemunha P., que trabalhou na sociedade comercial “A., Lda.” de 2003 a 2007, demonstrou conhecimento directo dos factos uma vez que foi interveniente nos mesmos. O seu depoimento afigurou-se credível e isento. Narrou o contexto da sua admissão na “A., Lda.”, o período de duração do contrato e as funções que exerceu. Referiu que existia uma proximidade à Impugnante porque a gerência era a mesma e que a pedido desta prestava alguns serviços àquela. Questionado sobre os serviços que efectuou para a Impugnante e o período temporal em que o fez, disse que um dos primeiros trabalhos que fez, logo em 2003 foi ajudar a fazer uns mapas de preços e concorrência em excel, que ainda antes de 2005 esteve envolvido no projecto da qualidade da Impugnante, que em finais de 2004 inícios de 2005 começou a estudar-se a hipótese de mudar o sistema informático da “A.”, mas sempre integrado no contexto da Impugnante pois esta tinha determinadas especificidades exigidas pela B. e que a maior parte do trabalho era feito nas instalações da “A.”. Conclui-se deste depoimento que os serviços prestados à Impugnante foram feitos não apenas no período temporal a que se referem as facturas objecto dos autos, como logo após a sua admissão na “A.” e que o desenvolvimento do sistema informático foi pensado para a própria “A.”, aproveitando-se a ocasião para também implementar tal sistema informático na Impugnante.

Quanto aos factos dados como não provados, os elementos documentais e prova testemunhal não lograram demonstrar a ocorrência dos mesmos.
A primeira testemunha inquirida, M., que exerce as funções de motorista na Impugnante desde o ano de 1997, apenas demonstrou ter conhecimento de que o Dr. P. era funcionário da “A.” e aparecia “de vez em quando” nas instalações da Impugnante. Esta testemunha exercia as suas funções de motorista fora da empresa, pelo que demonstrou ter muito pouco conhecimento sobre os factos a que foi inquirido.
A segunda testemunha inquirida não demonstrou ter conhecimento dos factos. Era comercial numa empresa fornecedora da “A.”, sediada na Maia e nunca se deslocou às instalações da Impugnante.
A testemunha A. quanto a estes factos apenas referiu que questionou a gerência da “A.” sobre a que se referiam as facturas emitidas à Impugnante (a que se referem os autos) e que lhe foi dito que os serviços já estariam a ser implementados. Mas que, como não trabalha nas instalações da empresa, não constatou tal facto, sabe apenas que o Dr. P. é licenciado em gestão, é TOC e fala fluentemente inglês e que ajudou na implementação do sistema informático. Quanto ao pagamento das facturas, referiu apenas que “há encontro de contas” entre as duas empresas porque umas são devedoras de outras. Do depoimento desta testemunha não foi possível apurar se o valor constante das facturas foi pago. É certo que a testemunha referiu o “encontro de contas”, no entanto, esse encontro de contas em algum momento teve que gerar algum pagamento de uma empresa à outra. É completamente inverosímil que o saldo da conta corrente entre essas empresas fosse sempre zero, pois para tal acontecer o valor das mercadorias/serviços prestados por uma, tinha que ser exactamente igual ao valor dos serviços prestados pela outra. Resulta, aliás, das regras da experiência neste tipo de situações que, mesmo quando existem contas correntes entre empresas, no final de um determinado período, usualmente um mês, a empresa que apresenta um saldo devedor paga-o à empresa que tem um saldo credor. Essas contas correntes não se mantêm “ad (a)eternum” sem se verificar algum pagamento. Acresce que, seria facilmente demonstrável pela Impugnante qual o saldo da conta corrente ao longo do tempo, pois tal bastava-se com prova documental, o que não foi feito.
Quanto à testemunha C. o seu depoimento mostrou-se muito vago e impreciso, não resultando do teor do mesmo a demonstração de qualquer um dos factos dados como não provados, não obstante ser empregada de escritório na sociedade comercial A., Lda. Referiu apenas que o Dr. P. era funcionário efectivo da A., Lda. e que estava nas instalações desta empresa todo o dia, que fez uns trabalhos para a Impugnante, sem precisar muito bem quais e que implementou o sistema informático nas duas empresas. Referiu, no entanto, que só com o processamento das facturas, tarefa que lhe competia, é que tomou conhecimento da prestação dos serviços pelo Dr. P. para a Impugnante. Questionada se após a saída do Dr. P. da empresa, a Impugnante contratou alguém para efectuar o serviço que aquele habitualmente fazia, referiu que foram contratadas 4 (quatro) pessoas licenciadas, 3 (três) em gestão e 1 (uma) em engenharia, mas não conseguiu concretizar as funções destes funcionários na empresa, não sendo assim suficiente esta menção genérica para dar como provado o facto referido em D).
Já a testemunha P. referiu não ter conhecimento dos acordos efectuados entre a Impugnante e a “A.” e afirmou desconhecer as questões relacionadas com a retribuição ou a remuneração combinadas, sabe apenas que recebia o seu salário pago pela “A.”. Também quanto à sua contratação, do seu depoimento não resultou que também tivesse sido contratado para prestar serviços na Impugnante; o que resulta do teor do mesmo é que, ocasionalmente, a gerência (que era comum) lhe pedia para fazer uns trabalhos, que as mais das vezes, era comum a ambas as empresas. Veja-se, a título de exemplo, a implementação do sistema informático e a vertente comercial, quanto a esta última atente-se na expressão usada pela testemunha “eu nunca vi isso como um serviço à N., era uma função de gestão”, essencialmente a testemunha aproveitava os seus conhecimentos e trabalho efectuado na “A.” para levar algum “know how” e clientes à Impugnante.

Posto isto, apreciemos:

1ª Questão
Padece, a sentença recorrida, de insuficiência de fundamentação em matéria de facto na medida em que assenta na consideração de facto de que a descrição dos trabalhos facturados (“serviço de apoio às vendas de gás”) não constitui denominação usual e habitual, mas não fundamenta essa afirmação, com o que viola os artigos 23º al b), 77º da LGT e 124º do CPA?

A alegação de violação de uma norma como o artigo 23º nº 1 alª a) do CIRC não tem sentido quando o que se alega é uma insuficiência de fundamentação, seja do acto administrativo tributário, seja da sentença recorrida.

Com efeito, tratando-se de uma norma de direito substantivo, a questão da existência ou da suficiência da fundamentação, seja do acto, seja da sentença, é logicamente prévia à questão da sua violação por este acto e ou sentença. Saber se é violada a alínea b) do nº 1 do artigo 23º do CIRC, implica saber se as despesas indicadas nas facturas em causa como pagamento de “serviços de apoio às vendas de gás” deviam ter sido consideradas custos enquanto subsumíveis à referida alínea, ou seja, enquanto “encargos de distribuição e venda, abrangendo os de transportes, publicidade e colocação de mercadorias”. Ora, se se alega insuficiência da fundamentação da decisão recorrida por não fundamentar a afirmação de facto de que a expressão “serviços de apoio ás vendas de gás” não constitui designação habitual de quaisquer serviços, não se pode afirmar que a sentença errou de meritis ao afirmar que aquela expressão não é designação habitual de quaisquer serviços, pelo que tão pouco se pode concluir que, errando, violou aquela alínea.
Temos, assim, por concluído que o artigo 23º nº 1 alª b) do CIRC não pode ter sido violado por via do objecto da questão sub judicio.

Face à invocação das demais normas, convém recordar que o objecto do recurso é a sentença proferida nos autos e não o acto tributário impugnado.

Com efeito, quer o artigo 77º da LGT quer o artigo 124º do CPR referem-se aos requisitos de fundamentação do acto administrativo tributário. Quanto à sentença, se padecer, ela própria, de falta de fundamentação em matéria de facto ou de direito só pode violar os artigos 123º nº 2 e 125º nº 1 do CPPT e 607º do CPC.

Assim, se uma sentença respaldar um acto administrativo que padeça de insuficiência ou falta de fundamentação, mas o fizer de modo fundamentado (ainda que sem razão) ela não padece de falta de fundamentação, mas viola o artigo 77º da LGT na medida e que o acto tributário mantido na ordem jurídica devia ser anulado por o violar. Mas se a sentença é ela mesma falha de fundamentação, por não permitir ao destinatário reconstituir o iter mental do julgador quer em matéria de facto quer em matéria de direito, então não se pode dizer que ela viola o sobredito artigo 77º, pois não se percebe se e como chegou o Juiz à conclusão de que o acto administrativo estava suficiente ou insuficientemente fundamentado. Apenas se pode afirmar que a sentença viola as normas processuais que obrigam o juiz a fundamentá-la de facto e de direito.

Ora, a recorrente alega que a sentença padece de falta de fundamentação por ela mesma não ter expressado por que entendeu, a Mº Juiz a qua, que a expressão “serviços de apoio a vendas de gás” não é usual. Portanto, ao menos pela alegada falta de fundamentação, agora em discussão, a sentença recorrida não violou quer o artigo 77º da LGT, quer o artigo 124º do CPA de 1991.

Fica-nos, sem embargo, a questão de saber se efectivamente a sentença padece, quanto ao apontado aspecto de facto, de falta de fundamentação. Nesse caso, a haver absoluta falta de fundamentação relativamente à prova desse facto, a sentença será nula nos termos do artigo 125º nº 1 do CPPT.

Para tanto torna-se necessário antes de mais saber se a sentença tem arrimo, entre o mais, nessa proposição de que a expressão “serviços de apoio a vendas de gás” não é usual modo de designar serviços prestados. Depois haverá que apreciar se essa proposição de facto carece de fundamentação e, nesse caso, se essa fundamentação se encontra no discurso da sentença.
Percorrida a sentença recorrida, verifica-se que os excertos relevantes para esta apreciação são os seguintes:
«IV Do direito
(…)
Saber se as facturas referidas nos pontos 3) e 4) da matéria assente cumprem os requisitos previstos no art.° 35.°, n.° 5, alínea b) do CIVA e art.° 23.°, n.° 1, alínea b) do CIRC, na redacção vigente à data dos factos
Dispõe o art.° 35. °, n.º 5, alínea b) do CIVA, na redacção dada pelo D.L. n.° 394-B/94, de 26/12 (aqui aplicável) “As facturas ou documentos equivalentes devem ser datados, numerados sequencialmente e conter os seguintes elementos: a quantidade e denominação usual dos bens transmitidos ou dos serviços prestados, com especificação dos elementos necessários à determinação da taxa aplicável (...).”
Dos elementos que devem constar obrigatoriamente das facturas e referidos no art.° 35.° do CIVA, existem alguns de carácter geral e outros específicos do IVA.
Nos primeiros incluem-se a datação e a numeração sequencial, a identificação do fornecedor de bens ou prestador de serviços e do destinatário ou adquirente, bem como a referência à quantidade e denominação usual dos bens transmitidos ou dos serviços prestados.
Sucede que, em sede de IRC, “o documento comprovativo e justificativo dos custos para efeitos do disposto nos arts. 23. °, n.° 1, e 42. °, n. ° 1, alínea g) do CIRC, não tem de assumir as formalidades essenciais exigidas para as facturas em sede de IVA, uma vez que a exigência de prova documental não se confunde nem se esgota na exigência de factura, bastando tão-só um documento escrito, em princípio externo e com menção das características fundamentais da operação, uma vez que ao contrário do que se passa com o IVA, em sede de IRC, a justificação do custo consubstancia uma formalidade probatória e, por isso, substituível por qualquer outro género de prova” — cfr. Acórdão do STA, de 05/07/2012, proc. n.° 0658/11.
Nesse mesmo sentido, veja-se também os Acórdãos do TCAS, de 23/04/2015, proc. n.° 06468 e de 21/05/2015, proc. n.° 07833/14.
Acresce que, o presente processo de impugnação judicial refere-se a IRC e não a IVA e, como resulta do ponto 9) da matéria assente, o eventual não cumprimento pela Impugnante, das formalidades previstas no art.° 35.°, n.° 5, alínea b) do CIVA para a emissão das facturas, não foi atendido pela administração tributária para atender à desconsideração das referidas facturas em sede de IRC.
Pelo que, por não ser a sede própria não se conhece da eventual violação do disposto no art.° 35.°, n.° 5, alínea b) do CIVA (na redacção vigente à data dos factos).

Em mais lado algum a sentença recorrida refere tacita ou expressamente o conceito de denominação usual.

No acabado de transcrever, a sentença recorrida acaba por decidir não emitir qualquer pronúncia sobre se a expressão “serviços de apoio á venda de gás” é modo de designar usualmente quaisquer serviços prestados, a pretexto de não estar em causa a dedutibilidade do IVA, mas sim correcções em matéria colectável de IRC, pelo que o cumprimento das exigências formais específicas do artigo 35º nº 5 do CIVA não é, aqui relevante.

Assim sendo, a sentença recorrida, deliberadamente, não buscou fundamento algum na consideração de que a expressão “serviços de apoio à venda de gás” não era modo usual de designar quaisquer serviços e, consequentemente, não se pronunciou no sentido de que a expressão “prestação de serviços de apoio a vendas de gás” não era modo usual de denominar a prestação de quaisquer serviços.

Mas se assim é, tal como já advertimos, fica prejudicada a alegação de que ela padece de insuficiência de fundamentação por ter ficado por saber por que entendia a Mª Juiz a qua que aquela denominação não era usual.

Improcede, pelo exposto, a alegação de insuficiência de fundamentação da sentença recorrida, quanto ao aspecto objecto da 1ª questão acima enunciada.

2ª Questão
Padece, a sentença recorrida, de insuficiência de fundamentação em matéria de facto, por aceitar acriticamente e usar como fundamento seu a infundamentada afirmação do RIT, de que não se consegue identificar os serviços prestados, de apoio às vendas de gás, com o que viola os artigos 23º a b), 77º da LGT e 124º do CPA?

Valem aqui, também, as considerações prévias feitas a propósito da 1ª questão.

Portanto, o que se vai apreciar é se a sentença recorrida se louva, além do mais, na consideração, supostamente feita no RIT, de que é impossível identificar os serviços prestados, de apoio às vendas de gás, objecto das facturas sub judicio e se, nesse caso, deixa por fundamentar essa afirmação.

Os excertos da sentença recorrida relevantes para esta apreciação são os seguintes:
No título “Factos Provados”, relevam os parágrafos 9º e 10º, em que se transcreve parte das considerações feitas no RIT final, já transcritos.

No título denominado “Do Direito” tudo o que encontramos de relacionável com a alegação sub judicibus reside no seguinte excerto:
«Saber se a fundamentação de facto do relatório final é subjectiva, obscura, contraditória, insuficiente e não esclarece concretamente a motivação do acto, em violação do disposto no art.° 23.°, n.° 1, alínea b) do CIRC, art.° 77.° da LGT e art.°s 124° e 125.°, n.° 2 do CPA.
A Impugnante imputa determinados vícios à fundamentação do relatório final que, a existirem, se reconduzem no vício de falta de fundamentação - cfr. art.° 125, n.° 2 do CPA/91.
(…)
Reportando-nos agora ao caso dos autos, importa verificar se no relatório de inspecção se encontram explanadas as razões de facto e de direito, que conduziram às liquidações adicionais impugnadas e se as mesmas são suficientes para esclarecer concretamente a motivação do acto.
Como resulta dos pontos 9) e 10) da matéria assente, o relatório de inspecção está fundamentado quer de facto quer de direito. Contém a descrição dos factos que levaram a desconsiderar como custo os alegados serviços a que se reportam as facturas indicadas para cada um dos anos objecto da acção inspectiva e contém a fundamentação jurídica com a indicação do art.° 23.° do CIRC, sendo feita a ponderação da legislação em vigor.
Face ao exposto no relatório, estão suficientemente explanadas as razões de facto e de direito, que a administração fiscal considerou para efeitos da desconsideração dos custos aí referidos e que levou à correcção da matéria tributável, sendo a fundamentação suficiente para conhecer o itinerário cognoscitivo e valorativo do acto, não padecendo de qualquer obscuridade, contradição ou insuficiência.
Assim, conclui-se pela improcedência do vício de falta de fundamentação invocado pela Impugnante.

Cumpre, antes de mais, advertir que a afirmação da AT mais directamente relacionável com esta alegação da Recorrente vem na alínea f) do capítulo II do RIT e não consiste exactamente em que foi impossível identificar os serviços prestados, mas sim em que, uma vez que as facturas não identificam os serviços prestados, não é possível “identificar se tais serviços iriam contribuir ou não para o incremento das vendas ou então para a redução dos custos, ou mesmo para a comercialização de novos produtos”. Verifica-se o emprego indevido do verbo “identificar”. Dever-se-ia ter escrito, por exemplo, “verificar” ou “apreciar”.

De todo o modo, nada é dito ou omitido, na sentença recorrida, que permita a alegação de que a sentença recorrida se fundamentou acriticamente na alegação da AT de que era impossível identificar os serviços prestados ou apreciar se esses serviços eram úteis para a formação do rendimento.

Na verdade, o que se alegava na PI era a obscuridade da fundamentação do acto impugnado e a Mª Juiz recorrida decidiu que face ao excerto do RIT final transcrito nos parágrafos 9 e 10 da matéria de facto provada eram perfeitamente perceptíveis as razões de facto por que a AT desconsiderara os custos “titulados” nas facturas em causa, pelo que a fundamentação era suficiente.

A sentença recorrida, tão pouco aqui fez um julgamento sobre a conformidade material do acto impugnado com a lei substantiva. Cingindo-se ao que era alegado, apreciou o acto impugnado do ponto de vista da suficiência da fundamentação.

Está, com isto, prejudicada a afirmação de que a decisão de improcedência da impugnação usou como fundamento seu a alegação de que não se conseguia identificar os serviços prestados e designados como “apoio às vendas de gás”.

Como assim, o recurso improcede também sob o ponto de vista da alegação que suscitou a esta questão.

3ª Questão
Errou, a sentença recorrida, em matéria de facto, ao laborar no entendimento de que impendia sobre a Impugnante o ónus de provar a veracidade do objecto das facturas emitidas pela “A. Lda” e identificadas e descritas no RIT e a sua indispensabilidade à formação do rendimento, uma vez que ela tinha a sua contabilidade organizada e não foi provado qualquer facto que lhe retirasse credibilidade, pelo que se presumia verdadeiro e de boa fé tudo o declarado pela Impugnante, conforme artigos 75º nº 1 e 81º nº 1 da LGT?

Antes de mais cumpre dizer que não tem sentido a invocação do artigo 81º nº 1 da LGT, pois não está em causa qualquer correcção de matéria colectável de IRC com recurso a métodos indirectos.

Foi com recurso às regras próprias do IRC, designadamente o artigo 23º nº 1, quanto ao que são e não são custos dedutíveis, que a decisão impugnada acresceu o valor das facturas aqui em causa.

No mais, importa verificar se e em quê a sentença recorrida laborou no questionado pressuposto em termos de ónus da prova e se isso era proscrito por Lei, designadamente pelo artigo 75º nº 1 da LGT.
Vejamos.
O segmento da sentença recorrida susceptível de ser o objecto desta critica que lhe faz a recorrente é redutível à seguinte citação.
«Saber se deve ser aceite como custo fiscal para efeitos de IRC os serviços a que se referem as facturas desconsideradas pela Autoridade Tributária.
(…)
Compulsado o relatório de inspecção verifica-se que estamos perante uma situação em que a administração fiscal concluiu pela dispensabilidade dos custos nos termos do art.° 23.° do CIRC.
Ora, quanto ao ónus da prova da indispensabilidade dos custos, a jurisprudência dos nossos tribunais superiores é pacífica no sentido de que não recai sobre o contribuinte esse ónus probatório. É à administração tributária que se impõe abalar a presunção de veracidade da declaração do imposto, apresentada pelo contribuinte (cfr. art.° 75.° da LGT).
No entanto, se a administração tributária, fundamentadamente, despoletar a dúvida sobre a relação justificativa de uma determinada despesa com a actividade do sujeito passivo, compete a este, por se encontrar mais habilitado para o efeito, a explicação sobre a congruência económica da operação, exigindo-se que o contribuinte alegue e comprove factos concretos, sindicáveis, capazes de demonstrar a veracidade das actuações empresariais que provocaram os gastos registados - cfr., entre outros, Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul,
Importa também ter presente que não é imperioso que a administração tributária efectue uma prova directa, no sentido de evidente e intocável, “antes pode resultar de circunstâncias colaterais e indirectas que, atentas a idoneidade dos respectivos meios de suporte e regras da experiência comum, indiciem, segundo padrões de avaliação e aferição pautados por critérios de razoabilidade e normalidade, um determinado resultado como o mais legitimamente atendível — cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 11/02/2016, proc. n.° 00080/03-Porto.
Feito o enquadramento legal da questão em apreciação, importa analisar se o juízo formulado pela autoridade tributária no que concerne à dispensabilidade dos custos a que se referem os serviços ínsitos no descritivo das facturas a que se alude nos pontos 3) e 4) da matéria assente, se pode considerar como pertinente e adequado, isto é, se os elementos indiciários apontados no relatório de inspecção permitem inferir, com um grau de probabilidade, aquela dispensabilidade.
Assim, a administração tributária avançou com os indicativos seguintes:
a) Existem relacionamentos próximos e familiares entre os sócios das empresas “A., Lda” e “N. , Lda.” na medida em que, o Sr. A. detém uma quota de 60% do capital social da empresa N. , Lda.” e uma quota de 10% no capital social da empresa “A., Lda.” e o Sr. A., detém uma quota de 40% do capital social da empresa N. , Lda.” e é herdeiro do Sr. A., que detinha uma quota de 90% no capital social da empresa A., Lda.”
b) A facturação dos serviços em causa só foi efectuada durante um lapso de tempo muito específico (de Abril de 2005 a Dezembro de 2006). Tal período corresponde ao tempo em que o colaborador P., (nessa data genro do administrador da N., Sr. A.) esteve ao serviço da empresa A., Lda.
c) Antes e após o período de tempo referido no ponto anterior, não foram facturados quaisquer tipos de serviços relacionados com os que agora são colocados em questão.
e) Não existe qualquer contrato ou “folha de obra” subjacentes aos serviços que foram prestados.
f) Não existem quaisquer meios de pagamento relacionados com os serviços prestados.
No decurso do procedimento inspectivo foram tomadas declarações ao gerente da Impugnante que quanto aos pontos acima elencados referiu apenas que as instalações da “A., Lda.” servem de apoio administrativo à N., que os serviços que constam nas facturas correspondem a trabalho administrativo de trabalhadores afectos ao quadro de pessoal da empresa “A., Lda.” e trabalho de prospecção e pesquisa de novos produtos e de novos fornecedores efectuado pelo colaborador P., também afecto ao quadro de pessoal da empresa “A., Lda/’, que não existe contrato escrito e que não existem meios de pagamento subjacentes à prestação desses serviços porque as duas empresas têm operações de compra e venda recíprocas e é efectuado ocasionalmente um “encontro de contas” entre as empresas.
Perante este quadro fático, persiste a dúvida sobre a natureza dos serviços efectivamente prestados pela sociedade comercial “A., Lda/’ à Impugnante, não só porque a descrição das facturas é muito vaga e genérica, como também não ficou demonstrado que a Impugnante não tivesse um quadro de pessoal que lhe permitisse fazer face a determinados trabalhos/serviços, para os quais fosse necessário recorrer a funcionários sem vínculo, os quais são trabalhadores de uma outra empresa (ainda que em ambas o órgão da gerência fosse constituído pela mesma pessoa). Acresce que, o não pagamento desses serviços é gerador de fundada dúvida sobre a natureza e existência dos mesmos. É que, mesmo sufragando a tese da Impugnante, seria facilmente comprovável o referido “acerto de contas”, bastando à Impugnante juntar os respectivos documentos contabilísticos. Não obstante, a alegada existência de uma denominada “conta corrente”, parece-nos inverosímil que esta apresente um saldo igual a zero ou que se mantenha com saldo devedor/credor “ad [a]eternum”, sendo um facto que resulta da experiência comum que, em algum momento, o saldo existente é pago. No entanto, esses elementos não foram juntos pela Impugnante ao procedimento inspectivo.
Afigura-se, assim, que a administração tributária, fundamentadamente, abalou a presunção de veracidade da declaração de imposto apresentada pela Impugnante, no que às facturas a que nos vimos a referir diz respeito.
Perante o exposto, em sede judicial, impunha-se à Impugnante a prova da respectiva indispensabilidade, o que, diga-se, também não foi feito.»

Antes de mais, digamos que, vistos os termos do RIT transcritos nos nºs 9 e 10 da decisão em matéria de facto, a decisão da AT não assentou na alegação de uma fundada suspeita de não terem sido, sequer, incorridos os custos objecto das facturas, mas sim na afirmação de que não seriam indispensáveis para a formação do rendimento, assumida com base nos factos, esses sim, considerados provados, mencionados nas alíneas a) a f) do relatório e da sentença.

Assim, não está em causa o facto de que os custos foram incorridos, apenas a sua comprovada indispensabilidade, nos termos e para os efeitos do artigo 23º nº 1 do CIRC.

Também importa referir que a Impugnante e Recorrente parte de um pressuposto errado quando alega que a sua contabilidade estava impecável. Impecável não estava, pois continha as facturas sub judicio, facturas cuja descrição dos serviços prestada era genérica e polissémica e, por isso, não permitia aferir, sem recurso a outros documentos, que por sinal, tão pouco existiam, a adequação dos custos ao disposto no artigo 23º nº 1 do CIRC.

Mas avancemos:
Nessa matéria a sentença recorrida refere expressamente que é ónus da AT provar, não a dispensabilidade, mas factos de que decorram dúvidas fundadas sobre aquela, com o que passará a caber ao contribuinte a alegação e a prova dos factos que demonstrem a indispensabilidade dos custos nos termos e para os efeitos do citado artigo 23º.

Embora não o diga expressamente, a sentença só pode estar a arrimar-se no disposto no artigo 75º nº 2 alª a), segundo o qual a presunção prevista no nº 1 não se verifica quando “as declarações, contabilidade ou escrita revelarem omissões, erros, inexactidões ou indícios fundados de que não reflectem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo”.

A indicação indefinida e indefinível dos serviços prestados, com que se deparou a AT e aqui nos deparamos nós, é subsumível sem dificuldade no conceito de “omissões” – materialmente estavam omissos quaisquer elementos identificadores dos serviços prestados – e até, no de “inexactidões”, não forçosamente no sentido de inverdades, mas no sentido de que, por via da ambiguidade da expressão, não se menciona exactamente a qualidade a quantidade, dos serviços que foram fonte do crédito facturado.

Assim, o simples facto dos comprovados e indiscutidos termos das facturas em causa, ambíguos, e bem assim a falta de elementos documentais, na contabilidade da Impugnante, para suprir essa ambiguidade, são motivo sobejo para se duvidar fundadamente da indispensabilidade dos custos, segundo a seguinte lógica: se os serviços facturados podem ser tudo e mais alguma coisa, atenta a ambiguidade e a indefinição das facturas, então é francamente possível que o que quer que tenham sido, não tivesse com a formação do rendimento a menor relação relevante.

Quer nos termos concretos do artigo 75º nº 2 do LGT quer mesmo em termos de uma distribuição equitativa do ónus da prova, é justo que caiba sobre o contribuinte o ónus de alegar e de provar que os custos com o objecto indefinido nas facturas têm de facto uma relação necessidade ou ao menos adequação ou conveniência em ordem à realização dos proveitos.

Como assim, bem andou a sentença recorrida em julgar ser do Recorrente o ónus de alegar e provar os factos de que poderia decorrer essa conclusão.

Pelo exposto, improcede a alegação de erro de julgamento em matéria de facto subjacente à questão sub judicio.

4ª Questão
Errou, a sentença recorrida, no julgamento em matéria de facto, ao dar como não provados os factos como tais enunciados de A a D, que deviam ter sido dados como provados nesses precisos termos, e ao dar como provados os factos como tal enunciados sob os nº 9 e 10?

Como é sabido, o artigo 640º nºs 1 e 2 alª a) do CPC faz impender sobre o recorrente em matéria de apreciação da prova o ónus de delimitar positivamente o que entende serem os factos indevidamente não provado ou provados a decisão que devia ter sido tomada e os meios de prova determinantes, chegando ao ponto de lhe impor, no caso da prova verbal gravada sob pena de “imediata rejeição (…) do recurso na respectiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes” (nº 2 alª a)”.
Este ónus tem de ser entendido adequadamente, no sentido de o seu objecto de não ir além do que for possível ou exigível em concreto, satisfazer, e dos limites decorrentes direitos fundamentais, como o do acesso à justiça (artigo 20º nºs 1 e 4 da CRP), e legais, como o do duplo grau de jurisdição.
Designadamente, seja por a crítica à decisão da matéria de facto residir, não na sustentação de que se provou certo facto dado como não provado, mas outrossim, na de que não se fez prova de determinados factos, seja porque a prova testemunhal é por natureza, em abstracto, inadequada, ou, por imposição legal, inadmissível, podem ficar prejudicadas as especificações previstas na alínea b) do nº 1 e ficam obviamente prejudicadas as da alínea a) do nº 2. Mesmo quando a alegação da não prova de certo facto se funda em que os depoimentos colhidos, embora admissíveis e em abstracto susceptíveis, não a produziram, pode acontecer ser logicamente impossível, impraticável, ou pelo menos inexigível, indicar depoimentos e respectivas passagens concretas de que decorra essa conclusão negativa.
Nos demais casos, embora a sanção da rejeição do recurso só esteja expressamente prevista para o caso subsumível ao nº 2 alª a) – isto é, para a invocação de prova verbal gravada – nem por isso deixará de ser inevitável a rejeição do recurso, quanto mais não seja por uma razão de ordem lógica, sempre que, por falta das outras menções, o julgador se deparar com a indefinição do objecto do recurso e da sua motivação.
In casu, a recorrente, repete ao longo da a alegação e das 61 ditas conclusões, os factos que entende que deviam ter sido julgados como provados e a final os que entende que deviam ter sido julgados não provados.
Já quanto aos que deveriam ter sido julgados não provados e quanto aos meios de prova que determinariam a prova dos não provados e a não prova dos provados, o recurso não é claro, do ponto de vista daquele ónus.

Assim, ao longo da alegação e das conclusões vai referindo testemunhas inquiridas, até transcreve e delimita, na gravação, longos excertos do depoimentos, mas não especifica as afirmações, com referência às gravações, tidas por decisivas para a prova deste facto e ou a não prova deste, seja por razões de ordem lógica, seja por razões de ordem prudencial. Depois, na recta final das conclusões – conclusão 61 - volta a mencionar os factos que reputa provados e não provados, dizendo, desta feita, que os meios de prova invocados como fundamento do erro foram por si indicados com precisão e com transcrição dos excertos que considera relevantes para a modificação da decisão recorrida.

Porém:
Por um lado, para mencionar os factos provados que deviam ter sido dados como não provados remete o leitor sem mais para os parágrafos 9 e 10, sendo certo que estes são constituídos por extensas transcrições do RIT que por sua vez contêm percepções e informações da AT cuja veracidade se presume (artigo 76º nº 1 da LGT) e pode ser fundamento de facto para a decisão da impugnação.

Por outro lado, para indicar os meios de prova limita-se, ainda aqui, a juntar extensas transcrição dos depoimentos aqui totais, ali parciais, prestados pelas testemunhas por si indicadas, com menção dos minutos e segundos do inicio e do termo dos depoimentos ou dos excertos alegadamente relevantes, ao longo de bem mais de uma centena de páginas sem, afinal especificar em que afirmações desses depoimentos, e porquê, reside, por força da lógica e ou, manifestamente, das regras da experiência comum, a prova dos factos dados como não provados e a não prova dos factos (que factos?) dados como não provados.

É certo que em alguns depoimentos, como os das testemunhas P. e A., no processo em suporte de papel, determinados excertos aparecem a sombreado, podendo colocar-se a hipótese de serem essas as passagens tidas por decisivas no sentido, ao menos, da prova doa factos dados como não provados. Porém isso não é explicitado, além de que a extensão dos sombreados acaba por resultar numa inespecificação e por obnubilar uma qualquer alegação tácita das afirmações decisivas e do por quê de o serem.

Visto isto, ficamos sem saber que factos concretos (mencionados no relatório e contidos nos parágrafos 9 e 10 da decisão de facto da sentença recorrida), no entender da recorrente não ficaram provados e por que não ficaram; e sem saber por que entende a recorrente, isto é, com base em que conteúdos concretos dos depoimentos gravados e transcritos entende a Recorrente que se impunha, fosse lógica, fosse prudencialmente, dar por provado os factos A a D.

Assim, tem de se concluir que o recurso, quer na parte relativa à prova dos factos dados como provados nos parágrafos 9 e 10, quer na parte relativa à não prova dos factos dados como não provados sob as alíneas A) a D) da decisão recorrida, não cumpre, com os requisitos das alíneas a) e b) do nº 1 e a) nº 2 do artigo 640º do CPC, para poder ser conhecido, pelo que o Tribunal o rejeita, abstendo-se de se pronunciar sobre o mesmo.

5ª Questão
Errou, a sentença recorrida, no julgamento de direito, ao não julgar ser obscura, por contraditória, a fundamentação do RIT, que não explica por que reconhece as facturas na escrita da A. Lda (como proveitos) mas já não na escrita da Impugnante (como custos)?

Antes de mais cumpre notar que não faz parte dos factos provados que as facturas em causa tenham sido reconhecidas pela AT na contabilidade fiscal da A. Lda.

De todo o modo, esta questão labora num pressuposto quod est demostrandum, a saber, que há inconciliabilidade lógica entre a decisão de não aceitação dos custos titulados nas facturas em causa para efeitos de dedução dos mesmos ao lucro tributável da Impugnante, por um lado, e a consideração dos créditos titulados nessas mesmas facturas, como proveitos, para determinação do rendimento tributável da A. Lda.

Ora, sucede que não é pressuposto de facto dos actos impugnados a não ocorrência dos custos, mas sim e apenas a não verificação, quanto a eles, dos requisitos de relevância resultantes do artigo 23º nº 1 do CIRC, isto é, a comprovada indispensabilidade dos mesmos para a formação do rendimento. Como assim, é perfeitamente compatível com a não consideração dos custos na impugnante, a consideração dos correspondentes proveitos na A..

Como assim, sem necessidade de mais considerações, improcede esta alegação de obscuridade da fundamentação da sentença recorrida.

6ª Questão
Errou de direito a sentença recorrida por não ter julgado procedente a alegação de violação, pela AT, do dever de colaboração com o contribuinte, expresso no artigo 48º nº 1 da LGT, por aquela não ter satisfeito o pedido feito pela Impugnante, em sede de audiência prévia, de lhe ser indicada a denominação dos serviços a apor em facturas de substituição das “não aceites”, nos termos e para os efeitos do artigo 78º do CIVA.

O julgamento da Mª Juiz a qua, nesta matéria é redutível aos parágrafos 8 e 10 da matéria de facto provada e aos seguintes segmentos em matéria de dita de direito:
«Saber se a Direcção de Finanças de Viana do Castelo violou o dever de colaboração com o contribuinte plasmado no art.° 48.°, n.° 1 do CPPT:
(…) tem que se atender que tal dever de colaboração não permite ao sujeito passivo que se exonere e descure a diligência exigida no cumprimento das obrigações jurídicas que a lei lhe impõe.
Por um lado, o art.° 6.° do Código Civil dispõe que “A ignorância ou má interpretação da lei não justifica a falta do seu cumprimento nem isenta as pessoas das sanções nela estabelecidas.” Por outro lado, é certo que com regularidade, a administração fiscal disponibiliza orientações genéricas, de molde a que os contribuintes fiquem esclarecidos quanto a disposições legais e o seu alcance.
Assim, não era exigível à administração fiscal que indicasse qual a designação que deveria constar das facturas, desde logo, porque tal não se configura como uma obrigação decorrente do princípio da colaboração e também porque só a Impugnante e a sociedade comercial “A., Lda.” sabem, concretamente, quais os serviços prestados.
Pelo exposto, improcede também este invocado vício.»

1º Aditamento à matéria de facto provada
Para uma mais esclarecedora apreciação desta alegação é conveniente aditar à matéria de facto provada, designadamente ao parágrafo 8, a seguinte, que o está documentalmente, no P.A., a fs. 106:
8-A –Nos artigos 27º 28º da sua pronúncia prévia, a Impugnante escreveu o seguinte:
27° - Dispõe o n° 1 do art° 48.° do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) que, a administração tributária esclarecerá os contribuintes e outros obrigados tributários sobre a necessidade de apresentação de declarações, reclamações e petições e a prática de quaisquer outros actos necessários ao exercício dos seus direitos, incluindo a correcção dos erros ou omissões manifestas que se observem.
28° - Assim, caso continuem a entender que aquela descrição não dá cumprimento ao disposto na alínea b) do n° 5 do art° 36° do CIVA, o que só por mera hipótese académica se coloca, requeremos que nos informem qual o descritivo que entendem que devemos mencionar nas referidas facturas para efeitos de podermos proceder à sua rectificação das eventuais "deficiências".

Assim, está provado que a Impugnante, em audiência prévia, não só alegou que era dever da AT informar qual o descritivo dos serviços como requereu à AT que lhe informasse os termos em que devia corrigir as facturas, de modo a cumprirem com o artigo 35º nº 5 do CIVA.

É certo que o cumprimento dos requisitos formais das facturas, que resultam daquela norma do CIVA, também teria beneficiado a Impugnante em sede de IRC, pois da menção concreta dos serviços prestados poderia resultar poder concluir-se pela sua conexão com a actividade objecto da Impugnante, suficiente para o juízo de comprovada indispensabilidade para gerar os lucros tributáveis.

Também é certo que resulta do citado artigo 48º nº 1 do CPPT o dever, da Administração para com o contribuinte, de o informar sobre a necessidade de corrigir quaisquer erros e omissões manifestos.

Embora não lhe dê a maior importância no conjunto da sua argumentação, a sentença recorrida contém a razão decisiva e a nosso ver, por que se deve entender que o dever de colaboração não foi infringido.

Consiste, ela, em que, atenta a indefinição e ambiguidade extremas da descrição dos serviços facturados, só o contribuinte sabe em que consistiram os mesmos, pelo que há uma impossibilidade lógica de a AT o informar sobre o modo concreto como deveria descrever os supostos serviços de apoio à venda de gás.

A este propósito convém recordar que se trata de custos de cuja contratação subjacente não ficou rasto documental na contabilidade, pelo que nem mesmo com recurso a documentação coeva das facturas se podia densificar aquela polissémica expressão.

Não se diga que estavam e estão aí as explicações verbais do gerente e a sua disponibilidade para tudo esclarecedor e concretizar. As informações verbais do impugnante, a posteriori relativamente à emissão das facturas e ao projecto do RIT, sem qualquer suporte documental e em função de um almejado suprimento da não dedutibilidade dos custos nos termos do artigo 23º nº 1 do CIRC careceriam da menor credibilidade.

Em suma, por lógica e praticamente impossível, pois só a impugnante sabia que concretos serviços prestados foram esses que designou como apoio às vendas de gás, não era dever da AT, face ao artigo 48º nº 1 do CPPT, informar a Impugnante sobre como devia fazer designar em novas vias das facturas, esses serviços, apesar de aquela lhe o ter requerido em audiência prévia.

Ante o que vai dito, conclui-se que a sentença recorrida não enferma do supra apontado erro de julgamento.

7ª Questão
Errou, no julgamento direito, a sentença recorrida, ao julgar improcedente a alegação do artigo 60º nº 7 da LGT (obrigatoriedade da consideração dos elementos novos suscitados em audiência prévia), já que os peritos da AT, após a pronúncia prévia da Impugnante, “não investigaram nem apuraram ou identificaram:
a) O aumento das margens de comercialização dos produtos da Impugnante;
b) as vendas de novos produtos, que em anos anteriores não eram comercializados pela Impugnante, tais como os painéis solares e os painéis fotovoltaicos, entre outros que foram introduzidos no giro da empresa;
c) Quais os serviços prestados pela A. Lda. à Impugnante (através da testemunha P.) no apoio ao gás que foram realizados durante os anos de 2005 e 2006 (anos a que se referem as facturas em causa);
d) Os serviços que foram prestados pela A. Lda. à Impugnante, cujas empresas se complementam por causa do negócio da venda de gás, quanto à certificação do processo de qualidade exigido pela B., da qual é concessionária a Recorrente.”

2º Aditamento à Matéria de facto provada
Para uma apreciação desta alegação é conveniente aditar à matéria de facto provada, designadamente ao parágrafo 8, a seguinte, que o está documentalmente, no P.A., a fs. 103 e sgs:

8 – B O teor dos parágrafos 46 a 71 da pronúncia prévia da Impugnante era o que consta a fs. 103 e sgs do PA, transcrevendo-se aqui os parágrafos 70 e 71:
«70º - Um dos objectivos fundamentais que presidiu à introdução do direito dos contribuintes participarem na formação das decisões da Administração Tributária pelo exercício do direito de audição prévia, é o do aperfeiçoamento da matéria de facto e de direito, subjacentes àquelas decisões, por forma a evitar que estas estejam fundamentadas em factos que não correspondem à verdade material dos factos, ou ainda de forma obscura, contraditória ou insuficiente, evitando assim a instauração de processos de impugnação judicial de tais decisões destinados à declaração da nulidade ou da anulabilidade de tais decisões.
71° - Estamos certos que, de forma empenhada, contribuímos para a descoberta da verdade material dos factos constantes do Relatório elaborado pelo TATA.
Nestes termos, como estabelece o disposto no n° 7 do art° 60º da LGT, requeremos que, V. Exa. tenha em consideração na fundamentação da decisão final, todos os factos novos que por este meio aduzimos ao processo e em consequência determine o seu arquivamento.»

Vejamos o essencial dos termos da sentença recorrida na parte agora sob crítica:
“(…)
Analisado o processo físico da inspecção tributária e, nomeadamente o ponto 8) da matéria assente, verifica-se que a Impugnante exerceu, por escrito, o direito de audição prévia, onde aduziu vários argumentos tanto relativos ao IRC como ao IVA.
Atento que as liquidações ora impugnadas dizem respeito ao IRC, apenas os argumentos aduzidos quanto a este devem ser aqui atendidos.
Ora, se atentarmos na formulação dos argumentos apresentados pela Impugnante e no teor do capítulo IX do relatório da inspecção, nomeadamente o ponto 10) da matéria assente, constata-se que aqueles argumentos foram todos rebatidos pela administração fiscal.
Na verdade, foram de tal forma considerados e analisados os argumentos da Impugnante que o relatório inspectivo socorre-se dos títulos usados por aquela e indica claramente os pontos que contesta.
Acresce que, o art.° 60.°, n.° 7 da LGT não exige que seja dada procedência aos argumentos aduzidos, mas apenas que aqueles sejam ponderados pela administração fiscal. Ora, como resulta da análise do relatório de inspecção tal facto foi tido em conta.

Efectivamente o RIT tem um capítulo destinado exclusivamente a rebater e rebate questão por questão os argumentos relatados.

E também é certo – é obvio – que ter em conta os elementos novos apresentados em sede de audiência prévia não implica acolher a sua procedência.

Porém, nesta instância, a Recorrente revela considerar que para cumprir com o nº 7 do artigo 70º da LGT a AT devia não só rebater as suas alegações como investigar os factos (que nem tudo o são) mencionados nas sobreditas alíneas.

Os termos literais do nº 7 do artigo 60º da LGT são os seguintes.
“Os elementos novos suscitados na audição dos contribuintes são tidos obrigatoriamente em conta na fundamentação da decisão”.

É pacífico na doutrina e na jurisprudência que para cumprir com o contraditório e o direito de participação dos administrados não tem a administração que levar a cabo todas a actividade de produção de prova e de averiguação de factos que lhe for requerida ou sugerida em audiência prévia.

Desde logo, tratando-se de factos cuja relevância esteja prejudicada pelo entendimento de direito adoptado pela Administração, não teria sentido esta proceder à sua investigação.

Sob pena de se ver constrangida á prática de actos inúteis no procedimento e de ficar à mercê da actividade dos administrados meramente destinada a entorpecer o procedimento administrativo e ou tributário, a AT, para respeitar o princípio da participação apenas terá que investigar e apurar factos novos (não generalidades) alegados, que à partida se mostrem relevantes de um ponto de vista do princípio do inquisitório para a decisão do procedimento.

Ora, in casu, antes de tudo, da pronúncia prévia não consta o pedido de realização de quaisquer diligências instrutórias concretas e determinadas relativamente à prova de quaisquer factos concretos e determinados, relevantes parava decisão do procedimento.

Os próprios factos que a Impugnante alega deverem ter sido investigados, não são tanto factos como conclusões e generalidades, pelo que não se prestam a uma actividade instrutória.

Mas sobretudo, a utilidade, e até a possibilidade da prova de factos subsumíveis àquelas conclusões que compõe as sobreditas alíneas estão prejudicadas pela fundamentação do acto tributário, constante do RIT, quando se diz que não se sabe que serviços em concreto correspondem à menção de serviços de apoio a vendas de gás constantes das facturas, por isso mesmo que o seu teor é sobremaneira genérico e não foram encontrados documentos que o permitam densificar de modo a se ter por “comprovadamente” relacionado com a obtenção do lucro tributável, nem mesmo os meios de pagamento, nem a alegada compensação de créditos com saldo zero, tudo num contexto das relações de participação entre as empresas e de parentesco próximo entre os gerentes que torna ainda mais frágil uma argumentação já de si vaga e genérica.

Pelo exposto, julga este tribunal que a sentença recorrida não errou no julgamento de direito ao dar por improcedente a alegação de violação do nº 7 do artigo 60º da LGT.

8ª Questão
Errou de direito, a sentença recorrida, violando, designadamente, os artigos 23º nº 1 alª b) e 41ª nº 1 alª g) do CIRC, ao julgar as facturas em causa desconsideráveis para efeitos de IRC, apesar de elas terem todas as menções essenciais para esse efeito?

Presumimos que a Recorrente se quer referir, não ao artigo 41º, mas ao artigo 42º do CIRC.

Dir-se-ia que importaria discutir, antes de mais, a questão de saber se as facturas em causa tinham todas as menções essenciais para que os respectivos custos fossem considerados.

Porém cumpre fazer uma clarificação.
Não se trata aqui, em sede de IRC, de saber se as facturas continham requisitos essenciais ou não, isso é irrelevante.
Trata-se, sim, de saber se os custos, tal como surgem documentados nas facturas em causa e na restante contabilidade, podiam e deviam ser considerados dedutíveis.

Na verdade, a dedutibilidade dos custos para efeitos de IRS não depende, como sucede com o IVA, de estarem mencionados numa factura ou em documento equivalente que satisfaça certos requisitos formais.

A norma geral sobre a relevância e dedutibilidade dos custos ou perdas extrai-se do da conjugação do artigo 23º nº 1, cujo corpo tem o seguinte teor:
- Consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, nomeadamente os seguintes:”; com a alínea g) do nº 1 do artigo 42º do mesmo CIRC que reza assim:
1 - Não são dedutíveis para efeito de determinação do lucro tributável os seguintes encargos, mesmo quando contabilizados como custos ou perdas do exercício (…) g) Os encargos não devidamente documentados e as despesas confidenciais” (redacção anterior à introduzida pela Lei nº 67-A/2007 de 31/12).

Assim, independentemente da qualidade da factura, tudo o que é necessário é que os custos tenham ocorrido, estejam devidamente documentados e tenham sido “comprovadamente” indispensáveis para a manutenção da fonte produtora.

Segue-se, no artigo 23º nº 1, uma enumeração exemplificativa, em cuja alª b) a Impugnante encontra (sem explicitar o motivo, aliás) o conceito em que subsumir as despesas em causa, cuja descrição, nas facturas, consiste na expressão “serviços prestados de apoio ás vendas de gás”.

A AT, conclui que, na ausência de qualquer documentação que permitisse caracterizar tais serviços de apoio, no contexto do parentesco entre pessoas singulares e participação entre as sociedades, estava demonstrada a dispensabilidade destes custos e, portanto, excluída a sua dedutibilidade.

Poe sua vez, a sentença recorrida entendeu que a AT, atentas a ambiguidade daquela expressão, a ausência de outros elementos de prova documental e as relações de participação entre as empresas emissora e tomadora e de família entre os sócios gerentes, havia fundados motivos para se duvidar da indispensabilidade; e que a Impugnante, onerada, por isso, (75º nº 2 da LGT), com a alegação e a prova dos factos de que se pudesse concluir pela indispensabilidade, não se desonerou de tal, donde resultou concluir-se pela não prova da indispensabilidade e consequente desconsideração dos custos.

Quanto à inexistência de documentos, a Impugnante alega que nada na lei obriga a que contratos como os subjacentes às facturas em causa sejam escritos, nem que haja uma folha de obra relativamente a esses trabalhos; e que a compensação de créditos – com que justifica a falta de vestígios dos meios de pagamento das facturas – não tem que ser, também ela, objecto de documento. Alega que ofereceu e produziu abundante prova testemunhal de factos de que resultava a essencialidade dos serviços em causa, para a manutenção da fonte produtora.

Antes de mais há que recordar que não se provaram os factos A a D supra descritos – se era nesses que a Impugnante via a alegada indispensabilidade.

Depois, e de qualquer modo, a prova testemunhal só a título complementar, relativamente a documentos contabilisticamente relevantes, poderia aqui ser útil.

A propósito da prova testemunhal, quanto a este objecto, isto é, de factos de que resulte a “comprovada indispensabilidade” dos custos, ocorre citar o acórdão recentemente emitido por este TCA (25 de Março do corrente ano), no processo nº 562/12.0BEPRT, em que se discutia a comprovada indispensabilidade de gastos com viagens pela Europa – estas, aliás, bem mais concretas e documentadas do que os “serviços prestados” aqui sub judicibus:
«Neste contexto a prova testemunhal, sendo um dos meios de prova admissível em direito, na demonstração das despesas ou custo, não se basta se não se ancorar em outra prova objectiva e mais segura, por exemplo, assente em documentos registados na contabilidade da empresa, como actas ou acordos de parcerias, consabido que no âmbito da contabilidade e fiscalidade os factos esteiam-se no campo documental, (principio da documentação art. 23.º, n.º1, 115.º e 121.º do CIRC) sendo a prova testemunhal complementar, atendendo, nomeadamente, ao seu carácter mais volátil, naturalmente, ligada às contingências da incerteza e inconstância.
(…)
De resto, importa ainda sublinhar que a obrigação de documentação fiscal assume igualmente uma função probatória, na medida em que, permite comprovar os encargos ou custos para efeitos de rendimento tributável, sendo o dever de documentação e de os exibir à administração uma forma de concretização do dever de cooperação do contribuinte para com a administração, permitindo, a partir deles, aferir a sua relação com actividade produtiva da empresa.
Neste sentido, se retira da fundamentação, ainda que respeitante a outra questão, do acórdão do STA de 9-10-2019, ao referir-se ao art. 17.º do CIRC: A regra aí consagrada é a de que o lucro tributável é apurado a partir do resultado contabilístico, mas não se identifica com este, cabendo depois realizar ainda um conjunto de correcções que permitam transportar para a base tributável apenas aquilo que deva reconduzir-se aos já mencionados proveitos e custos em sentido económico e, ainda, no que respeita aos custos, apenas aqueles que, segundo o critério subjacente ao artigo 23.º do CIRC, na versão em vigor em 2008, sejam “comprovadamente indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora” entre os quais se incluíam os “encargos de natureza financeira, como (…) diferenças de câmbio (…)” (artigo 23.º, n.º 1, al. c do CIRC).
Se a demonstração do encargo é particularmente difícil incumbe mostrar a razão dessa dificuldade para que se possa então substituir provas mais seguras por provas menos seguras.
Na verdade, nada disto foi empreendido pela recorrente que apresentou documentação que não lhe permitia evidenciar o carácter de indispensabilidade dos gastos, ou, não a apresentou, e, com isso, accionar a sua dedutibilidade, por sua vez, a prova testemunhal não permitiu, nem permite, colmatar o que aquela não evidenciou.
Nesta vertente de gastos a recorrente apela ainda no que respeita às viagens na Europa haveria que assimilar o raciocínio da sentença nos gastos com viagens ao Brasil.
Todavia, como decorre do que se vem expondo, nos custos com viagens na Europa falharam os elementos objectivos da indispensabilidade das mesmas, pois que não se encontra qualquer evidencia de que as mesmas ocorreram por necessidade ou objectivo da actividade empresarial.
Por conseguinte, a prova testemunhal produzida, nos moldes em que decorreu, está longe de poder colmatar a inexistência de dados objectivos de política expansionista pelos países da europa e que as viagens estavam acopladas a tal desígnio da empresa.
Com efeito, sendo insofismável que um custo indispensável não tem de ser um custo que directamente implique a obtenção de proveitos, aliás em concordância com a jurisprudência maioritária [bem como da doutrina que se debruça sobre esta temática] não tem de haver uma conexão, do tipo causa-efeito, entre custos e proveitos, pelo que, ambas se vêm afastando da visão finalística da indispensabilidade [enquanto requisito para que os custos sejam aceites como “custos fiscais”] todavia, o gasto tem de se apresentar conexionado com a empresa com a sua expansão ou divulgação de tal modo que não deixe de estar relacionado com a sua actividade o que, como é evidente, implica estar corporizado em dados que estabeleçam essa ligação. Há um dever de motivação ou explicação acerca da congruência económica da operação que terá de estar respaldada em qualquer elemento objectivo.
Um custo será aceite fiscalmente num juízo reportado ao momento em que é efectuado e seja adequado à estrutura produtiva da empresa e à obtenção de lucros, não pode é ser contraído no interesse que não seja dela ou, dito de outro modo, não se inscrever tal custo no âmbito da sua actividade, antes na prossecução de objectivos alheios, pois que, accionando as regras da experiência se concluiu que não se inscreve naquela actividade, ainda que de forma mediata.
Assim, improcede o erro de julgamento de facto imputado à decisão recorrida.»

No nosso caso, o sentido deste arrazoado é tanto mais flagrante quanto não há qualquer rasto documental dos serviços prestados, para além das facturas, e a descrição, nestas, da despesa ou da causa da despesa é tão genérica e polissémica que pode ser tudo e quase nada.

Como assim, bem andou a sentença recorrida em não ter julgado procedente a impugnação, apesar de as facturas conterem, além dos demais elementos, como descrição do seu objecto, a expressão “serviços prestados de apoio às vendas de gás”.

Visto o exposto, improcedem todas as alegações em que a Recorrente arcava a sua pretensão recursiva, pelo que o recurso haverá de improceder.

Dispositivo

Pelo exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal em julgar improcedente o recurso.
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Custas pela Recorrente: artigo 527º do CPC.
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Porto, 13/5/2021

Tiago Afonso Lopes de Miranda
Ana Patrocínio
Cristina Travassos Bento