Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:03015/18.9BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:12/20/2019
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Frederico Macedo Branco
Descritores:CADUCIDADE DO CONTRATO DE TRABALHO A TERMO RESOLUTIVO INCERTO; INTERNATOS MÉDICOS;
Sumário:1 – -Não é devida qualquer compensação pela cessação, por caducidade, de contrato de trabalho a termo resolutivo incerto, no âmbito dos “internatos médicos” dada a natureza jurídica destes enquanto período de formação especializada, “tendo na sua base necessidades formativas do contratado”;

2 - Não se verifica qualquer similitude entre a contratação precária e a razão de ser da consagração da compensação atribuída pela caducidade e a caducidade do título de vinculação sob o qual se desenvolvem os internatos médicos;

3 - Os internatos médicos, como processos de formação especializada tendentes à obtenção de uma habilitação profissional, promovida pela Administração da Saúde, têm as suas vicissitudes - geradoras de eventual caducidade - associadas ao próprio desempenho do formando, que pode lograr uma avaliação positiva ou não e, naquele caso, pode lograr elegibilidade em concurso de recrutamento associado ao seu ciclo de formação ou a outros, e não estão relacionados com qualquer processo de formação de vontade para a denúncia e consequente caducidade do vínculo por parte da Administração Pública;*
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:Administração Regional de Saúde do Norte IP
Recorrido 1:A. M. C. P.
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:I Relatório
A Administração Regional de Saúde do Norte IP, no âmbito da Ação Administrativa intentada por A. M. C. P. tendente ao pagamento de 9.299,52€ a título de compensação pela caducidade do contrato de trabalho em funções públicas a termo resolutivo incerto, inconformada com a Sentença proferida em 28 de maio de 2019 que julgou a ação procedente, veio interpor recurso jurisdicional da referida decisão, em 1 de julho de 2019, tendo apresentado as seguintes conclusões:
“1ª Não é devida qualquer compensação pela cessação, por caducidade ou desvinculação, de contrato de trabalho a termo resolutivo sob o qual atualmente se titulam os "internatos médicos", dada a natureza jurídica destes enquanto período de formação especializada e «tendo na sua base necessidades formativas do contratado» (daquele Acórdão do TCAN de 15-07-2015) e não outros fundamentos;
2ª Essa natureza jurídica não tem qualquer paralelo com a da contratação a termo resolutivo amplamente prevista no Código do Trabalho e admitida na Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (Lei nº 35/2014, de 20-6) estando claramente expressa no regime jurídico do internato médico, desde a constante do Dec-Lei nº 203/2004, de 18-8 aplicável ao caso dos autos e constituindo um regime especial;
3ª Nem existe qualquer paralelismo entre os regimes constantes dos artigos 56º a 60º da LGTFP e o das normas do regime do internato médico que regulam a situação (vg os dos artigos 24º e 25º do diploma na reforma de 2009, Dec-Lei nº 45/2009, de 13-02) em particular quanto ao papel da vontade da Administração para a cessação do vínculo;
4ª Não se verificando, como a jurisprudência assinala, nenhuma similitude entre a contratação precária e a razão de ser da consagração da compensação atribuída pela caducidade e a caducidade/desvinculação do título de vinculação sob o qual se desenvolvem os internatos médicos;
5ª Acresce que os internatos médicos, como processos de formação especializada tendentes à obtenção de uma habilitação profissional, promovida pela Administração da Saúde, têm as suas vicissitudes - geradoras de eventual cessação do vínculo - associadas ao próprio desempenho (mérito) do formando, que pode lograr uma avaliação positiva ou não e, naquele caso, pode lograr elegibilidade em concurso de recrutamento associado ao seu ciclo de formação ou a outros;
6ª E não estão relacionados com qualquer processo de formação de vontade para a denúncia omissiva e consequente caducidade do vínculo por parte da Administração Pública, até pela particular natureza da relação de emprego público;
7ª Até por que o termo desse título contratual está clara e rigidamente estabelecido na lei, associado ao merecimento da avaliação e não a outra e diferente ponderação da Administração Pública;
8ª O médico interno é "informado" da caducidade do vínculo, por ter ocorrido o facto correspondente - a não elegibilidade do médico no concurso a que se candidatara - sem qualquer protagonismo ou contributo (por ato ou omissão) da Administração, mas igualmente informado não sendo modificativa da relação essa comunicação;
9ª Com a devida vénia, é pelo facto de o contrato a termo resolutivo detido pelo médico se ter fundado na titulação do internato médico, enquanto período de formação especializada tutelada pela Administração que tal natureza o exclui de todas as regras gerais da contratação a termo resolutivo, incluindo a da previsão de atribuição de qualquer compensação pela respetiva cessação;
10ª A ter decidido como o fez, não obstante a procura de apoio jurisprudencial, e o seu mérito intrínseco, violou a douta decisão recorrida as normas dos artigos 24º e 25º do DL 203/2004, na redação dada pela reforma de 2009 (DL 45/2009), bem como as dos artigos 56º a 61º da LGTFP, ao admitir subsumíveis a estas o regime especial da titulação dos internatos médicos.
Termos em que, e nos melhores de direito do douto suprimento do Tribunal, na atendibilidade das precedentes conclusões, deve o presente recurso ser julgado provado e procedente, com as legais consequências, vg de revogação da douta sentença recorrida, assim se fazendo JUSTIÇA!”

O Recorrido/A. P. veio a apresentar as suas Contra-alegações de Recurso em 13 de setembro de 2019, aí tendo concluído:
“A. Pela presente ação o Recorrido requereu a condenação da Recorrente ao reconhecimento do direito à compensação prevista nos termos do disposto na cláusula nona do contrato de trabalho a termo resolutivo incerto celebrado a 30.01.2012, em consequência da caducidade do contrato e a condenação ao pagamento da compensação, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, a liquidar a final.
B. Por sentença proferida a 1.06.2019, este Tribunal Julgou “a ação procedente e, consequentemente, condena-se a Recorrente a pagar ao Recorrido a quantia de €9.299,52 (nove mil, duzentos e noventa e nove euros e cinquenta e dois cêntimos) a título de compensação pela caducidade do contrato de trabalho em funções públicas a termo resolutivo incerto, acrescida de juros vencidos até 30.11.2018 no valor de € 340,39 (trezentos e quarenta euros e trinta e nove cêntimos) e vencidos a partir de então e vincendos.”
C. Inconformada com o teor da decisão, a Recorrente recorreu alegando essencialmente o seguinte: Não é devida qualquer compensação pela cessação, por caducidade ou desvinculação, de contrato de trabalho a termo resolutivo sob o qual atualmente se titulam “os internatos médicos”, dada a natureza jurídica destes enquanto período de formação especializada e “tendo na sua base necessidades formativas do contratado”.
D. Mais ainda dispõe que “a ter decidido como o fez, não obstante a procura de apoio jurisprudencial, e o seu mérito intrínseco, violou a douta decisão recorrida as normas dos artigos 24º e 25º do DL 203/2004, na redação dada pela reforma de 2009 (DL 45/2009), bem como as dos artigos 56º a 61º da LGTFP, ao admitir subsumíveis a estas o regime especial da titulação dos internatos médicos.”
E. Ora, com tal entendimento não pode o Recorrido conformar-se, porquanto não lhe assiste razão!
F. O Recorrido foi contratado pela Recorrente, a termo resolutivo incerto para que, no âmbito do internato médico, sob autoridade e direção da entidade titular ao serviço do qual foi colocado, independentemente da sua natureza jurídica, sem prejuízo da autonomia técnica inerente à atividade contratada, desempenhe as funções correspondentes às de Médico Interno.
G. O Recorrido trabalhou durante a vigência do contrato supra referido, um período de 40 horas semanais.
H. Nos termos do aludido contrato foi fixada uma remuneração base de acordo com o disposto nos termos do artigo 214º do RCTFP.
I. De acordo com o disposto na cláusula 9ª do contrato “o contrato caduca quando, prevendo-se a ocorrência do termo incerto a ele aposto, o Primeiro Outorgante comunica ao Segundo Outorgante a cessação do mesmo, com a antecedência mínima de trinta ou sessenta dias, conforme o contrato tenha duração até dois anos ou duração superior, respetivamente.”
J. Mais dispõe, o n.º 3 do mesmo clausulado que “a caducidade do contrato confere ao segundo outorgante o direito a receber uma compensação de valor correspondente a dois dias de retribuição base por cada mês de duração do vínculo” — documento este junto aos autos e não impugnado.
K. Sendo que, o contrato em causa terminou, por caducidade, a 31.12.2017, ou seja, cerca de 8 (oito) meses após o final da formação, isto é, a aquisição pelo Recorrido do título de Médico especialista.
L. Porquanto se o contrato em causa tivesse por objeto apenas a formação como especialista, assim que terminada teria operado a caducidade, o que não se verificou, in casu.
M. Ou seja, o Médico adquiriu o título de Especialista em Abril de 2017 e o contrato manteve-se em vigor até Dezembro de 2017.
N. Sendo que neste período e como veio a suceder durante os 5 anos de internato, o Médico tinha plena autonomia e independência do seu trabalho.
O. Nesta medida não se vislumbra que possa ser procedente o entendimento da Recorrente, na medida em que sufraga que o Recorrido não tem direito a compensação porque o contrato tem uma natureza jurídica de formação.
P. Já que a lei aplicável ao caso concreto, nomeadamente, os contratos de trabalho em funções públicas não dispõe que os contratos a termo resolutivo incerto não sejam objeto de compensação aquando da caducidade.
Q. Assim, e conforme consta da douta sentença proferida pelo Tribunal a quo, foi intenção do legislador compensar a incerteza da duração e precariedade associada a este tipo de contrato, o que necessariamente acarreta ansiedade e angústia ao trabalhador, consagrando, por isso, a norma legal, o direito a uma compensação.
R. Na verdade, se a contratação de médicos internos por hospitais, tivesse como único propósito formar os licenciados em medicina, conferindo-lhe instrumentos, capacidade e formação adequada, que sentido faria o pagamento de uma retribuição, bem como o pagamento de férias, subsídio de férias e subsídio de natal.
S. Acresce ainda e por último que, se fosse esse o entendimento do legislador que sentido faria qualificar os contratos dos médicos internos como contratos de trabalho em funções públicas a termo resolutivo incerto.
T. Destarte, nenhuma censura merece a decisão proferida pelo Tribunal a quo, não tendo, pois, violado qualquer dispositivo legal nem qualquer princípio geral do direito, pelo que deve a mesma ser mantida.
U. Deste modo o fundamento do presente recurso deveria ser julgado totalmente improcedente, mantendo o decidido na sentença recorrida.
Nestes termos e nos melhores de direito, requer-se a V. Exª se digne a julgar o recurso improcedente e confirmar a decisão recorrida só assim se faz a inteira e sã justiça!”

Por Despacho de 4 de outubro de 2019 foi admitido o recurso interposto.

O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado em 8 de novembro de 2019, nada veio dizer, requerer ou Promover.

Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.

II - Questões a apreciar
Importa apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA, onde se suscita, designadamente, o facto da decisão proferida contrariar o regime do internato médico.

III – Fundamentação de Facto
O Tribunal a quo considerou a seguinte factualidade:
“1) Em 30.01.2012, o Autor celebrou com a Ré um contrato de trabalho a termo resolutivo incerto, referente ao Internato Médico 2012-A. que constitui o documento n.º 1 junto com a petição inicial.
2) O contrato teve início em 01.01.2012 (documento n.º 1 junto com a petição inicial).
3) O Autor foi contratado pela Ré, a termo resolutivo incerto para que, no âmbito do internato médico, sob autoridade e direção da entidade titular ao serviço do qual foi colocado, independentemente da sua natureza jurídica, sem prejuízo da autonomia técnica inerente à atividade contratada, desempenhe as funções correspondentes às de médico interno.
4) À data da cessação do contrato de trabalho a remuneração base era de € 1.937,38 (mil novecentos e trinta e sete euros e trinta e oito cêntimos) (documento n.º 2 junto com a petição inicial).
5) O referido contrato caducou em 28.12.2017 (documento n.º 3 junto com a petição inicial; fls. 11 do p.a.).
6) Nessa data foram pagos ao Autor os créditos salariais correspondentes ao subsídio de Natal, férias e subsídio de férias (fls. 9 do p.a.).
7) No entanto e quanto à compensação pela caducidade do contrato, nada foi pago ao Autor.”

IV – Do Direito
Decidiu-se em 1ª Instância julgar “a presente ação procedente e, consequentemente, condenando-se a R. a pagar ao A. a quantia de €9.299,52 a título de compensação pela caducidade do contrato de trabalho em funções públicas a termo resolutivo incerto, acrescida de juros vencidos até 30.11.2018 no valor de €340,39 e vencidos a partir de então e vincendos.”

Foi o seguinte o discurso fundamentador da decisão Recorrida:
“Importa aferir se ao contrato de trabalho a termo resolutivo incerto a que se refere o Decreto-Lei n.º 45/2009, de 13 de Fevereiro, se aplica o mesmo regime que aos contratos a termo resolutivo incerto, referidos pela Lei n.º 35/2014 de 20 de junho
É o seguinte o art.º 294º deste diploma legal que tem como epígrafe “caducidade do contrato de trabalho em funções públicas a termo incerto”:
1 - O contrato de trabalho em funções públicas a termo incerto caduca quando, prevendo-se a ocorrência do termo, o empregador público comunique ao trabalhador a data da cessação do contrato, com a antecedência mínima de sete, 30 ou 60 dias, conforme o contrato tenha durado até seis meses, de seis meses até dois anos ou por período superior, respetivamente.
2 - Tratando-se da situação prevista na alínea i) do n.º 1 do artigo 57.º, que dê lugar à contratação de vários trabalhadores, a comunicação a que se refere o número anterior deve ser feita, sucessivamente, a partir da verificação da diminuição gradual da respetiva ocupação, com a aproximação da conclusão do projeto para o desenvolvimento do qual foram contratados.
3 - A falta da comunicação a que se refere o n.º 1 implica para o empregador público o pagamento da remuneração correspondente ao período de aviso prévio em falta.
4 - A caducidade do contrato confere ao trabalhador o direito a uma compensação calculada nos termos previstos no Código do Trabalho para os contratos a termo incerto.
Diga-se desde já que não se vêm razões para que ocorra tratamento diferente nas duas situações. Aliás, o Decreto-Lei n.º 45/2009, de 13 de Fevereiro veio referir que os internatos médicos passavam a ser exercidos através de contrato a termo resolutivo incerto e não através de contrato administrativo de provimento como até aí, por motivo da entrada em vigor de grandes reformas operadas quanto aos trabalhadores da Administração Pública com a entrada em vigor das Leis n.ºs 12-A/2008, de 27 de Fevereiro e 59/2008, de 11 de Setembro, tendo deixado de existir no ordenamento jurídico nacional, nesta altura, os contratos administrativos de provimento.,
Sobre esta questão, já se tinha debruçado anteriormente também o Tribunal Central Administrativo Norte no processo n.º 01680/13.2BEPRT, de 15-07-2015, cujo discurso fundamentador refere o seguinte:
De acordo com o artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 203/2004, de 18/08, na redação vigente à data em que a Autora iniciou o seu internato médico (ano de 2005), «Após a licenciatura em Medicina, inicia-se o internato médico, que corresponde a um processo único de formação médica especializada, teórica e prática, tendo como objetivo habilitar o médico ao exercício diferenciado na respetiva área profissional de especialização».
Com vista à realização do internato médico, o artigo 13.º desse diploma estipulava que os médicos internos eram providos por contrato administrativo de provimento ou por nomeação em regime de comissão de serviço extraordinária, caso fossem funcionários públicos.
No caso, é inquestionável que o contrato celebrado em 01 de janeiro de 2005 entre a Autora e o Hospital de SJ constituía, tal como nele se refere, um contrato administrativo de provimento, modalidade contratual através da qual se assegurava o exercício de funções próprias do serviço público que não revestissem caráter de permanência.
Na cláusula 3.ª desse contrato estipulou-se que a autora se obrigava «a assegurar, com carácter de subordinação, o exercício de funções correspondentes à sua categoria, com sujeição ao regime Jurídico da Função Pública» e, na cláusula 4.ª que a mesma ficava «colocada no Hospital de SJ nos termos do artigo 13.º do Dec.Lei n.º 203/2004…».
Entretanto, conforme se sabe, entraram em vigor as Leis n.ºs 12-A/2008, de 27/02 [LVCR] e 59/2008, de 11/09 [RCTFP], com as quais a modalidade de contrato administrativo de provimento deixou de existir no ordenamento jurídico nacional.
Com efeito, de acordo com o artigo 9.º, n.º1 da LVCR, a relação jurídica de emprego público passou a constituir-se por nomeação ou por contrato de trabalho em funções públicas, podendo ainda estabelecer-se, nos termos previstos no n.º4 desse preceito, por comissão de serviço quando se trate «a) Do exercício de cargos não inseridos em carreiras, designadamente dos dirigentes; b) Da frequência de curso de formação específico ou da aquisição de certo grau académico ou de certo título profissional antes do período experimental com que se inicia a nomeação ou o contrato para o exercício de funções integrado em carreira, em ambos os casos por parte de quem seja sujeito de uma relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado constituída previamente».
Por sua vez, no artigo 91.º da mesma lei determinou-se que os trabalhadores com contrato administrativo de provimento transitam para uma das modalidades previstas nas alíneas a), b), c) ou d) do n.º1 dessa norma, entre as quais [cfr.alínea d)] se inscreve a modalidade de contrato a termo resolutivo certo ou incerto, a processar-se de acordo com a natureza das funções exercidas e da previsível duração do contrato.
Entretanto foi publicado o Decreto-Lei n.º 45/2009, de 13/02, que procedeu à terceira alteração ao Decreto-Lei n.º 203/2004, de 18 de Agosto [diploma que define o regime jurídico da formação médica, após a licenciatura em Medicina, com vista à especialização, e estabelece os princípios gerais a que deve obedecer o respetivo processo], em cujo preâmbulo se escreve que a impossibilidade de celebrar novos contratos administrativos de provimento impõe a definição de uma nova forma de vinculação daqueles internos, que iniciarão o 1.º ano do internato médico a 1 de Janeiro de cada ano civil, a qual passará pela celebração de um contrato de trabalho em funções públicas com a administração regional de saúde ou com as Regiões Autónomas, na modalidade de contrato a termo resolutivo incerto ou, no caso de o interno ser titular de uma relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado constituída previamente, mediante comissão de serviço, que vigorará pelo período de duração estabelecido para o respetivo programa de formação médica especializada, incluindo repetições e interrupções. O Decreto-Lei n.º 45/2009 manteve a noção de internato médico que já constava da versão inicial do D.L. 203/2004, mas no seu artigo 13.º, sob a epígrafe “ Vinculação dos médicos internos” passou a dispor que:
Por sua vez, no seu artigo 17.º, n.º1 estipula-se que «Aos médicos internos é aplicado, com as exceções previstas nos números seguintes, o regime de férias, faltas e licenças em vigor no regime do contrato de trabalho em funções públicas para os trabalhadores em contrato de trabalho a termo resolutivo incerto». Por força das referidas alterações legislativas, a autora transitou de uma relação de trabalho titulada por um contrato administrativo de provimento para uma relação de trabalho na modalidade de contrato de trabalho em funções públicas a termo resolutivo incerto. De acordo com o artigo 1.º, n.º1 da Portaria n.º 251/2011, de 24/06, que aprovou o Regulamento do Internato Médico (doravante RIM), «O internato médico rege-se pelo disposto no Decreto-Lei n.º 203/2004, de 18 de Agosto, na redação introduzida pelos Decretos-Leis n.ºs 11/2005, de 6 de Janeiro, 60/2007, de 13 de Março, 45/2009 de 13 de Fevereiro, e 177/2009, de 4 de Agosto, adiante designado de regime de internato médico, e pelo disposto no presente Regulamento». Estabelece também o artigo 2.º do RIM que, «O internato médico realiza-se após a licenciatura em Medicina ou após o equivalente mestrado integrado em medicina» e «corresponde a um processo de formação médica especializada, teórica e prática, tendo como objetivo habilitar o médico ao exercício tecnicamente diferenciado numa especialidade médica». E no seu artigo 49.º, sob a epígrafe “ Princípios gerais”, inserido no Capítulo VII “Regime Jurídico e condições de trabalho”, estatui que:
1- Os internos do internato médico são colocados nos locais de formação, mediante a celebração de contrato de trabalho em funções públicas na modalidade de contrato a termo resolutivo incerto ou em regime de comissão de serviço caso o médico interno seja titular de uma relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado constituída previamente.
2- Aos médicos que frequentam o internato médico aplica-se, com as exceções previstas neste Regulamento, o regime de férias, faltas e licenças, com ou sem perda de remuneração, em vigor para a carreira médica.
3-O regime de trabalho durante o internato médico implica a prestação de 40 horas por semana.
4- O horário dos médicos internos é estabelecido e programado em termos idênticos ao dos médicos integrados na carreira médica, tendo em conta as atividades específicas de cada especialidade.».
Sobre o contrato de trabalho em funções públicas a termo resolutivo incerto prevê o artigo 57.º, n.º1, al.j) da Lei n.º 35/2014, de 20/06 que pode ser aposto termo resolutivo aos contratos «Quando a formação, ou a obtenção do grau académico ou título profissional, dos trabalhadores no âmbito das entidades empregadoras públicas envolva a prestação de trabalho subordinado». É o que se passa com as carreiras médicas, cujo acesso à respetiva categoria de base pressupõe, além da habilitação académica de base (licenciatura em Medicina), a frequência e aprovação do que usualmente se designa por internato médico, e que envolve a prestação de trabalho subordinado por parte dos médicos internos. Perante o quadro legal enunciado, é inequívoco que a realização do internato médico corresponde, por um lado, a um processo de formação médica especializada, teórica e prática, cujo objetivo é habilitar o médico ao exercício tecnicamente diferenciado numa especialidade médica. E, por outro lado, a um processo que envolve a prestação de trabalho subordinado por parte do médico que se encontra nessa situação. Estas situações constituem fundamento legal para a celebração de um contrato de trabalho em funções públicas a termo resolutivo incerto, nos termos expressamente consignados no artigo 93.º, n.º1, al. j) aplicável ex vi art.º 106.º do RCTFP e artigo 13.º do Decreto-lei n.º 203/2004, de 18/08, na redação conferida pelo Decreto-Lei n.º 45/2009, de 13/02. Como tal, a situação em que o internato médico se desenvolve, dá lugar a uma relação de emprego público na modalidade de contrato de trabalho a termo resolutivo incerto, com as especificidades próprias que decorrem da natureza desse processo de formação médica. Daí não decorre que a natureza da relação de emprego criada pelo contrato de trabalho a termo resolutivo incerto no âmbito do internato médico seja diferente das demais situações enquadráveis na citada alínea j), n.º1 do artigo 93.º do RCTFP, que não deixam de ser consideradas relações de emprego público, pelo facto de terem na sua génese necessidades formativas dos contratados. Isto para significar que, caso se conclua assistir o direito à compensação pela caducidade do contrato de trabalho a termo incerto aos trabalhadores cujo contrato tenha sido outorgado com fundamento na al.j), n.º1 do art.º 93.º do RCTFP, decorrente da conclusão da formação, esse direito também não poderá deixar de assistir aos médicos internos cujo contrato a termo resolutivo incerto tenha caducado por força da conclusão do internato médico, com fundamento nas razões apontadas na decisão recorrida. Numa e noutra situação não se está perante uma típica relação de trabalho, mas perante uma relação que, tendo na sua base necessidades formativas do contratado, ainda assim se desenvolve num contexto laboral em que o formando também se encontra adstrito ao cumprimento de prestações dessa natureza, em regime de subordinação e que o legislador, no exercício dos poderes que lhe são conferidos pela Constituição, considera como constituindo uma relação de emprego público.
Com a fundamentação precedente que se sufraga tem de se concluir que não é pelo facto de o contrato a termo resolutivo certo celebrado pelo Autor ter como finalidade o cumprimento de formação relativa ao internamento médico que não se encontra o mesmo sujeito às regras estabelecidas para os demais contratos a termo resolutivo incerto.
No caso em preço encontra-se provado que o A. cessou o seu contrato em 28 de dezembro de 2017. Não se encontra aprovado, nem vem alegado, que o mesmo tenha sido prorrogado até à publicação do despacho contendo as vagas carenciada, como foi o caso do acórdão citado anteriormente. Aliás encontra-se mesmo provado que em 28 de dezembro de 2017 o Autor cessou o seu vínculo laboral. Ora, esta denúncia do contrato leva a que tenha direito à compensação referida no artigo 294º da Lei n.º 35/2014 de 20 de junho.
De referir, em primeiro lugar que, como estamos perante a caducidade de um contrato a termo incerto não é de aplicar à situação dos autos o acórdão de uniformização de jurisprudência n.º 3/2015, tirado no Proc. n.º 1473/14, datado de 17-04-2015, e publicado na 1.ª Série do DR, n.º 98, de 21 de Maio de 2015.
Por seu lado, nos termos do artigo 60º, n.º 2 da LGTFP “o contrato a termo incerto dura por todo o tempo necessário para a substituição do trabalhador ausente ou para a conclusão da tarefa ou serviço cuja execução justifica a celebração” e, de acordo com o nº 1 do artigo 294º, “caduca quando, prevendo-se a ocorrência do termo, o empregador público comunique ao trabalhador a data da cessação do contrato, com a antecedência mínima de 7, 30 ou 60 dias, conforme o contrato tenha durado até seis meses, de seis meses até dois anos ou por período superior, respetivamente”.
Verifica-se do exposto que o contrato a termo incerto mantém-se enquanto se mantiver a circunstância que motivou a sua celebração e cessa obrigatoriamente quando a mesma deixa de se verificar, ou seja, ocorrendo o termo que lhe foi aposto — cfr. nº 2, in fine, do artº 63º da LGTFP.
A entidade demandada comunicou ao A. a cessação, por caducidade, do seu contrato a termo incerto, mencionando que a cessação produziria efeitos decorridos que fossem 60 dias, ou seja, no dia 28 de dezembro de 2017.
No caso dos contratos a termo incerto, a estatuição do nº 4 do artº 294º confere ao trabalhador o direito a uma compensação calculada nos termos do Código do Trabalho para os contratos a termo incerto, compensação esta que visa atribuir uma recompensa material ao trabalhador colocado numa situação de precariedade laboral, proporcional à efetiva duração do contrato, como reconhecimento e compensação pela situação (incerta e excecional) em que exerceu funções.
No caso dos autos não tendo havido denúncia do contrato por parte do Autor este tem direito à perceção de uma compensação, nos termos referidos.
Sobre o direito à compensação no caso de trabalhadores com contrato de trabalho incerto, ver Acórdãos deste Tribunal de 29/05/2014, proferido no Proc. n.º 03400/11.7BEPRT e Acórdão de 03-06-2016, Proc. n.º 00329/12.5BEPDL.
Assim sendo, com os fundamentos expostos é de concluir que o A. tem direito à compensação referida no artigo 294.º, n.º 4 da LGTFP.

Atento até o facto do aqui relator e um dos seus adjuntos terem subscrito ambos enquanto adjuntos o Acórdão deste TCAN nº 2223/15.9BEPRT, de 23.05.2019, de objeto análogo, ainda que a ARSN, aqui Recorrente, aí surja como Recorrida, seguir-se-á o mesmo de perto, mutatis mutandis:

Desde logo, aí se sumariou:
“I - Não é devida qualquer compensação pela cessação, por caducidade, de contrato de trabalho a termo resolutivo sob o qual atualmente se titulam os “internatos médicos” dada a natureza jurídica destes enquanto período de formação especializada e “tendo na sua base necessidades formativas do contratado”;
I.1 - Não se verifica qualquer similitude entre a contratação precária e a razão de ser da consagração da compensação atribuída pela caducidade e a caducidade do título de vinculação sob o qual se desenvolvem os internatos médicos;
I.2 - Acresce que os internatos médicos, como processos de formação especializada tendentes à obtenção de uma habilitação profissional, promovida pela Administração da Saúde, têm as suas vicissitudes - geradoras de eventual caducidade - associadas ao próprio desempenho do formando, que pode lograr uma avaliação positiva ou não e, naquele caso, pode lograr elegibilidade em concurso de recrutamento associado ao seu ciclo de formação ou a outros, e não estão relacionados com qualquer processo de formação de vontade para a denúncia e consequente caducidade do vínculo por parte da Administração Pública;
(...)”

Entende o Autor aqui Recorrido que a cessação do contrato lhe confere o direito à compensação, por causa da natureza precária do vínculo.

Já a Recorrente/ARSN entende, em síntese, que “não existe direito a qualquer compensação pela caducidade do contrato de trabalho a termo resolutivo quando o mesmo constitui o título da realização do internato médico, atenta a natureza deste.

Vejamos:
O objeto dos presentes autos é constituído pelo pedido principal de condenação da Ré a pagar ao Autor a importância de €9.299,52 bem como os respetivos juros de mora vencidos no valor de €340,39 e vincendos a liquidar a final, em decorrência da caducidade do contrato de trabalho de emprego público a termo resolutivo incerto celebrado entre as partes.

Entende-se que os “internatos médicos”, ainda que enquadrados enquanto contrato de trabalho a termo resolutivo incerto, e anteriormente sob contratos administrativos de provimento, mas porque vigoram durante um período de formação, de estágio profissional pré-carreira, para obtenção do grau de 'assistente', não conferem direito a qualquer compensação, que é privativa dos contratos de trabalho a termo, certo ou incerto, que se constituam desligados de qualquer 'formação' ou 'estágio' e, pelo contrário, representem contratação precária em si mesma - cfr. o Acórdão deste TCAN de 15/7/2015, no âmbito do proc. 1680/13.2 BEPRT.

Sempre se dirá que não faria sentido a aplicação das regras do art.º 253.º do RCTFP, pois, se assim fosse, tal significaria que a entidade empregadora estaria obrigada a comunicar a cessação do contrato 60 dias antes da conclusão do internato.

É incontornável e insofismável que a conclusão do internato está dependente da aprovação final do médico interno, nos termos do regulamento do internato médico, sendo que a Administração desconhece se tal se virá a concretizar.

Assim sendo, nunca a Administração sabe qual o termo previsível do contrato (máxime, porque a conclusão do internato nem sequer depende da sua vontade, mas da aprovação nas provas finais).

Por outro lado, o internato pode cessar por causas distintas da aprovação (daí a previsão do art.º 25.º do Decreto-Lei n.º 203/2004, de 18.08).
Aí se refere (Sublinhado nosso):
“Cessação do contrato
1 - A falta de aproveitamento nas avaliações previstas no n.º 1 do artigo 22.º, após as repetições admitidas nos termos do artigo anterior, determina a cessação do contrato e da comissão de serviço extraordinária e a consequente desvinculação do interno.
2 - A não comparência às provas de avaliação contínua que requeiram a presença do interno determina também a cessação do contrato ou da comissão de serviço extraordinária, salvo se justificada nos termos do n.º 2 do artigo anterior.
3 - A não realização da avaliação final do internato médico, na data estabelecida para o efeito, determina a cessação do contrato ou da comissão de serviço extraordinária, salvo se justificada pelos motivos a que se refere o número anterior, devidamente comprovados perante o respetivo júri e por ele justificados.
4 - Determina, igualmente, a cessação do contrato administrativo de provimento ou da comissão de serviço extraordinária a não apresentação do interno nas situações e prazos referidos no n.º 2 do artigo 14.º
5 - Nos casos de cessação do contrato ou da comissão de serviço extraordinária, a avaliação final pode ser realizada, posteriormente, mediante requerimento do interessado dirigido ao diretor-geral do DMRS.”

Mesmo nestes casos, o legislador utiliza sempre a fórmula “determina a cessação”, impondo a cessação do vínculo estabelecido independentemente da vontade da entidade pública que outorga o contrato.

Essa é, com efeito, outra das razões pelas quais tendemos a considerar que não existe, neste caso, direito a compensação. É que a cessação do vínculo não está dependente da vontade da entidade empregadora. Por força da lei, ela está obrigada a fazer cessar o contrato logo que o internato cesse.

Trata-se de uma especificidade do regime do internato médico e um desvio à regra do Artº 253º do Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas –RCTFP, que prevê no seu nº 4 que “A caducidade do contrato confere ao trabalhador o direito a uma compensação ...”.

Nos termos deste normativo, para que a caducidade opere, mostra-se necessária a comunicação por parte da entidade empregadora.
No caso do Internato médico, o termo do contrato ocorre ope legis, sem sequer ser necessário que tal seja comunicado, bastando que o internato termine.

Entende o Autor, aqui Recorrido que a cessação do contrato lhe confere o direito à compensação, por causa da natureza precária do vínculo, sendo que esse entendimento não encontra respaldo no regime do internato médico onde se assinala nas suas linhas normativas essenciais que não estamos perante um tipo de “contratação precária” que o legislador do Código do Trabalho pretende combater, mas perante um quadro jurídico próprio da “formação médica especializada” realizada com avaliação própria e emissão de título habilitacional.

Aliás, a referida formação clinica tem módulos próprios, e uma avaliação contínua e regular, da qual pode inclusivamente resultar uma reprovação, e a consequente caducidade imediata da relação contratual.

O referido regime não tem qualquer paralelo com a contratação resolutiva a termo.

Como se sumariou no Acórdão deste TCAN de 15/7/2015, proc. 01680/13.2BEPRT: “I - A realização do internato médico corresponde a um processo de formação médica especializada, teórica e prática, cujo objetivo é habilitar o médico ao exercício tecnicamente diferenciado numa especialidade médica, envolvendo a prestação de trabalho subordinado por parte do médico que se encontra nessa situação.
II - A relação jurídica de emprego público estabelecida com os médicos internos, sob a forma de contrato administrativo de provimento, passou a ser, por força do art.º 13.º do DL 45/2009, que alterou DL n.º 203/2004, uma relação de trabalho titulada por um contrato de trabalho a termo resolutivo incerto.
III - Os contratos de trabalho a termo resolutivo incerto, celebrados com os médicos internos, são automaticamente prorrogados até à publicação do despacho contendo as vagas carenciadas, momento a partir do qual, o contrato cessa, sem direito a qualquer compensação, caso os mesmos não concorram a nenhuma das vagas existentes.

A caducidade do vínculo de emprego público, ao contrário do que ocorre com a caducidade do contrato a termo previsto e regulado em geral no Código do Trabalho, não carece de declaração de vontade do empregador público. Ou seja, a caducidade opera nos termos gerais e de acordo com o regime característico da sua natureza própria, isto é, ope legis.

Tal significa que, enquanto no direito laboral o silêncio do declarante (empregador) implica, como efeito jurídico, a prorrogação do vínculo de contrato de trabalho a termo resolutivo por igual período (chegando à conversão do contrato nas prorrogações silentes sucessivas) no direito do emprego público o silêncio implica a plena operatividade da caducidade e só uma declaração expressa renova o vínculo.

Na verdade, dispõe o Código do Trabalho, no artigo 149º/2, que “na ausência de estipulação a que se refere o número anterior e de declaração de qualquer das partes que o faça cessar, o contrato renova-se no final do termo, por igual período se outro não for acordado pelas partes.”; e o artigo 345º/1 estatui que “o contrato de trabalho a termo incerto caduca quando, prevendo-se a ocorrência do termo, o empregador comunique a cessação do mesmo ao trabalhador, com a antecedência mínima de sete, 30 ou 60 dias conforme o contrato tenha durado até seis meses, de seis meses a dois anos ou por período superior.”

Diferentemente refere o artº 61º/1 da LGTFP que “o contrato a termo certo não está sujeito a renovação automática”, estipulando o artº 293º/1 que “o contrato de trabalho em funções públicas a termo certo caduca no final do prazo estipulado, desde que o empregador público ou o trabalhador não comuniquem, por escrito, até 30 dias antes de o prazo expirar, a vontade de o renovar”.

Como facilmente se constata a situação dos autos é diferente.

É certo que no caso dos internatos médicos a própria lei consente que o internato, depois de obtido o grau de 'assistente' se prolongue e o vínculo se mantenha até um termo ad quem que é constituído ou pela não candidatura do titular ao concurso de recrutamento que seja aberto ou, tendo-o sido, até à seleção ou exclusão ou não colocação em lugar elegível.
Ou seja, aquilo que os hospitais fazem é “informar”/avisar os interessados de que o contrato caducou pela ocorrência/verificação do facto em si mesmo, não sendo a “declaração de vontade” que faz operar a caducidade.

É certo que a norma do artº 294º/1 da LGTFP estabelece, na linha da legislação que a antecede, que “o contrato de trabalho em funções públicas a termo incerto caduca quando, prevendo-se a ocorrência do termo, o empregador público comunique ao trabalhador a data da cessação do contrato, com a antecedência mínima de sete, 30 ou 60 dias, conforme o contrato tenha durado até seis meses, de seis meses até dois anos ou por período superior, respetivamente.” Tal aparentemente mostraria que é na vontade do empregador público que se acha a génese do desencadeamento da caducidade.

Em qualquer caso, não é essa a situação dos internatos médicos.

Com efeito, o internato médico termina sempre por facto imputável ao médico interno:
i) ou pela reprovação final e consequente não obtenção do grau;
ii) ou pela obtenção do grau e não candidatura aos concursos de recrutamento próprios de cada ciclo de estágio;
iii) ou pela não elegibilidade em concursos dessa natureza, e não por facto associado à vontade da entidade empregadora pública.

A própria lei geral do Trabalho tem sido interpretada no sentido de apenas haver lugar à atribuição da compensação pela caducidade do contrato de trabalho a termo quando o trabalhador vê cessar o vínculo 'contra' a sua vontade, o que não é o caso do internato clinico.

Em face do que precede, entende-se que não é devida qualquer compensação pela cessação, por caducidade, de contrato de trabalho a termo resolutivo sob o qual se titulam os “internatos médicos” dada a natureza jurídica destes enquanto período de formação especializada, “tendo na sua base necessidades formativas do contratado”;

A natureza jurídica do internato clinico não tem qualquer paralelo com a contratação a termo resolutivo prevista no Código do Trabalho e admitida na Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (Lei 35/2014, de 20 de junho) estando expressa no regime jurídico do internato médico, constante do DL 203/2004, de 18 de agosto, enquanto conjunto normativo de natureza especial.

Acresce que não se verifica qualquer similitude entre a contratação precária e a razão de ser da consagração da compensação atribuída pela caducidade e a caducidade do título de vinculação sob o qual se desenvolvem os internatos médicos.

Os internatos médicos, enquanto processos de formação especializada tendentes à obtenção de uma habilitação profissional, promovida pela Administração da Saúde, têm especificidades e vicissitudes próprias, que quanto à caducidade contratual estão associadas ao próprio desempenho do formando, na qual poderá obter uma avaliação positiva ou negativa, sendo que naquele caso, pode almejar a aceder ao procedimento concursal de recrutamento associado ao seu ciclo de formação, não dependendo pois a sua eventual desvinculação contratual de qualquer intervenção da Administração.

Em face de tudo quanto precedentemente se expendeu, não se acompanhará o sentido da decisão recorrida, entendendo-se não ser devida qualquer compensação pela cessação, por caducidade, do contrato de trabalho a termo resolutivo incerto, no âmbito dos “internatos médicos” dada a sua natureza diferenciada, enquanto período de formação especializada que tem subjacente necessidades formativas do contratado.
* * *
Deste modo, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Norte, conceder provimento ao Recurso, revogando-se a Sentença Recorrida, mais se julgando a Ação improcedente.

Custas pelo Recorrido.

Porto, 20 de dezembro de 2019


Frederico de Frias Macedo Branco
Nuno Coutinho
Ricardo de Oliveira e Sousa