Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01407/14.1BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:04/21/2016
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Frederico Macedo Branco
Descritores:INIMPUGNABILIDADE DE ATOS; CENTROS DE INSPEÇÃO; CERTIDÕES.
Sumário:1 – A declarada inimpugnabilidade do ato administrativo, corresponde à exceção da irrecorribilidade do ato administrativo, resultante do não preenchimento dos requisitos previstos, designadamente, nos artigos 51° a 54° do CPTA.
2 – Os serviços do Município ao certificar o requerido, nos termos em que o fizeram, não emitiram qualquer ato administrativo ou decisão materialmente administrativa, na medida em que não definiram qualquer situação jurídica ou produziram qualquer efeito jurídico.
As "decisões" já estavam previamente definidas em instrumentos urbanísticos, tendo-se limitado as certidões a atestá-lo documentalmente.
O certificado não resulta de um Pedido de Informação Prévia que, esse sim, tem a virtualidade de determinar a emissão de informação sobre a viabilidade de realizar determinada operação urbanística, mas face a um mero pedido de certidão para dar conta das virtualidades de um terreno para a instalação de um centro de inspeções, o que não tem as características de ato constitutivo de direitos do artigo 14º, nº 1 do RJUE, mas de mero ato descritivo.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:SCV – ... SA,
Recorrido 1:Município do Porto
Votação:Maioria
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no qual concluiu no sentido de dever “ser negado provimento ao recurso”.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
I Relatório
A SCV – ... SA, devidamente identificada nos autos, no âmbito da ação administrativa especial, intentada contra o Município do Porto, inconformada com a Sentença proferida em 16 de Setembro de 2015, no TAF do Porto (Cfr. 192 a 208 Procº físico), que julgou “procedente a aventada exceção de inimpugnabilidade dos atos postos em crise” mais “absolvendo o Réu da instância”, veio em 27 de Outubro de 2015 Recorrer da referida Sentença para esta instância (Cfr. fls. 221 a 234 Procº físico).

Formula a aqui Recorrente/SCV nas suas alegações de recurso as seguintes conclusões (Cfr. fls. 224 a 234 Procº físico).

“1- Para se candidatar ao concurso público aberto pelo IMTT e descrito no facto 1 da douta sentença, a ora recorrente apresentou nos serviços da CMP um requerimento melhor descrito no facto 2 da douta sentença, que se tem por inteiramente reproduzido.

2- De acordo com o facto 4 da douta sentença, a CMP informou e decidiu que, no local em apreço, seria possível a prestação de serviços a veículos ligeiros e pesados — facto 4 da douta sentença.

3- Posteriormente, revogou tal decisão, mediante despacho de 16/01/2014 facto 7 e 8 da douta sentença.

4- Por despacho de 07/04/2014, proferido pela Chefe da DMPGU com o tero de "certifique-se...", que incorpora uma decisão de concordo com a informação, ou seja, concorda que o local em apreço reúne condições para a instalação de um CITV que preste serviços a veículos ligeiros e pesados, desde que os acessos ao terreno sejam exclusivamente efetuados pela Rua BV — factos 11 e 12 da sentença.

5- Os atos impugnados são os despachos de 16/01/2014 e 07/04/2014 que revogaram a decisão descrita no facto 4 da douta sentença e do qual resulta que, a CMP, aos 17/06/2013, mediante despacho da Chefe da DMGPU, de 22/05/2013, que, concordando com a informação, mandou emitir a certidão que certifica que o local em apreço, por ser servido por um Eixo Urbano Estruturante e de Articulação Intermunicipal, para um possível CITV a instalar neste local, será possível a prestação de serviços a veículos ligeiros e pesados.

6- Pelo que, os atos impugnados incorporam uma decisão de revogação do despacho 22/05/2013, materializada na certidão de 17/06/2013.

7- Há, pois, uma decisão de revogação (ato administrativo) e que afeta os direitos e interesses legalmente protegidos da recorrente, impedindo-a de concorrer ao concurso aberto pelo IMTT. Acresce que:

8- Os atos impugnados, também, constituem uma decisão sobre a viabilidade de instalar naquele local um CITV para veículos ligeiros e pesados.

9- Tal como resulta do facto 2 da douta sentença, por requerimento de 22/04/2013, a A. requereu a emissão de uma certidão nos termos do n° 5 do artigo 4° da lei 11/2011, em como o local reúne as condições necessárias para instalação de um centro de inspeção

10- Fez tal pedido para instruir uma candidatura ao concurso público aberto pelo IMTT para a instalação de centos de inspeção de veículos automóveis (CITV) no Porto -- facto 1 da sentença.

11- Perante este pedido, a Câmara Municipal abriu um procedimento administrativo, os serviços prestaram as respetivas informações, sobre as quais recaíram os despachos de "certifique-se" e que, necessariamente, incorporam, uma decisão de concordo com o teor da informação.

12- Tratam-se de atos unilaterais praticados, no exercício do poder administrativo e produzem efeitos sobre uma situação individual e concreta e que consiste na possibilidade de instalar um centro de inspeções naquele local para veículos ligeiros e pesados, e de consequentemente concorrer ao concurso aberto pelo IMTT.

14- Não se tratam meramente de atos opinativos ou ordens internas, mas decisões sobre a possibilidade ou não de instalar um CITV, naquele local, para veículos pesados e ligeiros e consequentemente, a possibilidade de se candidatar ao concurso do IMTT dependeria de tal decisão, materializada em certidão.

15- Estamos, pois, perante atos administrativos, pois são decisões dos órgãos da administração que, ao abrigo das normas de direito administrativo, visam produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta e com eficácia externa.

17- Fez, pois, o Tribunal errada interpretação do art. 120° do CPA e art. 51°, n° 1 do CPTA. Sem prescindir:

18- Os atos impugnados poderão em tese serem considerados como atos de indeferimento da pretensão da Recorrente.

19- Em síntese, face aos pontos 2 e 10 factos constantes da douta sentença, pretendia a Recorrente que a CMP decidisse se o local em apreço "reúne as condições necessárias a instalação de um centro de inspeções para veículos ligeiros e pesados".

20- A decisão da CMP a tal pedido foi negativa e ou de indeferimento, pelo que, estava o Tribunal obrigado a fazer usso do disposto no art. 51°, n° 4 do CPTA, ou seja, convidar a ora recorrente a substituir a petição, para o efeito de formular o adequado pedido de condenação à prática do ato devido.

21- A tal obrigaria o princípio da tutela jurisdicional efetiva - art. 2° do CPTA e ainda os artigos 20° e 268° doa Constituição da República Portuguesa. Acresce que:

22- O Tribunal julgou procedente a exceção de inimpugnabilidade dos atos, alegados pelo R. e pelo CI.

22- Conforme consta da douta sentença, a ora recorrente pugnou pela improcedência de tal exceção, por requerimento a fls 178 a 182 dos autos físicos e do SITAF a fls ...

23- Mas, também, por esse requerimento, a ora recorrente requereu a convolação da ação administrativa especial em comum.

24- Fê-lo nos seguintes termos:
Termos em que o expõe e requer a V. Ex. se digne julgar por não provada e improcedente a exceção invocada pelo R. Município e contra interessada. Se assim não for entendido, requer, desde já, a convolação da ação administrativa especial em comum, mantendo os seguintes pedidos: "reconhecido que o local em causa nos autos e melhor identificado nas plantas juntas reúne as condições necessárias para a instalação de um CITV para veículos ligeiros e pesados e condenado o R. a tal reconhecer e a emitir uma certidão que tal comprove, de modo claro e inequívoco, acompanha de planta de localização que identifique o respetivo terreno".

25- Sobre este pedido de convolação, o Tribunal não se pronunciou, pelo que, há clara omissão de pronúncia, que influi sobre a decisão da causa e gera a nulidade, que aqui expressamente se invoca — art. 608°, n° 2 e art. 195° do CPC.

26- Sendo certo que, nada impede a convolação, sendo que da petição inicial constam factos e pedidos que possibilitam — vide artigos 50 e ss da petição inicial.

27- Violou pois o Tribunal os princípios da adequação formal, cooperação e economia processual e da tutela jurisdicional efetiva — art. 6°, 7° do CPC

Termos em que o presente recurso deve ser julgado pro não provado e provado e procedente e em consequência ser revogada a douta sentença, seguindo-se os demais termos até final.”

O Recurso Jurisdicional foi admitido por Despacho de 29 de Outubro de 2015 (Cfr. fls. 238 Procº físico).

O Contrainteressado/I..., veio a apresentar as suas contra-alegações de Recurso em 25 de Novembro de 2015, concluindo (Cfr. fls. 253 a 255 Procº físico:

“A) A douta sentença que determinou a absolvição do Réu da instância por verificação da exceção dilatória de inimpugnabilidade dos supostos atos em crise deve ser mantida por correta interpretação e aplicação do disposto no artigo 120.º do CPA e 51.º, n.º 1 do CPTA.
B) Os supostos atos colocados em crise na petição inicial – os despachos prolatados em 16.01.2014 e 07.04.2014 – são ordens de emissão de certidão do teor de atos opinativos anteriores, limitando-se estes informar (simples declarações de conhecimento ou de inteligência) sobre a possibilidade, em abstrato, da instalação de um CITV numa determinada localização, traduzindo assim um juízo técnico próprio.
C) Os supostos atos não encerram pois um segmento decisório, destinado a produzir efeitos jurídicos sobre a situação individual e concreta do requerente, nem constituem direitos a seu favor.
D) Por estes motivos, os supostos atos não são impugnáveis, faltando o pressuposto da tradicional recorribilidade do ato. Acresce que,
E) A informação, certificada em 17/06/2013 pelo Recorrido Município, que se destinou a instruir o processo de candidatura apresentada pela Recorrente ao procedimento concursal aberto pelo Recorrido CI IMT igualmente não é um ato administrativo, pois não encerra uma decisão definitiva relativamente à situação do requerente, nem sequer constitui direitos; Assim
F) As decisões posteriores – afinal os supostos atos impugnados de 16/01/2014 e 07/04/2014 – não podem, igualmente, ser julgadas atos administrativos revogatórios porquanto, mais uma vez, são meros atos opinativos, que não se destinam a produzir efeitos na situação jurídica do requerente da certidão e, nessa medida, inimpugnáveis, consubstanciando uma impossibilidade jurídica a revogação de ato inexistente. Por outro lado,
G) O Recorrente na petição inicial, configurando os despachos de 16.01.2014 e 07.04.2014 como atos administrativos, peticionou a sua anulação e a condenação da administração no prática do ato (de deferimento) devido em substituição daquele: o reconhecimento e/ou emissão de certidão no sentido de que o local em causa reúne as condições para a instalação do CITV.
H) O pretendido convite à apresentação de nova petição (previsto n.º 4 do artigo 59.º do CPTA, que deve ser lida em conjunto com o disposto nos artigos 88.º e 89.º do mesmo diploma) deixa de se justificar quando se peticiona a anulação da recusa (como ocorreu in casu), pois que se verifica que não há óbice à viabilidade da ação.
I) Com efeito, o que in casu comprometeu a viabilidade da ação foi a verificação de exceção dilatória de a inimpugnabilidade dos atos impugnados. Finalmente,
J) Não se verifica a invocada nulidade por omissão de pronúncia quanto à peticionada convolação da ação, devendo, também nesta parte, ser rejeitado o recurso.
K) O efeito da verificação da exceção dilatória de inimpugnabilidade dos atos prevista na alínea c) do artigo 89.º do CPTA (insuprível) é a absolvição da instância, que se impõe, e que tem como consequência obstar ao prosseguimento do processo, mesmo que seja para conhecimento de pedidos subsidiários.
TERMOS EM QUE Deve ser negado provimento ao recurso apresentado, confirmando-se o teor da douta sentença, assim se fazendo JUSTIÇA”

O Recorrido/Município, veio a apresentar as suas contra-alegações de Recurso em 7 de Dezembro, concluindo (Cfr. fls. 264 a 266 Procº físico:

“A. A douta sentença proferida pelo tribunal a quo e colocada em crise pela Recorrente afigura-se, no entendimento da entidade Recorrida, justa, bem fundamentada e inatacável, demonstrando uma aplicação exemplar das normas jurídicas em vigor.
B. Nesta medida, e salvo melhor opinião de V/ Ex.ªs, é inegável que o seu conteúdo, fundamento e sentido não merecem qualquer reparo ou censura, pelo que o presente recurso encontra-se, inevitavelmente, votado ao insucesso.
C. Em suma, observa-se que as questões que o Recorrente coloca no presente pleito reconduzem-se, designadamente i) à errada interpretação sobre a qualificação dos atos impugnados [atos administrativos e respetiva (in)impugnabilidade]; e ii) omissão de pronúncia sobre o pedido de convolação da ação.
D. Em primeira linha, e no que diretamente concerne à errada qualificação dos atos em crise pela sentença proferida, o raciocínio expendido pelo Recorrente carece de total fundamento.
E. De facto, no que a este pretenso argumento concerne nada haverá a acrescentar em relação ao que já se deixou expressamente consignado em sede de Contestação, aderindo-se, por conseguinte, aos argumentos amplamente sustentados, de forma exímia, pela douta sentença recorrida.
F. Assim, urge não perder de vista que os atos sindicados não se consubstanciaram numa decisão, mas sim, como bem sustentado no âmbito da decisão proferida como «uma mera ordem interna para certificar o teor de uma informação».
G. De facto, pelos serviços competentes do Município do Porto foram proferidas informações (atos opinativos), materializadas em “certidão”, não existindo, pois, qualquer prolação de um ato administrativo ou decisão materialmente administrativa capaz de produzir per se um efeito na esfera jurídica da Recorrente.
H. Com efeito, e atento o conceito de ato administrativo patenteado pelo artigo 120.º do CPA então em vigor que, na esteira da mais unânime doutrina e jurisprudência pátrias foi acolhido pelo atual artigo 148.º do CPA, os atos aqui em crise não podem, contrariamente à pretensão da Recorrente, ser qualificados como atos administrativos.
I. Nessa medida e mercê da respetiva qualificação de ato não administrativo, não qualificam os supraditos atos como impugnáveis contenciosamente, nos termos e para os efeitos do artigo 51.º do CPTA.
J. Pelo exposto, dúvidas não persistem que nas hipóteses congeminadas como pretensamente irregulares, a entidade aqui recorrida não praticou qualquer ato administrativo, pelo que bem andou a sentença recorrida ao considerar não estarmos in casu perante qualquer ato administrativo, por falta dos seus pressupostos legais e estruturantes e, nessa medida, ao julgar procedente a invocada exceção da inimpugnabilidade dos atos, absolveu a entidade demandada da instância, nos termos e para os efeitos da alínea c) do n.º 1 do artigo 89.º do CPTA.
K. Por último, também quanto à pretensa omissão de pronúncia invocada, não pode ser assacado qualquer vício à sentença recorrida.
L. A douta sentença proferida pelo Tribunal a quo ao pronunciar-se favoravelmente sobre a exceção previamente deduzida absteve-se, assim, de emitir qualquer pronúncia quanto ao mérito da ação, sendo certo que, e em todo o caso, sempre se observaria a impossibilidade da pretensa convolação, atenta a incompatibilidade de pedidos que nessa medida vêm aduzidos.
M. De facto, a Recorrente, aproveitando o ensejo do requerimento de resposta, deduziu um pedido subsidiário superveniente, apresentando, por essa via, uma causa de pedir e um pedido distintos aos inicialmente por si expressamente balizados, conformando, em bom rigor, uma nova ação e extravasando amplamente os limites admitidos pelo mecanismo da convolação processual,
N. O que, em todo o caso, nunca poderia ser admitido.
O. Nesta medida, reitere-se, a douta decisão recorrida deve ser confirmada in totum por V. Exas., ratificando-se, em conformidade, a absolvição da instância da entidade Recorrida, em virtude da procedência da exceção de inimpugnabilidade dos atos sindicados.”

O Ministério Público junto deste Tribunal, tendo sido notificado em 11 de Janeiro de 2016 (Cfr. fls. 288 Procº físico), veio a emitir Parecer em 15 de Janeiro de 2016 (Cfr. Fls. 289 a 293 Procº físico), no qual concluiu no sentido de dever “ser negado provimento ao recurso”.

Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.

II - Questões a apreciar
As questões a apreciar e decidir prendem-se predominantemente com a necessidade de verificar da impugnabilidade dos atos objeto de impugnação, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA.

III – Fundamentação de Facto
O Tribunal a quo, considerou a seguinte factualidade, a qual aqui se entende ser suficiente e adequada:
1. O IMTT abriu concurso para a instalação de três Centros de Inspeção de veículos automóveis (CITV) no Porto, tendo as respetivas candidaturas de ser instruídas com uma certidão emitida pela CMP que comprove, de modo claro e inequívoco, que o local proposto reúne as condições necessárias para o efeito e com uma planta de localização identificadora do respetivo terreno;
2. Para se candidatar a tal concurso, a A. apresentou nos serviços competentes da Ré um requerimento (registo interno da CMP nº 54209/13/CMP), onde aduziu:
«[...) Candidato ao Concurso Público para abertura de Centro de Inspeção Automóvel e na qualidade de Promitente Comprador; vem por este meio requerer a V. Exa. que seja emitida Certidão nos termos do n° 5 do Artigo 4° da Lei 11/2011 de 26 de Abril e do Decreto Lei 2612013 de 19 de Fevereiro, em como o local reúne as condições necessárias para instalação de um centro de inspeção.
O prédio localiza-se no cruzamento da Rua BV com a Rua HLM, da freguesia da Foz do Douro, inscrito nas Finanças com os Artigos Matriciais Nºs 2… e 1… Rústicos e com os Artigos Matriciais Nºs 1… e 3…Urbanos.
A implantação do Edifício irá cumprir com todos Requisitos Legais e Regulamentos Aplicáveis»;
3. Todavia, a A. não apresentou em tais serviços a planta de implantação do CITV;
4. Face ao requerido, foi emitida certidão, datada de 17.06.2013, autorizada pela Chefe da DMGPU, a 22.05.2013, onde se consignou que:
«[. . .] de harmonia com o despacho da senhora Chefe de Divisão Municipal de Gestão de Procedimentos Urbanísticos (…) para o terreno assinalado na planta em anexo, se encontram reunidas as condições para instalação de um CITV.
Mais se certifica que, de acordo com o disposto nos artigos D-3/7º e D-3/8. ° do Código Regulamentar do Município do Porto e com o definido na Carta de Hierarquia da Rede Rodoviária que constitui parte integrante do Plano Diretor Municipal do Porto, o local em apreço, por ser servido por um Eixo Urbano Estruturante e de Articulação Intermunicipal, para um possível CITV a instalar neste local, será possível a prestação de serviços a veículos ligeiros e pesados»
5. A 17.06.2013, a A. enviou, por carta registada com a/r ao IMT a sua candidatura com vista à instalação de um CITV no concelho do Porto, situando-se o terreno escolhido no cruzamento da Rua BV com a Rua HLM, instruindo essa candidatura com tal certidão emitida pela CMP, procedendo ao pagamento do montante de 5.000,00€;
6. A sociedade "I... - INSPECÇÃO DE VEÍCULOS, LDA.", na qualidade de concorrente no âmbito do aludido procedimento concursal (e, por conseguinte, interessada), veio, a 16.01.2014, junto do Município do Porto, solicitar, no âmbito do PA 4441/14/CMP, o esclarecimento do teor da certidão emitida por esta edilidade, a 17.06.2013, a favor da aqui Autora, juntando para o efeito a correspondente planta de implantação do CITV apresentada pela A. no âmbito do referido concurso.
7. Face a este requerimento foi, a 16.01.2014, prestada a Informação n.º I/9044/14/CMP, junta ao PA n.º 4441/14/CMP, pela Chefe da DMAAU, onde se refere que: «os pressupostos que estiveram na base da emissão da certidão para o local em apreço (por referência à mencionada certidão de 17.06.2013) se encontram alterados, na medida em que o acesso ao CITV é efetuado não pela Rua de BV, que é um Eixo Estruturante de Articulação Intermunicipal, e sim pela Rua de HLM, sendo este um Eixo Urbano Complementar ou Estruturante Local».
8. Esta informação mereceu despacho de 16.01.2014 da Chefe da DMGPU em que se determinava: «Certifique-se do teor da informação prestada pela DMAAU»;
9. A 17.01.2014 é emitida a certidão requerida pela «I... SA», onde se incorpora o teor da referida informação;
10. A 04.04.2014, a ora A. apresentou requerimento na CMP registado sob o nº 37991/14CMP, solicitando emissão de nova certidão para efeitos do nº 5 do artº 4º da Lei 11/2011, de 26.04, expressamente requerendo que fosse «emitida certidão (…) comprovativa de que o terreno sito na Rua BV, melhor identificado no processo à margem referenciado, reúne as condições necessárias para instalação de um centro de inspeção para veículos ligeiros e pesados»;
11. Face ao antedito requerimento foi, a 16.01.2014, prestada a Informação n.º I/62816/14/CMP, agregada ao PA n.º 37991/14/CMP, pela Exma. Senhora Chefe da DMAAU, onde se expende que: «o local em apreço por ser servido por um Eixo Estruturante de Articulação Intermunicipal reúne condições para a instalação de um CITV que preste serviços a veículos ligeiros e pesados, desde que os acessos ao terreno em questão sejam exclusivamente efetuados por esta via Estruturante, ou seja, pela Rua de BV e não pela Rua de HLM, conforme layout apresentado junto do IMT, para efeitos de candidatura, o qual foi objeto de reclamação de um dos concorrentes»;
12. Esta informação mereceu despacho de 07.41.2014 da Chefe da DMGPU em que se determinava: «Certifique-se do teor da informação prestada pela DMAAU»;
13. A 07.04.2014 foi emitida a certidão requerida pela ora A. onde se incorpora o teor da referida informação;

IV – Do Direito
Vem interposto Recurso para esta instância da decisão do tribunal a quo que absolveu o réu da instância, por considerar inimpugnáveis os atos objeto de impugnação.

Entende a Recorrente/SCV que os atos em causa serão impugnáveis, ao que acresce o facto do tribunal a quo ter incorrido em omissão de pronúncia relativamente ao pedido de convolação da ação.

Vejamos:

Da Inimpugnabilidade dos atos
Desde logo, a declarada inimpugnabilidade do ato administrativo, corresponde à exceção da irrecorribilidade do ato administrativo, resultante do não preenchimento dos requisitos previstos, designadamente, nos artigos 51° a 54° do CPTA.

Com efeito, dispõe o artigo 51°, n.º 1 do CPTA então aplicável, que serão impugnáveis os atos com eficácia externa, mormente aqueles cujo conteúdo seja suscetível de lesar direitos ou interesses legalmente protegidos. O conceito de ato contenciosamente impugnável assenta no estabelecido, desde logo, no Artº 120° do (antigo) CPA, no qual se consideram atos administrativos as decisões dos órgãos da administração que ao abrigo de normas de direito público visem produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta, enquanto atos externos, que evidenciem um qualquer segmento decisório.

Como refere Vieira de Andrade “A Justiça Administrativa - Lições”, 2012, 12.ª edição, págs. 186/187: “… o conceito processual de ato administrativo impugnável não coincide com o conceito de ato administrativo, sendo, por um lado, mais vasto e, por outro, mais restrito. … É mais vasto apenas na dimensão orgânica, na medida em que não depende da tradicional qualidade administrativa do seu Autor … - artigo 51.º, n.º 2. … É mais restrito, na medida em que só abrange expressamente as decisões administrativas com eficácia externa, ainda que inseridas num procedimento administrativo, em especial os atos cujo conteúdo seja suscetível de lesar direitos ou interesses legalmente protegidos (artigo 51.º, n.º 1) - devendo entender-se que atos com eficácia externa são os atos administrativos que produzam ou constituam (que visem constituir, que sejam capazes de constituírem) efeitos nas relações jurídicas administrativas externas (na esfera jurídica dos destinatários), independentemente da respetiva eficácia concreta …”.

Estão excluídos do conceito de ato administrativo impugnável os chamados atos instrumentais que intervêm como auxiliares da atuação administrativas, os atos meramente preparatórios (propostas, informações, pareceres, relatórios, etc…) – cf. Mário e Rodrigo Esteves de Oliveira, Código de Processo nos Tribunais Administrativos, páginas 342 e seguintes; Rogério Soares, Direito Administrativo (Lições), páginas 100-101, Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, volume II, páginas 269 e seguintes.

Mais refere a este respeito Mário Aroso de Almeida, em “Considerações em torno do conceito de ato administrativo impugnável, in “Estudos de Homenagem ao Prof. Doutor Marcello Caetano”, Vol. II, p. 285 que “Em nossa opinião, desta circunstância resulta que o que, do ponto de vista estrutural, é decisivo para que os atos jurídicos concretos da Administração possam ser objeto de reação contenciosa — e, portanto, de impugnação contenciosa, quando tenham conteúdo positivo — é que eles possuam conteúdo decisório, no sentido, oportunamente explicitado, de que não se esgotem na emissão de uma declaração de ciência, um juízo de valor ou uma opinião, mas exprimam uma resolução que determine o rumo de acontecimentos ou o sentido de condutas a adotar. E isto, mesmo quando intervenham no plano de relações intra-administrativas e interorgânicas.
Determinante é que se trate de atos administrativos, no sentido que decorre do artigo 120.° do CPA. Do ponto de vista estrutural, deve, pois, a nosso ver, entender-se que todos os atos administrativos podem ser objeto de reação contenciosa — e, portanto, que, quando tenham conteúdo positivo, todos eles podem ser objeto de impugnação contenciosa, pelo que são, todos eles, atos administrativos impugnáveis.”

Também a jurisprudência se tem abundantemente pronunciado face a esta questão.

Sem qualquer preocupação de exaustão, refira-se, exemplificativamente, o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 16.12.2009, no processo 0140/09, em cujo sumário se afirma que:
“I - Hoje, face ao artº 51º, nº 1 do CPTA, a impugnabilidade do ato administrativo, depende apenas da sua externalidade, ou seja, da suscetibilidade de produzir efeitos jurídicos que se projetem para fora do procedimento onde o ato se insere.
II - Assim, torna-se irrelevante, para aferir da impugnabilidade do ato, que ele seja definitivo ou não, lesivo ou não, bem como a sua localização no procedimento (início, meio ou termo).
III - Assim, qualquer decisão administrativa pode ser hoje impugnável, questão é que o seu conteúdo projete efeitos jurídicos para o exterior, i.e. tenha eficácia externa.
(…)”.

Desde logo, ambos os atos objeto de impugnação assentam na expressão “certifique-se”, o que desde logo evidencia a sua natureza.

Como se refere na decisão recorrida, "os serviços do réu, ao "informar" nos termos em que o fizeram, não emitiram qualquer ato administrativo ou decisão materialmente administrativa, na medida em que não definiram qualquer situação jurídica ou produziram qualquer efeito jurídico. Veicularam uma informação, corporizada em certidão, que os seus destinatários aproveitarão como e para os efeitos que quiserem."

O Certificado não se consubstancia pois em qualquer decisão, que não seja a de determinar a certificação do teor de uma informação.

Diferente seria a situação se estivessemos perante um Pedido de Informação Prévia sujeito ao regime jurídico previsto nos n.ºs 3 e 4 do RJUE (aprovado pelo DL 555/99, de 16 de Dzembro).

Efetivamente é o Pedido de Informação Prévia que tem a virtualidade de determinar a emissão de informação sobre a viabilidade de realizar determinada operação urbanística, assim como os respectivos condicionamentos aplicáveis (artigo 14º, nº 1 do RJUE).

O Pedido de Informação Prévia, ao contrário de uma mera certidão descritiva da situação vigente, facultará já ao interessado um conjunto de informações de caracteristicas vinculativas, relativas à viabilidade de uma operação urbanística concreta.

O pedido de certidão aqui controvertido não constituindo pois um Pedido de Informação Prévia, não é também e naturalmente um ato constitutivo de direitos, suscetivel de conferir ou retirar ao interessado quaisquer direitos edificativos.

Efetivamente, os atos certificativos em questão limitaram-se a prestar a informação requerida, o que se não consubstanciou em qualquer ato materialmente administrativo, suscetível de produzir efeitos na esfera jurídica da aqui Recorrente, em face do que improcederá o suscitado vicio.

Do pedido de Convolação da ação
Alega a recorrente que o tribunal a quo, para além de se ter pronunciado no sentido da improcedência da exceção de inimpugnabilidade, não deu resposta à igualmente requerida convolação da ação administrativa especial em comum.

Efetivamente referiu o aqui Recorrente o seguinte:
"Termos em que o expõe e requer a V Ex. se digne julgar por não provada e improcedente a exceção invocada pelo R. Município e contrainteressada. Se assim não for entendido, requer, desde já, a convolação da ação administrativa especial em comum, mantendo os seguintes pedidos: "reconhecido que o local em causa nos autos e melhor identificado nas plantas juntas reúne as condições necessárias para a instalação de um CITV para veículos ligeiros e pesados e condenado o R. a tal reconhecer e a emitir uma certidão que tal comprove, de modo claro e inequívoco, acompanhada de planta de localização que identifique o respetivo terreno".

Sem prejuízo do peticionado, não se vislumbra que igualmente face a este aspeto mereça acolhimento o invocado.

Desde logo, não se reconhece a verificação da invocada omissão de pronúncia, atenta a circunstância da exceção dilatória de inimpugnabilidade dos atos prevista na alínea c) do artigo 89.° do CPTA e a consequente absolvição da instância, determinaram automaticamente a impossibilidade de prosseguimento da tramitação processual, ainda que para conhecimento de pedidos subsidiários.

Em qualquer caso, sempre se dirá que a convolação se não mostraria possível, uma vez que a mesma se consubstanciaria numa subversão processual, pois que determinaria uma nova ação, com causa de pedir e pedido diverso do originariamente formulado.

Como refere Jorge Lopes de Sousa, citado pelo Ministério Público, “Para efetuar a convolação, é necessário que seja viável o prosseguimento do processo na forma processual adequada, designadamente que a respetiva petição tenha sido tempestivamente apresentada para efeitos desta nova forma processual. Na verdade, a convolação justifica-se por razões de economia processual e, por isso, não se pode justificar, quando não for viável utilizar a petição para a forma de processo adequada, por qualquer razão que obste ao seu prosseguimento, pois, se no meio adequado não for possível proferir decisão sobre o mérito da causa, não haverá qualquer utilidade na correção do erro na forma de processo."

Se é certo que o tribunal poderia recorrer em abstrato ao então artigo 88.° do CPTA, por forma a viabilizar a correção do articulado, o que é facto é que, in casu, tal não se mostra possível, pois não estamos perante uma mero erro processual, suscetível de ser sanado e corrigido, mas antes perante um pedido subsidiário superveniente de convolação, de natureza e objeto diverso do formulado na petição inicial, o que sempre determinará a apresentação de uma nova ação e não da convolação da originária.

Improcede assim e igualmente o suscitado e analisado vicio.

* * *
Deste modo, em conformidade com o precedentemente expendido, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto, confirmando-se o sentido da decisão proferida em 1ª Instância.
Custas pelo Recorrente

Porto, 21 de Abril de 2016
Ass.: Frederico de Frias Macedo Branco
Ass.: Joaquim Cruzeiro (com voto vencido*)
Ass.: Fernanda Brandão
*Voto Vencido: Uma vez que considerava o ato impugnado como definidor de situação concreta e portanto impugnável.