Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00270/13.4BECBR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:07/03/2020
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:Helena Canelas
Descritores:AÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL – ALEGAÇÕES ESCRITAS – NULIDADE PROCESSUAL
Sumário:I – Na versão original do CPTA (anterior às alterações que lhe for I – Na versão original do CPTA (anterior às alterações que lhe foram introduzidas pelo DL. n.º 214-G/2015) a tramitação da ação administrativa especial inclui, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 91º nº 1, 2, 3 e 4, 78º nº 4, 83º nº 2, 87º nº 1 alínea b) do CPTA, a apresentação de alegações escritas pelas partes antes da prolação da decisão sobre o mérito da causa quando não haja lugar à audiência pública por iniciativa das partes, situação em que as alegações de direito são aduzidas de forma oral, ou quando as partes não tenham renunciado à sua apresentação.

II – Nos termos do artigo 91º nº 4 do CPTA (na redação temporalmente aplicável) devia ser assegurado às partes a notificação para apresentarem alegações escritas, sendo primeiramente notificado o autor, pelo prazo de 20 dias, e depois, simultaneamente, a entidade demandada e os contrainteressados, por igual prazo.

III – A omissão desse ato de notificação para apresentação de alegações escritas, exigido por lei na tramitação processual da ação administrativa especial, porque pode influir no exame ou na decisão da causa, consubstancia de harmonia com o disposto no artigo 195º nº 1 do CPC novo, ex vi do artigo 1º do CPTA, nulidade processual.*
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CIÊNCIA
Recorrido 1:M.
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial
Decisão:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. RELATÓRIO
O MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CIÊNCIA, réu na ação administrativa especial que contra si foi instaurada em 03/05/2013 no Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra por M. (devidamente identificada nos autos) – na qual esta impugnou o ato administrativo de 11/01/2013, que anulou a colocação da Autora no Agrupamento de Escolas (...), em (...), peticionando a sua declaração de nulidade e bem assim a consequente condenação da Entidade Demandada a colocar a autora naquele agrupamento, no usufruto de futuras reconduções no lugar, na contagem de tempo integral de serviço e no processamento do respetivo vencimento – inconformado com a sentença datada de 23/06/2017 (fls. 185 SITAF) do Tribunal a quo que julgou procedente a causa de pedir, mas improcedente, nos termos do n.º 1, do artigo 45.º do CPTA, o pedido formulado pela autora, e ordenou a notificação das partes para, querendo, acordarem, no prazo de 20 dias, o montante da indemnização a pagar pela Entidade Demandada à autora pelos danos derivados da impossibilidade de se repetir o ato administrativo impugnado sem os vícios que aqui lhe foram apontados, dela interpôs o presente recurso de apelação (fls. 199 SITAF), formulando as seguintes conclusões, nos seguintes termos:

I. O Tribunal “a quo” incorre em violação do disposto n.º 4 do art.º 91.º do CPTA ao não ter procedido à notificação do Recorrido para alegações, quando o mesmo não prescindiu desse direito processual;
II. A violação daquela norma processual determina a nulidade da sentença, porquanto o Réu viu coartado o seu direito de defesa e de exercício do contraditório previsto também no n.º 3 do art.º 3.º do CCP, aplicável ex vi do art.º 1.º do CPC;
III. Falta à verdade a sentença quando refere que «Regularmente notificadas, as partes não apresentaram alegações»;
IV. Só através da notificação da douta sentença, o Recorrente teve conhecimento do incumprimento do disposto no n.º 4 do art.º 91.º do CPTA;
V. Caso não se entenda que a inexistência de notificação das partes para alegações configura um vício que acarreta a nulidade da sentença, ainda, assim, aquele vício processual, porque coloca em causa os direitos de defesa do Recorrente, sempre determinaria a anulação da sentença;
VI. Padece de vício de julgamento da matéria de facto, o douto aresto ao considerar que «A Autora é docente de carreira do grupo de recrutamento 200 (cf. 1 a 4 do processo administrativo)»;
VII. A mesma, enquanto docente contratada a termo resolutivo, não tem nenhum vínculo permanente com o Recorrente, pelo que nunca poderia ser considerada docente de carreira (cf. fls. 1 a 4, 5, 19, 41, 44 a 49 do p.a);
VIII. Padece de erro a douta sentença ao considerar como matéria dada como provada no ponto 3 do douto aresto, o qual transcreve o Capítulo VIII do Aviso n.º 9653-A/20123, publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 135, de 13 de julho de 2012, em primeiro lugar, por não se tratar de matéria de facto e, em segundo lugar, por ser referente ao concurso da mobilidade interna, apenas aplicável dos docentes de carreira, o que não era o caso da Recorrida;
IX. Erra a douta sentença ao considerar que «A Autora é docente de carreira do grupo de recrutamento 200» (cf. 1 a 4 do processo administrativo);
X. Ora, o que resulta inequivocamente de folhas 1 a 4, 5, 19, 41, 44 a 49 do p.a. é que a Autora exerceu funções docentes sob a direção do Réu na qualidade de docente contratada a termo resolutivo;
XI. Por não provado, deve ser eliminado a parte final do ponto 5 do probatório, onde se pode ler o seguinte:
«No dia 28 de Dezembro de 2012 a Autora apresentou-se no Agrupamento de Escolas (...) em (...) e iniciou, nessa data, o exercício de funções não docentes (cf. documento a fls. 20 e 21 dos autos em processo físico e a fls. 19 e 52 do processo administrativo)»;
XII. Da documentação junta aos autos apenas se comprova que «No dia 28 de Dezembro de 2012, a Autora apresentou-se no Agrupamento de Escolas (...) em (...)»;
XIII. Não se acompanha a douta sentença recorrida ao dar como provado o ponto sete do probatório porquanto não se alcança do ofício de fls. 52 do p.a que, no dia 3 de janeiro de 2013, a Recorrida tenha lecionado «de acordo com o horário que lhe foi atribuído», pelo que deveria o mesmo ser eliminado;
XIV. No ponto 11 a douta sentença recorrida considera incorretamente que «O horário atribuído à Autora, na sequência do despacho de 11 de Janeiro de 2013, foi atribuído a A. (cf. documento a fls. 42, 44 a 50 do processo administrativo)»;
XV. Nem o horário atribuído à Recorrida ocorre na sequência do despacho de 11 de Janeiro de 2013, nem tão pouco a colocação da docente A. é consequência de qualquer despacho praticado pela entidade Recorrente, como se demonstrará;
XVI. A assunção daquela factualidade fez o douto incorrer em manifesto erro na apreciação da matéria de facto e veio a condicionar, de forma manifesta, o sentido da decisão e a aplicação do direito;
XVII. O que comprova do p.a. é que a não aceitação eletrónica por parte da Recorrida no prazo de 48 horas determinou que às 00:00:01 do dia 01/01/2013 fosse considerada a não aceitação em tempo útil da colocação pela plataforma eletrónica SIGRHE da Direção-Geral da Administração Escolar (fl. 35 do p.a.);
XVIII. Esta informação é gerada automaticamente pelo algoritmo, a qual determinou ipso factu a anulação da colocação não aceite em tempo útil.
XIX. Na nota informativa de 08/10/2012 da Direção-Geral da Administração Escolar (DGAE), pode ler-se que o horário registado na Reserva de Recrutamento que não obtenha a correspondente aceitação e colocação de um docente, «figurará no estado “Não Aceite, 1.ª vez”, sendo automaticamente considerado para nova Reserva de Recrutamento» (fl.10 do P.A.);
XX. Através do ofício datado de 11/03/2013, a Direção-Geral da Administração mais não fez do que informar o recorrido da irreversibilidade da anulação da colocação por efeito de não aceitação em tempo útil da colocação, pelo que, não constitui em si mesmo um ato administrativo, mas um mero ato informativo;
XXI. Não se acompanha de todo o entendimento do douto aresto que sobre o Agrupamento de Escolas de colocação impendia o dever de verificar se o docente tinha cumprido todos os deveres legais antes de proceder à entrega do horário;
XXII. No dia 28 de dezembro de 2012, data em que a Recorrido se apresentou no Agrupamento de escolas de colocação, ainda estava a decorrer o prazo para a aceitação eletrónica, pelo que a Recorrida tinha toda a legitimidade para refletir melhor e optar por não aceitar o horário distribuído;
XXIII. Por conseguinte, não precede a interpretação do douto aresto de que a apresentação do docente no agrupamento de escola de colocação equivale à sua aceitação efetiva, porquanto não resulta da lei;
XXIV. Tendo sido autonomizado pelo legislador aqueles dois deveres (de apresentação e de aceitação), apenas o cumprimento de ambos era suscetível de inviabilizar a anulação da colocação da Recorrente;
XXV. Entender de outro modo, é fazer uma interpretação contra legem do disposto nos n.ºs 9 e 10.º do art.º 37.º em conjugação com o disposto no art.º 18.º, n.º 1, al. a) e c), ambos do Decreto-Lei n.º 132/2012;
XXVI. As als. a) e c) do art.º 18.º do Decreto-Lei n.º 132/2012, enquanto sanções administrativas ope legis, operam por força do incumprimento do dever de aceitação e / ou de aceitação impendentemente de culpa do agente;
XXVII. A aplicação daquelas sanções administrativas, desempenha as finalidades de prevenção e repressão por incumprimentos das regras concursais sem que tenha havido um ato administrativo que as determine;
XXVIII. É bom reconhecer-se que a exigência da aceitação expressa do candidato decorre do procedimento concursal de massas em que a entidade decisora do processo de colocação não consegue, desde logo, obter a informação necessária dos estabelecimentos de ensino relativa à apresentação dos docentes na escola, atenta a existência de mais de oito centenas de unidades orgânicas e de milhares de docentes a concurso;
XXIX. A informatização do sistema de colocações obrigou, pois, a que a Administração exigisse a aceitação do candidato na plataforma informática, atenta a natureza urgente do processo de colocação dos professores;
XXX. Face à lei, o silêncio da Recorrida só poderia significar a falta de intenção de aceitação da colocação;
XXXI. Encontrando-se a atuação da Administração subordinada aos princípios da legalidade e da igualdade, não poderia ter agir noutro sentido que não fosse o da anulação da colocação da Recorrida;
XXXII. Salvo o devido respeito, a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da boa-fé defendidos pela douta sentença recorrida nunca poderá traduzir-se no afastamento de norma de carater imperativo que determine ope legis uma consequência jurídica resultante da verificação de certa factualidade, neste caso, a não aceitação da colocação através da plataforma eletrónica SIGRHE;
XXXIII. O afastamento do disposto nos n.ºs 9 e 10.º do art.º 37.º em conjugação com o disposto no art.º 18.º, n.º 1, al. a) e c), ambos do Decreto-Lei n.º 132/2012 sempre implicaria a existência de norma de sentido contraditória que, in casu, pudesse ser afastada por aplicação daqueles princípios;
XXXIV. Acontece que a ratio legis de tais normas, porque especiais do procedimento concursal de docentes, visam responder às reais necessidades de serviço docente, assegurando, com a maior celeridade possível a substituição de docentes e garantindo que, na medida do possível nenhum aluno fique sem aulas devido a situações ambíguas que se arrastam no tempo e lhes são completamente estranhas;
XXXV. A celeridade desejada do procedimento concursal em questão, sem paralelo pela sua complexidade e número de agentes e unidades orgânicas envolvidas, requer respostas prontas e ao minuto, pouco compassível com excessos de garantismo e displicência por parte daqueles que, porque interessados no procedimento, deveriam ser os primeiros a cumprir escrupulosamente e atempadamente os seus deveres;
XXXVI. Com efeito, face à prova junta os autos não se comprova qualquer ato negligente ou culposo do Recorrente que possa ter estado na origem da não aceitação da colocação da Recorrida, o que sempre conduziria à absolvição do Réu de todos os pedidos;
XXXVII. Incorre em contradição a douta sentença ao considerar no ponto 12 do probatório que «No dia 18 de Janeiro de 2013 A. celebrou com o Agrupamento de Escolas (...), em (…), um contrato de trabalho a termo incerto (cf. contrato a fls. 45 a 48 do processo administrativo)», e, mais adiante, a fls. 10 da sentença, concluir que «Dos presentes autos resulta, desde logo, que o lugar ocupado pela Autora foi atribuído a outra concorrente, com a qual o Agrupamento de Escolas (...) celebrou, no dia 18 de Janeiro de 2013, um contrato de trabalho por termo indeterminado»;
XXXVIII. Uma coisa é a celebração de contrato de trabalho em funções públicas a termo resolutivo incerto, efetivamente outorgado pela docente A., a outra concorrente a que se refere o excerto de folhas 10 do douto aresto recorrido, e outra bem diferente, a celebração contrato de trabalho por termo indeterminado;
XXXIX. Só a celebração do segundo tipo de contrato permite considerar o trabalhador outorgante docente de carreira nos termos previstos no art.º 2.º do ECD e no ponto 3 do preâmbulo do Aviso n.º 965-A/2012;
XL. É forçoso concluir pela manifesta contradição entre a matéria dada como provada no ponto 11 do probatório e a conclusão constante a fls. 10 do aresto.
XLI. Salvo o devido respeito, erra também a douta sentença ao alvitrar a hipótese de renovação da colocação da Recorrida nos termos que passamos a transcrever:
«Na verdade, limitando a lei a renovação do contrato previsto nos autos a um máximo de quatro anos letivos, onde se inclui o ano da contratação, conforme resulta do artigo 33.°, n.º 3 do Decreto-Lei n.º 132/2012, de 27 de Junho, considera-se, atendendo ao hiato temporal entretanto decorrido, que, de um ponto de vista naturalístico, e impossível dar cumprimento ao julgado anulatório e ao pedido condenatório formulado pela Autora»;
XLII. Tendo a Recorrida sido colocada no concurso de reserva de recrutamento a 28 de dezembro de 2012, mesmo admitindo por mero dever de patrocínio que a anulação da colocação da Recorrida configurava um ato ilegal, em sede de reconstituição da sua situação laboral, no limite, poderia ser-lhe reconhecido o direito a uma indemnização correspondente às remunerações que deixou de auferir até 31 de agosto de 2013 e contagem do tempo de serviço para todos os efeitos legais;
XLIII. Tendo a Recorrida obtida colocação no dia 28 de dezembro de 2012, em horário de 17 horas, a sua situação nunca seria subsumível ao disposto no n.º 3 do art.º 33.º do Decreto-Lei n.º 132/2012, para qual remete o n.º 2 do art.º 36.º daquele mesmo diploma;
XLIV. A colocação anulada pela Recorrida no ano escolar 2012/2013, porque obtida em 27 de dezembro de 2012, em horário de 17 horas, no grupo de recrutamento 200, nunca poderia ser considerada como anual (365 dias) e em horário completo (22 horas);
XLV. Aquela colocação era insuscetível de renovação nos termos previstos no n.º 4 do art.º 33.º do Decreto-Lei n.º 132/2012;
XLVI. Não é do «mero ponto de vista naturalístico», conforme defende o douto aresto que a Recorrida nunca poderia renovar a colocação obtida no Agrupamento de Escolas (...), (...);
XLVII. Mesmo que a colocação obtida no Agrupamento de Escolas (...), (...), não tivesse sido anulada a renovação da colocação seria legalmente impossível, desde logo, por não cumprir os requisitos legalmente previstos no Decreto-Lei n.º 132/2012;
XLVIII. Lavra em erro o douto aresto ao concluir pela aplicação do disposto no n.º 1 do art.º 45.º do CPTA, a pretexto de não ser possível a renovação da colocação da Recorrida do «mero ponto de vista naturalístico».

Terminando pugnando que, dando-se provimento ao recurso se declare a nulidade ou, em alternativa, a anulação da sentença recorrida, julgando-se improcedente a causa de pedir, absolvendo o recorrente de todos os pedidos.

Não foram apresentadas contra-alegações.
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Remetidos os autos a este Tribunal, em recurso, neste notificado, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 146º e 147º do CPTA, o Digno Magistrado do Ministério Público não emitiu Parecer.
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Redistribuídos os autos (cfr. Despacho nº 1/2019 de 04/01/2019 do Exmo. Senhor Juiz Desembargador Presidente deste TCA Norte) foram submetidos à Conferência para julgamento, com dispensa de vistos.
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II. DA DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO/das questões a decidir
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC novo (Lei n.º 41/2013) ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA.
Sendo que em face dos termos em que foram pelo recorrente formuladas as respetivas conclusões de recurso, vêm colocadas em seguintes questões essenciais:
- saber se ocorre nulidade decorrente da falta de notificação do réu para apresentar alegações escritas, devendo a sentença recorrida ser anulada – (conclusões 1ª a 5ª das alegações de recurso);
- saber se a sentença recorrida incorre erro de julgamento quanto à matéria de facto – (conclusões 6ª a 20ª das alegações de recurso);
- saber se a sentença recorrida incorre erro de julgamento quanto à solução jurídica da causa, fazendo uma incorreta interpretação designadamente do disposto nos n.ºs 9 e 10.º do artigo 37.º em conjugação com o disposto no artigo 18.º, n.º 1, al. a) e c), ambos do Decreto-Lei n.º 132/2012 e do disposto nos n.ºs 3 e 4 do art.º 33.º do Decreto-Lei n.º 132/2012 e uma errada subsunção dos factos ao direito – (conclusões 21ª a 47ª das alegações de recurso);
- saber se a sentença recorrida errou ao concluir pela aplicação do disposto no n.º 1 do artigo 45.º do CPTA – (conclusão 48ª das alegações de recurso).
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III. FUNDAMENTAÇÃO

A – De facto

O Tribunal a quo deu como provada com relevância para a decisão da causa a seguinte factualidade, assim vertida ipsis verbis na sentença recorrida:
1. A Autora é docente de carreira do quadro do grupo de recrutamento 200 (cf. documentos a fls. 1 a 4 do processo administrativo);

2. No dia 22 de Abril de 2012 a Autora apresentou candidatura eletrónica ao concurso de contração anual/inicial para o ano letivo de 2012/2013, não tendo obtido colocação nas listas definitivas (cf. candidatura a fls. 5 a 9 do processo administrativo);

3. No dia 13 de Julho de 2012 foi publicado na segunda série do Diário da República, n.º 135, o Aviso n.º 9653-A/2012, de 11 de Julho de 2012, relativo ao concurso anual de mobilidade interna com vista ao suprimento de necessidades temporárias de pessoal docente, para o ano escolar de 2012-2013, onde se previa, designadamente, o seguinte:

“(…) XIII — Aceitação da colocação e apresentação nas escolas
1 — Os candidatos colocados por mobilidade interna devem proceder à aceitação da colocação na aplicação informática a disponibilizar pela Direção-Geral da Administração Escolar, no prazo de quarenta e oito horas, correspondentes aos dois primeiros dias úteis seguintes à publicitação da lista de colocação, nos termos do n.º 2 do artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 132/2012.
2 — Os candidatos referidos no ponto anterior devem apresentar-se no prazo de setenta e duas horas após a respetiva colocação, no agrupamento de escolas ou escola não agrupada onde foram colocados.
3 — Nos casos em que a apresentação, por motivo de férias, maternidade, doença ou outro motivo previsto na lei, não puder ser presencial, deve o candidato colocado, por si ou por interposta pessoa, comunicar este facto ao agrupamento de escolas ou escola não agrupada, com apresentação do respetivo documento comprovativo, no prazo de 5 dias úteis.
(…)
11 — Na ausência de aceitação ou apresentação considera-se a colocação sem efeito, aplicando-se o disposto no artigo 18.º do Decreto–Lei n.º 132/2012, com as necessárias adaptações.”
(cf. aviso de abertura n.º 9653-A/2012, de 11 de Julho de 2012 disponível em www.dre.pt);

4. No dia 27 de Dezembro de 2012 a Autora foi colocada, através de reserva de recrutamento n.º 15, no Agrupamento de Escolas (...), em (...) (cf. documentos a fls. 16 a 18 do processo administrativo);

5. No dia 28 de Dezembro de 2012 a Autora apresentou-se no Agrupamento de Escolas (...) em (...) e iniciou, nessa data, o exercício de funções não docentes (cf. documento a fls. 20 e 21 dos autos em processo físico e a fls. 19 e 52 do processo administrativo);

6. À Autora foi atribuído o horário junto a fls. 13 dos autos que aqui se dá por integralmente reproduzido (cf. documentos a fls. 13, 67, 68 dos autos em processo físico);

7. No dia 3 de Janeiro de 2013 a Autora lecionou de acordo com o horário que lhe foi atribuído (cf. ofício a fls. 52 do processo administrativo);

8. No dia 4 de Janeiro de 2013 a Autora foi alertada, pela Direção do Agrupamento de Escolas, que não poderia continuar a lecionar uma vez que se verificou a falta de aceitação eletrónica da sua candidatura, o que determinou a suspensão da sua atividade docente (cf. documentos a fls. 20 e 21 dos autos em processo físico);

9. No dia 4 de Janeiro de 2013 a Autora apresentou uma exposição junto da Direção-Geral da Administração Escolar, da Direção Regional de Educação do Centro e do Agrupamento de Escolas (...) a informar da existência de falta de aceitação eletrónica e a pedir para ser mantida no lugar em que tinha sido colocada (cf. mensagens eletrónicas a fls. 61 a 66 dos autos em processo físico);

10. No dia 11 de Janeiro de 2013 a Diretora de Serviços do Recrutamento e Mobilidade da Direção-Geral da Administração Escolar remeteu à Autora um ofício com o seguinte teor:

“(…) Em resposta à solicitação constante do vosso Fax, datado de 7 de janeiro de 2013, somos a informar que, nos termos da Nota Informativa de 08 de outubro de 2012: «Os candidatos colocados no âmbito da Reserva de Recrutamento devem aceitar a colocação na aplicação informática disponibilizada pela Direção-Geral da Administração Escolar, no prazo de 48 horas, correspondentes aos dois primeiros dias úteis seguintes à publicação da lista de colocação (Artigo 16.º do DL 132/2012, de 27 de Junho).
O não cumprimento dos deveres de aceitação e apresentação é considerado, para todos os efeitos legais, como não aceitação da colocação, nos termos do disposto no Artigo 18.º do DL 132/2012, de 27 de Junho». Assim, o não cumprimento dos prazos referidos determinam a anulação da colocação, pelo que a situação é irreversível.”

(cf. ofício a fls. 23 dos autos em processo físico);

11. O horário atribuído à Autora, na sequência do despacho de 11 de Janeiro de 2013, foi atribuído a A. (cf. documento a fls. 42, 44 a 50 do processo administrativo);

12. No dia 18 de Janeiro de 2013 A. celebrou com o Agrupamento de Escolas (...), em (...), um contrato de trabalho a termo incerto (cf. contrato a fls. 45 a 48 do processo administrativo);

E consignou não resultarem provados outros factos com interesse para a decisão do mérito da causa.
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B – De direito
1. Da sentença recorrida
Pela sentença recorrida a Mmª Juíza a quo enfrentando o pedido impugnatório dirigida ao ato administrativo de 11/01/2013 que anulou a colocação da autora no Agrupamento de Escolas (...), em (...), julgou verificada a sua invalidade do ato impugnado, mas improcedente, nos termos do artigo 45.º nº 1 do CPTA, o pedido condenatório formulado pela autora, e ordenou a notificação das partes para, querendo, acordarem, no prazo de 20 dias, o montante da indemnização a pagar pela Entidade Demandada à autora pelos danos derivados da impossibilidade de se repetir o ato administrativo impugnado sem os vícios que aqui lhe foram apontados.

2. Da análise e apreciação do recurso
2.1 Da nulidade decorrente da falta de notificação do réu para apresentar alegações escritas – (conclusões 1ª a 5ª das alegações de recurso)
2.1.1 O recorrente começa por invocar que o Tribunal a quo incorreu em violação do disposto artigo 91º n.º 4 do CPTA ao não ter procedido à notificação do réu recorrido para alegações, quando o mesmo não prescindiu desse direito processual; que a violação daquela norma processual determina a nulidade da sentença, porquanto o réu viu coartado o seu direito de defesa e de exercício do contraditório previsto também no artigo 3º nº 3 do CPC, aplicável ex vi do artigo 1º do CPC; que falta à verdade a sentença quando refere que «Regularmente notificadas, as partes não apresentaram alegações»; que só com a notificação da sentença teve o recorrente conhecimento do incumprimento do disposto no artigo 91º nº 4 do CPTA; que caso não se entenda que a inexistência de notificação das partes para alegações configura um vício que acarreta a nulidade da sentença, ainda assim aquele vício processual, porque coloca em causa os direitos de defesa do recorrente, sempre determinaria a anulação da sentença, pugnando que se declare a nulidade ou, em alternativa, a anulação da sentença recorrida.
Vejamos.
2.1.2 Comece por dizer-se que a invocação aqui feita pelo recorrente não se reconduz a qualquer causa de nulidade da sentença (nulidade decisória).
O que poderá ocorrer, como aliás não deixa de invocar, é nulidade processual, situada a montante desta, consistente precisamente na omissão de notificação do réu para apresentar alegações escritas, nos termos do então previsto no artigo 91º nº 4 do CPTA, com influência sobre a decisão da causa.
2.1.3 Como é sabido as situações de nulidade da sentença encontram-se legalmente tipificadas no artigo 615º nº 1 do CPC novo, aprovado pela Lei nº 41/2013, aplicável ao contencioso administrativo ex vi do artigo 1º do CPTA, cuja enumeração é taxativa, ali se dispondo o seguinte:
É nula a sentença quando:
a) Não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar -se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.”

2.1.4 Ora, como é bom de ver, o incumprimento do disposto no artigo 91º nº 4 do CPTA (na redação temporalmente aplicável, a anterior à revisão operada pelo DL. nº 214-G/2015, considerando a data em que foi instaurada a ação) nos termos do qual quando não tenha havido lugar a audiência pública (a que aludia o artigo 91º nºs 1, 2 e 3 do CPTA) e as partes não tenham renunciado à apresentação de alegações escritas, deviam ser “…notificados o autor, pelo prazo de 20 dias, e depois, simultaneamente, a entidade demandada e os contrainteressados, por igual prazo, para, querendo, as apresentarem”, não consubstancia nenhuma situação de nulidade da sentença das enunciadas no artigo 615º nº 1 do CPC, aqui aplicável ex vi do artigo 1º do CPTA.
Nem mesmo a circunstância de não ser exata a referência feita no relatório da sentença de que «Regularmente notificadas, as partes não apresentaram alegações.».
2.1.5 Mas haverá nulidade processual, consistente na omissão da notificação para apresentação de alegações escritas?
2.1.6 Importa, antes do mais, explicitar que embora seja válida no direito processual a ideia segundo a qual «das nulidades reclama-se das decisões recorre-se», nada obsta que em sede do presente recurso se proceda ao conhecimento, e decisão da arguida nulidade processual, consistente na omissão da notificação prevista no artigo 95º nº 4 do CPTA para o réu apresentar alegações escritas, com prolação da sentença sem que àquela parte tenha sido dada a possibilidade de as apresentar (consubstanciando uma nulidade processual por omissão de ato prescrito na lei), já que se está, no caso, perante uma nulidade coberta ou assumida pela própria sentença.
Com efeito as nulidades processuais são “desvios do formalismo processual seguido em relação ao formalismo processual prescrito na lei e a que esta faz corresponder uma invalidade mais ou menos extensa de atos processuais e que podem assumir um de três tipos: a prática de um ato proibido, a omissão de um ato prescrito na lei e, por último, a realização de um ato imposto ou permitido por lei, mas sem o formalismo requerido”, cfr. Antunes Varela, in “Manual de Direito Processual Civil”, 1984, pág. 373.
Sendo que, sem prejuízo das nulidades de conhecimento oficio, as nulidades devem ser arguidas pelos interessados perante o juiz (cfr. artigos 196º e 197º do novo CPC), e é a decisão que vier a ser proferida que poderá ser impugnada pela via recursória, agora com a limitação constante do artigo 630º nº 2 do CPC nos termos do qual “não é admissível recurso das decisões… proferidas sobre as nulidades previstas no nº 1 do artigo 195º … salvo se contenderem com os princípios da igualdade ou do contraditório, com a aquisição processual de factos ou com a admissibilidade de meios probatórios” (vide, a este respeito, António Santos Abrantes Geraldes, in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2014, 2ª Edição, pág. 24). Solução que deve ser aplicada aos casos em que tenha sido praticada uma nulidade processual que se projete na sentença mas que não se reporte a qualquer das alíneas do nº 1 do artigo 615º do CPC, as quais constituem nulidades da própria sentença (nulidades «in interiore»).
A respeito da admissibilidade da arguição e conhecimento em sede de recurso das nulidades processuais cobertas ou assumidas por decisões judiciais, vide, na doutrina, Alberto dos Reis, in, “Comentário ao Código de Processo Civil”, 2.º, págs. 507 e ss., Manuel de Andrade, in, “Noções Elementares de Processo Civil”, pág. 182, e na jurisprudência, entre outros, os Acórdãos do STA de 28/03/2012, Proc. 01178/11, de 28/03/2012, Proc. 0934/11 e de 15/09/2011 (do Pleno), Rec. 505/10-20; deste TCA Sul de 03/11/2011, Proc. 07960/11 e do TCA Norte de 27/10/2011, Proc. 00647/10, todos in www.dgsi.pt..
2.1.7 Feita esta explicitação vejamos, então, por a nada obstar, se ocorre a invocada nulidade processual, consistente na prolação da sentença sem que o réu tenha sido notificado, nos termos do artigo 91º nº 4 do CPTA, para apresentar alegações escritas.
2.1.8 Porque com relevo para o conhecimento desta questão, atenham-se nos seguintes elementos factuais que ressumam dos autos:
1) – A autora, M. instaurou em 03/05/2013 no Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra contra o MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CIÊNCIA a presente ação administrativa especial na qual impugnou o ato administrativo de 11/01/2013, que anulou a colocação da Autora no Agrupamento de Escolas (...), em (...), peticionando a sua declaração de nulidade e bem assim a consequente condenação da Entidade Demandada a colocar a autora naquele agrupamento, no usufruto de futuras reconduções no lugar, na contagem de tempo integral de serviço e no processamento do respetivo vencimento.
- (cfr. fls. 1 SITAF)
2) – Pelo despacho-saneador datado de 10/11/2014 foi julgada improcedente a exceção dilatória de ilegitimidade passiva (litisconsórcio necessário passivo) que havia sido suscitado pelo réu na sua contestação, e considerado não existir também qualquer outra causa obstativa ao prosseguimento do processo, nem haver matéria de facto controvertida, tendo então sido nele consignado o seguinte:
«O autor, porém, não prescindiu das alegações finais, pelo que não é nesta sede que se haverá de conhecer do mérito da causa.
Como assim, proceda-se em conformidade com o art. 91º nº 4 do CPTA.»
- (cfr. fls. 175 SITAF)
3) – Por ofício datado de 12/11/2014 foi a autora notificada daquele despacho-saneador e bem assim «…para no prazo de 20 dias apresentar alegações escritas, nos termos do disposto no artº 91º nº 4 do CPTA».
- (cfr. fls. 178 SITAF)
4) – Por ofício datado de 12/11/2014 foi o réu notificado daquele despacho-saneador, ali se mencionando o seguinte: «…sendo que apenas apresentará alegações escritas, quando notificado nos termos do art.º 91º n.º 4 do CPTA»
- (cfr. fls. 180 SITAF)
5) – A autora não apresentou alegações escritas.
- (cfr. fls. 178-184 SITAF)
6) – Sem que o réu tenha sido notificado para apresentar alegações escritas, e sem que o réu as tenha espontaneamente apresentado, os autos foram conclusos em 16/12/2014 ao Mmº Juiz então titular do processo.
- (cfr. fls. 178-184 SITAF)
7) – Redistribuídos os autos em 18/04/2017 (nos termos do Despacho n.º 2/2017, da mesma data, do Senhor Juiz Presidente do TAF de Coimbra) a Mmª Juíza que passou, então, a ser a titular do processo, proferiu a sentença de 23/06/2017, objeto do presente recurso.
- (cfr. fls. 184-185 SITAF)
8) – A sentença recorrida foi notificada às partes através de ofícios de notificação expedidos em 28/06/2017.
- (cfr. fls. 196-197 SITAF)
9) – O réu interpôs recurso da sentença em 13/09/2017.
- (cfr. fls. 225-227 SITAF)

2.1.9 O CPTA na sua versão original (anterior às alterações que lhe foram introduzidas pelo DL. n.º 214-G/2015), assumia uma matriz essencialmente dualista das formas de processo, estabelecendo duas formas de processos principais não urgentes, a ação administrativa comum e a ação administrativa especial (vide, a este propósito, Sérvulo Correia, “Unidade ou pluralidade de meios processuais principais no contencioso administrativo”, in Cadernos de Justiça Administrativa, nº 22, pág. 23 ss.; Diogo Freitas do Amaral e Mário Aroso de Almeida, in Grandes Linhas da Reforma do Contencioso Administrativo, Almedina, Coimbra, 2003, pág. 88 ss.; Mário Aroso de Almeida, in O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos, Almedina, Coimbra, 2004, pág. 78 ss.; José Carlos Vieira de Andrade, in A Justiça Administrativa (Lições), Almedina, 2004, pág. 172 segs., e ainda Pedro Gonçalves, “A Acção Administrativa Comum” in, Stvdia Ivridica - Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra Administrativa, 86, Colloquia – 15, pág. 127 segs).
Com efeito, de harmonia com o então disposto no artigo 35º, nºs 1 e 2 do CPTA eram estabelecidas essas duas formas de processos principais não urgentes: a Ação Administrativa Comum (nas formas ordinária, sumária ou sumaríssima), prevista no Título II do Código e a Ação Administrativa Especial, prevista no Título III do Código.
Sendo que de acordo com o disposto no artigo 37º nº 1 do CPTA seguiam a forma da ação administrativa comum “…os processos que tenham por objeto litígios cuja apreciação se inscreva no âmbito da jurisdição administrativa e que, nem neste código nem em legislação avulsa sejam objeto de regulação especial”. E o nº 2 daquele artigo 37º do CPTA estabelecia, enumerando-as, as pretensões que deveriam obedecer à forma de ação administrativa comum.
Por sua vez, de harmonia com o disposto no artigo 46º nº 1 do CPTA seguiam a forma da ação administrativa especial “…os processos cujo objeto sejam pretensões emergentes da prática ou omissão ilegal de atos administrativos, bem como de normas que tenham ou devessem ter sido emitidas ao abrigo de disposições de direito administrativo”. Prevendo o nº 2 deste artigo 46º as pretensões que deveriam obedecer à forma de ação administrativa especial, nelas se abarcando, as seguintes:
“a) Anulação de um ato administrativo ou declaração da sua nulidade ou inexistência jurídica;
b) Condenação à prática de um ato administrativo legalmente devido;
c) Declaração da ilegalidade de uma norma emitida ao abrigo de disposições de direito administrativo;
d) Declaração da ilegalidade da não emanação de uma norma que devesse ter sido emitida ao abrigo de disposições de direito administrativo.”

2.1.10 Na situação presente estamos perante processo que seguiu a forma da ação administrativa especial, o qual foi instaurada em 03/05/2013, visando a impugnação do ato de 11/01/2013, que anulou a colocação da autora no Agrupamento de Escolas (...), em (...), cuja declaração de nulidade ou anulação foi peticionada e bem assim a consequente condenação da Entidade Demandada a colocar a autora naquele agrupamento, no usufruto de futuras reconduções no lugar, na contagem de tempo integral de serviço e no processamento do respetivo vencimento.
2.1.11 A tramitação da ação administrativa especial inclui, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 91º nº 1, 2, 3 e 4, 78º nº 4, 83º nº 2, 87º nº 1 alínea b) do CPTA, a apresentação de alegações escritas pelas partes antes da prolação da decisão sobre o mérito da causa quando não haja lugar à audiência pública por iniciativa das partes, situação em que as alegações de direito são aduzidas de forma oral, ou quando as partes não tenham renunciado à sua apresentação.
Havendo lugar à apresentação de alegações escritas (apelidadas de “alegações finais” no artigo 87º nº 1 alínea b) do CPTA) as partes eram previamente notificadas para as apresentarem, pelo prazo sucessivo de 20 dias (cfr. nº 4 do artigo 91º do CPTA), ainda que as mesmas fossem de apresentação facultativa, como decorre da última parte daquele nº 4 (… “para, querendo, as apresentarem”), não existindo qualquer efeito preclusivo ou cominatório da sua não apresentação por qualquer das partes.
Temos assim que o regime regra na tramitação da ação administrativa especial é o da possibilidade de as partes apresentarem alegações escritas antes de ser proferida decisão sobre o mérito da causa, para o que eram notificadas para o efeito. Só assim não sendo quando tivesse havido lugar a audiência pública por iniciativa das partes, a que aludiam os nºs 1, 2 e 3 do artigo 91º do CPTA, ou quando as partes tivessem a elas previamente renunciado nos termos das disposições conjugadas dos artigos 78º nº 4 e 83º nº 2 do CPTA, como decorre do disposto nos artigos 87º nº 1 alínea b) e 91º nº 4 do mesmo Código.
2.1.12 No despacho-saneador proferido em 10/11/2014 o Mmº Juiz a quo não deixou de atender que devia ser dado cumprimento ao então disposto no artigo 91º nº 4 do CPTA antes de se proferir sentença, o que determinou.
Sucede é que a secretaria judicial apenas lhe deu cumprimento, em parte.
2.1.13 É que nos termos daquele artigo 91º nº 4 do CPTA (na redação temporalmente aplicável, a anterior à revisão operada pelo DL. nº 214-G/2015) devia ser assegurado às partes a notificação para apresentarem alegações escritas, sendo primeiramente notificado “…o autor, pelo prazo de 20 dias, e depois, simultaneamente, a entidade demandada e os contrainteressados, por igual prazo…”.
Ora, se bem que a autora tenha sido notificada, pelo ofício datado de 12/11/2014 (de fls. 178 SITAF), do despacho-saneador e bem assim «…para no prazo de 20 dias apresentar alegações escritas, nos termos do disposto no artº 91º nº 4 do CPTA», já o réu foi apenas notificado (igualmente por ofício datado de 12/11/2014 de fls. 180 SITAF) do despacho-saneador. Não tendo a secretaria judicial emitido notificação ao réu para apresentar alegações depois de esgotado o prazo de 20 dias de que a autora dispunha para o fazer. E foi sem que o réu tenha sido notificado para as apresentar que os autos foram conclusos em 16/12/2014 ao Mmº Juiz então titular do processo.
Essa omissão não foi detetada pela Mmª Juíza a quo que proferiu a sentença, e nela consignou, aliás, que «Regularmente notificadas, as partes não apresentaram alegações».
Mas, tal como os autos evidenciam, tal notificação ao réu não ocorreu.
2.1.14 A omissão desse ato de notificação para apresentação de alegações escritas, exigido por lei na tramitação processual da ação administrativa especial, porque pode influir no exame ou na decisão da causa, consubstancia de harmonia com o disposto no artigo 195º nº 1 do CPC novo, ex vi do artigo 1º do CPTA, nulidade processual.
O que tem como inevitável consequência (nos termos do artigo 195º nº 2 do CPC novo, ex vi do artigo 1º do CPTA) a anulação da sentença recorrida. O que se decide.
Devendo, neste conspecto, os autos baixar à 1ª instância para assegurar a prática desse omitido ato de notificação ao réu para que apresente, querendo, alegações escritas no prazo de 20 dias, nos termos do citado artigo 91º nº 4 do CPTA. Sendo, após, e se a tanto nada entretanto obstar, prolatada nova sentença.

2.2 Dos demais fundamentos do recurso
Em face da supra decidida anulação da sentença por verificação da apontada nulidade processual, fica concomitantemente prejudicado o conhecimento das demais questões trazidas em recurso. Das quais, assim, nos abstemos de conhecer.
*
IV. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal em conceder provimento ao recurso, anulando-se a sentença recorrida por verificação da apontada nulidade processual, determinando-se a baixa dos autos à 1ª instância para que seja assegurada a prática do omitido, nos termos supra consignados.

Sem custas na presente instância de recurso, na medida em que o mesmo obteve provimento e a recorrida não contra-alegou – artigo 527º nºs 1 e 2 do CPC novo (aprovado pela Lei nº 41/2013) e artigos 7º e 12º nº 2 do RCP (artigo 8º da Lei nº 7/2012, de 13 de fevereiro) e 189º nº 2 do CPTA.
*
Notifique.
D.N.
*
Porto, 3 de julho de 2020

M. Helena Canelas
Isabel Costa
João Beato