Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00049/14.6BEBRG |
Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
Data do Acordão: | 12/21/2017 |
Tribunal: | TAF de Braga |
Relator: | Pedro Vergueiro |
Descritores: | OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL NULIDADE DA SENTENÇA POR FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO PRESCRIÇÃO INSOLVÊNCIA INCONSTITUCIONALIDADE ORGÂNICA COMPETÊNCIA LEGISLATIVA JULGAMENTO DA MATÉRIA DE FACTO GERÊNCIA DE FACTO |
Sumário: | I) Em relação à nulidade da sentença por não especificação dos fundamentos de facto, há que ter em atenção que, como é sabido, só se verifica tal nulidade quando ocorre falta absoluta de fundamentação, sendo que há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. II) O art. 100° do CIRE aprovado pelo Decreto-Lei nº 53/2004, de 18 de Março é inconstitucional, por violação do artº 165º nº 1 alínea i) da Constituição, por o governo não ter legislado ao abrigo e autorização legislativa e ser inovadora a causa de suspensão ali prevista quando interpretado tal preceito no sentido de que a declaração de insolvência suspende o prazo prescricional das dívidas tributárias imputáveis ao responsável subsidiário no âmbito do processo tributário. III) A lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, o que significa que o Recorrente tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida. IV) A gerência é, por força da lei e salvo casos excepcionais, o órgão da sociedade criado para lhe permitir actuar no comércio jurídico, criando, modificando, extinguindo, relações jurídicas com outros sujeitos de direito. Estes poderes não são restritos a alguma espécie de relações jurídicas; compreendem tantas quantas abranja a capacidade da sociedade (cfr. objecto social), com a simples excepção dos casos em que as deliberações dos sócios produzam efeitos externos (cfr. arts. 260º nº 1 e 409º nº 1 do Código das Sociedades Comerciais). O gerente/ administrador goza de poderes representativos e de poderes administrativos face à sociedade. A distinção entre ambos radica no seguinte: se o acto em causa respeita às relações internas entre a sociedade e quem a administra, situamo-nos no campo dos poderes administrativos do gerente. Pelo contrário, se o acto respeita às relações da sociedade com terceiros, estamos no campo dos poderes representativos. Por outras palavras, se o acto em causa tem apenas eficácia interna, estamos perante poderes de administração ou gestão. Se o acto tem eficácia sobre terceiros, verifica-se o exercício de poderes de representação. V) Analisada a matéria de facto provada, constata-se que ficou por provar uma realidade susceptível de evidenciar um tal exercício efectivo dos poderes de administração por parte dos ora Recorridos, sendo que, quem estava onerada com o peso da prova era a Fazenda Pública, por isso que, o exercício efectivo da administração é facto constitutivo de um pressuposto da responsabilidade subsidiária que se pretende efectivar através da reversão e a lei não estabelece, nesse domínio, qualquer presunção que inverta o ónus da prova.* * Sumário elaborado pelo Relator. |
Recorrente: | Autoridade Tributária e Aduaneira |
Recorrido 1: | A... e outros |
Decisão: | Negado provimento ao recurso |
Aditamento: |
Parecer Ministério Publico: |
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Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO A Excelentíssima Representante da Fazenda Pública, devidamente identificada nos autos, inconformada veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, datada de 22-02-2017, que julgou procedente a pretensão deduzida na presente instância de OPOSIÇÃO por Á…, Ál…, M… e Al…, com referência à execução originariamente instaurada contra a sociedade “F…, Lda.”, e contra eles revertida, com referência a dívidas de IVA de 2003, 2004 e 2005 e IRS do ano de 2004, no valor de € 71.444,67. Formulou nas respectivas alegações (cfr. fls. 219-224), as seguintes conclusões que se reproduzem: “ (…) I - A douta sentença recorrida que julgou procedente a oposição, salvo o devido, e muito, respeito que nos merece, padece de erro de julgamento de direito, bem como no que concerne à matéria de facto, concretamente ao não aplicar ao caso em apreço a norma do artigo 100.º do CIRE, aprovado pelo DL n.º 53/2004, de 18 de março, por um lado, e ao concluir, por outro, que a Administração Tributária não logrou comprovar o exercício efetivo da gerência por parte dos Oponentes. II - Quanto à prescrição, o douto acórdão do Tribunal Constitucional n.° 362/2015, de 2015-07-09, proferido no processo n.º 760/14, invocado na douta sentença recorrida, salvo melhor opinião, não declara a inconstitucionalidade com força obrigatória geral, nos termos consignados no artigo 282.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, pelo que o referido acórdão tem mera eficácia inter partes e não erga omnes, não impedindo a aplicação da norma do artigo 100.º do CIRE, que se mantém válida e vigente na ordem jurídica, ao caso concreto em apreço. III - Por força do disposto artigo 100.º do CIRE, o prazo de prescrição da dívida exequenda relativa a IRS do ano de 2004, e a IVA, dos anos de 2003 e 2004, manteve-se suspenso desde a data da declaração de insolvência da devedora, em 2005-07-01, até ao encerramento do processo de insolvência, em 2012-11-23, pelo que as dívidas em causa não estão prescritas. IV - As declarações de trabalhadores da sociedade devedora prestadas no âmbito do procedimento de reversão, que indicam que os Oponentes geriam efetivamente a sociedade devedora, foram importantes na decisão de reversão do processo executivo contra os Oponentes, cujo despacho se refere, além de outros elementos, às "informações prestadas por trabalhadores" [juntas ao processo executivo], mas totalmente desconsideradas na fundamentação da sentença recorrida, o que impediu uma correta e completa apreciação da prova da gerência levada a cabo pela AT. V - O Tribunal não valorou a prova testemunhal produzida em sede de audiência de inquirição de testemunhas, embora a mesma se tenha revelado esclarecedora quanto à gerência da sociedade devedora, por se tratar de trabalhadores da sociedade, que reconheceram os quatro sócios, Oponentes, como sendo quem geria a empresa em causa. VI - A análise do teor do despacho de reversão, contendo a alegação de todos os pressupostos da reversão, e dos factos a que o mesmo se reporta, apurados com base na prova documental produzida, incluindo os autos de declarações dos trabalhadores, contidos no processo executivo, conjugados com a prova testemunhal produzida em sede de audiência de inquirição de testemunhas, impõe a conclusão de que a AT alegou e demonstrou o exercício efecivo da gerência, tal como lhe competia [cfr. artigo 74.º, n.º 1, da LGT], devendo improceder, também por este motivo, a oposição. Nestes termos, e nos mais que serão doutamente supridos por Vossas Excelências, deverá o presente recurso obter provimento, revogando-se a douta sentença recorrida.” Os Recorridos Á…, Ál…, M…a e Al… não apresentaram contra-alegações. O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser concedido parcial provimento ao recurso. Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento. 2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que as questões suscitadas resumem-se, em suma, em analisar a suscitada nulidade da sentença por falta de fundamentação de facto, indagar da bondade da não aplicação ao caso em apreço, em sede de prescrição, da norma do artigo 100.º do CIRE, aprovado pelo DL n.º 53/2004, de 18 de Março e bem assim apreciar se os ora Recorridos exerceram a gerência efectiva ou de facto da sociedade originária devedora, no período em que para tal foram nomeados e em que nasceram as dívidas exequendas que subsistem nos autos de molde a poderem ser responsabilizados pelo pagamento das mesmas, abrangendo o erro de julgamento de facto neste âmbito. 3. FUNDAMENTOS3.1. DE FACTO Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte: “… 1. Foi instaurado o processo de execução 234820050103625 e apensos, em nome de "F…, LDA", NIPC 5…, no Serviço de Finanças de Viana do Castelo, referentes a IRS de 2004 e IVA de 2003, 2004 e 2005, no valor global de € 71.444,67, que aqui se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais - cfr. Certidão de divida e fls 2 a 34 do Pef apenso; 2. Em 06-11-2013, foi exarado despacho de reversão, no qual foi revertida a execução fiscal referida, contra os ora Oponentes, que se transcreve na parte mais relevante: "(…) Considerando que os contribuintes acima referidos são sócios gerentes da executada, conforme elementos juntos aos autos, designadamente certidão da conservatória do registo Comercial, contrato de fornecimento de energia celebrado com a EDP de Viana do Castelo, informações prestadas por trabalhadores (...)" - fls 77 do PEF apenso; 3. Por carta registada com aviso de receção assinado em 08-11-2013 por Maria… foi o Oponente Al… citado - fls 66 do Pef apenso; 4. Por carta registada com aviso de receção assinado em 11-11-2013 foi o Oponente Al… citado - fls 73 do Pef apenso; 5. Por carta registada com aviso de receção assinado em 08-11-2013 foi o Oponente Á… citado - fls 78 do Pef apenso; 6. Por prova de depósito em 22-11-2013 foi o Oponente M… citado - fls 79 a 87 do Pef apenso; 7. Da certidão da Conservatória do Registo Comercial de Viana do Castelo relativa à sociedade "F…, Lda" consta como gerentes: - M… e Al…, sendo que é suficiente para obrigar a sociedade a assinatura de Al… e de outro gerente - Doc junto a fls 91 dos autos; 8. Por sentença datada de 01-07-2005, proferida no Proc. nº 2897/05.9 TBVCT, que correu termos nos Juízos de Competência Especializada Cível do Tribunal de Viana do Castelo, foi declarada a insolvência da devedora originária "F… Lda.". (cfr. fls. 82 dos autos) 9. A presente Oposição deu entrada no Serviço de Viana do Castelo, em 12-12-2013. (cfr. fls. 6 e informação de fls 98 dos autos). Factos Não Provados Não resultam provados quaisquer outros factos, com relevância para a decisão da causa, tendo em conta as várias soluções de direito plausíveis. Motivação da decisão de facto A decisão da matéria de facto resultou da análise dos documentos e informações oficiais, não impugnados, juntos aos autos pelos Oponentes e constantes do processo de execução fiscal, bem como nas posições assumidas nos articulados, tudo conforme foi referido em cada ponto dos factos assentes. Não sendo necessário recorrer à prova testemunhal ouvida.” «» 3.2. DE DIREITO Assente a factualidade apurada cumpre, então, entrar na análise da realidade em equação nos autos e que se prende, num primeiro momento, com a questão da nulidade da sentença por falta de fundamentação de facto suscitada pelo Ministério Público, referindo, em termos essenciais, que considerar tão só, como fez a sentença que os depoimentos testemunhais (foram ouvidas quatro testemunhas) não eram de relevar por influírem na presente sentença é totalmente ininteligível, impondo-se concluir que na sentença apenas existe uma aparente fundamentação, no que ao exame crítico da prova concerne. Relativamente ao núcleo essencial desta arguição, há que ter em atenção que, como é sabido, só se verifica tal nulidade quando ocorre falta absoluta de fundamentação - Ac. do S.T.A. de 16-11-2011, Proc. nº 0802/10, www.dgsi.pt - , sendo que tal como refere o Prof. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, volume V, página 140 “há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto.”. Porém, como refere o Cons. Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, 5ª ed., Vol. I, pág. 909, “deverão considerar-se como falta absoluta de fundamentação os casos em que ela não tenha relação perceptível com o julgado ou seja ininteligível, situações em que se está perante uma mera aparência de fundamentação. Com efeito, a fundamentação destina-se a esclarecer as partes, primacialmente a que tiver ficado vencida, sobre os motivos da decisão, não só para ficar convencida de que não tem razão, mas também porque o conhecimento daqueles é necessário ou, pelo menos, conveniente, para poder impugnar eficazmente a decisão em recurso ou arguir nulidades, designadamente a derivada de eventual contradição entre os fundamentos e a decisão. Por isso, quando a fundamentação não for minimamente elucidativa das razões que levaram a decidir como se decidiu deverá entender-se que se está perante uma nulidade por falta de fundamentação”. Por outro lado, quanto à nulidade decorrente da falta de exame crítico das provas, é sabido que nos termos do disposto nos arts. 123º nº 2 do CPPT e 659º nº 3 do C. Proc. Civil, na elaboração da decisão final o julgador está vinculado a elencar discriminadamente, a factualidade demonstrada da não provada, fundamentando porque veio a tomar o sentido decisório final, seja no que concerne ao julgamento da matéria de direito, seja, como é axiomático e evidente, no que diz respeito ao julgamento da matéria de facto, na medida em que aquele mais não será do que subsunção desta última ao enquadramento jurídico tido por relevante e aplicável. Nesta sequência, cumpre notar que o vício em apreço, em qualquer das vertentes apontada, apenas ocorre quando haja ausência total de fundamentos, sendo que, é ponto assente que na sentença posta em crise foi analisada a prova produzida, nomeadamente a prova testemunhal, pois consignou-se que “A decisão da matéria de facto resultou da análise dos documentos e informações oficiais, não impugnados, juntos aos autos pelos Oponentes e constantes do processo de execução fiscal, bem como nas posições assumidas nos articulados, tudo conforme foi referido em cada ponto dos factos assentes. Não sendo necessário recorrer à prova testemunhal ouvida.”. Presente o exposto, e considerando os termos da decisão recorrida, é manifesto que a invocada nulidade não pode ser atendida na medida em que foram fixados os factos descritos no probatório relacionados com a problemática em causa, procedendo-se depois à análise das questões apontadas nos autos, o que significa que, nesta matéria, se exteriorizam as razões de facto e de direito que fundamentam a decisão, de modo que, a matéria apontada pelo Ministério Público terá de ser enquadrada no âmbito do erro na valoração crítica dessas mesmas provas, não podendo suportar a invocada nulidade da sentença por falta de fundamentação de facto. Aliás, basta ter presente o cerne do exposto na decisão recorrida para se perceber o exposto, na medida em que aí se refere que “o teor do despacho de reversão do qual resultou o chamamento dos Oponentes ao Processo de Execução Fiscal, é saliente a total ausência de factos concretos que permitam fundar um juízo conclusivo quanto efetivo exercício do cargo de gerência para o qual os Oponentes, não todos, haviam sido nomeados referentes ao período a que se reporta o pressuposto da responsabilização.”. Pois bem, o cerne da análise da decisão recorrida assenta no elemento agora descrito e considerando apenas tal situação, encontramos a justificação para a desconsideração da prova testemunhal nos termos acima descritos, não merecendo a decisão, nos seus exactos contornos, a censura que o Ministério Público lhe dirige. A partir daqui, importa então considerar a realidade subjacente ao presente recurso, o que significa a ponderação da questão da prescrição, constituindo o ponto central desta discussão a não aplicação ao caso em apreço da norma do artigo 100.º do CIRE, aprovado pelo DL n.º 53/2004, de 18 de Março. Pois bem, a decisão recorrida no tratamento da matéria da prescrição, defendeu que a declaração de insolvência da devedora originária, não constitui um facto interruptivo da prescrição das dívidas tributárias imputáveis ao devedor subsidiário, ancorando-se em jurisprudência do Tribunal Constitucional: "Neste contexto, o artigo 100.° do CIRE, interpretado no sentido de que a declaração de insolvência suspende o prazo prescricional das dívidas tributárias imputáveis ao devedor subsidiário no âmbito do processo tributário, ao ser editado pelo Governo a descoberto de credencial parlamentar e tendo em conta a matéria que regula, enferma do vício de inconstitucionalidade orgânica." (cfr. Acórdão do Tribunal Constitucional n° 362/2015, proferido no Processo n° 760/14, em 9.07.2015, disponível em www.tribunalconstitucional.pt). Nas suas alegações, a Recorrente aponta que, quanto à prescrição, o douto acórdão do Tribunal Constitucional n.° 362/2015, de 2015-07-09, proferido no processo n.º 760/14, invocado na douta sentença recorrida, salvo melhor opinião, não declara a inconstitucionalidade com força obrigatória geral, nos termos consignados no artigo 282.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, pelo que o referido acórdão tem mera eficácia inter partes e não erga omnes, não impedindo a aplicação da norma do artigo 100.º do CIRE, que se mantém válida e vigente na ordem jurídica, ao caso concreto em apreço e por força do disposto artigo 100.º do CIRE, o prazo de prescrição da dívida exequenda relativa a IRS do ano de 2004, e a IVA, dos anos de 2003 e 2004, manteve-se suspenso desde a data da declaração de insolvência da devedora, em 2005-07-01, até ao encerramento do processo de insolvência, em 2012-11-23, pelo que as dívidas em causa não estão prescritas. Com este pano de fundo, crê-se que a alegação da Recorrente apenas se compreende em função de uma leitura apressada da situação. Na verdade, independentemente de existir uma declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral, nos termos consignados no artigo 282º nº 1 da Constituição da República Portuguesa e do alcance da decisão a que alude a Recorrente, nada impede que, reflectindo sobre os termos do aresto em causa, os Tribunais possam “arrepiar” caminho, dando expressão imediata à orientação definida pelo Tribunal Constitucional, integrando essa realidade na apreciação das situações colocadas à consideração do Tribunal após a prolação de tal aresto. Aliás, foi esse o caminho trilhado pelo Supremo Tribunal Administrativo, como se retira do Ac. do S.T.A. de 07-10-2015, Proc. nº 0115/14, www.dgsi.pt, onde se dá nota do aludido juízo de inconstitcionalidade e da subsequente alteração da jurisprudência neste domínio, afirmando-se que “O estabelecimento de causas de suspensão do prazo de prescrição da obrigação tributária, por contender com garantias dos contribuintes, inclui-se na reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República, tendo as respectivas normas de estar contidas em lei formal da Assembleia da República ou em Decreto-Lei do Governo na sequência de uma Lei de Autorização Legislativa emitida pelo Parlamento para esse efeito.” e bem assim que “O art. 100° do CIRE aprovado pelo Decreto-Lei nº 53/2004, de 18 de Março é inconstitucional, por violação do artº 165º nº 1 alínea i) da Constituição, por o governo não ter legislado ao abrigo e autorização legislativa e ser inovadora a causa de suspensão ali prevista quando interpretado tal preceito no sentido de que a declaração de insolvência suspende o prazo prescricional das dívidas tributárias imputáveis ao responsável subsidiário no âmbito do processo tributário.”. Nesta medida, existindo jurisprudência do Tribunal Constitucional no sentido de julgar inconstitucional, por violação do artigo 165.º, n.º 1, alínea i), da Constituição, a norma do artigo 100.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de Março, interpretada no sentido de que a declaração de insolvência aí prevista suspende o prazo prescricional das dívidas tributárias imputáveis ao responsável subsidiário no âmbito do processo tributário e bem assim o facto de o S.T.A. ter acolhido a posição assumida pelo TC, alterando a sua jurisprudência, mostra-se mais do avisado ponderar esta nova realidade, sendo que foi este o procedimento do Tribunal recorrido, situação que não merece qualquer censura, não tendo qualquer cabimento o exposto pela Recorrente nesta sede. Diga-se ainda que, em momento mais recente, o Tribunal Constitucional na sequência do Acórdão nº 270/2017 de 31 de Maio de 2017 (Processo nº 894/16) voltou a “Julgar inconstitucional, por violação do artigo 165.º, n.º 1, alínea i), da Constituição, a norma do artigo 100.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de março, interpretada no sentido de que a declaração de insolvência aí prevista suspende o prazo prescricional das dívidas tributárias imputáveis ao responsável subsidiário no âmbito do processo tributário”, o que significa que nesta sede existe uma clara continuidade em termos jurisprudenciais, não sendo crível que o S.T.A. venha a inflectir a sua posição nesta matéria, de modo que, tem plena pertinência a afirmação da decisão recorrida que a declaração de insolvência da devedora originária, não constitui um facto interruptivo da prescrição das dívidas tributárias imputáveis ao devedor subsidiário, sendo esta a posição que também é sufragada pelo Tribunal, pelo que manifestamente improcede o exposto pela Recorrente neste âmbito. A Recorrente refere depois que as declarações de trabalhadores da sociedade devedora prestadas no âmbito do procedimento de reversão, que indicam que os Oponentes geriam efetivamente a sociedade devedora, foram importantes na decisão de reversão do processo executivo contra os Oponentes, cujo despacho se refere, além de outros elementos, às “informações prestadas por trabalhadores” [juntas ao processo executivo], mas totalmente desconsideradas na fundamentação da sentença recorrida, o que impediu uma correta e completa apreciação da prova da gerência levada a cabo pela AT, sendo que o Tribunal não valorou a prova testemunhal produzida em sede de audiência de inquirição de testemunhas, embora a mesma se tenha revelado esclarecedora quanto à gerência da sociedade devedora, por se tratar de trabalhadores da sociedade, que reconheceram os quatro sócios, Oponentes, como sendo quem geria a empresa em causa e a análise do teor do despacho de reversão, contendo a alegação de todos os pressupostos da reversão, e dos factos a que o mesmo se reporta, apurados com base na prova documental produzida, incluindo os autos de declarações dos trabalhadores, contidos no processo executivo, conjugados com a prova testemunhal produzida em sede de audiência de inquirição de testemunhas, impõe a conclusão de que a AT alegou e demonstrou o exercício efecivo da gerência, tal como lhe competia [cfr. artigo 74.º, n.º 1, da LGT], devendo improceder, também por este motivo, a oposição. Tal significa que se impõe avançar para a questão de saber se os Recorridos exerceram a gerência efectiva ou de facto da sociedade originária devedora, no período em que para tal foram nomeados e em que nasceram as dívidas exequendas de molde a poderem ser responsabilizados pelo pagamento das mesmas.
Nesta sequência, cabe notar que o despacho referido no parágrafo anterior conclui o processo de reversão, o qual compreende, além do mais, os elementos acima descritos dos quais é possível apreender a identificação dos ora Recorridos como gerentes da aludida sociedade, o que equivale a dizer, até em função da jurisprudência consolidada do S.T.A. acima referida que o processo de reversão que culminou com o despacho de reversão descrito nos autos ponderou todos os elementos de que depende a decisão de reversão, expressando tal decisão essa realidade com referência aos ora Recorridos, de modo que, embora não se acompanhe a linha de análise da decisão recorrida, é necessário voltar à questão inicial de saber se os Recorridos exerceram a gerência efectiva ou de facto da sociedade originária devedora, no período em que para tal foram nomeados e em que nasceram as dívidas exequendas de molde a poderem ser responsabilizados pelo pagamento das mesmas.
4. DECISÃO Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente, mantendo-se a decisão judicial recorrida. Custas pela Recorrente. Notifique-se. D.N.. Porto, 21 de Dezembro de 2017 Ass. Pedro Vergueiro Ass. Ana Patrocínio Ass. Ana Paula Santos |