Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00913/15.5BECBR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:11/05/2021
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:Frederico Macedo Branco
Descritores:EMPREITADA; CONTRATO DE FACTO; CONTRATO IMPERFEITO; TRABALHOS ACRESCIDOS;
Sumário:1 – Tendo sido realizados trabalhos acrescidos, executados e incorporados em obras efetuadas no âmbito de Empreitada contratada, previamente notificados ao dono de obra, sem que este tenha manifestado oposição à sua concretização, nunca tendo sido determinada a suspensão ou cessação dos referidos trabalhos, tendo até chegado a ser emitida autorização de pagamento, mal se compreende como poderiam tais trabalhos deixar de ser pagos.

2 - Tendo a realização dos referidos trabalhos acrescidos sido proposta em reunião realizada, nomeadamente, para o efeito, tendo chegado a ser objeto de despacho de pagamento e não tendo havido qualquer orientação ou determinação para a cessação da realização dos trabalhos em curso, ainda que sem contrato escrito, está-se em presença de um contrato de facto.

3 - Mesmo inexistindo contrato escrito, atenta a matéria dada como provada, sempre a ARS teria de suportar os custos da empreitada realizada, por se ter provado que a mesma foi realizada a seu favor.
A ausência de contrato escrito não autoriza a ilação de que o negócio jurídico seja equivalente a um nada, tal como se pura e simplesmente não tivesse acontecido.

4 - Tal como relativamente aos serviços prestados ao abrigo de um contrato entretanto declarado nulo, perante a inexistência de um contrato escrito, e tendo continuado a ser prestados os trabalhos, sem oposição do dono de obra, enquanto “Contrato de facto”, os mesmos terão de ser remunerados.
A inexistência de contrato escrito relativamente aos acrescidos trabalhos levados a cabo, não autoriza a ilação de que o negócio jurídico seja equivalente a um nada, tal como se pura e simplesmente não tivesse acontecido.
Com efeito, mesmo tendo-se verificado uma omissão na formalização da contratualização controvertida, sempre estaríamos perante uma «relação contratual de facto», ou «contrato imperfeito» noutra terminologia, cujos trabalhos sempre teriam de ser remunerados.

5 - Efetivamente, da factualidade provada é possível concluir que as partes mantiveram no âmbito da identificada empreitada, reuniões regulares e relações contratuais efetivas, sendo que não há rasto ou meros indícios, que a ARS se tenha oposto à realização dos trabalhos que foram sendo realizados.*
* Sumário elaborado pelo relator.
Recorrente:E., SA
Recorrido 1:ADMINISTRAÇÃO REGIONAL DE SAÚDE DO CENTRO
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Conceder parcial provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I Relatório
A E., S.A no âmbito da Ação Administrativa intentada contra a ADMINISTRAÇÃO REGIONAL DE SAÚDE DO CENTRO, I.P, tendente ao pagamento da quantia de €33.764,68, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos até integral pagamento, em resultado do contrato de prestação de serviços, tendo por objeto a realização de trabalhos nas instalações do Centro de Diagnóstico Pneumológico de Coimbra (CDP), inconformada com a Sentença proferida em 6 de maio de 2021 no Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, a qual, em síntese, julgou improcedente a presente Ação, veio interpor recurso jurisdicional da referida decisão para esta instância, em 12 de junho de 2021.
Formula a aqui Recorrente/E. nas suas alegações de recurso apresentadas, as seguintes conclusões:
- A necessidade de executar trabalhos a mais, para além dos previstos inicialmente, surgiu, no decurso dos trabalhos que a autora estava a executar no Centro de Diagnóstico Pneumológico de Coimbra;
- A autora elaborou uma proposta intercalar/revisão de custos e entregou-a em mão, á Diretora do Centro, Dr.ª M., no dia 02/01/2001;
3ª – Os trabalhos, a mais, propostos, tiveram a anuência imediata e concordância da Srª Diretora do Centro de Diagnostico Pneumológico de Coimbra;
– Os trabalhos, propostos a mais, pela autora, foram consideradas imprescindíveis e necessárias, por todos os intervenientes na reunião, havida no dia 09/01/2001;
5ª – Apesar de todos os intervenientes presentes na reunião, terem conhecimento, que a autora, não parou a obra, após a apresentação da sua proposta intercalar, ninguém comunicou ao legal representante da autora, que deveria parar a obra, até haver, uma autorização expressa, por escrito, para a realização das novas obras/continuação, complemento das iniciais, pelo órgão administrativo competente;
6ª – A única questão que foi levantada, na reunião de 09/01/2001, foi quanto ao acréscimo do custo dos trabalhos, por ser ilegal aceitar os acréscimos dos custos da grandeza apresentada;
7ª – Face á manifestação de aceitação por parte da Diretora do Centro da necessidade e sua imprescindibilidade, para o bom funcionamento do Centro de Diagnóstico Pneumológico e manifestação na referida reunião, por todos os órgãos administrativos da ré, presentes, que confirmaram a necessidade e imprescindibilidade da realização das obras propostas, o legal representante interpretou, tal realidade como aceitação da sua proposta/autorização, para executar os novos trabalhos por si propostos, tanto mais, que o órgão jurídico, ficou de enquadrar a situação em casa, de forma legal;
8ª – Interpretação/conclusão tirada, pelo legal representante da autora, que não merce qualquer censura, face á factualidade dada como provada, nº 6, nº 11, ponto 6 e nº 14, onde consta inclusive que a direção financeira, disse que havia verba para pagar os trabalhos a mais indicados e considerados necessários e imprescindíveis;
– A atuação da autora não merce, por outro lado qualquer censura, antes se sente enganada, dado que, o órgão jurisdicional, ficou de fazer o enquadramento legal e nada fez, nem disse, deixando concluir as obras, o que aconteceu no dia 19/03/2001;
10ª - Ao contrário do decidido, pelo douto tribunal “a quo”, que considerou, qua a autora não provou, quais os trabalhos executados e mais e qual o preço dos mesmos, a autora fez a prova de quais eram os trabalhos a mais, quer através da junção, os autos, da sua proposta intercalar, a qual foi dada como factualidade provada, no nº 5, como através das declarações de parte do legal representante da autora, onde referiu que foi necessário proceder á extensão da instalação da ventilação; proceder ao revestimento de paredes e chão; desmontagem de coisa que lá estavam e não podiam estar, bem como se fez prova por confissão, escrita, por parte da ré, de que a autora a nível de trabalhos a mais, procedeu á colocação de nova bancada em toda a extensão do laboratório e colocação de uma porta automática, motivada pela necessidade de obtenção de menores riscos, para quem trabalha no laboratório;
11ª – A factualidade respeitante aos trabalhos realizados a mais pela autora, e confirmados por escrito, pelo órgão da ré, devem ser dados, como provados por confissão, o que se requer;
12º - A autora, também indicou, na sua proposta intercalar, a percentagem de aumento de cada novo trabalho, face ao valor do preço, indicado inicialmente, pelo que, deve tal factualidade ser dada como provada e não como provada, como o douto tribunal decidiu;
12ª – Os trabalhos realizados pela autora, e provados em tribunal, facilmente comprovados na obra feita, devem ser dados como provados, o que aqui se requer, bem como as percentagens, indicadas pela autora e condenada a pagar tais trabalhos e serviços, á autora, tanto mais que a autora acabou a obra no dia 19/03/2001, onde se encontram inseridos os trabalhos a mais, por si executados e por si propostos, sem ter havido, qualquer reclamação, por parte do dono da obra, a aqui ré;
13º - A indicação de pagamento em percentagem, é permitido e está previsto no artº 8º nº 1, do Dec. Lei nº 59/99, de 2 de março e nº 2, do mesmo preceito legal refere, que na mesma empreitada pode ser acordado diversos modos de retribuição;
14ª – Ao contrário do decidido pelo douto tribunal “a quo”, os trabalhos a mais, executados pela autora, no Centro de Diagnóstico Pneumológico de Coimbra preenchem os requisitos previstos no artº 26º, nº 1, als. a e b) do Decreto lei nº 59/99, de 2 de março, dado que:
- os trabalhos em acusa não estavam previstos no contrato de empreitada inicial;
- Foi detetada a sua necessidade no decurso dos trabalhos descritos no contrato de empreitada;
- Eram necessários e imprescindíveis para o acabamento dos trabalhos inicialmente contratados e os trabalhos a mais, não podiam ser tecnicamente e economicamente separados do contrato de empreitada, celebrado entre as partes.
15ª – O contrato celebrado entre a autora é ré, deve ser qualificado, como um mero contrato de empreitada, e não um contrato de empreitada misto, como foi qualificado pelo douto tribunal “a quo”, dado que não foi comtemplado, no contrato de empreitada inicial a aquisição autónoma de serviços e equipamentos;
16ª - Os trabalhos realizados a mais, dados como provados, não podem ser considerados como fazendo parte do contrato de empreitada, apesar de serem necessários em sequência dos trabalhos iniciais adjudicados, mas sim trabalhos novos e independentes dos primeiros;
17ª – Sendo os trabalhos a mais, novos trabalhos, e não tendo a ré, através do seu órgão jurisdicional enquadrado a situação a nível legal, quando lhe foi solicitado, nem dado autorização expressa, para a execução dos mesmos, não existe causa justificativa, para que a ré, não seja condenada através do instituto de enriquecimento sem causa, como o douto tribunal decidiu;
18ª – Encontram-se preenchidos, todos os requisitos no artº 473º, do C. Civil, para que a ré seja condenada, a pagar á autora, a fatura peticionada ou o que se vir a considerar em liquidação de sentença;
19ª – A decisão ora recorrida, violou o disposto nos arts. 94º, nº 4, do CPTA, ao não considerar, provado por confissão do órgão da ré, que a autora procedeu á colocação de uma porta automática e uma bancada toda nova, ao longo de todo o laboratório e consequentemente todos os trabalhos necessários para a colocação da porta, seu funcionamento e trabalhos preparatórios e finais, para a colocação da bancada ao longo de todo o laboratório e seu funcionamento.
20ª - A decisão, ora recorrida, nos termos e fundamentos que foi proferida, limita o acesso da autora aos tribunais, pois não pode reclamar o seu direito a ser ressarcida, pela ré, pelos trabalhos a mais executados e não pagos, através da alegação da nulidade do segundo contrato de empreitada, pelo vicio de falta de forma escrita, da responsabilidade da ré.
21ª – A sentença, ora colocada em crise, violou os seguintes normativos legais: artº 94, nº 4, do CPTA;
- Artº 13, nº 1, do Dec. Lei nº 197/99, de 8 de junho;
- Artº 5º, nº 1 , artº 8º nº 1, artº 26º, nº 1, als. a) b) , artº 30º, todos do Dec. Lei nº 59/99 de 2/03, atualizado pelo Dec. Lei nº 163/99, de 14/09;
- Artº 473, do C. Civil.
Nestes Termos, nos melhores de Direito e com o mui douto suprimento de V. Ex.ªs., deve o presente recurso ser admitido e em consequência, deve a sentença proferida, ser revogada e substituída por outra, que condene a ré a pagar á autora, o valor da fatura e respetivos juros, conforme o peticionado, fazendo-se assim, a acostumada e Sã Justiça.

Em 22 de setembro de 2021 veio a ADMINISTRAÇÃO REGIONAL DE SAÚDE DO CENTRO, I.P apresentar as suas Contra-alegações de Recurso, nas quais concluiu:
A - Não merece qualquer censura a douta sentença recorrida.
B - Não provou a Recorrente, como lhe competia, quais os trabalhos “extraordinários” em concreto - espécie e quantidade - que executou, “porque nem sequer foi alegado na petição inicial”
- Cfr. Sentença, pág. 22.
C - “Ora, não se sabendo, em concreto, que trabalhos “a mais” vieram a ser efetivamente executados pela A., para além dos previstos no objeto do contrato inicial, também não é possível atestar, na verdade, que a realização desses trabalhos era imperativa e urgente, no contexto do tipo de serviços contratualizados e do objeto e finalidade da adjudicação. Não bastam, para tanto, as afirmação da Diretora do Centro de Diagnóstico Pneumológico de Coimbra (ofício n.º 01114, de 29/06/2001) no sentido de que os ajustamentos propostos eram imprescindíveis e necessários, o que, podendo ser correto na teoria, não pôde ser comprovado na prática, pois que, no fim de contas, não se sabem que concretos trabalhos não previstos foram executados em obra pela adjudicatária (o relatório elaborado no âmbito do processo de averiguações faz referência à colocação de uma “porta automática em vidro de deslizamento lateral” e à aplicação de “bancadas novas em toda a extensão do laboratório”, mas mais nenhuma evidência de que assim tenha sido foi apresentada nos autos, o que impede, a nosso ver que a realização de tais trabalhos se tenha por suficientemente provada).” - Cfr. Sentença, pág. 23.
D - Não provou, igualmente, que a execução de tais trabalhos foi expressamente autorizada pela Recorrida: “da prova feita nos autos não resultou comprovado que tenha sido dada uma autorização escrita pelo dono da obra, a ora R., para a execução daqueles trabalhos.”
– Cfr. Sentença, pág. 33.
E - Como resultou provado - Facto provado nº 11, ponto 6. - o que sucedeu foi precisamente o contrário;
F - E atendendo a que a autorização ou ordem escrita é uma formalidade ad probationem (Art. 26º, do Decreto-Lei nº 59/99, de 2 de março), a prova da respetiva existência só poderia efetuar-se por confissão ou documento escrito (Art. 364º, nº 2, d Código do Civil), o que não sucedeu;
Acresce que, tirando a “vontade” da Recorrente na execução de tais trabalhos “extraordinários” não ficou provada a necessidade da respetiva execução na sequência de uma circunstância imprevista - Cfr. Sentença, págs. 39 e 40.
G - Nos termos do disposto no Art. 474º, do Código Civil, “não há lugar à restituição por enriquecimento sem causa, quando a lei facultar ao empobrecido outro meio de ser indenizado ou restituído, negar o direito à restituição ou atribuir outros efeitos ao enriquecimento.”
H - Só pode, pois, recorrer-se à ação baseada nas regras do enriquecimento sem causa quando a lei não faculte ao empobrecido outros meios de reação.
I - O mesmo é dizer que “o instituto do enriquecimento sem causa não será aplicável, por maioria de razão, se o enriquecimento puder e dever ser destruído mediante simples ação (contratual) destinada a exigir o cumprimento do contrato ou por meio ação de reivindicação” - Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Anotação ao Art. 374º, in Código Civil Anotado, Volume I, Coimbra Editora.
J - “(…) encontrando-se provado que A. e R. celebraram um contrato por via do qual a primeira se obrigou a executar determinadas obras e serviços e a segunda se obrigou a pagar o preço, bem como que a A. desenvolveu, sob a égide dessa relação contratual, trabalhos adicionais que, peses embora não previstos no objeto do contrato inicial e apesar de não terem sido expressamente autorizados pelo dono da obra, por escrito, se destinaram à realização da obra globalmente contratualizada e se mostravam necessários à sua execução e conclusão, nunca se poderia falar, em rigor, de uma ausência de causa jurídica justificativa para a integração no património da R., com o consequente enriquecimento desta, dos trabalhos realizados pela A. E incorporados n resultado final.” Cfr. Sentença, pág. 44.
Termos em que, negando provimento ao recurso e mantendo a decisão recorrida, farão Vªs Exªs. a costumada JUSTIÇA!”
Por Despacho de 30 de setembro de 2021 foi admitido o recurso interposto.
O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado em 8 de outubro de 2021, nada veio dizer, requerer ou Promover.
Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
II - Questões a apreciar
Importa apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, que se consubstanciam na necessidade de verificar, nomeadamente, a suscitada “incorreta decisão proferida, tendo em atenção a factualidade dada como provada e subsunção dos factos ao direito aplicável ao caso, em análise”, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA.

III – Fundamentação de Facto
Foi em 1ª instância fixada a seguinte factualidade provada e não provada:
Factos provados:
Consideram-se provados os seguintes factos, com relevo para a decisão da causa:
1) Na sequência de procedimento de negociação sem publicação prévia de anúncio, nos termos do art.º 80.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 197/99, de 08/06, e da respetiva adjudicação à A., esta celebrou com a R., em 15/09/2000, um “contrato de prestação de serviços”, do qual constam, além do mais, as seguintes cláusulas:
“1.ª – A E., pelo presente contrato, obriga-se a fornecer e a prestar, nas instalações do Centro de Diagnóstico Pneumológico de Coimbra, serviço dependente da ARSC/SRSC, sediado na Av. (...), os serviços constantes da sua proposta n.º P028/00, que do presente contrato passa a fazer parte integrante, e que a seguir se discriminam:
- Reparação de uma bancada de fluxo laminar classe II, tipo B3, com substituição total dos filtros absolutos, ligação ao exterior e Certificação;
- Reparação e substituição do sistema de extração dedicada das câmaras de fluxo laminar de risco com introdução de novo ventilador para altas temperaturas;
- Introdução de sistema de purificação e depuração de ar UAT que permitirá a recirculação de 50% do ar entrado no laboratório de isolamento;
- Trabalhos de limpeza das condutas de ventilação existentes com os necessários trabalhos de esterilização das mesmas antes e após limpeza;
- Trabalhos de sanitização das salas envolventes do laboratório de risco;
- Validação das salas;
- Validação das câmaras;
- Balanceamento da unidade de risco com acerto das pressões de funcionamento;
- Testes de aferição ao desempenho da unidade.
2.ª – A E. obriga-se ainda à execução de duas salas de Pressão Negativa (P3) no Departamento de Microbiologia, sendo que uma é um laboratório de risco e outra é uma sala de apoio, prestando os seguintes serviços que, aliás, constam da proposta n.º P027/00, por si apresentada:
- Introdução de Unidade de Ventilação de Ar Estéril, com efeito biocida, com aumento de potência e do número de renovações/hora;
- Preparação da unidade para aceitar o sistema proposto no item anterior;
- Reparação e distribuição das bancadas conforme normas de risco;
- Instalação de difusores de ar estéril;
- Execução de sistema de extração a 100%, a nível baixo, de maneira a manter a contaminação a nível do solo;
- Execução de sistemas de extração dedicada a cada aparelho (fluxos laminares e centrifugas);
- Revestimento do chão com material não poroso, manta em PVC soldada a quente;
- Reparação das paredes com revestimento a matéria plástica especial antibacteriano;
- Revestimento do teto com material plástico especial para salas de risco;
- Reparações das janelas com introdução de vidros à face;
- Preparação da parede para aceitar o novo autoclave;
- Execução de novos circuitos elétricos com proteção individualizada por aparelho;
- Execução de circuito elétrico estabilizado para o Bactec;
- Execução de novo circuito de gás encastrado na parede;
- Instalação de acessórios de segurança;
- Instalação de quadro de informação e comando de toda a unidade;
- Reparação total de um fluxo laminar Classe II B3;
- Emissão de relatório técnico e de Certificado de Conformidade.
(…)
5.ª – A E. obriga-se a fornecer e a executar todos os serviços objeto do presente contrato no prazo de 30 (trinta) dias úteis, contados da notificação da adjudicação.
(…)
10.ª – Pela aquisição de todos os serviços identificados nas cláusulas 2.ª e 3.ª, a ARSC/SRSC pagará à E. a importância total de 9.890.000$00 (nove milhões e oitocentos e noventa mil escudos) acrescida de IVA à taxa de 17%.
11.ª – A importância prevista na cláusula anterior será paga nas seguintes condições:
a) 30%, acrescido do IVA, nos termos previstos nas alíneas a) e b) do art.º 72.º do Decreto-Lei n.º 197/99, na data da assinatura do presente contrato, data em que se têm por iniciados os trabalhos;
b) Os restantes 70% no prazo de 90 dias contados da data da apresentação da respetiva fatura.
12.ª – 1. Os pagamentos ao abrigo do presente contrato serão efetuados após a verificação dos formalismos legais em vigor para o processamento das despesas públicas. (…)” (cfr. docs. de fls. 27 a 30 e 38 a 42 do processo administrativo).
2) Em 02/10/2000, por despacho superior, a R. pagou à A. o adiantamento de 30% do total do contrato, nos termos da respetiva cláusula 11.ª, no valor de € 17.315,22 (3.471.390$00), IVA incluído (cfr. doc. de fls. 63 a 65 do suporte físico do processo e docs. de fls. 6 a 8 do processo administrativo).
3) A A. cumpriu integralmente os trabalhos programados e previstos no contrato de prestação de serviços (acordo).
4) A A. verificou a necessidade de execução de trabalhos não contemplados no contrato de prestação de serviços e que constituíam o desenvolvimento das obras inicialmente previstas.
5) Através do ofício n.º C/001/01, de 02/01/2001, enviado ao cuidado da Diretora do Centro de Diagnóstico Pneumológico de Coimbra, Dr.ª M., a A. apresentou um relatório intercalar/proposta de revisão de custos das obras em execução, referentes ao contrato de prestação de serviços celebrado, no qual expôs e informou o seguinte:
“1 – Atrasos das obras
Como é sabido a obra está com atraso algo substancial devido a imponderáveis que nos dispensamos de enumerar com exaustão pois estamos certos que já serão conhecidos por quem de direito dentro da hierarquia do STDR que superintende nesta obra.
(…)
Muitos destes acidentes de percurso têm a ver com a natureza do edifício, de construção bastante antiga, e daquilo que nos tem sido imposto pelas obras entretanto efetuadas aquando da instalação inicial do laboratório: revestimento de paredes, linhas de água, linhas de esgotos, linhas elétricas (de potência e de iluminação), sistema de ventilação, sistema de extração e mesmo a própria climatização, ou seja, o ar condicionado e aquecimento, e a nova configuração do laboratório.
Aquilo que se presumiu ir encontrar, e que presidiu à elaboração da proposta, foi uma coisa.
Aquilo que nos apareceu pela frente foi outra bem diferente. Passamos a explicar:
- Paredes: são de reboco muito antigo e ao terem sido revestidas com chapa reforçada a alumínio, colada com cola de contacto, não permitiram que fossem retiradas sem que toda a parede viesse atrás. Qualquer tentativa de remoção do revestimento existente implicou a completa derrocada do reboco existente que teve de ser restaurado. Não restou outra alternativa que não colocar os novos revestimentos por cima dos antigos o que implicou a reparação do revestimento existente, a aplicação de outro tipo de colas e o estabelecimento de outro tipo de procedimentos que não seriam necessários se se trabalhasse em cima de alvenaria. (…) (3%).
- Tetos: apresentavam bastantes rachas, algumas a todo o comprimento, o que juntamente com as inúmeras furações que trespassavam de lado a lado a placa tiveram que ser todos raspados, betumados e pintados a tinta especial de borracha, para evitar minimamente as mais que prováveis infiltrações. A placa a montante, ou seja, o sótão, deveria ser objeto de profundos melhoramentos pois parece-nos estar sujeita a elevadas cargas o que, com o piso húmido ou mesmo molhado como por vezes acontece, por ser um telhado não isolado, pode constituir sério perigo. As rachas existentes eram um sinal bem claro do que se passa (3%).
- Portas: a alteração da configuração do laboratório implicou alterações e a reconstrução de mais duas portas sendo uma tripla, ou seja, duas folhas e um postiço. Vai também ser colocada uma porta automática de deslizamento lateral em vidro (3% + 5%).
- Bancadas: contrariamente ao suposto não se conseguiu aproveitar uma única bancada das existentes. Embora feitas em inox este era do tipo doméstico, de baixa qualidade, e apresentavam-se com aspeto muito sujo e em avançado estado de deterioração. Houve que aplicar bancadas novas em toda a extensão do laboratório e, também como resultante da nova configuração, também a quantidade foi significativamente aumentada. A própria bancada anti vibratória existente para a balança analítica é obsoleta e terá que ser completamente nova. Como são bancadas topo de gama e os metros quadrados a mais necessários ainda são em quantidades apreciáveis o reflexo no custo final é importante (6,5%).
- Linhas de água e esgotos: bastante alterados na sua configuração devido às alterações introduzidas na posição do autoclave e das bancadas de lavagens que tiveram de passar para outra sala que vai ficar dedicada à esterilização e lavagens. Os cilindros de aquecimento colocados no telhado terão que ser também removidos e colocados, aquele que funcionar, no primeiro piso com as proteções elétricas adequadas (1,5%).
- Eletrificação: a extensão destas linhas a mais duas dependências, não contempladas no projeto inicial, não se reduzem a um mero aumento do número de metros de cabo elétrico como se compreenderá. Por outro lado tem sido uma grande preocupação para nós a instalação elétrica do telhado. Temos estado a providenciar as condições mínimas de segurança no nosso entendimento. É uma situação que deveria ser encarada no seu todo com alguma urgência embora fique bem melhor após a nossa intervenção (1,5%).
- Ventilação: o sistema de ventilação ficou deficitário para o Laboratório agora aumentado pelo que teve de ser ainda mais reforçado estando a serem introduzidas as alterações necessárias e obrigatórias para o efeito (2,5%).
- Extração: de correção mais fácil que a insuflação mas, pelas mesmas razões teve de ser alterado na forma e com a aplicação de nova motorização e controlo (1,5%).
- Ar condicionado: para que a instalação existente de aquecimento e ar condicionado possam continuar a funcionar sem terem que ser completamente substituídos, e dado que foram recentemente objeto de beneficiação, obrigou também ao aumento do sistema de retorno. Para assegurar a completa segurança dos utentes vai ser introduzida no retorno um sistema de tratamento e purificação de ar (fotocatálise), iguais aos que hoje são usados apenas nos blocos cirúrgicos (3,5%).
2. Alterações ao projeto
- Nova configuração: esta nova opção pelos técnicos, e que também é igualmente responsável por algum atraso, é superiormente sustentada por ser tecnicamente inatacável e, portanto, não merece qualquer reparo técnico, bem pelo contrário. É uma alteração que se imporia a muito curto prazo só que então a custos três vezes superiores. O substancial aumento das condições de trabalho e de segurança que introduz confere ao laboratório um aspeto bem diferente e mais de acordo com aquilo que deve ser. Com esta modificação os caminhos e áreas do laboratório ficam bem definidas e, portanto, mais seguro. É indubitável que o projeto, que por razões económicas estava um pouco ‘coxo’, sofreu com esta alteração uma enorme mais-valia na sua qualidade e funcionalidade e não custa admitir que com esta configuração o Laboratório de Alto-Risco do STDR de Coimbra pode muito bem passar a ser uma instalação de referência nacional. (…) O ‘mas’ da questão, e há sempre um ‘mas’ nestas coisas, é que obrigou a profundas alterações ao projeto inicial com apreciáveis obras de caráter extraordinário com os custos inerentes. (…)
Em acumulado, e revendo a área de atuação por baixo, as novas dependências incluídas significam um acréscimo de ma s de 38% da área prevista na proposta inicial para execução deste laboratório de contenção mas o acréscimo de custo que pedimos é praticamente só para cobrir despesas (17%).
- Zona administrativa: era uma zona também ela obsoleta. (…) Irá ser toda remodelada, com novo tipo de divisória e com porta de acesso de maiores dimensões, de acordo com o equipamento existente. Só será debitado os custos das divisórias e melhoramentos de paredes e tetos (4%).
(…)
3. Acréscimo de custos
(…)
Assim, e discriminando item a item para que tudo seja bem claro, temos o seguinte:
- Acréscimo de custos em trabalhos extraordinários (projeto original) 17,5%
- Acréscimo de custos devido ao aumento da área do laboratório 27%
- Porta automática em vidro 5%
Total: 49,5%
(…)
Sem querer melindrar a hierarquia é no pressuposto que não temos melhor interlocutor, dada a posição que ocupa e a sua assídua presença na obra, que nos dirigimos a V. Exa. com o fim de lhe solicitar o favor de patrocinar junto da hierarquia competente a nossa pretensão de, e permissão para, apresentarmos um Orçamento Retificativo com base no que acima foi exposto e que está longe de ser exaustivo. (…)”
(cfr. doc. de fls. 16 a 19 do processo administrativo).
6) Em 09/01/2001 foi realizada uma reunião em que estiveram presentes o representante legal da A., a Diretora do Centro de Diagnóstico Pneumológico de Coimbra, o Diretor de Serviços de Administração Geral da R. e o Chefe de Divisão Financeira da R., na qual foi analisado o relatório intercalar que antecede e a respetiva proposta de revisão de custos (cfr. docs. de fls. 61 a 65 do suporte físico do processo).
7) A A. executou trabalhos não contemplados no objeto do contrato de prestação de serviços inicialmente celebrado (cfr. docs. de fls. 61, 62 e 67 a 72 do suporte físico do processo).
8) Através do ofício n.º C024/01, de 09/04/2001, dirigido à R. e ao cuidado da respetiva Presidente, a A. expôs o seguinte:
“(…) Como oportunamente foi referido houve lugar a algumas alterações ao projeto inicial e a trabalhos adicionais resultantes de várias contingências, normais em trabalhos deste tipo, e do mau estado das infraestruturas existentes que resultaram num acréscimo significativo de custos, cuja estimativa foi presente à Sub-Região em janeiro do corrente (…).
Nesse documento explicávamos as alterações pedidas, a sua pertinência, da significativa volumetria que acrescentava ao projeto inicial e daí os seus custos. Já no que respeita aos trabalhos a mais que o conjunto da execução obrigou, nomeadamente devido aos acidentes de percurso, uns normais outros nem tanto, que é normal encontrarem-se em instalações deste tipo, só agora, acabada que está a obra, pudemos apurar o total dos seus reais custos.
(…)
Assim, pedimos a V. Exa. que, além da fatura devida ao remanescente, nos permita a apresentação da fatura dos trabalhos extraordinários que se cifra num total de 58,5%, ou seja, 52% que já tinha sido estimado em janeiro (… e não 49,5% como erradamente saiu) mais um pequeno acréscimo de 6,5% que, como acima explicamos, só foi possível apurar no final da obra”
(cfr. doc. de fls. 15 do processo administrativo).
9) Concluídos os trabalhos, a A. emitiu, em 23/04/2001, em nome da R., as seguintes faturas:
fatura n.º A-8, no valor de € 40.402,18, IVA incluído, com o descritivo “Restantes 70% de 9.890.000$00 + IVA relativo ao Contrato de Prestação de Serviços no Centro de Diagnóstico Pneumológico de Coimbra”;
fatura n.º A-9, no valor de € 33.764,68, IVA incluído, com o descritivo “Trabalhos extraordinários ao Contrato de Prestação de Serviços no Centro de Diagnóstico Pneumológico de Coimbra, conforme nossos ofícios n.º 001/01 de 02.01.2001 e n.º 024/01 de 09.04.2001” (cfr. docs. de fls. 73 e 74 do suporte físico do processo).
10) Em 24/04/2001 a Coordenadora da Sub-Região de Saúde de Coimbra proferiu o seguinte despacho, exarado no ofício n.º C024/01, de 09/04/2001, remetido pela A.: “Face ao exposto e apresentadas as razões válidas sobre o atraso da obra e também a alteração do projeto, autorizo o pagamento das faturas apresentadas n.º A-8 e n.º A-9” (cfr. doc. de fls. 15 do processo administrativo).
11) Remetidas as faturas em causa à Divisão de Gestão Financeira da R., o respetivo Chefe de Divisão elaborou, em 28/04/2001, a informação n.º 29, da qual consta, além do mais, o seguinte:
“(…) 4. Embora desde a apresentação da nossa Informação n.º 21, de 12/05/2000, este assunto tenha passado, conforme nossa proposta superiormente aceite, para a Repartição Administrativa, em meados de dezembro/2000 alertámos pessoalmente o Sr. Diretor de Serviços Administração Geral, para o facto de o contrato não estar a ser cumprido, uma vez que nos termos do mesmo os serviços deveriam já estar concluídos nessa data e apresentada a respetiva faturação;
5. Em 9/01/2001, fomos convocados para uma reunião pelo Sr. Diretor de Serviços para tratar de assunto do CDP em que estiveram presentes também a Sr.ª Dr.ª L. e o Sr. L. da E.. Durante a referida reunião ficámos a saber que a mesma se destinava a explicar os atrasos na execução dos trabalhos, os quais deveriam ter sido executados em 30 dias úteis, bem como a solicitar a aceitação de acréscimos de custos dos trabalhos de 49,5% baseados em alterações efetuadas;
6. Na referida reunião foi esclarecido, quer pelo Sr. Diretor de Serviços, enquanto jurista, quer eu próprio como responsável pela área financeira, que seria absolutamente ilegal a aceitação de acréscimos de custos desta grandeza, tanto mais que nem sequer havia sido efetuada qualquer proposta de alteração aos fornecimentos e serviços contratados. Foi inclusivamente referida a responsabilidade quer do CDP quer da firma contratada ao darem execução a serviços e fornecimentos diferentes dos estabelecidos nas cláusulas do contrato, sem que os mesmos fossem propostos e aceites formalmente por quem tinha competência para o efeito; (…)
É reclamado um acréscimo de encargos de 6.769.211$ (IVA incluído) por ‘Trabalhos Extraordinários ao Contrato…’, os quais não foram identificados nem solicitados pelo CDP e, como tal, também não autorizados superiormente; (…)”
(cfr. doc. de fls. 1 a 3 do processo administrativo).
12) Por despacho de 02/05/2001 da Coordenadora Sub-Regional de Saúde, exarado sob a informação que antecede, foi o processo remetido à Assessoria Jurídica para pronúncia quanto à viabilidade de pagamento das faturas em causa (cfr. doc. de fls. 1 do processo administrativo).
13) Através de ofício de 18/06/2001, subscrito pela Coordenadora Sub-Regional de Saúde, foi a A. informada de que, “quanto à fatura n.º A-9, de 23/04/2001, no valor de 6.769.211$, (…) considerando o facto de a mesma não ter enquadramento no contrato assinado, foi solicitada a sua análise e emissão de parecer jurídico pela Assessoria Jurídica desta SRS” (cfr. doc. de fls. 75 do suporte físico do processo).
14) Consta do ofício n.º 01114, de 29/06/2001, subscrito pela Diretora do Centro de Diagnóstico Pneumológico de Coimbra e dirigido à Coordenadora da Sub-Região de Saúde de Coimbra, o seguinte:
“Em resposta ao ofício 9621, de 06/06/2001, referente às obras efetuadas no Laboratório deste CDPC, e em cumprimento do Despacho de 2001/06/01, passo a informar:
(…)
4. Em 2 de janeiro de 2001, a firma E., S.A. enviou-nos um Relatório Intercalar/Proposta para Revisão de Custos, no qual especificava e justificava o atraso verificado na execução da obra, a necessidade de alteração ao projeto inicial e os custos discriminados de cada uma das alterações propostas.
5. Analisada esta proposta, constatados os factos referidos e verificado ser imprescindível proceder-se aos ajustamentos propostos, sem o que não seria possível garantir os objetivos fundamentais que deram origem ao início das obras – sanitização e segurança – esteve a Diretora deste CDPC absolutamente de acordo com a necessidade de se proceder aos ajustamentos propostos que, para além de indispensáveis, vinham ao encontro do parecer das entidades referidas no ponto número um.
6. Por isso, em reunião efetuada na sequência da receção do Relatório Intercalar/Proposta de Revisão de Custos, a pedido da firma executante, solicitámos uma reunião à Direção de Serviços de Administração Geral e à Divisão Financeira, para análise da situação.
7. Nessa reunião, realizada ainda em janeiro, participaram os responsáveis pelas áreas referidas no ponto anterior, a Diretora do CDPC e o representante da firma responsável pela obra. Foi entregue e analisado o Relatório Intercalar/Proposta de Revisão de Custos, que discrimina, fundamenta e orçamenta todas as alterações propostas ao contrato estabelecido e o atraso que então se verificava na execução da obra.
8. Confirmada a absoluta necessidade das alterações propostas, a Chefia da Divisão Financeira informou ter a SRSC disponibilidade orçamental para poder proceder à cabimentação das verbas necessárias à alteração do projeto inicial, tendo ficado a resolução do enquadramento legal a cargo da Direção de Serviços de Apoio Geral.
9. Não coube à Diretora do CDPC a elaboração do contrato inicial. Obviamente também não lhe caberia efetuar a elaboração do contrato de alteração.
10. Os trabalhos prosseguiram em conformidade com as alterações propostas no Relatório Intercalar/Proposta de Revisão de Custos.
11. Em 19 de março de 2001, a firma E., S.A. dá como concluídas as obras do Laboratório.
(…)
Do que se expôs pode concluir-se que o papel da Diretora do CDPC foi o de, além de informar e alertar a SRSC para a situação de grave risco para a Saúde Pública em que se encontrava o Laboratório de BK, o de mediadora entre a firma executora das obras e a SRSC, garantindo a resolução de um grave problema que, a qualquer momento poderia atingir consequências imprevisíveis, o de procurar minimizar todos os custos e o de garantir a continuidade do funcionamento dos serviços mínimos do Laboratório, em obras, imprescindíveis ao funcionamento dos serviços deste CDPC. (…)”
(cfr. doc. de fls. 61 e 62 do suporte físico do processo).
15) A fatura n.º A-8 foi paga pela R. à A. em 16/07/2001 (cfr. docs. de fls. 77 e 78 do suporte físico do processo).
16) Por despacho de 01/03/2002 da Coordenadora da Sub-Região de Saúde de Coimbra, foi ordenada a instauração de um processo de averiguações na sequência dos factos constantes da informação n.º 29, de 28/04/2001, no âmbito do qual a Diretora do Centro de Diagnóstico Pneumológico de Coimbra prestou declarações, em 03/09/2002, de cujo auto consta o seguinte:
“(…) Perguntada sobre o que é que entende acerca do afirmado pela Firma E. ao referir que a declarante foi assídua presença na obra, entende que isso não pode ser considerado como fiscalizadora da obra, até porque não tem conhecimentos para o efeito, recorda que lhe eram perguntadas coisas como: cores do chão, bancadas, era chamada muitas vezes para ouvir queixas relativamente à não comparência de determinados operários.
Mais declara que ao tempo da execução dos trabalhos descritos no contrato de prestação de serviços foi substituído o autoclave existente que se encontrava avariado, pelo SUCH, empresa que fazia a sua manutenção.
Perguntada acerca de uma porta automática, confirma a sua colocação motivada pela necessidade de obtenção de menores riscos para quem trabalha no laboratório, porta que foi colocada entre duas salas de trabalho de maior risco. Confirma também a colocação de novas bancadas em substituição das existentes, bancadas inox, por estas se encontrarem deterioradas” (cfr. doc. de fls. 66 do suporte físico do processo).
17) No âmbito do referido processo de averiguações, foi elaborado, em 30/09/2002, um Relatório, do qual consta, além do mais, o seguinte:
“(…) Decorrente deste parecer não se afigura possível fazer a destrinça entre os trabalhos a executar, imprescindíveis à sanitização no contexto do contrato de prestação de serviços e as alterações ao projeto que a E. afirma ter efetuado sem que para tal tivesse sido autorizada.
Os trabalhos a realizar estão consignados nas cláusulas 1.ª, 2.ª, 3.ª e 4.ª e foram orçamentados.
Quaisquer outros trabalhos a mais a realizar deveriam ter sido discriminados, orçamentados e propostos para autorização a quem de direito, ou seja, a Sr.ª Coordenadora da Sub-Região de Saúde de Coimbra.
(…)
Como é evidente, a verificação de todo este circunstancialismo deve ocorrer previamente à execução de quaisquer serviços não incluídos no projeto inicial, o que não aconteceu no caso objeto do presente processo. (…)”
(cfr. doc. de fls. 67 a 72 do suporte físico do processo).
18) Através de carta de 20/05/2015, enviada por correio registado em 25/05/2015, a A. interpelou a R. “no sentido de procederem ao pagamento daquele débito no montante de €33.764,68, acrescido dos respetivos juros moratórios, no prazo máximo de 8 dias”
(cfr. docs. de fls. 79 e 80 do suporte físico do processo).
19) Correu termos no Juízo de Grande Instância Cível de Sintra, 1.ª Secção, Comarca da Grande Lisboa-Noroeste, o processo n.º 71485/08.4YIPRT, que teve origem em requerimento de injunção apresentado pela A. contra a R., tendo em vista o pagamento da fatura n.º A-9, processo que culminou em decisão, proferida em 30/03/2010, pela qual foi dado sem efeito o requerimento injuntivo, por falta de junção de procuração forense pela A. (cfr. docs. de fls. 217 e 218 do suporte físico do processo).
20) Correu termos no Juízo de Grande Instância Cível de Sintra, 2.ª Secção, Comarca da Grande Lisboa-Noroeste, o processo n.º 77317/13.4YIPRT, que teve origem em requerimento de injunção apresentado pela A. contra a R., tendo em vista o pagamento da fatura n.º A-9, processo que culminou em decisão, proferida em 09/01/2014, pela qual foi determinado o desentranhamento do requerimento injuntivo, por falta de pagamento da taxa de justiça devida pela A. (cfr. docs. De fls. 215 e 216 do suporte físico do processo).
21) A fatura n.º A-9, de 23/04/2001, no valor de € 33.764,68, IVA incluído, não foi, até ao momento, paga pela R. (acordo).
22) O requerimento de injunção na origem dos presentes autos foi apresentado no dia 15/10/2015 (cfr. doc. de fls. 3 do suporte físico do processo).
Factos não provados:
a) Dada a imperatividade e urgência dos trabalhos extraordinários para a boa execução das obras inicialmente previstas, a R. autorizou a sua execução por ajuste direto verbal, autorização que foi dada de imediato pela Diretora do Centro de Diagnóstico Pneumológico de Coimbra, Dr.ª M..
b) Esta autorização foi reconhecida, no âmbito do processo de averiguações, pela própria Diretora do Centro de Diagnóstico Pneumológico de Coimbra, Dr.ª M..

IV – Do Direito
No que ao direito concerne e no que aqui releva, discorreu-se na decisão recorrida o seguinte:
Extrai-se da factualidade provada que, na sequência de procedimento de negociação sem publicação prévia de anúncio, nos termos do art.º 80.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 197/99, de 08/06, e da respetiva adjudicação à A., esta celebrou com a R., em 15/09/2000, um “contrato de prestação de serviços”, pelo qual a A. se obrigou a fornecer e a prestar, nas instalações do Centro de Diagnóstico Pneumológico de Coimbra, serviço dependente da R., os serviços constantes da sua proposta n.º P028/00, (…)
Ficou convencionado que a A. deveria fornecer e executar todos os serviços objeto do contrato no prazo de 30 dias úteis, contados da notificação da adjudicação, sendo que, pela aquisição dos referidos serviços, a R. comprometeu-se a pagar à A. a quantia total de 9.890.000$00, acrescida de IVA à taxa de 17%, quantia que seria paga nas seguintes condições: 30%, acrescido de IVA, na data da assinatura do contrato, data em que se teriam por iniciados os trabalhos; os restantes 70% no prazo de 90 dias contados da data da apresentação da respetiva fatura. Ademais, os pagamentos ao abrigo do contrato deveriam ser efetuados após a verificação dos formalismos legais em vigor para o processamento das despesas públicas (cfr. ponto 1 dos factos provados).
Sabe-se que a A. cumpriu integralmente os trabalhos programados e previstos no contrato de prestação de serviços, tendo a R., por sua vez, procedido inicialmente ao pagamento de 30% do total do contrato, no valor de € 17.315,22 (3.471.390$00), IVA incluído, bem como, concluídos os trabalhos, ao pagamento da fatura n.º A-8, no valor de € 40.402,18, IVA incluído, referente aos restantes 70% do preço a pagar pelos serviços contratualizados (cfr. pontos 2, 3, 9 e 15 dos factos provados).
Sucede que, tendo a A. verificado a necessidade de execução de trabalhos não contemplados no contrato de prestação de serviços e que constituíam o desenvolvimento das obras inicialmente previstas, veio a mesma a executar trabalhos não contemplados no objeto do referido contrato, razão pela qual emitiu, em nome da R., a fatura n.º A-9, com data de 23/04/2001, no valor de € 33.764,68, IVA incluído, com o descritivo “Trabalhos extraordinários ao Contrato de Prestação de Serviços no Centro de Diagnóstico Pneumológico de Coimbra, conforme nossos ofícios n.º 001/01 de 02.01.2001 e n.º 024/01 de 09.04.2001”. No entanto, a fatura n.º A-9 não foi, até ao momento, paga pela R. (cfr. pontos 4, 7, 9 e 21 dos factos provados).
É, pois, o valor titulado por esta fatura n.º A-9 que a A. ora reclama nos presentes autos, valor acrescido dos competentes juros de mora, seja com base em responsabilidade contratual, seja com base no instituto do enriquecimento sem causa. Apreciando:
O contrato de prestação de serviços celebrado entre as partes mostra-se regulado pelo Decreto-Lei n.º 197/99, de 08/06, em vigor à data da sua celebração e execução, diploma que veio estabelecer o regime da realização de despesas públicas com locação e aquisição de bens e serviços, bem como da contratação pública relativa à locação e aquisição de bens móveis e de serviços [e que, entretanto, foi revogado pelo Decreto-Lei n.º 18/2008, de 29/01, que aprovou o Código dos Contratos Públicos (CCP), com exceção dos art.os 16.º a 22.º e 29.º].
Em matéria de realização de despesas, dispunha o art.º 16.º, n.º 1, do citado Decreto-Lei que, “para efeitos do presente diploma, a despesa a considerar é a do custo total da locação ou da aquisição de bens ou serviços”. Acrescentava o art.º 17.º, n.º 1, que “são competentes para autorizar despesas com locação e aquisição de bens e serviços as seguintes entidades: a) até 20.000 contos, os diretores-gerais ou equiparados e os órgãos máximos dos serviços com autonomia administrativa; b) até 40.000 contos, os órgãos máximos dos organismos dotados de autonomia administrativa e financeira, com ou sem personalidade jurídica; c) até 750.000 contos, os ministros; d) até 1.500.000 contos, o Primeiro-Ministro; e) sem limite, o Conselho de Ministros”.
Por seu turno, o art.º 21.º, com a epígrafe “Alteração do montante da despesa autorizada”, estipulava que “a competência fixada nos termos do artigo 17.º mantém-se para as despesas provenientes de alterações, variantes, revisões de preços e contratos adicionais, desde que o respetivo custo total não exceda 10% do limite da competência inicial” (n.º 1). E, “quando for excedido o limite percentual estabelecido no número anterior, a autorização do acréscimo da despesa compete à entidade que, nos termos do artigo 17.º, detém a competência para autorizar a realização do montante total da despesa” (n.º 2)
Já o art.º 22.º, n.º 5, previa que “as despesas resultantes de situações imprevistas ou de fornecimentos a mais, cujos contratos iniciais tenham sido precedidos da portaria a que se refere o n.º 1 e desde que os novos encargos tenham cabimento no orçamento em vigor à data do adicional, são autorizadas nos termos do artigo anterior, sendo, neste caso, dispensada a publicação de nova portaria”.
Importa, ainda, ter presente o disposto no art.º 5.º do Decreto-Lei n.º 197/99, de 08/06, relativo aos contratos mistos, segundo o qual, “na realização de despesas e na contratação pública que abranja, simultaneamente, empreitadas de obras públicas, locação, aquisição de bens ou serviços aplica-se o regime previsto para a componente de maior expressão financeira”.
Ora, analisando as cláusulas do contrato de prestação de serviços celebrado entre as partes, constatamos que a larga maioria dos “serviços” que a A. se obrigou a prestar e a fornecer à R. se enquadra no objeto de uma empreitada (de obras públicas), sendo esta a dimensão dos serviços contratados que assume maior expressão e significado no contexto do acordo celebrado (o qual, em rigor, se apresenta como um contrato misto). Com efeito, grande parte dos serviços contratualizados dizem respeito a obras de reparação e substituição de estruturas, bem como de construção, alteração e/ou beneficiação de outros elementos presentes nas instalações do Centro de Diagnóstico Pneumológico de Coimbra, tendo sido, aliás, autonomamente clausulado que a A. se obrigou à execução (construção) de duas salas de pressão negativa no Departamento de Microbiologia do referido Centro.
Assim, considerando que, nos contratos mistos, se aplica o regime previsto para a componente de maior expressão financeira, cumpre também atender, in casu, ao regime previsto no Decreto-Lei n.º 59/99, de 02/03, que aprovou o regime jurídico das empreitadas de obras públicas e que se encontrava em vigor à data dos factos (mas que, entretanto, foi também revogado pelo diploma que aprovou o CCP).
(…)
Dos normativos acima citados resulta, portanto, que são considerados trabalhos a mais todos aqueles trabalhos que não se encontrem previstos ou incluídos no objeto do contrato inicial celebrado entre as partes e cuja espécie ou quantidade se destine, em qualquer caso, à realização da mesma empreitada e se tenham tornado necessários na sequência de uma circunstância imprevista verificada aquando da realização da obra.
Por outro lado, o empreiteiro é obrigado a executar esse tipo de trabalhos caso tal lhe seja ordenado por escrito pelo dono da obra, a não ser que aquele opte pelo direito de rescisão nos termos previstos na lei. O projeto de alteração deverá, ainda, ser entregue ao empreiteiro com a ordem escrita de execução dos trabalhos, a qual deverá ser previamente formalizada como contrato adicional ao contrato de empreitada. O empreiteiro, por seu turno, deverá apresentar a sua lista de preços para trabalhos da espécie dos que constam do contrato no prazo de 15 dias a contar da data de receção da ordem de execução dos trabalhos, devendo o dono da obra decidir em 15 dias, implicando a falta de decisão a aceitação dos preços da lista do empreiteiro.
Ou seja, e para além do mais, subjacente à execução deste tipo de trabalhos está a iniciativa do dono da obra e não a iniciativa do empreiteiro. E, nessa medida, ponto fulcral na execução de trabalhos a mais, isto é, de trabalhos não previstos no contrato inicial, é a existência de uma autorização ou ordem expressa, por escrito, do dono de obra no sentido da sua efetiva realização pelo empreiteiro.
Aqui chegados, temos que a A. alega, como vimos, ter executado trabalhos não previstos no contrato de prestação de serviços que celebrou com a R., trabalhos que aquela designa de “extraordinários”, isto porque, durante a execução das obras, veio a verificar a necessidade de realização de trabalhos não contemplados no referido contrato de prestação de serviços e que constituíam o desenvolvimento das obras inicialmente previstas. Tais trabalhos “a mais” foram refletidos na fatura n.º A-9, cujo pagamento é aqui reclamado.
Contesta a R. que nada deve à A. a título de trabalhos “extraordinários”, defendendo, desde logo, que nunca deu autorização à sua cocontratante para executar quaisquer trabalhos adicionais e não previstos no objeto do contrato celebrado, o que a leva, aliás, a concluir, entre o mais, que tais trabalhos nem sequer podem ser qualificados como “trabalhos a mais”, inexistindo, por isso, qualquer obrigação de pagamento da sua parte.
(…)
O que está em causa é, na verdade, saber se sobre a R. impende, ou não, a correspetiva obrigação de pagamento, para o que importa apurar, antes de mais, se, como esta alega e defende, estamos em presença de verdadeiros e próprios “trabalhos a mais” e se houve, de facto, uma autorização ou ordem expressa da sua parte para que a A. iniciasse ou prosseguisse a execução dos trabalhos não contemplados no contrato.
Julgamos, porém, que a factualidade assente não nos permite chegar à conclusão de que os trabalhos em causa devem ser qualificados como “trabalhos a mais”, suscetíveis de fazer nascer do lado do dono de obra a correspondente obrigação de pagamento.
Isto porque da prova feita nos autos não resultou comprovado que tenha sido dada uma autorização escrita pelo dono da obra, a ora R., para a execução daqueles trabalhos.
O que resultou provado foi que, tendo verificado a necessidade de execução de trabalhos não contemplados no contrato de prestação de serviços e que constituíam o desenvolvimento das obras inicialmente previstas, a A. apresentou junto da Diretora do Centro de Diagnóstico Pneumológico de Coimbra, Dr.ª M., um relatório intercalar/proposta de revisão de custos das obras em execução, referentes ao contrato de prestação de serviços celebrado (ofício n.º C/001/01, de 02/01/2001), na qual expôs e descreveu os atrasos nas obras, as alterações ao projeto e os acréscimos de custos daí decorrentes. Mais se sabe que, logo em 09/01/2001 – ou seja, antes da conclusão dos trabalhos e antes da emissão da fatura n.º A-9 –, foi realizada uma reunião em que estiveram presentes o representante legal da A., a Diretora do Centro de Diagnóstico Pneumológico de Coimbra, o Diretor de Serviços de Administração Geral da R. e o Chefe de Divisão Financeira da R., na qual foi analisado o relatório intercalar que antecede e a respetiva proposta de revisão de custos. Consta, aliás, da informação n.º 29, elaborada pelo Chefe de Divisão Financeira da R. em 28/04/2001, um dos intervenientes na aludida reunião de 09/01/2001, que foi manifestada ao legal representante da A. a oposição expressa, do lado da R., quanto à realização dos “trabalhos a mais” propostos e quanto ao pagamento do acréscimo de custos correspondente. Como se refere naquela informação, “na referida reunião foi esclarecido, quer pelo Sr. Diretor de Serviços, enquanto jurista, quer eu próprio como responsável pela área financeira, que seria absolutamente ilegal a aceitação de acréscimos de custos desta grandeza, tanto mais que nem sequer havia sido efetuada qualquer proposta de alteração aos fornecimentos e serviços contratados. Foi inclusivamente referida a responsabilidade quer do CDP quer da firma contratada ao darem execução a serviços e fornecimentos diferentes dos estabelecidos nas cláusulas do contrato, sem que os mesmos fossem propostos e aceites formalmente por quem tinha competência para o efeito”
Por outro lado, não se pode concluir que tal autorização tenha sido dada por via da Diretora do Centro de Diagnóstico Pneumológico de Coimbra – factualidade que, de todo o modo, não foi dada como provada [cfr. alíneas a) e b) dos factos não provados] –, ou seja, dos elementos carreados para os autos não é possível concluir que essa autorização tenha sido concedida, como alega a A., por ajuste direto verbal, dado pela então Diretora do Centro.
Nem, na verdade, tal “ajuste direto verbal” obedeceria às formalidades impostas pelo art.º 26.º do Decreto-Lei n.º 59/99, de 02/03, que exige uma ordem ou autorização por escrito.
Como referido em sede de motivação da matéria de facto, dos documentos que foram juntos aos autos não se retira que a referida Diretora tenha dado uma autorização formal, sequer por escrito, com o intuito de vincular as partes, para que a A. avançasse com a execução de trabalhos não previstos no contrato inicial. O que se retira da prova efetuada é, tão somente, que a Diretora apenas manifestou o seu acordo ou aval relativamente à necessidade de se proceder aos ajustamentos propostos pela A. – o que não equivale a uma autorização nem, muito menos, à formalidade exigida no n.º 2 do art.º 26.º do Decreto-Lei n.º 59/99, de 02/03, relativa à existência de uma ordem escrita – e, bem assim, que o seu papel foi o de “mediadora entre a firma executora das obras e a SRSC”. Nem equivale a uma qualquer autorização, nos termos e para os efeitos do disposto no citado art.º 26.º, a circunstância de a A. nunca ter sido impedida de realizar as obras “a mais”, que terão sido, segundo alega, executadas à vista de todos, pois que o facto de não ter sido impedida, na prática, de executar as obras e os trabalhos em causa não significa que a R. tenha dado à A. autorização expressa (muito menos por escrito) para essa mesma execução, o que são, como se disse, realidades distintas.
De referir, ainda, que, tal como também salientado na motivação dos factos provados e não provados, o legal representante da A. não deixou de confirmar a realização da reunião em 09/01/2001, na qual foi discutida a proposta de revisão de custos por si apresentada, tendo reconhecido que, de facto, foram levantados problemas pelas chefias acerca da inclusão dos valores a mais no contrato, mas, porque entendeu ser a tanto “alheia”, prosseguiu com a realização de trabalhos “a mais”. Ora, se reconheceu que foi informada de que haveria entraves à formalização da contratualização dos referidos trabalhos, não pode a A. daí concluir, sem mais, que, em todo e qualquer caso, lhe foi dada autorização para os realizar e incorporar na obra, apenas com base num acordo “informal”, verbal, que lhe teria sido dado pela Diretora do Centro de Diagnóstico Pneumológico de Coimbra.
Por conseguinte, temos que inexiste, no caso sub judice, qualquer autorização ou ordem escrita que impusesse à A. a execução dos trabalhos não previstos no contrato inicial e que esta veio efetivamente a executar, por sua iniciativa, sendo que tal ordem ou autorização constituía um elemento essencial para que tais trabalhos pudessem ser qualificados como “trabalhos a mais” e para que a A. pudesse reclamar o respetivo pagamento.
E a jurisprudência, a este respeito, tem entendido que, existindo divergência entre as partes quanto à existência de uma ordem ou autorização de execução de quaisquer “trabalhos a mais”, sempre se impunha à A. a prova dessa ordem ou autorização – o que não sucedeu.
Apesar de a A. alegar a execução desses trabalhos e apesar de ter resultado provado que assim foi, não demonstrou, porém, que a R. alguma vez os tivesse ordenado ou que tivesse dado, quando confrontada com a necessidade da sua execução, a sua prévia autorização, por escrito.
Pode ler-se, a este propósito, no acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 06/05/2010 (proc. n.º 00070/05.5BEMDL, publicado em www.dgsi.pt), o seguinte:
“Como se diz no Ac. de 7/11/2001 - Proc. 46289 (ainda que tenha por referência o Dec. Lei 235/86, regime que continha o antigo RJEOP, mas cujas normas questionadas têm versão semelhante, sem alterar a sua interpretação - os art.os 27.º e 159.º, n.º 2 do Dec. Lei 235/86 correspondem aos art.os 26.º e 182.º do Dec. Lei 59/99, respetivamente) – ‘Para além dos trabalhos a que o empreiteiro se obrigou «in initio», também são de incluir no âmbito do contrato de empreitada de obras públicas os trabalhos a mais ordenados pelo dono da obra e os trabalhos cuja necessidade ou conveniência obtenham, no decurso do contrato, o acordo de ambas as partes.
Contudo, e porque o art.º 159.º, n.º 2, do DL n.º 235/86 estabelecia uma formalidade «ad probationem», a emissão dessa ordem, sendo controvertida a sua existência, só podia provar-se por confissão ou documento escrito (art.º 364.º, n.º 2, do C. Civil), não sendo admissível a produção de prova testemunhal a seu respeito (art.º 393.º, n.º 1, do C. Civil).
Se o tribunal coletivo se fundou em prova testemunhal para responder afirmativamente ao quesito em que se perguntava se a fiscalização ordenara ao empreiteiro a realização de certos trabalhos, tal resposta deve ser havida como não escrita (art.º 646.º, n.º 4, do CPC).
Assente que o empreiteiro não demonstrou que a realização dos trabalhos a mais por si invocados lhe foi ordenada ou, sequer, que tais trabalhos foram tidos pelo dono da obra como necessários ou convenientes, improcede a ação de condenação no pagamento do preço dos mesmos trabalhos’.
No mesmo sentido, o recente Ac. STA de 17/3/2010 - 01047/09 (ainda que tenha por referência agora o Dec. Lei 405/93, que não o 235/86, mas cujas normas questionadas têm versão semelhante, sem alterar a sua interpretação - os art.os 27.º e 159.º, n.º 2 do Dec. Lei 235/86 correspondem aos art.os 26.º e 163.º do Dec. Lei 405/93 e aos art.os 26.º e 182.º do Dec. Lei 59/99, respetivamente, sendo que aqui se faz referência ao Ac. de 7/11/2001, que refere que ‘A obrigação de pagamento de qualquer quantia com fundamento em responsabilidade civil emergente de contrato de empreitada de obras públicas tem de ter subjacente acordo das partes quanto à realização dos trabalhos, sendo relevante não só o acordo inicial, materializado no contrato, como acordos posteriores que se forem formando, mesmo quando a iniciativa foi do empreiteiro e ocorreu ulterior concordância do dono da obra.
O Réu negou que tivesse sido dada tal ordem (art.º 55.º da Base Instrutória). A matéria foi levada ao quesito 10.º da Base Instrutória, a que o Tribunal Coletivo respondeu que esse trabalho foi realizado a solicitação do Réu, resposta esta que foi dada com suporte em prova testemunhal (fls. 1174 e 1178).
O Réu defende que não se prova que não é admissível prova testemunhal por força do disposto nos art.os 26.º, n.º 3, e 163.º do DL n.º 405/93.
Efetivamente, o art.º 163.º do DL n.º 405/93 estabelece nos seus n.os 1 e 2, que «para realização das suas atribuições, a fiscalização dará ordens ao empreiteiro, far-lhe-á avisos e notificações, procederá às verificações e medições e praticará todos os demais atos necessários» e que «os atos referidos no número anterior só poderão provar-se, contra ou a favor do empreiteiro, mediante documento escrito». Por seu turno, o art.º 26.º, n.º 3, em que se refere que «o empreiteiro é obrigado a executar os trabalhos previstos no n.º 1 caso lhe sejam ordenados por escrito pelo dono da obra», embora seja uma disposição que tem em vista proteger os interesses do empreiteiro, revela que as ordens também podem ser dadas diretamente pelo dono da obra por escrito, pelo que ser-lhes-á aplicável o mesmo regime, se não diretamente, pelo menos por analogia, pois é manifesto que as razões que podem justificar a desconfiança legislativa em relação à prova testemunhal nesta matéria, tanto valem em relação a ordens dadas pela fiscalização como a ordens dadas diretamente pelo dono da obra.
(…)
De outra banda, para além da inexistência de autorização ou ordem escrita para a realização dos trabalhos adicionais, não previstos no contrato inicial, não foi alegado pelas partes (e não resultou provado) que a fiscalização (ou, eventualmente, a R., dono de obra, para o caso de ela própria ter assumido essa fiscalização) tenha fornecido “os planos, desenhos, perfis, mapa da natureza e volume dos trabalhos e demais elementos técnicos indispensáveis para a sua perfeita execução e para a realização das medições”, como impunha o n.º 2 do art.º 26.º do Decreto-Lei n.º 59/99, de 02/03. Também não se verificou a entrega de um projeto de alteração à A., empreiteira, nem a execução dos trabalhos foi formalizada através de um contrato adicional ao contrato de prestação de serviços, conforme exigiam os n.os 4 e 7 do referido preceito.
(…)
No entanto, o que se sabe é apenas que a A. verificou a necessidade de execução de trabalhos não contemplados no contrato de prestação de serviços e que constituíam o desenvolvimento das obras inicialmente previstas, tendo, para esse efeito, apresentado um relatório intercalar/proposta de revisão de custos das obras em execução, no qual alega ter executado (e ser sua intenção vir a executar) determinados trabalhos não previstos no contrato celebrado, que aí enumera e descreve, trabalhos esses ditados, sobretudo, por circunstâncias que apenas foram detetadas em obra. Não se sabe, porém – porque nada foi alegado, nem provado, a esse respeito – se efetivamente tais circunstâncias apenas detetadas em obra, já em fase de execução, e que terão obrigado a trabalhos adicionais, eram totalmente imprevisíveis ab initio, no sentido de que não poderiam sequer tais trabalhos ter sido incluídos no contrato de prestação de serviços inicialmente celebrado.
Nesta medida, porque o ónus de alegação e prova da imprevisibilidade dos trabalhos adicionais era da A., não tendo sido alegados factos que a comprovassem, também não logrou a mesma provar este requisito, essencial à qualificação dos trabalhos em causa como “trabalhos a mais”, nos termos legalmente consagrados.
Ante o exposto, apenas é possível verificar, in casu, à luz do probatório, que a A. executou trabalhos não contemplados no contrato de prestação de serviços que constituíam o desenvolvimento das obras inicialmente previstas, ou seja, que tais trabalhos se destinaram à realização da obra globalmente contratualizada e se mostraram necessários para a sua execução e conclusão.
Contudo, estas circunstâncias são insuficientes para se darem por preenchidos todos os restantes requisitos do art.º 26.º do Decreto-Lei n.º 59/99, de 02/03, a saber: a necessidade dos trabalhos terem resultado de “uma circunstância imprevista”; de terem sido ordenados ou autorizados por escrito, pela R.; de terem sido fornecidos “os planos, desenhos, perfis, mapa da natureza e volume dos trabalhos e demais elementos técnicos indispensáveis para a sua perfeita execução e para a realização das medições”; e de ter sido entregue um projeto de alterações ao empreiteiro.
Assim, não tendo tais trabalhos obedecido aos requisitos indicados no art.º 26.º do Decreto-Lei n.º 59/99, de 02/03, não podem os mesmos ser qualificados como “trabalhos a mais” – ou como “trabalhos extraordinários”, como expressamente referido na fatura n.º A-9, aqui em causa –, o que significa que inexiste, do lado da R., dono de obra, a correspetiva obrigação de proceder ao pagamento desses trabalhos, a título de “trabalhos a mais” ou “trabalhos extraordinários” (cfr., entre outros, o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 17/03/2010, proc. n.º 01047/09, e o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 12/09/2013, proc. n.º 06754/10, ambos publicados em www.dgsi.pt).
Soçobra, assim, o primeiro fundamento invocado pela A. para condenação da R. no pagamento do valor titulado pela fatura n.º A-9, assente no (in)cumprimento do contrato de prestação de serviços entre ambas celebrado (responsabilidade contratual), resultando prejudicada a apreciação dos demais argumentos nesta sede alegados (mormente, no que se refere à “nulidade” dos trabalhos a mais).
(…) *
Ante todo o exposto, é forçoso concluir que a A. não tem direito ao pagamento, pela R., da quantia de € 33.764,68, referente aos “trabalhos extraordinários” executados no âmbito do contrato de prestação de serviços que foi celebrado entre as partes para realização de determinadas obras nas instalações do CDP, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, seja a título de responsabilidade civil contratual, seja, subsidiariamente, a título de enriquecimento sem causa.
E, inexistindo qualquer direito de crédito da A. sobre a R., no que à fatura n.º A-9 diz respeito, bem como a correspetiva dívida da R. perante a A., fica automaticamente prejudicada a questão da prescrição dos juros de mora que foi suscitada nos autos. Com efeito, se, como é sabido, a obrigação de juros surge em consequência da obrigação de capital, visto que representa o rendimento dele (ou se torna devida face ao incumprimento do dever de pagar essa obrigação), não é logicamente possível conceber a existência dessa obrigação de juros quando o dever de que ela depende simplesmente não existe. Se não há obrigação de pagamento da fatura n.º A-9, porque o valor da mesma constante não se mostra devido pela R., nunca poderia a falta de pagamento oportuno desse valor originar o vencimento de juros de mora, pelo que a questão da sua prescrição perde todo o sentido e relevância.

Vejamos:
Há um conjunto de factos dados como provados que aqui se destacarão, por relevarem para a decisão que se adotará:
Assim:
“(...)
3) A A. cumpriu integralmente os trabalhos programados e previstos no contrato de prestação de serviços (acordo).
4) A A. verificou a necessidade de execução de trabalhos não contemplados no contrato de prestação de serviços e que constituíam o desenvolvimento das obras inicialmente previstas.
5) Através do ofício n.º C/001/01, de 02/01/2001, enviado ao cuidado da Diretora do Centro de Diagnóstico Pneumológico de Coimbra, Dr.ª M., a A. apresentou um relatório intercalar/proposta de revisão de custos das obras em execução, referentes ao contrato de prestação de serviços celebrado, no qual expôs e informou o seguinte:
“(...)
3. Acréscimo de custos
(…)
Assim, e discriminando item a item para que tudo seja bem claro, temos o seguinte:
- Acréscimo de custos em trabalhos extraordinários (projeto original) 17,5%
- Acréscimo de custos devido ao aumento da área do laboratório 27%
- Porta automática em vidro 5%
Total: 49,5%
(…)
6) Em 09/01/2001 foi realizada uma reunião em que estiveram presentes o representante legal da A., a Diretora do Centro de Diagnóstico Pneumológico de Coimbra, o Diretor de Serviços de Administração Geral da R. e o Chefe de Divisão Financeira da R., na qual foi analisado o relatório intercalar que antecede e a respetiva proposta de revisão de custos (cfr. docs. de fls. 61 a 65 do suporte físico do processo).
7) A A. executou trabalhos não contemplados no objeto do contrato de prestação de serviços inicialmente celebrado (cfr. docs. de fls. 61, 62 e 67 a 72 do suporte físico do processo).
(...)
10) Em 24/04/2001 a Coordenadora da Sub-Região de Saúde de Coimbra proferiu o seguinte despacho, exarado no ofício n.º C024/01, de 09/04/2001, remetido pela A.: “Face ao exposto e apresentadas as razões válidas sobre o atraso da obra e também a alteração do projeto, autorizo o pagamento das faturas apresentadas n.º A-8 e n.º A-9” (cfr. doc. de fls. 15 do processo administrativo).
(...)
12) Por despacho de 02/05/2001 da Coordenadora Sub-Regional de Saúde, exarado sob a informação que antecede, foi o processo remetido à Assessoria Jurídica para pronúncia quanto à viabilidade de pagamento das faturas em causa (cfr. doc. de fls. 1 do processo administrativo).
13) Através de ofício de 18/06/2001, subscrito pela Coordenadora Sub-Regional de Saúde, foi a A. informada de que, “quanto à fatura n.º A-9, de 23/04/2001, no valor de 6.769.211$, (…) considerando o facto de a mesma não ter enquadramento no contrato assinado, foi solicitada a sua análise e emissão de parecer jurídico pela Assessoria Jurídica desta SRS” (cfr. doc. de fls. 75 do suporte físico do processo).
14) Consta do ofício n.º 01114, de 29/06/2001, subscrito pela Diretora do Centro de Diagnóstico Pneumológico de Coimbra e dirigido à Coordenadora da Sub-Região de Saúde de Coimbra, o seguinte:
“Em resposta ao ofício 9621, de 06/06/2001, referente às obras efetuadas no Laboratório deste CDPC, e em cumprimento do Despacho de 2001/06/01, passo a informar:
(…)
8. Confirmada a absoluta necessidade das alterações propostas, a Chefia da Divisão Financeira informou ter a SRSC disponibilidade orçamental para poder proceder à cabimentação das verbas necessárias à alteração do projeto inicial, tendo ficado a resolução do enquadramento legal a cargo da Direção de Serviços de Apoio Geral.
(...)
10. Os trabalhos prosseguiram em conformidade com as alterações propostas no Relatório Intercalar/Proposta de Revisão de Custos.
11. Em 19 de março de 2001, a firma E., S.A. dá como concluídas as obras do Laboratório.(...)”
Retornando ao objeto da Ação, foi originariamente peticionado pela Autora a condenação da Entidade Demandada, aqui Recorrida, no pagamento de 33.764,68€, mais juros, correspondente a fatura que não terá sido paga, no âmbito de contrato de prestação de serviços, tendente à realização de trabalhos nas instalações do Centro de Diagnóstico Pneumológico de Coimbra (CDP).

Estando em causa trabalhos alegadamente executados a mais, para além dos inicialmente previstos e aceites entre as partes e que levou á adjudicação dos trabalhos, relativamente aos quais inexiste autorização escrita face à sua realização/execução, veio o Tribunal de 1ª Instância a julgar improcedente a Ação.

Além do mais, entendeu o Tribunal a quo que a autora, não fez prova de quais os trabalhos realizados acrescidamente, que determinaram a emissão da Fatura nº 9-A, no valor de 33.764,68€.

Se é certo que não há qualquer contrato escrito relativamente aos trabalhos realizadas a mais face ao originário contrato, o que é facto é que a ARS nunca se opôs à sua realização, o que levou a Autora a afirmar que houve uma autorização implícita e tácita.

Aliás, como antecedentemente se transcreveu, resulta da matéria dada como provada que, a autora, no decurso da execução dos trabalhos, iniciais e aprovados por ambas as partes contraentes, verificou que havia necessidade de proceder a novas obras de readaptação e aproveitamento das obras já executadas de acordo com o projeto inicial, tendo em atenção a finalidade da execução das mesmas.

Foi em face da referida constatação técnica, que a Autora veio a apresentar relatório intercalar/proposta de revisão de custos das obras em execução, á sua interlocutora, a Diretora do Centro de Diagnóstico Pneumológico de Coimbra.

Efetivamente, a proposta de revisão de custos e alteração do projeto inicial à referida Diretora em 02/01/2001, que a terá encaminhado para os órgãos hierarquicamente competentes (Facto Provado 5).

Na reunião realizada em 9/01/2001 (Facto Provado, nº 6), destinada, nomeadamente, a discutir o teor da proposta intercalar apresentada, estiveram persentes a Diretora do Centro Pneumológico, o Diretor de Serviços de Administração Geral e o Chefe de Divisão Financeira, ambos ao serviço da Ré.

Diga-se que, não obstante as obras acrescidas, estivessem reconhecidamente em curso, não foi alegado e menos ainda provado que os representantes da Demandada, aqui Recorrida, se tivessem pronunciado no sentido da paragem da execução das mesmas.

Resulta aliás dos Autos que a proposta apresentada pela Autora mereceu acolhimento por parte da Diretora do CDPC e que a própria chefia da Divisão Financeira, terá chegado a informar que a SRSC tinha disponibilidade orçamental para poder proceder á cabimentação das verbas necessárias á alteração do projeto inicial, tendo a resolução do enquadramento legal ficado a cargo da Direção de Serviços de Apoio Geral, (Facto Provado nº 14), sendo que a Coordenadora da Sub – Região da Saúde de Coimbra chegou a proferir despacho autorizando o pagamento, nomeadamente, da aqui controvertida faturas A-9, respeitante á revisão de preços pelos novos trabalhos executados e concluídos em março de 2001.

Sublinha-se que os controvertidos trabalhos acrescidos sempre foram prosseguindo com pleno conhecimento da aqui Recorrida, nunca tendo sido objeto de qualquer ordem de suspensão ou cessação pelo o dono da obra.

É incontornável, e resulta do próprio discurso fundamentador da decisão de 1ª instância, que os controvertidos trabalhos foram executados e incorporados nas obras efetuadas nas instalações do CDPC, estando apenas controvertido o seu pagamento, consubstanciado na Fatura nº 9-A, no valor de 33.764,68€.

Tendo os trabalhos acrescidos sido propostos e realizados, tendo chegado o seu pagamento a ser objeto, em 24/04/2001, de despacho a autorizar o pagamento, por parte da Coordenadora da Sub-Região de Saúde de Coimbra, nunca tendo sido determinada, quer a suspensão quer a cessação dos referidos trabalhos reconhecidamente em curso, mal se compreende como poderá deixar de ser efetivado o correspondente pagamento.

Sublinha-se que não foi impugnada a realização dos trabalhos cuja faturação se mostra controvertida, tendo antes sido reconhecida a sua efetivação.

À data da proposta de realização dos referidos trabalhos e da sua realização estava em vigor o Decreto-Lei n.º 59/99, de 02/03, com as alterações entretanto introduzidas.

Tendo a realização dos trabalhos acrescidos sido proposta, apresentada em reunião realizada, nomeadamente, para o efeito, tendo chegado a ser objeto de despacho de pagamento e não tendo, como reiteradamente se afirmou, havido qualquer orientação ou determinação para a cessação da realização dos trabalhos em curso, ainda que sem contrato escrito, estamos em presença manifestamente de um contrato de facto.
Como resulta do acórdão deste TCAN nº 126/12.8BEMDL, de 12.06.2019, mesmo inexistindo contrato escrito, atenta a matéria dada como provada, sempre a ARS teria de suportar os custos da empreitada realizada, por se ter provado que a mesma foi realizada a seu favor.
Como se sumariou no identificado Acórdão “A ausência de contrato escrito não autoriza a ilação de que o negócio jurídico seja equivalente a um nada, tal como se pura e simplesmente não tivesse acontecido”.
Na realidade, a ARS não demonstra por que razão o empreiteiro, aqui Recorrente, havia de ter realizado acrescidos trabalhos nas identificadas instalações se não estivesse convicto de que os mesmos estavam aprovados e que seriam pagos, pois que inexistiam sinais em sentido contrário.
Por outro lado, mas no mesmo sentido, se não tivesse havido uma contratualização, ainda que não escrita e de facto, resultante das reuniões realizadas, certamente que a ARS teriam cuidado de ter impedido a realização dos acrescidos trabalhos, sabendo, como sabia, que os mesmos estavam em curso.
De realçar ainda que no procedimento resulta que a própria Chefia da Divisão Financeira informou ter a SRSC disponibilidade orçamental para poder proceder à cabimentação das verbas necessárias à realização das acrescidas obras.
Já noutra perspetiva, mas ainda assim, no mesmo sentido decisório, afirmou-se no acórdão deste TCAN nº 949/11BEBRG, de 17/04/2015, aqui aplicado mutatis mutandis, que “(…) Tal como relativamente aos serviços prestados ao abrigo de um contrato entretanto declarado nulo, perante a inexistência de um contrato, resultante da sua caducidade, e continuando a ser prestados os serviços anteriormente contratualizados, sem oposição, enquanto “Contrato de facto”, tais serviços terão de ser remunerados. A inexistência de contrato, por caducidade do mesmo, não autoriza “a ilação de que o negócio jurídico seja equivalente a um nada, tal como se pura e simplesmente não tivesse acontecido.”
Com efeito, e como se afirmou já, mesmo tendo-se verificado uma omissão na formalização da contratualização controvertida, sempre estaríamos perante uma «relação contratual de facto», ou «contrato imperfeito» noutra terminologia, cujos trabalhos sempre teriam de ser remunerados.
Em linha com o Acórdão do STA nº 047638 de 21-09-2004, a ARS sempre teria de ser condenada no pagamento dos trabalhos prestados no âmbito da empreitada de facto contratualizada, pois que mesmo verificando-se irregularidades e insuficiências formais, tal não autorizaria que se tirasse como ilação que o negócio jurídico seria equivalente a um nada, como se pura e simplesmente não tivesse acontecido.
Efetivamente, da factualidade provada é possível concluir que as partes mantiveram no âmbito da identificada empreitada, reuniões regulares e relações contratuais efetivas, sendo que não há rasto ou meros indícios, que a ARS se tenha oposto à realização dos trabalhos que foram sendo realizados.
Em resumo, mesmo reconhecendo insuficiências formais na controvertida acrescida empreitada, ainda assim, sempre a ARS teria de dar satisfação às suas obrigações remuneratórias, pois que os trabalhos efetivamente realizados não poderão ser “equivalentes a um nada”, sendo que, sendo caso disso, sempre estaremos em presença de um “Contrato de facto” ou imperfeito.
Dos juros de mora.
No que concerne a juros, é indubitável que os juros de mora só podem ser contados a partir do momento que a obrigação subjacente se torna líquida, válida e eficaz, ou seja, a partir da decisão judicial.

De outro modo estaria a ARS obrigada a pagar juros de mora por uma obrigação ainda não liquidada e legitimada por decisão judicial, pois só a partir desta poderão ser conferidos efeitos jurídicos a uma obrigação não escrita.

Assim sendo, tendo o Tribunal conferido validade a um contrato não escrito, enquanto contrato de facto, afastando o efeito anulatório adveniente do incumprimento de requisito formal, que obrigaria à sua formalização por escrito, deverá a ARS ser condenada a pagar à aqui Recorrente, para além dos valores de capital em dívida, também os correspondentes juros de mora, mas só a partir da sua validação pelo tribunal, pois, como se disse, que só com a decisão judicial se consolidou e liquidou a obrigação de pagamento.
* * *
Deste modo, em conformidade com o precedentemente expendido, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Norte, em conceder parcial provimento ao Recurso:
a) Revogando-se a Sentença Recorrida,
b) Mais se determinando o pagamento por parte da ARS do valor correspondente à fatura nº 9-A, no valor de 33.764,68€.
c) Acrescido dos juros de mora, a partir do trânsito em julgado da sentença judicial.
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Custas pelas partes, em função do decaimento
*
Porto, 5 de novembro de 2021

Frederico de Frias Macedo Branco
Alexandra Alendouro
Paulo Ferreira de Magalhães