Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00126/17.1BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:04/12/2018
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Mário Rebelo
Descritores:LEI 51/2015 DE 8 DE JUNHO.
Sumário:1. O regime aprovado pela Lei n.º 51/2015 de 8/6 contempla a redução das coimas não aplicadas ou não pagas, associadas ao incumprimento do dever de pagamento de taxas de portagem, cuja regularização ocorreu antes da entrada em vigor dessa Lei.
2. Desde que fossem pagas até 60 dias a contar da entrada em vigor da Lei, ou seja, até 29 de Setembro de 2015, prorrogado até 15 de Outubro do mesmo ano, ou até à mesma data, identificasse o processo de contra ordenação onde estava a ser aplicada a coima.
3. É à Reclamante que cabe o ónus da prova dos factos relativos ao direito que se arroga para beneficiar da redução ali prevista. *
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Autoridade Tributária e Aduaneira
Recorrido 1:A..., S.A.
Decisão:Concedido provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

RECORRENTE: Autoridade Tributária e Aduaneira.
RECORRIDO: A… SA.
OBJECTO DO RECURSO: Sentença proferida pela MMª juiz do TAF do Porto que julgou procedente a reclamação e revogou o acto reclamado que indeferira o pedido de adesão ao regime RERD Portagens.
CONCLUSÕES DAS ALEGAÇÕES:
A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou procedente a Reclamação contra a decisão do órgão de execução fiscal que recaiu sobre o requerimento de redução das coimas ao abrigo do Regime Excepcional de Regularização de Dívidas (RERD Portagens), relativamente aos processos de execução fiscal (PEF) n.ºs. 3182201501010972, 3182201501010999, 3182201501011057, 3182201501011073, 3182201501011090, apensos ao processo principal 3182201501010956.

B. A reclamante alega essencialmente que a referida decisão está ferida de ilegalidade por se encontrarem reunidos os requisitos do artigo 4º da Lei 51/2015 de 8 de Junho que aprovou o RERD – Portagens, invocando que, para o efeito, o importante é que as taxas de portagens tenham sido liquidadas até ao sexagésimo dia após a entrada em vigor do mencionado diploma.
C. Considerou o Tribunal a quo que “É à Reclamante que cabe o ónus da prova do direito a que se arroga e, assim, para demonstrar a ilegalidade do despacho que impugna havia que provar estarem reunidas as condições legalmente impostas para que obtivesse a requerida redução. Atendendo à redacção da alínea b) do n.º 2 e ao n.º 3 do artigo 4.º da Lei 51/2015 de 08.06, e a que a mesma lei entrou em vigor em 01.08.2015 [cfr. o seu artigo 10.º], para beneficiar da redução ali prevista deveria a Reclamante proceder ao pagamento, até 60 dias a contar da entrada em vigor da lei 51/2015 ou, até à mesma data, identificar os processos de contraordenação onde estava a ser aplicada a coima ou demonstrar ter requerido junto da AT a passagem das guias para proceder ao referido pagamento.”
D. e que “Portanto, tendo a lei entrado em vigor em Agosto de 2015, a Reclamante deveria ter diligenciado nos termos referidos até final de Outubro de 2015.”
E. Prossegue o Tribunal considerando que “A este propósito vem a Reclamante invocar que na base de dados da AT não constavam processos pendentes, tendo junto um print de consulta à base de dados da AT que confirma esta versão. Este print data de Novembro de 2015, ou seja, data posterior ao prazo limite referido.”
F. que “Solicitado à AT esclarecimento sobre tal facto – falta de informação na base de dados da AT sobre os processos pendentes contra a Reclamante – veio esta informar que pela circunstância de os PEF se encontrarem suspensos desde 08/04/2015 a base de dados não os reflecte como activos.”
G. E que “Acresce que conforme resulta do probatório a Reclamante em 06/11/2015 requereu à AT que levantasse a suspensão dos PEF para poder proceder à emissão das guias para pagamento.”
H. Concluindo que “…a falta de pagamento não pode ser imputada à Reclamante na medida em que pela consulta à base de dados da AT, desde 8 de Abril de 2015 não existiam processos activos contra a reclamante e tal facto deve-se à circunstância de estarem suspensos com prestação de garantia. Trata-se de limitação do sistema informático da AT que não pode prejudicar a Reclamante que demonstrou, conforme consta do probatório, ter tentado efectuar os pagamentos.”
I. Com a ressalva do sempre devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o assim decidido, porquanto, considera que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento de facto na apreciação e valoração da prova e erro na aplicação do direito aos factos, pelas razões que passa a elencar.
J. A Lei n.º 51/2015 de 8 de Junho, com entrada em vigor em 01 de Agosto de 2015, aprovou um regime excepcional de regularização de dívidas resultantes do não pagamento de taxas de portagem e coimas associadas, por utilização de infraestrutura rodoviária efectuada até ao último dia do segundo mês anterior ao da sua publicação. (cfr. o seu artigo 1º)
K. O referido regime prevê, nos n.ºs 2 e 3 do artigo 4º, a redução das coimas não aplicadas ou não pagas, associadas ao incumprimento do dever de pagamento de taxas de portagem, cuja regularização ocorreu antes da entrada em vigor dessa Lei, para 10% do mínimo da coima prevista no tipo legal ou 10% do montante da coima aplicada mas ainda não paga, no caso de coimas pagas no processo de execução fiscal, desde que sejam pagas até 60 dias a contar da entrada em vigor da Lei, ou seja, até 29 de Setembro de 2015, prazo este prorrogado até 15 de Outubro do mesmo ano.
L. In casu, e uma vez que, relativamente aos processos de execução fiscal apensos ao processo principal n.º 3182201501010956, foram efectivamente pagas as taxas de portagem em data anterior à da entrada em vigor do RERD, o regime de redução das coimas instituído pela alínea b) do n.º 2 do artigo 4º poderia ser aplicado às coimas associadas às infracções em causa, desde que,
M. “se verificasse a condição estabelecida no n.º 3 do mesmo preceito” (tal como se encontra ressalvado, e bem, na douta sentença ora recorrida).
N. Em 22.01.2016, a Reclamante requereu a aplicação do RERD nos mencionados processos de execução fiscal, solicitando a aplicação do disposto no mencionado artigo 4º, n.º 2 alínea b) da Lei 51/2015, com a inerente redução das coimas, de modo a poder aceder à emissão das competentes guias e subsequente pagamento. (doc. 14 junto à P.I.)
O. Mas, e como é igualmente bem ressalvado na douta sentença ora recorrida, “É à Reclamante que cabe o ónus da prova do direito a que se arroga…para beneficiar da redução ali prevista deveria a Reclamante proceder ao pagamento, até 60 dias a contar da entrada em vigor da lei 51/2015 ou…demonstrar ter requerido junto da AT a passagem das guias para proceder ao referido pagamento.”
P. Ora, tal prova não foi efectuada pela Reclamante, pois apenas consta dos autos um print extraído da base de dados da AT no qual, à data da consulta, 13.11.2015, o sistema informático indicava com relação à “lista de processos de Contra-Ordenação instaurados activos” e à “lista dos processos de execução fiscal pendentes activos” que “Não foi encontrada informação processual”.
Q. Portanto, tal “print data de Novembro de 2015, ou seja, data posterior ao prazo limite” estabelecido no referido n.º 3 do artigo 4º da Lei 51/2015 (tal como bem ressalvado pela douta sentença ora recorrida).
R. No entanto, apesar de todas estas ressalvas por parte da Meritíssima Juíza de Direito na douta sentença ora recorrida, a mesma concluiu, de forma contraditória, afirmando que a Reclamante “demonstrou, conforme consta do probatório, ter tentado efectuar os pagamentos.”
S. Ora, o que releva, in casu, é a existência ou não da prova de que a Reclamante requereu, no prazo legal, isto é, até 15.10.2015, a passagem das guias para proceder ao pagamento das coimas ao abrigo do artigo 4º da Lei 51/2015.
T. E tal prova, simplesmente, não consta dos autos.
U. Destarte, e, uma vez que a Reclamante não cumpriu, como lhe competia (pois a ela cabe o ónus da prova do direito a que se arroga), a demonstração da ilegalidade da decisão reclamada,
V. decidindo da forma como decidiu, a douta sentença recorrida enferma de ERRO DE JULGAMENTO DE FACTO E DE DIREITO APLICÁVEL, pelo que deverá ser revogada.

Termos em que,
Deve ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional com as legais consequências.

CONTRA ALEGAÇÕES.
A recorrida contra alegou e concluiu:
A. Vêm as presentes Alegações apresentadas no âmbito do recurso interposto pela Fazenda Pública da sentença proferida no processo n.º 126/17.1BEPRT do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou a reclamação do ato do órgão de execução Fiscal procedente.
B. Pretexta a Fazenda Pública que não se conforma com a douta decisão julgou procedente por considerar que “(...) tal prova não foi efetuada pela Reclamante, pois apenas consta dos autos um print extraído da base de dados da AT no qual, à data da consulta, 13.11.2015, o sistema informático indicava com relação à “lista de processos de Contra- Ordenação instaurados ativos” e à “lista dos processos de execução fiscal pendentes ativos” que “Não foi encontrada informação processual”.
16
C. Portanto, tal “print data de Novembro de 2015, ou seja, data posterior ao prazo limite” estabelecido no referido n. º3 do artigo 4.º da Lei 51/2015
(…)”.
D. Aditou a Recorrente que “No entanto, apesar de todas as ressalvas por parte da Meritíssima Juíza de Direito na douta sentença ora recorrida, a mesma concluiu de forma contraditória, afirmando que a Realmente “demonstrou conforme consta do probatório, ter tentado efetuar os pagamentos.”
E. “Ora, o que releva, in casu, é a existência ou não da prova de que a Reclamante requereu, no prazo legal, isto é, até 15.05.2015, a passagem das guias para proceder ao pagamento das coimas ao abrigo do artigo 4.º da Lei 51/2015.”
F. Assim, conclui que” (…) uma vez que a Reclamante não cumpriu, como lhe competia (pois a ela cabe o ónus da prova do direito a que se arroga), a demonstração da ilegalidade da decisão reclamada (…).”
G. Ao invés da posição assumida pela Representante da Fazenda Pública (FP), entende a Alegante ser justa, adequada e legalmente fundamentada a decisão proferida pelo Tribunal “a quo”, na medida em que julgou procedente a Reclamação da decisão do órgão de execução fiscal que recaiu sobre o requerimento de redução das coimas ao abrigo do regime excecional de regularização de dívidas [RERD] portagens aos processos 3182201501010972,3182201501010999,3182201501011057,31822015 01011073,3182201501011090, que se encontram apensos ao processo principal 3182.2015.0101.0956 e, em consequência determinou a anulação do despacho reclamado.
H. Para tanto, entendeu o Tribunal a quo que o “(…) não cumprimento atempado do pagamento ou pedido de pagamento das coimas no prazo referido no n. º3 do artigo 4.º da Lei 51/2015, não é imputável à reclamante, mas antes à AT, por limitação do seu sistema informático, pelo que se impõe determinar a procedência da reclamação, anulando-se o despacho reclamado.”
I. Ora, no Ponto U das suas conclusões de recurso, a Fazenda Pública consignou que” (…) uma vez que a Reclamante não cumpriu, como lhe competia (pois a ela cabe o ónus da prova do direito a que se arroga), a demonstração da ilegalidade da decisão reclamada (…).”
J. Em face do que conclui a Fazenda Pública, a questão que se coloca é precisamente saber se a sentença a quo enferma de erro no julgamento da matéria de facto e de aplicação do direito aos factos, na medida em que aquela nas suas conclusões refere que recaia sob a Recorrida a produção de prova de que requereu no prazo legal, i.e., até ao dia 15.10.2015, a passagem das guias para proceder ao pagamento das coimas ao abrigo do RERD.
K. No acórdão datado de 14 de Junho de 2017, proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte, decidiram os Mmos. Juízes Desembargadores “(...) conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e ordenar a baixa dos autos à 1.ª instância para diligências complementares de prova nos termos sobreditos e prolação de nova decisão.”
L. Em virtude do citado acórdão, competia ao Tribunal a quo “diligenciar junto do competente serviço de finanças por onde correm as execuções e a
que o tribunal a quo estava vinculado pelo princípio do inquisitório e da verdade (…).”, obter informação “(…) se refletindo a base de dados não se encontrarem ativos os processos executivos em causa, tal obstava à extração das guias para pagamento das coimas exequendas com redução pela própria AT e se tal informação foi transmitida pela AT e quanto à Recorrente e em que data foi operacionalizada a base de dados em termos de permitir a extração das referidas guias para pagamento, se em
Janeiro/2016 ou outra anterior.
E ainda, se os doc.13 e 14 juntos à p.i. (fls.44 a 46), dirigidos ao órgão de execução fiscal e peticionando a emissão de guias pagamento deram efetivamente entrada nos serviços, como afirma a Recorrente, e em que momento.”
M. Pois bem, os autos desceram à 1.ª instância precisamente para apurar o ordenado no Acórdão que se vem de citar, foi a AT notificada pelo Tribunal a quo para responder às seguintes questões: “1. Refletindo a base de dados não se encontrarem ativos os processos executivos em causa tal obstava à extração das guias para pagamento das coimas exequendas com redução pela própria AT?; 2. Esta informação foi transmitida pela AT à recorrente? Se sim quando? 3. Em que data foi operacionalizada a base de dados em termos de permitir a extração das referidas guias para pagamento? Em Janeiro de 2016 ou em data anterior?”.
N. Nenhuma das questões colocadas foi respondida de forma clara e exata pela AT.
O. Tendo em consideração que o Tribunal a quo estava adstrito a obter junto da AT resposta às questões solicitadas pelo Tribunal ad quem.
P. Ao invés do alegado pela AT, reitera-se que, da prova documental junta aos autos, documentos 10 a 14 com a PI, decorre que efetivamente o não pagamento das coimas no prazo previsto no n. º 3, do artigo 4.º do RERD Portagens, i.e., até 25/10/2015, deveu-se a causas extrínsecas à sua própria vontade, designadamente devido a um problema informático do Portal das Finanças, imputável única exclusivamente à Autoridade Tributária e Aduaneira.
Q. Conforme resulta de ambos os requerimentos, a Reclamante solicitava a aplicação do RERD, e no segundo requerimento requeria a emissão das guias.
R. A AT não fez a prova que o Tribunal Central Administrativo Norte solicitou, pelo contrário, os documentos que juntou aos autos apenas confirmam o alegado na Petição Inicial e nas Alegações de Recurso.
S. Ou seja, ficaram assim por responder as seguintes questões: “1. Refletindo a base de dados não se encontrarem ativos os processos executivos em causa tal obstava à extração das guias para pagamento das coimas exequendas com redução pela própria AT?; 2. Esta informação foi transmitida pela AT à recorrente? Se sim quando? 3. Em que data foi operacionalizada a base de dados em termos de permitir a extração das referidas guias para pagamento? Em Janeiro de 2016 ou em data anterior?”.
T. Reitera-se que, os processos em execução fiscal em causa, não foram instaurados após o termo da vigência do RERD, 25/10/2015, mas em momento anterior à sua entrada em vigor, 01/08/2015.
U. Por outras palavras, se efetivamente não existisse o referido problema informático com a página do Portal das Finanças da Recorrente, em condições normais, na data de 13/11/2015, quer a “A…”, quer o próprio Serviço de Finanças do Porto-2, conseguiriam visualizá-los.
V. Em 29/09/2015, a Recorrente procedeu ao pagamento dos montantes exigíveis nos Processos de Execução Fiscal n.º 3182.2015.0101.0891 e 3182.2015.0101.0913, e concomitantemente foram os mesmos declarados extintos, e como tal os mesmos deixaram de constar da Página do Portal das Finanças da recorrente.
W. Razão pela qual, em 13/11/2015, os Processos de Execução Fiscal n.º 3182.2015.0101.0891 e 3182.2015.0101.0913, não constavam daquela Página.
X. Isto é, os processos em execução fiscal quando ativos ou suspensos têm de constar da página do Portal das Finanças de cada contribuinte, exceto se tiverem sido declarados extintos.
Y. In casu, em 13/11/2015, não constava quer o estado ativo, quer suspenso, mas simplesmente inexistia qualquer informação no Portal das Finanças sobre os mesmos.
Z. Ou seja, a Recorrente apenas não procedeu ao pagamento das coimas em causa no prazo legal previsto no n.º3, do artigo 4.º do RERD Portagens, porque a contribuinte e p Serviço de Finanças, estavam informaticamente impossibilitados de emitir as guias para pagamento.
AA.O aludido problema informático, conforme é expressamente referido no artigo 15.º da Petição Inicial, apenas foi solucionado em Janeiro de 2016.
BB.Assim, a decisão recorrida, deverá ser mantida na íntegra, julgando-se o recurso interposto improcedente. Não foram, assim, violadas quaisquer normas legais e aplicou-se corretamente o direito aos factos provados, não merecendo, pois, censura a sentença proferida.
Nestes termos, deve o recurso interposto ser julgado totalmente improcedente devendo manter-se inalterada a decisão recorrida. Com o que farão V. Exas. a habitual e sã JUSTIÇA!

PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO.
O Exmo. Procurador-Geral Adjunto neste TCA emitiu esclarecido parecer concluindo pela improcedência do recurso e confirmação da sentença recorrida.

II QUESTÕES A APRECIAR.
O objecto do presente recurso, delimitado pelas conclusões formuladas (artigos 635º/3-4 e 639º/1-3, ambos do Código de Processo Civil, «ex vi» do artº 281º CPPT), salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 608º/ 2, in fine), consiste em saber se a sentença errou ao julgar procedente a reclamação e determinar a anulação do despacho reclamado que indeferiu o pedido de adesão ao regime RERD Portagens.

Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.


III FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.
A sentença fixou os seguintes factos provados e respetiva motivação:
1. Em 13.11.2015, através da consulta no Portal das Finanças à lista de processos de contra-ordenação activos, em nome da Reclamante, foi obtida a mensagem de Não foi encontrada informação processual – fls. 42;
2. Em 06/01/2016 a Reclamante enviou à AT o requerimento de fls. 44 solicitando o levantamento da suspensão dos PEF ali referidos (3182201401305360, 3182201501010913; 3182201501010891) por impossibilidade do sistema informático da AT aferir o montante a pagar com aplicação do RERD de Portagens – fls. 44, 532, 534, 535;
3. Em 22.01.2016 a Reclamante apresentou um requerimento junto do serviço de Finanças do Porto 2, com referência ao PEF 3182201401305360, solicitando a aplicação do disposto no artigo 4.º, n.º 2, alínea b), da Lei 51/2015, com a inerente redução das coimas, por ter pago o valor da taxas de portagem, pedindo a “aplicação do RERD no processo supra identificado (…) de modo a que a contribuinte possa proceder à emissão das respectivas guias e pagamento subsequente” – cfr. requerimento de fls. 45 e registo dos ctt de fls. 46 e vinheta dos ctt de fls. 106 do processo físico;
4. O Serviço de Finanças do Porto indeferiu o requerido, por despacho de 29/11/2016, a fls. 46 a 50, do processo físico, com o teor seguinte:
1. Foram instaurados neste Serviço de Finanças, em nome de A…, SA, NIPC 5…, os processos de execução fiscal:
A - 3182201501010972, por coimas provenientes de B…, SA, no montante de 20.5555,82, cf. documentos juntos ao PEF de fls. 1 a 113 - Anexo A.
B - 3182201501010999, por coimas provenientes de B…, S.A., no montante de 5.010,12, cf. documentos juntos ao PEF de fls. 1 a 28 -Anexo B.
C - 3182201501011057, por coimas provenientes de B…, SA, no montante de 9.339,12, cf. documentos juntos ao PEF de f/s. 1 a 52 - Anexo C.
D - 3182201501011073, por coimas provenientes de B…, S.A., no montante de 7.606,44, cf., documentos juntos ao PEF de fls. 1 a 42 - Anexo D.
E - 3182201501010972, por coimas provenientes de B…, SA, no montante de 9.556,38, cf. documentos juntos ao PEF de fls. 1 a 50 -Anexo E.
F - 3182201501010972, por coimas provenientes de B…, SA, no montante de 9.322,92, cf. documentos juntos ao PEF de fts. 1 a 52 - Anexo E.
2. Os processos descritos no ponto anterior, encontram-se apensos ao processo identificado em F) (processo principal n.º 3182201501010956).
3. Em requerimento entrado neste Serviço de Finanças em 2016-01-22 (Ent. 2016E000279664), vem a contribuinte requerer a aplicação do RERD nos processos mencionados em 1, nos termos do n° 2, aI. b), do artigo 4.º do RERD Portagens, de modo que o contribuinte possa proceder à emissão das guias, e pagamento subsequente.
4. Do n.º 3, do artigo 4.º da Lei n.º 50/2015 de 08 de junho, concluiu-se que para beneficiar da redução referida pela contribuinte, a contribuinte deveria ter procedido ao respetivo pagamento até 60 dias a contar da entrada em vigor da mencionada Lei.
5. Nos processos mencionados em 1, já estão reflectidas todas as anulações previstas no diploma legal que aprovou o regime excepcional de regularização de dívidas resultantes do não pagamento de dívidas resultantes do não pagamento de taxas de portagens e coimas associadas, pela utilização de infraestruturas rodoviárias.
6. No processo identificado em 1A, Processo de Execução Fiscal (PEF) 3182201501010972, instaurado pelo não pagamento de 53 coimas de portagens, as taxas de portagens, relacionadas com as mesmas coimas, foram pagas no âmbito dos seguintes PEF:
- 26 coimas no PEF 318220140124023, extinto por pagamento voluntário em 03.02.2015 - antes do período RERD;
- 18 coimas no PEF 3182201401245279, extinto com o benefício previsto na Lei n.º 51/2015;
- 9 coimas no 3182201401273371 extinto por pagamento voluntário em 08.02.2015- antes do período RERD.
7. No processo identificado em 18, PEF 3182201501010999, instaurado pelo não pagamento de 12 coimas de portagens, as taxas de portagens, relacionadas com as mesmas coimas, foram pagas no âmbito do seguinte PEF:
- 12 coimas no PEF 3182201401273371, extinto por pagamento voluntário em 08.02.2015 - antes do período RERD.
8. No processo identificado em 1C, PEF 3182201501011057, instaurado pelo não pagamento de 22 coimas de portagens, as taxas de portagens, relacionadas com as mesmas coimas, foram pagas no âmbito do seguinte PEF:
- 22 coimas no PEF 3182201401273371 extinto por pagamento voluntário em 08.02.2015 - antes do período RERD.
9. No processo identificado em 10, PEF 3182201501011073, instaurado pelo não pagamento de 18 coimas de portagens, as taxas de portagens, relacionadas com as mesmas coimas, foram pagas no âmbito do seguinte PEF:
- 18 coimas no PEF 3182201401273371, extinto por pagamento voluntário em 08.02.2015 - antes do período RERD.
10. No processo identificado em 1E, PEF 3182201501011090, instaurado pelo não pagamento de 21 coimas de portagens, as taxas de portagens, relacionadas com as mesmas coimas, foram pagas no âmbito do seguinte PEF:
- 21 coimas no PEF 3182201401273371, extinto por pagamento voluntário em 08.02.2015 - antes do período RERD.
11. No processo identificado em 1F, PEF 3182201501011090, pelo não pagamento de 22 coimas de portagens, as taxas de portagens, relacionadas com as mesmas coimas, foram pagas no âmbito do seguinte PEF:
- 22 coimas no PEF 3182201401245279, extinto com o benefício previsto na Lei n.º 51/2015.
12. Pelo exposto, parece-me não ser de atender o requerido, pela contribuinte, uma vez que se encontram já reflectidas, nos processos aqui referidos, todas as anulações de acordo com o previsto na Lei 51/2015 de 08 de junho. – fls. 46 e ss.;
5. Em 08.03.2016 a Reclamante apresentou junto do serviço de Finanças do Porto 2 um requerimento em que refere que a informação não a esclarece e pede para ser esclarecida se foram as taxas de portagem ou as coimas que foram pagas voluntariamente e simultaneamente pede a aplicação disposto no artigo 4.º, n.º 2 alínea b) da Lei 51/2015, “de modo a que a contribuinte possa proceder à emissão das respectivas guias e pagamento subsequente” – cfr. requerimento de fls. 52-53 e de fls. 110-111 e vinheta dos ctt de fls. 110 do processo físico,
6. A Chefe do Serviço de Finanças remeteu à Reclamante resposta de 31.03.2016, que refere “assunto: processo de execução fiscal n.º 31822014010305360 e apensos”, a fls. 54 e 55, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;
7. A Reclamante apresentou uma Reclamação de acto do órgão de execução fiscal, nos processos de execução fiscal 3182201401278371 e 3182201401274023, apensos ao processos 3182201401305360, da decisão proferida em 31.03.2016, que correu termos por este Tribunal, sob o n.º 1330/16.5BEPRT, em que por decisão de 03.10.2016 foi determinada a extinção da instância, por inutilidade superveniente da lide, por estarem extintos por pagamento os processos em que foi deduzida e não respeitarem a coimas, mas sim a taxas de portagem, onde se deu como provado o seguinte: (…)
7. Nos processos de execução fiscal n.º 3182201401278371 e 3182201401274023 não se encontram em cobrança quaisquer coimas, mas somente taxas de portagem e custos administrativos(…).
8. As taxas de portagens pagas já no âmbito do processo de execução fiscal 3182201401274023, deram origem a 26 coimas, as quais estão a ser coercivamente cobradas no âmbito do processo de execução fiscal n.º 3182201501010972(…).
9. As taxas de portagens pagas já no âmbito do processo de execução fiscal 3182201401278371, deram origem a 82 coimas, as quais estão a ser coercivamente cobradas no âmbito do processo de execução fiscal n.ºs 3182201501010972 (…) 3182201501010999(…), 3182201501011057(…), 3182201501011073(…) e 3182201501011090 (…) – fls. 56 a 73;
8. Em 26.10.2016, com expressa referência aos processos executivos 3182201501010972, 3182201501010999, 3182201501011057, 3182201501011073, 3182201501011090, a Reclamante apresentou um requerimento em que pede a aplicação do disposto no artigo 4.º, n.º 2 alínea b), da Lei 51/2015, “de modo a que a contribuinte possa proceder à emissão das respectivas guias e pagamento subsequente” - cfr. requerimento de fls. 21-22 do processo físico;
9. Em 30.11.2016 foi proferido despacho de concordância com a informação que o antecedeu, de 29.11.2016, a qual termina com as menções seguintes menções (fls. 24 a 26):
12. A este respeito já foi dada resposta à requerente em 2010-03-31 (2016S00046822).
13. Relativamente aos mesmos processos foi deduzida oposição (1643/15.3BEPRT), que corre termos no TAF do Porto.
14. Parece-me ser de dar conhecimento à Requerente de que nada foi alterado relativamente à anterior notificação de 31.03.2016.
10. A decisão a que se refere o ponto antecedente foi comunicada por carta registada em 05.12.2015 – cfr. fls. 119 a 123 do processo físico;
11. Em 15.12.2016 foi apresentada a presente Reclamação da decisão referida no ponto 9, com referência expressa aos processos de execução fiscal n.º 3182201501010956 e apensos [3182201501010972, 3182201501010999, 3182201501011057, 3182201501011073, 3182201501011090 – cfr. requerimento inicial e informação de fls. 4 e registo dos ctt a fls. 7 do processo físico;
12. O OEF informou que aquando da apresentação do requerimento de fls. 44, os PEF ali identificados já se encontravam extintos, nos termos seguintes (fls. 532):
a) O PEF 3182201401305360 desde 23/09/2015, pela Lei 51/2015;
b) O PEF 3182201501010913 desde 29/09/2015 por pagamento e anulação;
c) O PEF 3182201501010891 desde 30/09/2015 pela Lei 51/2015;
13. O OEF informou que aquando da apresentação do requerimento de fls. 14, o PEF ali identificado já se encontrava suspenso – fls. 532;
14. O OEF informou que o facto de na base de dados da AT não reflectir activos os PEF aqui em discussão prende-se com a circunstância de estarem suspensos por existir oposição judicial com prestação de garantia – fls. 545.
*
Factos não provados: Com interesse para a decisão não se provou que como refere a AT a fls. 545 era possível emitir as guias para pagamento relativos aos processos em apreço, que não constavam da base de dados da AT como activos por se encontrarem suspensos.
*
A motivação do tribunal quanto aos factos provados assentou no teor das peças processuais e na apreciação da prova documental, considerando provados os factos alegados pelas partes que, não tendo sido impugnados, foram corroborados pelos documentos integrados nos autos que foram referenciados imediatamente após cada um dos factos [artigo 211, n.º 2 do CPPT e 74 e 76, n.º 1, da LGT e 362 e seguintes do Código Civil (CC)].
Atendendo aos documentos juntos pelo reclamante e a informação prestada pelo OEF a fls. 545, conclui-se que na base de dados da AT os PEF aqui em apreço não apareciam em consulta do reclamante, por estarem suspensos com garantia.
O facto não provado resulta de uma questão de raciocínio, pois não é credível que se os processos não constam da base de dados como activos por estarem suspensos, como afirma a própria AT e como demostra a Reclamante com o print de 13/11/2015, que o contribuinte encontre uma opção de emissão de guias de processos que não constam.

ADITAMENTO OFICIOSO DE FACTOS:
Ao abrigo do disposto no art.º 662º do CPC aditamos o seguinte facto extraído do ofício da AT de fls. 545 referido no facto provado n.º 14:
15. No ofício referido no n.º anterior, a AT informa que
“A circunstância de a base de dados da AT refletir que não estão activos os processos de execução fiscal que aqui se encontram em análise, prende-se com o facto de estes se encontrarem suspensos desde 08.04.2015, nos termos do art.º 169º do CPPT, atendendo à existência de oposição judicial e garantia (...)
Não obstante, sempre teria sido possível emitir as guias de pagamento relativas àqueles processos (salvaguardando inoperacionalidades temporárias do sistema informático, que ocorrem ocasionalmente, mas que se julga não corresponderem ao que aqui se questiona) (...)
A informação transmitida pela AT com referência aos pagamentos a efectuar nos processos de execução fiscal em causa nos autos de reclamação é a que consta dos autos (...) não tendo sido possível identificar qualquer outra interação relativa a este assunto que tenha sido objecto de registo”.

IV FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.
Em 2013, por transposição de pórticos e/ou barreiras reservadas à via verde sem proceder ao pagamento da taxa de portagem, foram instaurados vários processos de contraordenação e PEF´s por falta de pagamento dos valores em dívida contra “A…, SA”.
Citada nos PEF´s 0981, 0913, 5360, a que estava apensado o PEF 0956 a sociedade apresentou oposição às execuções fiscais.
Em 29/9/2015 efetuou o pagamento dos montantes exigidos nos PEF´s 0891 e 0913, o que conduziu à extinção da instância por inutilidade superveniente nos processos de oposição.
Mas não efectuou o pagamento do PEF 0956, que se encontrava suspenso ao abrigo do art. 169º do CPPT e não visível no Portal do Contribuinte.
Em 22/1/2016 requereu ao OEF o levantamento da suspensão dos Processos de Execução Fiscal (5360) “de modo a que o contribuinte possa proceder à emissão das respetivas guias e pagamento subsequente” (doc 14, fls. 45).
Por despacho de 29/1/2016 o pedido foi indeferido “por já se encontrarem “refletidas nos processos aqui referidos, todas as anulações de a cordo com o previsto na Lei n.º 51/2015, de 08 de Junho” e porque (nos outros processos) “... a contribuinte deveria ter procedido ao respetivo pagamento até 60 dias a contar da entrada em vigor da mencionada Lei”.
A Reclamante pediu aclaramento do despacho, designadamente por não ter procedido ao pagamento das coimas associadas mas sim das taxas de portagem devidas e renovou o pedido de aplicação do REDR “...de modo a que o contribuinte possa proceder à emissão das respetivas guias e pagamento subsequente” (fls. 52).
Por ofício de 31/3/2016 (fls. 54) a AT manteve a mesma interpretação e indeferiu pedido.
Foi interposta reclamação contra o despacho, que por sentença de 3/10/2016 no processo 1330/16.5BEPRT decidiu que nos processos de execução fiscal 8371 e 4023 não se encontravam em cobrança quaisquer coimas mas somente taxas de portagem e custos administrativos, tornando-se inútil decidir se o RERD é aplicável às coimas decorrentes das taxas de portagem não pagas (...) pois tais coimas estão a ser cobradas coercivamente noutros processos que não estes em análise (fls. 72).
No citado processo consta dos factos provados n.º 9 que as “taxas de portagem pagas já no âmbito do processo de execução fiscal n.º 3182201401278371 deram origem a 82 coimas as quais estão a ser coercivamente cobradas no âmbito dos processos de execução fiscal n.ºs ...(seguindo-se a identificação numérica de cinco processos de execução fiscal)”.
Em 26/10/2016 a Reclamante requereu a aplicação do RERD aos processos de execução fiscal identificados na sentença (fls. 21).
O pedido foi indeferido por despacho de 30/11/2016, concluindo-se no ponto 14 “Parece-me ser de dar conhecimento à requerente que nada foi alterado relativamente à anterior notificação de 2016-03-31” (fls. 26).
Contra este despacho foi deduzida a presente reclamação alegando, em síntese, que no período de vigência da Lei n.º 51/2015 não conseguiu visualizar estes PEF´s no seu Portal das Finanças o que a impediu de emitir guias para pagamento. Entende também que o facto de ter pago as taxas de portagem em data anterior à entrada em vigor do RERD não afasta o direito de proceder ao pagamento das coimas com a respetiva redução legal.

O Exmo. Representante da Fazenda Pública contestou alegando, em síntese, que aplicação do RERD tem como um dos pressupostos que o pagamento pelo agente da taxa de portagem e custos administrativos seja efetuado até 60 dias a contar da entrada em vigor da Lei que o aprovou.
E quanto à redução das coimas não aplicadas ou não pagas, associadas ao incumprimento do dever de pagamento de taxas de portagem, cuja regularização ocorreu antes da entrada em vigor dessa Lei, desde que sejam, pagas até 60 dias a contar da entrada em vigor da mencionada Lei.
Assim, tendo a Lei entrado em vigor no dia 1/8/2015, o período de vigência do regime excecional de regularização aí previsto vigorou desde o dia 1 de agosto de 2015 até 29 de setembro de 2015, prazo que posteriormente foi alargado até 15 de outubro de 2015
As taxas de portagem relacionados com as dívidas de coimas para cuja cobrança foram instaurados os PEF´s em causa foram pagas no dia 8 de fevereiro de 2015, portanto, fora do período de vigência da Lei n.º 51/2015 de 8 de junho pelo que as referidas coimas nunca poderiam estar abrangidas pela aplicação daquele regime excecional

Por sentença de 4 de abril de 2017 (fls. 466 e segs.) a reclamação foi julgada improcedente por não se ter provado que a Reclamante requereu a aplicação do RERD no período até 60 dias a contar da entrada em vigor da Lei n.º 51/2015, embora se tenha decidido que “tendo a Reclamante pago o valor das taxas de portagem em data anterior à da aplicação do RERD, poderia ser aplicado às coimas em execução nos PEF n.ºs (...) o regime de redução das coimas instituído pela alínea b) do n.º 2 do artigo 4º do RERD, posto que se verificasse a condição estabelecida no n.º 3 do mesmo preceito”.

A Reclamante não se conformou com o decaimento e recorreu para este TCA. Defendeu ter produzido prova suficiente de que o não pagamento das coimas em execução fiscal no prazo previsto no n.º 3 do art.º 4º da Lei n.º 51/2015, não lhe pode ser imputado, mas sim a problema informático do Portal das Finanças. Se esse problema não existisse, em condições normais a Recorrente na data de 13/11/2015 e o Serviço de Finanças conseguiriam visualizá-los. Problema informático que apenas foi solucionado em janeiro de 2016 como sustentou no art.º 15º da petição inicial.

O douto acórdão de fls. 507 e segs. ordenou a baixa dos autos para diligências complementares de prova, pois se em 13/11/2015 “a base de dados não referenciava como activos os processos de contra-ordenação e de execução fiscal em causa, isto é, nos quais respetivamente foram, aplicadas e estão a ser cobradas as dívidas de coimas cujo pagamento com redução nos termos da Lei n.º 51/2015 pretende, sendo que, por outro lado, tais dívidas não foram entrementes pagas, tal indica que o sistema apresentava falhas ou que os dados introduzidos estavam incorrectos”.

E prossegue o douto acórdão “..como se pondera na sentença, que pela data da consulta não se fica a saber se era essa a informação que a base de dados refletia até 25/10/2015, assumida como a data termo do pagamento das coimas exequendas com redução; mas então, impunha-se ao tribunal a quo averiguar se assim era ou não e que facto superveniente a essa data determinara a alteração da informação disponível na base de dados”.

Para além disso, continua o douto acórdão, “....impunha-se esclarecer se refletindo a base de dados não se encontrarem activos os processos executivos em causa, tal obstava à extração das guias para pagamento das coimas exequendas com redução pela própria AT e se tal informação foi transmitida pela AT e quando à Recorrente e em que data foi operacionalizada a base de dados em termos de permitir a extração das referidas guias para pagamento...”

Remetidos os autos à primeira instância, foi ordenada a notificação da AT para prestar os esclarecimentos mencionados no acórdão e após alegações facultativas foi proferida sentença que julgou a reclamação procedente, considerando-se não provado “...que como refere a AT a fls. 545 era possível emitir as guias para pagamento relativos aos processos em apreço, que não constavam da base de dados da AT como activos por se encontrarem suspensos”.

A sentença concluiu que a falta de pagamento não pode ser imputada à Reclamante “...na medida em que pela consulta à base de dados da AT, desde 8 de Abril de 2015 não existiam processos activos contra a reclamante e tal facto deve-se à circunstância de estarem suspensos com prestação de garantia. Trata-se de limitação do sistema informático da AT que não pode prejudicar a Reclamante que demonstrou, conforme consta do probatório, ter tentado efectuar os pagamentos.
Face à factualidade assente, julgo que o não cumprimento atempado do pagamento ou pedido de pagamento das coimas no prazo referido no n.º 3 do artigo 4.º da Lei 51/2015, não é imputável à reclamante, mas antes à AT, por limitação do seu sistema informático, pelo que se impõe determinar a procedência da reclamação, anulando-se o despacho reclamado.

Com o assim decidido não se conforma a AT que defende haver erro de julgamento de facto e direito.

Erro de facto porque cabendo à Reclamante o “ónus da prova do direito a que se arroga para beneficiar da redução ali prevista deveria ter a Reclamante proceder ao pagamento até 60 dias a contar da entrada em vigor da Lei 51/2015 ou...demonstrar ter requerido junto da AT a passagem das guias para proceder ao referido pagamento” (Conclusão O).
Mas tal prova não foi efectuada pela Reclamante, pois apenas consta dos autos um print extraído da base de dados da AT no qual, à data da consulta, 13.11.2015, o sistema informático indicava com relação à “lista de processos de Contra ordenação instaurados activos” e à “lista dos processos de execução fiscal pendentes activos” que “Não foi encontrada informação processual” (Conclusão P).
Tal print “data de Novembro de 2015, ou seja, data posterior ao prazo limite” estabelecido no referido nº 3 do art.º 4º da Lei n.º 51/2015 (Conclusão Q).
No entanto, apesar de todas estas ressalvas por parte da Meritíssima Juíza de Direito na douta sentença ora recorrida, a mesma concluiu, de forma contraditória, afirmando que a Reclamante “demonstrou, conforme consta do probatório, ter tentado efectuar os pagamentos.” (Conclusão R).
Ora, o que releva, in casu, é a existência ou não da prova de que a Reclamante requereu, no prazo legal, isto é, até 15.10.2015, a passagem das guias para proceder ao pagamento das coimas ao abrigo do artigo 4º da Lei 51/2015. (Conclusão S)
E tal prova, simplesmente, não consta dos autos (Conclusão T).

A Recorrida pugna pela improcedência do recurso. Sustenta, em síntese, que a AT não esclareceu de forma clara e exata as questões que lhe foram colocadas no despacho e que quer o contribuinte quer o Serviço de Finanças estavam informaticamente impossibilitados de emitir guias para pagamento pelo que a sentença deverá ser confirmada.

Do ponto de vista legal, está em causa a aplicação do regime excepcional de regularização de dívidas resultantes do não pagamento de taxas de portagem e coimas associadas, por utilização de infraestrutura rodoviária efectuada até ao último dia do segundo mês anterior ao da sua publicação, aprovado pela Lei n.º 51/2015 de 8/6.

O referido regime contempla a redução das coimas não aplicadas ou não pagas, associadas ao incumprimento do dever de pagamento de taxas de portagem, cuja regularização ocorreu antes da entrada em vigor dessa Lei, para 10% do mínimo da coima prevista no tipo legal ou 10% do montante da coima aplicada mas ainda não paga, no caso de coimas pagas no processo de execução fiscal, desde que sejam pagas até 60 dias a contar da entrada em vigor da Lei, ou seja, até 29 de Setembro de 2015 (artigo 4º/2,3. O prazo foi depois prorrogado até 15 de Outubro do mesmo ano).

Sabendo-se que relativamente aos processos de execução fiscal apensos ao processo principal n.º 3182201501010956, foram pagas as taxas de portagem em data anterior à da entrada em vigor do RERD, o regime de redução das coimas instituído pela alínea b) do n.º 2 do artigo 4º poderia ser aplicado às coimas associadas às infracções em causa.

Se fosse cumprido o requisito temporal.
Isto é, se o respetivo pagamento fosse efetuado até 15 de outubro, ou até à mesma data, identificasse o processo de contraordenação onde estava a ser aplicada a coima (n.º 3 do art. 4º).

A Reclamante requereu a aplicação do RERD nos mencionados processos de execução fiscal, solicitando a aplicação do disposto no mencionado artigo 4º, n.º 2 alínea b) da Lei 51/2015, com a inerente redução das coimas, de modo a poder aceder à emissão das competentes guias e subsequente pagamento.
Mas fê-lo só em 22/1/2016.

Ora, como bem nota a douta sentença recorrida, “É à Reclamante que cabe o ónus da prova do direito a que se arroga (…) para beneficiar da redução ali prevista deveria a Reclamante proceder ao pagamento, até 60 dias a contar da entrada em vigor da lei 51/2015 ou, até à mesma data, identificar os processos de contraordenação onde estava a ser aplicada a coima ou demonstrar ter requerido junto da AT a passagem das guias para proceder ao referido pagamento.”

Posto isto, vejamos se a Reclamante cumpriu satisfatoriamente o ónus a seu cargo recuperando dos factos provados os seguintes nos habilitam a reflexão posterior.

Assim sabemos que (1):
Em 26/10/2016 “A…” requereu a aplicação do disposto no art.º 4º n.º 2 alínea b) da Lei n.º 51/2015, mencionando expressamente os PEF´s 3182201501010972, 3182201501010999, 3182201501011057, 3182201501011073, 3182201501011090 (facto Provado n.º 8).
O pedido foi indeferido por despacho de 30/11/2016 com o fundamento (de caráter remissivo) de que nada se alterou em relação à decisão proferida em 31/3/016.

Deste despacho foi interposta reclamação, julgada improcedente pelo facto de a Reclamante não ter provado que em 25/10/2015 – data limite do termo de pagamento das coimas exequendas com redução – a base de dados não referenciava como activos os processos de contraordenação e execução fiscal em causa.

Interposto recurso para este TCA, a sentença foi revogada e ordenada a remessa dos autos à 1ª instância para a realização de diligências tendentes a indagar:
i) Se a consulta efetuada em 13/11/2015 – que não referenciava os processos em causa como activos – refletia idêntica informação em 25/10/2015.
ii) E caso na base de dados não se encontrassem activos os PEF´s (em 22/10/2015) era necessário averiguar se isso impedia a “extração das guias para pagamento das coimas exequendas com redução pela própria a AT”.
iii) E se a AT transmitiu tal informação à Recorrente e quando.
iv) Em que data foi operacionalizada a base de dados em termos de permitir a extracção das referidas guias para pagamento, se em Janeiro de 2016 ou outra anterior.
v) E se os documentos n.ºs 13 e 14 (fls. 44 e 45, respetivamente) deram entrada nos serviços e em que data.

As diligências foram ordenadas (fls. 524 e 543) e cumpridas (fls. 533 e 545, respetivamente). Com efeito, embora a Recorrida defenda que ficaram por responder as seguintes questões “1. Refletindo a base de dados não se encontrarem ativos os processos executivos em causa tal obstava à extração das guias para pagamento das coimas exequendas com redução pela própria AT? 2. Esta informação foi transmitida pela AT à recorrente? Se sim quando? 3. Em que data foi operacionalizada a base de dados em termos de permitir a extração das referidas guias para pagamento? Em Janeiro de 2016 ou em data anterior?”, a AT esclareceu a situação no ofício de fls. 545, várias vezes referido na sentença pela MMª juiz:
a) Os processos em análise não se encontram activos por se encontrarem suspensos desde 08.04.2015, nos termos do art.º 169º do CPPT.
b) Não obstante, sempre teria sido possível emitir as guias de pagamento relativas àqueles processos (“salvaguardando inoperacionalidades temporárias do sistema informático, que ocorrem ocasionalmente, mas que se julga não corresponderem ao que aqui se questiona”).
c) E por fim, refere que “A informação transmitida pela AT com referência aos pagamentos a efetuar nos processos de execução fiscal em causa nos autos de reclamação é a que consta dos autos (designadamente a que suporta o despacho reclamado), não tendo sido possível identificar qualquer outra interação relativa a este assunto que tenha sido objecto de registo”

Assim, resulta claro que as informações pretendidas foram satisfeitas pela AT, o que aliás se reflete nos factos provados da sentença recorrida: a diligência ordenada em v) reflete-se nos factos provados n.ºs 2 e 3 e as mencionadas i), iii) e iv) refletem-se no facto provado n.º 14, sabendo-se no entanto que em matéria de informação a AT não teve “...qualquer outra interação relativa a este assunto”.

A diligência mencionada em ii) embora respondida afirmativamente pela AT (no ofício de fls. 545), recebeu da parte da MMª juiz o julgamento de não provado por inferência lógica, “...pois não é credível que se os processos não constam da base de dados como activos por estarem suspensos, como afirma a própria AT e como demostra a Reclamante com o print de 13/11/2015, que o contribuinte encontre uma opção de emissão de guias de processos que não constam.”

Contudo, a questão colocada no acórdão deste TCA não era exatamente saber se o contribuinte dispunha de uma opção de emissão de guias de processos que não constam na base de dados, mas sim saber se isso (ou seja, o facto de os PEF´s não estarem ativos na base de dados) impedia a “extração das guias para pagamento das coimas exequendas com redução pela própria a AT” (destaque nosso).

Assim, ao considerar que o contribuinte não dispõe de “... uma opção de emissão de guias de processos que não constam” a MMª juiz enfrentou a questão por um ângulo que não a resolve.
Embora pareça certo que o contribuinte não podia, ele próprio, extrair guias para pagamento – porque os processos estavam suspensos ao abrigo do art. 169º do CPPT – o conhecimento desse facto não resolve o problema, nem esgota as questões colocadas no despacho da MMª juiz de fls. 543 e a resposta da AT no ofício de fls. 545.

Com efeito, a Reclamante alegou nos artigos 16º e 17º da douta petição inicial que “Apesar de ter tentado obter as guias para pagamento junto do Serviço de Finanças do Porto-2 a Reclamante foi informada de que também não conseguiam aceder ao processo, garantindo que iam resolver o problema. O problema apenas foi solucionado em Janeiro de 2016, tendo sido de imediato requerido pela Reclamante a emissão das guias para pagamento e aplicação do RERD” (sublinhado nosso).

Tendo em conta o alegado pela Reclamante, o ac. do TCA pretendeu esclarecer se se confirmava que a AT também não conseguia a aceder ao sistema nem extrair as guias para o respetivo pagamento.

Essa foi também a pergunta colocada pela MMª juiz no despacho de fls. 543 (2). E a resposta da AT foi que “sempre teria sido possível emitir as guias de pagamento relativas àqueles processos”.

A MMª juiz interpretou esta resposta como se dissesse que era possível ao contribuinte extrair guias para pagamento de processos que não estavam activos, o que a levou a considerar não provado tal facto por “...uma questão de raciocínio pois não é credível que se os processos não constam da base de dados como activos por estarem suspensos, como afirma a própria AT e como demostra a Reclamante com o print de 13/11/2015, que o contribuinte encontre uma opção de emissão de guias de processos que não constam.”.

Mas como a pergunta não era saber se o contribuinte poderia extrair guias para pagamento de processos não activos no sistema, mas sim a se a AT o podia fazer, a reflexão subsequente está naturalmente inquinada.

Neste contexto, o raciocínio da MMª juiz acima transcrito não só não resolve a questão como se constrói a partir de uma conclusão não contida nas premissas (perguntas e informação da AT) o que acabou por contaminar todo o ulterior discurso fundamentador e respetiva decisão.

Ou seja, bastando-se com o facto de os processos não estarem activos no “sistema” e por isso o contribuinte não poder extrair as guias para pagamento, concluiu a MMª juiz que a falta de pagamento tempestivo com redução não é imputável à Reclamante nem a pode prejudicar, pelo que se impõe determinar a procedência da reclamação.

Mas o que é certo é que não conseguindo a Reclamante aceder aos processos em causa, poderia ter requerido à AT a emissão das guias para pagamento das coimas e aplicação do RERD, no prazo previsto no art. 4º/3 da Lei n.º 51/2015.

Como aliás, de certo modo (3), acabou por fazer em 22/1/2016 através do requerimento endereçado ao Exmo. Chefe do Serviço de Finanças de Porto-2, onde – entre o mais- requer se “...proceda à aplicação do RERD no processo supra identificado nos termos do n.º 2, al. b), do artigo 4º do RERD Portagens, de modo a que a contribuinte possa proceder à emissão das respetivas guias, e pagamento subsequente”.

Ora, se até à data limite de pagamento das coimas exequendas com redução (25/10/2015) a Reclamante não “conseguiu” aceder aos respetivos processos nem à opção de emissão de guias de pagamento, deveria ter requerido à AT a respetiva emissão.

Se o tivesse feito, não veria a sua pretensão recusada por não ter procedido ao respetivo pagamento até 60 dias a contar da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 51/2015.

E teria provado que tempestivamente requereu a aplicação do referido diploma, como era seu ónus (art. 74º LGT e 342 do Código Civil).

Mas não provou.
Sendo certo que o facto de os PEF´s se encontrarem suspensos desde o dia 8/4/2015 e por isso não estarem ativos na base de dados, ­ não impedia a Reclamante de formular requerimento à AT para que fossem emitidas as respetivas guias de pagamento à semelhança do que fez em 22/01/2016 (e também em 6/1/2016, ao pedir o levantamento da suspensão dos processos de execução fiscal) (4).

Por isso, não podemos acompanhar a sentença na conclusão de que
“... a falta de pagamento não pode ser imputada à Reclamante na medida em que pela consulta à base de dados da AT, desde 8 de Abril de 2015 não existiam processos activos contra a reclamante e tal facto deve-se à circunstância de estarem suspensos com prestação de garantia. Trata-se de limitação do sistema informático da AT que não pode prejudicar a Reclamante que demonstrou, conforme consta do probatório, ter tentado efectuar os pagamentos.
Face à factualidade assente, julgo que o não cumprimento atempado do pagamento ou pedido de pagamento das coimas no prazo referido no n.º 3 do artigo 4.º da Lei 51/2015, não é imputável à reclamante, mas antes à AT, por limitação do seu sistema informático, pelo que se impõe determinar a procedência da reclamação, anulando-se o despacho reclamado.

Pelo contrário, sabendo-se que a Reclamante não solicitou ao órgão de execução fiscal a emissão de guias para pagamento das coimas com redução ao abrigo do RERD, no período de vigência deste, não pode reclamar a aplicação deste regime por exercício extemporâneo do seu direito.

Assim procedendo as conclusões do recurso, impõe-se a revogação da sentença recorrida e a improcedência da reclamação.


V DECISÃO.

Termos em que acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso Tributário deste TCAN em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar improcedente a reclamação.
Custas pela Reclamante.
Porto, 12 de abril de 2018.
Ass. Mário Rebelo
Ass. Cristina da Nova
Ass. Bárbara Tavares Teles



(1) Recuperamos apenas a factualidade relevante para a decisão do recurso, uma vez que o “historial” do processo foi acima sumariado e julgamos desnecessário repetir.
(2) Questão n.º 1 do despacho de fls. 543: “Reflectindo a base de dados não se encontrarem activos os processos executivos em causa tal obstava à extracção das guias para pagamento das coimas exequendas com redução pela própria AT?”
(3) Dizemos de certo modo porque, de facto, não requereu a emissão de guias pela AT, mas não deixou de requerer o seu pagamento, como vemos.
(4) A fls. 21 da douta sentença refere a MMª juiz que o requerimento a solicitar o levantamento da suspensão dos processos foi efetuado em 06/01/2015. Trata-se, no entanto, de mero lapso, porque como resulta do facto provado n.º 2 tal requerimento foi formulado em 06/01/2016.