Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00273/09.3BEAVR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:01/31/2020
Tribunal:TAF de Aveiro
Relator:Frederico Macedo Branco
Descritores:CONCURSO PARA PROFESSORES; ENSINO DE ESPANHOL;
Sumário:1 – Estão previstas duas vias distintas para a aquisição de uma qualificação profissional para a docência:
Por um lado, os cursos de licenciatura integrando todas as componentes de formação (Licenciaturas em Ensino) e, por outro lado, os complementos de formação pedagógica (Cursos de Formação Pedagógica) na sequência de uma licenciatura, sendo que estes cursos também podem ser realizados por via da profissionalização em serviço, nos termos do Decreto-Lei n.º 287/88, de 19 de agosto (cfr. n.º 2 do art. 65.º da Lei de Bases do Sistema Educativo, com a redação dada pela Lei n.º 49/2005, de 30/08).

2 - A Formação Inicial Docente, por via Universitária, poderá assim revestir as seguintes modalidades:
a) Formação inicial integrada - Licenciaturas em Ensino, com a duração de cinco anos (sendo o último de estágio), correspondentes a uma disciplina ou grupo de disciplinas de docência;
b) Formação inicial sequencial - Licenciaturas em Ensino ou em Ramo Educacional de áreas científicas, com a duração total de cinco anos (sendo o último ano de estágio) e como opção possível após tronco comum da referida área;
c) - Curso de formação pedagógica - após licenciatura, incorporando necessariamente a realização de estágio.

3 - As habilitações profissionais para o grupo de recrutamento Espanhol (código de recrutamento 350) são as que conferem qualificação profissional para o grupo de docência (Espanhol) do 3.º ciclo do ensino básico e do ensino secundário.
As questionadas novas habilitações para a docência do Espanhol apenas são conferidas a quem já dispunha de qualificação profissional para os grupos de recrutamento numa língua estrangeira e ou Português (códigos de recrutamento 200, 210, 220, 300, 310, 320, 330 e 340).*
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:Ministério da Educação
Recorrido 1:M.H.G.C.F. e Outras
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial
Decisão:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I Relatório
M.H.G.C.F. e Outras, intentaram Ação Administrativa Especial contra o Ministério da Educação, na qual peticionaram:
“a) a anulação do (...) despacho do Diretor-Geral dos Recursos Humanos da Educação de 9 de Março de 2009, que declarou aberto o concurso interno e externo destinados a educadores de infância e de professores dos ensino básico e secundário para o ano escolar de 2009-2010, publicitado através do Aviso de Abertura n.º 5432-A/2009 de 12 de Março, publicado no n.º 50 da II Série, Parte C, do Diário da República, de 12 de Março de 2009, na parte referente ao ponto 3.4. do Capítulo IV);
b) a condenação do Réu à adoção dos atos e operações necessários para reconstituir a situação que existiria se o ato impugnado não tivesse sido praticado, explicitado, se for o caso, as vinculações a observar pela administração educativa, bem como nas custas, em todos os demais encargos e em procuradoria.”

Em 29 de maio de 2015 foi proferida a seguinte decisão no TAF de Aveiro:
“Nos termos e com os fundamentos acima exposto acordam os juízes deste Tribunal em julgar a presente ação parcialmente procedente, e em consequência:
- anular o (...) despacho do Diretor-Geral dos Recursos Humanos da Educação de 9 de Março de 2009, que declarou aberto os concursos interno e externo destinados a educadores de infância e de professores dos ensino básico e secundário para o ano escolar de 2009-2010, publicitado através do Aviso de Abertura n.º 5432-A2009 de 12 de Março, publicado no n.º 50 da II Série, Parte C, do Diário da República, de 12 de Março de 2009, na parte referente ao ponto 3.4. do Capítulo IV);
- condenar o Réu à reconstituição da situação que existiria se os atos impugnados não tivessem sido praticados.”
Em 13 de julho de 2015 veio o Ministério da Educação apresentar Recurso relativamente à decisão proferida, aí tendo concluído:
“1. A decisão do acórdão do Tribunal a quo surge afetada pelos vícios da ambiguidade e da ininteligibilidade, pois considerando a impugnação do despacho de abertura do concurso e a condenação à reconstituição da situação que existiria sem a prática dos atos impugnados, não se compreende se esta decisão deve repercutir-se na esfera de todos os opositores ao concurso ou apenas na esfera das Autoras.
2. A decisão não é, pois, clara e presta-se a interpretações diferentes na sua execução, o que consubstancia uma situação de ininteligibilidade da decisão, vício gerador de nulidade da sentença, nos termos da alínea c) do nº 1 do art.º 615º do CPC.
3. Mas mesmo que assim não se entendesse e, procurando introduzir alguma clareza na decisão, sempre se diria que existiria uma contradição entre a fundamentação e a decisão.
4. Com efeito, o Tribunal a quo reconhece na fundamentação da sua decisão que não é possível condenar o Réu a praticar o ato impugnado expurgado da invalidade de que o mesmo padece, pois foi aberto para o ano escolar de 2009/2010, o qual já decorreu.
5. Porém, ao anular o ato de abertura do concurso…
6. E ao condenar o Réu à reconstituição da situação que existiria se os atos impugnados não tivessem sido praticados,
7. Não restringindo essa reconstituição ao caso concreto das Autoras, antes dirigindo-se para o universo geral e abstrato dos docentes em concurso,
8. Tal resultaria em sede de execução da sentença, na reconstituição dos vários atos e procedimentos do próprio concurso,
9. Que se reconhecera não ser possível de constituir objeto de condenação do Réu.
10. Motivo pelo qual somos a concluir pela existência de uma contradição entre os fundamentos e a decisão, prevista na alínea c) do nº 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil, causa de nulidade da sentença.
Termos pelos quais e, com o douto suprimento de V. Exas. deve ser concedido provimento ao presente recurso e revogada a decisão recorrida com todas as legais consequências e assim se fará a costumada JUSTIÇA!”

O Recurso do Ministério da Educação veio a ser admitido por Despacho de 17 de setembro de 2015.

A Autora M.H.G.F. veio apresentar as suas Contra-alegações de Recurso em 12 de novembro de 2015, aí tendo concluído:
“1. No recurso apresentado o Recorrente Ministério da Educação não coloca em causa a ilegalidade do despacho impugnado do Diretor-Geral dos Recursos Humanos da Educação de 9 de Março de 2009, que declarou aberto os concursos interno e externo destinados a educadores de infância e de professores dos ensino básico e secundário para o ano escolar de 2009/2010, publicitado através do Aviso de Abertura n.º 5432-A/2009 de 12 de Março, publicado no n° 50 II da Série, Parte C, do Diário da República, de 12 de Março de 2009, na parte referente ao ponto 3.4 do Capítulo IV), nem a consequente anulação decidida pela Tribunal a quo.
2. O Réu/Recorrente limita-se a invocar alegadas nulidades da Sentença nos termos da alínea c) do nº 1 do 615° do CPC por alegada "existência de ambiguidade ou obscuridade" no acórdão e alegada "existência de uma contradição entre a fundamentação e a Decisão do Acórdão", assentando tal argumentação num manifesto e ostensivo lapso constante do Acórdão recorrido que o Recorrente não pode desconhecer mas do qual se pretende fazer valer.
3. Note-se que o Recorrente podia ter dúvidas quanto ao alcance da execução do acórdão, porém não podia, nem pode, ter dúvidas quanto ao âmbito do aviso de concurso em causa nos presentes autos, sendo a todos os títulos lamentável que o Recorrente se procure fazer valer do que é um manifesto lapso do Tribunal a quo.
4. Resulta do Aviso de Abertura n.º 5432-A/2009 (facto provado E)) que os concursos visavam "... O preenchimento de vagas existentes nos quadros de agrupamento de escolas e nos quadros de escolas não agrupadas do Ministério da Educação..." e não só "... ao suprimento das necessidades transitórias de pessoal docente, estruturadas em horários, completos ou incompletos" no ano 2009/2010.
5. É manifesto e evidente da mera leitura do aviso de abertura onde está publicitado o ato em causa (e das próprias peças processuais apresentadas pelas partes e inclusive do despacho saneador proferido nestes autos) que não estava em causa a mera abertura de um concurso para o ano escolar 2009/2010 já que se visava também o preenchimento de vagas do quadro,
6. Daí que, como o Recorrente não pode desconhecer, trata-se de um erro manifesto a afirmação constante na página 8 do Acórdão "... já não é passivei condenar o Réu a praticar o ato impugnado expurgado da invalidade de que o mesmo padece, pois foi aberto para o ano escolar de 2009/2010, o qual já decorreu...".
7. As invocadas nulidades, em si, - quer a invocação nas conclusões 1 e 2 do recurso de uma alegada "ambiguidade e da ininteligibilidade", quer a invocação nas conclusões 3 a 10 de uma alegada "contradição entre a fundamentação e a decisão" - as mesmas não têm qualquer subsistência, tratando-se quando muito de dúvidas quanto aos termos em que deve executar a sentença de anulação.
8. O Recorrente pretende com a invocação das mesmas utilizar o referido erro manifesto constante do Acórdão para se furtar ao cumprimento das obrigações que para si resultam da sentença de anulação do ato em causa por força do artigo 173° do CPTA.
9. As alegadas "ambiguidade" e "contradição" centram-se na afirmação constante do Acórdão que, como se referiu supra, é um manifesto lapso do juiz (que o Recorrente não podia desconhecer) pelo que não estamos perante uma nulidade da sentença mas sim perante a necessidade de reforma da sentença ao abrigo do previsto no artigo 616º nº 2 aI. b) do CPC.
Pelo exposto e nos demais de direito, deverão ser consideradas improcedentes as nulidades invocadas e, consequentemente, o recurso improcedente, assim se fazendo a acostumada JUSTIÇA!”

A Autora M.H.G.F. veio igualmente apresentar em 12 de novembro de 2015 Recurso Subordinado, no qual concluiu:
“1. O tribunal a quo procedeu corretamente ao considerar a ilegalidade do despacho impugnado do Diretor-geral dos Recursos Humanos da Educação de 9 de Março de 2009, que declarou aberto os concursos interno e externo destinados a educadores de infância e de professores dos ensinos básico e secundário para o ano escolar de 2009/2010, publicitado através do Aviso de Abertura n.º 5432-A/2009 de 12 de Março, publicado no nº 50 II da Série, Parte C, do Diário da República, de 12 de Março de 2009, na parte referente ao ponto 3.4 do Capítulo IV), nem a consequente anulação decidida pela Tribunal agua.
2. Sendo certo que nos termos do artigo 173º do CPTA, o Réu Ministério da Educação ficou constituído no dever de reconstituir a situação que existiria se o ato anulado não tivesse sido praticado.
3. Porém, com fundamento em lapso manifesto, afirma-se no acórdão recorrido que "Sendo certo que já não é possível condenar o Réu a praticar o ato impugnado expurgado da invalidade de que o mesmo padece, pois foi aberto para o ano escolar de 2009/2010, o qual já decorreu, ..." e, com base em tal proposição, apenas se julgou a ".... ação parcialmente procedente ... ".
4. Note-se que o alegado pedido constante da PI de "b) condenar o Réu à adoção dos atos e operações necessários para reconstituir a situação que existiria se o ato impugnado não tivesse sido praticado, explicitando, se for o caso, as vinculações a observar pela administração educativa", mais não é do que uma mera concretização (cfr. artigo 173º do CPTA) da consequência necessariamente decorrente do prévio pedido de anulação do ato.
5. Interpõe-se o presente recurso subordinado, por cautela e dever de patrocínio, face à posição assumida pelo Recorrente Ministério da Educação no seu Recurso, na qual se pretende fazer valer de manifesto erro do Juiz para procurar delimitar o direito da recorrente a ver reconstituída a sua situação se o ato anulado não tivesse sido praticado.
6. Isto dito, resulta do Aviso de Abertura n.º 5432-A/2009 (facto provado E)) que os concursos visavam "... O preenchimento de vagas existentes nos quadros de agrupamento de escolas e nos quadros de escolas não agrupadas do Ministério da Educação..." e não só "... ao suprimento das necessidades transitórias de pessoal docente, estruturadas em horários, completos ou incompletos" no ano 2009/2010.
7. É manifesto e evidente da mera leitura do aviso de abertura onde está publicitado o ato em causa (e das próprias peças processuais apresentadas pelas partes e inclusive do despacho saneador proferido nestes autos) que não estava em causa a mera abertura de um concurso para o ano escolar 2009/2010 já que se visava também o preenchimento de vagas do quadro.
8. Dai ser um lapso manifesto a afirmação constante na pagina 8 do Acórdão "... já não é possível condenar o Réu a praticar o ato impugnado expurgado da invalidade de que o mesmo padece, pois foi aberto para o ano escolar de 2009/2010. o qual já decorreu, ...", com fundamento na qual se considerou a ação apenas "parcialmente procedente".
9. Face ao exposto, é manifesto que tal como é imposto pelo artigo 616º nº 2 aI. b) do CPC, deve o Acórdão recorrido ser reformado e considerar-se a ação totalmente procedente e não apenas parcialmente como, com fundamento no lapso manifesto supra, se afirmou na parte decisória da sentença.
Nestes termos e melhores de Direito, deve ser reformado o acórdão recorrido, , assim se fazendo a acostumada Justiça!”

Por Despacho de 5 de fevereiro de 2016 é admitido o Recurso subordinado apresentado pela identificada Autora.

Em 18 de março de 2016, veio o Ministério da Educação a apresentar as suas Contra-alegações relativamente ao Recurso Subordinado apresentado pela Autora, aí tendo concluído:
“I. As conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objeto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”.
II. O Acórdão recorrido vem dizer que o regime das habilitações profissionais para a docência se encontrava consagrado no Decreto-Lei n.º 27/2006, de 10 de fevereiro, emitido pelo Governo, sob a forma de Decreto-Lei, nos termos do n.º 2 do art. 34.º da Lei de Bases do Sistema Educativo, com a redação dada pela Lei n.º 49/2005, de 30/08, pelo que, o artigo 2.º da Portaria n.º 303/2009, de 24 de Março, é orgânica, formal e materialmente ilegal.
III. Daí a primeira conclusão das presentes alegações de recurso.
IV. A questão de mérito apreciada pelo Acórdão recorrido, que a Recorrente pretende ver sancionada pelo Tribunal ad quem, é, pois, e tão só, a complexa matéria das habilitações para a docência.
V. Quanto a esta, o Acórdão recorrido interpretou e aplicou de forma incorreta a norma vertida no artigo 2.º da Portaria n.º 303/2009, assinada em 11 de março, mas que só viria a ser publicada em 24 de Março, retificada pela Declaração de Retificação n.º 25/2009, de 13 de Abril, o disposto no artigo 7.º, alínea v), do Decreto-Lei n.º 27/2006, de 10 de Fevereiro e o n.º 2 do artigo 34.º da Lei de Bases do Sistema Educativo, com a redação dada pela Lei n.º 49/2005, de 30/08
VI. O ponto 3.4 do Capítulo IV do Aviso n.º 5432-A/2009 publicado no Diário da República, 2.ª série, N.º 50, de 12 de Março, transpõe para o Aviso de abertura dos concursos a norma vertida no artigo 2.º da Portaria n.º 303/2009, de 24 de Março, retificada pela Declaração de Retificação n.º 25/2009, de 13 de Abril.
VII. À data do termo do prazo fixado para a reunião do requisito habilitacional exigido pelo ponto 3.4 do Capítulo IV do Aviso n.º 5432-A/2009, já estava em vigor o artigo 2.º da Portaria n.º 303/2009, assinada em 11 de março, mas que só viria a ser publicada em 24 de Março, retificada pela Declaração de Retificação n.º 25/2009, de 13 de Abril.
VIII. Pois que, os candidatos devem reunir os requisitos até ao termo do prazo fixado para apresentação das candidaturas (cfr. no n.º 3 do seu art. 25..º pela Portaria 83-A/2009, de 22 de janeiro).
IX. Os dois caminhos previstos na Lei de Bases do Sistema Educativo para a aquisição de uma qualificação profissional docente são os cursos de licenciatura integrando todas as componentes de formação (Licenciaturas em Ensino) e complementos de formação pedagógica (Cursos de Formação Pedagógica) na sequência de uma licenciatura.
X. No entanto, os cursos de formação pedagógica, também poderiam ser realizados através da profissionalização em serviço, globalmente equivalentes à componente pedagógica dos cursos integrados de formação profissional para o mesmo nível de ensino, que obrigatoriamente deviam integrar a realização de um estágio, nos termos do Decreto-Lei n.º 287/88, de 19 de agosto (cfr. ainda n.º 2 do art. 65.º da Lei de Bases do Sistema Educativo, com a redação dada pela Lei n.º 49/2005, de 30/08).
XI. O diploma que regulamentava a formação inicial de professores, para que remetia o artigo 34.º da Lei de Bases do Sistema Educativo, com a redação dada pela Lei n.º 49/2005, de 30/08, e o art. 11.º do Estatuto da Carreira Docente, era o Decreto-Lei n.º 344/89, de 11 de outubro, que se manteve em vigor até à publicação do Decreto-Lei n.º 43/2007, de 22 de fevereiro.
XII. O Decreto-Lei n.º 194/99, de 7 de junho, regulou o sistema de acreditação dos cursos de formação inicial de educadores de infância e de professores dos ensinos básico e secundário.
XIII. Nos termos do art. 4.º do Decreto-Lei n.º 194/99, de 7 de junho, o diploma de um curso de formação inicial só pode certificar qualificação profissional para a docência se o curso tiver sido objeto de acreditação, de acordo com aquele diploma.
XIV. No entanto, aos titulares de cursos de licenciatura que assegurem a formação científica na área de docência respetiva, mas que não a complementaram com formação pedagógica adequada (estágio pedagógico) era-lhes reconhecida, para efeito de concursos, a habilitação própria para a docência.
XV. Com efeito, nos termos do n.º 3 do art. 2.º do Decreto-Lei n.º 287/88, de 19 de agosto, eram chamados à profissionalização em serviço os docentes que ingressavam nos quadros de nomeação provisória, portadores de habilitação própria
XVI. Era este o estado das coisas à data da publicação do Decreto-Lei n.º 27/2006, de 10 de fevereiro.
XVII. Estado das coisas, esse, que em nada foi alterado por aquele diploma legislativo.
XVIII. Como o objetivo pretendido pelo Decreto-Lei n.º 27/2006, de 10 de fevereiro, é de criar e definir os grupos de recrutamento para efeitos de seleção e recrutamento do pessoal docente da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário, limita-se a fazer a equiparação com os grupos de docência anteriormente existentes, para efeitos de habilitações.
XIX. Daí o seu art. 10.º dispor que «Todas as referências feitas aos grupos de docência pela legislação em vigor consideram-se reportadas aos grupos de recrutamento a que se refere o presente decreto-lei.»
XX. Não estabelece habilitações para o novo grupo de recrutamento porque «As habilitações profissionais para o grupo de recrutamento Espanhol (código de recrutamento 350) são as que conferem qualificação profissional para o grupo de docência (Espanhol) do 3.º ciclo do ensino básico e do ensino secundário»,
XXI. Se assim é, não se descortina como é que a Portaria n.º 303/2009 poderia violar a alínea v do art. 7.º do Decreto-Lei n.º 27/2006, de 10 de Fevereiro.
XXII. Por outro lado, a Portaria n.º 303/2009, de 24 de março, não viola o regime das habilitações profissionais para a docência, nomeadamente o art. 34.º da Lei de Bases do Sistema Educativo, o Decreto-Lei n.º 344/89 ou o Decreto-Lei n.º 194/99, porque, ao contrário daquele regime, não vem conferir habilitação profissional ab initio, isto é a docentes que da mesma ainda não eram detentores.
XXIII. Com efeito, nos seus termos, as novas habilitações para a docência do Espanhol apenas são conferidas a quem já dispunha de qualificação profissional para os grupos de recrutamento numa língua estrangeira e ou Português (códigos de recrutamento 200, 210, 220, 300, 310, 320, 330 e 340).
XXIV. Assim, todos os docentes abrangidos pela Portaria n.º 303/2009, de 24 de março, eram detentores de uma formação inicial, com uma componente de formação científicas no domínio das línguas, ajustada à futura docência, uma componente de ciências de educação e uma componente de prática pedagógica orientada pela instituição formadora, com a colaboração do estabelecimento de ensino em que essa prática é realizada.
XXV. Pelo que, o objetivo da Portaria era permitir a transição destes docentes, com esta formação inicial, daqueles grupos de recrutamento, para o grupo de recrutamento do Espanhol, em obediência ao disposto no art. 72.º do Estatuto da Carreira Docente o que só era possível mediante o estabelecimento de habilitações complementares que respeitassem a necessária aptidão pedagógica para a docência do Espanhol.
XXVI. O Decreto-Lei n.º 43/2007, de 22 de Fevereiro, aprova um novo regime jurídico da habilitação profissional para a docência na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário.
XXVII. No entanto, a Portaria n.º 303/2009, de 24 de março, igualmente não viola o Decreto-Lei n.º 43/2007, de 22 de Fevereiro.
XXVIII. Assim é porque o mesmo não se encontrava ainda em aplicação, aguardando a necessária regulamentação.
XXIX. Mesmo que assim não se entendesse, a verdade é que tendo o Mestrado em Ensino de Inglês e de [língua estrangeira] nos Ensinos Básicos e Secundário, constante das referência 7 e 8 do Anexo ao Decreto-Lei n.º 43/2007, sido criado apenas após a entrada em vigor daquele diploma, em 2009, ainda não havia alunos que tivessem concluído o mesmo e que se pudessem apresentar como portadores de qualificação profissional, nos termos daquele diploma legal.
XXX. Não obstante, e, em face das exigências do sistema educativo, havia falta de docentes com qualificação profissional no grupo de recrutamento do Espanhol, de modo a satisfazer as necessidades educativas dos alunos, assim como havia noutros grupos de recrutamento da área de línguas, um número de docentes excessivo para aquele mesmo efeito.
XXXI. Como resulta do preâmbulo da Portaria n.º 303/2009, tinha-se assistido a uma crescente opção pela aprendizagem da língua espanhola por parte dos alunos dos ensinos básicos e secundários.
XXXII. Este aumento de alunos que se matricularam na disciplina do Espanhol nos ensinos básico e secundário resultou de novas regras orientadores da organização e da gestão curricular dos ensinos básico e secundário, consagradas com os Decretos-Lei n.ºs n.º 6/2001, de 18 de Agosto e 74/2004, de 26 de Março.
XXXIII. O n.º 1 do art. 19.º do Decreto-Lei n.º 6/2001, ao conferir norma habilitante para a reorganização dos grupos de docência, por forma a corresponder aos princípios orientadores da organização e da gestão do currículo constantes daquele diploma, deve ser interpretado, não apenas no sentido da definição dos grupos, como também das respetivas qualificações para a docência nos ensinos básico e secundário, em conformidade com as necessidades decorrentes dos seus novos planos curriculares.
XXXIV. Aliás, este sentido já era estabelecido n.º 1 do art. 13.º do Decreto-Lei 286/89, de 29 de Agosto, cuja epígrafe tem o mesmo conteúdo do art. 19.º do Decreto-Lei n.º 6/2001 e do art. 16.º do Decreto-Lei n.º 74/2004, de 26 de Março: Reestruturação dos grupos de docência.
XXXV. O Decreto-Lei n.º 27/2006, de 10 de fevereiro, não revogou, nem o Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18 de Agosto, nem o Decreto-Lei n.º 74/2004, de 26 de Março.
XXXVI. O Acórdão recorrido confunde os perfis de competência e de formação de educadores e professores para ingresso na carreira docente, que nos termos do n.º 2 do art. 4.º da Lei de Bases do Sistema Educativo, são definidos por Decreto-Lei, com as habilitações profissionais para a docência exigidas pelo art. 22.º do Estatuto da Carreira Docente.
XXXVII. Esse «perfil geral de desempenho profissional do educador de infância e dos professores dos ensinos básico e secundário» veio a ser estabelecido pelo Decreto-Lei n.º 240/2001, de 30 de agosto.
XXXVIII. Quanto às restantes alegações da Recorrente, as mesmas limitam-se a reproduzir o já alegado pela mesma em sede de contra-alegações de recurso principal.
XXXIX. A Recorrente não alega que tenha ocorrido erro na determinação da norma aplicável ou na qualificação jurídica dos factos, a decisão tenha sido proferida com violação de lei expressa ou que dos autos constem documentos ou outro meio de prova que, só por si e inequivocamente, implique decisão em sentido diverso.
XL. O que existe é um verdadeiro erro de julgamento por os fundamentos estarem em oposição com a decisão.
Nestes termos e nos mais de Direito, que muito doutamente serão supridos por VV. Exas., deverá ser proferida decisão que conclua pela admissão e procedência das presentes contra-alegações, como é de JUSTIÇA.”

O TAF de Aveiro veio, por Despacho de 30 de abril de 2016 a reconhecer que a decisão anteriormente proferida careceria de nulidade, reformulando a mesma, aí se decidindo:
“Nos termos e com os fundamentos acima expostos, acordam os juízes deste Tribunal a julgar a presente ação procedente e em consequência:
- anular o ato impugnado, consubstanciado no despacho do Diretor-Geral dos Recursos Humanos da Educação de 9 de março de 2009, que declarou aberto os concursos interno e externo destinados a educadores de infância e de professores dos ensino básico e secundário para o ano escolar de 2009-2010, publicitado através do Aviso de Abertura n.º 5432-A/2009 de 12 de Março, publicado no n.º 50 da II Série, Parte C, do Diário da República, de 12 de Março de 2009, na parte referente ao ponto 3.4. do Capítulo IV), condenando o Réu à adoção dos atos e operações necessários para reconstituir a situação que existiria se o ato anulado não tivesse sido praticado.”

O Ministério da Educação veio novamente a apresentar Contra-alegações de Recurso em 13 de maio de 2016, aí concluindo:
“O Acórdão recorrido interpretou e aplicou de forma incorreta a norma vertida no artigo 2.° da Portaria n.º 303/2009, assinada em 11 de março, mas que só viria a ser publicada em 24 de Março, retificada pela Declaração de Retificação n.º 25/2009, de 13 de Abril, o disposto no artigo 7.°, Alínea v), do Decreto-Lei n.º 27/2006, de 10 de Fevereiro e o n.º 2 do artigo 34.° da Lei de Bases do Sistema Educativo, com a redação dada pela Lei n." 49/2005, de 30/08
II. O ponto 3.4 do Capítulo IV do Aviso n.º 5432-A/2009 publicado no Diário da República, 2ª' série, N.º 50, de 12 de Março, transpõe para o Aviso de abertura dos concursos a norma vertida no artigo 2.° da Portaria n. ° 30312009, de 24 de Março, retificada pela Declaração de Retificação n.º 25/2009, de 13 de Abril.
III. À data do termo do prazo fixado para a reunião do requisito habilitacional exigido pelo ponto 3.4 do Capítulo IV do Aviso n." 5432-A/2009, já estava em vigor o artigo 2.° da Portaria n." 303/2009, assinada em 11 de março, mas que só viria a ser publicada em 24 de Março, retificada pela Declaração de Retificação n.º 25/2009, de 13 de Abri.
IV. Pois que, os candidatos devem reunir os requisitos até ao termo do prazo fixado para Apresentação das candidaturas (cfr. no n.º 3 do seu art. 25.° pela Portaria 83-A/2009, de 22 de janeiro).
Os dois caminhos previstos na lei de Bases do Sistema Educativo para a aquisição de uma qualificação profissional docente são os cursos de licenciatura integrando todas as componentes de formação (licenciaturas em Ensino) e complementos de formação pedagógica (Cursos de Formação Pedagógica) na sequência de uma licenciatura.
VI. No entanto, os cursos de formação pedagógica, também poderiam ser realizados através da profissionalização em serviço, globalmente equivalentes à componente pedagógica dos cursos integrados de formação profissional para o mesmo nível de ensino, que obrigatoriamente deviam integrar a realização de um estágio, nos termos do Decreto-Lei n.º 287/88, de 19 de agosto (cfr. ainda n.º 2 do art. 65.° da lei de Bases do Sistema Educativo, com a redação dada pela lei n." 49/2005, de 30/08).
VII. O diploma que regulamentava a formação inicial de professores, para que remetia o artigo 34.° da lei de Bases do Sistema Educativo, com a redação dada pela lei n.º 49/2005, de 30/08, e o art. 11.° do Estatuto da Carreira Docente, era o Decreto-lei n.º 344/89, de 11 de outubro, que se manteve em vigor até à publicação do Decreto-Lei n.º 43/2007, de 22 de fevereiro.
VIII. O Decreto-lei n.º 194/99, de 7 de junho, regulou o sistema de acreditação dos cursos de formação inicial de educadores de infância e de professores dos ensinos básico e secundário.
IX. Nos termos do art. 4.° do Decreto-Lei n.º 194/99, de 7 de junho, o diploma de um curso de formação inicial só pode certificar qualificação profissional para a docência se o curso tiver sido objeto de acreditação, de acordo com aquele diploma.
X. No entanto, aos titulares de cursos de licenciatura que assegurem a formação científica na área de docência respetiva, mas que não a complementaram com formação pedagógica adequada (estágio pedagógico) era-lhes reconhecida, para efeito de concursos, a habilitação própria para a docência.
XI. Com efeito, nos termos do n.º 3 do art. 2.º do Decreto- Lei n.º 287/88, de 19 de agosto, eram chamados à profissionalização em serviço os docentes que ingressavam nos quadros de nomeação provisória, portadores de habilitação própria
XII. Era este o estado das coisas à data da publicação do Decreto-Lei n.º 27/2006, de 10 de fevereiro.
XIII. Estado das coisas, esse, que em nada foi alterado por aquele diploma legislativo.
XIV. Como o objetivo pretendido pelo Decreto-Lei n.º 27/2006, de 10 de fevereiro, é de criar e definir os grupos de recrutamento para efeitos de seleção e recrutamento do pessoal docente da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário, limita-se a fazer a equiparação com os grupos de docência anteriormente existentes, para efeitos de habilitações.
XV. Dai o seu art. 10.º dispor que «Todas as referências feitas aos grupos de docência pela legislação em vigor consideram-se reportadas aos grupos de recrutamento a que se refere o presente decreto-lei.»
XVI. Não estabelece habilitações para o novo grupo de recrutamento porque «As habilitações profissionais para o grupo de recrutamento Espanhol (código de recrutamento 350) são as que conferem qualificação profissional para o grupo de docência (Espanhol) do 3.º ciclo do ensino básico e do ensino secundário.
XVII. se assim é, não se descortina como é que a Portaria n.º 303/2009 poderia violar a alínea v do art. 7.º do Decreto- Lei n.º 27/2006, de 10 de Fevereiro
XVIII. Por outro lado, a Portaria n.º 303/2009, de 24 de março, não viola o regime das habilitações profissionais para a docência, nomeadamente o art. 34.º da Lei de Bases do Sistema Educativo, o Decreto-Lei n.º 344/89 ou o Decreto-lei n.º 194/99, porque, ao contrário daquele regime, não vem conferir habilitação profissional ab initio, isto é a docentes que da mesma ainda não eram detentores.
XIX. Com efeito, nos seus termos, as novas habilitações para a docência do Espanhol apenas são conferidas a quem já dispunha de qualificação profissional para os grupos de recrutamento numa língua estrangeira e ou Português (códigos de recrutamento 200, 210, 220, 300, 310, 320, 330 e 340).
XX. Assim, todos os docentes abrangidos pela Portaria n.º 303/2009, de 24 de março, eram detentores de uma formação inicial, com uma componente de formação científicas no domínio das línguas, ajustada à futura docência, uma componente de ciências de educação e uma componente de prática pedagógica orientada pela instituição formadora, com a colaboração do estabelecimento de ensino em que essa prática é realizada.
XXI. Pelo que, o objetivo da Portaria era permitir a transição destes docentes, com esta formação inicial, daqueles grupos de recrutamento, para o grupo de recrutamento do Espanhol, em obediência ao disposto no art. 72.° do Estatuto da Carreira Docente o que só era possível mediante o estabelecimento de habilitações complementares que respeitassem a necessária aptidão pedagógica para a docência do Espanhol.
XXII. O Decreto-Lei n.º 43/2007, de 22 de Fevereiro, aprova um novo regime jurídico da habilitação profissional para a docência na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário.
XXIII. No entanto, a Portaria n.º 303/2009, de 24 de março, igualmente não viola o Decreto-Lei n.º 43/2007, de 22 de Fevereiro.
XXIV. Assim é porque o mesmo não se encontrava ainda em aplicação, aguardando a necessária regulamentação.
XXV. Mesmo que assim não se entendesse, a verdade é que tendo o Mestrado em Ensino de Inglês e de [língua estrangeira] nos Ensinos Básicos e Secundário, constante das referência 7 e 8 do Anexo ao Decreto- Lei n.º 43/2007, sido criado apenas após a entrada em vigor daquele diploma, em 2009, ainda não havia alunos que tivessem concluído o mesmo e que se pudessem apresentar como portadores de qualificação profissional, nos termos daquele diploma legal.
XXVI. Não obstante, e, em face das exigências do sistema educativo, havia falta de docentes com qualificação profissional no grupo de recrutamento do Espanhol, de modo a satisfazer as necessidades educativas dos alunos, assim como havia noutros grupos de recrutamento da área de línguas, um número de docentes excessivo para aquele mesmo efeito.
XXVII. Como resulta do preâmbulo da Portaria n.º 303/2009, tinha-se assistido a uma crescente opção pela aprendizagem da língua espanhola por parte dos alunos dos ensinos básicos e secundários.
XXVIII. Este aumento de alunos que se matricularam na disciplina do Espanhol nos ensinos básico e secundário resultou de novas regras orientadores da organização e da gestão curricular dos ensinos básico e secundário, consagradas com os Decretos-Lei n.ºs n.º 6/2001, de 18 de Agosto e 74/2004, de 26 de Março.
XXIX. O n.º 1 do art. 19.° do Decreto-Lei n.º 6/2001, ao conferir norma habilitante para a reorganização dos grupos de docência, por forma a corresponder aos princípios orientadores da organização e da gestão do currículo constantes daquele diploma, deve ser interpretado, não apenas no sentido da definição dos grupos, como também das respetivas qualificações para a docência nos ensinos básico e secundário, em conformidade com as necessidades decorrentes dos seus novos planos curriculares.
XXX. Aliás, este sentido já era estabelecido n.º 1 do art. 13.° do Decreto-Lei 286/89, de 29 de Agosto, cuja epígrafe tem o mesmo conteúdo do art. 19.º do Decreto-Lei n.º 6/2001 e do art, 16.° do Decreto-Lei n.º 74/2004, de 26 de Março: Reestruturação dos grupos de docência.
XXXI. O Decreto-Lei n.º 27/2006, de 10 de fevereiro, não revogou, nem o Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18 de Agosto, nem o Decreto-Lei n.º 74/2004, de 26 de Março.
XXXII. O Acórdão recorrido confunde os perfis de competência e de formação de educadores e professores para ingresso na carreira docente, que nos termos do n.º 2 do art. 34.º da Lei de Bases do Sistema Educativo, são definidos por Decreto-Lei, com as habilitações profissionais para a docência exigidas pelo art. 22.º do Estatuto da Carreira Docente.
XXXIII. Esse «perfil geral de desempenho profissional do educador de infância e dos professores dos ensinos básico e secundário» veio a ser estabelecido pelo Decreto-Lei n.º 240/2001, de 30 de agosto.
XXXIV. E, nos termos do art. 2.º daquele diploma, constitui um quadro de orientação a que se encontram subordinadas a organização dos cursos de formação inicial e a sua acreditação como conferindo habilitação profissional para a docência.
Nestes termos e nos mais de Direito, que muito doutamente serão supridos por V. Exas.. deverá ser proferida decisão que conclua pela admissão e procedência do presente recurso alargado, como é de JUSTIÇA.”

Não foram apresentadas Contra-alegações de Recurso

A Autora Maria Helena Fernandes veio em 27 de maio de 2016 a “desistir do Recurso subordinado que havia apresentado”.
O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado em 11 de julho de 2016, nada veio dizer, requerer ou promover.
O presente Processo foi-nos concluso em 21 de novembro de 2019.
Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
II - Questões a apreciar
Importa apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente/Ministério, designadamente, os invocados erros apreciação dos diplomas legais aplicáveis, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA.

III – Fundamentação de Facto
O Tribunal a quo, considerou a seguinte factualidade como provada:
“A) As Autoras são licenciadas em línguas e literaturas modernas - variante de Estudos Portugueses e Espanhóis e são portadoras de habilitação profissional para o grupo de recrutamento de Espanhol (350) (cfr. acordo e fls. 81 a 116, do processo físico);
B) A Autora N.S.J.S. obteve a sua qualificação profissional em 31.05.2006 (cfr. fls. 83 e ss, do processo físico);
C) A Autora P.R.B.S.P. obteve a sua qualificação profissional em 14.06.2004 (cfr. fls. 92 e ss, do processo físico);
D) A Autora M.H.G.C.F. obteve a sua qualificação profissional em 06.06.2007 (cfr. fls. 105 e ss, do processo físico);
E) No Diário da República, 2.ª série, n.º 50, de 12 de Março de 2009, foi publicado o aviso n.º 5432-Al2009, relativo a "Concurso de educadores de infância e de professores dos ensinos básico e secundário para o ano escolar de 2009-2010, nos termos do previsto e regulado pelo Decreto-Lei n.º 20/2006, de 31 de Janeiro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 51/2009, de 27 de Fevereiro", do qual se extrai o seguinte:
"IV - Requisitos gerais e específicos de admissão a concurso (...)
3- Habilitações para os grupos de recrutamento:
3.1 - As habilitações legalmente exigidas para o presente concurso são as seguintes:
3. 1 - 1 - curso de formação inicial de professores, com estágio pedagógico integrado:
Licenciatura de ensino de .... ;
Licenciatura do ramo de formação educacional em .... ;
Curso de Professores do ensino básico (Licenciatura);
Curso de Professores do ensino primário/curso do Magistério primário/curso de educador de infância (Bacharelato);
Especialidade de Mestrado (2.º ciclo do Processo de Bolonha);
3.1 - 2 - Curso científico sem estágio pedagógico integrado:
Estágio clássico;
Profissionalização em serviço/em exercício;
Qualificação em Ciências da Educação - Universidade Aberta;
Outra
3.2- As qualificações profissionais para o grupo de recrutamento de Educação Moral e Religiosa Católica são as seguintes:
3.2.1 - Qualificações profissionais conferidas pela licenciatura em Ciências Religiosas, nos termos do despacho n.º 144/ME/88, de 2 de Setembro, e pela licenciatura em Teologia acrescida da habilitação pedagógica complementar ministradas pela Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa, ou por qualquer licenciatura acrescida de 60 créditos em Ciências Religiosas conferidos pela Faculdade de Teologia ou pelas escolas teológicas previstas na alínea a) do mapa n.º 1 anexo ao Despacho Normativo n.º 6-A/90, de 31 de Janeiro, e nas listas subsequentes publicadas no Diário da República, 2.ª Serie, n.ºs 3, de 12 de Fevereiro de 1992, e 63, de 16 de Março de 1994, e pela habilitação pedagógica complementar, conferida pela Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa;
3-3 - A habilitação para a educação especial é conferida por uma qualificação profissional para a docência acrescida de uma formação na área da Educação Especial titulada pelos cursos constantes na Portaria n.º 212/2009, de 23 de Fevereiro.
3.4 - A habilitação para o grupo de recrutamento Espanhol é conferida também aos docentes com uma qualificação profissional numa Língua estrangeira e/ou Português e que possuam na componente cientifica da sua formação a variante Espanhol ou, o Diploma Espanhol de Língua Estrangeira (DELE) nível C do Instituto Camões.(...)
9 de Março de 2009 - O Diretor-Geral, J. S. M." (tis. 151 e ss do processo físico);
F) As Autoras foram opositoras ao concurso a que se reporta a alínea anterior (acordo e cfr. fls. 81 a 116 do processo físico);”

IV – Do Direito
No que ao direito concerne e no que aqui releva, discorreu-se em 1ª instância:
“Pretendem as Autoras obter a anulação do ato consubstanciado no despacho do Diretor-Geral dos Recursos Humanos da Educação de 9 de Março de 2009, que declarou aberto os concursos interno e externo destinados a educadores de infância e de professores dos ensino básico e secundário para o ano escolar de 2009-2010, publicitado através do Aviso de Abertura n.º 5432-A/2009 de 12 de Março, publicado no n.º 50 da II Série, Parte C, do Diário da República, de 12 de Março de 2009, na parte referente ao ponto 3.4. do Capítulo IV).
Alegam para o efeito, e em síntese, que são licenciadas em línguas e literaturas modernas - variante de Estudos Portugueses e Espanhóis; que são portadoras de habilitação profissional para o grupo de recrutamento de Espanhol (350); que nos termos do ato impugnado, bem como ainda nos termos do disposto no n.º 2, alínea a) da Portaria n.º 303/2009, de 24 de Março, também poderão ser opositores ao concurso em questão docentes que, embora não tenham habilitação profissional neste Grupo, sejam profissionalizadas noutra área, e que possuam requisitos não determinados nos Decreto-Lei n.º 20/2006, de 31 de Janeiro e no Estatuto da Carreira Docente e/ou o designado DELE Superior do Instituto Cervantes; que o ato impugnado padece de invalidade decorrente da violação: do artigo 5.º, n.º 2, alínea v), do Decreto-Lei n.º 27/2006, de 10 de Fevereiro, bem como o disposto no Decreto-Lei n.º 43/2007, de 22 de Fevereiro; do artigo 72.°, do Estatuto da Carreira Docente, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 139-A90, de 28 de Abril, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 15/2007, de 19 de Janeiro; dos princípios da justiça e imparcialidade e até da boa-fé, consagrados nos artigos 6.° e 6.º-A, do Código de Procedimento Administrativo; e do princípio constitucional da igualdade e da proporcionalidade [cfr. artigo 59.°, n.º 1, alínea a), da Constituição da República Portuguesa e 5.° do Código de Procedimento Administrativo].
Na perspetiva do Réu, o ato impugnado limita-se a transpor para a regulamentação dos concursos a norma constante do artigo 2.° da Portaria n.º 303/2009; que, no entanto, as Autoras não obtiveram a sua habilitação profissional para o grupo de recrutamento de Espanhol de acordo com os critérios previstos no Decreto-Lei n.º 43/2007; que a disciplina do Decreto-Lei n.º 74/2006, de 24 de Março não é colocada em causa; que o alargamento das habilitações para o grupo de recrutamento de Espanhol concretizado nas normas em causa, encontra a sua justificação legal nas disposições dos Decretos-Lei n.ºs 6/2001, de 18 de Agosto e 74/2004, de 26 de Março, que constituem as suas normas habilitantes; que as medidas consagradas na aludida Portaria têm natureza manifestamente excecional e transitória; que ao reconhecer-se a habilitação profissional para o recrutamento de Espanhol aos docentes que enquadram a previsão da norma do artigo 2.° da Portaria n.º 303/2009 assegura-se o cumprimento do disposto no artigo 72.° do Estatuto da Carreira Docente; que não se mostram violados os princípios invocados. Vejamos, então.
O ato impugnado, consubstanciado no referido ponto 3.4, do aviso de abertura dos concursos interno e externo destinados a educadores de infância e de professores dos ensino básico e secundário para o ano escolar de 2009-2010, veio permitir a habilitação para o grupo de recrutamento Espanhol também aos docentes com uma qualificação profissional numa Língua estrangeira e/ou Português e que possuam na componente cientifica da sua formação a variante Espanholou, o Diploma Espanhol de Língua Estrangeira (DELE) nível C do Instituto Camões.
Ora, a disciplina relativa aos concursos para seleção e recrutamento do pessoal docente da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário, encontrava-se à data do concurso a que respeita o ato impugnado, disciplinada no Decreto-Lei n.º 20/2006, de 31 de Janeiro, com as alterações que lhe foram sucessivamente introduzidas pelos Decretos-Lei n.ºs 35/2007, de 15 de Fevereiro e 51/2009, de 27 de Fevereiro.
Assim, dispõe o artigo 2.°, n.º 1, deste Diploma que aqueles concursos são aplicáveis aos docentes com a categoria de professor com nomeação definitiva ou provisória e aos portadores de qualificação profissional para a docência.
Este diploma prevê ainda, no artigo 5.°, n.ºs 5, que: "O concurso externo destina-se ao recrutamento de candidatos que pretendam aceder a lugares da categoria de professor dos quadros de agrupamento de escolas ou escola não agrupada e preencham os requisitos previstos no artigo 22.º do Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos Básico e Secundário, aprovado pelo Decreto -Lei n.º 139 -Al90, de 28 de Abril, na sua redação atual."
Também o artigo 36.°, deste Diploma prevê ainda que: "O ingresso na carreira docente faz-se mediante concurso destinado ao provimento de lugar do quadro da categoria de professor de entre os docentes que satisfaçam os requisitos de admissão a que se refere o artigo 22.º"
Com relevância para o caso em apreço, cabe ainda perscrutar o regime previsto no Decreto-Lei n.º 27/2006, de 10 de Fevereiro, que cria e define os grupos de recrutamento para efeitos de seleção e recrutamento do pessoal docente da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário, e no qual se encontra previsto no seu artigo 1.°, n.º 2, que para efeitos daquele diploma "entende-se por grupo de recrutamento a estrutura que corresponde a habilitação específica para lecionar no nível de ensino, disciplina ou área disciplinar da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário".
Ora, com referência ao grupo de recrutamento de espanhol, reporta-se o artigo 7.°, alínea v), deste Diploma, de onde se retira que: "As habilitações profissionais para o grupo de recrutamento Espanhol (código de recrutamento 350) são as que conferem qualificação profissional para o grupo de docência (Espanhol) do 3.º ciclo do ensino básico e do ensino secundário, previsto no Despacho Normativo n.º 14/99, de 12 de Março, com a realização do estágio pedagógico nesse grupo de docência.
Por último, e ainda com relevância para o caso sub judicie atente-se na Lei de Bases do Sistema Educativo, na redação aplicável à data (Lei n.º 46/86, de 14 de Outubro, alterada pela Lei n.º 115/97, de 19 de Fevereiro e Lei n.º 49/2005, de 30 de Agosto), mais concretamente, no seu artigo 34.°, n.ºs 1 e 2, no qual se dispõe que:
"1- Os educadores de infância e os professores dos ensinos básico e secundário adquirem a qualificação profissional através de cursos superiores organizados de acordo com as necessidades do desempenho profissional no respetivo nível de educação e ensino.
2- O Governo define, por decreto-lei, os perfis de competência e de formação de educadores e professores para ingresso na carreira docente. "
Resulta, por isso, dos supra citados normativos, o ato impugnado viola o disposto no artigo 5.º, n.º 2, alínea v), do Decreto-Lei n. 27/2006, de 10 de Fevereiro, permitindo que fossem considerados habilitados ao referido concurso, no que respeita ao grupo de recrutamento Espanhol também aos docentes com uma qualificação profissional numa Língua estrangeira e/ou Português e que possuam na componente cientifica da sua formação a variante Espanholou, o Diploma Espanhol de Língua Estrangeira (DELE) nível C do Instituto Camões, pois que não correspondem às habilitações profissionais que, à data, eram legalmente exigidas para a docência naquele nível de ensino e grupo de recrutamento.
Na verdade, resulta da Lei da Bases da Educação que cabe ao Governo definir por Decreto-Lei os perfis de competência e de formação de educadores e professores para ingresso na carreira docente, sendo que, nos termos do disposto nos artigos artigo 22.°, alínea b), e 36.° do Estatuto dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos Básico e Secundário da Carreira Docente, é requisito geral de admissão a concurso, e assim de ingresso na carreira docente, possuir as habilitações profissionais legalmente exigidas para a docência no nível de ensino e grupo de recrutamento a que os opositores nos respetivos concursos, se candidatam, tendo o ato impugnado, alargando o universo de opositores ao concurso em causa a candidatos que não detinham as habilitações previstas na lei.
Assim, a alegação do Réu, de que os artigos 19.°, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 6/2001 e 16.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 74/2004 permitiam que por portaria se procedesse à reorganização dos grupos de docência, é desde logo destituída de fundamento.
É que se é verdade que os Decretos-Lei n.º 6/2001, de 18 de Janeiro e n.º 74/2004, de 26 de Março (entretanto já revogados pelo Decreto-Lei n.º 139/2012, de 5 de Julho), que estabeleceram os princípios orientadores da organização e da gestão do currículo, bem como da avaliação das aprendizagens, referentes ao nível básico e secundário de educação (cfr. artigo 1.°, n.º 1), dispunham que a reorganização dos grupos de docência era realizada através de portaria do Ministro da Educação, de forma a corresponder aos princípios que regiam aqueles diplomas em matéria de organização e gestão do currículo (cfr. artigo 19.°, n.º 1), também é verdade que tais normativos se reportam apenas à reorganização dos grupos de docência e não à definição das habilitações necessárias para o ingresso na carreira docente, nos respetivos grupos, constando tal disciplina do Decreto-Lei n.º 27/2006, conforme já se disse.
E tal é aliás inequívoco do preâmbulo deste Decreto-Lei n.º 27/2006, onde se lê que: "Em resultado da experiência entretanto colhida, e após cuidada avaliação dos atuais grupos de docência, torna-se possível estabilizar um conjunto de soluções que orientem o processo de determinação e suprimento das necessidades de docência, tendo por referência as habilitações adequadas à lecionação das várias valências ou áreas disciplinares.
No quadro das iniciativas destinadas a alcançar tal desiderato, e em paralelo com a revisão do regime jurídico de seleção e recrutamento do pessoal docente da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário, o presente diploma procede à criação dos grupos de recrutamento para efeitos de colocação destes profissionais, através do reagrupamento e reorganização dos atuais grupos de docência, operando a sua transfiguração, fusão, desdobramento e renumeração, com a definição de novas áreas de recrutamento e a respetiva qualificação profissional."
Resulta assim que o legislador pretendeu definir as habilitações necessárias para os grupos de recrutamento ali criados, não deixando aberta qualquer possibilidade para que pudessem ser introduzidas alterações àquelas regras, através de Portaria do membro do Governo.
Aliás, este Decreto-Lei n.º 27/2006, de 10 de Fevereiro, veio a ser alterado apenas recentemente pelo Decreto-Lei n.º 176/2014, de 12 de Dezembro e, em consequência, foi criado um novo grupo de recrutamento, mais concretamente, de Inglês do ensino básico (aí se fazendo constar as habilitações necessárias para este grupo).
Por outro lado, também a alegação do Réu de que deu apenas cumprimento à Portaria n.º 303/2009, de 24 de Março, não procede.
É que o ato impugnado foi praticado em 9 de Março de 2009 [facto assente na alínea b)] e esta Portaria só entrou em vigor no dia seguinte ao da sua publicação (24.03.2009).
De todo o modo, acresce ainda que aquela Portaria tivesse entrado em vigor em data anterior, sempre o ato impugnado teria que se considerar ilegal. Senão, vejamos.
É que as portarias são regulamentos ministeriais, assinados apenas por um ou alguns ministros (cfr. Sérvulo Correia, Noções de Direito Administrativo, Vol. I, pág. 102, Lisboa/1982), tratando-se de atos normativos emanados do Governo no âmbito da sua atividade administrativa, no entanto, e apesar da violação da norma regulamentar ser expressamente equiparada a violação da lei, o Direito criado não possui o mesmo valor que o da lei, pois o regulamento só pode disciplinar determinada matéria na medida em que a lei lho consinta; e os regulamentos existentes ficam revogados pelo aparecimento de uma lei que contenha disciplina contrária às suas disposições.
Ora, no caso em apreço, aquela Portaria não respeita a disciplina contida no Decreto-Lei n.º 27/2006, em clara violação do princípio da hierarquia das fontes e das normas.
Quanto à alegada violação do Decreto-Lei n.º 43/2007, assiste razão ao Réu quando alega que tal violação não ocorre pois este Diploma não é aplicável ao caso em apreço. É que a disciplina aqui contida reporta-se efetivamente à habilitação profissional para a docência na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário (cfr. artigo 1.°), mas não é aplicável a todos os que adquiriram habilitação profissional para a docência no âmbito de legislação anterior à entrada em vigor daquele decreto-lei (Cfr. artigo 26.°), como é o caso das Autoras [cfr. alíneas b), c) e d), da matéria assente], a que acresce que, de todo o modo, aquele Diploma não define as habilitações profissionais específicas para cada grupo de recrutamento, as quais continuaram a ser as previstas no Decreto-Lei 27/2006, de 10 de Fevereiro.
Quanto à alegada violação do artigo 72.° do Estatuto da Carreira Docente, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 139-A/90, de 28 de Abril, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 15/2007, de 19 de Janeiro, conclui-se que este normativo foi também violado pois que o ato impugnado permite que a transição dos docentes, por concurso, entre os diversos níveis ou ciclos de ensino previstos neste Estatuto e entre os grupos de recrutamento estabelecidos em legislação própria, não esteja condicionada à existência das qualificações profissionais exigidas para o nível, ciclo de ensino ou grupo de recrutamento a que o docente concorre.
No que tange à suscitada violação dos princípios invocados, apesar de inequívoca a conclusão da existência da invalidade decorrente do vicio de violação de lei, não vislumbra porém o Tribunal onde a violação dos referidos princípios possa ocorrer, desde logo porque tais violações não se encontram concretizadas/sustentadas em factos pelas Autoras.
Peticionam ainda as Autoras a condenação do Réu à adoção dos atos e operações necessários para reconstituir a situação que existiria se o ato anulado não tivesse sido praticado.
Sendo certo que o ato impugnado reporta-se a concurso aberto para o ano escolar de 2009/2010, o qual já decorreu, a verdade é que atenta a procedência do primeiro pedido, o efeito repristinatório decorre desde logo da decisão anulatória proferida, o que sempre obriga o Réu a reconstituir a situação que existiria se o ato impugnado não tivesse sido praticado, nos termos em que o foi.”

Vejamos:
As Autoras, aqui Recorridas, contestam predominantemente que possam ser opositores ao concurso para preenchimento de vagas de quadro para o grupo de recrutamento de Espanhol, docentes que, embora não tenham habilitação profissional neste Grupo, sejam profissionalizados noutra área, e que possuam requisitos não determinados nos supra referidos decretos-leis e/ou o designado DELE Superior do Instituto Cervantes.

Em bom rigor, a lesão que alegam decorrente do suposto alargamento da base de recrutamento para lecionar a disciplina de Espanhol, é meramente eventual e hipotético, pois que, não obstante estar em causa um procedimento concursal realizado em 2009, não fizeram prova que possam ter sido prejudicadas em concreto em decorrência do invocado alargamento da referida base de recrutamento.

Em qualquer caso, analisemos o suscitado:
Desde logo, dispõe o impugnado ponto 3.4 do Capítulo IV do Aviso n.º 5432-A/2009 publicado no Diário da República, 2.ª série, N.º 50, de 12 de Março:
“3.4 – A habilitação para o grupo de recrutamento Espanhol é conferida também aos docentes com uma qualificação profissional numa Língua estrangeira e/ou Português e que possuam na componente científica da sua formação a variante Espanhol ou, o Diploma Espanhol da Língua Estrangeira (DELE) nível C do Instituto Cervantes.”

A referida norma concursal corresponde e resulta singelamente ao artigo 2.º da Portaria n.º 303/2009, de 24 de Março, retificada pela Declaração de Retificação n.º 25/2009, de 13 de Abril, no qual se pode ler:
“Artigo 2.º
Habilitação profissional
São considerados titulares de habilitação profissional para o grupo de recrutamento de Espanhol (código de recrutamento 350) os docentes que se encontrem numa das seguintes situações:
a) Portadores de qualificação profissional numa língua estrangeira e ou Português (códigos de recrutamento 200, 210, 220, 300, 310, 320, 330 e 340) e do diploma de Espanhol como língua estrangeira (DELE), outorgado pelo Instituto Cervantes, correspondente ao nível C2 do Quadro Europeu Comum de Referência para as Línguas e obtido até ao final do ano letivo de 2008-2009;
b) Portadores de qualificação profissional numa língua estrangeira e ou Português (códigos de recrutamento 200, 210, 220, 300, 310, 320, 330 e 340) e que, na componente científica da sua formação, possuam a variante de Espanhol.”

Entendeu o tribunal a quo, que o requisito constante do ponto 3.4 do Capítulo IV do Aviso n.º 5432-A/2009, não estava operativo à data da abertura do concurso, uma vez que a Portaria que o estabelecera, não estava ainda em vigor.

Em qualquer caso, e desde logo, à luz do n.ºs 1 e 3 do art. 29.º do Decreto-Lei n.º 204/98, de 11 de Julho, e art. 21.º do Decreto-Lei n.º 498/88, de 31 de dezembro, o preenchimento dos requisitos concursais terá de ocorrer até ao termo do prazo fixado para apresentação das candidaturas, em face do que se não reconhece o invocado vício, pois que aquando do termo do prazo de candidatura já estava plenamente em vigor a Portaria n.º 303/2009, publicada em 24 de Março.
Já quanto a aspeto diverso, referiu-se na decisão recorrida que o regime das habilitações profissionais para a docência se encontrava consagrado no Decreto-Lei n.º 27/2006, de 10 de fevereiro, nos termos do n.º 2 do art. 34.º da Lei de Bases do Sistema Educativo, com a redação dada pela Lei n.º 49/2005, de 30/08, em face do que o artigo 2.º da Portaria n.º 303/2009, de 24 de Março se mostraria ilegal.

Vejamos então e no que aqui releva, o intrincado regime aplicável às habilitações para a docência.

Assim e desde logo, refere o artigo 34.º da Lei de Bases do Sistema Educativo, com a redação dada pela Lei n.º 49/2005, de 30/08, o seguinte:
“Artigo 34.º
Formação inicial de educadores de infância e de professores dos ensinos básico e secundário
1 - Os educadores de infância e os professores dos ensinos básico e secundário adquirem a qualificação profissional através de cursos superiores organizados de acordo com as necessidades do desempenho profissional no respetivo nível de educação e ensino.
(…)
7 - A qualificação profissional dos professores do ensino secundário pode ainda adquirir-se através de cursos de licenciatura que assegurem a formação científica na área de docência respetiva, complementados por formação pedagógica adequada.”

Estão pois previstas duas vias distintas para a aquisição de uma qualificação profissional para a docência:
Por um lado, os cursos de licenciatura integrando todas as componentes de formação (Licenciaturas em Ensino) e, por outro lado, os complementos de formação pedagógica (Cursos de Formação Pedagógica) na sequência de uma licenciatura, sendo que estes cursos também podem ser realizados por via da profissionalização em serviço, nos termos do Decreto-Lei n.º 287/88, de 19 de agosto (cfr. n.º 2 do art. 65.º da Lei de Bases do Sistema Educativo, com a redação dada pela Lei n.º 49/2005, de 30/08).

A Formação Inicial Docente, por via Universitária, poderá assim revestir as seguintes modalidades:
a) Formação inicial integrada - Licenciaturas em Ensino, com a duração de cinco anos (sendo o último de estágio), correspondentes a uma disciplina ou grupo de disciplinas de docência;
b) Formação inicial sequencial - Licenciaturas em Ensino ou em Ramo Educacional de áreas científicas, com a duração total de cinco anos (sendo o último ano de estágio) e como opção possível após tronco comum da referida área;
c) - Curso de formação pedagógica - após licenciatura, incorporando necessariamente a realização de estágio.

Os referidos modelos correspondem aos cursos de formação inicial de licenciatura profissionalizantes previstas no n.º 1 do Artigo 34º da LBSE -Licenciaturas em Ensino - e os complementos de formação pedagógica referidos nos n.ºs 6 e 7 do mesmo artigo.

Refira-se que o diploma regulamentar relativo à formação inicial dos docentes, era o Decreto-Lei n.º 344/89, de 11 de outubro, em vigor até à publicação do Decreto-Lei n.º 43/2007, de 22 de fevereiro.

Nos termos do art. 15.º do referido diploma, a estrutura curricular dos cursos de formação inicial incluía, designadamente:
a) Uma componente de formação pessoal, social, cultural, científica, tecnológica, técnica ou artística ajustada à futura docência;
b) Uma componente de ciências de educação;
c) Uma componente de prática pedagógica orientada pela instituição formadora, com a colaboração do estabelecimento de ensino em que essa prática é realizada.

Alude-se ainda ao Decreto-Lei n.º 194/99, de 7 de junho, que regulava o sistema de acreditação dos cursos de formação inicial de educadores de infância e de professores dos ensinos básico e secundário, o qual, no seu art. 4.º fixava que a qualificação profissional para a docência sempre dependeria do facto do curso ter sido objeto de acreditação.

Mais tarde, e muitos diplomas legais e regulamentares depois, veio a ser publicado o Decreto-Lei n.º 27/2006, de 10 de fevereiro, que logo no seu 1ª Artigo, estabelecia que:
«1 - O presente decreto-lei cria e define os grupos de recrutamento para efeitos de seleção e recrutamento do pessoal docente da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário.»

A respeito já deste diploma, refira-se que se não acompanha o entendimento adotado em 1ª instância, de acordo com o qual o ato objeto de impugnação violaria «o disposto no artigo 7.º, n.º 2, alínea v), do Decreto-Lei n.º 27/2006, de 10 de Fevereiro» (Refere-se no acórdão, por manifesto lapso, o Artº 5º).
Resulta do aludido normativo que:
a) As habilitações profissionais para o grupo de recrutamento Espanhol (código de recrutamento 350) são as que conferem qualificação profissional para o grupo de docência (Espanhol) do 3.º ciclo do ensino básico e do ensino secundário
b) previsto no Despacho Normativo n. 14/99, de 12 de Março, com a realização do estágio pedagógico nesse grupo de docência.

Assim, o referido diploma visou, designadamente, criar e definir os grupos de recrutamento para efeitos de seleção e recrutamento do pessoal docente da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário.

Não são estabelecidas habilitações para o novo grupo de recrutamento uma vez que, como se aludiu já, «As habilitações profissionais para o grupo de recrutamento Espanhol (código de recrutamento 350) são as que conferem qualificação profissional para o grupo de docência (Espanhol) do 3.º ciclo do ensino básico e do ensino secundário».

Assim sendo, mal se compreende como poderia a Portaria n.º 303/2009 violar a alínea v do art. 7.º do Decreto-Lei n.º 27/2006, de 10 de Fevereiro.

Com efeito, é lapidar que as novas habilitações para a docência do Espanhol apenas são conferidas a quem já dispunha de qualificação profissional para os grupos de recrutamento numa língua estrangeira e ou Português (códigos de recrutamento 200, 210, 220, 300, 310, 320, 330 e 340).

O objetivo da Portaria era singelamente viabilizar a transição dos docentes com formação inicial nos indicados grupos de recrutamento, para o grupo de recrutamento do Espanhol, em conformidade com o estatuído no art. 72.º do Estatuto da Carreira Docente, mediante o estabelecimento de habilitações complementares que otimizassem a aptidão para a docência do Espanhol.

Sublinha-se, por outro lado, que o Estatuto da Carreira Docente, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 15/2007, de 19/01, no que concerne ao concurso de recrutamento para lugar de quadro, estabelece o seguinte:
Artigo 22.º
Requisitos gerais e específicos
1 - São requisitos gerais de admissão a concurso:
(…)
b) Possuir as habilitações profissionais legalmente exigidas para a docência no nível de ensino e grupo de recrutamento a que se candidatam;

Já se referia no n.º 1 do art. 67.º do Decreto-Lei n.º 20/2006, de 31 de Janeiro, que «Os indivíduos portadores de habilitação própria para a docência podem candidatar-se aos concursos para seleção e recrutamento de pessoal docente previstos neste decreto-lei até ao concurso para o ano escolar de 2007-2008, inclusive.»

No seguimento da alteração operada pelo DL nº 51/2009, passou o artigo 2.º, n.º 1 a dispor que os opositores aos concursos têm de ser portadores de qualificação profissional, sendo que, para efeitos de recrutamento para preenchimento de lugar de quadro, só poderiam ser admitidos a concurso os docentes titulares de habilitação profissional, nos termos do n.º 1 do art. 65.º da Lei de Bases do Sistema Educativo, no qual, paradigmaticamente, se estabelecia que «Serão tomadas medidas no sentido de dotar os ensinos básico e secundário com docentes habilitados profissionalmente, mediante modelos de formação inicial conformes com o disposto na presente lei, de forma a tornar desnecessária a muito curto prazo a contratação em regime permanente de professores sem habilitação profissional»

Foi pois em função do referido desiderato que foi aprovado um novo regime jurídico da habilitação profissional para a docência na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário, através do Decreto-Lei n.º 43/2007, de 22 de Fevereiro, o qual, aquando da publicação da aqui controvertida Portaria n.º 303/2009, ainda aguardava regulamentação.

Realça-se que a própria Recorrente não obteve a sua reconhecida habilitação profissional para o grupo de recrutamento de Espanhol nos termos do Decreto-Lei n.º 43/2007, de 22 de Fevereiro, uma vez que a havia já obtido em momento anterior.

Aliás, é o próprio n.º 1 do art. 26.º do Decreto-Lei n.º 43/2007 que refere expressamente que «aqueles que adquiriram habilitação profissional para a docência no âmbito de legislação anterior à entrada em vigor do presente decreto-lei mantêm essa habilitação para a docência no domínio em que a obtiveram.»

Por outro lado, como a própria Entidade Recorrente alude, a decisão recorrida tende a confundir duas realidades distintas.

Com efeito, os perfis de competência e de formação de educadores e professores para ingresso na carreira docente estão definidos no n.º 2 do art.º 4.º da Lei de Bases do Sistema Educativo, enquanto que as habilitações profissionais para a docência, constam do art.º 22.º do Estatuto da Carreira Docente.
Em conclusão, refira-se que se não vislumbra que o impugnado ponto 3.4 do Capítulo IV do Aviso n.° 5432-A/2009 publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 50, de 12 de Março, padeça de qualquer vício determinante da sua impugnação, pois que se limitou a dar operatividade à norma constante do Art.º 2º da Portaria n.º 303/2009, entretanto entrada em vigor.

Em função de tudo quanto supra ficou explicitado, não se pode acompanhar o entendimento adotado em 1ª instância, sendo que até, e como se afirmou já, está por provar que a Recorrente possa ter sido concretamente prejudicada pelo ato objeto de impugnação.
* * *
Deste modo, em conformidade com o precedentemente expendido, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Norte, concede-se provimento ao Recurso, revoga-se a decisão recorrida, mais se julgando a Ação improcedente.

Custas pela Recorrente

Porto, 31 de janeiro de 2020

Frederico de Frias Macedo Branco
Nuno Coutinho
Ricardo de Oliveira e Sousa