Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01597/04.1BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:06/25/2015
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Ana Patrocínio
Descritores:ANULAÇÃO DE VENDA
FALTA CITAÇÃO DE ARRENDATÁRIO
DIREITO DE PREFERÊNCIA
ARTIGOS 239.º E 249.º, N.º 7 DO CPPT
Sumário:I - In casu, o arrendatário não tinha que ser citado, para efeitos do disposto no artigo 239.º, n.º 1 do CPPT, por não ser credor preferente.
II - De igual forma, não tinha que ser notificado, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 249.º, n.º 7 do CPPT, por não ser titular do direito de preferência na alienação dos bens em causa.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Grupo..., S.A.
Recorrido 1:F... e Autoridade Tributária e Aduaneira
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Relatório

Grupo…, S.A., pessoa colectiva n.º 5…, com sede na Rua…, n.º 1…, na Póvoa de Varzim, interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, proferida em 28/08/2014, que julgou improcedente o pedido de anulação das vendas das fracções autónomas designadas pelas letras “C”, “D”, “E”, “F”, “G”, “H”, “I”, “J”, “K”, “L”, “N”, “P”, “S”, “W”, “Z” e “EW”, do prédio urbano inscrito na matriz predial da freguesia da Póvoa de Varzim sob o artigo 7…, vendidas no âmbito dos processos de execução fiscal n.os 1872200101031414, 1872200101034480 e 1872200201057103, em que é executada “R…, Lda.”.


A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as conclusões que se reproduzem de seguida:
A - Decorre do disposto no Art.° 239° que após a concretização da penhora em sede de convocação de credores, estes são chamados ao processo por via de citação, e não por via de notificação;
B - Nos termos do Art.° 41° n.° 1 do Cód. de Proc. e Proc. Trib., a citação é efectuada na pessoa dos gerentes ou seus administradores, só sendo possível efectuar a citação nos termos do n.° 2 do Art.° 41° quando se mostre impossível a primeira;
C - A administradora da Reclamante não foi notificada ou contactada do que quer que fosse e desconhece os termos do processo, nada a Recorrente recebeu de quem quer que fosse para a chamar a intervir nos presentes autos, nomeadamente, nos termos do Art.° 239° do CPPT;
D - Igualmente, não foi notificado qualquer funcionário da empresa, e tal notificação a existir, não seria sequer eficaz, atento o disposto no n.° 1 do Art.° 41° do CPPT;
E - A citação a ocorrer tem que ter lugar com a antecedência legal, ou seja, aquando da convocação de credores, e na medida em que é devido um prazo de preparação aos proponentes ou aos credores preferentes, quer para poderem levantar obstáculos à execução, quer para exercer os demais direitos no processo;
F - A falta ou nulidade da citação, importa a nulidade de todos os actos subsequentes á citação, importando assim na nulidade do acto de abertura de propostas e de adjudicação, o que decorre de forma clara do disposto nos Arts. 194º e 195° do CPC, sendo certo que, não há que recorrer à regra geral do Art.°201 do CPC, e do Art.° 98° do CPPT, porque decorre da lei, maxime do disposto no Art.° 194º e 195° do CPC a consequência para o processo da falta de citação.
G - Por falta de citação, nos termos do disposto nos Arte. 194°e 195° do CPC, deve igualmente ser anulada a venda em questão, por se tratar de termo do processo posterior ao da citação;
Nestes termos e nos mais de direito, devem as presentes vendas ser anuladas, e em conformidade, ordenada a repetição da citação e dos posteriores actos do processo, como é de JUSTIÇA.

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Não houve contra-alegações.
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O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso e mantida integralmente a douta sentença recorrida.
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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa decidir se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, tendo em vista apurar se a falta de citação da arrendatária (preferente), aqui Recorrente, integra nulidade que determine a anulação das vendas.

III. Fundamentação

1. Matéria de facto

Da sentença prolatada em primeira instância, consta decisão da matéria de facto com o seguinte teor:
“Cumpre apreciar, para o que importa dar como provados os seguintes factos:
1) Em 25/05/2004, no âmbito do processo de execução fiscal n.º 1872200101031414, foi informado que, por desconhecimento do arrendamento dos prédios penhorados cuja venda estava marcada para 27/05/2004, não foi efetuada a notificação da arrendatária para, querendo, exercer o direito de preferência – cfr. fls. 17 do processo de execução fiscal (PEF) n.º 1872200101031414, apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
2) Na sequência da informação mencionada na alínea antecedente, foi determinada a realização da notificação da venda à ora Requerente, tendo a notificação ocorrido no dia 25/05/2004, pelas 17 horas e 50 minutos, na pessoa R…, alegada representante legal da notificanda, dando-lhe conta de que a venda das frações “E”, “F” e “G do prédio urbano inscrito na matriz predial da freguesia da Póvoa de Varzim sob o artigo 7… teria lugar no dia 27/05/2004, pelas 10 horas – cfr. fls. 17, 20 e 20-A do PEF n.º 1872200101031414, apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
3) Em 25/05/2004, no âmbito do processo de execução fiscal n.º 1872200101034480, foi informado que, por desconhecimento do arrendamento dos prédios penhorados cuja venda estava marcada para essa data, não foi efetuada a notificação da arrendatária para, querendo, exercer o direito de preferência – cfr. fls. 66 do PEF n.º 1872200101034480, apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
4) Na sequência da informação mencionada na alínea antecedente, foi adiada a abertura das propostas de compra para o dia 28/05/2004 e determinada a notificação da venda à ora Requerente, tendo a notificação ocorrido no dia 25/05/2004, pelas 17 horas e 50 minutos, na pessoa de R…, alegada representante legal da notificanda, dando-lhe conta de que a venda das frações “K”, “L”,“N”, “P”, “S”, “W, “Z” e “EW” do prédio urbano inscrito na matriz predial da freguesia da Póvoa de Varzim sob o artigo 7… teria lugar no dia 28/05/2004, pelas 10 horas – cfr. fls. 66 e 67 do PEF n.º 1872200101034480, apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
5) Em 25/05/2004, no âmbito do processo de execução fiscal n.º 1872200201057103, foi informado que, por desconhecimento do arrendamento dos prédios penhorados cuja venda estava marcada para 26/05/2004, não foi efetuada a notificação da arrendatária para, querendo, exercer o direito de preferência – cfr. fls. 59 dos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
6) Na sequência da informação mencionada na alínea antecedente, foi determinada a realização da notificação da venda à ora Requerente, tendo a notificação ocorrido no dia 25/05/2004, pelas 17 horas e 50 minutos, na pessoa R…, alegada representante legal da notificanda, dando-lhe conta de que a venda das frações “C”, “D”,“H”, “I” e “J” do prédio urbano inscrito na matriz predial da freguesia da Póvoa de Varzim sob o artigo 7… teria lugar no dia 26/05/2004, pelas 10 horas – cfr. fls. 59 e 60 dos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
7) A contribuinte R… não era, à data das notificações mencionadas nas alíneas 2), 4) e 6) supra, representante legal da ora Requerente, constando dos registos informáticos da Autoridade Tributária como funcionária daquela no ano de 2004, sendo que a Requerente era representada nessa data pela administradora única Ilda Gabriela Nogueira de Freitas Soares Franco – cfr. fls. 427 a 436 dos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
8) As vendas das frações mencionadas nas alíneas 2), 4) e 6) supra, tiveram lugar nos dias 26, 27 e 28 de maio de 2004 – cfr. fls. 68 dos autos, fls. 48 do PEF n.º 1872200101031414 e fls. 74 e 75 do PEF n.º 1872200101034480, ambos apensos aos autos.
9) Em 20 e 21 de julho de 2004, a ora Requerente foi notificada da adjudicação aos respetivos adquirentes das frações “C”, “D”, “E”, “F”, “G”, “H”, “I”, “J”, “K”, “L”, “N”, “P”, “S”, “W”, “Z” e “EW”, do prédio urbano inscrito na matriz predial da freguesia da Póvoa de Varzim sob o artigo 7… – cfr. fls. 79 dos autos, fls. 56 do PEF n.º 1872200101031414 e fls. 132 do PEF n.º 1872200101034480, ambos apensos aos autos.
10) A presente ação de anulação de venda deu entrada no Serviço de Finanças da Póvoa de Varzim em 13/08/2004 – cfr. fls. 91 dos autos. ()
Com relevância para a decisão da causa, consideram-se ainda provados os seguintes factos:
A) Contra “R…, Lda.” foram instaurados os processos de execução fiscal n.os 1872200101031414, 1872200101034480 e 1872200201057103 – cfr. fls. 1 e 2 dos autos, fls. 1 e 2 do PEF n.º 1872200101031414 e fls. 1 e 2 do PEF n.º 1872200101034480, ambos apensos aos autos.
B) O órgão de execução fiscal penhorou à executada as frações autónomas designadas pelas letras “C”, “D”, “E”, “F”, “G”, “H”, “I”, “J”, “K”, “L”, “N”, “P”, “S”, “W”, “Z” e “EW”, do prédio urbano inscrito na matriz predial da freguesia da Póvoa de Varzim sob o artigo 7…, tendo determinado a realização das respetivas vendas, por propostas em carta fechada, nos dias 25, 26 e 27 de maio de 2004, sendo que a venda designada para o dia 25 de maio foi posteriormente adiada para o dia 28 do mesmo mês – cfr. fls. 48 dos autos, fls. 10 do PEF n.º 1872200101031414 e fls. 46 e 66 do PEF n.º 1872200101034480, ambos apensos aos autos.
C) As vendas mencionadas na alínea antecedente foram publicitadas através de anúncios, editais e internet, nos termos constantes de fls. 49, 50, 57 e 58 dos autos, fls. 18, 19, 21 e 22 do PEF n.º 1872200101031414 e fls. 47, 48 e 56 a 58 do PEF n.º 1872200101034480, ambos apensos aos autos.
D) As frações autónomas mencionadas na alínea B) supra foram vendidas em 26, 27 e 28 de maio de 2004 e adjudicadas aos respetivos compradores – cfr. fls. 68 dos autos, fls. 48 do PEF n.º 1872200101031414 e fls. 74 e 75 do PEF n.º 1872200101034480, ambos apensos aos autos.
Mais se provou que,
E) Em 22/10/2001, o liquidatário judicial da massa falida de “Sociedade de Construções…, S.A.”, em sua representação, intentou, por apenso ao processo de falência, ação de impugnação pauliana, entre outros, contra a ora Requerente, pedindo, além do mais, a declaração de ineficácia em relação à massa falida da transmissão operada pela sociedade “Comércio de Pneus…, Lda.” a favor da aqui Requerente, com a consequente restituição à dita massa falida das frações “C”, “D”, “E”, “F”, “G”, “H”, “I”, “J”, “K”, “L”, “N”, “P”, “S”, “W”, “Z” e “EW”, do prédio urbano inscrito na matriz predial da freguesia da Póvoa de Varzim sob o artigo 7…, e respetivo cancelamento dos registos de propriedade – cfr. fls. 299 a 337 dos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
F) Em 20/10/2003, a ora Requerente, na qualidade de arrendatária, outorgou com “R..., Lda.”, na qualidade de locadora, um documento particular denominado de “Arrendamento Comercial”, através do qual a sociedade “R…” declarava dar de arrendamento à aqui Requerente, livre de ónus e encargos, pelo prazo de um ano renovável por iguais períodos e com início a 01/11/2003, as frações autónomas designadas pelas letras “C”, “D”, “E”, “F”, “G”, “H”, “I”, “J”, “K”, “L”, “N”, “P”, “S”, “W”, “Z” e “EW”, do prédio urbano inscrito na matriz predial da freguesia da Póvoa de Varzim sob o artigo 7… – cfr. fls. 61 a 65 do PEF n.º 1872200101034480, apenso aos autos, cujo teor se dá por reproduzido.
G) A ação de impugnação pauliana mencionada na alínea E) supra, que deu lugar à instauração do processo n.º 172-W/1999, que correu termos no 2.º Juízo do Tribunal de Comércio de Vila Nova de Gaia, foi julgada deserta por decisão proferida em 21/01/2008, transitada em julgado em 07/03/2008 – cfr. fls. 398 e 399 dos autos, cujo teor se dá por reproduzido.

2. FACTOS NÃO PROVADOS
Inexistem, com interesse para a decisão.

Motivação:
A convicção do tribunal quanto aos factos dados como provados resultou da análise dos documentos juntos aos autos, os quais não foram impugnados.”
*
2. O Direito

Conforme explicitação nas alegações da Recorrente, a questão a dirimir no presente recurso é apenas apurar se a falta de citação da arrendatária integra nulidade que determine a anulação das vendas tal como requerido nos presentes autos pela Recorrente, na medida em que todas as questões de natureza incidental e exceptiva estão sanadas e resolvidas na presente fase, atenta a decisão proferida sobre as mesmas e das quais não houve recurso.
Na decisão em causa, e seguindo uma opinião doutrinal que se citou na decisão, considerou o tribunal que em relação ao preferente (arrendatária) a nulidade não afectaria o direito do preferente, dado que teria sempre a possibilidade de lançar mão da acção de preferência.
Vejamos o que foi decidido pelo tribunal recorrido a este propósito:
“(…) Resta, pois, apreciar a invocada omissão de notificação da ora Requerente para o exercício do direito de preferência, na qualidade de arrendatária dos prédios vendidos na execução fiscal.
Dispõe o art.º 249º, n.º 7, do CPPT, que os titulares do direito de preferência na alienação dos bens são notificados do dia e hora da entrega dos bens ao proponente, para poderem exercer o seu direito no ato de adjudicação.
Ora, a respeito da falta desta notificação, refere Jorge Lopes de Sousa que “Os titulares de direito de preferência legais ou convencionais com eficácia real que não sejam notificados (por não serem conhecidos ou por se frustrarem as tentativas de notificação) não perderão os respetivos direitos pelo facto de não os exercerem no processo de execução fiscal. Na verdade a falta de notificação tem a mesma consequência que a falta de notificação ou aviso prévio na venda particular (art. 892.º, n.º 2 do CPC), isto é, o direito de preferência subsiste à venda, podendo ser exercido autonomamente, através de uma acção de preferência, a propor no prazo de seis meses, a contar da data em que o titular teve conhecimento dos elementos essenciais da alienação, nos termos do art.º 1410.º do CC. O mesmo sucede com a frustração da notificação do preferente que, nos termos do n.º 4 daquele art. 892.º, não preclude a possibilidade de propor acção de preferência.
Deste regime especial conclui-se que, no caso de ser omitida indevidamente a notificação dos titulares do direito de preferência, apesar de a falta constituir uma irregularidade, não constitui nulidade processual, não implicando a anulação de qualquer dos termos posteriores do processo (como é próprio das nulidades, em face do preceituado no art. 98.º, n.º 3, do CPPT e 201.º, n.º 2, do CPC), designadamente a venda”.
Assim, tendo em conta este douto entendimento, de que aqui nos apropriamos, impõe-se concluir que, ainda que se entenda que a ora Requerente era titular de um direito de preferência resultante da sua qualidade de arrendatária dos imóveis vendidos na execução, mesmo assim não pode arguir a nulidade da venda por omissão da sua notificação para o exercício desse direito, pois essa omissão apenas lhe confere o direito de instaurar uma ação de preferência, para assumir a posição do comprador, ou seja, essa falta de notificação não constitui fundamento determinante da anulação da venda, nos termos do art.º 257º, n.º 1, alínea c), do CPPT. Também por essa razão, a invocada falta de abertura das propostas nos dias indicados nos anúncios e a ausência de comunicação da data concreta dessa abertura, são irrelevantes para efeitos de anulação das vendas. (…)”

Os titulares de direitos de preferência não são citados para a execução fiscal, mas apenas notificados para exercerem o seu direito, pois as suas possibilidades de intervenção processual, a esse título, reduzem-se a esse exercício, nos termos do artigo 249.º, n.º 7 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).
Neste artigo 249.º refere-se apenas que os titulares do direito de preferência são notificados, sem se exigir a notificação com contacto pessoal, pelo que deverá entender-se que estas notificações são efectuadas através de carta registada com aviso de recepção, à semelhança do que se passa na execução comum, dado que na execução fiscal e na execução comum são idênticas as preocupações de certeza na efectivação das notificações (cfr. artigo 892.º, n.º 3 e artigo 233.º, n.º 1 e 2, alínea a), na redacção anterior do CPC).
O artigo 249.º, n.º 7 do CPPT foi chamado à colação pela sentença recorrida, na medida em que a ora Recorrente havia sustentado na sua petição inicial dos presentes autos que “nos termos da lei, os preferentes são citados para a abertura de propostas”, arrogando a sua qualidade de arrendatária e possuidora dos bens.
No entanto, aplicabilidade desta norma falece, desde logo, por falha de um pressuposto basilar: ser a ora Recorrente titular do direito de preferência na alienação dos bens em causa nos processos de execução fiscal em crise.
É verdade que a construção jurídica que é efectuada na sentença recorrida assenta no pressuposto de que a arrendatária, aqui Recorrente, é titular de um direito de preferência: “(…) ainda que se entenda que a ora Requerente era titular de um direito de preferência resultante da sua qualidade de arrendatária dos imóveis vendidos na execução, mesmo assim não pode arguir a nulidade da venda por omissão da sua notificação para o exercício desse direito (…)”.
Contudo, não faz sentido avançarmos se a factualidade apurada nos permite, com segurança, concluir não ser a mesma titular do direito de preferência.
Resulta da alínea F) da matéria de facto assente que, em 20/10/2003, a ora Requerente, na qualidade de arrendatária, outorgou com “R…, Lda.”, na qualidade de locadora, um documento particular denominado de “Arrendamento Comercial”, através do qual a sociedade “R…” declarava dar de arrendamento à aqui Requerente, livre de ónus e encargos, pelo prazo de um ano renovável por iguais períodos e com início a 01/11/2003, as fracções autónomas designadas pelas letras “C”, “D”, “E”, “F”, “G”, “H”, “I”, “J”, “K”, “L”, “N”, “P”, “S”, “W”, “Z” e “EW”, do prédio urbano inscrito na matriz predial da freguesia da Póvoa de Varzim sob o artigo 7….
Ora, o arrendatário de prédio urbano ou de suas fracções autónomas tem o direito de preferência na compra e venda do local arrendado há mais de um ano – cfr. artigo 47.º, n.º 1 do Regime do Arrendamento Urbano, na redacção vigente em 2004.
Na verdade, o arrendamento denominado comercial iniciou-se em 01/11/2003, pelo que, na data em que estava agendada a venda (25/05/2004), somente havia decorrido pouco mais do que seis meses de arrendamento das fracções em causa; inviabilizando concluir que a arrendatária fosse titular do direito de preferência na compra e venda das fracções arrendadas.
Aqui chegados, é irrelevante, em face da factualidade apurada, retirar quaisquer ilações acerca da existência ou não de citação (como alegado) ou de notificação da Recorrente, na qualidade de arrendatária, para exercício de direito de preferência, uma vez não ser titular desse direito. Logo, não ocorreu sequer qualquer omissão do disposto no artigo 249.º, n.º 7 do CPPT, na medida em que é inaplicável à situação concreta.
Por outro lado, nos termos do disposto no artigo 239.º do CPPT, apenas os credores com garantia real sobre os bens penhorados são citados pessoalmente para a execução.
As garantias reais, como direitos reais que são, só existem nos casos previstos na lei, como se infere do preceituado no artigo 1306.º do Código Civil.
São direitos reais de garantia propriamente ditos a consignação de rendimentos (cfr. artigos 656.º a 665.º do Código Civil), o penhor (artigos 666.º a 685.º do Código Civil), a hipoteca (artigos 686.º a 732.º do Código Civil), os privilégios creditórios especiais (artigos 733.º a 735.º, 738.º, 748.º e 750.º a 752.º do Código Civil) e o direito de retenção (artigos 754.º a 761.º do Código Civil). Como tal deverão, ainda, considerar-se, para este efeito, o arresto não convertido em penhora e a penhora noutra execução, por lhes ser atribuído o efeito de preferência sobre qualquer outro credor que não tenha garantia real anterior (artigos 622.º, n.º 2 e 822.º, n.º 1 e 2 do Código Civil).
Ora, da prova, dos elementos ínsitos nos autos e da factualidade apurada não resulta sequer que a aqui Recorrente seja credora da executada, muito menos que o seja com garantia real sobre os bens penhorados; pelo que também pelo disposto no artigo 239.º do CPPT não tinha que ser citada – cfr. tese da Recorrente nas suas conclusões das alegações de recurso A) e C).
Nesta conformidade, é, mais uma vez, irrelevante, em face da factualidade apurada, retirar quaisquer ilações acerca da existência ou não de citação da Recorrente, na qualidade de arrendatária, para permitir a prossecução das execuções, por não ser credora com garantia real relativamente aos bens penhorados. Logo, não ocorreu também qualquer omissão do disposto no artigo 239.º do CPPT, na medida em que é inaplicável à situação concreta.
Pelo exposto, improcedem todas as conclusões das alegações de recurso e, consequentemente, não merece provimento o presente recurso; não se vislumbrando quaisquer fundamentos para anulação das vendas em causa.

Conclusões/Sumário

I - In casu, o arrendatário não tinha que ser citado, para efeitos do disposto no artigo 239.º, n.º 1 do CPPT, por não ser credor preferente.
II - De igual forma, não tinha que ser notificado, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 249.º, n.º 7 do CPPT, por não ser titular do direito de preferência na alienação dos bens em causa.

IV. Decisão

Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso.

Custas a cargo da Recorrente, nos termos da tabela I-B – cfr. artigos 6.º, n.º 2, 7.º, n.º 2 e 12.º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais.

Porto, 25 de Junho de 2015.
Ass. Ana Patrocínio
Ass. Ana Paula Santos
Ass. Fernanda Esteves