Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01664/19.7BEBRG
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:06/04/2020
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Paulo Ferreira de Magalhães
Descritores:RECLAMAÇÃO DE ACTO PRATICADO PELO ÓRGÃO DA EXECUÇÃO FISCAL; APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO; PRESCRIÇÃO; INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO; FUNDAMENTAÇÃO.
Sumário:1 - Havendo sucessão de leis no tempo, a lei nova é competente para determinar os efeitos sobre o prazo de prescrição que têm os factos que ocorrem na sua vigência, por força do disposto no artigo 12.° do Código Civil.

2 - Ocorrendo várias causas de interrupção da prescrição antes da entrada em vigor da nova redacção do artigo 49.°, n.º 3 da LGT, introduzida pelo artigo 89.° da Lei 53-A/2006, de 29 de dezembro, devem todas elas ser consideradas.

3 - A redacção actual do artigo 49.°, n.º 3 da LGT, estabelecendo expressamente que a interrupção se opera uma única vez, aplica-se apenas aos factos interruptivos verificados após o início da vigência do diploma que introduziu a alteração da norma.

4 – Nos termos dos artigos 326.º, n.º 1 e 327.º, n.º 1, ambos do Código Civil, o facto interruptivo inutiliza para a prescrição o prazo decorrido até à sua verificação e o novo prazo só começa a correr com a decisão final (que seja dada no processo de natureza administrativa), a decisão que puser termo ao processo de execução fiscal ou o trânsito em julgado da decisão (proferida em processo judicial).

5 - A fundamentação, ainda que sucinta, deve ser suficiente para convencer (ou não) o interessado e permitir-lhe a sindicância jurisdicional do acto.*
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:A., Lda.
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:


I - RELATÓRIO


A., Ld.ª, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da Sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, datada de 13 de Dezembro de 2019, que julgou totalmente improcedente a Reclamação por si apresentada do despacho datado de 01 de Julho de 2019 proferido pelo Director de Finanças de (...), e que em consequência, decidiu pela improcedência do pedido de extinção da execução por si requerido com fundamento na prescrição da dívida, assim como quanto ao pedido subsidiário de alargamento do plano prestacional relativo ao PEF em curso, bem como ao vício de falta de fundamentação da decisão de indeferimento do alargamento do número de prestações mensais para 5 anos.

No âmbito das Alegações por si apresentadas [Cfr. fls. dos autos em suporte físico], elencou a final as conclusões que ora se reproduzem:

CONCLUSÕES
1. Vem o recurso interposto da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal (doravante TAF) de Braga, datada de 13/12/2019, que julgou totalmente improcedente a reclamação do despacho proferido pelo Órgão de Execução Fiscal (doravante OEF), Serviço de Finanças de (...) 2, apresentado pela Executada, ora Recorrente.
2. Desde logo, não pode a Recorrente aderir a esta tese do tribunal a quo e conformar-se com os efeitos mediatos e imediatos que a decisão daí vertida acarreta para a sua esfera jurídica.
3. Em primeiro lugar, e cautelarmente, por dever de patrocínio, cumpre dilucidar o instituto e correspondente regime da prescrição das dívidas tributárias que consiste na extinção do direito, que assiste ao Estado, de exigir determinada dívida tributária ao contribuinte ou a um outro responsável tributário.
4. O prazo prescricional para as dívidas tributárias é de 8 anos, contados a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou a exigibilidade do imposto relativamente ao imposto sobre o valor acrescentado – art.º 48, n.º 1 da LGT, DL n.º 398/98, de 17 de Dezembro na redação atual da Lei n.º 32/2019, de 03/05.
5. No que concerne à LGT, o regime da interrupção, a LGT (art.º 49, n.º1) dispõe que a citação (facto interruptivo que ora nos importa), interrompe a prescrição, uma única vez (n.º2), ou seja prevê uma única interrupção, não sucessiva, dando lugar a duas interpretações que contendem diretamente com a questão de saber se, adstrito às causas de interrupção da prescrição aqueles terão efeito duradouro (tal como o consagrada na lei civil) ou instantâneo/imediato.
6. Considera a Recorrente que uma vez verificado o facto que causa a interrupção da contagem do prazo prescricional, este recomeça a contar de imediato, uma vez que o facto que o interrompeu tem um efeito instantâneo, não carecendo de aguardar pelo trânsito em julgado da decisão.
7. O efeito duradouro que se pretende inferir ex vi dos artigos 326 e 327º do CC, não se compatibiliza com interesses basilares que se visam tutelar com o regime da prescrição tributária, porquanto a interpretação à luz da lei civil significa que a interrupção da prescrição tem, na prática, um efeito suspensivo “agravado” do prazo pois nem sequer é possível recuperar o prazo antes decorrido.
8. À interrupção da prescrição, enquanto facto instantâneo e não duradouro, não pode, concomitantemente associar-se uma suspensão com natural efeito duradouro, porquanto tal interpretação não encontra qualquer acolhimento na Lei Geral Tributária, que ao contrário do Código Civil, aquele diploma legal não faz qualquer referência ao facto de o prazo apenas se reiniciar com o termo do processo que despoletou a interrupção.
9. Sem prescindir, não foi intenção do legislador aplicar ao regime da prescrição tributária expressamente regulado, o que vem vertido no artigo 327º do CC.
10. Não existem quaisquer lacunas que mereçam ser colmatadas com recurso ao regime civil, pelo que sempre se deverá concluir pelo efeito instantâneo da interrupção da prescrição das dívidas tributárias.
11. O tribunal a quo, reaviva na douta sentença recorrida, que durante muitos anos a legislação tributária continha – de forma EXPRESSA - a definição de interrupção da prescrição – cfr. o art.º 27º do CPCI, o art.º 34º do CPT e o art.º 48º da LGT até à alteração introduzida pela Lei n.º 53-A/2006, de 29/12 – sempre no sentido de conferir efeito duradouro a todos os atos interruptivos, já que a prescrição não corria após esses atos e só voltava a correr caso cessasse esse efeito duradouro por mor da paragem do processo por facto não imputável ao contribuinte.
12. É manifesta e clara a intenção do legislador em expurgar do ordenamento jurídico tributário aquele efeito duradouro da interrupção da prescrição.
13. Aquando da alteração pela Lei n.º 53-A/2006, de 29/12 ao CPPT, e nas sucessivas alterações, até à sua redação atual, o legislador não fez qualquer remissão ou transposição da interpretação daquelas regras para o ordenamento tributário.
14. Ademais, a aplicação do atual regime da prescrição, considerando que o prazo de se interrompe, uma única vez, por um dos factos previstos no art 49.º, n.º 1 LGT, com efeito duradouro, enquanto não houver decisão definitiva ou transitada em julgado, que ponha termo ao processo (n.º 4 do mesmo artigo), aliada à morosidade das decisões administrativas e judiciais e inércia da AT, pode levar facilmente a que os prazos de prescrição, atinjam e cheguem mesmo a ultrapassar as duas décadas!
15. No caso em concreto, na esteira da tese de que se socorre o tribunal a quo, considerando, que os factos tributários ocorreram respetivamente a 01/01/2007, 01/01/2008 e 01/01/2009, o prazo prescricional passa a ser mais do dobro de anos considerados para efeitos do art.º 48.º, n.º 1!
16. Tal solução viola de forma categórica os princípios de proporcionalidade e interesse público intrínsecos à atuação da Administração Pública e conformadores do Estado de Direito Democrático!
17. Esta interpretação/aplicação do regime da prescrição posterga cabalmente as garantias dos contribuintes à tutela jurisdicional efetiva e direito à justiça num prazo razoável.
18. À luz da teoria do efeito instantâneo, citada a Recorrente a 30/03/2009, o prazo prescrição até aí decorrido interrompe-se e é dado sem efeito, começando a correr novo prazo com a duração de 8 anos, com término a 30/03/2017 e sendo essa a data da prescrição daquela dívida com origem em liquidações adicionais de IVA.
19. Face ao ora exposto, entende a Recorrente, que sempre se deverá atribuir efeito instantâneo ao facto interruptivo, porquanto é essa interpretação que melhor se arquiteta com as garantias dos contribuintes, sem prejuízo do interesse público de uma cobrança eficaz e célere.
20. Por tudo quanto foi exposto, dúvidas não restam quanto à inconstitucionalidade material de que enferma a interpretação dos preceitos da prescrição das dívidas tributárias à luz da lei civil, porque restringe os direitos, liberdades e garantias dos contribuintes para além do necessário para salvaguardar as necessidades financeiras do Estado e a justa repartição da riqueza, sem exceção para o caso concreto, aquela interpretação acolhida pelo Tribunal a quo, viola diretamente os princípios da proporcionalidade e prossecução do interesse público, constitucionalmente consagrados nos artigos 18.º, n.º 2 e 266.º, n.º 2 da Constituição da Republica Portuguesa.
21. A interpretação do efeito duradouro dos factos que interrompem o prazo prescricional, que propicia a inércia da Autoridade Tributária relativamente aos processos de execução fiscal e morosidade das decisões judiciais sempre contenderá com direito dos cidadãos à obtenção de justiça num prazo razoável e ao direito à tutela jurisdicional efetiva – arts. 20º e 268º, n.º 4 CRP - , bem como com o princípio da tutela da confiança legítima inerente à ideia de Estado de Direito Democrático – art.º 2º CRP.
22. Por fim, não pode deixar de considerar que a posição adotada pelo tribunal a quo assente no elemento literal do n.º 1 do Artigo 49.º da LGT, de que o prazo prescricional não se inicia enquanto não transitar em julgado a decisão que ponha termo a reclamação, recurso hierárquico ou impugnação judicial, sempre se socorrerá da interpretação analógica com recurso às normas dos artigos 326.º e 327.º do CC para validade tal interpretação.
23. O que constitui, indubitavelmente, uma violação da proibição do recurso à analogia em matéria respeitante a garantias dos particulares e consequentemente uma violação do princípio da legalidade – art.º 266º, n.º2.
24. A douta sentença recorrida, enferma de inconstitucionalidade material, na medida da incorreta interpretação e desvirtuada aplicação do disposto nos artigos 48º e 49º da LGT e 326º e 327º do CC.
25. Demonstrada a prescrição da dívida, pelo menos desde 30/03/2017, e exigida pela administração tributária, no âmbito do processo de execução fiscal mencionado, desde já pugna a Recorrente pela sua extinção.
26. Sem prescindir, verifica-se um claro vício de falta de fundamentação da decisão que incidiu sobre o pedido de alargamento do número de prestações e que não mereceu consideração, ainda que não tenha sido acolhida pela decisão recorrida.
27. A Recorrente/Executada, requereu que fosse aumentado o número de prestações para pagamento, pois se é verdade que se mantêm os encargos e demais obrigações de pagamento pendentes, que decorrem do exercício da atividade pela Recorrente, também é verdade que estas se tornam incomportáveis com o pagamento mensal de um valor de quase 20.000€.
28. Nestes termos, uma vez que a dívida excede 500 unidades de conta, requereu a executada ao órgão de execução fiscal que fosse alargado o número de prestações mensais para 5 anos, nos termos do disposto no artigo 96.º, n.º 5 do CPPT.
29. Perante o pedido apresentado nestes termos, o tribunal a quo acompanha a primeva decisão do órgão de execução fiscal, entendendo "legalmente possível aplicar o n.º 5do art.º 196 do CPPT”, não assistindo razão à Recorrente.
30. Acrescenta ainda que “tal fundamentação já havia sido comunicada à reclamante aquando da notificação da decisão do deferimento do pagamento em 24 prestações, donde resulta, de forma expressa, clara e congruente que, em face da natureza das dívidas, (...), não estavam reunidos os pressupostos para a autorização do pagamento nos termos do n.º 5 do art.º 196.º do CPPT (50 prestações), tendo em vista o que dispõe o n.º 2 do art.º 196º do CPPT.”
31. Reconhece ainda que o plano de pagamento foi interrompido em virtude de nenhuma prestação ter sido paga.
32. Posto isto, reafirma-se ora em sede do presente recurso, que fica por esclarecer o motivo de tal conclusão, considerando que o aludido preceito (o artigo 196º, n.º 5 do CPPT) determina que "Nos casos em que se demonstre notória dificuldade financeira e previsíveis consequências económicas para os devedores, poderá ser alargado o número de prestações mensais até 5 anos, se a dívida exequenda exceder 500 unidades de conta no momento da autorização, não podendo então nenhuma delas ser inferior a10 unidades da conta”.
33. Escusou-se a Autoridade Tributária de fundamentar, devidamente, a sua decisão, no sentido da não aplicação do artigo 196.º, n.º 5 do CPPT.
34. A fundamentação deve ser "i) oficiosa, o que significa que ela não está dependente de pedido do interessado, mas antes constitui um verdadeiro dever de agir da parte dos órgãos administrativos tributários, em face da vertente publicista das atuações destes; ii) completa, ou seja, a Administração deverá indicar todos os elementos necessários à tomada de decisão, não sendo de admitir fundamentações; parciais ou incompletas (embora possa ser uma fundamentação sumária); iii) clara, o que significa que deverá ser formulada sem apelo a demasiados conceitos ou expressões técnicas, e não deverá conter obscuridades, ambiguidades ou contradições. Neste sentido, exige a CRP que a fundamentação seja "acessível"; iv) atual, devendo ela ser (totalmente) efetuada no momento da comunicação da decisão e não posteriormente; e v) expressa, o que quer dizer que deverá ser emitida de modo direto e concludente, não podendo ser implícita ou tácita".
35. "A falta destes requisitos - fundamentações incompletas, obscuras, abstratamente remissivas bem assim como a falta da própria fundamentação, constitui ilegalidade, suscetível de conduzir à anulação do ato em causa, mediante meios graciosos ou contenciosos" (cf. Joaquim Freitas da Rocha, Lições de Procedimento e Processo Tributário, 6. a edição, Coimbra, Almedina, 2018, p. 147 e seguintes).
36. Nestes termos, deverá o pedido de alargamento do número de prestações ser deferido, anulando-se a decisão que o rejeitou, a qual padece de ilegalidade por falta de fundamentação.
37. Termos em que deve ser o presente recurso julgado totalmente procedente.
38. A douta sentença recorrida viola e não faz uma correta aplicação dos artigos 48º e 49º da LGT, 326º e 327º do Código Civil, 2º, 18.º, nº 2, 20º, 266.º, nº 2 e 268.º, nº 4, todos da CRP.
Nestes termos e nos melhores de direito deve a sentença recorrida ser revogada, julgando-se procedente por provado o presente recurso, como é de DIREITO E JUSTIÇA![…].”
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A Recorrida Fazenda Pública, não apresentou Contra-alegações.
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O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.
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Com dispensa dos vistos legais [Cfr. artigos 36.º, n.º 2, do Código de Processo dos Tribunais Administrativos e 657.º, n.º 4, do Código de Processo Civil], cumpre agora apreciar e decidir, visto que nada a tal obsta.

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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR
Cumpre então apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, cujo objecto do recurso está delimitado pelas conclusões das respectivas alegações - Cfr. artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.ºs 4 e 5, todos do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigo 2.º, alínea e) e artigo 281.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) –, e que se centram, em suma, em saber se ocorre erro de julgamento em matéria de direito, por a Sentença recorrida não ter declarado a prescrição das dívidas tributárias, e por ter mantido o indeferimento do período de alargamento do número de prestações mensais, assim como da não ocorrência do vício de falta de fundamentação.
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III - FUNDAMENTOS
IIIi - DE FACTO

No âmbito da factualidade considerada pela decisão recorrida, dela consta o que por facilidade para aqui se extrai como segue:

III - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

1.1) FACTOS PROVADOS

Consideram-se provados, com relevância para a decisão da causa, os factos que infra se indicam:

1) Em 25/03/2009 foi instaurado pelo Serviço de Finanças de (...) 2, contra a reclamante, o processo de execução fiscal n.º 3590200901009141, para cobrança coerciva de dívidas de IVA e juros compensatórios referentes aos períodos 2006/03, 2006/05, 2006/11, 2006/12, 2007/01, 2007/06, 2007/11 e 2008/02, no montante global de € 314.969,56 (facto não controvertido, cfr. documento 2 junto com a resposta, consulta, via SITAF, da oposição à execução fiscal, processo n.º 772/09.7BEBRG, 3 UO, TAF de Braga).

2) A reclamante foi citada no âmbito do processo de execução fiscal identificado em 1), em 30/03/2009 (consulta, via SITAF, da oposição à execução fiscal, que correu termos na 3 UO, TAF de Braga, sob o n.º 772/09.7BEBRG, e que foi apresentada pela reclamante na sequência da sua citação no âmbito do processo de execução fiscal identificado em 1)).

3) Em 05/02/2009 o reclamante apresentou impugnação judicial das liquidações de IVA e juros compensatórios que estão na origem do processo de execução fiscal identificado em 1), e que correu termos neste Tribunal sob o n.º 283/09.0BEBRG (facto não controvertido, consulta SITAF do processo de impugnação judicial n.º 283/09.0BEBRG; e ponto 24 da petição inicial).

4) Em 19/01/2010 foi proferida sentença no processo de impugnação judicial identificado no ponto antecedente que julgou improcedente a referida impugnação, não tendo sido apresentado recurso da mesma (consulta SITAF do processo de impugnação judicial n.º 283/09.0BEBRG).

5) Em 08/05/2009, o reclamante deduziu oposição à execução fiscal identificada em 1), que correu termos neste Tribunal sob o n.º 772/09.7BEBRG (facto não controvertido, cfr. documento 4 junto com a resposta; consulta, via SITAF, da oposição à execução fiscal, processo n.º 772/09.7BEBRG, 3 UO, TAF de Braga).

6) Em 18/10/2017 foi proferida sentença no processo de oposição à execução fiscal identificado no ponto antecedente, que julgou a oposição totalmente improcedente, não tendo sido apresentado recurso da mesma (cfr. documento 4 junto com a resposta; consulta, via SITAF, da oposição à execução fiscal, processo n.º 772/09.7BEBRG, 3 UO, TAF de Braga).

7) Em 14/06/2018 foi proferido despacho pelo Diretor de Finanças de (...) a autorizar à reclamante o pagamento da dívida exequenda identificada em 1) em 24 (vinte e quatro) prestações, com fundamento na informação que infra se transcreve (cfr. fls. 34 a 37 do suporte eletrónico dos autos):
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

8) Em 20/12/2018 a reclamante apresentou requerimento junto do órgão de execução fiscal, no qual peticionou a extinção do processo de execução fiscal identificado em 1) com fundamento na prescrição da dívida exequenda, e o alargamento do número de prestações para pagamento da quantia exequenda (facto não controvertido).

9) Em 26/06/2019 sobre o requerimento identificado no ponto antecedente recaiu informação, elaborada por técnico da Direção de Finanças de (...), com o seguinte teor (cfr. fls. 38 do suporte eletrónico dos autos):
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

10) Em 27/06/2019, com base na informação antecedente, foi proposto pelo Diretor Adjunto da Direção de Finanças que “não seja proferida decisão quanto ao pedido subsidiário, quer por inexistir dever de decisão, quer em virtude do plano de pagamento em prestações das dívidas tributárias ter sido incumprido pela Requerente e, por conseguinte, se revelar inútil tal pedido” (cfr. fls. 39 do suporte eletrónico dos autos).

11) Em 01/07/2019, sobre a proposta que antecede recaiu despacho de concordância proferido pelo Diretor de Finanças de (...) (cfr. fls. 39 do suporte eletrónico dos autos).

12) Através do ofício n.º 3590/2588/2019, datado de 08/07/2019, do Serviço de Finanças de (...) 2, foi remetido ao mandatário da reclamante, por via postal registada com aviso de receção, o despacho identificado no ponto antecedente (cfr. fls. 73 a 75 do suporte eletrónico dos autos).

13) Em 24/07/2019 o reclamante solicitou esclarecimentos quanto ao despacho identificado em 10) (facto não controvertido).

14) Em 06/08/2019 sobre o requerimento identificado no ponto antecedente recaiu informação, elaborada por técnico da Direção de Finanças de (...), com o seguinte teor (cfr. fls. 40 e 41 do suporte eletrónico dos autos):
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

15) Em 26/08/2019, sobre a informação que antecede recaiu despacho de proferido pelo Diretor de Finanças de (...) com o seguinte teor (cfr. fls. 39 do suporte eletrónico dos autos): “Concordo. Notifique-se o requerente”.

16) A presente reclamação deu entrada no Serviço de Finanças de (...) 2, em 29/08/2019 (cfr. fls. 33 do suporte eletrónico dos autos).

1.2) FACTOS NÃO PROVADOS

Não existem factos não provados com relevância para a decisão da causa.

Motivação

O Tribunal formou a sua convicção relativamente a cada um dos factos dados como provados tendo por base a análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos, os quais não foram objeto de impugnação, no processo de execução fiscal, bem como no posicionamento das partes assumido nos respetivos articulados, conforme discriminado nos vários pontos da fundamentação de facto.”
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III - DE DIREITO

Está em causa a Sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, datada de 13 de Dezembro de 2019, que julgou totalmente improcedente a Reclamação por si apresentada do despacho datado de 01 de Julho de 2019 proferido pelo Director de Finanças de (...) [doravante OEF], e que em consequência, decidiu pela improcedência do pedido de extinção da execução por si requerido com fundamento na prescrição da dívida, assim como quanto ao pedido subsidiário de alargamento do plano prestacional relativo ao PEF em curso, bem como do vício de falta de fundamentação da decisão de indeferimento do alargamento do número de prestações mensais para 5 anos.

Os recursos jurisdicionais constituem os meios específicos de impugnação de decisões judiciais, por via dos quais os recorrentes pretendem alterar as Sentenças recorridas, nas concretas matérias que os afectem e que sejam alvo da sua sindicância, razão pela qual é necessário e imprescindível que no âmbito das alegações de recurso, os recorrentes prossigam de forma clara e objectiva as premissas do silogismo judiciário em que se apoiou a decisão recorrida, por forma a evidenciar os erros em que a mesma incorreu.

Cumpre então apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, cujo objecto do recurso está delimitado pelas conclusões das respectivas Alegações, ou seja, as conclusões delimitam a área de intervenção do tribunal ad quem, e que se centram em saber se a Sentença recorrida incorreu em erro de julgamento em torno do direito aplicável.

Conforme dimana das conclusões das suas Alegações de recurso, a Recorrente aduz nesta sua pretensão recursiva, que o Tribunal recorrido não fez uma correta aplicação dos artigos 48.º e 49.º, ambos da LGT, e 326.º e 327.º, ambos do Código Civil, assim como dos artigos 2.º, 18.º, n.º 2, 20.º, 266.º, n.º 2 e 268.º, n.º 4, todos da CRP, sustentando para tanto, em termos similares aos que já havia perseguido na Reclamação deduzida, no sentido, em suma, de que tinha ocorrido a prescrição dos tributos em apreço [IVA dos períodos compreendidos entre março de 2016 e fevereiro de 2008], e bem assim, de que o Tribunal a quo acolheu na Sentença recorrida, erradamente, a não ocorrência do vício de falta de fundamentação da decisão que incidiu sobre o pedido de alargamento do número de prestações, pois que havia requerido ao OEF que fosse aumentado o número de prestações para pagamento, já que para além de se manterem os encargos e demais obrigações de pagamento pendentes que decorrem do exercício da sua atividade, que as prestações se tornam incomportáveis com o pagamento mensal de um valor de €20.000,00.

Neste patamar.

A Recorrente apenas não concorda com o julgamento tirado pelo Tribunal a quo, no sentido da não verificação da prescrição das dívidas tributárias, por considerar [a Recorrente] que se deve atribuir efeito instantâneo ao facto interruptivo atinente à sua citação, ocorrida em 30 de março de 2009, dando-se por isso sem efeito o tempo até aí decorrido, e que a partir daí começa a correr novo prazo de 8 anos, cujo termo ocorre em 30 de março de 2017, tempo em que no seu entender se dá a prescrição das dívidas com origem em liquidações adicionais de IVA, e que assim não tendo sido julgado pelo Tribunal, que se têm por violados, na base dessa interpretação, os normativos constitucionais por si elencados, atinentes, designadamente à tutela jurisdicional efectiva, aos princípios da proporcionalidade e interesse público intrínsecos à actuação da Administração Pública, e ainda também a prossecução pelo Tribunal recorrido de uma aplicação desvirtuda do disposto nos artigos 48.º e 49.º da LGT, e 326.º e 327.º do CC, elevanando-a a um plano de inconstitucionalidade material, pontuando a final pela imputação de erro de julgamento, por não ter o Tribunal a quo julgado ocorrer o vício de falta de fundamentação em torno do pedido de alargamento do número de prestações.

Ou seja, não constitui questão submetida ao julgamento deste TCA Norte, apreciar e decidir sobre se o prazo de prescrição aplicável às dívidas em causa é de 8 anos, e se o termo inicial de contagem desse prazo se deu em 01 de janeiro de 2007, assim como não o é o facto de o prazo de prescrição que estava em curso à data em que a Executada [ora Recorrente] foi citada [em 30 de março de 2009] ter sido interrompido por efeito dessa citação, antes apenas, reside a questão nuclear em apreciar e decidir sobre se a interrupção da prescrição decorrente da citação da Executada [ora Recorrente] tem mero efeito instantâneo, no sentido de se inutilizar para a contagem do prazo prescricional o período temporal até aí decorrido, e que a partir desse momento se inicia um novo prazo, ou se também tem efeito duradouro, no sentido de obstar a que o novo prazo comece a correr até que seja posto termo ao termo do processo de execução fiscal.

Ora, da fundamentação expendida na Sentença recorrida extrai-se que se concluiu pela não prescrição dos tributos em causa, e bem assim, que não ocorre falta de fundamentação da decisão que incidiu sobre o pedido de alargamento do número de prestações.

Em sede da apreciação do julgamento da não ocorrência da prescrição das dívidas tributárias em causa, o Tribunal recorrido decidiu nos termos que para aqui se extraem como segue:

“[...]
Estão em causa nos presentes autos dívidas de IVA dos períodos compreendidos entre março de 2006 e fevereiro de 2008 (cfr. ponto 1) dos factos provados).
De acordo com o princípio geral de aplicação da lei no tempo - de que a lei só dispõe para o futuro - plasmado designadamente nos artigos 2º da Constituição da República Portuguesa (CRP), e 12º do Código Civil (CC), a lei reguladora do regime de prescrição das obrigações tributárias é a que vigorar à data da sua constituição (data em que tiver ocorrido o facto tributário).
Com efeito, a prescrição, enquanto causa extintiva da relação jurídica obrigacional, é matéria de direito substantivo, pelo que ter-se-á de atender, por regra, ao regime prescricional vigente no momento da constituição da relação jurídico-tributária.
À data da constituição das dívidas em apreço – 2006 a 2008, encontrava-se já em vigor a Lei Geral Tributária, encontrando-se a prescrição disciplinada no seu art.º 48.º.
[...]
Com efeito, a partir de 2005 a redação do art.º 48.º, n.º 1, in fine, da LGT, por força da Lei nº 55-B/2004, de 30 de dezembro, passou a apontar como termo inicial do prazo de prescrição, independentemente da natureza de imposto de obrigação única ou periódico, o início do ano seguinte àquele em que se verificou a “exigibilidade” do imposto ou o facto tributário.
Assim, no que diz respeito às dívidas de IVA de 2006, o prazo de prescrição começa a contar a partir do ano seguinte àquele em que o facto tributário ocorreu, ou seja, a partir de 01/01/2007 e terminaria, caso nenhuma causa de suspensão ou interrupção houvesse, em 31/12/2014.
Já no que respeita às dívidas de IVA de 2007, o prazo de prescrição começa a contar a partir de 01/01/2008 e terminaria, caso nenhuma causa de suspensão ou interrupção houvesse, em 31/12/2015.
E, por último, que respeita às dívidas de IVA de 2008, o prazo de prescrição começa a contar a partir de 01/01/2009 e terminaria, caso nenhuma causa de suspensão ou interrupção houvesse, em 31/12/2016.
Refira-se, no entanto, que uma coisa é o prazo de prescrição, sendo aplicável em caso de sucessão de regimes legais o disposto no art.º 297° do Código Civil, e outra são os factos interruptivos e/ou suspensivos da prescrição, aos quais se aplica a lei em vigor à data da sua ocorrência, conforme resulta do art.º 12º do Código Civil, e o Supremo Tribunal Administrativo tem afirmado de forma reiterada (cfr. Acórdãos de 06/11/2008, recurso n.º 0828/08, de 11/03/2009, recursos n.º 01033/08 e n.º 050/09, e de 24/03/2010, recurso n.º 01187/09, todos disponíveis em www.dgsi.pt).
Deste modo, e a título meramente exemplificativo, nada impede que se aplique o prazo de prescrição previsto no CPT e se possam aplicar factos suspensivos ou interruptivos da prescrição previstos noutros diplomas e/ou noutras redações do mesmo diploma. Tudo dependerá do momento em que tais factos ocorrerem, e da lei vigente nesse momento.
[...]
Em suma, as causas de interrupção ou suspensão da prescrição atendíveis para o cômputo em concreto do prazo de prescrição são as previstas na lei vigente à data da respetiva ocorrência, em conformidade com o disposto no n.º 2 do art.º 12º do Código Civil, motivo pelo qual haverá que averiguar quais as causas interruptivas do decurso do prazo prescricional das dívidas subjacentes ao processo de execução fiscal n.º 3590200901009141, e o regime legal instituído aquando da ocorrência de tais causas interruptivas/suspensivas.
No caso vertente, de acordo com o que resulta dos factos considerados provados, a reclamante foi citada no âmbito do processo de execução fiscal n.º 3590200901009141, em 30/03/2009 (cfr. ponto 2) dos factos considerados provados).
[...]
De harmonia com o disposto no artigo 49.º n.º 3 da LGT, na redação introduzida pela Lei 53-A/2006, de 29 de dezembro (LOE 2007) a interrupção tem lugar uma única vez, com o facto que se verificar em primeiro lugar.
Saliente-se, porém, que a Lei de Orçamento de Estado de 2007 entrou em vigor em 1 de janeiro de 2007, e, sendo uma norma sobre os efeitos dos factos, ela só se aplica após a sua entrada em vigor, por força do estatuído no artigo 12.º, nº 2 do Código Civil.
Temos assim que, em relação às dívidas tributárias relativas a IVA dos períodos compreendidos entre março de 2006 e fevereiro de 2008, o primeiro facto interruptivo ocorrido após 1 de janeiro de 2007 foi a citação da reclamante, que ocorreu em 30/03/2009, pelo que, o período que decorreu desde o início do prazo de prescrição (01/01/2007), até à citação da reclamante (30/03/2009) é eliminado pelo facto interruptivo da citação da reclamante, nos termos do art.º 326.º, n.º 1 do Código Civil.
Acresce que, a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo tem firmado o entendimento de que a interrupção da prescrição decorrente da citação do executado inutiliza para a prescrição o tempo decorrido até à data em que se verificou o facto interruptivo, e obsta ao início da contagem do novo prazo de prescrição enquanto o processo executivo não findar, nos termos do art.º 326.º, n.º 1, e 327.º, n.º 1 do Código Civil.
[...]
Destarte, tendo a citação da reclamante interrompido a prescrição, em 30/03/2009, não corre novo prazo enquanto o processo não findar, daí que até à data não ocorreu a prescrição.
Assim sendo, manifesto é não estarem prescritas as dívidas exequendas, sendo irrelevante determinar se o prazo de prescrição se suspendeu.
Concluindo, então, temos que na data da citação da reclamante - 30/03/2009 - ainda não se havia completado o prazo de prescrição; a citação interrompeu a prescrição com a inutilização do prazo anteriormente decorrido (art.º 49º da LGT). Desde a data da citação o prazo não voltou a correr, pois que, ainda hoje, encontra-se a decorrer o efeito duradouro de paralisação, que implica que o novo prazo não começa a correr enquanto não transite em julgado ou não forme caso decidido a decisão que ponha termo ao processo que provocou o efeito interruptivo, ou seja, o processo de execução fiscal (cfr. neste sentido, o acórdão do STA de 09.05.2012, proferido no processo nº 0282/12).
Face ao exposto, conclui-se pela não prescrição dos tributos em causa nos presentes autos.
[...]“

Como julgamos, é grande o acerto do assim julgado pelo Tribunal recorrido.

Efectivamente, não dispondo a lei tributária em torno da definição de “prescrição”, e outro tanto também nada dispondo a respeito dos efeitos a atribuir aos factos interruptivos e suspensivos do prazo que seja convocável [in casu, de 8 anos, atento o disposto no artigo 48.º, n.º 1 da LGT e a natureza do imposto em causa], atenta a unidade do sistema jurídico, a dilucidação em torno das questões suscitadas nesse domínio tem de ser encontrada a partir do disposto no artigo 49.º da LGT, concatenado com o que prevê nesse domínio a aplicação do direito comum, mormente, do que a esse respeito dispõe o Código Civil, - v.g., o disposto nos artigos 326.º, n.º 1, e 327.º, n.º 1, ambos do Código Civil -, já que a tanto dá cobertura o disposto no artigo 2.º, alínea d) da LGT.

Conforme bem sentenciou o Tribunal recorrido, estando em causa dívidas tributárias reportadas a IVA dos períodos compreendidos entre março de 2006 e fevereiro de 2008, e tendo a citação da Reclamante, ora Recorrida, ocorrido em 30 de março de 2009 – Cfr. ponto 2 do probatório -, que foi o primeiro facto interruptivo ocorrido após 1 de janeiro de 2007 [e tendo presente a redação do artigo 49.º da LGT introduzida pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro], face ao disposto no artigo 12.º, n.º 2 do Código Civil, o período de tempo transcorrido entre o início do prazo prescricional, em 01 de janeiro de 2007, e a data da citação da ora Recorrente [em 30 de março de 2009] é eliminado da ordem jurídica, decorrente do facto interruptivo atinente à sua citação [da ora Recorrente], sendo ainda obstativo da contagem de um novo prazo de prescrição enquanto o processo de execução fiscal não terminar, e daí que, encontrando-se pendente a acção executiva, em face dos efeitos duradouros produzidos pela citação, se deva concluir que o prazo de prescrição ainda não decorreu, enquanto não tiver passado em julgado a decisão que puser termo ao processo - sendo este de resto, o entendimento maioritário sufragado pela jurisprudência do STA, de que destacamos, entre outros, os Acórdãos datados de 17 de dezembro de 2008, proferido no Processo n.º 01020/08; de 20 de maio de 2015, proferido no Processo n.º 1500/14; de 26 de agosto de 2015, proferido no Processo n.º 1012/15; de 27 de janeiro de 2016, proferido no Processo n.º 01698/15; de 10 de janeiro de 2018, proferido no Processo n.º 01360/17; e de 13 de março de 2019, proferido no Processo n.º 01437/18.4BELRS, todos disponíveis in www.itij.pt.

Neste conspecto, por ter interesse para a decisão a proferir, para aqui se extrai parte daquele Douto Acórdão do STA, referenciado supra em último lugar, datado de 13 de março de 2019 [a cujo julgamento aderimos sem reservas visando a interpretação e aplicação uniforme do direito [cfr. artigo 8.º, n.º 3 do Código Civil], como segue:

“[...]
3. A questão colocada no presente recurso consiste em saber se a sentença padece de erro de julgamento em matéria de direito ao ter julgado que não ocorrera a extinção, por prescrição, das dívidas em cobrança na execução fiscal nº 33012001 01013254 e que emergem de actos de liquidação de IRC relativos aos exercícios de 1996 e 1997.
Tal como consta da sentença recorrida, o Reclamante defendeu a ilegalidade da decisão do órgão de execução fiscal por entender que a sua citação para essa execução, ocorrida em 13/09/2001, enquanto acto interruptivo do prazo de prescrição, tem efeito interruptivo puramente instantâneo, e não um efeito duradouro, sob pena de violação do art.º 103º, nº 2, da Constituição da República Portuguesa.
Todavia, assim não entendeu o julgador em 1ª instância, que depois de concluir, de forma fundamentada, ser aplicável o prazo de prescrição de 8 anos previsto no art.º 48º da LGT, julgou não assistir razão ao Reclamante, porquanto a sua citação constitui um acto interruptivo de efeito duradouro, ou seja, não permite que novo prazo comece a correr enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo, em conformidade com o disposto no art.º 327º nº 1 do Código Civil.
Como nela se deixou explicitado, «a devedora originária foi citada no âmbito do processo de execução fiscal em causa nos presentes autos em 13.09.2001 (alínea B) do probatório), facto que constitui causa de interrupção do prazo de prescrição nos termos do artigo 49º, nº 1, da LGT» e nos termos desse preceito «a citação do executado interrompe a prescrição, interrupção que, no caso das obrigações tributárias, provoca dois efeitos, a saber: - efeito instantâneo de inutilização de todo o prazo decorrido anteriormente (artigo 326º nº 1 do Código Civil); - efeito duradouro de paralisação, que implica que o novo prazo não começa a correr enquanto não transite em julgado, ou não forme caso decidido a decisão que ponha termo ao processo que teve o efeito interruptivo, conforme resulta do artigo 327º, nº 1, do Código Civil (vd., Jorge Lopes de Sousa, “Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária: Notas Práticas, 2ª ed., Lisboa, Áreas Editora, 2010, pp. 57).».
«Assim, em 13.09.2001 interrompeu-se o prazo de prescrição, ficando inutilizado todo o prazo que anteriormente havia corrido. E, sendo o efeito interruptivo a citação, não tendo decorrido à data da mesma o prazo de prescrição, encontra-se, ainda hoje, a decorrer o efeito duradouro de paralisação, que implica que o novo prazo não começa a correr enquanto não transite em julgado ou não forme caso decidido a decisão que ponha termo ao processo que provocou o efeito interruptivo, ou seja, o processo de execução fiscal (cfr. neste sentido, o acórdão do STA de 09.05.2012, proferido no processo nº 0282/12).
Deste modo, há que concluir não se encontrar prescrita a obrigação tributária relativa ao IRC do exercício de 1996. Consequentemente, e por maioria de razão, também a dívida exequenda relativa a IRC do ano de 1997, não prescreveu.
Este é precisamente o entendimento vertido no acórdão do STA referido pela Reclamante, proferido em 10.01.2018 no processo no 01360/17, que não obstante conter um voto de vencido, mantém por maioria a posição sufragada de modo unânime até então pela Jurisprudência do STA (vd. a título exemplificativo, os acórdão de 20.12.2017, proc. 897/16 e de 06.12.2017, proc. 1300/17, de 27.01.2016, proc. no 01698/15; de 07.01.2016, proc. 01564/15; de 16.11.2011, proc. no 0289/11; de 12.08.2009, proc. no 0748/09).
Por outro lado, a posição expressa pela Reclamante de que a interpretação das causas de suspensão expressas no despacho reclamado quanto aos efeitos da suspensão do processo de execução após a citação do executado se apresenta ferida de inconstitucionalidade, por violação dos artigos 103º, nº 2, e 165º, nº 1, alínea i), da Constituição da República Portuguesa, também suscitada pela Exma. Juíza Conselheira vencida no acórdão do STA trazido à colação pela Reclamante, carece em absoluto de sustentação, não se vislumbrando de que modo tal inconstitucionalidade se pode revelar, na medida em que, como se disse naquele mesmo aresto, por remissão para o acórdão proferido em 06.12.2017, no proc. 1300/17: ”Importa lembrar que a Lei Geral Tributária não regula o instituto da prescrição – que é um instituto de direito comum – na sua completude, antes apenas os aspectos que, atenta a natureza tributária da dívida, merecem normação especial em face do direito comum, a saber, em especial, o respectivo prazo, o termo inicial da sua contagem, os factos interruptivos e suspensivos do prazo, o conhecimento oficioso da prescrição. Não contém a lei tributária uma definição de prescrição, como nada diz quanto aos efeitos dos factos interruptivos e suspensivos do respectivo prazo, porquanto em tal matéria pressupõe a aplicação do direito comum, atenta a unidade do sistema jurídico. (…)».
Dado que neste recurso o Reclamante se limita a insistir que a citação, enquanto acto interruptivo do prazo de prescrição, tem um efeito interruptivo puramente instantâneo, e não duradouro, sob pena de violação das normas constitucionais que aponta, vejamos se lhe assiste razão.
Desde logo, importa notar que na sentença não foi evocado ou aplicado o regime legal de suspensão do prazo de prescrição – contido no art.º 49º nº 4 da LGT – ou, sequer, considerada a existência de um qualquer acto suspensivo desse prazo. O que foi evocado e aplicado foi o efeito duradouro de um acto interruptivo (citação) face à regra geral fixada nos artigos 326º nº 1 e 327º do Código Civil, tendo em conta que actualmente a Lei Geral Tributária (LGT) nada dispõe sobre a matéria e que a prescrição constitui um instituto jurídico previsto, nos seus termos gerais, no Código Civil.
Com efeito, mesmo relativamente a dívidas tributárias, as normas do Código Civil não podem deixar de ser observadas caso a situação não obtenha regulação especial na LGT ou em diploma próprio, já que a prescrição constitui um dos institutos gerais do direito cujas regras gerais se encontram vertidas naquele Código.
É certo que a prescrição da obrigação tributária se justifica pela necessidade da estabilização das relações jurídicas tributárias, de segurança e de paz jurídica, mas essa necessidade não confere ao respectivo devedor o direito a prazos de prescrição menores do que os previstos para o devedor de obrigação civil, ou o direito a enfrentar menos actos interruptivos ou suspensivos do prazo de prescrição destas obrigações, ou, sequer, o direito a obter diferenciados efeitos (duradouros ou instantâneos) para os actos interruptivos relativamente ao devedor de obrigação civil, pois não existe regra ou princípio (legal ou constitucional) que o imponha.
Tudo isto para dizer que, pese embora não seja possível, no âmbito de obrigações tributárias, chamar à colação as normas do direito civil que regem o prazo de prescrição, que regem a determinação do dies a quo e que definem actos interruptivos e suspensivos – por se tratar de matéria taxativamente fixada na LGT e rigorosamente sujeita ao princípio da legalidade tributária de reserva da lei formal, integrando-se nas “garantias dos contribuintes” – pode e deve, contudo, ir aí buscar-se o significado do conceito jurídico de “prescrição” e dos conceitos de “interrupção” e de “suspensão” da prescrição, e, bem assim, o alcance dos efeitos jurídicos da interrupção e da suspensão, sabido que, tal como a doutrina há muito vem afirmando e a LGT deixou consignado no seu art.º 11º, sempre que nas normas fiscais se empreguem termos próprios de outros ramos de direito devem os mesmos ser interpretados no mesmo sentido daquele que aí têm, salvo se outro decorrer diretamente da lei.
Ora, dado que perante o regime geral do instituto da prescrição são bem distintos os conceitos de interrupção e de suspensão, não é aceitável a confusão desses conceitos.
Com efeito, tal como decorre do preceituado nos artigos 318º a 320º do C.Civil, a suspensão do prazo de prescrição tem como efeito que este não comece a correr enquanto se verificar o facto, de natureza duradoura, a que é atribuído efeito suspensivo, isto é, os actos suspensivos são sempre de natureza duradoura, obstando ao começo e ao decurso do prazo de prescrição enquanto perdurarem.
Já a interrupção inutiliza todo o tempo decorrido anteriormente, fazendo, em princípio, reiniciar de imediato a contagem de novo e integral prazo (efeito instantâneo), salvo se o acto interruptivo for constituído pela «citação, notificação ou ato equiparado, ou compromisso arbitral», caso em que a lei faz prolongar no tempo a relevância do acto interruptivo até que ocorra determinado facto (efeito duradouro).
É o que decorre, de forma inequívoca, dos seguintes preceitos do C.Civil:
ARTIGO 326º
(Efeitos da interrupção)
1. A interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do ato interruptivo, sem prejuízo do disposto nos nºs 1 e 3 do artigo seguinte. (sublinhado nosso)
2. (…)
ARTIGO 327º
(Duração da interrupção)
1. Se a interrupção resultar de citação, notificação ou ato equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo.
2. Quando, porém, se verifique a desistência ou a absolvição da instância, ou esta seja considerada deserta, ou fique sem efeito o compromisso arbitral, o novo prazo prescricional começa a correr logo após o acto interruptivo.
3. Se, por motivo processual não imputável ao titular do direito, o réu for absolvido da instância ou ficar sem efeito o compromisso arbitral, e o prazo da prescrição tiver entretanto terminado ou terminar nos dois meses imediatos ao trânsito em julgado da decisão ou da verificação do facto que torna ineficaz o compromisso, não se considera completada a prescrição antes de findarem estes dois meses.
Deste modo, como referem PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA, no “Código Civil Anotado” em anotação ao art.º 326º, «O efeito da causa interruptiva pode ser instantâneo, como no caso de o devedor reconhecer a dívida. Desde esse momento começa, pois, a contar-se um novo prazo. Mas bem pode a causa interruptiva manter a sua relevância durante um período mais ou menos longo. É o que acontece nos casos previstos no artigo seguinte»; e em anotação ao artigo 327º escrevem que «Ao lado da interrupção admite-se, nos casos enumerados no nº 1, um prolongamento dos efeitos da interrupção até ao julgamento da causa; só neste momento é que começa a contar-se o novo prazo».
Por conseguinte, após um acto interruptivo, o reinício do prazo tanto pode ocorrer de imediato, como ocorrer só a partir do momento em que cesse, por determinação da lei, o seu efeito.
E é essa a verdadeira questão que cumpre analisar neste recurso, tendo em conta que na sentença se julgou que a citação do executado, ora Recorrente, constituía um acto interruptivo de efeito duradouro, ou seja, que não permite que novo prazo comece a correr enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo, sendo essa a única razão que levou a concluir pela não ocorrência da prescrição.
Apreciemos, então, a questão.
Relativamente às dívidas de natureza tributária, temos por inquestionável que a prescrição só é aceite enquanto expressamente prevista nas normas de direito tributário que admitam a sua existência, definam o seu prazo e tipifiquem os actos interruptivos e suspensivos – como acontece com as normas contidas na LGT. Todavia, e como acima referimos, tal não significa que os efeitos dos actos interruptivos não possam ser colhidos no Código Civil, atenta a circunstância de, atualmente, inexistir na LGT qualquer norma sobre a matéria. Com efeito, embora este diploma legal fixe, de forma taxativa, os actos interruptivos da prescrição, ela não define os efeitos desses actos, isto é, não define se eles têm efeito instantâneo ou duradouro.
É certo que durante muitos anos a legislação tributária continha essa definição – cfr. o art.º 27º do CPCI, o art.º 34º do CPT e o art.º 48º da LGT até à alteração introduzida pela Lei n.º 53-A/2006, de 29/12 – sempre no sentido de que o efeito da interrupção só cessava se o processo que constituía a causa interruptiva ficasse parado mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte. O que equivalia a conferir efeito duradouro a todos os actos interruptivos, já que a prescrição não corria após esses actos e só voltava a correr caso cessasse esse efeito duradouro por mor da paragem do processo nos termos referidos (acrescentando-se, então, ao prazo que a partir daí se iniciava, todo o prazo que decorrera até à instauração do processo, o que, na prática, equivalia a converter ou “desgraduar”, nesse específico caso, a interrupção em suspensão da prescrição).
Contudo, após a alteração introduzida no art.º 49º da LGT pela Lei nº 53-A/2006, de 29/12, esse regime desapareceu e deixou de haver norma a definir os efeitos dos actos interruptivos da prescrição relativamente a obrigações tributárias. Razão por que não há como deixar de aplicar as normas contidas no C.Civil, onde, como se viu, o artigo 326º estabelece que «a interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do ato interruptivo, sem prejuízo do disposto nos nºs 1 e 3 do artigo seguinte» e o artigo seguinte dispõe que «1. Se a interrupção resultar de citação, notificação ou ato equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo».
Termos em que, mais uma vez, se reitera a jurisprudência consolidada neste STA no sentido de que a interrupção decorrente da citação do executado inutiliza todo o tempo decorrido até à data em que se verificou o facto interruptivo e obsta ao início da contagem do novo prazo enquanto o processo executivo não findar.
Pelo exposto, bem andou o Mmº Juiz do tribunal “a quo” ao reconhecer efeito duradouro ao acto interruptivo de citação e, por consequência, ao julgar que, por esse motivo, não ocorrera ainda a prescrição das dívidas em cobrança.
[…].”

Ou seja, ao contrário do que sustenta a ora Recorrente, o reconhecimento de um duplo efeito – instantâneo e duradouro – à interrupção da prescrição decorrente da sua citação [da Executada] para os termos do processo de execução fiscal, não viola o princípio da legalidade tributária, nem prejudica o seu acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva, em suma, não põe em causa a efectivação dos seus direitos liberdades e garantias, e muito menos com o princípio da tutela da confiança legítima inerente ao Estado de direito democrático, pois que em face da ausência de norma legal de âmbito tributário, não existe nem subsiste outro fundamento de ordem legal para não atribuir ao acto de citação ocorrido no processo de execução fiscal os mesmos efeitos, duradouros, que o acto de citação produz no processo executivo comum, pelo que, por aqui tem de falecer a pretensão recursiva da Recorrente.

Sustentou ainda a Recorrente, que a interpretação dos preceitos da prescrição das dívidas tributárias à luz da lei civil enferma por isso de inconstitucionalidade material, e que a interpretação acolhida pelo Tribunal a quo [socorrendo-se da interpretação analógica com recurso às normas dos artigos 326.º e 327.º do CC], viola diretamente os princípios da proporcionalidade e prossecução do interesse público, constitucionalmente consagrados nos artigos 18.º, n.º 2 e 266.º, n.º 2 da Constituição da Republica Portuguesa, e que sempre contenderá com o direito à obtenção de justiça num prazo razoável e ao direito à tutela jurisdicional efetiva, bem como com o princípio da tutela da confiança legítima inerente à ideia de Estado de Direito Democrático, e ainda, que a Sentença recorrida enferma de inconstitucionalidade material, por ter prosseguido numa incorreta interpretação e desvirtuada aplicação do disposto nos artigos 48.º e 49.º, ambos da LGT, e 326.º e 327.º, ambos do CC, e nesse sentido, que estando no seu entender demonstrada a prescrição da dívida que a AT lhe exige no âmbito do PEF, pelo menos desde 30/03/2017, que deve ser determinada a sua extinção.

Ora, quanto à invocada inconstitucionalidade suscitada pela Recorrente, face ao julgamento tirado pelo Tribunal recorrido em torno da interpretação dada ao disposto nos artigos 48.º e 49.º, ambos da LGT e 326.º e 327.º, ambos do CC, julgamos que não assiste razão alguma à Exequente, tanto mais que sobre esta matéria o Tribunal Constitucional tem reiteradamente expendido jurisprudência, de que destacamos o Douto Acórdão n.º 6/2014, datado de 07 de janeiro, proferido no Processo n.º 905/2012, que por julgarmos com interesse para a decisão a proferir, para extraímos parte, como segue:

“[…]
5. A recorrente invoca ainda a inconstitucionalidade material das normas do artigo 49º da LGT, quando interpretadas no sentido de que a apresentação de impugnação judicial protela o início do prazo de prescrição para o momento em que a impugnação judicial transitar em julgado e de que tal preceito se torna aplicável a factos tributários e prazos prescricionais ocorridos e iniciados antes da sua entrada em vigor.
Importa recordar que o efeito suspensivo da prescrição até ao trânsito em julgado da decisão proferida no processo, que o tribunal recorrido considerou aplicável, decorre de dois diferentes preceitos legais e reporta-se a dois distintos meios processuais: a suspensão por efeito da interposição da impugnação judicial associada a prestação de garantia, em aplicação do disposto no artigo 49º, n.º 3, na redacção anterior à Lei n.º 53-A/2006, que determina a suspensão do prazo de prescrição enquanto se mantiver parado o processo de execução fiscal; a suspensão por efeito da oposição à execução, que entrou em juízo em 14 de setembro de 2007, que se prolongou até ao trânsito em julgado da decisão proferida nesse processo, em aplicação do disposto no artigo 49º, n.º 4, na redacção da Lei n.º 53-A/2006.
Na verdade, a suspensão do prazo de prescrição em consequência da paragem do processo de execução fiscal associada à interposição de reclamação, impugnação ou recurso, provinha já da primitiva redação do n.º 3 do artigo 49º, e manteve-se, com ligeiras alterações, na redação introduzida pela Lei n.º 100/99. Sendo que a suspensão do prazo prescricional até à decisão definitiva do processo, quando tenha sido deduzida, designadamente, uma impugnação judicial, é uma decorrência do disposto no artigo 169º, n.º 1, do CPPT, que determina que «a execução ficará suspensa até à decisão do pleito […] desde que tenha sido constituída garantia nos termos do artigo 195º ou prestada nos termos do artigo 199º […]»
Trata-se, por isso, de uma suspensão do prazo de prescrição que está ligada à suspensão do processo de execução fiscal e pelo prazo durante o qual essa suspensão ocorrer.
Entretanto, a norma do n.º 4 do artigo 49º da LGT, na redação introduzida pela Lei n.º 53-A/2006, foi também aplicada ao caso mas com o sentido interpretativo de que a suspensão do prazo de prescrição por efeito da dedução da oposição à execução fiscal se mantém «enquanto não houver decisão definitiva ou passada em julgado, que puser termo ao processo».
Por outro lado, a segunda interpretação normativa que a recorrente argui de inconstitucionalidade (pela qual o preceito se torna aplicável a factos tributários e prazos prescricionais ocorridos e iniciados antes da sua entrada em vigor) está necessariamente ligada a esta última disposição. De facto, ao discutir a aplicabilidade de uma nova lei a factos tributários e prazos prescricionais ocorridos e iniciados antes da sua entrada em vigor, a recorrente apenas pode ter tido em conta o mencionado artigo 49º, n.º 4, da LGT, cuja redação foi introduzida pela Lei n.º 53-A/2006, sendo que as outras disposições legais também aplicadas pelo tribunal recorrido o foram na respetiva versão originária, relativamente à qual se não colocaria o problema da pretendida aplicação retroativa.
Quanto a qualquer destes sentidos interpretativos, a recorrente alega a violação do princípio da legalidade fiscal consagrado no artigo 103º, n.º 2, da Constituição, bem como do princípio da proibição da retroatividade do imposto, a que se refere o n.º 3 desse artigo, e do princípio da proteção da confiança.
6. Quanto ao primeiro dos parâmetros de constitucionalidade, importa começar por notar que a argumentação da recorrente parte sempre da ideia de que o tribunal recorrido, ao considerar verificada a suspensão do prazo prescricional até ao trânsito em julgado da decisão a proferir relativamente à impugnação judicial, efetuou uma interpretação da norma do artigo 49º, n.º 3, da LGT, na redação anterior à Lei n.º 53-A/2006, por recurso a analogia, tornando aplicável à suspensão prevista nessa disposição o regime do artigo 327º, n.º 1, do Código Civil.
Mas vimos já que a instância se não limitou a aplicar a referida disposição do artigo 49º, n.º 3, mas também a do n.º 4 desse artigo, na redacção da Lei n.º 53-A/2006.
O acórdão recorrido aplicou efetivamente a norma do n.º 4 do artigo 49º, na redação resultante daquela Lei, mas por referência à oposição à execução que foi deduzida pela recorrente em 14 de Setembro de 2007. E dela resulta, com toda a evidência, do seu próprio sentido literal, que o prazo de prescrição legal se suspende nos casos de reclamação, impugnação, recurso ou oposição, quando determinem a suspensão da cobrança da dívida, «enquanto não houver decisão definitiva ou passada em julgado, que puser termo ao processo».
O princípio da legalidade fiscal exige, de facto, numa das usas dimensões jurídicas, a tipicidade legal dos impostos, implicando a conformação por parte da lei dos elementos modeladores do tipo tributário, abrangendo a incidência objetiva e subjetiva, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes (cfr., entre outros, o acórdão do Tribunal Constitucional n.º 127/2004), E, como se deixou já esclarecido, poderá incluir-se entre as garantias dos contribuintes, como tal coberta pela tipicidade legal, o prazo respeitante à prescrição da obrigação tributária.
O ponto é que o tribunal recorrido respeitou os limites da interpretação da lei fiscal decorrentes do princípio da tipicidade, atribuindo ao inciso «enquanto não houver decisão definitiva ou passada em julgado», que consta da referida norma do artigo 49º, n.º 4, o significado jurídico que comummente lhe é conferido, sem necessidade de qualquer aplicação analógica de princípios jurídicos provenientes de outros ramos do direito.
Tendo a decisão recorrida efetuado uma interpretação normativa que se enquadra nos cânones da hermenêutica jurídica e que é compatível com o teor verbal da norma, não lhe pode ser imputada a violação do princípio da legalidade fiscal (em sentido idêntico, ainda que com referência ao princípio da legalidade penal, o recente acórdão n.º 186/2013).
E o mesmo é possível dizer quanto à norma do n.º 3 do artigo 49º, na redação primitiva, quando interpretada no sentido de protelar a suspensão do prazo de prescrição até à decisão final a proferir na impugnação judicial, em consequência da paragem do processo de execução fiscal. Tendo sido prestada garantia idónea no âmbito do processo de impugnação judicial, fica suspensa a cobrança coerciva através do processo de execução fiscal, pelo que a suspensão do prazo prescricional fica necessariamente associada à impossibilidade de a autoridade tributária satisfazer o seu crédito enquanto não vier a ser produzida, naquele processo, uma decisão definitiva.
E, sendo assim, também neste caso, o prolongamento do efeito suspensivo, com base na conjugação dessa disposição com a dos artigos 169º, n.º 1, do CPPT e 52º,n.º 2, da LGT, corresponde a uma interpretação sistemática da lei que não envolve qualquer violação do princípio da tipicidade.
7. Num segundo momento, a recorrente invoca que a suspensão do prazo de prescrição até ao trânsito em julgado da decisão que recaia sobre a impugnação judicial viola o princípio da proteção da confiança, na medida em que, na prática, determina a inviabilidade de uma obrigação tributária vir a ser declarada prescrita.
Como tem já sido afirmado, a garantia de segurança jurídica inerente ao Estado de direito corresponde, numa vertente subjetiva, a uma ideia de proteção da confiança dos particulares relativamente à continuidade da ordem jurídica e trata-se assim de um princípio que exprime a realização imperativa de uma especial exigência de previsibilidade, protegendo sujeitos cujas posições jurídicas sejam objetivamente lesadas por determinados quadros injustificados de instabilidade (BLANCO DE MORAIS, Segurança Jurídica e Justiça Constitucional, in Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, vol. XLI, n.º 2, 2000, pág. 625).
Nesse sentido, a violação do princípio da proteção da confiança não pode ser imputada ao regime jurídico que em si resulta da nova disposição do artigo 49º, n.º 4, mas a esse regime na medida em que represente um agravamento da posição jurídica dos contribuintes, em relação ao sistema legal anteriormente vigente, com o qual se não pudesse legitimamente contar.
Nesse contexto, o Tribunal Constitucional tem também já considerado que não há «um direito à não-frustração de expectativas jurídicas ou a manutenção do regime legal em relações jurídicas duradoiras ou relativamente a factos complexos já parcialmente realizados», para concluir que o legislador não está impedido de alterar o sistema legal afetando relações jurídicas já constituídas e que ainda subsistam no momento em que é emitida a nova regulamentação, por ser essa uma necessária decorrência da autorevisibilidade das leis (acórdão nº 287/90).
O que se impõe averiguar é, assim, se poderá haver por parte dos sujeitos de direito um investimento de confiança na manutenção de um determinado regime legal e se não poderá haver, em contraposição, um primacial interesse de ordem pública que possa justificar a alteração.
Ora, cabe recordar, revertendo ao caso concreto, que o mecanismo de interrupção do prazo de prescrição que consta do n.º 1 do artigo 49º desde a sua versão originária, implicava já a possibilidade de o prazo interrompido pela interposição de algum dos meios processuais aí previstos não se reiniciar antes do trânsito em julgado da decisão que puser termo ao processo, por ser um dos efeitos normais da interrupção (artigo 327º, n.º 1, do Código Civil). Isso porque a utilização pelo legislador tributário da figura da interrupção da prescrição sem qualquer outra especificação não pode deixar de ser entendida, no quadro de uma interpretação sistemática da lei, como correspondendo a uma remissão para as disposições da lei civil que regulam o instituto, mormente no que se refere aos respetivos efeitos (neste sentido, DIOGO LEITE DE CAMPOS/BENJAMIM SILVA RODRIGUES/JORGE LOPES DE SOUSA, ob. cit., pág. 405).
A especificidade que o n.º 1 do artigo 49º introduziu, nesse plano, foi apenas quanto à natureza do ato que é suscetível de provocar o efeito interruptivo, que foi aí caracterizado como correspondendo a qualquer dos atos processuais ou procedimentais que permitam discutir a legalidade do ato de liquidação do imposto. A referência feita, na redação introduzida pela Lei n.º 100/99, à citação apenas pretendeu aditar a qualquer das situações em que o impulso processual ou procedimental pertence ao particular, aquelas outras em que a iniciativa é da própria Administração Tributária, pretendendo-se abarcar, desse modo, o caso em que seja instaurada execução fiscal contra o sujeito passivo do imposto.
Ao permitir que a interrupção ocorresse por efeito de reclamação, recurso, hierárquico, impugnação ou pedido de revisão oficiosa, o legislador pretendeu que qualquer desses atos desencadeasse os efeitos jurídicos que resultam da lei geral, incluindo quanto ao prolongamento da interrupção até ao julgamento da causa.
A nova redação dada ao artigo 49º pela Lei n.º 53-A/2006, ainda que tenha deixado intocado o referido n.º 1, afastou-se, no entanto, do regime precedente: além de ter revogado o antigo n.º 2, que permitia a transformação do efeito interruptivo em efeito supensivo, veio determinar que «a interrupção tem lugar uma única vez, com o facto que se verificar em primeiro lugar» (n.º 3) e que o prazo de prescrição legal se suspende «em virtude de pagamento de prestações legalmente autorizadas, ou enquanto não houver decisão definitiva ou passada em julgado, que puser termo ao processo, nos casos de reclamação, impugnação, recurso ou oposição, quando determinem a suspensão da cobrança da dívida» (n.º 4).
Nestes termos, a interrupção opera, não sucessivamente, com qualquer dos meios processuais previstos no n.º 1, mas apenas com aquele que for primeiramente acionado. Em contrapartida, qualquer dos outros meios que forem utilizados complementarmente implica a suspensão do prazo de prescrição, com um efeito similar ao que já anteriormente resultava da interrupção.
Ou seja, funciona agora um sistema articulado de mecanismos de interrupção e de suspensão do prazo, que substitui o anterior regime que permitia que o efeito interruptivo desencadeado por qualquer dos meios previstos no n.º 1 se transmudasse em efeito suspensivo quando se verificasse a situação mencionada no n.º 2: a paragem do processo por mais de um ano.
Note-se, em todo o caso, que atual regime, salvo a situação anómala em que ocorresse uma excessiva demora do processo, não é essencialmente mais gravoso que o que resultava da primitiva versão da norma, que permitia que, sucessivamente, o prazo prescricional pudesse considerar-se interrompido até ao trânsito em julgado da decisão a proferir no processo, quando fossem utilizados pelo interessado diversos meios processuais. E, por outro lado, o prolongamento da suspensão até à decisão definitiva do processo não é também uma solução jurídica que fosse inteiramente estranha ao sistema legal.
Na verdade, essa mesma solução já resultava do disposto no artigo 49º, n.º 3, da LGT, na sua redacção primitiva, no ponto em que a suspensão do prazo de prescrição que aí se previa já devia entender-se como correspondendo à duração da paragem do processo execução em resultado de uma impugnação judicial que fosse acompanhada de prestação de garantia, e que, por efeito do artigo 169º, n.º 1, do CPPT, se mantinha até à decisão do pleito.
E quanto a esta última norma não pode sequer invocar-se uma qualquer violação do princípio da segurança jurídica, visto que ela já vigorava à data da interposição da impugnação judicial, que remonta a 8 de Março de 1999.
Resta considerar, por fim, que o regime legal se mostra justificado por razões de interesse público relacionadas com a necessidade de obtenção de receitas fiscais que resultem de impostos que tenham sido já objeto de liquidação. Nos termos do n.º 4 do artigo 49º da LGT, a suspensão do prazo de prescrição opera apenas nos casos em que se verifique a suspensão da cobrança da dívida, e, por conseguinte, durante aquele período de tempo em que a própria Administração Tributária se encontra impedida de arrecadar, ainda que coercivamente, as importâncias que se encontram em dívida, e nos casos em que essa impossibilidade é determinada por um impulso processual do sujeito passivo. O mesmo sucede quanto à suspensão do prazo determinada pela disposição do artigo 49º, n.º 3, na redacção anterior àquela, que, como se anotou, apenas ocorre por efeito da paragem do processo de execução fiscal.
8. A recorrente alude ainda à violação do princípio da não retroatividade do imposto, alegação que parece ter apenas cabimento quando referida ao sentido interpretativo - que se extrai da decisão recorrida -, segundo o qual a norma do n.º 4 do artigo 49º se torna aplicável a factos tributários e prazos prescricionais ocorridos e iniciados antes da sua entrada em vigor.
Esta questão foi, no entanto, já analisada pelo acórdão do Tribunal Constitucional n.º 592/12, ainda que por referência a uma idêntica interpretação normativa extraída dos artigos 12º e 49º, n.º 3, da LGT, na sua versão originária.
E não há motivo para alterar o julgado.
O Tribunal tem vindo a entender a proibição de impostos retroativos resultante do n.º 3 do artigo 103º da Constituição no sentido de abarcar apenas as situações de retroatividade autêntica ou em sentido próprio, explicitando-se no acórdão n.º 399/2010, com apoio nos trabalhos preparatórios da revisão constitucional de 1997, em que se introduziu essa disposição, não se ter pretendido «integrar no preceito as situações em que o facto tributário que a lei nova pretende regular não ocorreu totalmente ao abrigo da lei antiga, antes continuando a formar-se na vigência da lei nova», pelo menos quando estejam em causa impostos periódicos (ainda neste sentido, os acórdãos n.ºs 128/2009 e 85/2010).
Admitindo que a proibição constitucional respeita aos elementos essenciais do imposto que tenham caráter retroativo e constituindo a prescrição das obrigações tributárias e as respetivas causas de interrupção e suspensão verdadeiras garantias dos contribuintes, há que concluir que a aplicação de causas de interrupção ou suspensão introduzidas pela lei nova a prazos de prescrição que já haviam começado a correr ao abrigo da lei antiga é assimilável a uma situação de aplicação retrospetiva de norma fiscal desfavorável.
Na verdade, a prescrição constitui uma causa de extinção da obrigação tributária de formação contínua, prevendo a lei que, no decurso desse período de formação, possam ocorrer factos ou serem praticados atos suscetíveis de causar a sua interrupção ou suspensão. O regime de suspensão do prazo prescricional resultante de nova lei não deixa de ser aplicado a factos ocorridos após a sua entrada em vigor, quando o prazo em causa tenham começado a correr na vigência da lei antiga e ainda se não encontre terminado no momento em que se deu a cessação da sua vigência. Trata-se, portanto, de uma norma fiscal com natureza retrospetiva.
[…]”

De modo que, neste conspecto, também por aqui tem de improceder a pretensão recursiva da Recorrente.

Cumpre agora apreciar a suscitada falta de fundamentação do despacho de recusa de concessão do pagamento da dívida em 5 anos, com fundamento em que existe norma legal que o permite, como constante do artigo 196.º, n.º 5 do CPPT, e nesse domínio, aferir do julgamento tirado pelo Tribunal recorrido sobre a inaplicabilidade desse normativo, pois que, como assim sustentou a Recorrente, fica por esclarecer o motivo dessa conclusão.

Sustentou a Recorrente - Cfr. pontos 26, 27 e 28 das Conclusões das suas Alegações- que o Tribunal a quo acolheu na Sentença recorrida, erradamente, a não ocorrência do vício de falta de fundamentação da decisão que incidiu sobre o pedido de alargamento do número de prestações, e que nesse sentido, havia requerido ao OEF que fosse aumentado o número de prestações para pagamento, pois que para além de se manterem os encargos e demais obrigações de pagamento pendentes, que decorrem do exercício da sua atividade, que as prestações se tornam incomportáveis com o pagamento mensal de um valor de quase €20.000,00, e que foi porque a dívida excede 500 unidades de conta, que requereu ao OEF que fosse alargado o número de prestações mensais para 5 anos, o que o OEF não deferiu nos termos do disposto no artigo 196.º, n.º 5 do CPPT, por ter considerado [o OEF] não estarem reunidos os requisitos legais para o efeito, e que o Tribunal a quo no julgamento efectuado pela Sentença recorrida veio a manter, defendendo o Recorrente, no presente recurso, que fica por esclarecer o motivo de tal conclusão, porque a AT se escusou de fundamentar devidamente a sua decisão, no sentido da não aplicação do artigo 196.º, n.º 5 do CPPT, e que tendo ocorrido falta de fundamentação, a que o Tribunal deu acolhimento, que o pedido de alargamento do número de prestações deve ser deferido, anulando-se a decisão que o rejeitou, a qual padece de ilegalidade por falta de fundamentação.

A jurisprudência e a doutrina têm sido firmes no sentido de que a fundamentação dos actos administrativos é clara quando é permitido ao seu destinatário, na posse do acto que lhe foi dirigido, compreender sem incertezas, qual o caminho seguido pelo respectivo decisor, sobre os pressupostos valorados e como o foram, como uma espécie de percurso cognoscitivo, em que a decisão surge de forma lógica e necessária face aos factos e razões que lhe estão na base. Neste sentido, Cfr. Freitas do Amaral, e Outros, in Código do Procedimento Administrativo, Almedina, Coimbra, 3ª. Edição, pág. 230, e Vieira de Andrade, in, O dever de fundamentação expressa dos actos administrativos, Almedina, Coimbra, pág. 232 e seguintes.

A fundamentação, ainda que sucinta, deve assim ser suficiente para convencer (ou não) o interessado e permitir-lhe o controlo do acto. Traduz-se isto, a final, em dizer que o interessado deve ficar na posse de todos os elementos de facto e de direito que conduziram à decisão, ou seja, deve dar-se-lhe, ainda que de forma sucinta, nota do itinerário cognoscitivo e valorativo seguido para a tomada de decisão, pois só assim o interessado pode analisar a decisão e ponderar se lhe dá ou não o seu acordo, e também só por essa via, ele fica munido dos elementos essenciais para poder impugnar a decisão, pois só sabendo quais os factos concretos considerados pela Administração, ele pode argumentar se eles se verificam ou não, isto é, só conhecendo os critérios valorativos da Administração sobre esses factos, ele pode discuti-los, apresentar outros ou até valorá-los doutra forma, e por outro lado, só em face das normas legais invocadas, ele pode discernir se são essas ou outras as aplicáveis ao caso.

Pretende-se, pois, que o destinatário do acto fique ciente do modo e das razões por que se decidiu num ou noutro sentido.

Ora, em face do que resultou provado, julgamos ser manifesto que a decisão proferida pelo OEF, objecto da Reclamação, foi devidamente explicitada em termos de a Recorrente ficar a saber por que termos e pressupostos é que assim decidiu, e que, por parte da ora Recorrente, é destituído de sentido a invocação de que a mesma não compreende a fundamentação de direito aí aduzida, ou que há falta de fundamentação.

Neste conspecto, para aqui cumpre extrair parte da fundamentação aduzida na Sentença recorrida, como segue:

“[...]
Na verdade, do ato reclamado resulta perfeitamente percetível que, por despacho de 14/06/2018 da Sr.ª Diretora de Finanças de (...) foi autorizado à reclamante o pagamento em 24 prestações mensais, nos termos do disposto no art.º 196.º, n.º 3, al. b) do CPPT, uma vez que, “a dívida exequenda resulta da falta de entrega, dentro dos prazos legais, de imposto repercutido a terceiros, não sendo legalmente possível aplicar o n.º 5 do art.º 196.º do CPPT”.
Note-se, aliás, que tal fundamentação havia já sido comunicada à reclamante aquando da notificação da decisão de deferimento do pagamento em 24 prestações, donde resulta, de forma expressa, clara e congruente que, em face da natureza das dívidas, (IVA não entregue nos cofres do Estado dentro do prazo legal), não estavam reunidos os pressupostos para a autorização do pagamento nos termos do n.º 5 do art.º 196.º do CPPT (60 prestações), tendo em vista o que dispõe o n.º 2 do art.º 196.º do CPPT.
Acresce que, resulta igualmente claro do ato reclamado, para além de ser do conhecimento da reclamante, que, apesar de autorizado o plano de pagamento em 24 prestações, a reclamante não procedeu ao pagamento de nenhuma prestação, razão pela qual “o plano foi interrompido nos termos do n.º 1 do art.º 200.º do CPPT”.
Pelo que, por esta razão foi proposto pelo Diretor Adjunto da Direção de Finanças que “não seja proferida decisão quanto ao pedido subsidiário, quer por inexistir dever de decisão, quer em virtude do plano de pagamento em prestações das dívidas tributárias ter sido incumprido pela Requerente e, por conseguinte, se revelar inútil tal pedido”. Proposta esta que mereceu despacho de concordância do Diretor de Finanças de (...), e que consubstancia aqui o ato reclamado.
Diante o exposto, nenhuma censura poderá ser assacada ao ato reclamado, uma vez que, do mesmo resulta de forma expressa, clara e percetível as razões pelas quais não foi atendido o pedido de alargamento do número de prestações, pelo que, terá que improceder o vício de falta de fundamentação.
[...]“

Ora, como assim resultou provado sob o ponto 7 do probatório, matéria que não foi sindicada pela Recorrente, dela se extrai com meridiana clareza, que já em 14 de junho de 2018, o Director de Finanças de (...) se havia pronunciado sobre um pedido da ora Recorrente, deduzido por requerimento datado de 18 de maio de 2019 no sentido de poder fazer o pagamento da dívida exequenda em prestações, no “... máximo legalmente admissível, nos termos do art.º 196.º n.º 5 do CPPT“.

O despacho daquele Director foi proferido sobre informação prestada pelos serviços, com ampla fundamentação de facto e de direito, em que aquele Director se apoiou, e que foi determinante para o deferimento à Executada, ora Recorrente, do pagamento da dívida em 24 prestações, e tanto, em suma, porque face à natureza das dívidas em causa [IVA não entregue nos cofres do Estado, em períodos dos anos de 2006, 2007 e 2008], não estavam reunidos os pressupostos para a autorização do pagamento em 60 prestações, ao abrigo do indicado artigo 196.º, n.º 5 do CPPT, porquanto o n.º 2, assim como a alínea b) do n.º 3 deste mesmo normativo, dispõem que não sendo possível o pagamento da dívida em prestações no caso de a mesma ter por fundamento, designadamente, imposto retido na fonte ou repercutido a terceiros, que de todo o modo, se for demonstrada a dificuldade financeira excepcional e de previsíveis consequências económicas gravosas por parte do Executado, que pode ser deferido esse pagamento em prestações mensais, em número não superior a 24.

Como assim também resultou provado sob o ponto 9 do probatório, matéria que também não foi sindicada pela Recorrente, dela também se extrai com meridiana clareza, que tendo sido notificada em 04 de julho de 2018 de que foi deferido o pagamento da dívida em 24 prestações mensais, e que a 1.ª prestação devia ter sido paga até 31 de agosto de 2018, que não o fez, assim como quanto a nenhuma das demais, informação esta que foi prestada pelos serviços da AT, depois de em 20 de dezembro de 2018 –
Cfr. ponto 8 do probatório -, a Executada ora Recorrente ter apresentado requerimento onde formulou dois pedidos, sendo o pedido principal atinente à extinção do processo com fundamento na prescrição da dívida exequenda, e o pedido alternativo atinente ao alargamento do número de prestações para pagamento.

Ora, como resultou provado, sendo incontrovertido que a Executada não cumpriu com o plano prestacional que lhe foi deferido pela AT, pois não pagou nenhuma das 24 prestações mensais, para além de a Executada não poder deixar de saber e conhecer ser convocável o disposto no artigo 200.º, n.º 1 do CPPT, e neste conspecto, que não tendo sido feitos esses pagamentos, que o processo de execução fiscal prosseguir os seus termos, e bem assim, que versando o seu requerimento datado de 20 de dezembro de 2018 – Cfr. ponto 8 do probatório -, a dedução de um pedido de igual teor ao que havia formulado em 18 de maio de 2018, que face ao disposto no artigo 13.º, n.º 2 do CPA [atinente ao princípio da decisão], não existe o dever de decisão porquanto o órgão competente para decidir já tinha praticado acto em que apreciou essa sua pretensão, em tempo que não ultrapassou os 2 anos, antes apenas um período de cerca de 8 meses.

Ora, neste conspecto, julgamos que os fundamentos de facto foram tratados e trabalhados na Sentença recorrida à luz das normas legais aplicáveis, o que ocorreu de forma lógica e juridicamente possível, e que o veio a ser no sentido da improcedência da pretensão formulada, sendo que, como assim julgamos, a Executada bem pôde entender o teor do acto que lhe foi notificado, podendo é certo, o que já é diverso, não concordar com o teor da decisão, por não lhe ser de feição.

Sintetizando, o Tribunal recorrido decidiu em conformidade com a factualidade apurada, pelo que, falecendo as Conclusões das alegações do recurso apresentado pela Recorrente, tem de improceder a sua pretensão recursiva em toda a linha, e confirmada a Sentença recorrida, com todas as legais consequências.

Improcede, por conseguinte, o presente recurso jurisdicional.
*

E assim formulamos as seguintes CONCLUSÕES/SUMÁRIO:

Descritores: Reclamação de acto praticado pelo órgão da execução fiscal; Aplicação da lei no tempo; Prescrição; Interrupção da prescrição; Fundamentação.


1 - Havendo sucessão de leis no tempo, a lei nova é competente para determinar os efeitos sobre o prazo de prescrição que têm os factos que ocorrem na sua vigência, por força do disposto no artigo 12.° do Código Civil.

2 -
Ocorrendo várias causas de interrupção da prescrição antes da entrada em vigor da nova redacção do artigo 49.°, n.º 3 da LGT, introduzida pelo artigo 89.° da Lei 53-A/2006, de 29 de dezembro, devem todas elas ser consideradas.

3 - A redacção actual do artigo 49.°, n.º 3 da LGT, estabelecendo expressamente que a interrupção se opera uma única vez, aplica-se apenas aos factos interruptivos verificados após o início da vigência do diploma que introduziu a alteração da norma.

4 –
Nos termos dos artigos 326.º, n.º 1 e 327.º, n.º 1, ambos do Código Civil, o facto interruptivo inutiliza para a prescrição o prazo decorrido até à sua verificação e o novo prazo só começa a correr com a decisão final (que seja dada no processo de natureza administrativa), a decisão que puser termo ao processo de execução fiscal ou o trânsito em julgado da decisão (proferida em processo judicial).

5 - A fundamentação, ainda que sucinta, deve ser suficiente para convencer (ou não) o interessado e permitir-lhe a sindicância jurisdicional do acto.
***

IV - DECISÃO

Nestes termos, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202.º da Constituição da República Portuguesa, os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, Acordam em conferência em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente, mantendo a decisão judicial recorrida.

*

Custas a cargo da Recorrente.
**

Notifique.
*

Porto, 04 de junho de 2020.


Paulo Ferreira de Magalhães
Maria do Rosário Pais
António Patkoczy