Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00166/11.4BEAVR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:07/15/2014
Tribunal:TAF de Aveiro
Relator:Helena Ribeiro
Descritores:FUNDO DE GARANTIA SALARIAL
DESPEDIMENTO COLETIVO
COMPENSAÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 401.º DO CT/2003
DATA DE VENCIMENTO
Sumário:I. No caso da entidade empregadora vir a ser judicialmente declarada insolvente o Fundo de Garantia Salarial, nos termos do n.º 1 do art. 319.º da Lei n.º 35/2004, garante os créditos salariais que se hajam vencido nos seis meses que antecederam a data de propositura da ação de insolvência ou da data de entrada do requerimento relativo ao procedimento de conciliação.
II. Respeitando os créditos salariais reclamados à compensação pela caducidade dos contratos de trabalho com fundamento em despedimento coletivo, prevista no artigo 401.º do Código do Trabalho de 2003 [despedimento coletivo], o seu vencimento ocorre aquando da cessação dos respetivos contratos de trabalho.
III. A ilicitude de um despedimento no âmbito do direito laboral privado apenas pode ser declarada pelo tribunal do trabalho e, nesse caso, a indemnização pela cessação ilícita do contrato de trabalho apenas se vence com o trânsito em julgado da respetiva decisão judicial.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:ASS...
Recorrido 1:Fundo de Garantia Salarial
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
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Decisão Texto Integral:ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO ADMINISTRATIVA DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO NORTE:
I.RELATÓRIO
ASS..., CVS..., CASOFSV..., JASC..., JGR..., JMMO..., MJP..., MMO..., MAVS..., MFMM..., MCSM..., MFVS..., MMVS..., OVS..., e RSS..., inconformados, vieram interpor recurso jurisdicional da decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, em 29 de maio de 2012 que julgou improcedente a ação administrativa especial que intentaram contra o FUNDO DE GARANTIA SALARIAL, I.P., em que pediram a anulação dos atos proferidos pelo Presidente do Conselho de Gestão do Fundo de Garantia Salarial, em 18 de novembro de 2010, que indeferiram os pedidos de pagamento apresentados pelos Recorrentes ao do Fundo de Garantia Salarial referentes a créditos emergentes de contrato de trabalho e da sua cessação.
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Admitido o recurso jurisdicional, e findo o prazo para a apresentação de contra-alegações, os autos subiram ao Tribunal Central Administrativo Norte, que por acórdão de 14.03.2013, na senda do Acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo, datado de 05.06.2012 [Rº 0420/12], que fixou jurisprudência no sentido de que «Das decisões do juiz relator sobre o mérito da causa, proferidas sob a invocação dos poderes conferidos no artigo 27.º, n.º1, alínea i) do CPTA, cabe reclamação para a conferência, nos termos do n.º 2, não recurso», DECIDIU «não tomar conhecimento do recurso jurisdicional “sub judice”, e determinar a baixa dos autos ao TAF “a quo” a fim de o objeto do mesmo ser apreciado, a título de “reclamação”, pela Formação de Juízes a quem competiria proceder ao julgamento da matéria de facto e de direito nesta acção administrativa especial».
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Nessa sequência, por acórdão de 23.07.2013, o coletivo de juízes do TAF de Aveiro, apreciando a reclamação em cumprimento do sobredito acórdão deste TCAN, decidiu indeferir a reclamação apresentada para a conferência e manter a sentença recorrida.
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OS RECORRENTES, inconformados com a decisão proferida, interpuseram recurso jurisdicional da mesma, tendo o senhor juiz relator proferido despacho, em 26/03/2014, de convite aos Recorrentes para apresentarem, em 10 dias, conclusões das alegações de recurso que observem o desiderato imposto no artigo 639.º do CPC aprovado pela Lei n.º 41/2013.
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Em cumprimento do despacho antecedentemente referido, os Recorrentes terminaram a respetiva alegação de recurso com as seguintes CONCLUSÕES:
“A) O Fundo de Garantia Salarial assegura o pagamento dos créditos previstos no art. 317º da Lei 35/2004 que se tenham vencido nos 6 meses que antecedem a data da propositura da ação de insolvência (art.º 319.º, n.º1 da Lei n.º 35/2004).
B) As leis laborais estabelecem as datas/períodos em que se vencem os créditos emergentes do contrato de trabalho, e, designadamente, que, quanto aos créditos relativos a indemnizações/compensações por cessação do contrato de trabalho;
C No caso sub judice, em 19 de Setembro de 2008 a entidade patronal dos aqui Recorrentes, invocando razões de natureza económica, suspendeu a laboração, procedeu ao encerramento da empresa e despediu todos os seus trabalhadores entre os quais os aqui AA. (cfr. a. B) dos factos provados), assinalando no Modelo RP 5044 que instruiu o processo de requerimento de pagamento do Fundo de Garantia Salarial e que se encontra junto aos autos, como motivo da cessação do contrato, “Despedimento por extinção do posto de trabalho” e, na secção “fundamentação do motivo assinalado, escreveu: “conjuntura difícil do sector corticeiro; incêndio fábrica L... em Julho passado; eminente demolição da fábrica de A... por imposição Inst. Est. Portugal para prolongamento do IC 24; estado de saúde do sócio-gerente; e impossibilidade de prosseguir actividade”.
D) Do exposto resulta que, neste caso, se trata de uma situação que cabe na previsão do art. 402º do Código do Trabalho (2003) (despedimento por extinção do posto de trabalho).
E) Neste último caso, a lei manda seguir um determinado processualismo ou, se se preferir, determinadas regras procedimentais que vêm descritas no art. 423º e segs. do Código de Trabalho (de 2003). Ora,
F) A violação destas regras determina a ilicitude de despedimento.
G) Sendo o despedimento declarado ilícito, o empregador é condenado a indemnizar o trabalhador por todos os danos patrimoniais e não patrimoniais causados (art.º 436º, n.º 1, al. a) e ainda a pagar ao trabalhador as retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal (art. 437º, n.º 1), para além da compensação a que se refere o art. 401º aplicável por força do disposto na al. d) do art. 432º (sublinhado nosso).
H) Sucede ainda que ao trabalhador objecto de despedimento por extinção do posto de trabalho é concedido um pré-aviso de despedimento, então de 60 dias, cuja inobservância implica para o empregador o pagamento da retribuição correspondente ao período de antecedência em falta (cfr. art. 398º aplicável por força do disposto no art. 404º do C.T.).
I) A ilicitude do despedimento deve ser declarada pelo tribunal e na data do despedimento a obrigação de pagamento não está ainda quantificada, nem configura uma obrigação com prazo certo.
J) Significa isto que, não obstante a lei estabelecer a data do vencimento dos créditos laborais, a obrigação de pagamento que nasce na esfera jurídica do trabalhador com o despedimento não é, nessa data e no caso “sub judice”, certa nem líquida, nem com prazo certo, e, portanto, não é (ainda) exigível.
K) A exigibilidade da obrigação faz-se pelo seu reconhecimento que pode ser judicial ou extrajudicial.
L) No caso “sub judice” o reconhecimento dos direitos dos AA., aqui Recorrentes, consubstanciados nos montantes referidos em 5º da petição inicial, foi feito extrajudicialmente através de um verdadeiro acordo de rescisão do contrato de trabalho.
M) E esse reconhecimento, que, pelas razões expostas, equivale ao “vencimento” do direito, ocorre dentro do prazo de 6 meses anterior à data da propositura da acção de insolvência, posto que o reconhecimento dos créditos ocorre em 20 de Fevereiro de 2009 e a propositura da acção de insolvência tem lugar em 30 de Junho de 2009.
N) Aliás, foi este e sempre também o entendimento da R., Recorrida, que em centenas, talvez milhares de casos, no Distrito de Aveiro, iniciou sempre a contagem do prazo de 6 meses a partir da data do reconhecimento, na esmagadora maioria dos casos, judicial, do direito, como sucedeu no caso de 2 trabalhadores da mesma empresa (AJF...e MFAG...) que, nas mesmas condições, viram deferido o pagamento do Fundo de Garantia salarial porque lhes foi reconhecido judicialmente o seu direito.
O) Assim sendo e não obstante se afirmar na douta sentença recorrida que a opção pelo recurso à via judicial não alteraria a data do vencimento dos créditos, objectivamente e no caso em apreço, a administração tratou de forma desigual, situações iguais, o que, aliás, constitui, como já se disse, a excepção ao comportamento normal da R., pelo menos na área geográfica abrangida pelo Instituto da Segurança Social de Aveiro.
P) Razão pela qual e no caso em apreço, se entende que a douta sentença recorrida violou, por erro de interpretação e aplicação e por ter ocorrido o vício de erro nos pressupostos do acto o disposto no nº 1 do art. 319º da Lei nº 35/2004, de 29 de Julho, bem como violação do princípio da igualdade (art. 13º da CRP), da legalidade (art. 3º do C.P.A.) e da justiça e da imparcialidade (arts. 6º e 6º- A do C.P.C)”
Terminam, pedindo que a decisão recorrida seja revogada e substituída por outra que conde o Recorrido à prática de ato administrativo que defira o pagamento aos Recorrentes dos créditos emergentes do contrato de trabalho e da sua cessação.
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O RECORRIDO não apresentou contra alegações de recurso.
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O Senhor Procuradora-Geral Adjunto junto deste TCAN, notificado nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 146.º do C.P.T.A., pronunciou-se sobre o mérito do recurso nos moldes que constam do seu parecer de fls.329 a 335, sustentando que deve ser negado provimento ao mesmo, e confirmado o aresto recorrido.
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Cumprido o disposto no artigo 146.º, n.º2 do CPTA [notificação do parecer emitido pelo Ministério Público], ninguém se pronunciou.
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II.FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
II.1 MATERIA DE FACTO
A sentença recorrida deu como assentes, com relevância para a decisão proferida, os seguintes factos:
A) Os AA. foram trabalhadores da firma O & S..., Lda.
B) No final do mês de Setembro de 2008 e por invocadas razões de natureza económica, a citada firma suspendeu a laboração, procedeu ao encerramento da empresa e despediu todos os seus trabalhadores, entre os quais os AA..
C) Em consequência dos despedimentos subsequentes ao encerramento da empresa, esta, após negociações, emitiu documentos particulares aos AA., reconhecendo-se devedora, a título de direitos emergentes de cessação do contrato, das seguintes quantias globais a cada um dos AA.:
ASS................................6.496,00€
CVS.............................11.979,00 €
FSV............................12.843,20 €
JASC...........................8.445,58 €
JGR............................6.496,60 €
JMMO...................... 10.916,72 €
MJP...........................12.993,20 €
MMO.........................17.338,32 €
MAVS..........................7.078,50 €
MFMM.....................15.246,00 €
MCSM......................10.890,50 €
MFVS..................... 15.790, 50 €
MMVS......................5.445,00 €
OVS.........................5.445,00 €
RSS .........................7.146,26 €
no total de 154.550, 98 €. – cfr. Doc 11 junto com a PI.
D) Os AA. interpuseram acção executiva para cobrança naqueles créditos.
E) Tal acção correu termos no Tribunal de Trabalho de Santa Maria da Feira com o n.º 116/09.8 TTVFR – cfr. Doc. n.º 2 constituído por 2 folhas anexo à PI.
F) Nela foi penhorado um imóvel tendo, no entanto, a execução sido suspensa por existir, sobre o mesmo, penhora anterior – cfr. Doc. n.º 3 anexo à PI.
G) Impossibilitadas de cobrar os seus créditos, os AA., em 30 de Junho de 2009, requereram a insolvência da empresa – cfr. Doc. n.º 5 anexo à PI.
H) E esta foi declarada insolvente por Sentença proferida, em 6 de Outubro de 2009, no processo n.º 3452/09.0TVFR, no 2.º Juízo Cível de Santa Maria da Feira – doc. n.º 6 anexo à PI.
I) Vindo, em 7 de Dezembro de 2009 a instância do processo executivo acima referido, a ser julgada extinta por inutilidade superveniente da lide em consequência da declaração de insolvência da Executada no referido processo n.º 3452/09.0TVFR,– cfr. Doc. n.º 4 constituído por 3 folhas anexo à PI.
J) Na sequência da declaração de insolvência, os AA. requereram a concessão do Fundo de Garantia Salarial por requerimentos apresentados no serviço local de F..., do Centro Distrital de Aveiro, datados de 21.01.2010, juntando para o efeito os atinentes documentos. – cfr. PA.
K) Conforme consta das reclamações de créditos elaboradas pelos AA, no âmbito do processo de insolvência, e de cada um dos requerimentos apresentados pelos mesmos no serviço local de F..., do Centro Distrital de Aveiro, datados de 21.01.2010 os contratos de trabalho celebrados entre os AA. e a Insolvente O & S..., Lda. cessaram, por caducidade, em 19 de Setembro de 2008 – cfr. fls. 1 a 5 de cada um dos volumes do PA, Apenso aos autos.
L) Por ofícios datados de 23 de Junho de 2010 foram os AA. notificados do despacho do Presidente do Conselho de Gestão do Fundo de Garantia Salarial, manifestando a intenção de indeferir o requerimento e notificando os AA. para exercerem o direito de audiência prévia – doc. n.º 7 cuja cópia junto com a PI.
M) O que estes em tempo vieram fazer em carta que seguiu sob registo do correio – doc. n.º 8 constituído por 4 folhas anexo à PI.
N) Entre as datas de 26 e 30 de Novembro de 2010 foram os AA. notificados, por ofício, dos despachos do Senhor Presidente do Conselho de Gestão do Fundo de Garantia Salarial que indeferiu os pedidos de pagamento do Fundo de Garantia Salarial – cfr doc. n.º 1 anexo à PI.
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II. 3. ADITAMENTO DE MATÉRIA DE FACTO
Ao abrigo do disposto no 662.º, n.º1 do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, consideram-se ainda provados os seguintes factos, que se aditam à matéria de facto assente:
O) Os créditos referidos na alínea C) da matéria de facto foram reconhecidos pelo Administrador da Insolvência na sequência da reclamação de créditos apresentada por cada um dos autores no âmbito do respetivo processo de insolvência- cfr. PA.
P) Os autores declararam, nas respetivas reclamações de crédito, terem sido despedidos «por extinção do posto de trabalho» e que a insolvente «não pagou a respetiva indemnização pelo despedimento, nos termos do art.º 366.º do Código de trabalho»- cfr. reclamações de créditos insertas no PA;
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II. 4 DO DIREITO
QUESTÕES DECIDENDAS
(1) Cumpre apreciar as questões suscitadas pela ora Recorrente, o que deverá ser efetuado dentro das balizas estabelecidas, para tal efeito, pela lei processual aplicável - ver artigos 5.º, 608.º, n.º2, 635.º, n.ºs 4 e 5, e 639.º do C.P.C., na redação conferida pela Lei n.º 41/2013, ex vi art.º 1.º do C.P.T.A, e ainda conforme o disposto no artigo 149º do CPTA.
(2) De acordo com a motivação e conclusões apresentadas pelos Recorrentes, as questões a decidir reconduzem-se a saber se a decisão recorrida padece de erro de julgamento de direito derivado:
(i) da errada interpretação e aplicação do n.º1 do artigo 319.º da lei n.º 35/2004, de 29 de julho, por se ter considerado que os créditos salariais reclamados se venceram fora do período de referência de seis meses previstos nessa norma;
(ii) da violação do princípio da igualdade (art. 13º da CRP), da legalidade (art. 3º do C.P.A.) da justiça e da imparcialidade (arts. 6º e 6º- A do C.P.C).
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DO ERRO DE JULGAMENTO DECORRENTE DA INTERPRETAÇÃO E APLICAÇÃO DO N.º1 DO ARTIGO 319.º DA LEI N.º 35/2004, DE 29/07- DA DETERMINAÇÃO DO MOMENTO DE VENCIMENTO DOS CRÉDITOS SALARIAIS RECLAMADOS.
(3) Está em causa saber, essencialmente, se os créditos reclamados pelos ora Recorrentes ao Fundo de Garantia Salarial se venceram no mês de setembro de 2008, data em que a respetiva entidade empregadora «por invocadas razões de natureza económica…suspendeu a laboração, procedeu ao encerramento da empresa e despediu todos os seus trabalhadores» [cfr. ponto 4 da p.i] - situação em que tais créditos não se encontrarão abrangidos pelo período de referência previsto no n.º1 do art.º 319.º da lei n.º 35/2004 - ou se, como é sustentado pelos Recorrentes, tais créditos se venceram apenas em fevereiro de 2009, data em que a aquela entidade empregadora emitiu documentos escritos nos quais declarou, em relação a cada um dos ora Recorrentes, ser devedora das quantias neles mencionadas, a título de “indemnização pelo despedimento, nos termos do art.º 433.º do Código do Trabalho”, encontrando-se, consequentemente, abrangidos pelo período de referência do n.º1 do art.º 319.º da dita Lei, situação em que se terá de concluir pela procedência do aduzido erro de julgamento.
Vejamos, então.
(4) O Fundo de Garantia Salarial foi criado pelo Decreto-Lei n.º 219/99, de 15 de junho, com o objetivo de assegurar aos trabalhadores, em caso de incumprimento pela entidade empregadora, o pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho ou da sua cessação, verificadas certas condições.
(5) Esse regime foi, entretanto, alterado pela Lei n.º 35/2004, de 29 de julho, que veio regulamentar a Lei n.º 99/2002, de 27 de agosto, diploma que aprovou o Código do Trabalho e em cujo artigo 380.º se estabelece, sob a epígrafe de «garantia de pagamento», que a “… garantia do pagamento dos créditos emergentes do contrato de trabalho e da sua violação ou cessação, pertencentes ao trabalhador, que não possam ser pagos pelo empregador por motivo de insolvência ou de situação económica difícil é assumida e suportada pelo Fundo de Garantia Salarial, nos termos previstos em legislação especial …”.
(6) A Lei n.º 35/2004, de 29 de julho impõe a verificação cumulativa de determinados requisitos para que o Fundo de Garantia Salarial assegure o pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho, sua violação e cessação.
(7) Nos termos do artigo 317º da Lei n.º 35/2004, de 29/07 “O Fundo de Garantia Salarial assegura, em caso de incumprimento pelo empregador, ao trabalhador o pagamento dos créditos emergentes do contrato de trabalho e da sua violação ou cessação nos termos dos artigos seguintes.”
(8) Dimana do n.º1 do artigo 318.º do mesmo diploma que “ O Fundo de Garantia Salarial assegura o pagamento dos créditos a que se refere o artigo anterior, nos casos em que o empregador seja judicialmente declarado insolvente.” e nos termos do seu n.º2, o “… Fundo de Garantia Salarial assegura igualmente o pagamento dos créditos referidos no número anterior, desde que se tenha iniciado o procedimento de conciliação previsto no Decreto-Lei n.º 316/98, de 20 de Outubro …” , estabelecendo-ainda no n.º 3 que sem “… prejuízo do disposto no número anterior, caso o procedimento de conciliação não tenha sequência, por recusa ou extinção, nos termos dos artigos 4.º e 9.º, respetivamente, do Decreto-Lei n.º 316/98, de 20 de Outubro, e tenha sido requerido por trabalhadores da empresa o pagamento de créditos garantidos pelo Fundo de Garantia Salarial, deve este requerer judicialmente a insolvência da empresa …” , sendo que para “… efeito do cumprimento do disposto nos números anteriores, o Fundo de Garantia Salarial deve ser notificado, quando as empresas em causa tenham trabalhadores ao seu serviço: a) Pelos tribunais judiciais, no que respeita ao requerimento do processo especial de insolvência e respetiva declaração; b) Pelo Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas e ao Investimento (IAPMEI), no que respeita ao requerimento do procedimento de conciliação, à sua recusa ou extinção do procedimento…” (n.º 4).
(9) Todavia, considerando-se o disposto nos artigos 319.º e 320.º do mesmo diploma, como veremos, o Fundo de Garantia Salarial não garante o pagamento de todos e quaisquer créditos e quanto aos que garante apenas o faz até determinado montante.
Neste sentido, o artigo 319º da Lei n.º 35/2004, de 29/07, sob a epígrafe “Créditos abrangidos”, prescreve o seguinte:
“1- O Fundo de Garantia Salarial assegura o pagamento dos créditos previstos no artigo 317º que se tenham vencido nos seis meses que antecedem a data da propositura da ação ou apresentação do requerimento referido no artigo anterior.
2- Caso não haja créditos vencidos no período de referência mencionado no número anterior, ou o seu montante seja inferior ao limite máximo definido no n.º 1 do artigo seguinte, o Fundo de Garantia Salarial assegura até este limite o pagamento de créditos vencidos após o referido período de referência.
3- O Fundo de Garantia Salarial só assegura o pagamento dos créditos que lhe sejam reclamados até três meses antes da respetiva prescrição.”
(10) E o artigo 320.º da Lei n.º 35/2004, de 29/07, estabelece que:
“1- Os créditos são pagos até ao montante equivalente a seis meses de retribuição, não podendo o montante desta exceder o triplo da retribuição mínima mensal garantida.
2- Se o trabalhador for titular de créditos correspondentes a prestações diversas, o pagamento é prioritariamente imputado à retribuição.
(...)”
(11) A este respeito, importa aqui deixar bem expresso que a jurisprudência dos tribunais superiores desta jurisdição administrativa tem vindo reiteradamente a entender que no caso da entidade empregadora vir a ser judicialmente declarada insolvente o Fundo de Garantia Salarial assegurará os créditos salariais que se hajam vencido nos seis meses que antecederam a data de propositura da ação de insolvência ou da data de entrada do requerimento relativo ao procedimento de conciliação (previsto no DL n.º 316/98)- cfr. Acs. do STA de 17.12.2008 - Proc. n.º 0705/08, de 04.02.2009 - Proc. n.º 0704/08, de 07.01.2009 - Proc. n.º 0780/08, de 10.02.2009 - Proc. n.º 0820/08, de 11.02.2009 - Proc. n.º 0703/08, de 25.02.2009 - Proc. n.º 0728/08, de 12.03.2009 - Proc. n.º 0712/08, de 25.03.2009 - Proc. n.º 01110/08, de 02.04.2009 - Proc. n.º 0858/08, de 10.09.2009 - Proc. n.º 01111/08, todos disponíveis in www.dgsi.pt.
(12) Frise-se que o âmbito de abrangência do art.º 319.º, nº1 da Lei n.º 35/2004, nos termos em que a jurisprudência nacional o tem entendido, foi considerado como não violador da Diretiva 80/987/CEE do Conselho, por Acórdão do TJUE de 28/11/2013, proferido no Processo n.º C-309/12, que fixou o seguinte entendimento:
“A Diretiva 80/987/CEE do Conselho, de 20 de outubro de 1980, relativa à proteção dos trabalhadores assalariados em caso de insolvência do empregador, conforme alterada pela Diretiva 2002/74/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de setembro de 2002, deve ser interpretada no sentido de que não se opõe a uma legislação nacional que não garante os créditos salariais vencidos mais de seis meses antes da propositura da ação de insolvência do empregador, mesmo quando os trabalhadores tenham proposto, antes do início desse período, uma ação judicial contra o seu empregador, com vista à fixação do valor desses créditos e à sua cobrança coerciva” – cfr. Acórdão do TCAN de 14.02.2014, processo n.º 00756/07.0BEPRT,
(13) Posto isto, e para o que ora releva, decorre do disposto nos artigos 317.º e ss da Lei n.º 35/2004, no essencial, que o Fundo de Garantia Salarial assegura ao trabalhador, em caso de incumprimento pelo empregador judicialmente declarado insolvente, o pagamento, até determinado montante, dos créditos emergentes de contrato de trabalho e da sua cessação que se tenham vencido nos seis meses que antecedem a data da propositura da ação de declaração de insolvência.
(14) No tocante ao requisito referente à declaração de insolvência da entidade empregadora o mesmo encontra-se, in casu, preenchido, porquanto, conforme resulta da matéria de facto assente sob a alínea H), em 30 de junho de 2009, foi instaurada ação de declaração de insolvência da entidade empregadora dos Recorrentes que correu termos no 2.º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Santa Maria da Feira, com o processo n.º 3452/09.0TBVFR, no âmbito da qual, em 06/10/2009, se proferiu decisão a declarar insolvente a entidade empregadora dos Recorrentes.
(15) Já no que concerne ao requisito do vencimento dos créditos salariais reclamados nos seis meses que antecederam a data de instauração da ação de insolvência, as partes têm posições divergentes, entendendo os Recorrentes que os créditos reclamados pelos mesmos se encontram dentro do período de abrangência de seis meses previsto no n.º1 do art.º 319.º, uma vez que, na sua perspectiva, tendo-se tais créditos se vencido em fevereiro de 2009, os mesmos estão dentro do período legal de abrangência [30/12/2008 e 30/06/2009], ao passo que o Recorrido situa a data de vencimento de tais créditos no dia 18/09/2008, logo, fora do período de abrangência supra mencionado e a que se reporta o n.º1 do art.º 319º da Lei n.º 35/2004.
(16) A questão central a decidir nesta instância recursiva é, por conseguinte, a de saber se os créditos reclamados pelos Recorrentes se venceram na data da cessação dos seus contratos de trabalho ou se os mesmos se venceram posteriormente, máxime, aquando da emissão da declaração de reconhecimento dos mesmos por parte da respetiva entidade empregadora, o que coloca desde logo a questão de sabermos qual a natureza dos créditos reclamados pelos Recorrentes.
(17) Antes de avançarmos mais na dilucidação da questão que constitui o pomo da discórdia entre os sujeitos processuais, importa considerar o que foi sentenciado na decisão recorrida a este respeito, aí se consignando, designadamente que «De acordo com os n.ºs 3 e 5 do artigo 390.º do Código do Trabalho então em vigor (2003), o encerramento total e definitivo determina a caducidade do contrato devendo, em tal caso, seguir-se o procedimento previsto nos artigos 419.º e ss com as necessárias adaptações e de acordo com o respectivo n.º 5, verificando-se a caducidade do contrato nos casos previstos nos números anteriores, o trabalhador tem direito à compensação estabelecida no artigo 401.º, pela qual responde o património da empresa.
De acordo com o disposto no artigo 401.º (Compensação), o trabalhador cujo contrato cesse em virtude de despedimento coletivo tem direito a uma compensação correspondente a um mês de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade (n.º 1); no caso de fracção de ano, o valor de referência previsto no número anterior é calculado proporcionalmente (n.º 2).A compensação a que se refere o n.º 1 não pode ser inferior a três meses de retribuição base e diuturnidades (n.º 3).Presume-se que o trabalhador aceita o despedimento quando recebe a compensação prevista neste artigo (n.º 4).
Dos dispositivos legais referenciados resulta então que a obrigação de pagamento dos créditos emergentes de contrato de trabalho se vence (…) na data da caducidade do contrato motivado por encerramento total e definitivo, no caso de indemnização compensação pelo despedimento estabelecido no artigo 401.º.
(…) Na tese dos AA., e bem, o reconhecimento dos créditos pela sociedade, agora insolvente, reportam-se aos créditos vencidos à data da cessação do contrato, o que veio evitar o recurso à via judicial, ou seja, à instauração de uma eventual ação laboral de reconhecimento desses créditos.
Ora, e como refere a Entidade Demandada, a tal ocorrer, desse facto não resultaria qualquer alteração da data do vencimento dos créditos requeridos ao Fundo de Garantia Salarial.
(…) os pagamentos requeridos ao Fundo de Garantia Salarial pelos AA. decorrentes dos créditos laborais por indemnização/compensação por cessação do contrato de trabalho venceram-se, para todos, na data de cessação do contrato de trabalho, isto é, 19.09.2008.
Do que resulta que, todos os créditos requeridos pelos AA. se venceram, efectivamente, antes do período de 6 meses que antecedeu a data de propositura da acção de insolvência, o mesmo é dizer, antes da data de 30 de Dezembro de 2008.
Não ocorrendo assim a alegada violação de lei, designadamente do disposto no artigo 319.º, n.º1 do Regulamento do Código do Trabalho (Lei n.º 35/2004 de 29 de Julho)
(…) No caso, a Entidade Demandada deu cabal cumprimento à lei…ao indeferir o pedido dos Autores por os créditos laborais cujo pagamento foi por eles reclamado ao Fundo de Garantia não se encontrarem abrangidos pelo mencionado período de referência (…). O que aliás não é posto em causa pelos Autores, já que o que eles defendem é que nos seus casos tendo o reconhecimento dos créditos em causa ocorrido durante o prazo previsto no n.º1 do art. 319.º da Leu 35/2004, de 29 de Junho, tal deve bastar para se considerarem tais créditos abrangidos no período legal de referência (…). Entendimento não passível de acolhimento, por não ter fundamento legal (…)».
(18) Resulta da sentença recorrida, em primeiro lugar, que a senhora juiz a quo considerou que os Recorrentes foram alvo de um despedimento coletivo, por força do qual lhes assiste o direito à compensação prevista no artigo 401.º do CT/2003 e, em segundo lugar, que essa indemnização se venceu na data da cessação dos respectivos contratos e não na data em que a entidade empregadora dos Recorrentes emitiu as declarações de reconhecimento de tais créditos salariais.
(19) De notar, porém, que analisando a sentença recorrida dela não se extrai, pelo menos, de forma absolutamente inequívoca, se os créditos salariais reclamados pelos Recorrentes se materializam apenas na compensação a que se reporta o artigo 401.º do CT/2003, ou se neles se considerou estarem incluídos outros créditos salariais, como salários, férias e subsídios, para o que em muito contribui o facto de na sentença recorrida se tecerem várias considerações sobre a data de vencimento de outros créditos salariais, para além da dita compensação, como sejam os referentes às retribuições, férias e subsídio de férias.
(20) A somar à assinalada dificuldade duma imediata apreensão dos concretos créditos salariais em discussão, vêm os Recorrentes invocar que o despedimento de que foram alvo foi um despedimento por extinção do posto de trabalho e que o mesmo foi um despedimento ilícito, na medida em que não foi cumprido o procedimento legal previsto no CT, dando assim a entender que os créditos salariais reclamados têm a ver com a ilicitude do despedimento, razão pela qual os mesmos não se terão vencido na data da cessação dos seus contratos de trabalho mas apenas aquando do reconhecimento efetuado pela entidade empregadora.
(21) Vejamos, em concreto, os argumentos apresentados pelos Recorrentes em sustento da sua pretensão e que são os seguintes:
(i) em 19 de setembro de 2008 a sua entidade patronal, invocando razões de natureza económica, suspendeu a laboração, procedeu ao encerramento da empresa e despediu todos os seus trabalhadores entre os quais os Recorrentes, assinalando no Modelo RP5044 que instruiu o processo de requerimento de pagamento ao FGS, como motivo da cessação do contrato “ Despedimento por extinção do posto de trabalho” e na secção “fundamentação do motivo assinalado”, escreveu “Conjuntura difícil do sector corticeiro….impossibilidade de prosseguir a actividade” – cfr. conclusão C) das alegações de recurso;
(ii) a situação descrita cabe na previsão do art.º 402.º do CT (2003) “ Despedimento por extinção do posto de trabalho), cujo procedimento a seguir se encontra disciplinado nos artigos 423.º e ss do CT, importando a violação dessas regras, a ilicitude do despedimento- cfr. conclusões D), E) e F);
(iii) sendo tal despedimento declarado ilícito, o empregador é condenado a indemnizar o trabalhador por todos os danos patrimoniais e não patrimoniais causados [cfr. art.º 436.º, n.º1, al.a)], bem como as retribuições que o mesmo deixou de auferir desde o despedimento até à data da sentença [cfr. art.º 437.º, n.º1], para além da compensação a que se refere o art.º 401.º aplicável por força do disposto na al. d) do art.º 432.º, para além de ser concedido a tais trabalhadores um prazo de aviso prévio de 60 dias, cuja inobservância implica para o empregador a obrigação da retribuição correspondente ao período de antecedência em falta [cfr. art.º 398.º ex vi art.º 404.º do CT]- cfr. conclusões G) e H).
(iv) a ilicitude do despedimento deve ser declarada pelo tribunal, sendo que na data do despedimento a obrigação de pagamento não está ainda quantificada, nem configura uma obrigação com prazo certo, sendo que a exigibilidade da obrigação faz-se pelo seu reconhecimento que pode ser judicial ou extrajudicial, o que, na situação em causa, foi feito extrajudicialmente, equivalendo o mesmo ao vencimento do direito.
(22) Isto dito, importa clarificar, desde já, se o despedimento dos ora Recorrentes foi um despedimento coletivo, como se considerou na sentença recorrida ou se, como os Recorrentes sustentam, se tratou antes de um despimento com fundamento na extinção do posto de trabalho, e ilícito.
(23) Nos termos do n.º1 do artigo 397.º do CT(2003) “Considera-se despedimento colectivo a cessação de contratos de trabalho promovida pelo empregador e operada simultânea ou sucessivamente no período de três meses, abrangendo, pelo menos, dois ou cinco trabalhadores, conforme se trate, respectivamente, de microempresa e de pequena empresa, por um lado, ou de média e grande empresa, por outro, sempre que aquela ocorrência se fundamente em encerramento de uma ou várias secções ou estrutura equivalente ou redução de pessoal determinada por motivos de mercado, estruturais ou tecnológicos”.
(24) O despedimento coletivo caracteriza-se assim, por dois trações essenciais: (i) primeiro, o de abranger uma pluralidade de trabalhadores da empresa; (ii) segundo, o da rutura dos respectivos contratos de trabalho assentar numa razão comum a todos eles
(25) Por seu turno, o despedimento com fundamento em extinção do posto de trabalho encontra-se regulado nos artigos 402.º e ss do C.T, e a principal distinção entre o mesmo e o despedimento coletivo, traduz-se no facto de, neste caso, se estar perante um despedimento individual, sendo que, no tocante às razões que o fundamentam, essas são do mesmo tipo das que são invocadas no despedimento coletivo [motivos económicos ou de mercado, tecnológicos ou estruturais relativos à empresa].
(26) Ora, tendo em consideração a matéria de facto apurada, da qual resulta inequivocamente que a entidade empregadora dos Recorrentes procedeu ao despedimento de todos os seus trabalhadores, entre os quais se incluíam os ora Recorrentes, por razões objetivas, a decisão recorrida julgou adequadamente ao classificar o despedimento de que os Recorrentes foram alvo como um despedimento coletivo, atenta a definição do art.º 397.º, n.º1 do CT/03.
(27) Partindo então deste pressuposto, importa ter presente que de acordo com o disposto no artigo 398.º, n.º1 do CT “ A decisão de despedimento, com menção expressa do motivo, deve ser comunicada, por escrito a cada trabalhador com uma antecedência não inferior a 60 dias relativamente à data prevista para a cessação do contrato” , e a inobservância do aviso prévio a que se reporta a norma transcrita, segundo o disposto no n.º2 do mesmo artigo, “não determina a imediata cessação do vínculo e implica para o empregador o pagamento da retribuição correspondente ao período de antecedência em falta”.
(28) Para o caso, porém, de encerramento total e definitivo da empresa, como sucedeu in casu, dispõe o n.º3 do artigo 390.º do CT que a ocorrência dessa situação “ determina a caducidade do contrato de trabalho, devendo, em tal caso, seguir-se o procedimento previsto nos artigos 419.º e ss, com as necessárias adaptações”
(29) Outrossim, em conformidade com o disposto nos artigos 419.º e ss do CT, o despedimento coletivo está sujeito a um procedimento prévio, que inclui a necessidade de ser enviada uma comunicação escrita à comissão de trabalhadores, ou na sua falta, à comissão intersindical ou às comissões sindicais da empresa representativas dos trabalhadores a abranger, ou na falta de todas estas entidades, a cada um dos trabalhadores que possam vir a ser abrangidos, a intenção de proceder ao despedimento, comunicação essa que deve se acompanhada dos elementos a que se refere o n.º2 do art.º 419.º, máxime, da indemnização referida no n.º 1 do artigo 401.º.
(30) Nos termos do n.º1 do artigo 401.º do CT, “O trabalhador cujo contrato cesse em virtude de despedimento colectivo tem direito a uma compensação correspondente a um mês de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade”, não podendo essa compensação, em caso algum, ser inferior a três meses de retribuição base e diuturnidades (n.º3).
(31) Após tais comunicações, deve seguir-se uma fase de negociações, com vista à obtenção de um acordo sobre a dimensão e dos efeitos das medidas a aplicar, de cujas reuniões é lavrada acta (art.º 420.º), negociações essas em cujo processo participam os serviços competentes do ministério responsável pela área laboral (art.º 421.º).
(32) Celebrado o acordo ou na falta deste, decorridos 20 dias sobre a comunicação a que reporta o artigo 419.º, n.º1 ou 5 “o empregador comunica, por escrito, a cada trabalhador a despedir a decisão de despedimento, com menção expressa do motivo e da data da cessação do respectivo contrato, indicando o montante da compensação, assim como a forma e o lugar do seu pagamento”- cfr. artigo 422.º.
(33) Nos termos do n.º1 do artigo 431.º do CT, «O despedimento colectivo é ainda ilícito sempre que o empregador:
a) Não tiver feito as comunicações e promovido a negociação previstas nos n.ºs 1 ou 4 do artigo 419.º e n.º1 do artigo 420.º;
b) Não tiver observado o prazo para decidir o despedimento, referido no n.º1 do artigo 422.º;
c) Não tiver posto à disposição do trabalhador despedido, até ao termo do prazo de aviso prévio, a compensação a que se refere o artigo 401.º e, bem assi, os créditos vencidos ou exigíveis em virtude da cessação do contrato de trabalho (…)”
(34) E de acordo com o que o dispõe o artigo 435.º do CT “A ilicitude do despedimento só pode ser declarada por tribunal judicial em ação intentada pelo trabalhador” (n.º1), estabelecendo-se, ainda, no seu n.º2, que a respetiva ação tem de ser intentada no prazo de 6 meses a contar da data da cessação do contrato, encontrando-se os efeitos da ilicitude regulados nos artigos 436.º a 439.º.
(35) Na situação que temos em mãos, os Recorrentes não provaram terem sido alvo de um despedimento ilícito, o qual, conforme decorre do sobredito art.º 435.º do CT, sempre estaria dependente de uma decisão judicial e, pese embora, a dada altura, procurem fazer crer ao tribunal a quo e ao tribunal ad quem que a indemnização cujo pagamento reclamaram ao FGS emergia do carácter ilícito do despedimento de que foram destinatários, a verdade é que os factos apurados desmentem cabalmente uma tal hipótese.
Vejamos.
(36) Na petição inicial os Recorrentes começam por afirmar que conforme poderá verificar-se do requerimento de reclamação de créditos, o valor em dívida refere-se ao pagamento da indemnização pelo despedimento que ocorreu em 19/09/2008, e que, a fim de evitar o recurso à via judicial, a entidade empregadora, no final de fevereiro de 2009, reconheceu e considerou-se devedora dos créditos reclamados.
(37) Por outro lado, pese embora nas declarações emitidas pela respetiva entidade empregadora se mencione que os créditos salariais reconhecidos se referem á indemnização prevista noartigo 433” do CT/03 (indemnização por inadaptação do trabalhador), os Recorrentes afirmam na p.i. ter-se tratado de um equívoco a alusão aí feita ao artigo 433.º do CT, uma vez que a indemnização em causa era aquela a que se reportava o artigo 432.º do CT, ou seja, indemnização pela cessação ilícita dos contratos de trabalho com fundamento em extinção do posto de trabalho.
(38) Note-se, porém, que quando os Recorrentes reclamaram os créditos salariais reconhecidos pelas declarações emitidas pela sua entidade empregadora em fevereiro de 2009, no âmbito do competente processo de insolvência, aí afirmaram expressamente tratar-se unicamente da indemnização por antiguidade a que de reporta o “artigo 366.º”, e acrescentamos nós, do CT/2009. E é curioso registar que este artigo 366.º é o que regula o direito dos trabalhadores ao recebimento de uma compensação em caso de cessação do contrato de trabalho decorrente de causas objetivas, ou seja, o que sucedeu ao artigo 401.º do CT na versão de 2003.
(39) Considerando o acervo factual apurado não temos qualquer dúvida em como os créditos salariais reclamados pelos Recorrentes dizem respeito unicamente à compensação pela cessação dos respectivos contratos de trabalho, prevista e regulada pelo art.º 401.º do CT/2003 [art.º 366.º do CT/2009], tendo sido estes créditos os que foram reconhecidos pelo senhor Administrador de Insolvência. De igual modo, é também forçoso concluir-se que não tendo os ora Recorrentes instaurado no prazo de seis meses a competente ação de impugnação do despedimento com vista a demonstrar a sua ilicitude, nos termos das competentes disposições legais do CT/03, jamais lhes assistiria o direito de reclamarem junto do FGS qualquer montante indemnizatório emergente da ilicitude do despedimento, não sendo para tal suficiente um eventual reconhecimento extrajudicial por parte da respetiva entidade empregadora.
(40) E sendo assim, a data de vencimento do direito ao pagamento dos créditos salariais reclamados pelos Recorrentes, traduzidos na compensação a que se reporta o artigo 401.º do CT/03, é a data da cessação dos contratos de trabalho dos Recorrentes, pelo que, tal como foi decidido no arresto recorrido, o seu vencimento ocorreu fora do período de abrangência de seis meses previsto no n.º1 do art.º 319.º da Lei n.º 35/2004.
(41) Pretender como os Recorrentes que tal “indemnização” apenas se venceu com a declaração emitida pela entidade empregadora, não tem qualquer suporte legal, não só porque, reitera-se, a mesma se consubstancia na compensação prevista no art.º 401.º do CT/203, como porque, ainda que assim não fosse e a mesma correspondesse à indemnização pela cessação ilícita dos respectivos contratos de trabalho, então sempre teria que existir previamente uma decisão judicial que reconhecesse a natureza ilícita desse despedimento, não podendo uma declaração emitida pela entidade empregadora valer como se de uma decisão judicial se tratasse, atento o disposto no citado art.º 435.º do CT/2003.
(42) A ilicitude de um despedimento apenas pode ser declarada pelo tribunal do trabalho e, nesse caso, a indemnização pela cessação ilícita do contrato de trabalho apenas se vence com o trânsito em julgado da respetiva decisão, donde decorre que, o trabalhador estará em tempo para reclamar o crédito daí resultante junto do FGS se a data do trânsito em julgado de tal decisão judicial se situar dentro do prazo de seis meses previsto no n.º1 do art.º 319.º da Lei n.º 35/2004.
(43) Perante tudo quanto vem dito, é manifesto que aos Recorrentes não assiste o direito de verem os créditos reclamados assegurados pelo FGS, por não se verificar o requisito previsto no n.º1 do artigo 319.º da Lei n.º 35/2004, que exige que os créditos reclamados se tenham vencido nos seis meses que antecedem a data da instauração da ação de insolvência.
***
II. DA VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA IGUALDADE, DA LEGALIDADE, DA JUSTIÇA E DA IMPARCALIDADE.
(44) No que concerne à alegada violação dos princípios da igualdade, da legalidade (art. 3º do C.P.A.) da justiça e da imparcialidade (arts. 6º e 6º- A do C.P.A.), que os Recorrentes assacam aos atos impugnados, importa referir que sendo o ato impugnado legal, como resulta das considerações que acabamos de efetuar, o mesmo não poderá violar os apontados princípios. Na verdade, se as decisões proferidas pelo Recorrido se mostram conformes ao bloco legal aplicável, como vimos suceder, e sendo a atuação da Administração neste domínio uma atividade vinculada, então a mesma não pode ter atuado em violação dos apontados princípios, ou seja, de forma desigual, parcial, ou injusta, porque, pura e simplesmente, atuou de acordo com a lei.
(45) Sem prejuízo do que se acabou de enunciar, tendo em conta a particular enfase que os Recorrentes põem na violação do principio da igualdade decorrente do facto do Fundo de Garantia Salarial ter assumido o pagamento de créditos salariais de outros trabalhadores que se encontravam na mesma situação dos ora Recorrentes, e que a sentença recorrida não deu como demonstrado, reitera-se que não vemos razão para divergir do que foi decidido pelo tribunal a quo a este respeito, tanto quanto é certo não existir igualdade na ilegalidade.
(46) Na verdade, como se expende no Ac. do TCAS de 10.07.2008, proferido no Rec.n.º 12555/03 «(…) em situações de aplicação estritamente vinculada da lei (…), opera apenas o princípio da legalidade e não tem expressão relevante o princípio da igualdade, uma vez que este funciona como limite interno da discricionariedade e só tem sentido na medida em que a Administração goza de liberdade para escolher a conduta a adoptar (Cfr. Esteves de Oliveira e Sérvulo Correia, apud Santos Botelho, Pires Esteves e C. Pinho in CPA anotado, 5ª edição, pág. 65).
Daí se segue que, mesmo com o intuito de evitar casos de manifesta divergência de tratamento em casos idênticos, o princípio da igualdade não impõe à Administração o dever de afastar o cumprimento da lei.
É que, como se refere no Acórdão de 29-01-2002 da 2ª Subsecção do C.A. do S.T.A., processo 047525, não existe um «direito à igualdade na ilegalidade» ou à «repetição dos erros».
Na mesma linha, vide ainda o Acórdão de 06-11-2001, também da 2ª Subsecção do C.A. do S.T.A., processo 047833, que «Embora o princípio da igualdade postule a autovinculação da administração no âmbito dos seus poderes discricionários, devendo ela utilizar critérios substancialmente idênticos para a resolução de casos idênticos, sob pena de total desrazoabilidade e com forte incidência no regular funcionamento da actividade administrativa, não existe um «direito à igualdade na ilegalidade», ou à «repetição dos erros», podendo a administração afastar-se de uma prática anterior que se mostre ser ilegal».
No caso, não existia margem para o exercício de poderes discricionários e, por isso, a Administração tinha, mais que o poder, o dever de decidir a pretensão do Recorrente da única forma legalmente admissível, como fez.».
(47) Assim sendo, impera concluir que a sentença recorrida, ao decidir como decidiu e com os fundamentos com que o fez, não merece censura, não tendo incorrido em qualquer erro de interpretação e aplicação da lei aos factos, como lhe é assacado.
(48) A sentença recorrida deverá, assim, ser mantida na ordem jurídica, e ser negado provimento ao recurso jurisdicional que a põe em causa.
Neste sentido se decide.
*****
III- DECISÃO
Nestes termos, acordam, em conferência, os juízes deste Tribunal em:
1. Negar provimento ao recurso jurisdicional;
2. Manter a decisão recorrida.
Custas a cargo dos Recorrentes em ambas as instâncias.
Notifique.
DN.
*
Processado com recurso a meios informáticos, tendo sido revisto e rubricado pela relatora (cfr. artº 131º nº 5 do CPC “ex vi” artº 1º do CPTA).
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Porto, 15 de Julho de 2014
Ass.: Helena Ribeiro
Ass.: João Beato Sousa
Ass.: Maria do Céu Neves