Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00566/20.9BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:09/30/2021
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Paulo Moura
Descritores:DÍVIDAS À SEGURANÇA SOCIAL; INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO; DEVEDOR ORIGINÁRIO; RESPONSÁVEL SUBSIDIÁRIO.
Sumário:I - As dívidas à Segurança Social prescrevem no prazo de cinco anos, conforme previsto no artigo 60.º, n.º 3 da Lei de Bases Gerais do Sistema de Segurança Social, assim como no artigo 187.º, n.º 1 do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social.

II - A citação na exceção fiscal do devedor originário interrompe a prescrição.

III – Se a citação do responsável subsidiário for efetuada para além dos cinco anos contados do período a que as contribuições à Segurança Social são devidas, o efeito interruptivo operado pela citação do devedor originário, não produz efeitos.
Recorrente:A.
Recorrido 1:INSTITUTO DE GESTÃO FINANCEIRA DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P.
Votação:Unanimidade
Decisão:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido da procedência do recurso.
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Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
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A., executado por reversão na execução instaurada pelo INSTITUTO DE GESTÃO FINANCEIRA DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P. - Secção de Processo Executivo de Bragança, interpõe recurso da sentença que julgou improcedente a Oposição deduzida com fundamento na prescrição das dívidas exequendas.

Formula nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem:

2.1- Vem o presente recurso interposto da sentença que julgou improcedente a oposição à execução, incorrendo em erro de julgamento, tanto quanto à matéria de facto, como quanto à matéria de direito, por errada valoração dos elementos constantes dos autos.
2.2- A fundamentação da sentença recorrida parte do pressuposto de facto, errado, que a Segurança Social remeteu ao Oponente o ofício que consta de fls. 8 do processo executivo apenso, datado de 14/08/2015.
2.3- E assenta, ainda, no entendimento segundo o qual tal notificação não obriga a registo postal, concluindo que o prazo prescricional dos créditos exequendos se tem por interrompido com a notificação para o exercício do direito de audição prévia feita por ofício de 14/08/2015.
2.4- Com tal decisão não se conforma o recorrente, porquanto não foi produzida nos autos qualquer prova do envio do referido ofício datado de 14/08/2015, não tendo a notificação sido recebida pelo destinatário nem por qualquer outro meio chegado ao seu conhecimento.
2.5- O referido ofício não se mostra acompanhado de qualquer comprovativo de envio ou do registo postal que permita comprovar a sua expedição.
2.6- Impondo-se a alteração da decisão de facto, por erro de julgamento, passando a matéria de facto constante do ponto 5 dos factos provados para o elenco de factos não provados.
2.7- A sentença recorrida viola as normas do n.º 4 do artigo 60º da LGT, ex-vi artigo 23.º, n.º 4, do mesmo diploma; das normas conjugadas do n.º 3 do artigo 38º, do n.º 1 do artigo 36.º e do n.º 1 do artigo 39.º do CPPT, ex-vi alínea b) do artigo 2º da LGT; e das normas conjugadas do n.º 1 do artigo 112.º, da alínea c) do n.º 1 do artigo 114.º e do n.º 1 do artigo 113.º do CPA, ex-vi alínea c) do artigo 2º da LGT, das quais resulta que, a reversão de dívidas deve ser precedida de audição do responsável subsidiário, devendo a notificação para exercício do direito de audição prévia ser feita por carta registada a enviar para o domicílio fiscal do contribuinte.
2.8- Não se pode reconhecer a existência e a validade da notificação para o exercício do direito de audição prévia do revertido, por não ter sido feita prova da realização desse acto, cabendo à Segurança Social demonstrar que deu cumprimento à formalidade legalmente exigida, com o que não se basta a simples existência do ofício de notificação.
2.9- A decisão de reversão da dívida é ineficaz em relação ao executado/revertido, nos termos do artigo 36º n.º 1 do CPPT, por falta de notificação prévia do responsável subsidiário do projecto de decisão de reversão, para exercício do direito de audição prévia, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 23º n.º 4 e 60º da Lei Geral Tributária.
2.10- Devendo ser anulados todos os actos processuais subsequentes ao projecto de decisão de reversão, por ineficácia em relação ao executado/revertido.
2.11- E concluindo-se pela prescrição da dívida exequenda, nos termos das disposições conjugadas do artigo 60º, n.º 3, da Lei n.º 4/2007, de 16 de janeiro, do artigo 10º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 199/99, de 8 de junho, e do artigo 6º do Decreto-Regulamentar n.º 26/99, de 27 de outubro, porquanto a citação do executado/revertido apenas se concretizou em 13.12.2019, isto é, muito para além do prazo de cinco anos a contar da data em que aquelas obrigações deveriam ter sido cumpridas.
Nestes termos, deve ser concedido provimento ao presente recurso e, consequentemente, ser revogada a sentença recorrida, a qual deverá ser substituída por outra que julgue a oposição à execução procedente e, em consequência, declare extinta a execução, por prescrição da dívida exequenda, assim se fazendo

Não foram apresentadas contra-alegações.

O Ministério Público emitiu parecer no sentido de o recurso ser julgado procedente, por entender que se verifica a prescrição das dívidas exequendas, na medida em que não está demonstrada a notificação do Oponente para o exercício da audição prévia em relação à preparação da reversão da execução fiscal.

Foram dispensados os vistos legais, nos termos do n.º 4 do artigo 657.º do Código de Processo Civil, com a concordância das Exmas. Desembargadoras Adjuntas, atenta a disponibilidade do processo na plataforma SITAF (Sistema de Informação dos Tribunais Administrativos e Fiscais).
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Delimitação do Objeto do Recurso – Questões a Decidir.

As questões suscitadas pela Recorrente, delimitada pelas alegações de recurso e respetivas conclusões [vide artigos 635.º, n.º 4 e 639.º CPC, ex vi alínea e) do artigo 2.º, e artigo 281.º do CPPT] são as de saber se existe erro de julgamento da matéria de facto e de direito, no que concerne à notificação da audição para reversão da execução e quanto à verificação da prescrição das dívidas exequendas.
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Relativamente à matéria de facto, o tribunal, deu por assente o seguinte:

FUNDAMENTAÇÃO
FACTOS PROVADOS
1. O “Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P.”, em 20/2/2011, instaurou contra a sociedade comercial “A., LDA.”, Contribuinte Fiscal nº (…), o Processo de Execução nº 1302201100091316 e apensos, com vista à cobrança coerciva de créditos da Segurança Social referentes ao período compreendido entre Outubro e Dezembro de 2010 e legais acréscimos, no montante global de € 1.396,24.
2. Dão-se por reproduzidas as certidões de dívida constantes de fls. 1 do processo administrativo apenso aos autos.
3. O “Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P.”, em 19/3/2011, procedeu à citação da sociedade comercial “A., Lda.”, mediante registo postal remetido para “Caminho (…)”, conforme documento que se encontra a fls. 3 do processo apenso que se dá por reproduzido.
4. No Processo de Execução nº 1302201100091316 e apensos, em 14/8/2015, foi lavrado o “Projecto de Reversão” que consta a fls. 5 do processo apenso e se dá por reproduzido, relativos aos créditos mencionados em 1.
5. O “Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P.” remeteu ao Oponente para “Route de (…)”, o ofício que consta a fls. 8 do processo apenso e se dá por reproduzido, datado de 14/8/2015, com vista à notificação do Oponente para exercício do direito de audição prévia em relação ao projecto de reversão mencionado em 4, de que remeteu cópia, e foi acompanhado da correspondente certidão de dívidas.
6. No Processo de Execução nº 1302201100091316 e apensos, em 21/11/2019, foi lavrado o “Despacho de Reversão” que consta a fls. 12/14 do processo apenso e se dá por reproduzido, relativo aos créditos mencionados em 1.
7. O “Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P.” remeteu ao Oponente, para “Route de (…)”, sob registo postal, o ofício que consta a fls. 15 do processo apenso e se dá por reproduzido, datado de 21/11/2019, com vista à citação do Oponente como revertido, no Processo de Execução mencionado em 1 e apensos, pelo montante global de € 7.256,93, sendo € 5.581,16 de quantia exequenda, € 1.391,77 de juros de mora, e € 284,00 de custas.
8. O aviso de recepção relativo ao ofício mencionado em 7 foi assinado pelo Oponente em 13/12/2019, conforme documento de fls. 17 do processo apenso que se dá por reproduzido.
9. A presente oposição foi apresentada em 9/1/2020.

FACTOS NÃO PROVADOS
Nada mais se provou com interesse para o conhecimento do mérito.

A convicção do Tribunal alicerçou-se na análise crítica da prova documental junta aos autos referida no probatório em relação a cada facto, na matéria alegada e não impugnada, e outra de conhecimento oficioso do Tribunal, dispensando a respectiva alegação, nos termos do artigo 412º do Código de Processo Civil.
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Apreciação jurídica do recurso.

Alega o Recorrente que a Sentença parte do pressuposto de facto errado de que a Segurança Social lhe remeteu o ofício datado de 14/08/2015 (audição para preparação da reversão da execução fiscal) e que tal notificação não obriga a registo postal. Refere que não existe documento externo que comprove a entrega daquele expediente.

Mais alega, que o ponto 5) da matéria de facto deve passar dos factos provados, para os factos não provados.

Por sua vez, a Sentença seguiu o seguinte discurso fundamentador:
Conforme decorre do probatório em 4 e 5 o Exequente lavrou projecto de reversão em relação aos créditos exequendos, que remeteu ao Oponente por ofício datado de 14/8/2015.
O Oponente, notificado desse articulado e da junção do processo administrativo, do qual constava o documento relativo à notificação para exercício do direito de audição, remeteu-se ao silêncio, e só tardiamente, em sede de alegações, suscitou questão nova, qual seja que não foi notificado para exercer o direito de audição prévia, e não teve conhecimento do ofício em causa. Todavia, além de se tratar de questão que não invocou no seu articulado inicial, não impugnou o documento em causa, nem juntou prova documental, testemunhal, ou outra, relativamente a tal facto.
Assim sendo, tem que se concluir pela existência e validade da notificação do Oponente para exercício do direito de audição em relação ao projecto de reversão, por ofício de 14/8/2015, notificação que não obriga a registo postal.
Consequentemente, contabilizado o prazo prescricional de 5 anos nos termos acima explicitados verifica-se os créditos exequendos mais antigos, referentes a Outubro de 2010, podiam ser exigidos a partir do dia 15/11/2010, por ser o dia 15 do mês seguinte a que respeita tal prestação, como estatuído no artigo 10º, nº 2, do DL nº 199/99, de 8 de Setembro. Destarte, o prazo prescricional de 5 anos constante da Lei nº 17/00, de 8 de Agosto, contabilizado desde 15/11/2010 completou-se em 15/11/2015, depois da Segurança Social ter procedido à notificação do Oponente para exercer o direito de audição prévia, que teve lugar por ofício de 14/8/2015.
Por maioria de razão os créditos mais recentes também não prescreveram.

Segundo refere a Sentença, o Oponente não invoca na Petição Inicial de Oposição que não foi notificado para exercer o direito de audição prévia, nem sequer após a notificação da Contestação, nem com a junção do processo administrativo, apenas o fazendo em sede de alegações pré-sentenciais. Conclui a Sentença que levantado o assunto nas alegações pré-sentenciais, é questão nova que não pode ser conhecida, para além de que a notificação para o exercício do direito de audição em relação ao projeto de reversão, não obriga a registo postal.

Apreciando.
Efetivamente na Petição Inicial, o Oponente não refere que nunca foi notificado para o exercício do direito de audição prévia sobre o projeto de reversão da execução fiscal contra si.
No entanto, não se pode considerar que isso seja uma questão nova, na medida em que a questão fundamental a apreciar é a invocada prescrição, para o efeito, devendo o juiz analisar todos os factos que importem a essa apreciação, na medida em que a prescrição é de conhecimento oficioso.
Resulta, ainda, que não se pode dizer que o Oponente, assim que notificado da Contestação e da junção do processo executivo, devia ter impugnado o documento em causa e ter junto prova documental, testemunhal ou outra, para demonstrar que não recebeu aquela notificação. Isto porque, por um lado, o processado da Oposição não prevê a Réplica para resposta às exceções perentórias, mas apenas a resposta às exceções deduzidas pela Fazenda Pública que impeçam o conhecimento do mérito da causa, portanto exceções dilatórias (vide artigo 113.º, n.º 2, por remissão do artigo 211.º, n.º 1 do CPPT); e, por outro lado, é ao notificante que compete a prova da notificação (daí que não tivesse o Oponente de indicar prova testemunhal ou outra, para tentar demonstrar o facto negativo).
Para além disso, impugnar o documento que se encontra junto ao processo executivo, apenas faria sentido se o mesmo não correspondesse à verdade, pois que a impugnação de documentos visa invocar a sua falsidade, sendo que a presença de um ofício num processo pode ser verdadeira. Questão diferente é a de saber se tal documento chegou ao conhecimento do destinatário; situação que nada tem a ver com a sua impugnação.

Ora, considerando que a prescrição é de conhecimento oficioso, assim como as regras por demais firmadas na jurisprudência sobre o ónus da prova sobre a notificação dos atos tributários, conclui-se que a Sentença não podia dar como provado, da forma como deu, o que consta do ponto 5) da matéria de facto.
Isto porque, não resulta demonstrado nos autos ou no processo executivo que o Oponente tenha sido notificado para exercer o direito de audição prévia tendo em vista a reversão da execução fiscal.
Apenas consta do processo executivo uma minuta de um ofício (portanto, nem sequer é um ofício propriamente dito, como a seguir explicaremos), que preparava a elaboração de um ofício, com vista à audição do Recorrente para efeitos de reversão contra si da execução.
Em face do exposto, decide-se alterar a matéria de facto constante do ponto 5), passando a ter o seguinte teor:
5. O “Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P.”, Secção de Processo Executivo do Porto II, elaborou em 14/08/2015 uma minuta de ofício, dirigida ao Oponente, com o endereço de « Route (…)», com vista à notificação do Oponente para exercício do direito de audição prévia em relação ao projeto de reversão mencionado em 4, no qual constava, designadamente o seguinte: O/A Coordenador(a) da Secção de processo Executivo (nome e cargo)».
(vide fls. 8 do PEF, corresponde a fls. 17 do pdf digitalizado do PEF)

Atenta a alteração dada ao ponto 5) da matéria de facto, não se mostra necessário dar como não provado que o Oponente não foi notificado, pois da nova redação já resulta que tal ofício, não passou afinal de um projeto de ofício que não foi expedido por via postal.

Motivação da alteração ao ponto 5.
Em primeiro lugar, a afirmação de que se trata de uma minuta de ofício retira-se do facto de o documento em causa não estar completo, na medida em que, conforme consta da sua parte final, não consta do mesmo, nem o cargo de quem assinaria o ofício, nem o nome. Veja-se a parte transcrita em que apenas se refere:
«O/A Coordenador(a) da Secção de Processo Executivo
(nome e cargo)»
Comparando-se este documento com os demais similares, ou seja, os elaborados para realizar uma notificação ou citação, verifica-se que aqueloutros contém sempre o nome e o cargo da pessoa que assina o ofício.
Veja-se que o ofício de citação da devedora originária contém o nome do Coordenador da Secção de processo (fls. 6 do PEF, digitalizado em pdf, encontra-se a fls. 13 do pdf de págs. do SITAF).
Por sua vez, o ofício elaborado para a citação do revertido já contém a indicação do cargo de quem assina e o respetivo nome, ou seja, o «Coordenador da Secção de Processo Porto II», seguido da assinatura (por chancela) e nome impresso do Coordenador (fls. 13 do PEF, que corresponde a fls. 27/28 do pdf do PEF digitalizado).
Nada disto consta no ofício preparado para a audição prévia, pelo que não se julga crível que tivesse sido expedido um ofício, sem indicação do cargo e nome de quem ordena a notificação.
Para além disso, não existe qualquer comprovativo em como aquele o documento tenha sido expedido, como um talão de registo dos correios.
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Em face da não comprovação da notificação para efeitos de audição prévia sobre o projeto de reversão da execução, verifica-se que o revertido apenas teve conhecimento da execução fiscal quando foi citado em 13/12/2019 – vide ponto 8) da matéria de facto.
Segundo a nota de citação, as dívidas à segurança Social reportam-se a outubro, novembro e dezembro de 2010.
Considerando que se tratam de dívidas à Segurança Social, o prazo de prescrição é de cinco anos, sem prejuízo de o mesmo se poder interromper e suspender.
Assim, analise-se o regime legal referente à prescrição das dívidas à Segurança Social.
Segundo a Lei n.º 4/2007 de 16 de janeiro, que aprova as Bases Gerais do Sistema de Segurança Social, as dívidas à Segurança Social prescrevem no prazo de cinco anos, interrompendo-se com qualquer diligência administrativa realizada para a sua cobrança. O preceito contém a seguinte redação:
Artigo 60.º (Restituição e cobrança coerciva das contribuições ou prestações)
1 - As quotizações e as contribuições não pagas, bem como outros montantes devidos, são objecto de cobrança coerciva nos termos legais.
2 - As prestações pagas aos beneficiários que a elas não tinham direito devem ser restituídas nos termos previstos na lei.
3 - A obrigação do pagamento das quotizações e das contribuições prescreve no prazo de cinco anos a contar da data em que aquela obrigação deveria ter sido cumprida.
4 - A prescrição interrompe-se por qualquer diligência administrativa, realizada com conhecimento do responsável pelo pagamento, conducente à liquidação ou à cobrança da dívida.

Para além do citado diploma e preceito, é ainda aplicável o Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social, aprovado pela Lei n.º 110/2009, de 16 de setembro, na medida em que acrescenta um facto à interrupção da prescrição, bem como esclarece os termos em que a prescrição se suspende. Trata-se do artigo 187.º do Código dos Regimes Contributivos, que contém a seguinte redação:

Artigo 187.º (Prescrição da obrigação de pagamento à segurança social)
1 - A obrigação do pagamento das contribuições e das quotizações, respectivos juros de mora e outros valores devidos à segurança social, no âmbito da relação jurídico-contributiva, prescreve no prazo de cinco anos a contar da data em que aquela obrigação deveria ter sido cumprida.
2 - O prazo de prescrição interrompe-se pela ocorrência de qualquer diligência administrativa realizada, da qual tenha sido dado conhecimento ao responsável pelo pagamento, conducente à liquidação ou à cobrança da dívida e pela apresentação de requerimento de procedimento extrajudicial de conciliação.
3 - O prazo de prescrição suspende-se nos termos previstos no presente Código e na lei geral.

Ora, o a prescrição interrompeu-se com a citação do devedor originário, em 19/03/2011, conforme dado por assente no ponto 3 da matéria de facto.
Por sua vez, o revertido foi citado em 13/12/2019.
Havendo citação do devedor originário, interrompe-se a prescrição, mas como está em causa uma reversão contra um responsável subsidiário, aplica-se o regime do n.º 3 do artigo 48.º da Lei Geral Tributária (LGT), que estabelece:
Artigo 48.º (Prescrição)
(…)
3. A interrupção da prescrição relativamente ao devedor principal não produz efeitos quanto ao responsável subsidiário se a citação deste, em processo de execução fiscal, for efetuada após o 5.º ano posterior ao da liquidação.

Este regime é aplicável também à reversão das dívidas à Segurança Social, pois que não existe normativo idêntico nem na Lei n.º 4/2007 de 16 de janeiro, que aprova as Bases Gerais do Sistema de Segurança Social, nem no Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social, aprovado pela Lei n.º 110/2009, de 16 de setembro.
Neste sentido, veja-se o que escreve o Conselheiro Jorge Lopes de Sousa in “Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária – Notas Práticas”, 2.ª Edição, Áreas Editora, 2010, páginas 115 a 122, quando refere que o n.º 3 do artigo 48.º da LGT, consagra uma exceção à regra da interrupção da prescrição, fazendo depender a continuação da interrupção em relação ao responsável subsidiário, pelas causas de interrupção que se verifiquem em relação ao devedor principal, a citação do responsável subsidiário até ao 5.º ano posterior ao da liquidação.
Neste sentido veja-se o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo 18/11/2020, proferido no processo n.º 0730/13.7BELRA (que pode ser lido na íntegra em www.dgsi.pt), cujo teor do sumário é o seguinte:
I - Além do benefício, comum, da isenção de custas e juros de mora - artigo (art.) 23.º n.º 5 da Lei Geral Tributária (LGT), perante a concessão de bónus, no pagamento da dívida exequenda ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.º 151-A/2013 de 31 de outubro, os oponentes, razoavelmente, pagaram com o fito, desde logo, na respetiva usufruição, pelo que, o pagamento efetuado se enquadra na previsão do art. 9.º n.º 3 da LGT, destacadamente, não precludiu o seu direito de oposição à respetiva execução fiscal, na qual, como lhes facultava o art. 204.º n.º 1 alínea (al.) d) do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), podiam, entre outros, aduzir como fundamento a prescrição da dívida exequenda.
II - O n.º 3 do art. 48.º da LGT não prevê qualquer prazo de prescrição especial e privativo dos responsáveis subsidiários (ou solidários), mas, apenas, como decorre, objetivo, do seu teor, positiva a regra de que qualquer interrupção da prescrição que haja operado (ou esteja a operar) na esfera jurídica do devedor principal, cuja responsabilidade pela dívida, por efeito do mecanismo da reversão, passou para a alçada jurídica e patrimonial dos revertidos, não persiste, isto é, não interrompe a prescrição da responsabilidade destes, desde que, a sua citação, para os termos do processo de execução fiscal (revertido), só tenha sido efetivada depois de decorrido o quinto ano posterior ao da liquidação (do tributo…), que consubstancia a quantia exequenda.
III - A citação, enquanto causa interruptiva do instituo da prescrição, transversal a todo o tipo de dívidas (civis, tributárias e equiparadas…), detém e opera com um duplo efeito, instantâneo (interrompe, no sentido de que faz parar a contagem e inutiliza todo o tempo decorrido anteriormente) e, por outro lado, duradouro (não deixa começar a correr novo prazo de prescrição até ao termo do processo, v.g., em que decorra a cobrança coerciva da dívida).
IV - Nenhum obstáculo, legal ou interpretativo, existe ao funcionamento da doutrina mencionada em 3., no tratamento da prescrição respeitante às dívidas, de contribuições/cotizações/quotizações, à Segurança Social.

No mesmo sentido, veja-se o Acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte de 28/09/2017, proferido no processo n.º 01241/16.4BRAVR (que pode ser lido na íntegra em www.dgsi.pt), cujo teor do sumário é o seguinte:
1. O prazo de prescrição aplicável às dívidas à segurança social é de 5 anos.
2. O n.º 3 do art. 49º LGT é de aplicação subsidiária às dívidas da segurança social, com adaptações.
3. Os factos interruptivos da prescrição das dívidas tributárias elencados no n.º 1 do artigo 49.º da LGT têm todos eles efeito duradouro.
4. Alguns factos interruptivos da prescrição das dívidas à segurança social, - como a notificação para audiência prévia -, têm efeito meramente instantâneo.
5. A limitação a uma das interrupções da prescrição das dívidas à segurança social apenas vale para as que têm o efeito duradouro.

Ora, as dívidas em apreço reportam-se a outubro, novembro e dezembro de 2010, pelo que não podendo ser levada em consideração a interrupção da prescrição operada pela citação do devedor originário em 19/03/2011 e, tendo o Oponente sido citado em 13/12/2019, verifica-se que decorreram oito anos, oito meses e 24 dias.
Sendo de cinco anos o prazo de prescrição das dívidas à Segurança Social, conclui-se que as dívidas exequendas se encontram prescritas.

Em face do exposto, conclui-se que o recurso deve ser julgado procedente, como tal a sentença revogada e a Oposição julgada totalmente procedente.
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Nos termos do n.º 7 do artigo 663.º do Código de Processo Civil, elabora-se o seguinte sumário:

I - As dívidas à Segurança Social prescrevem no prazo de cinco anos, conforme previsto no artigo 60.º, n.º 3 da Lei de Bases Gerais do Sistema de Segurança Social, assim como no artigo 187.º, n.º 1 do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social.

II - A citação na exceção fiscal do devedor originário interrompe a prescrição.

III – Se a citação do responsável subsidiário for efetuada para além dos cinco anos contados do período a que as contribuições à Segurança Social são devidas, o efeito interruptivo operado pela citação do devedor originário, não produz efeitos.
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Decisão

Termos em que, acordam em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar a Oposição procedente, ordenando--se a extinção da execução fiscal contra o Opoente pelas dívidas aqui revertidas.
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Custas a cargo da Recorrida, não sendo devida taxa de justiça nesta instância, por não ter contra-alegado.
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Porto, 30/09/2021.

Paulo Moura
Irene Isabel das Neves
Ana Paula Santos